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DION PASIEVITCH
DION PASIEVITCH
Código Logístico
ISBN 978-65-5821-028-3
IESDE BRASIL
2021
© 2021 – IESDE BRASIL S/A.
É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito do autor e
do detentor dos direitos autorais.
Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: devotchkah/ Envato Elements
Pasievitch, Dion
Aritmética / Dion Pasievitch. - 1. ed. - Curitiba [PR] : IESDE, 2021.
144 p. : il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-65-5821-028-3
5 Congruências 120
5.1 O pequeno teorema de Fermat 120
5.2 Congruências módulo m 123
5.3 Inteiros módulo m 127
5.4 O teorema chinês dos restos 137
6 Gabarito 141
APRESENTAÇÃO
Vídeo
A aritmética aborda conceitos que estão presentes na formação
acadêmica de todas as pessoas, desde o ensino básico. Entre estes
conceitos, os principais são aqueles que envolvem operações algébricas
com números naturais ou inteiros. Igualmente importante é a possibilidade
de comparar esses dois conjuntos numéricos. Todos esses assuntos estão
presentes no dia a dia e, para compreendê-los efetivamente, é necessário
estudar aritmética sob uma perspectiva mais formal.
Esta obra está organizada em cinco capítulos. O primeiro deles trata
de algumas noções preliminares as quais supomos conhecidas, mas que
são desenvolvidas para fixar notações e discorrer com rigor sobre a teoria.
Além disso, são relembrados os conceitos de conjuntos e funções, com
ênfase especial na teoria das relações. Em particular, relações de ordem e
de equivalência são discutidas cuidadosamente, pois constituem aspectos
fundamentais para o bom entendimento da teoria.
O segundo capítulo introduz o conjunto dos números naturais de
maneira axiomática, por meio dos axiomas de Peano. Partindo dessa
abordagem, definimos as operações algébricas usuais do conjunto dos
números naturais – a adição e a multiplicação – e demonstramos suas
propriedades rigorosamente. Em seguida, discutimos a ordem natural do
conjunto dos números naturais e apresentamos os princípios da tricotomia
e da boa ordenação, ambos resultados bastante relevantes do ponto de
vista teórico.
O terceiro capítulo aborda o conjunto dos números inteiros e suas
operações algébricas – adição, multiplicação e subtração –, além de sua
ordem natural, herdada do conjunto numérico apresentado no capítulo
anterior. Adotamos uma abordagem construtiva, em que o conjunto dos
números inteiros é construído com base no conjunto dos números naturais
por meio de uma relação de equivalência específica. Isso permite que a
adição, a multiplicação e a ordenação sejam definidas nos termos presentes
no conjunto dos números naturais. Adicionalmente, é introduzida a
subtração de inteiros. Por fim, discutimos a versão do princípio da tricotomia
para o conjunto dos inteiros e a noção de valor absoluto.
O quarto capítulo aborda a aritmética no conjunto dos números naturais
e inteiros. Em ambos os conjuntos, vamos definir a relação de divisibilidade,
demonstrar suas propriedades e deduzir vários resultados importantes.
Dentre eles, destacam-se o teorema fundamental da aritmética e o teorema
que mostra a existência de infinitos números primos. Esse último resultado
é consequência do teorema da decomposição em fatores primos, o qual é
demonstrado cuidadosamente.
O quinto e último capítulo apresenta tópicos adicionais que ampliam o
escopo e o entendimento da teoria. Destacam-se o pequeno teorema de
Fermat e o teorema chinês dos restos, e a sua conexão com congruências
lineares. Também são abordados os inteiros módulo m. Esse assunto, em
particular, é bastante relevante para outras disciplinas de álgebra, dado que
fornece um modelo de grupo abeliano finito.
Os exercícios foram escolhidos de modo a auxiliar no entendimento dos
tópicos tratados ao longo desta obra. Em geral, apenas a leitura da teoria será
suficiente para respondê-los. Enfatizamos que a resolução de exercícios é
fundamental para aprender novos conceitos em matemática. Sendo assim,
deve-se formar o hábito de praticar a teoria discutida com os exercícios,
pois, além de possibilitar que os tópicos sejam revisados, essa prática
contribui para o desenvolvimento do raciocínio lógico-matemático-formal.
Esperamos que esta obra contribua com o aprimoramento do
pensamento matemático e que seja suficientemente interessante para
motivar a busca por novos conhecimentos, não somente do campo da
aritmética, mas de outras áreas. Além disso, os tópicos discutidos aqui
configuram em introdução e motivação para o estudo de diversos outros
conteúdos nas teorias de grupo, anéis e corpos, e na teoria de números.
.
1
Teoria elementar
dos conjuntos
A teoria de conjuntos e seus desdobramentos constituem os funda-
mentos da matemática. É por meio da noção de conjuntos que é possível
definir relações, funções e formalizar diversos conceitos. Neste estudo, é
primordial que você adquira uma boa familiaridade com a teoria de con-
juntos, mesmo que no nível mais elementar. Pensando nisso, este capí-
tulo apresentará a teoria ingênua dos conjuntos, com ênfase na teoria
das relações, abrangendo os conceitos de função, relações de ordem e
de equivalência – assuntos fundamentais para o bom entendimento da
aritmética.
Entretanto, cabe destacar que o assunto da teoria de conjuntos não
será encerrado neste capítulo. Tal tarefa seria impossível. O objetivo cen-
tral é relembrar alguns conceitos elementares estudados em outras disci-
plinas e fixar a notação.
1.1 Conjuntos
Vídeo Nesta seção, discutiremos noções básicas da teoria ingênua dos conjuntos. O
qualificador ingênua é utilizado para distinguir essa teoria da teoria axiomática dos
conjuntos. No nível ingênuo, aceitamos a noção de conjunto de maneira intuitiva;
já no nível axiomático, desenvolvemos a teoria rigorosamente desde o princípio por
meio dos axiomas, por exemplo, dos axiomas de Zermello-Frankel. Entretanto, essa
abordagem axiomática foge ao escopo desta obra e, portanto, a exposição feita
abrange exclusivamente a teoria ingênua dos conjuntos.
B = {1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9}
B = {1, 2, 3, …, 9}
C = {1, 2, 3, …}
denota o conjunto dos números inteiros positivos. Nesse caso, uma quantidade
infinita de elementos foi omitida.
X = {2, 4, 6, 8, …}
X = {x | P(x)}
10 Aritmética
que lemos “x tal que P(x)”, sendo P(x) alguma propriedade sobre x. Qualquer objeto
x que torne a propriedade P(x) válida fará parte do conjunto X, ou seja, será um
elemento de X.
Definição
Seja X = {x | P(x)} um conjunto e x um objeto, são válidas as afirmações:
I. Se x satisfaz a propriedade P(x), isto é, se P(x) é uma proposição verdadeira, escrevemos x ∈ X
e dizemos que x pertence a X.
II. Se x não satisfaz a propriedade P(x), isto é, se P(x) é uma proposição falsa, escrevemos x ∉ X
e dizemos que x não pertence a X.
X = {x ∈ U | P(x)}
X = {x ∈ ℝ | P(x)}
Σxemρlo 1
x2 – 2x – 3 ⇒ 12 – 2 ⋅ 1 – 3 = 1 – 2 – 3 = –4 ≠ 0
Sendo assim, 1 ∉ X, já que 1 não satisfaz a propriedade que define X. Agora, note
que, por exemplo, se x = 3, temos que
x2 – 2x – 3 ⇒ 32 – 2 ⋅ 3 – 3 = 9 – 6 – 3 = 0
Definição
Sejam X e Y conjuntos. Dizemos que X está contido em Y e escrevemos X ⊂ Y, se todo elemento
de X é um elemento de Y. Caso X não esteja contido em Y, escrevemos X ⊄ Y.
