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AULA DE DIREITO PENAL III

UNIDADE II

2. DOS CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO

2.1. DO FURTO

ART. 155, CP. Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
§ 1º. A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno.
§ 2º. Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode
substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou
aplicar somente a pena de multa.
§ 3º. Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor
econômico.
Furto qualificado
§ 4º. A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:
I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;
II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;
III - com emprego de chave falsa;
IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.
§ 4º-A. A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se houver emprego
de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum.
§ 4º-B. A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa, se o furto mediante
fraude é cometido por meio de dispositivo eletrônico ou informático, conectado ou não
à rede de computadores, com ou sem a violação de mecanismo de segurança ou a
utilização de programa malicioso, ou por qualquer outro meio fraudulento análogo.
§ 4º-C. A pena prevista no § 4º-B deste artigo, considerada a relevância do resultado
gravoso:
I – aumenta-se de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado mediante a
utilização de servidor mantido fora do território nacional;
II – aumenta-se de 1/3 (um terço) ao dobro, se o crime é praticado contra idoso ou
vulnerável.
§ 5º. A pena é de reclusão de três a oito anos, se a subtração for de veículo automotor
que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior.
§ 6º. A pena é de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos se a subtração for de semovente
domesticável de produção, ainda que abatido ou dividido em partes no local da
subtração.
§ 7º. A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se a subtração for de
substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem
sua fabricação, montagem ou emprego.
Furto de coisa comum
ART. 156, CP. Subtrair o condômino, co-herdeiro ou sócio, para si ou para outrem, a
quem legitimamente a detém, a coisa comum:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.
§ 1º - Somente se procede mediante representação.
§ 2º - Não é punível a subtração de coisa comum fungível, cujo valor não excede a
quota a que tem direito o agente.

2.1.l. OBJETIVIDADE JURÍDICA (BEM JURÍDICO PROTEGIDO)

Protege-se o patrimônio, tanto na propriedade, na posse e na detenção.


Este conceito, não gera consenso na doutrina.

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A propriedade é o direito de usar, gozar, dispor e proteger de uma coisa


(art. 1.228, CC).

ART. 1.228, CC. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o
direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.

A posse é o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à


propriedade. Exemplo: o locatário e o comodatário exercem posse sobre o bem. CC,
Art. 1.196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou
não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.

ART. 1.196, CC. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno
ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.

A detenção é aquela situação em que alguém conserva a posse em nome


de outro e em cumprimento às suas ordens e instruções. A detenção não é posse,
portanto confere ao detentor direitos decorrentes desta (art. 1.198, CC).

ART. 1.198, CC. Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de


dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de
ordens ou instruções suas.

POSIÇÕES DOUTRINÁRIAS:

1) Somente a propriedade (Hungria);


2) A propriedade e a posse (Nucci; Greco; Masson);
3) A propriedade, posse e detenção (Mirabete; Delmanto;
Bitencourt).

A doutrina majoritária entende que o tanto o proprietário, como o


possuidor e como o detentor podem figurar como sujeitos passivos.

2.1.2. TIPO OBJETIVO

2.1.2.1. NÚCLEO DO TIPO: Subtrair significa retirar a coisa da posse da vítima,


passando ao poder do agente. Pode ocorrer por apoderamento direto, quando o agente
apreende a coisa manualmente, ou por apoderamento indireto, na hipótese de o agente
utilizar-se de terceiros
ou de animal.

2.1.2.2. COISA: Refere-se a tudo aquilo que possui existência de natureza


corpórea.

2.1.2.3. VALOR AFETIVO. Para alguns autores (como Damásio e Rogério Greco),
coisa de valor afetivo ou sentimental também pode ser objeto material de furto.

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Segundo Hungria (Comentários ao Código Penal, vol. VII, p. 23), “a coisa subtraída
deve representar para o dono, senão um valor reduzível a dinheiro, pelo menos uma
utilidade (valor de uso), seja qual for, de modo que possa ser considerada como
integrante do seu patrimônio”.

2.1.2.4. TRANSPLANTE. Remover tecidos, órgãos ou partes do corpo de pessoa ou


cadáver, em desacordo com as disposições da Lei nº. 9.434/97, configura o crime
descrito no art. 14 da referida legislação.

2.1.2.5. CADÁVER. A subtração de cadáver pode caracterizar crime de furto, como,


por exemplo, quando pertencer a um museu ou na hipótese de ser utilizado para a
finalidade científica, pois nestes casos passa a integrar o patrimônio de alguém. Caso
contrário, pode configurar o crime de subtração de cadáver (CP, art. 211).

2.1.2.6. ANIMAIS. Podem ser objeto material de furto se integrarem o patrimônio de


alguém. Denomina-se de abigeato o furto de gado.

2.1.2.7. FOLHAS DE CHEQUE E CARTÕES BANCÁRIOS. Apesar de existir


posição contrária, segundo o STJ não podem ser objeto material do crime de furto, uma
vez que desprovidos de valor econômico, indispensável à caracterização do delito contra
o patrimônio. Se o cheque subtraído for preenchido e utilizado como meio fraudulento
para o agente obter vantagem ilícita em prejuízo alheio, haverá estelionato (art. 171,
caput, do CP). Neste caso, conforme a Súmula 17 do STJ, o estelionato absorve o crime
de falso. A cártula de cheque assinada, ainda que não preenchida, pode ser objeto de
crime contra o patrimônio, eis que nessas condições, diferente do cheque totalmente em
branco, assume feição de título ao portador, dotado assim de valor econômico
intrínseco.

2.1.2.8. COISA ALHEIA. Significa pertencente a outrem. A coisa sem dono (res
nullius) não é objeto de furto. Também não configura o crime de furto (art. 155) a
subtração de coisa própria, mesmo que em poder de terceiro, embora possa caracterizar
o delito descrito no art. 346 do CP ou o crime de furto de coisa comum (art. 156). Não
há furto de coisa abandonada (res derelicta), pois não integra o patrimônio de ninguém.
Se houver o apoderamento de coisa perdida (res deperdita ou desperdicta), configura o
crime do art. 169, parágrafo único, II, do CP.

2.1.2.9. COISA MÓVEL. É aquela passível de ser removida ou deslocada. Certos


objetos são considerados imóveis pelo Código Civil (como navios e materiais separados
provisoriamente de um prédio), mas são móveis para o Direito Penal e, assim, passíveis
de furto.

2.1.2.10. COISA MÓVEL POR EQUIPARAÇÃO. Nos termos do § 3°, equipara-se a


coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico. Ocorre o
crime de furto nos casos de ligação clandestina de energia elétrica, de telefone e de
água. Predomina que o furto de energia elétrica constitui crime permanente.

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2.1.3. TIPO SUBJETIVO

Além do dolo, consistente na consciência e vontade de subtrair coisa


alheia móvel (animus furtandi), o tipo contém o elemento subjetivo especial “para si ou
para outrem”, que revela o fim de assenhoreamento definitivo (animus rem sibi
habendi).

2.1.3.1 FURTO DE USO. Será atípica, por ausência do elemento subjetivo especial do
tipo (para si ou para outrem), a subtração de coisa alheia móvel quando o agente não
possuir a intenção de assenhoreamento.

De acordo com a doutrina e jurisprudência, para caracterizar furto de uso


são necessários alguns requisitos:

a) subtração de coisa infungível;

b) intenção de uso momentâneo;

c) devolução imediata da coisa após o uso e sem qualquer dano.

Alguns autores ainda acrescentam que a vítima não pode ter percebido a subtração.

2.1.4. SUJEITOS

SUJEITO ATIVO: qualquer pessoa pode figurar como sujeito ativo de furto, salvo o
proprietário. Se o agente for funcionário público e subtrair ou concorrer para que seja
subtraído o dinheiro, valor ou bem (que se encontra em poder da administração
pública), em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a
qualidade de funcionário, responde por peculato-furto (CP, art. 312, § 1°). O particular
que concorrer com o funcionário público, sabendo dessa qualidade, também responde
por peculato-furto. Caso a desconheça, responderá por furto e o funcionário por
peculato-furto.

SUJEITO PASSIVO: são vítimas do furto o proprietário, o possuidor ou detentor


legítimo da coisa.

2.1.5. CONSUMAÇÃO

Quatro teorias clássicas se destacam:

1) Contrectatio (tocar): consuma-se no momento em que o


agente toca a coisa, ou seja, basta o contato com a mão.

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2) Amotio (remover) ou apprehensio (apreender): a


consumação ocorre no momento em que o agente remove
a coisa, passando para seu poder, mesmo sem retirá-la da
esfera de proteção da vítima. Assim, se o autor entra na
residência da vítima e retira um objeto do armário, ocorre
a consumação, mesmo que a coisa não seja retirada da
casa do ofendido. Observação: alguns autores diferenciam
amotio de apprehensio. Nesse sentido, para a teoria da
amotio, a consumação ocorreria com o deslocamento da
coisa, ao passo que, para a teoria da apprehensio, bastaria
o agente segurar a coisa, mesmo sem deslocamento.

3) Ablatio (tirar): além da remoção, a coisa deve ser retirada


da esfera de proteção da vítima.

