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30Giorni | A virgindade de Maria: um “teologumeno”?

(de Ignace de la Potterie) 09/01/2024 12:50

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A virgindade de Maria: um “teologumeno”?


de Ignace de la Potterie

Em 392, realizou-se em Cápua um Concílio do


qual participou Santo Ambrósio. Foi convocado
para condenar solenemente um bispo que negava a
virgindade perpétua de Maria. Hoje, mil e
seiscentos anos depois, a mesma dúvida se insinua
traiçoeiramente no corpo eclesial, sem que o povo
católico e nem mesmo seus guias teológicos
percebam o que está acontecendo.
Na realidade, essa concepção herética começou a
se manifestar novamente há cento e cinquenta
anos, como consequência da célebre contraposição
entre o Jesus histórico e o Cristo da fé. Até agora,
ela esteve circunscrita aos meios protestantes. Os
professores da famosa Escola de Tübingen, que
foram os primeiros a formulá-la, eram protestantes.
A Annunciação, Fra Angélico, Museu do Prado,
Madri (à esquerda está representada a expulsão de Um documento conservado no arquivo de
Adão e Eva do Paraíso terrestre) Tübingen que mostra qual era o seu objetivo, por
sinal declarado várias vezes nos trabalhos oficiais:
se conseguirmos romper todos os laços que
existem entre a experiência dos primeiros discípulos de Jesus e as narrativas posteriores que chegaram até
nós, o caminho estará livre para reduzir o Evangelho a um “mitologumeno”.
Essa concepção do Evangelho como mito foi retomada nesse século mais uma vez no ambiente
protestante, pela Escola chamada da Formgeshichte, cujos fundadores são Bultmann e Dibelius, que em
um texto escrito em 1932 usou pela primeira vez o termo “teologumeno”. Era um artigo sobre a
concepção virginal de Maria, no qual Dibelius explicava que “teologumeno” é uma teoria teológica que
não tem nada a ver com fatos históricos. Segundo a Formgeshichte , os Evangelhos não são livros
históricos, mas narrativas de fatos que foram mitizados sob a influência da história das religiões.
Infelizmente, essa tese ainda está na moda. Só uma coisa mudou desde o tempo da Escola de Tübingen e
da Formgeshichte : surpreendentemente, quem fala hoje da concepção virginal de Maria e da
Ressurreição como “teologumeno” são autores católicos!
O fenômeno teve início logo depois do Concílio Vaticano II com o famoso Catecismo Holandês de 1966.
Ele não usa a palavra “teologumeno” mas diz que a narrativa evangélica da concepção virginal significa
simplesmente que Cristo é o dom de Deus à humanidade: ele é “inteiramente concebido pelo Espírito
Santo”. Mas neste caso não é mais “nascido da Virgem Maria”? Essa tese foi assumida por Edward
Schillebeeckx, por Raymond Brown e muitos autores até hoje. Muitos dizem que o nascimento de Jesus
se deu em um matrimônio normal e foi mais tarde mitizado. Jesus é teologicamente Filho de Deus, mas
fisicamente filho de José. Não é só o teólogo Eugen Drewermann, que está na moda entre os católicos, a
sustentar que as narrativas de Lucas e Mateus sobre a concepção de Maria estão ligadas a mitos orientais,
principalmente egípcios. O teólogo espanhol Xabier Pikaza disse: “O ‘teologumeno’ é um dado
primordial exclusivamente teológico. As leis naturais seguiram seu caminho. José manteve relações
conjugais com Maria, mas através desse contato inter-humano [!] se atualizava a mão potente de Deus, de
modo que a aparição do menino foi no fundo uma atuação definitiva do espírito divino, a gênese

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primordial do filho de Deus”. O que significa essa linguagem tão equívoca?


Muitos teólogos católicos estão de acordo com
Drewermann e Pikaza. Não querem aceitar a historicidade
da narrativa evangélica. Todavia, nenhum deles foi
realmente capaz de levar até o fim a sua reflexão crítica,
perguntando de onde vem este “mito” e o que poderia ter
sido historicamente esse “teologumeno”. Vale a pena notar
que nos mitos pagãos não existe nenhum exemplo de uma
mulher que concebe e permanece virgem. Como poderia
uma pobre jovem judia ter a pretensão de conceber o Filho
de Deus em um matrimônio normal, sendo a única na
história? Isso só pode ter sentido se é um fato real.
Hoje, porém, não é só a concepção virginal de Maria que
corre o risco de ser reduzida a um “teologumeno”: a
Ressurreição corporal de Jesus também é reduzida a um
simples mito. Talvez não seja por acaso que são discutidos
o início e o fim da vida de Cristo, ou seja, os dois polos nos
quais se baseia a encarnação. São dogmas fundamentais da
Igreja Católica, mas esses exegetas modernos não querem
levar em conta a Tradição. Eles separam a história e a fé. A Natividade, Fra Angélico, Museu de São
Quais são as consequências? O teólogo alemão Karl Marcos, Florença
Hermann Schelkle explica: “Se a teologia católica tivesse
que interpretar a concepção virginal como um ‘teologumeno’, muitas coisas deveriam mudar na Igreja.
Seria necessário reformular o tema da inerrância da Bíblia, deveríamos mudar a consciência dos fiéis e a
própria doutrina mariológica”1.
Só podemos dar um juízo negativo sobre a teoria do “teologumeno”, mas é inegável que os evangelistas
acreditavam que a concepção virginal foi um fato histórico (Cf. Lc 3, 23). Eles ficariam completamente
perturbados se vissem as tentativas de alguns teólogos “católicos” de hoje para naturalizar a encarnação.

1 K. H. Schelkle, Theologie des Neuen Testaments, II, Patmos Verlag, Düsseldorf 1973, p. 182.

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