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No processo C-353/06,
que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234. o CE,
apresentado pelo Amtsgericht Flensburg (Alemanha), por decisão de 16 de Agosto
de 2006, entrado no Tribunal de Justiça em 28 de Agosto de 2006, no processo
intentado por:
Stefan Grunkin,
sendo intervenientes:
Standesamt Niebüll,
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ACÓRDÃO DE 14. 10. 2008 — PROCESSO C-353/06
advogada-geral: E. Sharpston,
secretário: H. von Holstein, secretário adjunto,
profere o presente
Acórdão
1 O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação dos artigos 12. o CE e
18.o CE.
2 Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe S. Grunkin e D. R. Paul à
Standesamt Niebüll (Conservatória do Registo Civil de Niebüll), por esta recusar
reconhecer o apelido do seu filho Leonhard Matthias, tal como determinado e registado
na Dinamarca, e inscrevê-lo no livro de família aberto por eles nessa Conservatória.
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3 O § 10, n.o 1, da Lei que aprova o Código Civil (Einführungsgesetz zum Bürgerlichen
Gesetzbuch, a seguir «EGBGB») dispõe:
«Os nomes das pessoas regem-se pela lei do Estado da sua nacionalidade.»
Direito civil
(2) Se, no prazo de um mês após o nascimento do menor, os progenitores não tiverem
feito essa declaração, o Familiengericht [Tribunal de Família] transfere o direito de
escolha do apelido do menor para um dos progenitores. O n.o 1 aplica-se mutatis
mutandis. O tribunal pode fixar ao progenitor um prazo para o exercício desse
direito. Se o direito de escolher o apelido do menor não for exercido nesse prazo,
será atribuído ao menor o apelido do progenitor para o qual o direito foi
transferido.
(3) Quando o menor nascer fora do território alemão, o tribunal só transfere o direito
de escolher o apelido do menor, nos termos do n.o 2, se um progenitor ou o menor o
requererem, ou se tal for necessário para registar o apelido do menor no Registo
Civil alemão ou num documento de identificação alemão.»
9 A Standesamt Niebüll pediu então ao Amtsgericht Niebüll que atribuísse a um dos pais
do menor Leonhard Matthias o direito de determinar o seu apelido, em aplicação do
§ 1617, n.os 2 e 3, do BGB. Este tribunal suspendeu a instância e submeteu ao Tribunal de
Justiça um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.o CE. No seu acórdão
de 27 de Abril de 2006, Standesamt Stadt Niebüll (C-96/04, Colect., p. I-3561), o
Tribunal de Justiça considerou que o Amtsgericht Niebüll, que decidia em processo
gracioso, actuava como autoridade administrativa, sem ser também chamado a decidir
um litígio, pelo que não se podia considerar que exercia uma função jurisdicional. Por
essa razão, o Tribunal de Justiça julgou-se incompetente para responder à questão
submetida.
16 Com efeito, embora, no estado actual do direito comunitário, as regras sobre o apelido
das pessoas sejam da competência dos Estados-Membros, estes devem, no exercício
dessa competência, respeitar o direito comunitário, a menos que esteja em causa uma
situação interna que não tenha nenhuma conexão com o direito comunitário (v.
acórdão de 2 de Outubro de 2003, Garcia Avello, C-148/02, Colect., p. I-11613, n.os 25 e
26 e jurisprudência aí citada).
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ACÓRDÃO DE 14. 10. 2008 — PROCESSO C-353/06
17 Ora, o Tribunal de Justiça já declarou que essa conexão com o direito comunitário
existe no que respeita a menores nacionais de um Estado-Membro que residem
legalmente no território de outro Estado-Membro (v. acórdão Garcia Avello, já referido,
n.o 27).
19 No entanto, no que respeita ao artigo 12.o CE, há que começar por lembrar que, como
alegam todos os Estados-Membros que apresentaram observações ao Tribunal de
Justiça e a Comissão das Comunidades Europeias, o menor Leonhard Matthias não
sofre na Alemanha uma discriminação em razão da nacionalidade.
20 Com efeito, uma vez que o menor e os seus pais têm unicamente a nacionalidade alemã
e que, para a atribuição do apelido, a norma de conflitos alemã em causa no processo
principal se baseia no direito substantivo alemão em matéria de nomes, a determinação
do nome do menor, na Alemanha, de acordo com a lei alemã, não pode constituir uma
discriminação em razão da nacionalidade.
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GRUNKIN E PAUL
o
Quanto ao artigo 18. CE
21 Há que recordar que uma legislação nacional que é desfavorável a certos cidadãos
nacionais, pelo simples facto de terem exercido a sua liberdade de circular e
permanecer noutro Estado-Membro, constitui uma restrição às liberdades reconhe-
cidas pelo artigo 18.o, n.o 1, CE a qualquer cidadão da União (acórdãos de 18 de Julho
de 2006, De Cuyper, C-406/04, Colect., p. I-6947, n.o 39, e de 22 de Maio de 2008,
Nerkowska, C-499/06, Colect., p. I-3993, n.o 32).
