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Material Teórico

Direito das Coisas


Posse e Propriedade

Profª Marlene Lessa


cod CoisasCDSG202101_ a01
Conceito
É o conjunto de normas que regem as relações jurídicas concernentes
aos bens materiais e imateriais suscetíveis de apropriação pelo homem.

Estabelece-se o vínculo jurídico entre uma pessoa e coisas ou bens (em


relação à sua aquisição, exercício, conservação e até perda). Domínio é este
vínculo estabelecido entre as pessoas e os bens incorporados ao seu
respectivo patrimônio.

Explicita Alexandre Cortez Fernandes1 que “a pessoa humana, além de


ser titular de direitos da personalidade, pode também deter direitos patrimoniais
- ambos são manifestações dos direitos subjetivos. Os direitos de
personalidade não são suscetíveis de valoração de ordem econômica, sua
tutela é constitucional, e está estribada no sistema de direitos e garantias
fundamentais, individuais e transindividuais. Já os direitos patrimoniais são
passíveis de aferição econômica, pois também gozam de proteção
constitucional.”

Direito Real
É a relação jurídica entre o homem e a coisa, que se estabelece
diretamente e sem intermediário, contendo, portanto, o sujeito ativo (titular do
bem), a coisa e o direito de dispor do bem, conservando-o, protegendo-o e
reivindicando-o de quem injustamente o detenha.

Ensina Arnoldo Wald2 que os direitos reais se referem “às relações


jurídicas referentes às coisas suscetíveis de apropriação, estabelecendo um
vínculo imediato e direto entre o sujeito ativo ou titular do direito e a coisa sobre
a qual o direito recai e criando um dever jurídico para todos os membros da
sociedade”.

Estão enumerados, os direitos reais, no art. 1.225 do CC:

Art. 1.225. São direitos reais:

I - a propriedade;

II - a superfície;

III - as servidões;

IV - o usufruto;

V - o uso;

1
Fernandes, Alexandre Cortez. Direito civil: direitos reais – 2 ed rev e ampl – Caxias do Sul, RS: Educs,
2016, p. 12.
2
Wald, Arnoldo. Direitos civil: direitos das coisas. 12 ed reform. São Paulo: Saraiva, 2009, p.1.

2
VI - a habitação;

VII - o direito do promitente comprador do imóvel;

VIII - o penhor;

IX - a hipoteca;

X - a anticrese.

XI - a concessão de uso especial para fins de moradia; (Incluído pela Lei


nº 11.481, de 2007)

XII - a concessão de direito real de uso;(Redação dada pela Lei nº 13.465,


de 2017)

XIII - a laje. (Redação dada pela Lei nº 13.465, de 2017)

Os direitos reais podem assim ser classificados:

• Direitos reais sobre coisas alheias – possibilidade de receber, através de


norma jurídica, permissão do proprietário para utilizar ou ter a coisa
como se fosse sua, observadas certas condições e circunstâncias
(legais ou contratuais).
• Direitos reais limitados de gozo e fruição – possibilidade de usar coisa
com limitação em sua utilização.
• Direitos reais de garantia – a coisa é dada, pelo seu titular, como
garantia de um débito, até que o mesmo seja quitado.
• Direito real de aquisição – compromisso irretratável de compra e venda
de imóvel.

Posse
Conceito

É visibilidade, a exteriorização do domínio (Ihering). É a relação


exterior intencional existente entre a pessoa e a coisa, tendo em vista a
função econômica desta (Maria Helena Diniz).

Para o Prof. Desembargador Laerson Mauro3 “posse é o fato que


consiste no exercício, com autonomia, total ou parcialmente, de algum
dos poderes inerentes ao domínio”. Finalmente, arremata Martin Woff
apud Caio Mário4 “poder efetivo sobre uma coisa, senhoria este que
pode exercer qualquer pessoa (física ou jurídica) e, sobre qualquer coisa
ou partes dela”, desde que visível.

