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FURTO SIMPLES

Furto

Art. 155. Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

Pena- reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

O referido tipo penal tutela somente a propriedade, ou também a posse e a


detenção legítimas da coisa?

Ficamos com a maioria, para quem a tutela agasalha a propriedade, posse e


detenção legítímas de coisa móvel (DELMANTO e FRAGOSO).

Sujeitos do crime

Sujeito Ativo

Não se exigindo qualidade especial do agente (delito comum), qualquer pessoa


pode ser sujeito ativo do furto, salvo o proprietário.

Sendo assim, caso o proprietário subtraia coisa sua que se encontra na


legítima posse de terceiro, pratica qual infração penal?

Para a maioria, conforme o caso, haverá o delito de exercício arbitrário das


próprias razões (arts. 345 e 346, ambos do CP).

E se é um funcionário público que subtrai ou facilita para que seja subtraído


bem público ou particular que se encontra sob a guarda ou custódia da
Administração, valendo-se, para tanto, de alguma facilidade proporcionada
pelo cargo, responde por crime de furto?

Não, neste caso, o funcionário público pratica crime de peculato furto (art. 312,
§ 1º, do CP).

Sujeito Passivo

Sujeito passivo poderá ser qualquer pessoa, física ou jurídica, proprietária,


possuidora ou detentora da coisa assenhorada.

Conduta

A conduta punida no tipo em estudo é apoderar-se o agente, para si ou para


outrem, de coisa alheia móvel, tirando-a de quem a detém (diminui-se o
patrimônio da vítima).

Se um sujeito “A” treinar um animal, por exemplo, um macaco, para


subtrair aparelhos de telefone celular, poderá responder por crime de furto?

Sim. O apoderamento pode ser direto (apreensão manual) ou indireto


(valendo-se de interposta pessoa ou até animais).

Para a configuração do delito exige-se que o bem subtraído possua


apreciação econômica ou a subtração de bem com valor meramente
sentimental também o configura?
Da análise do tipo em estudo, fica claro que o objeto material do crime deve
ser coisa alheia móvel, economicamente apreciável. Esta é a posição
majoritária.

Contudo, existe corrente minoritária que entende que o interesse apenas moral ou
sentimental da coisa, desde que relevantes, segundo alguns, também configura o
crime, pois não deixa de integrar o patrimônio de alguém.

Partes do corpo humano podem ser objeto material do delito de furto? E um


cadáver, pode ser objeto material deste crime?

O ser humano, vivo, por não ser coisa, não pode ser objeto material de furto.

O cadáver, em regra, também não, salvo se pertence a alguém, destacado


para alguma finalidade específica, como, por exemplo, a uma faculdade de
medicina para estudos científicos.

Então, o que acontece se alguém remover clandestinamente tecidos, órgãos


ou partes do corpo de pessoa ou cadáver em desacordo com as disposições
legais?

Neste caso, poderá restar configurado o delito descrito no tipo do art. 14 da Lei
9.434/97 (Lei de Transplante de Órgãos).

Coisa de Ninguém x Coisa Abandonada x Coisa Perdida

Havendo que ser alheia, a coisa de ninguém (coisa que nunca teve dono) e a
coisa abandonada (que já pertenceu a alguém, mas foi dispensada) não podem
ser objeto material do delito de furto.
Tratando-se de coisa perdida (portanto, alheia) o crime será de apropriação
indébita de coisa achada (art. 169, parágrafo único, II, do CP).

Suponhamos que um indivíduo “A”, mineiro de Itabirito, vá à praia pela


primeira vez e resolva trazer, como recordação, um garrafão com água do
mar e uma caixa com a areia da praia. Neste caso, poderá “A” responder
pela prática do delito de furto?

Não. Coisas públicas de uso comum (que a todos pertencem), como, por
exemplo, o ar, a luz, a água do mar e dos rios, em princípio, não podem ser
objeto material de furto, a não ser que destacadas do local de origem e
tenham significado econômico para alguém (ex: areia da praia que serve ao
artista para criar suas obras).

A subtração de objetos deixados dentro de uma sepultura configura qual


crime?