4) Illatio (transportar ou trazer): além de ser removida do


lugar e retirada da esfera de proteção da vítima, a coisa
deve ser levada para local seguro.

Nossa legislação adotou a Teoria da Amotio Qualificada, ou seja, a


famosa Teoria da Inversão da Posse, assim sendo, a consumação da subtração se dá
com a posse da coisa pelo agente. Mesmo assim, não há consenso acerca do exato
momento da posse. Os dois principais posicionamentos são:

I. Entende-se consumado o furto no momento em que a coisa sai


da esfera de vigilância ou disponibilidade da vítima. Alguns
doutrinadores acrescentam que o agente deve ter posse
tranquila da coisa.

II. Consuma-se no momento em que o agente obtém a posse da


coisa, ainda que por curto espaço de tempo, sendo
desnecessário falar-se em posse tranquila e no critério de saída
da coisa da chamada "esfera de vigilância da vítima". Basta
que, cessada a clandestinidade, o agente tenha tido a posse da
res furtiva, ainda que retomada, em seguida, pela perseguição
imediata.

A segunda posição é a posição majoritária das Cortes superiores: STF:


"Para a consumação do furto, é suficiente que se efetive a inversão da posse, ainda que a
coisa subtraída venha a ser retomada em momento imediatamente posterior.
Jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal" (1ª T., HC 114329/RS, j.
01/10/2013).

Como visto, acolhida a posição do STF e do STJ, segundo a qual basta a


inversão da posse para a consumação do furto, a tentativa perfeita e o arrependimento

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eficaz passam a ser incabíveis, uma vez que, ao terminar a fase executória (com
inversão da posse), o crime estará consumado.

2.1.6. TENTATIVA. É admissível. Para o STF e STJ, ocorre quando o agente não
consegue, por circunstâncias alheias à sua vontade, obter a posse da coisa, mesmo que
por curto espaço de tempo.

2.1.7. FURTO MAJORADO OU FURTO NOTURNO. Nos termos do § 1°, a pena


aumenta-se de um terço do furto simples, se o crime é praticado durante o repouso
noturno.

2.1.7.1. REPOUSO NOTURNO. Período em que as pessoas se recolhem para dormir.


Deve ser analisado de acordo com os costumes e hábitos do local do crime. Neste
período o agente possui maior facilidade para a prática da conduta, considerando que a
vigilância da vítima, ou mesmo de terceiros, é reduzida. Em suma, visa à proteção do
patrimônio no período em que está mais vulnerável.

Exigência de a vítima estar repousando e de ser praticado em


casa habitada. Orientações:

 Não é necessário que o crime seja praticado em casa habitada ou


que a vítima esteja repousando durante a prática do crime. Basta
ter sido o delito praticado durante o período de repouso noturno.
Nesse sentido: Damásio, Mirabete, Nucci e Capez.

 Para incidir a majorante, o crime deve ser praticado em casa


habitada e estar a vítima repousando. Nesse sentido: Bitencourt e
Fragoso.

2.1.8. FURTO PRIVILEGIADO OU MÍNIMO. Consoante o art. 155, § 2°: "Se o


criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena
de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena
de multa".

2.1.8.1. CRIMINOSO PRIMÁRIO. Aquele que não é reincidente. Haverá


reincidência com a prática de novo crime depois de transitar em julgado a sentença
condenatória de delito anterior (observando o lapso temporal de 5 anos). Nos termos da
legislação pátria, o réu poderá ser portador de maus antecedentes e (tecnicamente)
primário.

2.1.8.2. COISA DE PEQUENO VALOR. Conforme posicionamento jurisprudencial,


"pode o valor do salário mínimo ser adotado, em princípio, como referência. Todavia,
esse critério não é de absoluto rigor aritmético, cabendo ao juiz da causa sopesar as
circunstâncias próprias ao caso" (STJ, 5ª T., AgRg no HC 246338/RS, j. 05/02/2013).

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Se a coisa for de pequeno valor pode incidir o privilégio. No entanto, se a


coisa for de valor ínfimo e houver baixo desvalor da conduta, poderá ser aplicado o
princípio da insignificância, afastando a tipicidade material (não haverá crime). Com
efeito, na hipótese de furto privilegiado, o fato será típico, ilícito e culpável. A
consequência está no momento da aplicação da pena. No caso de aplicar-se o princípio
da insignificância, o fato sequer seria típico (atipicidade material).

Importante salientar, ainda, a inteligência da Súmula nº. 511 do STJ que


assim expõe:

SÚMULA Nº. 511, STJ. É possível o reconhecimento do privilégio previsto


no § 2º do art. 155 do CP nos casos de crime de furto qualificado, se
estiverem presentes a primariedade do agente, o pequeno valor da coisa e a
qualificadora for de ordem objetiva.

2.1.9. FURTO E PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.

2.1.9.1. REQUISITOS OBJETIVOS

Segundo o STF (desde o HC 84.412/SP), são critérios objetivos para


aferição da insignificância:

a) A mínima ofensividade da conduta do agente;

b) A nenhuma periculosidade social da ação;

c) Reduzido grau de reprovabilidade do comportamento;

d) A inexpressividade da lesão jurídica provocada. No mesmo


sentido:

2.1.9.2. REQUISITOS SUBJETIVOS

Embora não exista consenso, predomina que dados pessoais (como


personalidade, reincidência e antecedentes) devem ser valorados para afastar a
incidência do princípio da insignificância.

Assim sendo, a habitualidade e a reincidência delitiva revelam


reprovabilidade suficiente a afastar a aplicação do princípio da insignificância. É
indispensável que a conduta do agente seja marcada por ofensividade mínima ao bem
jurídico tutelado, reduzido grau de reprovabilidade, inexpressividade da lesão e
nenhuma periculosidade social.

2.1.10. FURTO FAMÉLICO

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É aquele cometido por quem se encontra em estado de extrema penúria e,


não tendo outra forma de conseguir alimento para si ou para seus familiares, subtrai
pequena quantidade de mantimentos ou um animal (uma galinha, por exemplo) para se
alimentar. O furto famélico não constitui crime em razão da excludente de ilicitude do
estado de necessidade, próprio ou de terceiros, pois a falta de alimentação acarreta
riscos à vida e à saúde. O furto famélico só pode ser reconhecido quando o agente não
tinha outros meios de conseguir o alimento naquele instante.

O termo “famélico” está ligado ao sentimento de fome. Assim, apesar de


também existir o estado de necessidade, que exclui o crime de furto, quando o agente
subtrai cobertor para não morrer de frio ou medicamento para não morrer em razão de
doença, tais casos não recebem a denominação de furto famélico.

2.1.11. FURTO QUALIFICADO

O art. 155, § 4°, comina pena de reclusão de 2 a 8 anos, e multa, se o


crime é cometido em qualquer das circunstâncias previstas nos incisos I a IV. As
qualificadoras são de natureza objetiva, exceto o abuso de confiança, que possui
natureza pessoal.

2.1.11.1 DESTRUIÇÃO OU ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO À SUBTRAÇÃO


DA COISA.

Qualifica o furto se o agente emprega violência contra um obstáculo


(outro objeto ou outra coisa) que protege a res furtiva. O ato de violência é contra a
coisa e não a pessoa, caso em que configuraria roubo. Destruição significa demolir ou
desfazer, ao passo que rompimento tem um sentido de quebrar ou rasgar sem perda da
individualidade. A violência deve ser empregada antes da consumação do furto, se
depois, constitui o crime de dano (art. 163 do CP).

O STJ entende que o rompimento do vidro do veículo, para furto do


próprio veículo, não se considera furto qualificado, mas sim, furto simples, pois o vidro
é parte integrante da coisa furtada, o que não caracterizaria a destruição descrita em lei.
Só será qualificado, se houver o rompimento do vidro para subtração de objeto
localizado no interior de veículo automotor.

A mera remoção do obstáculo, sem que ele sofra qualquer dano, não
qualifica o furto. Ex.: desparafusar janela ou porta, desligar o interruptor do alarme
sonoro, extrair o dispositivo antifurto de uma roupa dentro da loja sem danificá-lo etc.
Por isso é que se diz que nesta qualificadora a vítima sofre dois prejuízos financeiros: o
valor do bem furtado e o do obstáculo danificado. Existem, aliás, muitos casos em que o
conserto da porta quebrada ou do cofre destruído custa mais do que o bem furtado.

Como se trata de infração que deixa vestígios, é necessária a perícia para


a caracterização da materialidade da circunstância (art. 171 do CPP), salvo em caso de

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ausência de vestígios, quando a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta (arts. 158 e
167 do CPP).

2.1.11.1.1 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA: as Cortes Superiores têm se


manifestado pela impossibilidade de reconhecimento do delito bagatelar quando há
destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa, tendo em vista que denota
maior ofensividade e reprovabilidade da conduta.

A forma tentada é plenamente compatível com a figura qualificada,


bastando que o agente já tenha dado início ao ato de arrombamento, danificando, ainda
que parcialmente, o obstáculo, mesmo que seja preso antes de conseguir entrar no local
que pretendia, não tendo, portanto, conseguido concretizar a subtração por
circunstâncias alheias à sua vontade.

