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PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA
COLÉGIO DE PROCURADORES DE JUSTIÇA - ÓRGÃO ESPECIAL
CORREGEDORIA-GERAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO
RESOLUÇÃO Nº 1.618/2023-PGJ-CPJ-CGMP, DE 5 DE MAIO DE 2023.
(SEI Nº 29.0001.0244371.2021-19)

Disciplina o Acordo de Não Persecução Penal –


ANPP no âmbito do Ministério Público do
Estado de São Paulo, regulamentando o
disposto no artigo 28-A do Código de Processo
Penal.

O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA, o COLÉGIO DE PROCURADORES DE JUSTIÇA,


por meio de seu ÓRGÃO ESPECIAL e o CORREGEDOR-GERAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO,
no uso das atribuições legais que lhe são conferidas, respectivamente, pelos artigos 19, XII,
"c", 22, VI e 42, XI, da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993;

CONSIDERANDO a entrada em vigor da Lei nº 13.964, de 24 de dezembro de 2019, que


introduziu alterações na legislação penal e processual penal, disciplinando o acordo de não
persecução penal - ANPP;

CONSIDERANDO que os instrumentos negociais de resolução de conflitos, há tempos


presentes no processo civil, cumprem expectativas dos indivíduos e agentes político-
econômicos, porque abreviam o tempo para a solução do conflito, e atendem um prático cálculo
de utilidade social;

CONSIDERANDO que o consenso entre as partes se estabelece em um ambiente de


coparticipação racional, mediante vantagens recíprocas que concorrem para uma
aceitabilidade no cumprimento da medida mais efetiva, sentimento que eleva o senso de
autorresponsabilidade e comprometimento com o acordo, atributos que reforçam a confiança
no seu cumprimento integral;

CONSIDERANDO que o processo penal carecia de um instrumento como o ANPP, que traz
economia de tempo e recursos para que o sistema de justiça criminal exerça, com a atenção
devida, uma tutela penal mais efetiva nos crimes que merecem esse tratamento;

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CONSIDERANDO que o Ministério Público, como titular da ação penal pública, nos termos do
art. 129 da Constituição da República, detém legitimação exclusiva para propor o acordo de
não persecução penal;

CONSIDERANDO que cada unidade do Ministério Público deve regulamentar internamente o


acordo de não persecução penal, de modo a atender as exigências da Lei nº 13.964, de 24 de
dezembro de 2019, fixando parâmetros que assegurem a observância do princípio da unidade
e da homogeneidade na atuação funcional, sem prejuízo da obediência ao princípio da
independência funcional;

RESOLVEM:

Art. 1º. Recebido o inquérito policial relatado ou após o cumprimento das diligências
investigativas complementares, tratando-se de infração penal sem violência ou grave ameaça
e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos e tendo o investigado confessado formal e
circunstancialmente sua prática, observado o § 1º do artigo 5º desta resolução, o membro do
Ministério Público deve analisar o cabimento do acordo de não persecução penal, se reputar
não ser caso de arquivamento.

§ 1º. Para aferição da pena mínima a que se refere o caput, serão considerados concurso de
crimes, causas de aumento e de diminuição de pena.

§ 2º. O exame da conveniência de oferecer a proposta de acordo de não persecução penal,


com vistas à prevenção e repressão do delito, incumbe exclusivamente ao Ministério Público.

§ 3º. No caso de recusa, por parte do Ministério Público em propor o acordo de não persecução
penal, a denúncia deve ser oferecida acompanhada de manifestação que contenha os
fundamentos da denegação.

§ 4º. É cabível o acordo de não persecução penal nos crimes culposos com resultado violento,
pois, nesses delitos, a violência não está na conduta, mas no resultado não querido ou não
aceito pelo agente, incumbindo ao órgão de execução analisar as particularidades do caso
concreto.

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§ 5º. A presente resolução se aplica aos procedimentos investigatórios criminais, notícias de


fato e demais peças de informação.

Art. 2º. Sendo caso de celebração do acordo de não persecução penal, o membro do Ministério
Público deve comunicar o investigado, informando-o sobre:
I – a possibilidade de realização do acordo em seu favor diante do preenchimento dos requisitos
legais previstos no art. 28-A do Código de Processo Penal (CPP);
II - o prazo para manifestação de interesse na celebração do acordo, com a advertência de que
o silêncio será entendido como não aceitação da proposta e implicará na propositura da ação
penal;
III - a necessidade da presença de advogado ou Defensor Público, para acompanhar as
tratativas e ulterior assinatura do acordo;
IV – o endereço completo da seção ou subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)
local ou da Defensoria Pública, se existente na Comarca.

§1º. A minuta do acordo, com a descrição dos fatos e indicação da tipificação penal, deverá ser
encaminhada ao investigado.