Existe divergência doutrinária.

Para uns, haverá o delito do art. 210 ou art. 211, ambos do CP, inexistindo
furto, uma vez que os objetos materiais não pertencem a “alguém” (nesse
sentido: RT608/305).

Outros, com razão, ensinam que, se o intuito do agente não era o de violar
ou profanar sepultura, mas subtrair ouro existente na arcada dentária de
cadáver, o delito cometido é apenas o de furto, que absorve o art. 211 do CP
(RT598/313).

Voluntariedade
É o dolo, aqui chamado de animus furandi, consistente na vontade consciente de
apoderar-se definitivamente de coisa alheia, para si ou para outrem.

Se o sujeito subtrai um veículo, por exemplo, para utiliza-lo


momentaneamente e, em seguida, restituí-lo ao proprietário, haverá crime
de furto?

O agente deve ter a intenção de não devolver a coisa à vítima (animus rem sibi
habendi). Subtraindo coisa apenas para usá-la momentaneamente,
devolvendo-a, logo em seguida, haverá mero furto de uso, um indiferente
penal (caso de atipicidade por ausência do elemento subjetivo caracterizador do
delito - animus furandi).

São, em resumo, requisitos do furto de uso: a) intenção, desde o início, de uso


momentâneo da coisa subtraída; b) coisa não consumível; c) sua restituição
imediata e integral à vítima.

São exemplos: a empregada doméstica que se apossa de um vestido da


patroa na sexta-feira e o restitui no primeiro dia em que retorna ao trabalho
(no sábado ou na segunda-feira, dependendo do caso), ou do jardineiro de casa
de veraneio que pega a bicicleta que está guardada na casa do patrão para ir
embora e retorna com ela no dia seguinte.

O que é o furto famélico? Configura crime?

É aquele cometido por quem se encontra em estado de extrema penúria e,


não tendo outra forma de conseguir alimento para si ou para seus
familiares, subtrai pequena quantidade de mantimentos ou um animal (uma
galinha, por exemplo) para se alimentar.
O furto famélico não constitui crime em razão da excludente de ilicitude do
estado de necessidade, próprio ou de terceiro, pois a falta de alimentação
acarreta riscos à vida e à saúde. O furto famélico só pode ser reconhecido
quando o agente não tinha outros meios de conseguir o alimento naquele
instante.

Consumação e tentativa

Várias teorias procuram explicar o momento consumativo do furto.

Rogério Sanches leciona que adotou-se a teoria da amotio (ou apprehensio):


dá-se a consumação quando a coisa subtraída passa para o poder do agente,
mesmo que num curto espaço de tempo, independentemente de
deslocamento ou posse mansa e pacífica.

É possível concluir que foi adotada uma orientação que pode ser chamada de
teoria da inversão da posse para determinar o momento consumativo. Grosso
modo, essa corrente exige que a vítima perca a posse e o agente a obtenha.

Os tribunais superiores passaram a decidir que o furto se consuma no


momento em que cessa a clandestinidade por parte do agente, sendo
desnecessárias a posse mansa e pacífica e a retirada da esfera de vigilância
da vítima. Entende-se que cessa a clandestinidade quando o agente consegue
deslocar o bem do local onde se encontrava, ainda que seja ele imediatamente
perseguido e preso.

A coisa deve ser móvel. Na sua conceituação, o direito penal não se socorre do
direito civil, bastando que seja capaz de ser apreendida ou transportada de um
lugar para outro, sem perder sua identidade. Dentro desse espírito, apesar da
prescrição em sentido contrário do Código·Civil, para fins penais, são
considerados coisas móveis os navios, aeronaves e os materiais separados
provisoriamente de um prédio.
A tentativa é possível.

Nélson Hungria formula a seguinte hipótese, comum na prática: o indivíduo,


visando “surrupiar” dinheiro do bolso da calça de transeunte, se depara com a
algibeira vazia. Haverá, no caso, tentativa punível ou crime impossível (art. 17
do CP)?