2.1.11.2 COM ABUSO DE CONFIANÇA

O agente aproveita-se da facilidade surgida com a confiança. Como se


trata de circunstância de natureza subjetiva, é imperioso que o agente possua
consciência de que está agindo com abuso da confiança depositada pela vítima. Assim
sendo, a doutrina exige dois requisitos básicos para a configuração desta qualificadora:

1) É necessário que se demonstre a existência de uma especial


(grande) confiança da vítima no agente, que pode decorrer de
forte amizade ou coleguismo no trabalho, parentesco, namoro ou
noivado, relações profissionais etc. Assim, considerando que a
relação de confiança pode se dar em vários níveis, pode-se dizer
que foi estabelecido um critério aos juízes no sentido de não
reconhecerem a qualificadora quando verificarem a existência de
uma confiança pequena, comum, que não seja suficiente para
justificar tamanho agravamento da pena.

2) Que o agente tenha se aproveitado de alguma facilidade


decorrente da relação de confiança para executar o furto. É nisso
que consiste o abuso (de confiança). Assim, o amigo que furta
bens do interior da casa do outro durante uma visita incide na
forma qualificada, restando prejudicada a agravante genérica
referente a crime cometido com abuso de relação de hospitalidade
(art. 61, II, f) porque tal aspecto está contido na dinâmica da
qualificadora. Por outro lado, se o mesmo amigo invade a casa
durante viagem da vítima, cometendo o furto de uma maneira
como qualquer outra pessoa poderia tê-lo praticado, o crime é
simples.

Geralmente, esta modalidade é praticada por empregados contra os


empregadores, situação chamada de famulato. Ressalte-se que predomina o

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entendimento que a mera relação de emprego não basta para criar o vínculo de
confiança, que surge com o tempo.

Não se deve confundir com o crime de apropriação indébita. No art. 168,


o agente entra na posse da coisa de boa-fé, mas, posteriormente, dela se apropria (aliena
ou recusa a devolver). No furto qualificado o agente aproveita-se da facilidade inerente
da relação de confiança para subtrair a coisa. No furto, o agente não possui a posse da
coisa, ou, a possuindo, trata-se de posse vigiada. Na apropriação o agente tem a posse
desvigiada da coisa ou a sua detenção.

2.1.11.2.1 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA: A aplicação do princípio da


insignificância tem sido rechaçada pelos Tribunais Superiores, como regra, no crime de
furto qualificado pelo abuso de confiança, tendo em vista que tal circunstância denota
maior ofensividade e reprovabilidade da conduta.

A modalidade tentada é plenamente possível, quando o agente que goza


da confiança da vítima é flagrado no ato de subtração e acaba sendo impedido de
continuar na empreitada criminosa.

2.1.11.3 MEDIANTE FRAUDE

O agente utiliza artifício ou ardil para iludir a vítima e reduzir a


vigilância sobre a coisa, facilitando, assim, a sua subtração. Ex. usar crianças para
distrair a vítima enquanto furta, usar uniforme falso de empresas para adentrar na
residência e furtar, criar sites falsos imitando sites de bancos.

O STJ definiu que configura o crime de furto qualificado pela fraude a


subtração de valores de conta corrente, mediante transferência ou saque bancários sem o
consentimento do correntista; assim, a competência deve ser definida pelo lugar da
agência em que mantida a conta da pessoa lesada. Nesse caso, o fato deve ser
processado perante o Juízo do local da conta fraudada.

Também configura o crime de furto qualificado pela fraude, a conduta


consistente no furto de água praticado mediante ligação clandestina que permite que a
água fornecida pela empresa de água e saneamento flua livremente, sem passar pelo
medidor de consumo.

2.1.11.3.1 DIFERENÇA ENTRE FURTO MEDIANTE FRAUDE E


ESTELIONATO.

Estes crimes não se confundem. Há duas orientações que fazem a


diferenciação dos dois delitos, sejam elas:

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a) No furto, a fraude é utilizada pelo agente com o fim de burlar a


vigilância da vítima que, desatenta, tem seu bem subtraído, sem
que se aperceba; no estelionato, a fraude é usada como meio de
obter o consentimento da vítima que, iludida, entrega
voluntariamente o bem ao agente;

b) No furto, a coisa é subtraída, mesmo que a vítima a tenha


entregue ao agente, desde que não acredite perdê-la, ou seja, o
ofendido pode até entregar, mas espera a devolução. No
estelionato, a vítima, ludibriada, entrega a coisa e não espera a
devolução.

O furto qualificado, a fraude tem o escopo de reduzir/burlar a vigilância


da vítima para que, em razão dela, não perceba que a coisa lhe está sendo subtraída,
enquanto no crime de estelionato a fraude visa induzir a vítima a erro e, assim, entregar
o bem, espontaneamente, ao agente, assim sendo a clonagem de cartões para burlar o
sistema de proteção e vigilância do Banco, com o objetivo de retirar indevidamente
valores pertencentes aos titulares das contas bancárias corresponde a furto mediante
fraude.

2.1.11.4 ESCALADA

Significa adentrar no local do furto por meio anormal e que exija do


agente um esforço incomum. A qualificadora da escalada incide contra aquele que não
se intimida diante de um obstáculo, demonstrando uma tendência maior do agente em
delinquir. Exemplos. Pular ou escalar um muro alto para adentrar no imóvel; remoção
de telhas para entrar na residência pelo telhado.

A entrada em imóveis por vias subterrâneas, cavando-se túneis ou


acessos clandestinos, também se configuram como escalada.

É importante salientar que se faz necessária a realização de exame


pericial (CPP, art. 171). Entretanto, se não deixar vestígios, a qualificadora pode ser
provada por outros meios.

2.1.11.5. DESTREZA

É a especial habilidade de o agente subtrair a coisa, ou seja, é a


habilidade física ou manual empregada pelo agente na subtração, fazendo com que a
vítima não perceba o seu ato. É o meio empregado pelos batedores de carteira, pick-
pockets ou punguistas).

Se a vítima percebe a ação do agente e evita a subtração, não incide a


qualificadora, devendo o agente responder por tentativa de furto simples, todavia, se
terceiros impedem a subtração, haverá tentativa de furto qualificado.

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2.1.11.6. EMPREGO DE CHAVE FALSA

Chave falsa é qualquer instrumento, que tenha ou não a forma de chave,


o qual seja utilizado pelo agente para abrir fechaduras ou mecanismo material de
segurança. O conceito de chave falsa abrange:

1) A imitação da verdadeira feita clandestinamente, ou seja, sem o


conhecimento e autorização da vítima. As cópias que não são
clandestinas não podem ser tidas como chave falsa. Dessa forma,
se o empregado encontra a cópia da chave do carro do patrão
guardada em uma gaveta e usa essa chave reserva para subtrair o
veículo, a qualificadora não incide.

Se uma empregada doméstica recebe a cópia da chave da casa do patrão e


seu marido faz uma cópia da chave sem o conhecimento da esposa e em um momento
de viagens dos patrões desta, o marido utiliza a cópia para furtar a casa dos patrões,
comete o crime de furto qualificado.

Se alguém vê que a vítima guardou a chave de sua casa sob um vaso ao


deixar a residência e, em seguida, pega a chave e dela faz uso para entrar na casa,
responde por furto simples.

2) Qualquer instrumento, com ou sem formato de chave, capaz de


abrir uma fechadura (ou dispositivo análogo) sem arrombá-la.
Abrange os instrumentos que têm outra finalidade, mas que
também podem abrir a fechadura dependendo da habilidade do
agente, como, clipe de papel, grampo de cabelo, chave de fenda,
e, principalmente, aqueles que os próprios ladrões confeccionam
para servir efetivamente como chave falsa e que são chamados de
mixas ou gazuas.

2.1.11.7. CONCURSO DE PESSOAS

São os furtos nos quais são exigidas a presença de, no mínimo, duas
pessoas. Parte da doutrina sustenta que somente incide a qualificadora se os agentes
concorrerem na fase executória. A justificativa seria que o crime deve ser cometido
mediante o concurso de duas ou mais pessoas. A razão da maior reprovabilidade seria
justamente a eficiência e facilidade na fase executória. Em sentido contrário,
dispensando a presença dos agentes no local da execução do crime: Fragoso, Damásio e
Capez.

É importante ressaltar que predomina na jurisprudência e na doutrina que


os inimputáveis são computados para o reconhecimento do concurso de pessoas quando

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12
AULA DE DIREITO PENAL III

em participação com maiores de 18 anos e deverá ser reconhecido, também, delito de


corrupção de menores (art. 244-B do ECA), em concurso formal de crimes.

Havendo a associação criminosa (art. 288, CP), será admitido o crime de


furto qualificado pelo concurso de pessoas, não ocorrendo hipótese de bis in idem. O
crime de associação criminosa é autônomo e não depende da prática dos delitos visados,
tanto é que se consuma independentemente da prática destes.

Para o STF, ocorrerá bis in idem, devendo o magistrado escolher o crime


de maior gravidade para aplicar a pena e aplicar o princípio da consunção em relação ao
outro.

