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DIREITO IMOBILIÁRIO

Módulo: Posse e imobiliário processual.

TEMA 04 – Posse; aquisição e efeitos.

1. INTRODUÇÃO

O Código Civil brasileiro enumera os modos de aquisição da posse, que gera


muitas críticas dos doutrinadores.
Orlando Gomes ensina que
Não poucos condenam esse modo de proceder. Argui-se que se não
compadece com a orientação que adotou no tratamento da posse. Se
possuidor é todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de
algum dos poderes inerentes ao domínio, ou propriedade, quem quer
que se encontre numa dessas situações terá adquirido a posse. 1

Assim, discriminar modos pelos quais se adquire é inútil; mas de qualquer


forma a legislação traz os modos de aquisição da posse enumerados.

2. AQUISIÇÃO DA POSSE

Quanto a aquisição da posse, o Artigo 1.204 Código Civil preconiza:

Art. 1.204. Adquire-se a posse desde o momento em que se torna


possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes
inerentes à propriedade.

Portanto, a legislação determina o momento da aquisição da posse, e


enumera os modos de aquisição no Artigo 1.205 do Código Civil.
Assim temos os seguintes modos de aquisição:

1 GOMES, Orlando. Direitos Reais. 21a ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2012. Pág.
94.

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a) Modo Originário: quando não há consentimento de possuidor
precedente. Estão previstos no Artigo 493 do Código Civil e são: a apreensão e o
exercício do direito.
A apreensão, que é forma de disposição física da coisa, recai em objetos
materiais; já a posse de um direito adquire-se pelo seu exercício.
O Artigo 1.204 do Código Civil adota uma regra geral sobre a aquisição da
posse, referindo-se ao possível exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes
inerentes à propriedade.

b) Modo Derivado: quando se adquire-se com consentimento de


precedente possuidor; assim a posse é transferida. A tradição é o modo derivado de
aquisição da posse, e existem três modalidades: efetiva ou material; simbólica ou ficta;
consensual.
A efetiva é a tradição que se consuma com a entrega real da coisa, como
ocorre quando o vendedor passa ao comprador, ato contínuo, a coisa vendida; já na
tradição ficta, a entrega material da coisa é substituída por atitudes, gestos, ou mesmo
atos, indicativos do propósito de transmitir a posse, como acontece com a entrega das
chaves na aquisição de uma casa. Por fim, a tradição simbólica que pode acontecer
numa variação do animus; ou seja, quem possui em nome alheio passa a possuir em
nome próprio, ou quem possui em nome próprio passa a possuir em nome alheio.

3. QUEM PODE ADQUIRIR A POSSE

O Artigo 1.205 do Código Civil preconiza quem pode adquirir a posse nos
seguintes termos:

Art. 1.205. A posse pode ser adquirida:

I - pela própria pessoa que a pretende ou por seu representante;


II - por terceiro sem mandato, dependendo de ratificação.

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Portanto, temos as seguintes pessoas que podem adquirir a posse: própria
pessoa que a pretende, representante ou procurador, e terceiro sem procuração.
Na aquisição pessoal, ou seja, aquela adquirida pela própria pessoa que a
pretende, ela deve ser capaz. As pessoas absolutamente incapazes não podem
adquirir a posse sozinhas, dependem do intermédio dos seus representantes legais.
Já a aquisição por outrem, é aquela que se dá por meio de representante,
mandatário ou terceiro sem procuração. Aqui é preciso que o representante tenha o
animus de adquirir a posse da coisa, ou do direito, para o representado, e que este
tenha a intenção de possuir o que o outro detém.
E na representação legal e na procuração geral, é implícita a vontade do
representado.
Por fim, a posse pode ser adquirida por terceiro, que não seja representante;
contudo a aquisição fica na dependência da ratificação daquele em cujo interesse foi
praticado o ato; sendo imprescindível que ela aconteça.
A ratificação retroagirá ao dia do ato praticado pelo terceiro, e produz os
efeitos do mandato.