Dizer que X não está contido em Y significa que existe pelo menos um elemento
de X que não é elemento de Y. O seguinte exemplo ilustra a relação de inclusão.
Σxemρlo 3
12 Aritmética
Σxemρlo 4
Definição
Sejam X e Y dois conjuntos com o mesmo universo. Dizemos que X é igual a Y caso X ⊂ Y e
Y ⊂ X. Neste caso, escrevemos X = Y.
Em outras palavras, a definição anterior enuncia que dois conjuntos são iguais
se, e somente se, eles possuem os mesmos elementos.
Σxemρlo 5
X=Y
x2 + x – 2 ⇒ (–2)2 + (–2) –2 = 4 – 2 – 2 = 0
e se x = 1, então
x2 + x – 2 ⇒ 12 + 1 – 2 = 1 + 1 – 2 = 0
x2 + x – 2 = 0
(Continua)
Definição
Sejam X e Y conjuntos definidos em um mesmo universo U. Definimos:
I. A interseção de X e Y como o conjunto
X∩Y = {x ∈ U | x ∈ X e x ∈ Y}
Lemos o conjunto X∩Y como “x inter y”.
II. A reunião de X e Y como o conjunto
X∪Y = {x ∈ U | x ∈ X ou x ∈ Y}
III. Caso X ⊂ Y, o complementar de X em relação a Y como o conjunto
Y∖X = {x ∈ U | x ∈ Y e x ∉ X}
IV. O complementar de X como o conjunto
Xc = {x ∈ U | x ∉ X}
Σxemρlo 6
14 Aritmética
O próximo exemplo envolve um raciocínio mais elaborado. Livro
Σxemρlo 7
Nesta seção, serão discutidos os tópicos necessários para que seja possível
compreender plenamente os conceitos de funções, relações de ordem e relações
de equivalência. Esses conceitos estarão presentes durante toda sua formação em
Matemática. O ponto de partida é a definição de produto cartesiano de conjuntos.
Definição
Sejam X e Y conjuntos. O produto cartesiano de X por Y é o conjunto
X × Y ≔ {(x, y) | x ∈ X e y ∈ Y}
Os elementos (x, y) deste conjunto são denominados pares ordenados.
Definição
Dizemos que dois pares ordenados (x, y) e (z, w) de X × Y são iguais e escrevemos (x, y) = (z, w)
se, e somente se, x = z e y = w, ou seja,
(x, y) = (z, w) ⇔ x = z e y = w
Σxemρlo 8
Note que, por exemplo, (a, 1) ∈ X × Y, mas (1, a) ∉ X × Y. De fato, (1, a) não poderia
pertencer ao conjunto X × Y, visto que 1 ∉ X. Contudo, note que
16 Aritmética
Σxemρlo 9
Σxemρlo 10
ℝ × ℤ = {(x, y) | x ∈ ℝ e y ∈ ℤ}
Mas afinal, qual é a utilidade prática para o produto cartesiano de dois conjun-
tos? A grande utilidade está no fato de que o produto cartesiano permite capturar
relações existentes entre dois conjuntos. Para elaborar a respeito, é necessário de-
finir o que se entende por relação entre conjuntos.
Definição
Sejam X e Y conjuntos. Uma relação de X em Y é um subconjunto
ℛ ⊂ X ×Y
Nesse caso, se (x, y) ∈ ℛ, dizemos que x se relaciona com y por meio de ℛ, e escrevemos xℛy
(lê-se x “erre” y). Caso X = Y, dizemos que ℛ é uma relação em X.
ℛ = {(x, y) ∈ X × Y | xℛy}
Σxemρlo 11
X × Y = {(a,1), (b,1)}
Caso um dos conjuntos X ou Y seja infinito não é possível listar todas as rela-
ções possíveis de X em Y, dado que, nessa situação, existem infinitos subconjuntos
de X × Y. No entanto, é possível trabalhar com relações nessa situação, conforme
exemplificado a seguir.
Σxemρlo 12
Sejam X = ℝ e Y = ℝ. Considere
ℛ ≔ {(x, y) ∈ ℝ × ℝ | x + y = 1}
Porém, 0 (zero) não se relaciona com 2 por meio de ℛ, mesmo que (0, 2) ∈ ℝ × ℝ.
De fato, temos que 0 + 2 = 2 ≠ 1 e, portanto, (0, 2) ∉ ℛ. É conveniente escrever a
relação ℛ como
ℛ = {(x, 1 – x) | x ∈ ℝ}
18 Aritmética
Em particular, é possível interpretar geometricamente a relação ℛ. Para isso,
desenhe dois eixos ortogonais em um plano. O eixo horizontal representará o con-
junto das primeiras entradas dos pares pertencentes a ℛ, enquanto o eixo vertical
representará o conjunto das segundas entradas dos pares pertencentes a ℛ. A re-
lação ℛ corresponde à reta passando pelos pontos (0, 1) e (1, 0), respectivamente,
conforme ilustramos na Figura 1.
Figura 1
Reta que representa a relação ℛ
0 1 ℝ
Definição
Seja X um conjunto e ℛ uma relação em X. Dizemos que ℛ é uma relação:
I. Reflexiva, se xℛx, para todo x ∈ X.
II. Simétrica, se dados x, y ∈ X, tais que xℛy, então yℛx.
III. Antissimétrica, se dados x, y ∈ X, tais que xℛy e yℛx, então x = y.
IV. Transitiva, se dados x, y, z ∈ X, tais que xℛy e yℛz, então xℛz.
Note que as propriedades I, II e III não teriam sentido no caso de uma relação
ℛ ⊂ X × Y com X ≠ Y. Essa é a razão pela qual restringimo-nos às relações em X.
Σxemρlo 13
ℛ = {(1, 1), (1, 3), (2, 2), (2, 3), (3, 3)}
Essa relação é reflexiva, pois 1ℛ1, 2ℛ2 e 3ℛ3, ou seja, xℛx, para todo x ∈ X.
Σxemρlo 14
xℛy ⇔ x + y = 12
ℛ = {(x, y) ∈ X × X | x + y = 12}
mas isso não é estritamente necessário para a discussão. Temos que essa relação
é simétrica, pois se x, y ∈ X são tais que xℛy, então
x + y = 12
e, portanto,
y + x = 12
ou seja, yℛx.
Contudo, a relação
x𝒮y ⇔ x divide y
não é simétrica. De fato, temos que, por exemplo, 3𝒮6, já que 3 divide 6, mas 6 não
se relaciona com 3 por meio de 𝒮, dado que 6 não divide 3.
Σxemρlo 15
xℛy ⇔ x divide y
Essa relação é antissimétrica, pois, se xℛy e yℛx, temos que x divide y e y divide x.
Isso só pode acontecer caso x = y. No exemplo anterior, mostramos que ℛ não é
simétrica.
Σxemρlo 16
T1ℛT2 ⇔ T1 é semelhante a T2
(Continua)
20 Aritmética
Essa é uma relação transitiva. De fato, se T1, T2 e T3 são triângulos tais que T1ℛT2
e T2ℛT3, então T1 é semelhante a T2 e T2 é semelhante a T3. Logo, utilizando a geo-
metria plana, segue que T1 é semelhante a T3, ou seja, T1ℛT3, mostrando assim a
transitividade.
Definição
Sejam X e Y conjuntos e ℛ ⊂ X × Y uma relação de X em Y. Então:
I. O domínio de ℛ é o conjunto
D(ℛ) ≔ {x ∈ X | ∃ y ∈ Y; xℛy}.
II. O conjunto de partida de ℛ é o conjunto X.
III. O conjunto de chegada ou contradomínio de ℛ é o conjunto Y.
IV. A imagem de ℛ é o conjunto
I(ℛ) ≔ {y ∈ Y | ∃ x ∈ X; xℛy}.