2.1.11.8. HOUVER EMPREGO DE EXPLOSIVO OU ARTEFATO QUE CAUSE


PERIGO COMUM

Esta qualificadora visa coibir os furtos que tenham relação explosões de


caixas-eletrônicos e agências bancárias.

2.1.11.9. FURTO MEDIANTE FRAUDE COMETIDO POR MEIO


ELETRÔNICO

Esta qualificadora busca coibir os furtos ocorridos mediante fraude


utilizando meios eletrônicos, como redes sociais, sistemas de comunicação ligados a
rede mundial de computadores, com a possibilidade ou não de violação de sistemas de
segurança dos softwares.

Assim como admite um agravamento na pena se o servidor utilizado para


a prática criminosa estiver no exterior ou se a vítima por pessoa idosa ou vulnerável sob
quaisquer circunstâncias.

2.1.11.10. VEÍCULO AUTOMOTOR QUE VENHA A SER TRANSPORTADO


PARA OUTRO ESTADO OU EXTERIOR.

Esta qualificadora tem a finalidade de combater a crescente criminalidade


envolvendo furtos, roubos e receptação de veículos.

2.1.11.11. FURTO DE SEMOVENTE DOMESTICÁVEL DE PRODUÇÃO

Busca-se a proteção dos rebanhos destinados à atividade pecuária e


agropastoril, coibindo o abigeato (roubo de gado).

2.1.11.12. FURTO DE SUBSTÂNCIAS EXPLOSIVAS OU INSUMOS QUE


VENHAM A PRODUZIR SUBSTÂNCIAS EXPLOSIVAS

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AULA DE DIREITO PENAL III

Neste caso proíbe-se o furto de produtos, insumos ou substâncias que


venham a produzir, fabricar, empregar ou instrumentalizar a criação de substâncias
explosivas. Não se pode confundir com a qualificadora resultante do uso de explosivos
para obtenção da prática criminal.

Neste caso, não se incrimina o uso de explosivos no furto, mas sim, o


furto de substâncias explosivas ou se venham possibilitar a fabricação de explosivos.

2.1.12. FURTO DE COISA COMUM

Trata-se de crime próprio, figurando como sujeito ativo o condômino, co-


herdeiro ou sócio o sujeito passivo é aquele que legitimamente detém a coisa comum,
mesmo que não seja o condômino, co-herdeiro ou sócio.

Se, por exemplo, o próprio sócio detém a coisa comum e dela se


apropria, haverá apropriação indébita. Existe divergência doutrinária no caso de crime
cometido por sócio.

Hungria sustenta que a sociedade pode ter personalidade jurídica ou ser


sociedade de fato. Em sentido contrário, Noronha entende que se o sócio de sociedade
com personalidade jurídica subtrair coisa desta, comete furto (art. 155), uma vez que o
patrimônio da pessoa jurídica é distinto do patrimônio do sócio.

Porém, não é punível a subtração de coisa comum fungível, cujo valor


não excede a quota a que tem direito o agente.

2.1.13. CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA

O furto é um crime simples e de dano quanto à objetividade jurídica, de


concurso eventual quanto ao sujeito ativo, de ação livre e comissivo quanto aos meios
de execução, material e instantâneo quanto ao momento consumativo, doloso quanto ao
elemento subjetivo.

2.1.14. AÇÃO PENAL

No furto a ação penal é pública incondicionada, exceto no caso de furto


de coisa comum, a qual será condicionada a representação do ofendido.

2.2 ROUBO

ART. 157, CP. Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave
ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à
impossibilidade de resistência:
Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.

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AULA DE DIREITO PENAL III

§ 1º. Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega
violência contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou
a detenção da coisa para si ou para terceiro.
§ 2º. A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade:
I – (revogado)
II – se há o concurso de duas ou mais pessoas;
III – se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal
circunstância.
IV – se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro
Estado ou para o exterior;
V – se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade.
VI – se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou
isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego.
VII - se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma branca;
§ 2º-A. A pena aumenta-se de 2/3 (dois terços):
I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo;
II – se há destruição ou rompimento de obstáculo mediante o emprego de explosivo ou
de artefato análogo que cause perigo comum.
§ 2º-B. Se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma de fogo de
uso restrito ou proibido, aplica-se em dobro a pena prevista no caput deste artigo.
§ 3º. Se da violência resulta:
I – lesão corporal grave, a pena é de reclusão de 7 (sete) a 18 (dezoito) anos, e multa;
II – morte, a pena é de reclusão de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, e multa.

2.2.1. OBJETIVIDADE JURÍDICA

O roubo é um crime pluriofensivo que atenta contra patrimônio,


integridade física ou liberdade individual.

2.2.2. TIPO OBJETIVO

O roubo se caracteriza pela subtração do patrimônio mediante o emprego


de violência ou grave ameaça. A violência física é chamada de vis corporalis ou vis
absoluta, enquanto à violência moral é chamada de vis compulsiva.

A violência moral se caracteriza pela ameaça, ou seja, pela promessa


possibilidade de execução de mal grave a qual tenha potencial intimidatório à vítima.

A violência física pode ser subdividir em:

1) Violência Própria: resultante do emprego de força física. Ex.


tapas, socos, chutes, empurrões.

2) Violência Imprópria: é aquela que por qualquer meio reduza ou


impossibilidade de resistência. Ex. utilização de medicamento
para fazer a vítima dormir (“Boa noite, Cinderela”).

Não existe forma privilegiada no roubo.

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Não se aplica o princípio da insignificância ao roubo, diante da


pluriofensividade, revelada no emprego da violência e da grave ameaça. O desvalor da
ação é elevado.

O roubo se subdivide em:

a) ROUBO PRÓPRIO: onde a violência ou a grave ameaça são


aplicadas à vítima antes da subtração do patrimônio. Nesta
modalidade de roubo admite-se a violência própria e a
violência imprópria.

b) ROUBO IMPRÓPRIO: a violência ou a grave ameaça são


aplicadas à vítima após a subtração do patrimônio, com o fito de
assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si
ou terceiro. Neste caso somente se admite a violência própria
(física).

2.2.3. TIPO SUBJETIVO

O roubo é um crime doloso onde o sujeito ativo tem a vontade de ter a


coisa para si (animus rem sibi habendi).

2.2.4. SUJEITOS

2.2.4.1. SUJEITO ATIVO: qualquer pessoa pode figurar como sujeito ativo de roubo,
salvo o proprietário.

2.2.4.2. SUJEITO PASSIVO: são vítimas do crime de roubo o proprietário, o


possuidor ou detentor legítimo da coisa.

2.2.5. CONSUMAÇÃO E TENTATIVA

O roubo próprio se consuma com a inversão da posse (Teoria da inversão


da posse), neste sentido a matéria se encontra sumulada pelo STJ.

SÚMULA Nº. 582, STJ. Consuma-se o crime de roubo com a inversão da posse do bem
mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e em
seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo
prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada.

No roubo impróprio, a consumação se dá com o emprego da violência ou


da grave ameaça, sendo desnecessária a inversão da posse.

No roubo a tentativa somente é admissível quando do roubo na


modalidade própria, na modalidade imprópria não é admissível.

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2.2.6. ROUBO MAJORADO – São as hipóteses previstas no § 2º, § 2º-A e §2º-B,


todos do CP, sendo estas:

1) Mediante concurso de duas ou mais pessoas;

2) A vítima trabalha em serviço de transporte de valores e o agente


conhece tal circunstância;

3) Mediante subtração for de veículo automotor que venha a ser


transportado para outro Estado ou para o exterior;

4) Mediante restrição da liberdade da vítima;

5) Em virtude da subtração for de substâncias explosivas ou de


acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua
fabricação, montagem ou emprego;

6) Com emprego de arma branca;

7) Com emprego de arma de fogo;

8) Com destruição ou rompimento de obstáculo mediante o emprego


de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum.

Caso haja emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido, aplica-se


em dobro a pena prevista no caput deste artigo.

2.2.7. QUALIFICADO PELO RESULTADO

No art. 157, § 3º do CP, temos o roubo qualificado pelo resultado lesão


grave ou pela morte.

No inciso I está previsto o resultado lesão corporal grave (compreende


também a gravíssima, §§ 1º e 2º do art. 129), com pena de reclusão de 7 (sete) a 18
(dezoito) anos, e multa.

No inciso II, está tipificado o roubo com resultado morte, chamado de


latrocínio, cuja pena é de reclusão de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, e multa. Também
crime hediondo.

No roubo qualificado não se aplicam as causas de aumento de pena do §


2º, uma vez que os patamares de fixação da pena já são mais graves.

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Tratando-se de crime qualificado pelo resultado, estará consumado com a


produção de lesão grave/gravíssima na vítima, ainda que a subtração não se aperfeiçoe.

Nestes casos não se trata de crime preterdoloso, pois o agente quer


lesionar ou causa a morte para obter a subtração do bem.

No caso do inciso I é necessário que o agente pratique lesão corporal de


natureza grave ou gravíssima. Do contrário, não se constituirá a forma qualificada.