23 Com efeito, há que recordar que o Tribunal de Justiça já declarou, a respeito de menores
com a nacionalidade de dois Estados-Membros, que uma diversidade de apelidos pode
causar sérios inconvenientes aos interessados, quer de ordem profissional quer de
ordem privada, resultantes, nomeadamente, das dificuldades de beneficiarem, no
Estado-Membro de que esses menores são nacionais, dos efeitos jurídicos de actos ou
de documentos lavrados sob o nome reconhecido noutro Estado-Membro de que
também possuem a nacionalidade (acórdão Garcia Avello, já referido, n. o 36).
25 Como refere a Comissão, muitos actos da vida quotidiana, tanto no domínio público
como no domínio privado, exigem a prova da identidade, prova essa normalmente feita
com o passaporte. Uma vez que o menor Leonhard Matthias apenas tem a
nacionalidade alemã, a emissão desse documento é da exclusiva competência das
autoridades alemãs. Ora, no caso de recusarem o reconhecimento do apelido
determinado e registado na Dinamarca, essas autoridades entregarão ao menor um
passaporte com um nome diferente daquele que recebeu neste último Estado-Membro.
26 Por conseguinte, sempre que o interessado tiver de fazer prova da sua identidade na
Dinamarca, Estado-Membro onde nasceu e reside desde essa data, pode ter de dissipar
dúvidas sobre essa identidade e afastar suspeitas de falsas declarações suscitadas pela
divergência entre, por um lado, o nome que utiliza desde sempre na vida quotidiana e
que consta dos registos das autoridades dinamarquesas e de todos os documentos
oficiais que lhe dizem respeito na Dinamarca, como, por exemplo, o assento de
nascimento, e, por outro, o nome que consta do seu passaporte alemão.
28 Ora, sempre que o nome utilizado numa situação concreta não corresponder ao que
consta do documento apresentado para prova da identidade de uma pessoa,
nomeadamente para beneficiar de uma prestação ou adquirir um direito, ou ainda
para demonstrar o sucesso em provas ou a aquisição de habilitações, ou nas situações
em que o nome que consta de dois documentos apresentados conjuntamente não é o
mesmo, essa divergência de apelidos pode suscitar dúvidas quanto à identidade dessa
pessoa e à autenticidade dos documentos apresentados ou à veracidade dos dados
contidos nesses documentos.
29 Um entrave à livre circulação como o que resulta dos sérios inconvenientes descritos
nos n.os 23 a 28 do presente acórdão só se pode justificar com base em considerações
objectivas e se for proporcionado ao objectivo legitimamente prosseguido (v., neste
sentido, acórdão de 11 de Setembro de 2007, Comissão/Alemanha, C-318/05, Colect.,
p. I-6957, n.o 133 e jurisprudência aí referida).
32 Com efeito, na medida em que a conexão com a nacionalidade tenha por objectivo
garantir que o nome de uma pessoa possa ser determinado de modo contínuo e estável,
há que observar, como referiu a Comissão, que, em circunstâncias como as do processo
principal, essa conexão leva a um resultado contrário do pretendido. Na verdade,
sempre que o menor atravessar a fronteira entre a Dinamarca e a Alemanha, terá outro
nome.
34 Por outro lado, há que observar que a conexão feita pelo direito internacional privado
alemão entre a determinação do apelido de uma pessoa e a sua nacionalidade tem
excepções. Com efeito, é pacífico que as normas de conflitos alemãs relativas à
determinação do nome de um menor permitem uma conexão com a residência habitual
de um dos progenitores quando este se encontrar na Alemanha. Assim, um menor que,
como os seus pais, não tenha a nacionalidade alemã pode, não obstante, ter na
Alemanha um apelido formado de acordo com a lei alemã, quando um dos seus
progenitores aí tiver a sua residência habitual. Na Alemanha, também poderá ocorrer
uma situação semelhante à do menor Leonhard Matthias.
35 O Governo alemão alega ainda que a lei nacional não permite a atribuição de apelidos
compostos, por razões de ordem prática. Entende que, com efeito, a extensão dos
nomes deve poder ser limitada. Entende ainda que o legislador alemão tomou medidas
para que a geração seguinte não seja obrigada a renunciar a uma parte do nome da
família. O que uma geração ganharia em liberdade, se fossem admitidos os nomes
duplos, seria perdido pela geração seguinte. De facto, esta já não disporia das mesmas
possibilidades de combinação que a geração anterior.
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GRUNKIN E PAUL
37 Por outro lado, como resulta da decisão de reenvio, o direito alemão não exclui
totalmente a possibilidade de se atribuírem apelidos compostos aos menores de
nacionalidade alemã. Como confirmou o Governo alemão na audiência, quando um
dos progenitores tem a nacionalidade de outro Estado, os pais podem optar por atribuir
o apelido do filho em conformidade com a legislação desse Estado.
38 Além disso, há que observar que no Tribunal de Justiça não foi evocada nenhuma razão
específica que, eventualmente, se oponha ao reconhecimento do apelido do menor
Leonhard Matthias, tal como atribuído e registado na Dinamarca, como o facto de esse
nome ser contrário à ordem pública na Alemanha.
Quanto às despesas
Assinaturas
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