Σxemρlo 17
Considere os conjuntos
xℛy ⇔ y = 2x
Nessa situação,
= {(1, 2), (2, 4), (3, 6), (4, 8), (5, 10)}
(Continua)
D(ℛ) = {1, 2, 3, 4, 5} = X
Σxemρlo 18
xℛy ⇔ x2 + y2 = 1
Nesse caso,
Consequentemente,
D(ℛ) = {–1, 0, 1} ≠ X
enquanto
I(ℛ) = {–1, 0, 1} = Y
Definição
Sejam X e Y conjuntos e ℛ ⊂ X × Y uma relação. A inversa de ℛ é a relação
ℛ–1 ⊂ Y × X
definida por
yℛ–1x ⇔ xℛy
com x ∈ X e y ∈ Y.
Em termos de conjuntos, é possível escrever a relação inversa de ℛ como
ℛ–1 = {(y, x) ∈ Y × X | (x, y) ∈ ℛ}
Em outras palavras, ℛ–1 é obtida por meio de ℛ invertendo-se a ordem dos pares
ordenados pertencentes a ℛ. Vamos ilustrar isso com um exemplo.
22 Aritmética
Σxemρlo 19
Neste caso,
No âmbito das relações, há uma operação entre elas que merece destaque. É a
operação de composição de relações, definida a seguir.
Definição
Sejam X, Y e Z conjuntos e ℛ ⊂ X × Y e 𝒮 ⊂ Y × Z relações. Definimos a composta de ℛ e 𝒮,
denotada por 𝒮 ∘ ℛ (lê-se “s bola r”) como a relação de X em Z definida por
x𝒮 ∘ ℛz ⇔ ∃ y ∈ Y, tal que xℛy e yℛz
com x ∈ X e z ∈ Z.
Em termos de conjuntos, é possível escrever a relação S ∘ ℛ como
𝒮 ∘ ℛ = {(x, z) ∈ X × Z | ∃ y ∈ Y; (x, y) ∈ ℛ e (y, z) ∈ 𝒮}
Note que, por definição, 𝒮 ∘ ℛ é uma relação de X em Z. Além disso, para que te-
nha sentido, é necessário que o conjunto de chegada de ℛ coincida com o conjunto
de partida de 𝒮.
Σxemρlo 20
ℛ = {(1, m), (1, n), (2, m), (3, q), (4, q)} ⊂ X × Y
Note que para obter 𝒮 ∘ ℛ basta observar atentamente aqueles pares em ℛ cuja
segunda entrada aparece como primeira entrada dos pares em 𝒮.
Para finalizar esta seção, vamos introduzir uma relação especial, denominada
relação identidade. Ela é importante na discussão de funções.
Definição
Seja X um conjunto. A identidade de X é a relação em X definida por
xℛy ⇔ x = y
sendo x, y ∈ X.
Em termos de conjuntos, idX = {(x, x) | x ∈ X}
Livro
Σxemρlo 21
O livro Relações binárias,
escrito Edgard de Alencar
Filho, é excelente para Se X = {a, b}, então idX = {(a, a), (b, b)}.
aprofundar o conhecimen-
to a respeito dessas rela-
ções. A obra é recheada
de exemplos e exercícios,
sendo um complemento
Note que se ℛ ⊂ X × Y é uma relação qualquer, então
perfeito para os tópicos
estudados nessa seção. ℛ ∘ idX = ℛ e idY ∘ ℛ = ℛ
FILHO, E. A. São Paulo: Nobel, 1984.
Em outras palavras, compor uma relação com a identidade não tem qualquer
efeito.
1.3 Funções
Vídeo Anteriormente, apresentamos alguns tipos de relações que existem em um
mesmo conjunto: reflexiva, simétrica, antissimétrica e transitiva. E quanto ao caso
de relações entre conjuntos distintos? Nessa situação, as relações mais relevantes
são as funções. Em particular, toda função é uma relação, conforme será definido
a seguir.
24 Aritmética
Definição
Sejam X e Y conjuntos. Uma função de X em Y é uma relação f ⊂ X × Y tal que:
I. Para todo x ∈ X, existe y ∈ Y tal que xfy.
II. Se x ∈ X, y, y’ ∈ Y são tais que xfy e xfy’, então y = y’.
Nesse caso, escrevemos y = f(x) para significar xfy e a relação f ⊂ X × Y é denotada por f: X → Y.
Σxemρlo 22
xfy ⇔ y = x2
II. Se x, y, y’ ∈ ℝ são tais que xfy e xfy’, então y = x2 e y’ = x2, implicando em y = y’.
Σxemρlo 23
Seja X um conjunto e idX a relação identidade. Temos que idX é uma função. De
fato,
idX = {(x, x) | x ∈ X}
e, portanto, D(idX) = X. Além disso, se x, y, y’ ∈ X são tais que (x, y), (x, y’) ∈ idX, então,
pela definição de idX, segue que y = x = y’.
(Continua)
É importante ilustrar que nem toda relação constituirá uma função. Isso é feito
no exemplo a seguir.
Σxemρlo 24
xfy ⇔ x2 + y2 = 1
Nesse caso,
f = {(x, y) ∈ ℝ × ℝ | x2 + y2 = 1}
–1 1
Embora f seja uma relação em ℝ, f não é uma função. De fato, considerando, por
exemplo, x = –2, não existe y ∈ ℝ tal que xfy. Em particular, a definição de função
não fica satisfeita.
26 Aritmética
Definição
Sejam X e Y conjuntos. Dizemos que uma função f: X → Y é:
I. Injetora, se para todo x, y ∈ X tais que x ≠ y, temos f(x) ≠ f(y).
II. Sobrejetora, se para todo y ∈ Y, existe x ∈ X tal que y = f(x).
III. Bijetora, se f é injetora e sobrejetora.
Dizer que uma função é injetora significa que ela transforma elementos diferen-
tes no domínio em elementos diferentes no contradomínio.
Σxemρlo 25
2x – 1 = 2y – 1
Σxemρlo 26
y = 2x – 1
y 1
x
2
(Continua)
Note que a função utilizada nos últimos dois exemplos é bijetiva, pois demons-
tramos que ela é tanto injetora, quanto sobrejetora.
Teorema
Demonstração
Suponha que f–1 seja uma função. Para verificar a injetividade de f, considere
x, y ∈ X tais que f(x) = f(y). Nesse caso, (x, f(y)) ∈ f e, portanto, (f(y), x) ∈ f–1.
Porém, (y, f(x)) ∈ f e, portanto, (f(x), y) ∈ f–1. Como f(x) = f(y), temos que z = f(x) = f(y)
é tal que (z, x), (z, y) ∈ f–1. Sendo f–1 função, decorre que x = y. Em particular, f
é injetora.
Resta verificar que f é sobrejetora. Para tanto, considere y ∈ Y. Sendo f–1 uma
função e y ∈ D(f–1), existe x ∈ X tal que (y, x) ∈ f–1. Mas isso significa que (x, y) ∈ f, ou
seja, y = f(x). Portanto, f é sobrejetora.
Por outro lado, suponha que f seja bijetora. Para mostrar que f–1 é função é ne-
cessário verificar:
• D(f–1) = Y;
• Se (y, z1), (y, z2) ∈ f–1, então z1 = z2.
D(f–1) = I(f) = Y
Glossário Suponha então que (y, z1), (y, z2) ∈ Y × X são tais que (y, z1), (y, z2) ∈ f–1. Isso sig-
∎: significa que a demonstracao nifica que (z1, y), (z2, y) ∈ f, ou seja, y = f(z1) = f(z2). Sendo f injetora, deduzimos que
foi encerrada. Isso auxilia a z1 = z2. Portanto, f–1 é função.
leitura, pois separa o argumento
e a demonstracao do restante ∎
do texto.