Sobre o mesmo assunto, BITENCOURT distingue duas situações:

(1) se a vítima tem dinheiro acondicionado em outro bolso, o bem jurídico


(patrimônio) corre sério risco, há o perigo efetivo de dano;

(2) contudo, se a vítima não tem dinheiro algum no momento, não há


qualquer risco a seu patrimônio, em face da inexistência do bem.

A ação do agente, desde o princípio, estava destinada ao insucesso, pois não se


pode furtar o nada. Enfim, na primeira hipótese, a impropriedade do objeto é
relativa; na segunda, a impropriedade é absoluta, tratando-se de crime impossível
(art. 17 do CP).

Crime impossível ou tentativa em razão da existência de alarmes ou sistemas


similares que impedem a consumação

Não se pode falar em crime impossível por absoluta ineficácia do meio


quando o agente não consegue consumar o crime em razão de dispositivos
antifurto (alarmes sonoros, dispositivos que cortam a corrente elétrica ou o
combustível de veículos etc.). Entende-se que a ineficácia é relativa porque não
existe nenhum sistema de segurança infalível, sendo possível ao agente
desarmá-lo ou até mesmo levar o veículo de outra forma (guinchando-o ou
empurrando-o). Há, portanto, tentativa de furto nesses casos.
Crime impossível ou tentativa em casos de pessoa que tem sua conduta
vigiada

É absolutamente corriqueira a situação de pessoa que esconde sob sua blusa


mercadorias que retirou da prateleira de supermercado e é presa logo após
sair do estabelecimento, sem efetuar o devido pagamento, por funcionários que
a vigiavam pessoalmente ou por meio de câmeras de segurança. A doutrina é
praticamente unânime no sentido de que há crime de furto tentado. Na
jurisprudência é amplamente majoritário esse mesmo entendimento.

Majorante: repouso noturno (§ 1 °)

O § 1º do art. 155 aumenta a pena de um terço se o crime é praticado durante o


repouso noturno.

O que significa “repouso noturno”? E qual é o critério para a sua aferição?

De acordo com DAMÁSIO DE JESUS:

Repouso noturno é o período em que, à noite, pessoas se recolhem para


descansar.

Não há critério fixo para a conceituação dessa qualificadora. Depende do


caso concreto, a ser decidido pelo juiz. Assim, a qualificadora varia no espaço.
Ninguém dirá que foi praticado durante o período de repouso noturno furto
realizado às 21 horas no centro de São Paulo. Entretanto, ocorrerá essa
qualificadora numa fazenda do interior, uma vez que é comum nesses lugares o
recolhimento das pessoas, para o repouso, ainda bem cedo.
Se o furto for praticado durante o período de repouso noturno, porém em
casa desabitada, haverá a incidência da majorante?

Rogério Sanches entende que a incidência da majorante depende de o crime


ser praticado em local de moradia (não necessariamente imóvel, podendo, por
exemplo, ser um trailer), habitado e com seus moradores repousando (nesse
sentido: RT 714/393).

Porém, aduz que a maioria discorda (RT 688/325, 679/386 e 637/366).

Este último entendimento vem sendo adotado pelo Superior Tribunal de


Justiça em inúmeros julgados, dos quais podemos destacar: “Para o
reconhecimento da agravante do repouso noturno (parag. do art. 155, CP),
não tem qual quer importância o fato da casa, onde ocorreu o furto, estar
habitada e seu morador dormindo” (STJ — REsp 75.011/SP — Rel. Min.
Anselmo Santiago — DJ 03.11.1997, p. 56.379).

Esta majorante é aplicável às modalidades qualificadas do crime de furto,


ou somente ao furto simples?

De acordo com a orientação dos Tribunais Superiores, tinha aplicação


restrita ao furto simples, previsto no caput, podendo o juiz, em se tratando de
furto qualificado (§ 4°), considerar o período de cometimento (se durante o
repouso noturno) na análise das circunstâncias judiciais (art. 59 do CP).