4. TRANSMISSÃO DA POSSE

A posse pode ser transmitida de duas formas:

a) A título universal: é a que ocorre na sucessão universa, ou seja, com a


morte do titular da propriedade. Nesse caso, os sucessores continuam no direito a
posse do seu antecessor; conforme dispõe o Artigo 1.206 do Código Civil.
b) A título singular: é a que ocorre através de um negócio jurídico, portanto
um ato inter vivos. Aqui há a faculdade do novo proprietário unir sua posse ao do seu
antecessor; conforme se verifica na segunda parte do Artigo 1.207 do Código Civil.
Assim, a transmissão dependerá da forma que a posso foi transferida, ou seja,
atos inter vivos ou causa mortis.

5. EFEITOS DA POSSE

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Baseando-se nos Artigos 1.210 a 1.222 e 1.238 e seguintes do Código Civil,
temos os seguintes efeitos evidentes da posse:

a) Proteção possessória, abrangendo a autodefesa e o direito de uso dos


interditos;
b) Percepção dos frutos;
c) Responsabilidade pela perda ou deterioração da coisa;
d) Indenização pelas benfeitorias e o direito de retenção;
e) Usucapião;
f) Inversão do ônus da prova para quem contesta a posse;
g) Presunção da titularidade dos direitos da propriedade.

Alguns desses efeitos se produzem em todas as espécies de posse. Outros


são próprios da posse de boa-fé.

5.1. DO DIREITO AO USO DOS INTERDITOS

Ensina Carlos Roberto Gonçalves

A proteção conferida ao possuidor é o principal efeito da posse. Dá-se


de dois modos: pela legítima defesa e pelo desforço imediato
(autotutela, autodefesa ou defesa direta), em que o possuidor pode
manter ou restabelecer a situação de fato pelos seus próprios
recursos; e pelas ações possessórias, criadas especificamente para a
defesa da posse (heterotutela). 2

Assim, os possuidores têm várias formas de proteção da sua posse, que pode
ser, inclusive, feita por ele mesmo; além das ações possíveis.
As ações tipicamente possessórias são também denominadas interditos
possessórios, por constituírem formas evoluídas dos antigos interditos do direito
romano, que representavam verdadeiras ordens do magistrado. E são: a manutenção
da posse, a reintegração da posse e interdito proibitório.

2 Gonçalves, Carlos Roberto, Direito Brasileiro 5, Direito das Coisas, 14ª Ed., Saraiva Jur,
Pág. 121.

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O Artigo 1210, § 1º, do Código Civil preconiza:

Art. 1.210. (...)

§ 1o O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou


restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de
defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à
manutenção, ou restituição da posse.

Assim, quando o possuidor se acha presente e é turbado no exercício de sua


posse, pode reagir, fazendo uso da defesa direta, e portanto agindo em legítima
defesa; assemelhando-se a excludente prevista no Código Penal.
Mas se for hipótese de esbulho, e assim ocorrendo a perda da posse, o
possuidor poderá fazer uso do desforço imediato.
Contudo, isso só será autorizado se o possuidor o fizer desde logo, ou seja,
desde que tenha ciência do ocorrido; e também não podem exceder ao indispensável
à manutenção, ou restituição da posse.
A expressão “por sua própria força” significa sem apelar para a autoridade
policial ou para a justiça; e não se confunde com o desforço imediato; que é o
praticado diante do atentado já consumado, mas ainda no calor dos acontecimentos.
Quando a lei preconiza que possuidor tem de agir com suas próprias forças,
não significa que ele não possa ser auxiliado por amigos e empregados, permitindo-
se ainda, se necessário, o emprego de armas.
Havendo dúvida, é aconselhável o ajuizamento da ação possessória
pertinente, pois haverá o risco de se configurar o crime de exercício arbitrário das
próprias razões, previsto no art. 345 do Código Penal.
Havendo passado o momento da autotutela, ou havendo dúvida, é possível a
heterotutela; ou seja, o ingresso das ações possessórias.
Assim, é possível que o possuidor ingresse com a proteção possessória e,
cumulativamente, pleiteie a condenação do réu nas perdas e danos, nos termos do
Artigo 555, I do Código de Processo Civil.
Mas se ocorreu o perecimento ou a deterioração considerável da coisa, só
resta ao possuidor o caminho da indenização; uma vez que destituído de efeitos

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práticos a condenação na devolução de uma coisa inexistente ou sem interesse para
o possuidor.
Nesse caso, o juiz é obrigado a tomar em consideração o fato novo, conforme
preconiza o Artigo 493 do Código de Processo Civil.
O Superior Tribunal de Justiça, em respeito aos princípios da celeridade e
economia processuais, admite a conversão da ação possessória em indenizatória,
inclusive de ofício, para assegurar ao particular a obtenção de resultado prático
correspondente à restituição do bem; entendendo que a mudança não configurou
julgamento ultra petita ou extra petita, ainda que não tenha ocorrido pedido explícito
nesse sentido.

