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Curso de Direito Imobiliário

Prof. Rafael da Mota Mendonça


Curso de Direito Imobiliário

A TUTELA DA POSSE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

1. CONCEITO DE POSSUIDOR

Art. 1.196, CC. Considera-se possuidor todo aquele que tem de


fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à
propriedade.

OBS: Ius possessionis e Ius possidendi


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2. TEORIAS DA POSSE

2.1. Teoria Subjetiva (Savigny - 1803)


- Corpus: Elemento material da posse, correspondente ao vínculo
estabelecido entre pessoa e coisa. Este vínculo garante a
existência da possibilidade real e imediata da pessoa dispor
fisicamente da coisa, defendendo-a de possíveis agressões de
terceiros.

- Animus domini.
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2.2. Teoria Objetiva (Ihering - 1868)

- Corpus: Relação exterior que há entre o proprietário e a coisa,


ou a aparência da propriedade, sem necessidade de que haja o
poder físico sobre a mesma, bastando que o bem esteja
cumprindo com sua destinação econômica, sendo irrelevante o
contato físico (o animus está implícito no corpus).

- Affectio tenendi.
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OBS: Principais posições defendidas por Ihering:

(i) A posse é a condição de fato da utilização econômica da


propriedade.
(ii) O direito de possuir é um elemento indispensável da
propriedade, pois este que garante a sua utilização econômica.
(iii) A posse atua como uma proteção avançada da propriedade.
Posição defensiva do proprietário, que lhe permite repelir
ataques a sua esfera jurídica.
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3. NATUREZA JURÍDICA DA POSSE

1ª corrente (Bernhard Windscheid e Ebert Chamoun): Posse é


fato.

2ª corrente (Savigny): Posse tem dupla natureza, é fato e direito.


É um fato, em sua origem, mas por seus efeitos, se assemelha a
um direito (se aproxima do art. 1196 do CC). É um Direito
Pessoal, na perspectiva de proteção da pessoa do possuidor (não
é a mesma perspectiva do direito obrigacional).
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3ª corrente (Ihering – orientação dominante no Brasil: Orlando


Gomes e doutrina contemporânea): Posse é um direito. É um
interesse juridicamente tutelado por meio dos interditos
possessórios. É um Direito Real – Razões:

(i) A posse é exercida sem intermediários, em que o seu titular


pode opor esse direito em face de toda a coletividade.
(ii) Taxatividade: Os direitos reais devem estar previstos em lei. O
fato de a posse não estar no rol do art. 1225 do CC, não impede
sua natureza de direito real.
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OBS1: A Lei 6015/73 e o registro da posse: Não há previsão legal para


o registro da posse. Essa é a principal crítica de quem não defende a
posse como Direito Real. A origem fática afasta da posse alguns
atributos de Direito Real.

OBS2: Posse e Direito Civil-Constitucional: Defende a superação dessa


discussão (direito real ou pessoal). Afirmação de que a posse tem
uma posição autônoma e sui generis. A análise funcional da posse lhe
outorga legitimidade como direito patrimonial merecedor de tutela,
uma vez que contribui na promoção de interesses existenciais e
sociais constitucionalmente protegidos.
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4. DETENÇÃO
4.1. Detenção nas Teorias Subjetiva e Objetiva da posse
4.2. Detenção no Código Civil (Art. 1198 e 1208, 1ª parte do CC)
Art. 1.198, CC. Considera-se detentor aquele que, achando-se em
relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome
deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas.

Art. 1.208, CC. Não induzem posse os atos de mera permissão ou


tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos
violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a
clandestinidade.
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OBS1: Transformação da Detenção em Posse (artigo 1198, p.