Ressaltamos, no entanto, que o STJ decidiu ser possível a aplicação da


majorante também no furto qualificado, pois não há incompatibilidade entre
esta circunstância e aquelas que qualificam o delito, nem há prejuízo para a
dosimetria da pena, tendo em vista que o juiz parte da pena-base relativa à forma
qualificada e faz incidir o aumento de um terço na terceira fase de aplicação.
Furto Privilegiado

De acordo com o texto legal, é fácil notar que o reconhecimento do privilégio


pressupõe dois requisitos: primariedade e pequeno valor do bem.

• Primariedade

A condição de pessoa primária não é definida no Código Penal, que contém ape
nas definição de reincidência em seu art. 63. Assim, a contrario sensu, considera-
se primária toda e qualquer pessoa que não seja considerada reincidente pelo
juiz na sentença. O art. 155, § 2º, exige apenas primariedade, dispensando bons
antecedentes.

A condenação anterior por contravenção penal não retira a primariedade daquele


que, posteriormente, comete crime, não impossibilitando o privilégio.

• Pequeno valor da coisa subtraída

Em primeiro lugar, há de se dizer que foi adotado um critério objetivo no que diz
respeito ao conceito de coisa de pequeno valor, devendo ser assim considerada
aquela que não ultrapassa um salário mínimo. Não se deve, assim, comparar o
va lor do bem com o do patrimônio da vítima, na medida em que, se assim fosse,
o fur to cometido contra grandes empresas ou contra pessoas detentoras de
grande fortuna seria praticamente sempre privilegiado.

O valor do salário mínimo é aquele vigente à época do crime.

O privilégio pode ser aplicado às modalidades qualificadas do crime de


furto?
Segundo Rogério Sanches, o posicionamento tradicional do STF e do STJ
era no sentido de ser ele incompatível, vez que, além da gravidade do crime
qualificado, a posição topográfica do privilégio indica a intenção do legislador de
vê-lo aplicado somente ao furto simples e noturno (RT 608/446, 609/354 e
617/336). Há, contudo, clara modificação de orientação por parte dos
Tribunais Superiores, que passaram a admitir a combinação dos parágrafos,
desde que a qualificadora seja de ordem objetiva.

O STJ editou a súmula nº 511 neste exato sentido:

“É possível o reconhecimento do privilégio previsto no § 2° do


art. 155 do CP nos casos de crime de furto qualificado, se
estiverem presentes a primariedade do agente, o pequeno valor
da coisa e a qualificadora for de ordem objetiva”.

Cláusula de equiparação (§ 3º)

O furto consiste na subtração de coisa alheia móvel para si ou para outrem. O §


3º equipara à coisa móvel a energia elétrica e outras (genética, mecânica, térmica
e a radioatividade), desde que tenham valor econômico.

Como ajustar ao ordenamento penal a subtração de sinal de televisão a cabo


(servindo a mesma pergunta para a subtração de pulso telefônico)?

Há divergências.

A questão foi levada ao STF que, através da sua 2ª Turma, concedeu habeas
corpus para declarar a atipicidade da conduta de condenado pela prática do
crime descrito no art. 155, § 3°, do CP, por efetuar ligação clandestina de sinal de
TV a cabo. Reputou-se que o objeto do aludido crime não seria "energia" e
ressaltou-se a inadmissibilidade da analogia in malam partem em Direito Penal,
razão pela qual a conduta não poderia ser considerada penalmente típica.

Como distinguir o furto de energia elétrica do crime de estelionato?

Não podemos confundir furto de energia elétrica (art. 155, § 3º), praticado
mediante ligação clandestina, com o crime de estelionato (art. 171), hipótese
em que o agente emprega fraude, alterando o medidor de energia, para
acusar um resultado menor do que o consumido.

No segundo modus operandi, ao contrário do primeiro, o agente está autorizado,


por via de contrato, a gastar energia elétrica, porém acaba usando de artifício,
induzindo a vítima a erro, provocando resultado fictício, lhe advindo indevida
vantagem (nesse sentido: RT726/689).

Qualificadoras (§§ 4º e 5º)

O furto qualificado está previsto nos incisos I a IV do§ 4° e também no§ 5°.