28 Aritmética
Em resumo, sempre que f: X → Y é uma função bijetora, existe a função inversa
f : Y → X. Cabe destacar que a relação inversa f–1 sempre existe, porém, só é uma
–1
Teorema
Uma função f: X → Y é uma função bijetora se, e somente se, existe uma função
g: Y → X, tal que f ∘ g = idY e g ∘ f = idX. Neste caso, g = f–1.
Demonstração
Suponha que f é bijetora. Neste caso, existe a função g ≔ f–1: Y → X. Além disso,
f ∘ g = idY e g ∘ f = idX
É necessário verificar que f é bijetora. Vamos mostrar que g = f–1. Para isso, con-
sidere (y, x) ∈ g, ou seja, x = g(y). Nesse caso, temos que
Resta verificar a inclusão contrária f–1 ⊂ g. Para tanto, seja (y, x) ∈ f–1. Isso significa
que x = f–1(y), ou seja, y = f(x). Consequentemente,
Livro
Σxemρlo 27 A Coleção Fundamentos
da Matemática Elementar,
em seus vários volumes,
Considere a função f: ℝ → ℝ definida por f(x) = 2x + 1. Essa função é bijetora. Para além de abordar diversos
tópicos que são que são
demonstrar isso, note que g: ℝ → ℝ definida por
contemplados no curso de
graduação em Matemáti-
y 1
g( y ) ca, apresenta discussões
2 detalhadas com muitos
exemplos e exercícios.
é tal que Para complementar o
estudo desse conteúdo,
y 1 y 1 vale conferir o primeiro
( f g)( y ) f ( g( y )) f 2 1 y 1 1 y volume referente a teoria
2 2 de conjuntos e funções.
y 1
f 1( y ) g( y )
2
Além das funções, existem outros tipos de relações que são muito relevantes
para a aritmética. Dentre estas, destacam-se as relações de ordem, objeto de estu-
do da próxima seção.
Definição
Seja X um conjunto. Uma relação de ordem em X é uma relação ≼ em X tal que:
• ≼ é reflexiva: para todo x ∈ X, vale x ≼ x;
• ≼ é antisimetrica: se x, y ∈ X são tais que x ≼ y e y ≼ x, então x = y;
• ≼ é transitiva: se x, y, z ∈ X são tais que x ≼ y e y ≼ z, então x ≼ z.
Σxemρlo 28
II. Se x e y são dois números naturais, tais que x é menor que ou igual a y e y é
menor que ou igual a x, então, necessariamente, x = y.
(Continua)
30 Aritmética
III. Se um número natural x é menor que ou igual um número natural y e y é
menor que ou igual um número natural z, então x é menor que ou igual a z.
Essa argumentação não é precisa o suficiente. Para formalizá-la, é necessário dis- Livro
cutir a construção dos números naturais com bastante cuidado e, com base nisso,
definir o que significa ser “menor que ou igual a” no conjunto dos números naturais.
Esse tipo de formalização faz parte do estudo da aritmética dos números naturais.
A seguir, será apresentado um exemplo que ilustra que relações de ordem po-
dem ser definidas até mesmo para conjuntos não numéricos, isto é, para conjuntos
O livro Álgebra destaca-se
cujos elementos não são números. pela abordagem simples,
clara e direta. Os principais
pontos fortes são os
O exemplo anterior ilustra o caráter abstrato que uma relação de ordem pode ter.
Entretanto, na aritmética, as relações de ordem que aparecem com mais frequên-
cia são aquelas definidas em conjuntos numéricos e, portanto, mais manipuláveis.
O próximo exemplo ilustra que, além da relação menor que ou igual a, a relação
de divisibilidade é de ordem no conjunto dos números naturais.
Σxemρlo 30
xℛy ⇔ x divide y
De fato:
II. Se x e y são números naturais tais que x divide y e y divide x, então, neces-
sariamente, x = y. Portanto, ℛ é antissimétrica.
(Continua)
Definição
Seja X um conjunto. Uma relação ℛ ⊂ X × X em um conjunto X é dita uma relação de equi-
valência em X se
I. ℛ é reflexiva, ou seja, se x ∈ X, então xℛx.
II. ℛ é simétrica, ou seja, se x, y ∈ X são tais que xℛy, então yℛx.
III. ℛ é transitiva, ou seja, se x, y, z ∈ X são tais que xℛy e yℛz, então xℛz.
Se xℛy dizemos que “x é equivalente a y módulo ℛ”.
32 Aritmética
Σxemρlo 31
ℓ1ℛℓ2 ⇔ ℓ1 é paralela à ℓ2
Finalmente, se uma reta ℓ1 é paralela à uma reta ℓ2 e ℓ2, por sua vez, é paralela
a outra reta ℓ3, então, necessariamente, ℓ1 é paralela a ℓ3, mostrando assim, que ℛ
é uma relação transitiva.
Σxemρlo 32
De fato, se x ∈ ℤ, então
x–x=0=2⋅0
Suponha então que x, y ∈ ℤ são tais que xℛy. Nesse caso, existe k ∈ ℤ tal que
y – x = 2k
Consequentemente,
x – y = –2 ⋅ k = 2 ⋅ (–k)
y – x = 2k e z – y = 2l
Consequentemente,
z – x = (z – y) + (y – x) = 2l + 2k = 2 ⋅ (l + k)
Definição
Seja ℛ uma relação de equivalência em um conjunto X e x ∈ X. O conjunto
[x] ≔ {y ∈ X | yℛx}
é denominado de classe de equivalência de x módulo ℛ. Nesse caso, dizemos também que x é
um representante dessa classe de equivalência.
Σxemρlo 33
= {2 ⋅ (k + 1) | k ∈ ℤ}
e este é o conjunto dos inteiros pares, ou seja, [2] = [0].
34 Aritmética
Vamos explorar um exemplo adicional, a fim de fixar o entendimento.
Desafio
Verifique que [x] = [0] ou [x] =
Σxemρlo 34 [1], qualquer que seja o número
inteiro x.
(x, y)ℛ(z, w) ⇔ y = w
A relação ℛ também é simétrica. De fato, se (x, y), (z, w) ∈ ℝ2 são tais que
(x, y)ℛ(z, w), então y = w, de forma que w = y e, portanto, (z, w)ℛ(x, y).
Finalmente, ℛ é transitiva. Para mostrar isso, considere (x, y), (z, w), (u, v) ∈ ℝ2 tais
que (x, y)ℛ(u, v) e (u, v)ℛ(z, w). Nesse caso, y = v e v = w e, por consequência, y = w,
mostrando que (x, y)ℛ(z, w).
Definição
Sejam X um conjunto e ℛ uma relação de equivalência em X. O conjunto
X/ℛ ≔ {[x] | x ∈ X}
é denominado de quociente de X módulo ℛ.
Lembre-se que [0], nesse exemplo, coincide com o conjunto dos inteiros pares,
enquanto [1] coincide com o conjunto dos inteiros ímpares.
Σxemρlo 36
(x, y)ℛ(z, w) ⇔ y = w
ℝ2/ℛ = {{(x, y) | x ∈ ℝ} | y ∈ ℝ}
{(x, y) | x ∈ ℝ}
Teorema
36 Aritmética
Demonstração
I. Se x ∈ X, então xℛx, pois ℛ é reflexiva. Portanto, x ∈ [x], já que [x] consiste em Livro
todos os elementos de X que se relacionam com x por meio de ℛ.
II. Se x, y ∈ X são tais que [x] = [y], então x ∈ [x]. Em particular, x ∈ [y] em virtude
da igualdade [x] = [y]. Consequentemente, xℛy, pois [y] consiste em todos os
elementos de X que se relacionam com y por meio de ℛ.
Reciprocamente, suponha que xℛy. O objetivo é demonstrar que vale a igual-
dade de conjuntos [x] = [y]. Para tanto, considere z ∈ [x]. Pela definição de [x],
temos zℛx. Como, por hipótese, xℛy, segue da transitividade de ℛ que zℛy.
