Mayná Isabel Morais dos Santos - Número USP: 9777222
Capítulo 2 - O Estado de Direito e o Caráter Argumentativo do Direito.
Neil MacCormick.
1. Na parte introdutória do texto, MacCormick objetiva fazer algumas reflexões
sobre a retórica e a argumentação do direito, de modo a apresentar um possível caminho de reconciliação entre as duas. Assim, inicia o capítulo demonstrando a importância do Estado de direito face a ordem moral, de maneira que aquele tenha maior capacidade de proporcionar previsibilidade na vida das pessoas e razoável proteção contra intervenções arbitrárias no âmbito público e/ou privado. 1.1. O Estado de Direito não é apenas uma parte das regras de direito, visto que estas não são suficientes em si mesmas, mas também parte de um sistema jurídico. 1.1.1. Sistema que, em suas palavras, tenha um vasto corpo de regras enunciadas por autoridades, apoiadas por um grande corpo de precedentes registrados em compilações de decisões judicias, por discussões jurídicos-doutrinárias de princípios e valores abordados nesses precedentes e implícitos na legislação. 1.1.2. Por sua vez, a ordem moral por não ser pautada por um corpo de regras, tendem a ter julgamentos extremamente particularistas. 1.2. Contudo, MacCormick pondera que apesar da evidente importância do Estado de Direito para gerar maior segurança e certeza jurídica, isso não exclui suas incontroversas e suas questões problemáticas. 1.2.1. Tais como pelo fato do Estado de Direito ser reconhecido como um campo de argumentação, onde a retórica desenvolve sua arte. 1.2.2. A retórica é entendida como uma arte tanto elegante e persuasiva, quanto dúbia, na qual coloca em chefe as ideias de certeza e segurança jurídica que o Estado de Direito acarretaria as sociedades. 2. Nos dois seguintes tópicos, MacCormick parte de duas ideias que considera como dois lugares-comuns bem estabelecidos entre aqueles que pensam sobre o direito, quais sejam: o “caráter argumentativo do direito” e a ideologia do “Estado de Direito”. Por serem dois lugares-comuns que aparentemente se opõem, gera a indagação de se é possível concilia-los. 2.1. No primeiro lugar-comum, no caráter argumentativo do direito, o autor aduz que o direito está sujeito a argumentação, que apesar de nem sempre ser conclusiva, sempre será persuasiva. Ao deparar-se com uma questão ou problema jurídico, procura- se respostas e soluções que aparentam ser adequadas do ponto de vista do direito. 2.1.1. Para aprimorar e fortalecer a argumentação, é necessário testar as proposições que favorecem os dois lados das controvérsias, para poder imaginar os contra-argumentos e procurar pelo argumento ou os argumentos mais fortes de um lado e assim, poder testar a força dos argumentos de um determinado lado. 2.1.1.1. A opinião de alguém a respeito da força de um argumento dependerá: i) de uma avaliação da força correspondente do conjunto de argumentos em contrário; ii) da força ou peso da prova em relação aos fatos que estão questão e; iii) da probabilidade de se, provados, esses fatos se encaixem nos argumentos jurídicos. 2.1.1.2. O processo de avaliação da força relativa de argumentos concorrentes está, portanto, condicionada a opinião e de exigir julgamentos. Em algumas situações, não há como dizer com certeza qual argumento seja o mais forte. 2.2. O segundo lugar-comum é o Estado de Direito que, ao seu ver, possibilita a realização da dignidade dos seres humanos como participantes independentes, ainda que interdependentes, em atividades públicas e privadas dentro da sociedade. 2.2.1. Sendo a dignidade e a independência-dentro-da-interdependência, considerados como valores humanos e morais fundamentais. 3. Para alcançar a supracitada reconciliação, a primeira estratégia apresentada é a necessidade do reconhecimento de um freio fundamental no processo de argumentação jurídica, sugerido por Robert Alexy. 3.1. Consiste em dizer que a argumentação seja reconhecida como um caso especial do raciocino prático em geral, devendo se conformar com as condições de racionalidade e razoabilidade que se aplicam a todos os tipos de razão prática, ou ao menos que não haja asserções sem razão. 3.1.1. A argumentação retórica não deve ser algo que reduza a aceitabilidade de um argumento a seu efetivo caráter persuasivo. Para combater esta ideia, inicialmente, MacCormick aduz não ser possível relacionar a persuasão a um auditório ideal ou universal e por fim, apresenta algumas abordagens “crítica” do pensamento jurídico do final do século XX, a teoria retórica. 