Rompimento ou destruição de obstáculo

Essa qualificadora se mostra presente quando o agente arromba trincos,


fechaduras, portas ou janelas, ou, ainda, quando consegue arrombar um
cofre ou nele fazer um furo com um maçarico, ou, ainda, quando consegue
fazer um buraco na parede de uma loja para nela adentrar etc.

A qualificadora em análise pressupõe, necessariamente, que o obstáculo seja


danificado, no todo ou em parte, tanto que o art. 171 do Código de Processo
Penal expressamente exige perícia para constatar os vestígios deixados.
Rompimento x Destruição

Rompimento é a danificação parcial do obstáculo, como no arrombamento do


trinco de uma porta. Destruição é a danificação completa, como quebrar uma
porta de vidro, que fica toda estilhaçada no chão.

Configura-se a qualificadora quando a conduta atinge o próprio bem?


Como no caso em que o agente arromba a porta de um veículo, para furtá-
lo?

Não. É muito importante salientar que a doutrina e a jurisprudência só têm


aceitado a presente qualificadora quando a conduta atinge obstáculo que
impede a apreensão ou a remoção do bem, e nunca obstáculo que seja parte
integrante da própria coisa e que, por tal razão, seja juntamente com ele
subtraído. Assim, aplica-se a qualificadora quando o agente arromba um portão
para furtar o carro da garagem, mas não se aplica quando o agente arromba a
porta do próprio carro para levá-lo.

Sabendo que o rompimento de obstáculo, para qualificar o crime, há de ser


exterior à coisa subtraída, lembra a doutrina que se a violência for exercida
contra o próprio objeto visado não incide a qualificadora. Seguindo essa
lição, temos que o rompimento do quebra-vento constitui violência contra a
própria coisa objeto da subtração, não qualificando o furto (RT 80/264). Daí
surge a inevitável indagação: se destruir quebra-vento não qualifica o delito
quando a coisa visada é o próprio veículo, será que qualifica no caso de se
visar a subtração do seu toca-fitas?
Por questão de equidade há importante jurisprudência no sentido de que o
rompimento de quebra-ventos de veículo para a subtração de objetos existentes
no seu interior não caracteriza a qualificadora. É que, se a violação tivesse sido
feita para a subtração do próprio automóvel, simples seria o furto.

A Terceira Seção do STJ, finalmente, firmou entendimento de que incide a


qualificadora.

Aplica-se o princípio da insignificância quando o furto é qualificado pelo


rompimento de obstáculo?

O STF tem decisões nos dois sentidos, prevalecendo, porém, a inviabilidade


da incidência do referido postulado aos delitos contra o patrimônio
praticados mediante ruptura de barreira.

Abuso de confiança

Para configurar esta qualificadora exige-se um especial vínculo de lealdade ou


de fidelidade entre a vítima e o agente, sendo irrelevante, por si só, a simples
relação de emprego ou de hospitalidade (nesse sentido: RT571/391).

Se um indivíduo subtrair bens de seu cunhado, durante o período em que


este estiver trabalhando e, para tanto, arrombar a janela do imóvel e nele
ingressar, consumando o delito, incidirá a qualificadora do abuso de
confiança?

Não. Neste caso que, para a incidência da qualificadora, a doutrina entende


que a coisa deve ingressar na esfera de disponibilidade do agente em face da
facilidade decorrente da confiança nele depositada. Assim, se, não obstante a
relação de confiança, o agente pratica o furto de uma maneira que qualquer outra
pessoa poderia tê-lo cometido, não haverá esta qualificadora.

Emprego de Fraude

Fraude é qualquer artifício, engodo, ardil ou artimanha utilizados pelo agente


durante o contexto fático do delito a fim de viabilizar a subtração. Exemplo em
que duas pessoas entram em uma loja onde só existe um vendedor e,
enquanto um deles distrai a vítima com perguntas e pedidos de mercadorias,
o outro esconde objetos sob suas vestes.