5.2. DA PERCEPÇÃO DOS FRUTOS

Os frutos da coisa não têm existência independente, dependem da coisa


principal, cuja sorte seguem; são compostos pelos frutos, produtos e rendimentos
(vide anexo 01).
Quanto a sua origem os frutos estão divididos em:
a) Naturais: são as produções espontâneas da natureza. São frutos naturais
os produtos agrícolas, as partes dos animais e, segundo alguns, os produtos das
minas.
b) Industriais: produzem-se em virtude da intervenção do homem.
c) Civis: são os rendimentos, como os juros, dividendos, aluguéis e rendas em
geral.
E quanto ao seu estado, os frutos, ainda serão divididos em:
a) Pendentes: são pendentes os frutos não separados da coisa principal.
b) Percipiendos: os que podiam ter sido colhidos e não foram.
c) Percebidos ou Colhidos: os que foram colhidos.
O direito aos frutos relaciona-se a boa-fé ou má-fé do possuidor, sendo que a
lei presume que desde a contestação da lide tenha cessado a boa-fé do possuidor
(vide anexo 02). Pertencerão, portanto, ao possuidor os frutos naturais e industriais
separados até o dia em que oferece sua contestação ao reivindicante que tenha êxito
na demanda, bem como os rendimentos que a coisa produzir até esse exato momento,

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e daí por diante seu direito limita-se ao reembolso das despesas de produção e
custeio.
Assim, o possuidor de boa-fé tem direito aos frutos percebidos e às despesas
da produção e custeio dos frutos pendentes e colhidos, mas não tem direito aos frutos
pendentes, aos frutos antecipadamente colhidos e aos produtos.
Já o possuidor de má-fé apenas tem direito às despesas de produção e
custeio dos frutos colhidos e percebidos, mas não tem direito a quaisquer frutos.

5.3. INDENIZAÇÃO POR BENFEITORIAS E DIREITO DE RETENÇÃO

Todas as benfeitorias são acessórias da coisa, e são obras ou despesas


efetuadas numa coisa para conservá-la, melhorá-la ou apenas embelezá-la; portanto,
são melhoramentos efetuados em coisa já existente.
Acontece, porém, via de regra, aderem à coisa principal por forma que se toma
impossível ou extremamente dificultoso separá-las; e outras, que, materialmente,
comportariam a separação, não podem ser levantadas sem detrimento da coisa.
Portanto, apenas algumas benfeitorias suportam retirada sem perda do valor
próprio e sem sacrifício do bem principal; por isso não podendo conservar a coisa
acessória, quando absorvida pela principal, o possuidor fará jus ao equivalente em
dinheiro.

5.3.1. Classificação das Benfeitorias ou Despesas

As benfeitorias serão classificadas em conformidade com o Artigo 96 do


Código Civil da seguinte forma:

a) Benfeitorias Necessárias (impensae necesariae): têm por fim conservar


o bem ou evitar que ele se deteriore.

b) Benfeitorias Úteis (impensae utiles): aumentam ou facilitam o uso do


bem.

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c) Benfeitorias de Luxo (impensae voluptuariae): as de mero deleite ou
recreio, que não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável
ou sejam de elevado valor.
E essa classificação será determinante para a possibilidade, ou não, ao direito
de indenização; juntamente com a boa-fé ou má-fé do possuidor.

5.3.2 Direito à indenização

As regras da indenização das benfeitorias estão previstas nos Artigos 1.219 a


1.222 do Código Civil e serão pautadas segundo a classificação das benfeitorias e na
boa-fé ou má-fé do possuidor.
Assim, não assiste a todo possuidor, nem se exerce sobre toda espécie de
benfeitoria o direito à indenização, impondo-se distinções.
Portanto, em conformidade com o Artigo 1.219 do Código Civil temos as
seguintes situações:
a) Possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias
necessárias, das benfeitorias úteis, e ao levantamento das benfeitorias voluptuárias.
Tem, ainda o direito de exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias
necessárias ou úteis.
b) Possuidor de má-fé tem direito exclusivamente à indenização das
benfeitorias necessárias.
Portanto, o direito a indenização e retenção se pautará na posse seja de boa
ou de má-fé (vide anexo 03).