Em particular, z ∈ [y]. Isso mostra a inclusão [x] ⊂ [y]. A inclusão contrária é
O livro Álgebra moderna,
demonstrada de maneira análoga. dos autores Hygino H. Do-
mingues e Gelson Iezzi, é
III. Suponha que [x] ≠ [y] e [x]∩[y] ≠ ϕ. Como [x]∩[y] ≠ ϕ, existe z ∈ [x]∩[y]. Conse- uma referência clássica no
quentemente, z ∈ [x] e z ∈ [y]. Disso, segue que zℛx e zℛy. Pela simetria de ℛ, que diz respeito ao ensino
de álgebra abstrata. Entre
temos, especialmente, yℛz. Agora, yℛz e zℛx implicam yℛx, já que ℛ é transiti-
os tópicos abordados, en-
va. Mas, pelo item II, segue que [x] = [y], contradizendo [x] ≠ [y]. Portanto, não contra-se uma exposição
pode valer simultaneamente [x] ≠ [y] e [x]∩[y] ≠ ϕ. Consequentemente, [x] = detalhada de funções e
relações. Em particular,
[y] ou [x]∩[y] = ϕ. relações de ordem e equi-
valência são exploradas
IV. Basta mostrar a inclusão X ⊂ ⋃x∈X[x], pois a outra é imediata, dado que cada
com cuidado.
classe de equivalência [x] é um subconjunto de X. Para verificar a referida
DOMINGUES, H. H.; IEZZI, G. 5. ed.
inclusão, seja x ∈ X um elemento qualquer. Pelo item I, temos que x ∈ [x]. Mas São Paulo: Atual, 2003.
[x] ⊂ ⋃x∈X[x] e, portanto, x ∈ ⋃x∈X[x].
O item III do teorema afirma que duas classes de equivalência ou são iguais
ou são disjuntas. Já o item IV estabelece que o conjunto quociente de X módulo ℛ
forma uma partição do conjunto X, no sentido de que X é uma reunião disjunta dos
elementos de X/ℛ.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A teoria de conjuntos estabelece os conceitos básicos da matemática. Em particu-
lar, deve ser estudada com bastante cuidado e extensivamente. Seu estudo deve ter
início tão logo quanto possível para que se possa estabelecer as conexões existentes
entre as diversas teorias. Essas conexões estão presentes e são abundantes, acredite!
Não é diferente com a aritmética. Desde o início da construção dos números fica evi-
dente que os subsídios se encontram na teoria dos conjuntos. Sendo assim, convém
dedicar um bom tempo de sua formação para dominar o assunto. Isso possibilitará
uma rápida evolução em aspectos como lógica, aritmética, álgebra abstrata etc.
ATIVIDADES
Vídeo 1. Qual é a importância do estudo da teoria de conjuntos?
38 Aritmética
Teoria elementar dos conjuntos 39
2
O conjunto dos
números naturais
A existência dos números naturais é justificada pela necessidade
inerente que o ser humano tem de contar. Para a matemática, na quali-
dade de ciência, eles desempenham um papel fundamental, pois é com
base neles que são construídos os números inteiros e, consequente-
mente, os números racionais, reais e complexos. Esse fato explica a
necessidade de entender o significado, a natureza e as nuances dos
números naturais.
Eles estão relacionados à determinada quantidade ou ausência – nú-
mero zero –, estando presentes em nosso cotidiano e nossa jornada aca-
dêmica. Por isso, neste capítulo, vamos estudar as operações e os axiomas
que permitem formalizar esse conjunto numérico.
A matemática é uma das poucas ciências que pode ser desenvolvida de maneira
axiomática. Usualmente, o primeiro contato com o processo axiomático é feito no
contexto da geometria plana. Embora tenha sido Euclides, em sua obra Elementos,
quem desenvolveu parte significativa da geometria euclidiana, foi David Hilbert
quem realizou a tarefa de formalizar essa teoria de maneira bastante rigorosa por
meio de um processo axiomático.
40 Aritmética
O método axiomático tem origem em pressupostos que devem ser claros e
convincentes o suficiente para que não sejam contestados. Eles são chamados
de axiomas. O método é desenvolvido conforme o esquema a seguir.
Vya
Peace Peace ch
fully fully es
7/S 7/S lav
hut hut i
ter ter
sto
ku
c sto
k ck
s/
Sh
utt
ers
tock
Escolha Apresentação Resultados
A escolha dos axiomas deve ser Depois, cada axioma deve ser apre- Vencida a etapa da escolha dos
mínima, no sentido de que deve conter sentado como uma verdade além de axiomas, iniciamos a laboriosa e mais
estritamente o necessário para o qualquer dúvida razoável. Se esse fascinante tarefa: a descoberta e
desenvolvimento da teoria. não for o caso, a escolha a demonstração dos resultados
dos axiomas não foi decorrentes dos
bem feita. axiomas.
Como em qualquer teoria axiomática, com base nos axiomas de Peano, obte-
mos resultados que naturalmente devem estar de acordo com o entendimento
intuitivo de que se tem dos números naturais. Por exemplo, intuitivamente todo
mundo concorda com o fato de que quaisquer dois números naturais distintos
possuem sucessores distintos ou que existem infinitos números naturais. Para de-
monstrar estes resultados, devemos recorrer aos axiomas de Peano.
I. ℕ é um conjunto.
III. todo número natural n ∈ ℕ tem um, e só um, sucessor, a saber, o número
natural n + 1.
Para explicar como essas cinco observações dão origem aos axiomas de Peano,
precisamos introduzir a função sucessor
s: ℕ → ℕ
(I1) 0 ∈ A.
Essa argumentação utilizada para mostrar que A = ℕ, com base em (I1) e (I2), é
conhecida como princípio da indução finita. Vamos denotar essa propriedade por
(P3). Assim, o par (ℕ, s) junto às propriedades (P1), (P2) e (P3) motivam o enunciado
a seguir.
Definição
Axiomas de Peano
Existe um par (X, sX), sendo X um conjunto e sX: X → X uma função que satisfaz:
I. Existe um elemento e ∈ X que não é elemento da imagem de sX.
II. sX é uma função injetora.
III. Princípio da indução finita: se A ⊂ X é um subconjunto tal que:
(Continua)
42 Aritmética
• e ∈ A;
• x ∈ A ⇒ sX(x) ∈ A.
Então, A = X.
O par (X, sX) é denominado conjunto de números naturais, a função sX é chamada de função
sucessor e sX(x) é o sucessor de x.
De agora em diante, nas discussões teóricas, devemos nos limitar ao que afirmam os
axiomas de Peano e não ceder à tentação de utilizar propriedades a respeito dos nú-
meros naturais que já conhecemos intuitivamente. Essa abordagem evita “trapaças”
para chegar a conclusões sem antes ter desenvolvido a teoria com base nos axiomas
de Peano.
• ℕ = X;
• s = sX;
• 0 = e.
Essas notações auxiliam a exposição, pois permitem associar o que está sendo
discutido ao conhecimento empírico que se tem do conjunto dos números natu-
rais. Qual a razão disso? O par (X, sX) consiste em dois objetos que podem ser bas-
tante abstratos: X e sX. Portanto, a teoria é feita de modo que X se comporte como o
conjunto ℕ = {0, 1, 2, 3, …} – conforme estudado no ensino básico – e sX se comporte
como a função sucessor s(n) = n + 1.
Vale destacarmos que, apesar da notação (ℕ, s), ℕ e s são modelos abstratos
para o conjunto dos números naturais e para a função sucessor, afinal, interpretan-
do os axiomas de Peano com essa notação, temos que ℕ é apenas um conjunto e s
é apenas uma função s: ℕ → ℕ. Por enquanto, nada se sabe a respeito da natureza
de ℕ ou de s, além do que se enuncia nos axiomas de Peano. Sendo assim, como os
Nomeamos cada um dos símbolos 0, 1, 2, 3, ... como zero, um, dois, três etc.