§2º. A comunicação a que se refere o caput deve ser feita por qualquer meio disponível na
Promotoria de Justiça, assegurando a inequívoca ciência do investigado.

Art. 3º. Nos termos do que disposto no art. 28-A do CPP, são condições a serem discutidas no
acordo de não persecução penal:
I – a reparação do dano ou restituição da coisa à vítima, salvo impossibilidade de fazê-lo;
II – a renúncia voluntária a bens e direitos, indicados pelo Ministério Público como instrumentos,
produto ou proveito do crime;
III – a prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente
à pena mínima cominada ao delito, diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo
juiz da execução penal;
IV – o pagamento de prestação pecuniária, a ser estipulada em valor não inferior a 1 (um)
salário mínimo nem superior a 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos (art. 45, Código
Penal), a entidade pública ou de interesse social a ser indicada pelo juiz da execução penal;
V – o cumprimento de outra condição estipulada pelo Ministério Público, desde que proporcional
e compatível com a infração penal imputada.

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§ 1º. O membro do Ministério Público, ao estabelecer as condições do acordo, deverá avaliar


sua compatibilidade com a infração penal atribuída ao indiciado.

§ 2º. Nos termos do inciso V do art. 28-A do CPP, podem ser consideradas condições
complementares, que devem ser cumpridas durante o período de vigência do acordo,
dentre outras:
I - proibição de frequência a determinados lugares;
II - proibição de aproximação de determinadas pessoas;
III - comparecimento a programas ou cursos educativos;
IV - suspensão parcial ou totalmente, das atividades vinculadas a delitos ambientais;
V - interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade, que tenham potencialidade de
causar danos ambientais;
VI - proibição de conduzir veículo automotor;

§ 3º. As condições previstas no inciso V do art. 28-A do CPP, estipuladas no acordo de não
persecução penal, podem variar e se adaptar a inovações ou ampliações, desde que a
prestação avençada não seja proibida, não atinja direitos de terceiros e não viole valores sociais
e nem a dignidade da pessoa humana; haja concordância do investigado e implique em
recomposição social do bem jurídico tutelado pela norma penal violada.

Art. 4º. Nos termos do § 2º do art. 28-A do CPP, não se admitirá a proposta de acordo nas
seguintes hipóteses:
I - se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos termos
da lei;
II - se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta
criminal habitual, reiterada ou profissional;
III - ter sido o agente beneficiado nos 05 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração,
em acordo de não persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo;
e
IV - nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a
mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor.

Art. 5º. Com a manifestação favorável do investigado, o membro do Ministério Público deverá
designar dia e horário para a realização da audiência, a colheita da confissão e a formalização
do acordo de não persecução penal.

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§ 1º. A confissão de que trata o caput do art. 28-A do CPP deve ser entendida como aquela
realizada pelo investigado ao representante do Ministério Público no momento da celebração
do acordo e independe da negativa de confissão realizada no ato do interrogatório perante a
autoridade policial.

§ 2º. Eventuais tratativas prévias para fins de celebração do acordo, assim como o próprio
oferecimento de sua proposta, tanto na modalidade presencial quanto na virtual, devem ocorrer
no âmbito do Ministério Público, reservando-se ao Juízo a realização de audiência com
finalidade exclusiva de homologação do acordo, que prescinde da participação do membro do
Ministério Público.

§ 3º. A confissão detalhada dos fatos e as tratativas do acordo serão registrados pelos meios
ou recursos de gravação audiovisual, destinados a obter maior fidelidade das informações, e o
investigado deve estar sempre acompanhado de seu defensor.

Art. 6º. O membro do Ministério Público participante da celebração do acordo será o Promotor
ou Procurador de Justiça natural, observado o disposto nos §§ 1º e 2º desse artigo.

§ 1º. Quando não for possível a presença física do investigado nas dependências do Ministério
Público, o respectivo membro realizará as tratativas do acordo, bem como colherá a confissão
de forma telepresencial, evitando-se a expedição de carta precatória, salvo impossibilidade
técnica ou dificuldade de comunicação.

§ 2º. Na hipótese de expedição de carta precatória, ela será instruída com, no mínimo, os
seguintes documentos:
I - decisão fundamentada indicando o motivo que impossibilitou a tratativa telepresencial;
II - indicação do fato criminoso, com todas suas circunstâncias, que deverá nortear a confissão
do investigado;
III - minuta do acordo a ser apresentado ao investigado.

Art. 7º. Os membros do Ministério Público deverão zelar pela efetiva promoção dos direitos das
vítimas, informando-as, notadamente sobre a reparação do dano causado pela infração, salvo
impossibilidade.

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§ 1º. Buscando efetivar a reparação dos danos civis causados às vítimas hipossuficientes, o
Ministério Público, quando necessário, deve encaminhá-las aos órgãos de assistência judiciária
gratuita, mediante comunicação formal.