Há casos em que a fraude visa possibilitar a aproximação do agente dos bens


que pretende furtar, como no caso em que ele desliga a rede de uma casa e, em
seguida, se passa por funcionário da empresa telefônica, inclusive com o
respectivo uniforme falso, consegue entrar na residência a pretexto de efetuar
o conserto, ou quando finge ser pessoa responsável pela manutenção em
máquinas de uma certa empresa para conseguir ter acesso ao local.

Ocorrem também situações em que a finalidade da fraude é afastar a vítima do


local onde estão seus bens, pois a sua presença inviabilizaria o furto. Ex.:
descobrir o nome e o local onde uma criança estuda e telefonar para a mãe,
passando-se pelo diretor da escola, e dizer que ela deve ir a determinado
hospital porque o filho se acidentou. Com isso, a mãe sai de casa e o ladrão
consegue efetuar o furto aproveitando-se da ausência de pessoas no local e do
tempo que tem para recolher os bens.

Furto bancário via internet

Existem, ainda, fraudes mais elaboradas, em que os bandidos criam site falso
imitando o do banco das vítimas e estas, pensando tratar-se do site
verdadeiro, digitam o número da conta corrente e da respectiva senha, com
as quais os ladrões, posteriormente, sacam dinheiro da conta ou efetuam
transferências bancárias sem, evidentemente, terem autorização para tanto.

Escalada

Escalada é a utilização de via anormal para adentrar no local do furto, como


pular um muro ou portão, entrar pelo telhado ou pela chaminé, pela sacada
de um prédio, de paraquedas dentro de um sítio etc.

A escavação de túnel, evidentemente, é forma anormal de ingresso ao local do


crime, configurando a qualificadora. A qualificadora só se justifica quando o
agente necessita fazer um esforço considerável para ter acesso ao local
pretendido ou quando faz uso de instrumentos auxiliares, como cordas ou
escadas.

Destreza

Destreza é a habilidade física ou manual do agente que lhe permite efetuar a


subtração de algum bem que a vítima traz consigo sem que ela perceba. É o
que ocorre com os chamados batedores de carteira (punguistas ou pick pockets),
que, normalmente, atuam em locais de grande movimento como ônibus, metrôs,
trens, ruas ou avenidas movimentadas, para, sorrateiramente, colocar a mão
dentro da bolsa de mulheres e furtar a carteira, o telefone celular etc.

O ato de cortar uma bolsa com uma lâmina e furtar a carteira da vítima sem que
ela perceba constitui a figura qualificada: “É qualificado o furto pela destreza
quando o agente, com especial habilidade, sem que a vítima o perceba, corta a
bolsa onde são carregados os valores que subtrai” (Tacrim-SP — Rel. Dante
Busana — Jutacrim 77/229).
Obs. 1: Afigura-se presente a qualificadora se a vítima não nota a subtração,
mas outra pessoa presente no local vê o que se passa e a avisa.

Obs. 2: Não se pode falar em destreza na subtração de sujeito passivo que está
dormindo, que se encontra embriagado ou em qualquer outro estado de
inconsciência.

Obs. 3: Haverá tentativa de furto simples se a vítima, por exemplo, perceber a


mão do agente no bolso de seu casaco.

Emprego de chave falsa

O conceito de chave falsa abrange:

a) A imitação da verdadeira feita clandestinamente, ou seja, sem o


conhecimento e autorização da vítima.

As cópias que não são clandestinas não podem ser tidas como chave falsa.
Dessa forma, se o empregado encontra a cópia da chave do carro do patrão
guardada em uma gaveta e usa essa chave reserva para subtrair o veículo, a
qualificadora não incide.

b) Qualquer instrumento, com ou sem formato de chave, capaz de abrir uma


fechadura (ou dispositivo análogo) sem arrombá-la. Abrange os instrumentos
que têm outra finalidade, mas que também podem abrir a fechadura dependendo
da habilidade do agente, como, clipe de papel, grampo de cabelo, chave de fenda,
e, principalmente, aqueles que os próprios ladrões confeccionam para servir
efetivamente como chave falsa e que são chamados de mixas ou gazuas.