3.1.1.1 Teoria que sustenta que a exigência de adequação objetiva dos argumentos jurídicos representaria o maior dos golpes retóricos. Para chegar a uma decisão justificada, seria por meio de referência a considerações de ideologias externas ao direito. 3.2. Ato contínuo, MacCormick passa a apresentar as teorias procedimentais da razão, que fornece uma solução parcial ao problema relativo à consideração daquilo que seja persuasivo em um sentido objetivo, nas quais preocupam-se com a compreensão dos limites à razão prática que precisam ser reconhecidos para apresentar conclusões racionalmente aceitáveis em um contexto interpessoal. 3.2.1. O ponto de partida seria a ênfase dos retóricos no contexto interpessoal da argumentação e a análise da dupla função da universalização da razão. 3.2.1.1. Para testar proposições praticas por referência, ao menos em princípio, aos interesses, sentimentos e visões da totalidade das pessoas afetadas ou preocupadas com elas, conforme sugestão de Habermas, é possível propor um teste por meio da referência ao diálogo em uma “situação ideal de fala”, que todas as formas de coerção ou poder interpessoal ou dominação são postas de lados para os propósitos de conduzir um discurso interpessoal. 3.2.1.2. É justamente a análise dos freios necessários a esse discurso que produz a abordagem procedimental, que objetiva testar os tipos de princípios que debatedores racionais poderiam aceitar, reconhecendo os tipos de desejos e interesses que eles têm na realidade. 3.2.1.2.1. Os princípios aceitáveis ou lugares-comuns (topoi) devem ser passiveis de questionamentos, a qual serão aceitáveis até serem questionados com sucesso, questionamentos fundados na impossibilidade de eles passarem no teste da universalizabilidade ou de terem suas origens de poder social passadas ou presentes que teria que ser rejeitadas em uma situação ideal de fala. 3.2.2. O procedimento de testar procedimentalmente os argumentos aparenta correr o risco de levar a uma regressão infinita, o que permite que a análise das demandas sobre aquilo que seja razoável à luz dos limites reconhecidos para o discurso racional. Assim, os princípios continuariam sendo pontos de partidas, mas que podem ser questionados por meio da argumentação. 3.2.2.1. O corpo de pensamento prático e de compromissos internamente consistentes e que possua uma certa coerência geral, devem possuir os princípios e regras de decisões e de conduta que alguém adota. O que acarreta referências quanto as ordens de prioridade e procedimentos destinados a determinar o peso relativo das razões práticas de maneira a resolver os conflitos prima-facie entre elas. 3.2.3. Em uma discussão jurídica é necessários materiais para guiar e justificar as decisões, bem como para restringir o espectro dentro do qual as decisões dos agentes públicos podem ser feitas legitimamente. 3.2.3.1. Os materiais seriam as constituições, os tratados, as leis dos Parlamentos nacionais e subnacionais, as regulações e diretivas de entidades supranacionais, e os repertórios de decisões judiciais, reconhecidos em alguns sistemas como “precedentes”, no sentido de consistirem em uma “fonte formal do direito”. 3.3. Levando em consideração que os governos dos estados nações detêm poderes de autoridades sobre os demais, é de suma importância que sejam estabelecidos limites para que seus atos não serem discricionários, respeitando os limites impostos por diversas disposições. 3.3.1. As regras são as disposições quando podem ser derivadas de outros materiais como precedentes, em termos razoavelmente bem definidos e em contraposição aos demais tipos de normas. 3.3.2. Para MacCormick, as regras jurídicas são, portanto, disposições normativas estabelecidas ou interpretadas a partir de uma fonte jurídica reconhecida, sendo de sua natureza estabelecer que todo fato operativo terá uma consequência normativa, em forma padrão de implicação, “sempre que FO, então CN”. 3.3.2.1. O que ao seu ver, seria algo mais preciso que o modelo de universalizar os fundamentos da ação em uma situação que se exigiria uma tomada de uma decisão prática, em pensar que em uma decisão “D” que se justificaria sempre que certas circunstancia “C” ocorressem. Isto porque, todas as regras jurídicas seriam relevantes para as decisões, mas nem todas elas o são de forma direta. 3.3.3. Os processos jurídicos são permeados por certezas que são passiveis de questionamento, de modo que as pretensões ou acusações não podem ser apresentadas sem citação adequada das bases jurídicas que as suportam e sem fazer referência as alegações de fato.