§ 2º. Quando presente dano material suportado por vítima certa e determinada, a sua reparação
deve constar do acordo celebrado entre o Ministério Público e o investigado, salvo quando
demonstrada a impossibilidade de fazê-lo, incumbindo ao investigado a prova cabal de sua
vulnerabilidade financeira, não bastando a mera alegação.

§ 3º. Considerando que a norma do art. 28-A do CPP não limitou o ressarcimento da vítima em
relação aos prejuízos sofridos, o membro do Ministério Público pode fixar o valor mínimo do
dano moral diante do caso concreto.

§ 4º. No caso de ter sido fixada fiança e essa ter sido efetivamente paga pelo investigado, é
possível pactuar, como cláusula do ajuste, que o valor depositado judicialmente será revertido
a título de reparação de danos civis, considerando o disposto no art. 336 do CPP.

§ 5º. Com fundamento nos arts. 8º, 141, 356, 492 e 515, III, do CPC, aplicados ao CPP (art.
3º), o capítulo do acordo de não persecução penal relativo à composição de danos civis poderá
ser pactuado com caráter de autonomia, constituindo título executivo de natureza cível apto à
execução, mesmo na hipótese de posterior rescisão do ajuste.

§ 6º. Nos casos em que houver fixação de reparação do dano causado à vítima ou a seus
sucessores, deve constar do acordo, detalhadamente, a forma, o prazo e o meio dessa
reparação, além de identificação expressa do beneficiário, não se admitindo o emprego
genérico da expressão "vítima", evitando-se cláusulas ilíquidas, indefinidas ou incertas.

Art. 8º. Aceita a proposta, o membro do Ministério Público deverá redigir manifestação
contendo a descrição dos fatos praticados, a tipificação penal, os termos do acordo e o link da
audiência em que foi colhida a confissão, encaminhando-a, incontinenti, ao Juízo para
homologação.

Parágrafo único. O acordo será formalizado nos autos, com a qualificação completa do
investigado e estipulará de modo claro as suas condições, eventuais valores a serem restituídos

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e as datas para cumprimento, e, ao final, deverá ser firmado pelo membro do Ministério Público,
pelo investigado e seu defensor.

Art. 9º. Homologado o acordo, o membro do Ministério Público subscritor do ajuste


providenciará a comunicação da avença ao Instituto de Identificação "Ricardo Gumbleton
Daunt" (IIRGD), com os dados do processo (natureza da infração, data de seu cometimento e
da concessão do benefício) e do investigado ou denunciado.

Art. 10. O cabimento do acordo de não persecução penal, para fatos posteriores à Lei nº
13.964/2019, pressupõe que o crime ainda esteja na fase de investigação, só podendo ser
proposto na etapa do processo como decorrência dos institutos da emendatio e da mutatio
libelli (arts. 383 e 384 do CPP).

Art. 11. Se as condições estipuladas no acordo consistirem em obrigações que podem ser
cumpridas instantaneamente, não se mostra necessário o ajuizamento de ação de execução
perante a Vara de Execuções Criminais, competindo ao Juízo do conhecimento a homologação
do acordo e posterior declaração de extinção de punibilidade pelo cumprimento integral do
acordado.

Parágrafo único. Se as condições estipuladas no acordo consistirem em obrigações


continuadas, não instantâneas, a atribuição para promover a sua execução é do Promotor de
Justiça que atua na Vara de Execuções Criminais do local do domicílio do autor do fato.

Art. 12. Iniciada a execução do acordo de não persecução penal, nos termos do § 6° do art.
28-A do CPP, o membro do Ministério Público com atribuições perante o Juízo de Execução
Penal velará pela fiscalização de seu cumprimento, formulando requerimento de extinção ou
de rescisão do acordo, conforme comprovação do adimplemento ou do inadimplemento de suas
condições pelo compromissário.

Art. 13. Descumpridas quaisquer das condições voluntariamente ajustadas, o Ministério


Público requererá ao juiz a decretação da sua rescisão, possibilitando o oferecimento da
denúncia.

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Parágrafo único. O descumprimento do acordo de não persecução penal pelo investigado


também poderá ser utilizado pelo membro do Ministério Público como justificativa para o
eventual não oferecimento de suspensão condicional do processo.

Art. 14. Admite-se o acordo de não persecução penal em crime de ação penal de iniciativa
privada, a ser proposto /pelo ofendido ou seu representante legal, atuando o Ministério Público
como fiscal da ordem jurídica.

Art. 15. Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogando-se o art. 18 da
Resolução n. 1.364/2021-PGJ-CPJ.

São Paulo, 5 de maio de 2023.

MÁRIO LUIZ SARRUBBO


Procurador-Geral de Justiça

Publicado em: DOE, Poder Executivo – Seção I, São Paulo, 133 (88), Sábado, 06 de Maio de 2023 p.54.

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