2.2.7.1. DO LATROCÍNIO (ART. 157, §3º, II, CP)

Trata-se de crime complexo (fusão de roubo e homicídio) e pluriofensivo


(ofensa ao patrimônio e vida). É hediondo, seja consumado ou tentado. É crime contra o
patrimônio, pois a ofensa à vida é meio para a subtração patrimonial.

A competência é do juízo singular (e não do Tribunal do Júri), conforme


Súmula 603 do STF.

SÚMULA Nº. 603, STF. A competência para o processo e julgamento de latrocínio é


do Juiz singular e não do Tribunal do Júri.

Para a caracterização do latrocínio é essencial que o agente empregue


dolosamente a violência contra a vítima e exista relação de causalidade entre a
subtração patrimonial e a morte. A violência empregada no latrocínio deve ser dolosa.

No Brasil considera-se o latrocínio consumado quando:

a) Subtração consumada e morte consumada;

b) Subtração tentada e morte consumada (Súmula 610 STF).

E se considera o latrocínio tentando quando:

a) Subtração tentada e morte tentada.

b) Subtração consumada e morte tentada.

O Latrocínio pode resultar em pluralidade de mortes, neste caso será


considerado como um crime único se o roubo é voltado contra um único patrimônio,
embora mais de uma vítima seja morta.

Todavia, se vários patrimônios forem atingidos e uma única ação resultar


a morte de diversas pessoas, o agente incorrerá em concurso forma impróprio, ou seja,
resultante de desígnios autônomos (art. 70, parte final do CP), portanto a pena será a
mesma do concurso material (somatório das penas).

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AULA DE DIREITO PENAL III

Segundo o STJ, não é possível o reconhecimento da continuidade delitiva


(art. 71 do CP) entre os crimes de roubo e latrocínio, por não serem delitos da mesma
espécie (embora sejam do mesmo gênero). Haverá concurso material de crimes.

2.2.8. CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA

Crime complexo e de dano quanto à objetividade jurídica; é um crime


comum e concurso eventual quanto ao sujeito ativo, de ação livre e comissivo quanto
aos meios de execução, material e instantâneo quanto ao momento consumativo e
doloso quanto ao elemento subjetivo.

2.2.9. AÇÃO PENAL

A ação penal é pública incondicionada.

2.3. EXTORSÃO

ART. 158, CP. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o
intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar
que se faça ou deixar de fazer alguma coisa:
Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.
§ 1º. Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma,
aumenta-se a pena de um terço até metade.
§ 2º. Aplica-se à extorsão praticada mediante violência o disposto no § 3º do artigo
anterior.
§ 3º. Se o crime é cometido mediante a restrição da liberdade da vítima, e essa
condição é necessária para a obtenção da vantagem econômica, a pena é de reclusão,
de 6 (seis) a 12 (doze) anos, além da multa; se resulta lesão corporal grave ou morte,
aplicam-se as penas previstas no art. 159, §§ 2º e 3º, respectivamente.

2.3.1. OBJETIVIDADE JURÍDICA

A extorsão é, por certo, crime contra o patrimônio. Na forma qualificada


também atinge como bens jurídicos a liberdade da vítima, a integridade corporal e a
vida, portanto, trata-se de crime pluriofensivo, pois tutela o patrimônio e a integridade
física e/ou a liberdade.

2.3.2 TIPO OBJETIVO

O verbo nuclear da conduta é “constranger” que significa retirar a


capacidade de autodeterminação, em virtude da violência ou da grave ameaça.

O crime de extorsão é classificado como formal, pois independe do


resultado naturalístico para a sua consumação, e instantâneo, de consumação antecipada
ou de resultado cortado (Súmula 96 do STJ). Assim, o delito se consuma

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independentemente da obtenção da vantagem indevida. Se obtida a vantagem,


constituirá mero exaurimento.

SÚMULA Nº. 96, STJ. O crime de extorsão consuma-se independentemente da


obtenção da vantagem indevida.

Segundo o STF, não é possível se reconhecera continuidade delitiva entre


o roubo e a extorsão, pois não são crimes de mesma espécie, embora seja do mesmo
gênero (crimes contra o patrimônio).

2.3.3. TIPO SUBJETIVO

A extorsão é um crime doloso onde o sujeito ativo tem a vontade de obter


vantagem econômica indevida mediante o emprego de violência ou grave ameaça contra
a vítima.

2.3.4. SUJEITOS

2.3.4.1. SUJEITO ATIVO: qualquer pessoa pode figurar como sujeito ativo de
extorsão.

2.3.4.2. SUJEITO PASSIVO: são vítimas do crime de extorsão são aquelas que sofrem
o constrangimento mediante a violência ou grave ameaça.

2.3.4. EXTORSÃO MAJORADA

São causas de aumento de pena na extorsão:

a) Se o crime cometido por duas ou mais pessoas:


necessariamente coautoria. Para a caracterização da
majorante, é preciso que os comparsas pratiquem atos
executórios. Não é necessário que sejam os coautores
imputáveis ou que todos sejam identificados.

b) Se o crime cometido com emprego de arma: prevalece o


entendimento de se tratar de arma em sentido amplo. O
simulacro de arma de fogo não se presta para a incidência
da majorante.

2.3.5. EXTORSÃO QUALIFICADA

São qualificadoras da extorsão:

1) A extorsão que tenha por resultado lesão grave ou


gravíssima, ou ainda, resultado morte.

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AULA DE DIREITO PENAL III

2) A extorsão com restrição da liberdade da vítima, a fim de


obter a vantagem econômica. A restrição liberdade da
vítima é momentânea e tão somente, suficiente para
obtenção da vantagem econômica, garantida pela própria
vítima. Ex. sequestro relâmpago, saidinha de banco.

2.4. EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO

ART. 159, CP. Sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer
vantagem, como condição ou preço do resgate:
Pena - reclusão, de oito a quinze anos.
§ 1º. Se o sequestro dura mais de 24 (vinte e quatro) horas, se o sequestrado é menor de
18 (dezoito) ou maior de 60 (sessenta) anos, ou se o crime é cometido por bando ou
quadrilha.
Pena - reclusão, de doze a vinte anos.
§ 2º. Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena - reclusão, de dezesseis a vinte e quatro anos.
§ 3º. Se resulta a morte:
Pena - reclusão, de vinte e quatro a trinta anos.
§ 4º. Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade,
facilitando a libertação do sequestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços.

2.4.1. OBJETIVIDADE JURÍDICA

Este crime é classificado como crime complexo, pois resulta da junção da


extorsão (art. 158 do CP) com o sequestro (art. 148 do CP).

2.4.2 TIPO OBJETIVO

Sequestrar significa privar da liberdade de locomoção por tempo


relevante. O tipo estabelece um especial fim de agir, consistente na obtenção, para si ou
para outrem, de qualquer vantagem. Apesar de não haver referência expressa à natureza
da vantagem, prevalece o entendimento de que deve ter caráter econômico e indevido,
visto se tratar de crime contra o patrimônio.

Ademais, temos hipótese de crime formal, que se consuma com a


privação da liberdade da vítima, independentemente da efetiva obtenção da vantagem.
Caso recebido o preço do resgate, haverá mero exaurimento.

Tem por característica, também, ser crime permanente, já que a


consumação se prolonga ao longo do tempo, enquanto perdurar a privação da liberdade
da vítima.

2.4.3. TIPO SUBJETIVO

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A extorsão mediante sequestro é um crime doloso onde o sujeito ativo


tem a vontade de obter vantagem indevida mediante o sequestro da vítima.

2.4.4. SUJEITOS

2.4.4.1. SUJEITO ATIVO: qualquer pessoa pode figurar como sujeito ativo de
extorsão mediante sequestro.

2.4.4.2. SUJEITO PASSIVO: são vítimas do crime de extorsão são aquelas que sofrem
privação de sua liberdade com o intuito de que sua soltura resulte do pagamento de um
resgate.

2.4.5. EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO QUALIFICADA

São circunstâncias qualificadoras do crime:

a) O sequestro durar mais de 24 horas;


b) O Sequestrado ser menor de idade ou pessoa idosa;
c) O crime ser cometido por associação criminosa (art. 288,
CP);
d) Se o crime resultar em lesão corporal de natureza
grave/gravíssima ou em morte.

2.4.6. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA

Caso haja colaboração premiada de um dos integrantes da associação


criminosa e que esta colaboração vier a facilitar a libertação do sequestrado, o
magistrado deverá reduzir a pena de um a dois terços, sendo um direito subjetivo do
criminoso.

2.4.7. AÇÃO PENAL

A ação penal é pública incondicionada.

2.5. EXTORSÃO INDIRETA

ART. 160, CP. Exigir ou receber, como garantia de dívida, abusando da situação de
alguém, documento que pode dar causa a procedimento criminal contra a vítima ou
contra terceiro:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.

De acordo com o art. 160, configura extorsão indireta a conduta de exigir


ou receber, como garantia de dívida, abusando da situação de alguém, documento que
pode dar causa a procedimento criminal contra a vítima ou contra terceiro.

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O tipo busca coibir atos torpes de credores (agiotas, especialmente) em


face de devedores.