único do CC)

Art. 1.198, CC. Considera-se detentor aquele que, achando-se em


relação de dependência para com outro, conserva a posse em
nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas.
Parágrafo único. Aquele que começou a comportar-se do modo
como prescreve este artigo, em relação ao bem e à outra pessoa,
presume-se detentor, até que prove o contrário.
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Enunciado 301, CJF – Art.1.198. c/c art.1.204. É possível a


conversão da detenção em posse, desde que rompida a
subordinação, na hipótese de exercício em nome próprio dos
atos possessórios.

Art. 1.204, CC. Adquire-se a posse desde o momento em que se


torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos
poderes inerentes à propriedade.
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OBS2: Detentor que é demandado em razão de direito que o


demandante tem em face do possuidor

- CPC/73: Intervenção de Terceiro Cabível - Nomeação à Autoria


(art. 62 do CPC/73 - revogado pelo CPC/2015).

- CPC/2015: Art. 338


Art. 338, CPC/2015 - Alegando o réu, na contestação, ser parte
ilegítima ou não ser o responsável pelo prejuízo invocado, o juiz
facultará ao autor, em 15 (quinze) dias, a alteração da petição
inicial para substituição do réu.
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Parágrafo único. Realizada a substituição, o autor reembolsará as


despesas e pagará os honorários ao procurador do réu excluído,
que serão fixados entre três e cinco por cento do valor da causa
ou, sendo este irrisório, nos termos do art. 85, § 8o.
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OBS3: Efeito jurídico da posse estendido à Detenção (Art. 1210,


p. 1º do CC)

Art. 1.210, CC. O possuidor tem direito a ser mantido na posse


em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de
violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.
§ 1º O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou
restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os
atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do
indispensável à manutenção, ou restituição da posse.
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Enunciado 495, CJF - No desforço possessório, a expressão


“contanto que o faça logo” deve ser entendida restritivamente,
apenas como a reação imediata ao fato do esbulho ou da
turbação, cabendo ao possuidor recorrer à via jurisdicional nas
demais hipóteses.
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5. CLASSIFICAÇÃO DA POSSE

5.1. Posse exclusiva e composse

Art. 1.199, CC. Se duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa,


poderá cada uma exercer sobre ela atos possessórios, contanto
que não excluam os dos outros compossuidores.
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5.2. Posse direta e indireta

Art. 1.197, CC. A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu
poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal, ou real,
não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o
possuidor direto defender a sua posse contra o indireto.

Enunciado 76, CJF – Art. 1.197: O possuidor direto tem direito de


defender a sua posse contra o indireto, e este, contra aquele (art.
1.197, in fine, do novo Código Civil).
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OBS: Possuidor direto que é demandado em razão de direito que


o demandante tem em face do possuidor indireto:

- CPC/73: Denunciação da lide (art. 70, II do CPC/73 - revogado


pelo CPC/2015).

- CPC/2015: Art. 338 – Ilegitimidade passiva em preliminar de


contestação.
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5.3. Posse justa e injusta

Art. 1.200, CC. É justa a posse que não for violenta, clandestina
ou precária.

Art. 1.208, CC. Não induzem posse os atos de mera permissão ou


tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos
violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou
a clandestinidade.
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OBS1: Formas de sanar a posse violente e clandestina: Expressa e


tácita.

OBS2: Posse injusta nos contratos de Arrendamento Mercantil –


STJ:

Processo: REsp 1.528.626-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Rel.


Acd. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, por maioria, julgado em
17/12/2019, DJe 16/03/2020
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Tema: Bem móvel. Contrato de arrendamento mercantil firmado


por terceiro. Dívida prescrita. Usucapião. Possibilidade.
Destaque: A existência de contrato de arrendamento mercantil
do bem móvel impede a aquisição de sua propriedade pela
usucapião, contudo, verificada a prescrição da dívida, inexiste
óbice legal para prescrição aquisitiva. Informações do inteiro
teor: A princípio, a existência de contrato de arrendamento
mercantil do bem móvel impede a aquisição de sua propriedade
pela usucapião, em vista da precariedade da posse exercida pelo
devedor arrendatário.
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No caso, apesar do contrato de arrendamento, que tornava