Desse modo, pela definição temos que:
• um é o sucessor de zero;
• dois é o sucessor do um;
• três é o sucessor de dois; etc.
Entretanto, pode surgir mais uma questão: por que não utilizar a notação x + 1
no lugar de s(x)? Nesse estágio, o emprego do sinal + seria artificial, dado que esse
símbolo deve representar a adição de número naturais, a qual ainda não foi defini-
da. Em um momento oportuno, a adição de números naturais será definida e, com
isso, será o caso que s(x) = x + 1.
Se for demonstrado que A = ℕ, então, temos que a propriedade (P) é válida para
todo número natural, conforme desejado. Justamente nessa etapa entra o princí-
pio da indução finita. Para mostrar que A = ℕ verificamos que:
• 0 ∈ A;
• A é fechado para sucessores, isto é, x ∈ A ⇒ s(x) ∈ A.
Uma vez demonstrados esses dois fatos, aplicamos (P3) para deduzir que A = ℕ.
Esse argumento estará presente em toda a nossa discussão e convém nos habi-
tuarmos a ele desde o início. Essa ideia será utilizada para demonstrar o primeiro
resultado teórico dessa seção e ilustra o potencial dos axiomas de Peano.
Proposição
ℕ = {0}∪{s(n) | n ∈ ℕ} = {0, 1, 2, 3, …}
Demonstração
44 Aritmética
O conteúdo do enunciado da proposição pode ser traduzido ao afirmarmos que
(P) é uma propriedade válida para todo número natural, ou seja, basta verificar que
o conjunto
• 0 ∈ A;
• A é fechado para sucessores, isto é, se x ∈ A, então s(x) ∈ A.
mas isso significa que existe o número natural n = 0 ∈ ℕ tal que s(x) = s(n), garantin-
do, assim, que s(x) ∈ A.
s(x) = s(s(n))
Isso significa que existe o número natural m = s(n) ∈ ℕ tal que s(x) = s(m), de-
monstrando que s(x) ∈ A.
Livro
Uma abordagem bastante
agradável para os axiomas
de Peano pode ser encon-
Teorema trada na obra Fundamen-
tos de Aritmética, escrita
São válidas as seguintes afirmações sobre o (ℕ, s): por Hygino Hungueros
Domingues. É uma
I. ℕ ≠ ∅, isto é, ℕ tem pelo menos um elemento. excelente introdução à
aritmética para aprofundar
os tópicos discutidos em
nossos estudos.
a
EmBaSy/Shutterstock
+ a+b
2+0=2
2+1=3
46 Aritmética
2+2=4
2+3=5
2 + 1 = 3 = s(2) = s(2 + 0)
2 + 2 = 4 = s(3) = s(2 + 1)
Finalmente, a última adição também pode ser obtida por meio da anterior:
2 + 3 = 5 = s(4) = s(2 + 2)
Note que, neste raciocínio, existem dois tipos de adição envolvidas: uma da for-
ma 2 + 0 e outra da forma 2 + s(k), com k ∈ ℕ \ {0}. Sendo assim,
Definição
A adição de números naturais é a função
+: ℕ × ℕ → ℕ
(x, y) → x + y
definida por
x+0=0
x + s(k) = s(x + k)
para todo x ∈ ℕ e k ∈ ℕ \ {0}.
1+0=1
0 + 2 = 0 + s(1) = s(0 + 1)
Contudo, até então, não sabemos que 0 + 1 = 1. Tudo o que sabemos, por ora, é que
1 + 0 = 1. Esse problema será facilmente resolvido a seguir.
Se x ∈ ℕ, então 0 + x = x.
Demonstração
A = {n ∈ ℕ | 0 + n = n}
Vamos aplicar o princípio da indução finita para mostrar que A = ℕ. Por defini-
ção, A ⊂ ℕ. Além disso, pela definição de adição de números naturais, temos que
0+0=0
ou seja, 0 ∈ A.
Glossário
Lema
Lema é uma proposição auxiliar
para a demonstração de outro Se x, y ∈ ℕ, então vale
lema, proposição ou teorema. s(x) + y = s(x + y) = x + s(y)
Demonstração
(Continua)
48 Aritmética
Logo,
= s(s(m + n))
= s(m + s(n))
(a + b) + c e a + (b + c)
(a + b) + c = a + (b + c)
Teorema
Demonstração
(Continua)
A comutatividade é uma aplicação do princípio da indução finita. Para demons-
trarmos o item I, definimos:
A = {n ∈ ℕ | ∀ m ∈ ℕ, m + n = n + m}
m + 0 = m = 0 + m, para todo m ∈ ℕ
m + n = n + m, para todo m ∈ ℕ
A = {k ∈ ℕ | ∀ l, m ∈ ℕ, (k + l) + m = k + (l + m)}
(0 + l) + m = l + m = 0 + (l + m)
de maneira que
x+a=x+b
50 Aritmética
para algum x ∈ ℕ, segue que a = b. É como se fosse possível cancelarmos o x de
ambos os membros da igualdade. Mas como é possível fazer esse cancelamento
sem a noção de subtração? Essa pergunta será respondida a seguir.
Teorema
x+a=x+b
então, a = b.
Demonstração
A = {k ∈ ℕ | ∀ l, m ∈ ℕ; k + l = k + m ⇒ l = m}
Note que, por mais estranho que o conjunto A pareça, faz sentido sua definição. Na
pior das hipóteses, A seria o conjunto vazio, embora esteja longe de ser o caso. De fato,
A é um subconjunto de ℕ que contém 0, pois 0 ∈ ℕ e se l, m ∈ ℕ são tais que
0 + l = 0 + m, então l = m
k+l=k+m
s(k) + l = s(k) + m
s(k + l) = s(k + m)
Artigo
https://www.sbm.org.br/coloquio-centro-oeste-4/wp-content/uploads/sites/2/2016/01/Minicurso_6._A_construcao_dos_Reais.pdf
Ma
ula
ga
/S
hu
tte
rst
oc k
Zero Sucessor
Inicialmente Em seguida,
definimos a adição definimos a adição de
de um número um número natural
natural com o com o sucessor
0 (zero). de outro.
Ma
ula
ga
/S
hu
tte
rst
oc k
Zero Sucessor
Definimos a Em seguida, definimos
multiplicação de um a multiplicação de um
número natural por número natural pelo
0 (zero). sucessor de outro.
52 Aritmética
No primeiro caso, definimos x ⋅ 0 = 0, qualquer que seja o número natural x.
Isto garante a coerência com o que sabemos intuitivamente sobre a multiplicação
de números naturais.
x ⋅ s(k) = x ⋅ (k + 1) = x ⋅ k + x ⋅ 1 = x ⋅ k + x
Definição
A multiplicação de números naturais é a função
·: ℕ × ℕ → ℕ
(x, y) → x ⋅ y
sendo x ⋅ y o número natural definido como:
x⋅0=0
x ⋅ s(k) = x ⋅ k + x
para todo x ∈ ℕ e k ∈ ℕ \ {0}.
2⋅0=0
2 ⋅ 1 = 2 ⋅ s(0) = 2 ⋅ 0 + 2 = 0 + 2 = 2
2 ⋅ 2 = 2 ⋅ s(1) = 2 ⋅ 1 + 2 = 2 + 2 = 4
2 ⋅ 3 = 2 ⋅ s(2) = 2 ⋅ 2 + 2 = 4 + 2 = 6
Notemos que cada uma das multiplicações do número dois por um número
natural não nulo é obtida com base no resultado da linha anterior.