Trata-se de um crime de ação múltipla ou de conteúdo variado, pois o


agente poderá praticá-lo por meio da exigência ou recebimento. Se incidir nos dois
verbos, no mesmo contexto fático, haverá crime único.

A exigência é a solicitação em tom de ameaça. No que tange ao receber,


parte do próprio sujeito passivo a iniciativa de oferecer a garantia.

Nas duas condutas é preciso que o sujeito ativo esteja abusando da


situação em que se encontra a vítima. Diante disso, o sujeito ativo exige da pessoa
algum documento que possa dar causa à instauração de processo criminal contra essa
pessoa ou contra um terceiro.

Há dolo de aproveitamento, isto é, abuso da situação de dificuldade,


vulnerabilidade da vítima. O crime é comum.

A consumação dependerá do núcleo do tipo. Na modalidade exigir, o


crime é formal, bastando a simples exigência para sua consumação. Já no núcleo
receber é crime material, consumando-se no momento em que o sujeito ativo recebe o
documento que pode dar origem ao processo criminal. Se, depois de obter o documento,
o agente efetivamente dá início ao procedimento criminal do qual sabe ser a vítima
inocente, há concurso material do crime de extorsão indireta com denunciação caluniosa
(art. 399 do CP).

A ação penal é pública incondicionada, cabendo a suspensão condicional


do processo e acordo de não persecução penal (art. 28-A do CPP).

2.6 CRIME DE USURPAÇÃO

Alteração de limites
ART. 161, CP. Suprimir ou deslocar tapume, marco, ou qualquer outro sinal
indicativo de linha divisória, para apropriar-se, no todo ou em parte, de
coisa imóvel alheia:
Pena - detenção, de um a seis meses, e multa.
§ 1º. Na mesma pena incorre quem:
Usurpação de águas
I - desvia ou represa, em proveito próprio ou de outrem, águas alheias;
Esbulho possessório
II - invade, com violência a pessoa ou grave ameaça, ou mediante concurso
de mais de duas pessoas, terreno ou edifício alheio, para o fim de esbulho
possessório.
§ 2º. Se o agente usa de violência, incorre também na pena a esta cominada.
§ 3º. Se a propriedade é particular, e não há emprego de violência, somente
se procede mediante queixa.
Supressão ou alteração de marca em animais

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Art. 162, cp. Suprimir ou alterar, indevidamente, em gado ou rebanho


alheio, marca ou sinal indicativo de propriedade:
Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa.

2.6.1 USURPAÇÃO POR ALTERAÇÃO DE LIMITES

2.6.1.1 OBJETIVIDADE JURÍDICA

Protege-se o patrimônio imobiliário (bens imóveis).

2.6.1.2 TIPO OBJETIVO

No crime de alteração de limites, a conduta típica consiste em suprimir


ou deslocar tapume, marco, ou qualquer outro sinal indicativo de linha divisória, para
que o criminoso possa se apropriar de coisa imóvel alheia.

2.6.1.3 TIPO SUBJETIVO

O crime é cometido somente na forma dolosa, consistente na vontade de


suprimir ou de deslocar o tapume ou sinal indicativo de linha divisória, devendo ter a
finalidade de apropriar-se no todo ou em parte da coisa imóvel alheia (especial fim de
agir).

2.6.1.4. SUJEITOS DO CRIME

O sujeito ativo é o proprietário, possuidor ou futuro comprador do imóvel


vizinho.

O sujeito passivo é proprietário ou possuidor cujas áreas vizinhas sejam


alteradas em razão da conduta criminosa do sujeito ativo.

2.6.1.5. CONSUMAÇÃO E TENTATIVA

O crime é de consumação antecipada, ou seja, é formal. Com a mera


supressão ou deslocamento da linha divisória já estará consumado, ainda que o sujeito
não consiga efetivamente se apoderar da coisa imóvel alheia.

Admite-se a tentativa.

2.6.1.6. AÇÃO PENAL

A ação penal pública incondicionada, sendo este um crime de menor


potencial ofensivo, sujeito, portanto, ao rito do Juizado Especial Criminal, com a
aplicação dos benefícios penais provenientes da Lei nº 9.099/95.

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2.6.2. USURPAÇÃO DE ÁGUAS

2.6.2.1. OBJETIVIDADE JURÍDICA

Protege-se o patrimônio imobiliário (bens imóveis), visto que protege o


curso e os veios de água de desvios e obstruções.

2.6.2.2 TIPO OBJETIVO

Incorre neste crime quem desvia ou represa, em proveito próprio ou de


outrem, águas alheias.

As águas são parte do solo (art. 79 do Código Civil), por essa razão são
equiparadas a bens imóveis.

Se a água é canalizada, passa a ser de propriedade da empresa


concessionária de serviço público. Se a água ingressa em reservatório particular, passa a
pertencer ao dono do reserva. Assim, se, após a canalização ou mantida em reservatório
particular, a água for subtraída, não haverá o crime de usurpação de água, mas sim furto
(art. 155 do CP).

2.6.2.3 TIPO SUBJETIVO

Este crime é cometido somente na forma dolosa.

2.6.2.4. SUJEITOS DO CRIME

O crime é comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa, não


necessariamente o vizinho. Criminaliza-se o impedimento de uso da água.

O sujeito passivo é o proprietário ou possuidor da água que foi desviada


ou represada.

2.6.2.5. CONSUMAÇÃO E TENTATIVA

O crime é formal, consumando-se quando há o desvio ou represamento


da água alheia, independentemente de um real proveito por quem represou ou desviou.

2.6.2.6. AÇÃO PENAL

A ação penal pública incondicionada, sendo este um crime de menor


potencial ofensivo, sujeito, portanto, ao rito do Juizado Especial Criminal, com a
aplicação dos benefícios penais provenientes da Lei nº 9.099/95.

2.6.3. USURPAÇÃO POR ESBULHO POSSESSÓRIO

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2.6.3.1 OBJETIVIDADE JURÍDICA

Protege-se o patrimônio imobiliário (bens imóveis).

2.6.3.2 TIPO OBJETIVO

No crime de usurpação por esbulho possessório incorre quem invade,


com violência a pessoa ou grave ameaça, ou mediante concurso de mais de duas
pessoas, terreno ou edifício alheio.

2.6.3.3 TIPO SUBJETIVO

O crime é cometido somente na forma dolosa, consistente na vontade de


suprimir ou de deslocar o tapume ou sinal indicativo de linha divisória, devendo ter a
finalidade de apropriar-se no todo ou em parte da coisa imóvel alheia (especial fim de
agir).

2.6.3.4. SUJEITOS DO CRIME

Trata-se de crime de concurso necessário, pois deve haver pelo menos 3


pessoas. É indiferente se o crime é praticado na zona urbana ou rural.

Qualquer pessoa poderá ser o sujeito ativo do crime (é comum). O sujeito


passivo é quem detém a posse legítima ou a propriedade do imóvel que sofre a invasão.

2.6.3.5. CONSUMAÇÃO E TENTATIVA

O delito se consuma no momento da invasão, que consiste no ingresso à


força, independentemente de o titular ficar privado da posse. Isto é, a partir do momento
que os invasores ingressam à força na propriedade, ainda que sejam repelidos
imediatamente e ainda que o titular não fique privado da posse, o crime já estará
consumado. Portanto, é crime formal.

Havendo o esbulho, se houver a alteração de limites (crime-meio), esta


ficará absorvida, pois é etapa necessária do esbulho cometido. Incide o princípio da
consunção ou absorção.

Se o sujeito ativo se utiliza da violência (§2º), haverá concurso material


do esbulho possessório com qualquer dos delitos contra a pessoa.

Admite-se a tentativa.

2.6.3.6. AÇÃO PENAL

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Nos termos do §3º, a ação penal, se a propriedade é particular, e não há


emprego de violência, será privada (somente se procede mediante queixa).

Por outro lado, sendo o esbulho cometido em propriedade pública, o


crime será de ação penal pública incondicionada. Da mesma forma, será de ação penal
pública incondicionada caso o crime de esbulho seja em propriedade particular e o
delito se dê por meio de violência.

2.6.4. USURPAÇÃO POR SUPRESSÃO OU ALTERAÇÃO DE MARCA EM


ANIMAIS

2.6.1.1 OBJETIVIDADE JURÍDICA

Tutela-se aqui a propriedade e a posse dos animais semoventes.

Premissa do crime em análise é que não tenha havido prévio furto ou


apropriação indébita dos animais, pois, nesses casos, o agente só será punido pela
conduta anterior, sendo a supressão ou alteração da marca um post factum impunível.

2.6.1.2 TIPO OBJETIVO

A conduta típica consiste em apagar ou modificar o sinal indicativo de


propriedade em gado ou rebanho alheios. Quando a lei se refere a gado, está protegendo
a propriedade de animais de grande porte em atividade pastoril ou pecuária.

A infração penal apenas existe quando a conduta se dá indevidamente


(elemento normativo do tipo), sendo óbvio que, quem compra legalmente o animal,
pode remarcá-lo sem incorrer no ilícito penal.

Por ausência de previsão legal, marcar animal alheio desmarcado não


constitui crime.