3
Mauro, Laerson. Curso programado. Direito civil (coisas). Ed. Rio, RJ, 1982, p. 47.
4
Pereira, Caio Mario da Silva. Instituições de direito civil (direitos reais) p. 14.

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Objeto

Podem ser objeto de posse:

a. as coisas corpóreas, ou seja, bens materiais que podem ser tocados ou


apreendidos pelas pessoas.
b. a posse é um elemento acessório, já que o principal é a coisa corpórea.
c. a posse recai sobre direitos reais de fruição: direito de superfície,
servidão, uso, usufruto, habitação.
d. a posse recai apenas nos seguintes direitos reais de garantia: penhor e
anticrese, porque a hipoteca é garantia atinente a quem é dono
(proprietário) do bem.

Classificação

a. Posse direta – o possuidor utiliza o bem que está em seu poder

Art. 1.197. A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder,
temporariamente, em virtude de direito pessoal, ou real, não anula a
indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto
defender a sua posse contra o indireto.

b. Posse indireta – o possuidor arrecada os frutos (aluguéis, rendas, etc)


que a coisa lhe traz, ou seja, goza dos bens.

Composse (Compossessão ou Posse Comum)

Mais de uma pessoa exerce a posse sobre o mesmo bem. Compreende:

a. Pluralidade de sujeitos e coisa indivisa (que não está dividida)

b. Simultaneidade do exercício da posse (não há a exclusão do direito dos


demais):

Art. 1.199. Se duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa,


poderá cada uma exercer sobre ela atos possessórios, contanto que
não excluam os dos outros compossuidores.

Exemplo: posse dos herdeiros sobre o acervo hereditário, antes da partilha.


São compossuidores.

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A Posse Ainda Pode Ser

a. Justa – aquela que está correta, não padece de vícios (ou seja, não é
violenta, precária ou clandestina);

b. Injusta – aquela que se deu com aquisição de força física ou violência


moral (VIOLENTA), exercida com abuso de confiança por parte de quem
recebe a coisa, a título provisório, com o dever de restituí-la
(PRECÁRIA) ou estabelecida às ocultas do titular (CLANDESTINA);

c. Boa-fé – o possuidor está convicto de que a coisa realmente lhe


pertence, ignorando o prejuízo que comete contra o verdadeiro titular do
bem, já que desconhece o vício que lhe impede a aquisição da coisa. A
boa-fé é tida como se a posse não tivesse vícios, já que o posseiro
apresenta um justo título, quer dizer, um título hábil para transferir a
posse ou domínio, mas que contém algum vício que o impossibilita de
atingir tal fim. Ex. ter contrato de compra e venda não registrado ou
emitido por quem não era o dono do bem. O possuidor que pagou pela
coisa e recebeu o título acredita que é dono. Está de boa-fé e tem um
justo título.

d. Posse de má fé - o possuidor tem a ciência de que é ilegítimo o seu


direito, em razão dos vícios. Por exemplo, o possuidor sabe que estava
no bem em decorrência de uma locação verbal. O dono falece e ele
alega a terceiros que tinha recebido o bem em doação... (a posse era
precária).

Efeitos

• “Ad interdicta” – há amparo na lei. A norma permite o uso dos


“interditos”, quando a posse é ameaçada, esbulhada ou turbada, desde
que a posse seja justa.

• “Ad usucapionem” – dá origem a usucapião da coisa, quando


preenchidos os requisitos legais.

Quanto ao tempo (em que a posse foi exercida)

• Posse nova – ocorrida em menos de 1 ano e 1 dia (fala-se


“ano e dia”);
• Posse velha – exercida em prazo superior a 1 ano e 1 dia.

A proteção legal do Código de Processo Civil permite o uso da


concessão de liminar inaudita altera parte e a utilização do procedimento
especial do art. 560 e segs. do CPC - somente se o peticionário alega
que está sofrendo restrição em sua posse em menos de “ano e dia”.

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Elementos da Posse

• “Corpus” – exteriorização da propriedade. A posse só recai sobre


bens materiais, corpóreos.