possível o manejo da ação para a cobrança das prestações em
atraso e ensejava, concomitantemente, a reintegração de posse,
permaneceu inerte o credor arrendante. Após o transcurso do
prazo de cinco anos, no qual se verificou a prescrição do direito
do credor arrendante, a autora da ação de usucapião
permaneceu com a posse do veículo, que adquirira do devedor
arrendatário, por mais de cinco anos, fato que ensejou a
ocorrência da prescrição aquisitiva.
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Destaca-se que a usucapião, nesses casos, independe de justo


título ou de boa-fé, nos termos do art. 1.261 do Código Civil.
Logo, os vícios que inicialmente maculavam a posse, após o
decurso de cinco anos, qualificados pela inação do titular do
direito de propriedade, entidade arrendante, desapareceram.
Assim, a lei torna irrelevantes aqueles vícios inicialmente
ocorrentes e passa a proteger a posse e legitimar a propositura
da ação de usucapião do bem móvel.
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5.4. Posse de boa-fé e má-fé

Art. 1.201, CC. É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício,


ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa.
Parágrafo único. O possuidor com justo título tem por si a
presunção de boa-fé, salvo prova em contrário, ou quando a lei
expressamente não admite esta presunção.
Enunciado 309, CJF - Art. 1.228: O conceito de posse de boa-fé de
que trata o art. 1.201 do Código Civil não se aplica ao instituto
previsto no § 4º do art. 1.228.
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OBS1: Justo Título


Enunciado 302, CJF - Arts. 1.200 e 1.214: Pode ser considerado
justo título para a posse de boa-fé o ato jurídico capaz de
transmitir a posse ad usucapionem, observado o disposto no art.
113 do Código Civil.
Enunciado 303, CJF - Art. 1.201: Considera-se justo título, para a
presunção relativa da boa- -fé do possuidor, o justo motivo que
lhe autoriza a aquisição derivada da posse, esteja ou não
materializado em instrumento público ou particular.
Compreensão na perspectiva da função social da posse.
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OBS2: Vantagens do possuidor de boa – fé (efeitos da posse)

(i) Direito aos frutos

Art. 1.214, CC. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela


durar, aos frutos percebidos.
Parágrafo único. Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a
boa-fé devem ser restituídos, depois de deduzidas as despesas da
produção e custeio; devem ser também restituídos os frutos
colhidos com antecipação.
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Art. 1.216, CC. O possuidor de má-fé responde por todos os


frutos colhidos e percebidos, bem como pelos que, por culpa sua,
deixou de perceber, desde o momento em que se constituiu de
má-fé; tem direito às despesas da produção e custeio.
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(ii) Perda ou deterioração da coisa

Art. 1.217, CC. O possuidor de boa-fé não responde pela perda ou


deterioração da coisa, a que não der causa.

Art. 1.218, CC. O possuidor de má-fé responde pela perda, ou


deterioração da coisa, ainda que acidentais, salvo se provar que
de igual modo se teriam dado, estando ela na posse do
reivindicante.
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(iii) Benfeitorias

Art. 1.219, CC. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização


das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às
voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o
puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de
retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.
Art. 1.220, CC. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente
as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção
pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.
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Art. 1.221, CC. As benfeitorias compensam-se com os danos, e só


obrigam ao ressarcimento se ao tempo da evicção ainda
existirem.