Proposição
Se x ∈ ℕ, então é válido
x⋅0=0=0⋅x (Continua)
A = {n ∈ ℕ | 0 ⋅ n = 0}
0⋅0=0
0⋅n=0
0 ⋅ s(n) = 0 ⋅ n + 0 = 0 + 0 = 0
Lema
s(x) ⋅ y = x ⋅ y + y
Demonstração
A = {m ∈ ℕ | ∀ n ∈ ℕ; s(n) ⋅ m = n ⋅ m + m}
Primeiro, A ⊂ ℕ e 0 ∈ A, já que
n ⋅ 0 = 0 = 0 + 0 = n ⋅ 0 + 0, para todo n ∈ ℕ
= (n ⋅ m + m) + s(n)
= n ⋅ m + (m + s(n))
= n ⋅ m + (s(n) + m)
= n ⋅ m + (n + s(m))
= (n ⋅ m + n) + s(m)
54 Aritmética
Isso mostra que s(n) ∈ A sempre que n ∈ A. Portanto, A é fechado para sucesso-
res e, assim, A = ℕ, conforme desejado.
3 ⋅ 4 = s(2) ⋅ 4 = 2 ⋅ 4 + 4 = 8 + 4 = 12
Proposição
x⋅1=x=1⋅x
Demonstração
A = {n ∈ ℕ | n ⋅ 1 = n = 1 ⋅ n}
Primeiro, A ⊂ ℕ e 0 ∈ A, pois
0⋅1=0=1⋅0
n⋅1=n=1⋅n
s(n) ⋅ 1 = n ⋅ 1 + 1 = n + 1 = s(n)
1 ⋅ s(n) = 1 ⋅ n + 1 = n + 1 = s(n)
Teorema
x⋅y=y⋅x
Demonstração
Vamos, mais uma vez, aplicar o princípio da indução finita. Para isso, definimos
A = {n ∈ ℕ | ∀ m ∈ ℕ, n ⋅ m = m ⋅ n}
0 ⋅ m = 0 = m ⋅ 0, para todo m ∈ ℕ
n ⋅ m = m ⋅ n, para todo m ∈ ℕ.
s(n) ⋅ m = n ⋅ m + m = m ⋅ n + m = m ⋅ s(n)
2 ⋅ (3 + 1) = 2 ⋅ 3 + 2 ⋅ 1
56 Aritmética
Ela representa uma relação de compatibilidade entre as duas operações algébri-
cas definidas no conjunto dos números naturais: a adição e a multiplicação.
Teorema
x ⋅ (y + z) = x ⋅ y + x ⋅ z
(x + y) ⋅ z = x ⋅ z + y ⋅ z
Demonstração
A = {k ∈ ℕ | ∀ l, m ∈ ℕ, k ⋅ (l + m) = k ⋅ l + k ⋅ m}
k ⋅ (l + m) = k ⋅ l + k ⋅ m, para todo l, m ∈ ℕ
Consequentemente, s(k) ∈ ℕ e
s(k) ⋅ (l + m) = k ⋅ (l + m) + (l + m)
= (k ⋅ l + k ⋅ m) + (l + m)
= (k ⋅ l + l) + (k ⋅ m + m)
= s(k) ⋅ l + s(k) ⋅ m
Teorema
A = {m ∈ ℕ | ∀ k, l ∈ ℕ, k ⋅ (l ⋅ m) = (k ⋅ l) ⋅ m}
k ⋅ (l ⋅ 0) = k ⋅ 0 = 0 = (k ⋅ l) ⋅ 0
k ⋅ (l ⋅ m) = (k ⋅ l) ⋅ m
k ⋅ (l ⋅ s(m)) = k ⋅ (l ⋅ m + l) = k ⋅ (l ⋅ m) + k ⋅ l = (k ⋅ l) ⋅ m + k ⋅ l = (k ⋅ l) ⋅ s(m)
Lema
Sejam m, n ∈ ℕ. Se m ⋅ n = 0, então m = 0 ou n = 0.
Demonstração
58 Aritmética
Proposição
Demonstração
A = {n ∈ ℕ | ∀ m ∈ ℕ, p ∈ ℕ \ {0}; m ⋅ p = n ⋅ p ⇒ m = n}
m⋅p=0⋅p
m ⋅ p = n ⋅ p, para alguns m ∈ ℕ
m ⋅ p = s(n) ⋅ p
k ⋅ p + p = s(k) ⋅ p = m ⋅ p = s(n) ⋅ p = n ⋅ p + p
k⋅p=n⋅p
Mas, como n ∈ A, k ∈ ℕ e p ∈ ℕ \ {0}, deduzimos que k = n. Portanto, m = s(n). A Construção dos Números,
escrito por Jamil Ferreira,
O que nos mostra que n ∈ A. Pelo princípio da indução finita, A = ℕ, e a propriedade apresenta de maneira
enunciada é válida. rigorosa e precisa a cons-
trução dos conjuntos nu-
∎ méricos, desde o conjunto
dos números naturais até
o conjunto dos números
complexos. É uma leitura
Com respeito ao conteúdo da proposição anterior, é necessário tecermos um aler- que pode complementar
os estudos a respeito da
ta. Diante da igualdade x ⋅ z = y ⋅ z, com x, y ∈ ℕ e z ∈ ℕ – {0}, é muito tentador efetuar- teoria explorada nesta
mos a divisão por z em ambos os membros dessa igualdade. Porém, cuidado, esse seção.
argumento não é aplicável, pois, até o momento, nada se falou de divisão de números FERREIRA, J. 3. ed. Rio de Janeiro:
SBM, 2013.
naturais. A argumentação correta encontra fundamentos na proposição anterior.
Definição
Sejam x, y ∈ ℕ, definimos:
• x é menor que ou igual a y se existe um número natural p ∈ ℕ tal que
y=x+p
Nesse caso, escrevemos x ≤ y e podemos dizer que y é maior que ou igual a x.
• x é estritamente menor que y se x ≤ y e x ≠ y. Nesse caso, escrevemos x < y e podemos
dizer que y é estritamente maior que x.
Outra forma de descrevermos x ≤ y é denotarmos y ≥ x. Uma forma distinta de representarmos
x < y é escrevermos y > x, nesse caso, dizemos que y é estritamente maior que x.
Além disso, espera-se que todo número natural não nulo seja estritamente
maior que 0 e, também, que a ordenação seja preservada a nível de sucessores,
ou seja, se x ≤ y, então s(x) ≤ s(y). Essas são as propriedades mais imediatas que
decorrem da definição de relação de ordem e serão enunciadas e demonstradas
com algumas outras a seguir.
60 Aritmética
Proposição
Demonstração
I. Se x ∈ ℕ, então x = x + 0. Logo, por definição, 0 ≤ x.
II. Suponhamos que x ≠ 0. Por (a), tem-se 0 ≤ x e como x ≠ 0, resulta, por defini-
ção, que 0 < x.
III. Se x ≤ y, então existe p ∈ ℕ tal que y = x + p. Portanto, s(y) = s(x + p) = s(x) + p.
Logo, por definição, s(x) ≤ s(y).
VI. Se x < y, então x ≤ y e x ≠ y. Por (c) segue que s(x) ≤ s(y), e como a função suces-
sor é injetora, temos que s(x) ≠ s(y). Ao combinarmos essas duas informações,
temos que s(x) < s(y).
V. Se x < y, então x ≠ y e existe p ∈ ℕ tal que y = x + p. Mas, então, p ≠ 0, pois, do
contrário, teríamos y = x + 0 = x, contradizendo x ≠ y. Reciprocamente, su-
ponhamos que y = x + p, para algum p ∈ ℕ \ {0}. Por definição da relação “≤”,
segue que x ≤ y. Agora, y = x + p com p ≠ 0 implica x ≠ y. Mas, x ≤ y juntamente
com x ≠ y significam que x < y.
Teorema
y=x+pex=y+q
Consequentemente,
x + 0 = x = (x + p) + q = x + (p + q)
p+q=0
Desafio Mas isso implica p = q = 0. Portanto, y = x + 0 = x.