• “Animus” – o possuidor mostra, manifesta sua posse como se


fosse dono.

POSSUIDOR é o que tem pleno exercício de fato dos poderes inerentes


sobre a coisa. A coletividade desprovida de personalidade jurídica
também pode ser possuidora.

Aquisição

Há o princípio de que “ninguém pode, pó si só, mudar a causa da posse”.


Entende-se que se ela foi iniciada corretamente assim permanece. Se
clandestina, idem. Então a forma com que o posseiro iniciou, adquiriu a
coisa é relevante para verificar se sua posse é justa ou não. Daí surge a
divisão:

a. Posse originária – é a forma de adquirir, de ter o bem, quando


o atual possuidor não tem qualquer vínculo com o antecessor.
Trata-se de um ato unilateral. Ex. apreensão da coisa, pelo
exercício do direito, pela disposição da coisa ou dos direitos a
ela inerentes.

b. Posse derivada - é a que possui um vínculo jurídico com o


antecessor. O bem foi adquirido, foi entregue pelo anterior
possuidor. Ex. a entrega de um bem móvel, como um carro,
pelo vendedor ao comprador (a chamada tradição), etc.

Obs. Os arts. 1.204 e 1.205 do CC generalizaram o meio de


aquisição da posse:

Art. 1.204. Adquire-se a posse desde o momento em que se torna


possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes
inerentes à propriedade.

Art. 1.205. A posse pode ser adquirida:

I - pela própria pessoa que a pretende ou por seu representante;

II - por terceiro sem mandato, dependendo de ratificação.

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Ações Possessórias (Art. 1.210 do CC)

Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de


turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se
tiver justo receio de ser molestado.

§ 1o O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-


se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou
de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou
restituição da posse.

§ 2o Não obsta à manutenção ou reintegração na posse a alegação de


propriedade, ou de outro direito sobre a coisa.

Ações possessórias são meios de proteção da posse, cabíveis quando o


possuidor estiver sendo ameaçado, tendo obstáculos para exercer sua
posse (turbação) ou perder a posse do bem (esbulho).

a. Interdito proibitório – é a proteção preventiva da posse


ante a ameaças de perder ou de ser molestado na posse. O
interessado utiliza a ação de interdito proibitório para que o
juiz lhe dê um mandado que proíba o réu de praticar os atos
que ameaça concretizar, sob pena de multa e perdas e
danos. A liminar só é concedida se a ameaça é recente
(menos de ano e dia).
b. Manutenção na posse – ação para que o possuidor se
mantenha, permaneça na posse, quando estiver se sentindo
embaraçado na posse (ex. cortam-lhe as árvores, retiram-lhe
as cercas, etc.). A liminar é concedida, pelo rito especial,
com a prova de estar recente a turbação.
c. Reintegração na posse – ação movida por quem perdeu o
bem e pretende recuperá-lo porque a perda da posse se deu
em consequência de violência, clandestinidade ou
precariedade, praticadas pelo esbulhador.

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Observação: a lei autoriza o desforço imediato (art 1.210, § 1º. do CC),
ou seja, a legítima defesa da posse:

§ 1o O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-


se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa,
ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou
restituição da posse.

Indenizações

Quando o possuidor de boa-fé tiver de deixar o bem (porque a ação


de reivindicação ou evicção for desfavorável a ele) tem direito a ser
INDENIZADO pelas benfeitorias que realizou, desde que sejam úteis e
necessárias. As benfeitorias voluptuárias (de recreio) seguem a
disposição do art. 1.219 do CC:

Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das


benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se
não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da
coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias
necessárias e úteis.

“Jus retentionis” – direito de retenção: o possuidor de boa-fé pode


permanecer na coisa ou retê-la até ser pago pelas benfeitorias,
construções e plantações (art. 1219 CC).

O possuidor de má-fé somente pelas benfeitorias necessárias tem


direito à indenização - art. 1.220 do CC:

Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as


benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela
importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.