Art. 1.222, CC. O reivindicante, obrigado a indenizar as


benfeitorias ao possuidor de má-fé, tem o direito de optar entre
o seu valor atual e o seu custo; ao possuidor de boa-fé indenizará
pelo valor atual.
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OBS3: Benfeitorias e locatário de boa-fé:

Art. 35, L. 8245/91. Salvo expressa disposição contratual em


contrário, as benfeitorias necessárias introduzidas pelo locatário,
ainda que não autorizadas pelo locador, bem como as úteis,
desde que autorizadas, serão indenizáveis e permitem o exercício
do direito de retenção.
Art. 36, L. 8245/91. As benfeitorias voluptuárias não serão
indenizáveis, podendo ser levantadas pelo locatário, finda a
locação, desde que sua retirada não afete a estrutura e a
substância do imóvel.
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5.5. Posse de força nova e força velha

5.6. Posse ad interdicta e posse ad usucapionem

6. INTERVERSÃO DA POSSE

Art. 1.203, CC. Salvo prova em contrário, entende-se manter a


posse o mesmo caráter com que foi adquirida.
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Enunciado 237, CJF - Art. 1.203: É cabível a modificação do título


da posse – interversio possessionis – na hipótese em que o até
então possuidor direto demonstrar ato exterior e inequívoco de
oposição ao antigo possuidor indireto, tendo por efeito a
caracterização do animus domini.

- É uma alteração na causa possessionis. Fica caracterizada por


algum fato ostensivo, relevante e duradouro que evidencia a
independência econômica no desfrute da coisa.
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- Requisitos para a alteração da causa possessionis:

(i) Justo título para a posse: Motivo jurídico pelo qual o possuidor
começou a deter a coisa como própria.
(ii) A ostensividade na contradita direta ao direito do proprietário
por atos formais e positivos.
(iii) A impossibilidade da alegação de desconhecimento dos atos
de contradita por parte do proprietário.
(iv) Decurso de tempo sem qualquer oposição do proprietário.
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7. FORMAS DE AQUISIÇÃO DA POSSE

Art. 1.204, CC. Adquire-se a posse desde o momento em que se


torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos
poderes inerentes à propriedade.

Art. 1.205, CC. A posse pode ser adquirida:


I - pela própria pessoa que a pretende ou por seu representante;
II - por terceiro sem mandato, dependendo de ratificação.
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Art. 1.206, CC. A posse transmite-se aos herdeiros ou legatários


do possuidor com os mesmos caracteres.

Art. 1.207, CC. O sucessor universal continua de direito a posse


do seu antecessor; e ao sucessor singular é facultado unir sua
posse à do antecessor, para os efeitos legais.

Enunciado 494, CJF - A faculdade conferida ao sucessor singular


de somar ou não o tempo da posse de seu antecessor não
significa que, ao optar por nova contagem, estará livre do vício
objetivo que maculava a posse anterior.
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OBS1: Sucessão da posse e usucapião

Art. 1.243, CC. O possuidor pode, para o fim de contar o tempo


exigido pelos artigos antecedentes, acrescentar à sua posse a dos
seus antecessores (art. 1.207), contanto que todas sejam
contínuas, pacíficas e, nos casos do art. 1.242, com justo título e
de boa-fé.
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Enunciado 317, CJF - Art. 1.243: A accessio possessionis de que


trata o art. 1.243, primeira parte, do Código Civil não encontra
aplicabilidade relativamente aos arts. 1.239 e 1.240 do mesmo
diploma legal, em face da normatividade da usucapião
constitucional urbano e rural, arts. 183 e 191, respectivamente.
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OBS2: Traditio brevi manus

OBS3: Constituto possessório

Enunciado 77, CJF - Art. 1.205: A posse das coisas móveis e


imóveis também pode ser transmitida pelo constituto
possessório
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8. PERDA DA POSSE

Art. 1.223, CC. Perde-se a posse quando cessa, embora contra a


vontade do possuidor, o poder sobre o bem, ao qual se refere o
art. 1.196.