Concurso de agentes
A qualificadora é cabível ainda que um dos envolvidos seja menor de idade
ou que apenas um dos envolvidos tenha sido identificado em razão da fuga
dos demais do local. Assim, para aplicar a qualificadora, não é necessário que o
juiz condene duas ou mais pessoas na sentença, exigindo-se, contudo, prova de
que havia outras pessoas envolvidas.

O que ocorre se uma esposa, magoada com seu marido, chamar uma amiga
para, juntas, subtraírem a importância de R$ 2000,00 (dois mil reais) que
estavam em sua carteira e, após, juntas gastarem no Shopping? Como será a
responsabilização de cada uma?

Aplica-se a qualificadora, ainda, em casos de incidência de escusa


absolutória em relação a um dos envolvidos. Assim, se o filho da vítima
pratica uma subtração juntamente com um amigo, este incorre na figura
qualificada, enquanto o filho é isento de pena, nos termos do art. 181, II, do
Código Penal.

Transporte de veículo para outro Estado ou país

Trata-se de qualificadora que, ao contrário das anteriores, não se refere ao


meio de execução do crime, e sim a um resultado posterior, qual seja, o
transporte do veículo automotor para outro Estado da Federação ou para outro
país.

Para a configuração da qualificadora, é necessário que exista, já no momento


da subtração, intenção de transportar o veículo para um dos locais que a lei
menciona; contudo, de acordo com o próprio texto legal, pode-se concluir que a
qualificadora só se aperfeiçoa se o agente efetivamente transpuser a divisa
com outro Estado ou a fronteira com outro país. É que o dispositivo diz que a
pena será maior se o veículo vier a ser transportado para outro Estado ou
para o exterior.

É possível a tentativa nesta modalidade qualificada de furto?

Nessa modalidade de furto, vislumbra-se o conatus apenas na hipótese do


agente que, previamente intencionado a transportar o veículo para outro
Estado ou país, apodera-se do bem, passa a ser perseguido de imediato até
que transponha a divisa, mas acaba sendo preso sem que tenha conseguido a
posse tranquila do bem.

Veja-se que, se o agente conseguir consumar a subtração, mas for detido


antes de chegar em outro Estado ou país, responderá por furto (simples ou
qualificado por alguma das hipóteses do§ 4°), mas não por tentativa de furto
qualificado pelo§ 5°, porque não se pode cogitar de tentativa em uma hipótese
em que a subtração se consumou.

A pessoa contratada apenas para o transporte, não tendo qualquer


participação no delito anterior (quer material, quer moral), responde pelo
crime de furto qualificado?

Não, neste caso, responderá somente por receptação ou favorecimento real, a


depender do caso.

Se o agente conseguir consumar a subtração, mas for detido antes de chegar


em outro Estado ou país, responderá por furto qualificado tentado?

Não. Neste caso, responderá por furto simples ou qualificado por alguma das
hipóteses do § 4º, mas não por tentativa de furto qualificado pelo § 5º, porque
não se pode cogitar de tentativa em uma hipótese em que a subtração se
consumou.

Vislumbra-se o conatus apenas na hipótese do agente que, previamente


intencionado a transportar o veículo para outro Estado ou país, apodera-se do
bem, passa a ser perseguido de imediato até que transponha a divisa, mas acaba
sendo preso sem que tenha conseguido a posse tranquila do bem.

O § 5º menciona “outro Estado”, mas não diz nada sobre o Distrito Federal.
O que concluir do silêncio?

Existe divergência doutrinária e jurisprudencial. O STJ, em situação


semelhante em que julgava crime de dano contra o patrimônio do Distrito
Federal, entendeu não incidir a qualificadora, visto que o texto legal não se refere
ao DF e, assim, não seria possível analogia in malam partem no Direito Penal.

Rogério Sanches discorda. O autor entende que o Distrito Federal está


implícito. Deve-se interpretar o dispositivo de acordo com o sentido pretendido
pelo legislador, sendo certo que não foi sua pretensão excluir a Capital da
República, já que tal entendimento poderia transformá-la em local de “desova”
de veículos subtraídos, ante a ausência de punição mais severa.

Ação penal

É pública incondicionada, observadas as exceções do art. 182 do CP.

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