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Propriedade

Conceito
É o direito real que a pessoa tem de, em conformidade com a lei, usar,
gozar e dispor de um bem (móvel ou imóvel, corpóreo e incorpóreo), e de
reivindicá-lo de quem injustamente o detenha.

O domínio é o mais completo dos direitos subjetivos e constitui, como


vimos, o próprio cerne do direito das coisas. Aliás, poder-se-ia mesmo
dizer que, dentro do sistema de apropriação de riqueza em que vivemos,
a propriedade representa a espinha dorsal do direito privado, pois o
conflito de interesses entre os homens, que o ordenamento jurídico
procura disciplinar, manifesta-se, na quase generalidade dos casos, na
disputa sobre bens (Silvio Rodrigues).

Diz Washington de Barros que “o proprietário pode dispor da coisa como


entender, sujeito apenas a determinadas limitações, impostas pelo
interesse público ou pela coexistência do direito de propriedade dos
demais indivíduos”.

Previsão Legal
Artigo 1228 do CC:

Art. 1.228. O proprietário TEM A FACULDADE de usar, gozar e dispor


da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que
injustamente a possua ou detenha.

§ 1o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com


as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam
preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a
flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio
histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.

(pelo artigo 524 do CC/16: a lei assegura ao proprietário o direito de usar,


gozar e dispor da coisa).

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Elementos Constitutivos

a. Uso – “jus utendi”: possibilita ao proprietário utilizar o bem,


de acordo com a sua vontade, nos termos da lei.
b. Gozo – “jus fruendi”: possibilita ao proprietário arrecadar
os frutos (também as rendas, os juros, etc.) obtidos com a
exploração econômica do bem.
c. Disposição – “jus abutendi/ jus disponendi”: possibilita
ao proprietário dispor da coisa, vendendo-a, doando-a,
alienando-a, etc.
d. Reivindicação – “jus reivindicatio / rei vindicato”: o
proprietário tem direito de reaver a coisa do poder de quem
ilegalmente a detenha, alicerçado em seu direito de domínio
sobre o bem.

Classificação

• Plena – a propriedade será plena quando seu titular puder


usar, gozar e dispor do bem, de forma absoluta, perpétua e
exclusiva.
• Limitada – a propriedade será limitada quando estiver em
usufruto de outrem, com cláusula de fideicomisso, etc.,
enfim, quando estiver gravada de ônus, condição ou
qualquer entrave para seu titular.

Restrições na Propriedade

A propriedade do solo não se limita apenas à superfície, atinge o espaço


aéreo e o subsolo, até a altura ou profundidade que for útil. Porém a
legislação poderá impor limites, em razão de interesses sociais. Ex.
servidão de altura, galerias de águas no subsolo. Ainda, a C.F. determina
que as riquezas do solo pertencem à União.

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Art.s 1.229 do CC

Art. 1.229. A propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo


correspondentes, em altura e profundidade úteis ao seu exercício, não
podendo o proprietário opor-se a atividades que sejam realizadas, por
terceiros, a uma altura ou profundidade tais, que não tenha ele interesse
legítimo em impedi-las.

Art. 1.228, § 1o do CC

§ 1o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as


suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam
preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a
flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio
histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.

Art. 1.230 do CC

Art. 1.230. A propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e


demais recursos minerais, os potenciais de energia hidráulica, os
monumentos arqueológicos e outros bens referidos por leis especiais.

Parágrafo único. O proprietário do solo tem o direito de explorar os


recursos minerais de emprego imediato na construção civil, desde que
não submetidos a transformação industrial, obedecido o disposto em lei
especial.

Propriedade Imóvel

Modos de aquisição

a. Originária - é aquele que não há vínculo jurídico entre o


proprietário anterior e o atual. Ex. usucapião.
b. Derivada - é aquela em que existe um liame jurídico entre o
proprietário anterior e o atual. Ex. direito hereditário e o contrato
seguido de tradição.
c. Título universal – quando recai sobre a totalidade dos bens.
Ex. herança.
d. Título singular – quando recai sobre bem determinado e
individualizado.

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