Art. 1.224, CC. Só se considera perdida a posse para quem não


presenciou o esbulho, quando, tendo notícia dele, se abstém de
retornar a coisa, ou, tentando recuperá-la, é violentamente
repelido.
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9. A POSSE DOS BENS PÚBLICOS

Súmula 619, STJ - A ocupação indevida de bem público configura


mera detenção, de natureza precária, insuscetível de retenção ou
indenização por acessões e benfeitorias.
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10. FUNÇÃO SOCIAL DA POSSE

10.1. A função social no contexto da CRFB/88 e do CC/02.

10.2. Pressupostos da função social da posse

(i) Necessidade de releitura das justificativas para a tutela da


posse.
- Teoria clássica (Savigny e Ihering): Superação desses
argumentos.
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- Teoria contemporânea1: Ressignificação da posse de acordo com


os valores sociais que estão nela impregnados, como um poder
fático de ingerência socioeconômica sobre determinado bem da
vida, mediante a utilização concreta da coisa. A posse como
instrumento de promoção dos atributos do ser humano.

(ii) Formas de ingresso da posse no ordenamento jurídico


(configuração tridimensional da posse): Posse Real; Posse
Obrigacional; Posse Fática ou natural (Poder fático sobre a coisa,
independentemente de qualquer relação jurídica real ou
obrigacional).
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1)Doutrina contemporânea que percebe a posse como uma forma de promoção dos atributos essenciais do ser humano: Antônio
Hernandez Gil: “situa a posse como o direito que mais se aproxima da realidade social, pois o uso e o trabalho sobre a coisa servem
às necessidades humanas básicas, justificando o poder geral de abstenção perante a situação do possuidor e a garantia do desfrute
de bens essenciais”. Ana Rita de Albuquerque: “Torna-se evidente que o instituto da posse não pode deixar de receber esse influxo
constitucional, adequando as suas regras à ordem constitucional vigente como forma de cumprir a sua função de instituto jurídico,
fruto do fato social em si, verdadeira emanação da personalidade humana comprometido com o princípio da dignidade humana”.
Luís Edson Fachin: “o fundamento da função social da propriedade é eliminar da propriedade privada o que há de eliminável. O
fundamento da função social da posse revela o imprescindível, uma expressão natural da necessidade”.
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(iii) Autonomia da posse frente a propriedade.

Enunciado 492, CJF - A posse constitui direito autônomo em


relação à propriedade e deve expressar o aproveitamento dos
bens para o alcance de interesses existenciais, econômicos e
sociais merecedores de tutela.
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(iv) Análise da situação jurídica possessória a partir do caso


concreto – Individualização do sujeito possuidor (Laura Beck
Varela):

- 1º reflexo: Nova percepção da pluralidade de sujeitos


possuidores, que se diferencia da noção abstrata e monolítica de
possuidor do artigo 1.196 do CC (possuidores urbanos, rurais, de
bens móveis, imóveis, corpóreos, incorpóreos, bens de consumo,
de produção).
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- 2º reflexo: Resolução dos conflitos possessórios de acordo com


a diversidade dos padrões valorativos de cada caso, tendo-se
como vetor de ponderação a valorização dos efeitos da posse,
com ampla autonomia ao direito de propriedade.

- 3º reflexo: Possuidor deixa de ser sujeito passivo universal em


relação ao proprietário e adquire individualidade e busca acesso
aos bens que assegurem o mínimo essencial.
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11. INSTRUMENTOS DE REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA QUE


CONSAGRAM A POSSE NO CUMPRIMENTO DE SUA FUNÇÃO SOCIAL

11.1. Concessão de Direito Real de Uso – CDRU

- Legislação:
. Artigos 7° e 8° do DL 271/67.
. Artigo 48 da Lei 10257/2001 (Estatuto da Cidade).
. Artigo 1225, XII do CC (Inserido pela Lei 11.481/2007).
. Artigo 1473, IX do CC (Inserido pela Lei 11.481/2007).
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- Natureza da área ocupada:


. Artigo 7°, caput, DL 271/67: Área pública ou particular.

- Natureza do instituto:
. Direito real resolúvel em coisa alheia.