Marcas são feitas por ferro em brasa ou elementos químicos no couro do


animal. Em geral, são letras ou figuras. Sinais, em geral, são brincos colocados nas
orelhas ou no focinho do animal com formato característico.

Para que haja a configuração do crime, não basta que ocorra a supressão
ou a alteração, sendo necessário que essa supressão ou alteração da marca seja indevida.

Se o agente furta o animal e faz a alteração ou supressão da marca,


haverá a absorção do crime em estudo pelo furto qualificado, com base no princípio da
consunção. Em outras palavras, o crime de supressão ou alteração de marca ficará
absorvido pelo crime de furto qualificado de semovente domesticável de produção
(crime-fim, previsto no art. 155, §6º, CP). Assim, é necessário estar atento para verificar

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AULA DE DIREITO PENAL III

se não houve a prática de crime mais grave. Se o objetivo for de assenhoramento


definitivo, o crime é de furto qualificado.

2.6.1.3 TIPO SUBJETIVO

O crime admite apenas a forma dolosa.

2.6.1.4. SUJEITOS DO CRIME

O sujeito ativo qualquer pessoa, inclusive quem possui animal que


pertence a terceiro.

O sujeito passivo é o dono do animal.

2.6.1.5. CONSUMAÇÃO E TENTATIVA

A consumação se dá com a simples supressão ou alteração da marca ou


sinal, ainda que se dê apenas em relação a um animal.

A tentativa é possível, quando o agente não consegue concretizar a


remarcação iniciada, pela repentina chegada de alguém ao local, ou até mesmo quando
concretiza a remarcação, porém a faz de tal forma que continua sendo possível
identificar a marca do verdadeiro dono.

2.6.1.6. AÇÃO PENAL

A ação penal pública incondicionada, sendo este um crime de menor


potencial ofensivo, sujeito, portanto, ao rito do Juizado Especial Criminal, com a
aplicação dos benefícios penais provenientes da Lei nº 9.099/95.

2.7. DO DANO

ART. 163. CP. Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia:


Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
Dano qualificado
Parágrafo único - Se o crime é cometido:
I - com violência à pessoa ou grave ameaça;
II - com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não
constitui crime mais grave
III - contra o patrimônio da União, de Estado, do Distrito Federal, de
Município ou de autarquia, fundação pública, empresa pública, sociedade de
economia mista ou empresa concessionária de serviços públicos;
IV - por motivo egoístico ou com prejuízo considerável para a vítima:
Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa, além da pena
correspondente à violência.

2.7.1 OBJETIVIDADE JURÍDICA

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AULA DE DIREITO PENAL III

O bem jurídico protegido pelo art. 163 do CP é patrimônio das pessoas


físicas e jurídicas (propriedade e posse).

2.7.2 TIPO OBJETIVO

O tipo penal do crime de dano elenca três condutas típicas:


a) Destruir: é a mais grave das condutas em relação ao objeto
material, pois este deixa de existir em sua individualidade, é
extinto, eliminado. Ex.: derrubar uma casa; queimar livros;

b) Inutilizar: nesta modalidade o bem continua existindo, porém,


sem poder ser utilizado para finalidade a que se destina. Ex.:
quebrar os ponteiros de um relógio.

c) Deteriorar: o bem continua existindo e apto para suas funções,


contudo, com algum estrago parcial. Ex.: quebrar os vidros de um
carro.

A conduta de pichar, grafitar ou, por qualquer outro meio, conspurcar


edificação ou monumento urbano, constitui crime contra o meio ambiente, descrito no
art. 65, caput, da Lei n. 9.605/98.

Se o local pichado for imóvel rural ou bens móveis, haverá crime de


dano.
A doutrina salienta que, por falta de previsão legal, a conduta de dar
sumiço, fazer desaparecer coisa alheia, sem danificá-la, não constitui crime de dano.
Ex.: jogar um anel em um lago. É evidente, porém, que caracteriza ilícito civil.

O consentimento da vítima para a prática do dano exclui o delito, na


medida em que se trata de bem disponível, desde que a vítima seja pessoa capaz (maior
de idade e no gozo das faculdades mentais).

Pode ser coisa móvel ou imóvel, desde que tenha dono. A res nullius
(coisa que nunca teve dono) e a res derelicta (coisa abandonada) não podem ser objeto
de crime da dano, pois não podem ser tidas como coisa alheia. Quem as danifica não
comete ilícito penal. Já a coisa perdida (res deperdicta) tem dono, e quem dolosamente
a danifica ao encontrá-la comete crime de dano.

2.7.3 TIPO SUBJETIVO

O crime admite apenas a forma dolosa.

2.7.4. SUJEITOS DO CRIME

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O sujeito ativo qualquer pessoa, com exceção do dono da coisa


danificada.

O sujeito passivo é a pessoa que sofreu o prejuízo.

2.7.5. CONSUMAÇÃO E TENTATIVA

O crime de dano é material, isto é, a consumação ocorre quando


efetivamente se destrói, inutiliza ou deteriora a coisa alheia. Trata-se também de crime
não-transeunte, que deixa vestígios, marcas de existência. Daí decorre a necessidade de
prova pericial da materialidade, nos moldes do art. 158 do CPP.

É possível a tentativa (conatus).

2.7.6. DO DANO QUALIFICADO

São qualificadoras do crime de dano:

a) Emprego violência à pessoa ou grave ameaça. A violência se


volta contra pessoa e não contra a coisa. Há pluriofensividade da
conduta. A violência deve ser anterior ou concomitante ao dano; é
um meio para o agente danificar a coisa. Se posterior a violência,
poderá haver concurso de crimes (dano e lesão corporal), já que a
lei impõe o concurso material obrigatório nesse caso. A ameaça,
quando anterior ou concomitante, é absorvida pelo dano
qualificado. Se posterior, haverá concurso de dano e ameaça. A
ação penal é pública incondicionada.

b) Emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não


constitui crime mais grave. Nessa hipótese temos caso de
subsidiariedade expressa, pois o emprego de explosivo pode ser
meio de execução de um delito mais grave, como o homicídio. O
emprego de substância explosiva que qualifica o dano deve ser
anterior ou concomitante à prática do crime. Diferença em relação
aos crimes de incêndio (art. 250 do CP) e explosão (art. 251 do
CP): no crime de dano, o agente se limita a ofender o patrimônio
alheio. No incêndio e na explosão cria-se perigo comum a um
número indeterminado de pessoas. No caso do dano qualificado, a
intenção do agente é ofender o patrimônio específico daquela
vítima, não gerando perigo a outras pessoas.

c) Dano ao patrimônio público. O fundamento da qualificadora


reside na tutela do interesse coletivo na preservação dos bens
públicos, como os meios de transporte coletivos, presídios,
delegacias, hospitais. Segundo o STF, em regra, é inaplicável o

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princípio da insignificância. O STJ entende que o dano causado


ao patrimônio público em unidades prisionais com o intuito de o
preso fugir, não consitui o crime de dano, pois ausente o dolo
específico de deteriorar o patrimônio (animus nocendi), uma vez
que o intuito é alcançar a liberdade, sendo que o dano ao
patrimônio é mera atividade-meio para a obtenção do resultado
(liberdade).

d) Realizado por motivo egoístico ou com prejuízo considerável


para a vítima. A punição mais exacerbada se justifica no
individualismo excessivo e desprezo aos bens alheios de valores
mais altos. O motivo egoístico equivale ao torpe. O prejuízo
considerável será verificado no caso concreto, a depender não só
do valor do bem, mas sobretudo da situação econômico-financeira
da vítima.

2.7.7. AÇÃO PENAL

A ação penal no dano contém duas regras:

1) Em se tratando de dano simples, de dano qualificado pelo


motivo egoístico ou pelo prejuízo considerável à vítima, a ação
penal é privada.

2) Em se tratando de dano qualificado pelos demais motivos


(emprego de violência contra pessoa ou grave ameaça, substância
explosiva ou inflamável ou contra bens públicos, concessionárias
de serviços públicos ou sociedades de economia mista), a ação é
pública incondicionada.

2.8. INTRODUÇÃO OU ABANDONO DE ANIMAIS EM PROPRIEDADE


ALHEIA

Art. 164, CP. Introduzir ou deixar animais em propriedade alheia, sem


consentimento de quem de direito, desde que o fato resulte prejuízo:
Pena - detenção, de quinze dias a seis meses, ou multa.

2.8.1. OBJETIVIDADE JURÍDICA

O bem jurídico protegido é o patrimônio móvel ou imóvel das pessoas.

2.8.2. TIPO OBJETIVO

As condutas típicas são introduzir ou deixar animais em propriedade


alheia. A primeira delas é comissiva, exigindo que o agente coloque o animal na

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propriedade de outrem. A segunda é omissiva, em que o sujeito não retira o animal que,
por si só, entrou em terras alheias, quando estava ciente disso e poderia ter efetuado a
retirada.

O imóvel em questão pode ser urbano ou rural.

A configuração do delito exige, ainda que não haja consentimento de


quem de direito (elemento normativo).

2.8.3 TIPO SUBJETIVO

O crime admite apenas a forma dolosa.