5.3.3 Benfeitorias e Acessões

Deve-se distinguir-se as benfeitorias das acessões. As primeiras têm cunho


complementar; já as segundas são coisas novas, como as plantações e construções.
Quem semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em proveito do
proprietário, as sementes, plantas e construções; mas se estiver de boa-fé tem direito
à indenização. Mas, se procedeu de má-fé, pode ser constrangido, demais disso, a
repor as coisas no estado anterior, e a pagar os prejuízos causados.

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Se tratar-se de trabalho de construção, ou de lavoura, estando de má-fé mas
o fazendo na presença do proprietário, sem sua impugnação, quem construiu ou
plantou adquire o direito à indenização.

6 DIREITO DE RETENÇÃO

Sobre o direito de retenção, Carlos Roberto Gonçalves ensina

Como o jus retentionis é remédio defensivo de ação pronta e decisiva,


para compelir o devedor ao cumprimento da obrigação prevista na lei,
entende-se que não deve ser concedido a quem detém a coisa na
convicção de que não pode possuí-la.

Assim, o possuidor de boa-fé tem a faculdade de não restituir a coisa enquanto


não for indenizado do seu valor.
Constitui um dos modos de defesa, mas que para ser exercido é preciso,
primeiramente, que seja credor do valor de benfeitorias, e, em seguida, que esteja de
posse da coisa. A conexão entre o crédito e o bem é evidente.
Esse direito pode ser exercido por embargos nas ações possessórias, mas
quando o possuidor de boa-fé não exerce o direito de retenção, pode pleitear em ação
autônoma a indenização das benfeitorias necessárias e úteis.
Esse direito não está disponível para o possuidor de má-fé, por ter plena
consciência de que beneficia bem de outrem, razão por que não age de boa-fé, e, não
tendo poder legítimo, pois que adquirido de forma ilegal, falta-lhe aptidão para exercer
um direito que pressupõe a legitimidade da causa desse poder.
Direito a usucapir. Um dos efeitos mais importantes da posse é o direito a
usucapir, direito que, embora não se funde exclusivamente na posse, tem-na como
seu elemento básico. Usucapir é adquirir a propriedade pela posse continuada durante
certo tempo. A usucapião, com efeito, constitui um dos modos de aquisição do
domínio. Por sua importância, reclama demorado exame à parte.
Importante é observar que deve-se descrever de forma específica e minuciosa
as benfeitorias que realizou no imóvel, não o fazendo de forma genérica, e juntando
documentos comprobatórios, assim como as datas que foram realizadas, sob pena de

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perder o direito a indenização pelas benfeitorias; como a jurisprudência já se
manifestou:

Cerceamento de Defesa. Inexistência, uma vez que dos autos resulta a


desnecessidade de outras provas. Benfeitorias. Para pleitear indenização e retenção,
deve a parte descrever as benfeitorias que pretende haver realizado, não se admitindo
simples menção genérica a sua existência (Resp 4073/SP 1990/0006822-3).

Assim meras alegações não darão direito de retenção ao possuidor, mesmo


que de boa-fé.

7 DA RESPONSABILIDADE DO POSSUIDOR POR DETERIORAÇÕES

A responsabilidade do possuidor não se caracteriza, a menos que tenha agido


com dolo ou culpa, conforme preconiza o Artigo 1.217 do Código Civil.
Em compensação, o Artigo 1.218 do Código Civil determina que o possuidor
de má-fé responde pela perda, ou deterioração da coisa, ainda que acidentais, exceto
se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela na posse do reivindicante.
Portanto, mais uma vez a boa-fé ou má-fé do possuidor será determinante
para a responsabilização pelas deteriorações.

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Bibliografia

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das Coisas - Coleção Direito Civil


Brasileiro Volume 5 – 17. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019.

GOMES, Orlando. Direitos Reais. 21a ed. rev. e atual. Rio de Janeiro:
Forense, 2012.

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