- Forma de instituição:
. Artigo 7°, p. único, DL 271/67: Instrumento público ou
particular, ou por simples termo administrativo.
. Natureza contratual.
. Gratuito ou oneroso.
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- Extensão e finalidades do direito:

. Exploração da superfície, do subsolo e do especo aéreo (artigo


8° do DL271/67).

. Finalidade ampla. Uso social e específico: Art. 7° do DL 271/67:


regularização fundiária de interesse social, urbanização,
industrialização, edificação, cultivo da terra, aproveitamento
sustentável das várzeas, preservação das comunidades
tradicionais e seus meios de subsistência ou outras modalidades
de interesse social em áreas urbanas.
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- Transferência:

. Artigo 7°, p. 4°, DL 271/67: Salvo disposição em contrário a


CDRU transfere-se por ato entre vivos ou por sucessão legítima
ou testamentária.
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11.2. Concessão de Uso Especial para Fins de Moradia - CUEM

- Legislação:
. Artigos 15/20 do Estatuto da Cidade (Veto).
. MP 2220 de 04 de setembro de 2001.
. Artigo 1225, XI do CC (Inserido pela Lei 11.481/2007).
. Artigo 1473, VIII do CC (Inserido pela Lei 11.481/2007).
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- Natureza da área ocupada:


. Somente pública.

- Natureza do instituto:
. Direito real resolúvel em coisa alheia.
. Ato administrativo vinculado.
. Pode ser Individual ou Coletiva.
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- Requisitos (CUEM individual):


Art. 1o, MP 2220/2001: Aquele que, até 22 de dezembro de 2016,
possuiu como seu, por cinco anos, ininterruptamente e sem
oposição, até duzentos e cinquenta metros quadrados de imóvel
público situado em área com características e finalidade urbanas,
e que o utilize para sua moradia ou de sua família, tem o direito à
concessão de uso especial para fins de moradia em relação ao
bem objeto da posse, desde que não seja proprietário ou
concessionário, a qualquer título, de outro imóvel urbano ou
rural. (Redação dada pela lei nº 13.465, de 2017)
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- Requisitos (CUEM Coletiva):


Art. 2o, MP 2220/2001: Nos imóveis de que trata o art. 1o, com mais
de duzentos e cinquenta metros quadrados, ocupados até 22 de
dezembro de 2016, por população de baixa renda para sua moradia,
por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, cuja área total
dividida pelo número de possuidores seja inferior a duzentos e
cinquenta metros quadrados por possuidor, a concessão de uso
especial para fins de moradia será conferida de forma coletiva, desde
que os possuidores não sejam proprietários ou concessionários, a
qualquer título, de outro imóvel urbano ou rural. (Redação dada
pela lei nº 13.465, de 2017)
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- Forma de instituição (Art. 6° da MP 2220/2001):


. Requerimento administrativo.
. Requerimento judicial.

- Extensão e finalidades do direito:


. Natureza social. Finalidade precípua de moradia.
. Excepcionalmente é admitida a CUEM para fins comerciais
(Artigo 9° da MP).
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- Concessão em local diverso da ocupação originária:

Art. 4o, MP 2220/2001. No caso de a ocupação acarretar risco à


vida ou à saúde dos ocupantes, o Poder Público garantirá ao
possuidor o exercício do direito de que tratam os art. 1o e 2o em
outro local.
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Art. 5o, MP 2220/2001. É facultado ao Poder Público assegurar o


exercício do direito de que tratam os arts. 1o e 2o em outro local
na hipótese de ocupação de imóvel:

I - de uso comum do povo;


II - destinado a projeto de urbanização;
III - de interesse da defesa nacional, da preservação ambiental e
da proteção dos ecossistemas naturais;
IV - reservado à construção de represas e obras congêneres; ou
V - situado em via de comunicação.
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- Transferência (Art. 7°, MP 2220/2001):

. O direito de concessão de uso especial para fins de moradia é


transferível por ato inter vivos ou causa mortis.
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Prof. Rafael da Mota Mendonça

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