2.8.4. SUJEITOS DO CRIME

O sujeito ativo qualquer pessoa que não tenha relação jurídica com a
propriedade e com o animal ao mesmo tempo.

O sujeito passivo é a pessoa que sofreu o prejuízo.

2.8.5. CONSUMAÇÃO E TENTATIVA

O crime é material, consumando-se no momento em que há o prejuízo. A


tentativa é possível.

2.8.6. AÇÃO PENAL

A ação penal é privada, sendo infração de menor potencial ofensivo, a


qual cabe transação penal e suspensão condicional do processo.

2.9. DANO EM COISA DE VALOR ARTÍSTICO, ARQUEOLÓGICO OU


HISTÓRICO

Tacitamente revogado pela Lei nº 9.605/98.

2.10. ALTERAÇÃO DE LOCAL ESPECIALMENTE PROTEGIDO

Este dispositivo também foi revogado pela Lei nº 9.605/98.

2.11. APROPRIAÇÃO INDÉBITA

2.11.1. OBJETIVIDADE JURÍDICA

O dispositivo tutela o patrimônio e eventualmente a posse. Conforme se


nota pelo tipo penal, o possuidor ou detentor atual é o autor do crime. É possível,

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entretanto, que o bem, antes de ser entregue ao agente, estivesse na legítima posse de
outra pessoa, hipótese em que está também será vítima.

2.11.2. TIPO OBJETIVO

A apropriação indébita é um crime normalmente marcado pela quebra de


confiança (embora não seja requisito do delito), uma vez que a vítima espontaneamente
entrega um bem ao agente e autoriza que ele deixe o local em seu poder, e este, depois
de estar na posse ou detenção, inverte seu ânimo em relação ao objeto, passando a se
comportar como dono. Em outras palavras, a vítima entrega uma posse ou detenção
transitórias ao agente, e ele não mais restitui o bem.

Portanto, é possível elencar quatro requisitos para a configuração do


crime de apropriação indébita:

a) Que a própria vítima entregue o bem ao agente de forma livre,


espontânea e consciente;

b) Que a posse ou detenção recebidas sejam desvigiadas;

c) Que o agente esteja de boa-fé no momento da tradição;

d) Que o agente inverta o ânimo em relação ao objeto que já está em


seu poder.

A apropriação indébita exige que a entrega deve se dar de forma livre,


espontânea e consciente. A entrega é livre e espontânea porque a vítima não pode ter
sido coagida, pois, se o fosse, o crime seria o de roubo ou extorsão. Deve ser consciente
porque a vítima não pode estar em erro, pois, se estiver, o crime será o de estelionato ou
de apropriação de coisa havida por erro.

Na apropriação indébita a vítima entrega o bem porque quer, à pessoa


certa e no montante correto. Não há medo de sua parte e nenhum tipo de engano. Por
isso é que se diz que na apropriação indébita o agente recebe uma posse ou detenção
lícita. Ao entrar na posse ou detenção ele não está cometendo nenhum crime, o que só
ocorrerá posteriormente quando resolver tornar sua a coisa alheia.

A apropriação indébita também exige que a posse ou detenção


necessariamente sejam desvigiadas, posto que, como já estudado, se forem vigiadas e
o agente tiver que tirar o bem do local sem autorização, o crime será o de furto.

É importante ressaltar que, para se considerar desvigiada a posse, basta


que a vítima entregue o bem ao agente e autorize que ele deixe o local em seu poder. É
o que ocorre quando um amigo empresta o carro para o outro fazer uma viagem.
Embora a vítima saiba perfeitamente a quem emprestou o veículo, a posse é considerada

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desvigiada simplesmente porque quem emprestou o automóvel autorizou o outro a


deixar o local em seu poder. Caso não haja restituição e se prove o dolo do agente,
haverá crime de apropriação indébita.

A doutrina é unânime em asseverar que, se o agente já recebe o bem de


má-fé, isto é, com intenção de dele se locupletar, o crime é o de estelionato, que é mais
grave. Por isso, ainda por exclusão, se conclui que, na apropriação indébita, o agente
recebe o bem de boa-fé, ou seja, com intenção de devolvê-lo à vítima ou dar-lhe a
correta destinação de acordo com a orientação recebida (entregá-lo a terceiro, efe tuar
pagamento etc.) e, só posteriormente, resolve dele se locupletar.

Assim, se a vítima resolve entregar a posse de um objeto ao agente e ele


já sabe que não irá devolvê-lo, entende-se que ele manteve a vítima em erro com o
silêncio e, por isso, responde por estelionato.

Quando ocorrer a inversão do ânimo de possuidor a proprietário da coisa,


é o momento em que se configura o ilícito penal, pois desaparece a boa-fé por parte do
agente e surge a má-fé, o dolo de se tornar dono daquilo de que é mero possuidor ou
detentor. A inversão de ânimo pode se manifestar de duas formas:

1) Pela prática de ato de disposição que somente poderia ser


efetuado pelo proprietário. Essa modalidade é chamada de
“apropriação propriamente dita”, casos em que se dá quando o
aliena ou negocia a coisa em seu poder.

2) Pela recusa na devolução do bem à vítima ou de entrega ao


destinatário a quem o bem fora direcionado. Essa figura de
apropriação indébita é conhecida como “negativa de restituição”.
Nessa forma de crime, o agente às vezes declara expressamente
que não irá devolver o bem, contudo, isso não é imprescindível,
pois é comum que o possuidor ou detentor desapareça com ele e
não seja mais localizado, hipótese em que o dolo de se apropriar
resta claro por seu comportamento e pelo tempo decorrido.

2.11.3. TIPO SUBJETIVO

O crime admite apenas a forma dolosa, onde o criminoso inverte o ânimo


sobre a coisa e passa a ter a vontade de ser dono (animus rem sibi habendi), não mais
desejando devolver a coisa ao verdadeiro dono.

2.11.4. SUJEITOS DO CRIME

O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa que tenha a posse ou detenção
lícita de uma coisa alheia.

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AULA DE DIREITO PENAL III

O sujeito passivo é a pessoa que sofreu o prejuízo.

2.11.5. CONSUMAÇÃO E TENTATIVA

Na apropriação “propriamente dita”, o delito se consuma no momento em


que o agente, de alguma maneira, exterioriza, dá sinais inequívocos de que passou a se
comportar como dono. Como se trata de uma ação, a tentativa é possível quando, por
exemplo, a venda não se concretiza.

Na apropriação por “negativa de restituição”, a consumação se dá quando


o agente deixa claro, de forma verbal, pelo prazo ou por seu comportamento, que não irá
devolver o bem. Por se tratar de modalidade omissiva, é incompatível com a figura da
tentativa.

2.11.6 APROPRIAÇÃO INDÉBITA MAJORADA

A apropriação indébita será majorada nas seguintes hipóteses:

 EM FACE DE TER RECEBIDO A COISA POR DEPÓSITO


NECESSÁRIO – o conceito de depósito necessário é encontrado
no art. 647 do Código Civil, sendo considerada a coisa em
depósito necessário quando o que se faz em desempenho de
obrigação legal ou o que se efetuar por ocasião de alguma
calamidade, como o incêndio, a inundação, o naufrágio ou o
saque.

 TER RECEBIDO A COISA NA QUALIDADE DE TUTOR,


CURADOR, SÍNDICO, LIQUIDATÁRIO,
INVENTARIANTE, TESTAMENTEIRO OU
DEPOSITÁRIO JUDICIAL. Tutor é a pessoa nomeada
judicialmente para administrar os bens do menor de idade que não
possua representante legalmente hábil. Curador é a pessoa
nomeada judicialmente para administrar os bens de pessoas com
deficiência mental. O liquidatário é atualmente chamado de
síndico, ou seja, é a pessoa responsável por administrar a massa
falida. Inventariante é a pessoa a quem compete a administração
da herança. Testamenteiro é quem tem a incumbência de
cumprir as disposições de última vontade contidas em testamento.
Depositário judicial, nos termos do art. 159 do Código de
Processo Civil, é a pessoa nomeada pelo juiz para a guarda e
conservação de bens penhorados, arrestados, sequestrados ou
arrecadados por ordem do juízo. Caso seja particular, responderá
por apropriação indébita com a pena aumentada. Caso, porém,
seja funcionário público, responderá por peculato.

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AULA DE DIREITO PENAL III

 EM RAZÃO DE OFÍCIO, EMPREGO OU PROFISSÃO.


Emprego é a prestação de serviço com subordinação e
dependência, que podem ou não existir no ofício ou profissão.
Ofício é a ocupação manual ou mecânica que supõe certo grau de
habilidade e que é útil e necessária à sociedade. Profissão se
caracteriza pela inexistência de qualquer vinculação hierárquica e
pelo exercício predominantemente técnico e intelectual.

2.11.7. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PRIVILEGIADA

Conforme dispõe o art. 170 do CP, em todas as hipóteses de apropriação


indébita é aplicável o privilégio como causa especial de diminuição de pena, nos moldes
do art. 155, § 2º, do CP (“se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa
furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a
dois terços, ou aplicar somente a pena de multa”).

2.11.8. AÇÃO PENAL

A ação penal é pública incondicionada.

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