Na demonstração da propriedade
III. Suponhamos que x ≤ y e y ≤ z. Pela definição, existem p, q ∈ ℕ tais que
antissimétrica (item II), verifique
que p = q = 0.
y=x+pez=y+q
Consequentemente,
z = y + q = (x + p) + q = x + (p + q)
Lema
Demonstração
I. A igualdade s(x) = x + 1 revela que s(x) ≥ x, então resta verificarmos que s(x) ≠ x.
Por contradição, suponhamos que s(x) = x. Nessa situação, teríamos que
x + 1 = x + 0. Mas, a Lei do Cancelamento para a adição permitiria deduzir que
1 = 0, ou seja, s(0) = 0. Isto é impossível, pois 0 (zero) não pertence à imagem
de s. Portanto, temos que s(x) > x.
(Continua)
62 Aritmética
II. Suponhamos que y > x, isto é, y ≠ x, e existe p ∈ ℕ \ {0}, tal que y = x + p.
Mas como p ≠ 0, é possível escrevermos p = s(q) com q ∈ ℕ. Consequentemente,
y = x + p = x + s (q) = s(x) + q
Teorema
Demonstração
x+0=x=y+p=x+p
Mas pela Lei do Cancelamento para a adição, seguiria que p = 0, uma contradição.
y+0=y=x+p=y+p
Novamente, pela Lei do Cancelamento para a adição, seguiria que p = 0, uma
contradição.
y + 0 = y = x + p = (y + q) + p = y + (p + q)
A = {x ∈ ℕ | ∀ y ∈ ℕ, x > y, x = y ou x < y}
Por definição, A ⊂ ℕ e 0 ∈ A, pois para qualquer y ∈ ℕ temos que y > 0. Para fina-
lizar, temos que verificar que A é fechado para sucessores. Para tanto, seja x ∈ A, ou
seja, x ∈ ℕ e dado y ∈ ℕ, temos:
x > y, x = y ou x < y
Considerando essa informação, demonstraremos que s(x) > y, s(x) = y ou s(x) < y:
• Se y < x, então y < s(y) < s(x), portanto s(x) ∈ A.
• Se x = y, então, pelo lema da multiplicação do sucessor de x por y já demons-
trado, temos que s(x) = s(y) > y. Logo, s(x) ∈ A.
• Se x < y, então, pelo lema da multiplicação do sucessor de x por y já demons-
trado, temos que y = s(x) ou y > s(x). Assim, s(x) ∈ A.
Isso nos mostra que A é fechado para sucessores. Pelo princípio da indução
finita, deduzimos que A = ℕ, demonstrando, desse modo, a propriedade enunciada.
64 Aritmética
A demonstração do princípio da boa ordenação é um tanto complexa e, para
simplificar, convém estabelecermos o resultado auxiliar enunciado e demons-
trado a seguir.
Lema
Demonstração
Suponhamos que x < y. Nesse caso, existe p ∈ ℕ \ {0}, tal que y = x + p. Mas como
p ≠ 0, é possível escrevermos p = s(q), para algum q ∈ ℕ. Consequentemente,
y = x + p = x + s(q) = s(x) + q. Portanto, s(x) ≤ y.
Por outro lado, suponhamos que s(x) ≤ y. Diante disso, existe p ∈ ℕ tal que
y = s(x) + p. De modo consequente, y = x + s(p). Como s(p) ≠ 0, deduzimos que x < y.
Demonstração
X = {x ∈ ℕ | ∀ a ∈ A; x ≤ a}
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O conjunto dos números naturais, embora seja conhecido desde o ensino básico,
não pode ser compreendido de maneira completa sem a discussão de seus aspectos
teóricos. Essa discussão permite um diálogo com veracidade e precisão quando o
assunto é o conjunto dos números naturais. Além disso, a teoria abordada neste
capítulo ilustra como a matemática se desenvolve sobre suas próprias bases, um
resultado derivado de outro e todos alcançados dos pressupostos iniciais.
Esse tipo de desenvolvimento faz com que a intuição seja aprimorada, visto que
é por meio da observação de elementos concretos que chegamos à abstração da
teoria. Nesse caminho, muitas habilidades são desenvolvidas, inicialmente com o
aperfeiçoamento do raciocínio abstrato e culminando com a sofisticação na argu-
mentação. Todos esses elementos, além de serem úteis, são necessários para um
bom domínio do assunto.
ATIVIDADES
Vídeo 1. Qual seria a estratégia para demonstrar que todo número natural n ≠ 0 é sucessor
de outro natural?
REFERÊNCIAS
DOMINGUES, H. H. Fundamentos de aritmética. São Paulo: Atual, 1991.
DOMINGUES, H. H.; IEZZI, G. Álgebra Moderna. São Paulo: Atual, 1982.
FERREIRA, J. A Construção dos Números. Rio de Janeiro: SBM, 2011.
66 Aritmética
3
O conjunto dos
números inteiros
Uma vez que conhecemos o conjunto dos números naturais, percebemos
que muitos problemas não podem ser resolvidos por meio desse conjunto.
Por exemplo, a simples equação x + 2 = 1 não pode ser resolvida em . Então,
é necessário introduzirmos os números que permitem resolver esse tipo de
equação: os números inteiros.
O conjunto dos números inteiros é nosso objeto de estudo neste capítulo.
Por meio do conjunto dos números naturais e de sua adição, definiremos o
conjunto dos números inteiros com base em determinada relação de equiva-
lência. Com essa definição, é possível demonstrar rigorosamente as proprieda-
des da adição, subtração e multiplicação de números inteiros.
3.1 O conjunto ℤ
Vídeo A motivação para estender o conjunto dos números naturais vem da necessida-
de de resolver equações do tipo
x+b=a
x+1=0
não tem solução no conjunto dos números naturais. Entretanto, em muitas situa-
ções é desejável resolvê-la. Para sair desse impasse, é necessário introduzirmos
“números” não pertencentes ao conjunto dos números naturais. Esses novos nú-
meros serão todas as soluções de quaisquer equações da forma x + b = a possíveis
de formar variando a, b ∈ ℕ.
–1 = (1, 2)
–1 = (2, 3) ou –1 = (3, 4)
x+3=2ex+4=3
também teriam –1 como solução? De fato, não haveria nenhuma razão para es-
colher (1, 2) em prejuízo dos pares (2, 3) e (3, 4) para representar o –1. A solução
para resolver esse problema de ambiguidade é a mais simples possível. Em vez de
definir –1 como um par ordenado em particular, que corresponde a uma equação
com solução –1, definimos –1 como o conjunto de todos os pares ordenados de nú-
meros naturais que dão origem a uma equação de solução –1. Mais precisamente,
definimos
a+d=b+c
x+b=aex+d=c
então
k+b=aek+d=c
o que implica
a + d = (k + b) + d = b + (k + d) = b + c
Por outro lado, suponha que os pares (a, b) e (c, d) são tais que
a+d=b+c
x+b=aex+d=c
x + b = a ⇒ (x + b) + c = a + c
⇒ x + (b + c) = a + c
⇒ x + (a + d) = a + c
⇒ a + (x + d) = a + c
⇒x+d=c
68 Aritmética
Proposição
(a, b) ℜ (c, d) ⇔ a + d = b + c
Demonstração
Se (a, b) ⊂ ℕ x ℕ, então
a+b=b+a
já que a operação adição (+) é comutativa em ℕ. Isso nos mostra que (a, b) ℜ(a, b),
ou seja, ℜ é reflexiva.
• ℜ é simétrica.
Se (a, b) e (c, d) são elementos de ℕ x ℕ tais que (a, b) ℜ (c, d), então temos que
a+d=b+c
c+b=d+a
Suponha que (a, b), (c, d) e (e, f) são elementos de ℕ x ℕ tais que
a+d=b+cec+f=d+e
Logo,
a + f + (c + d) = (a + d) + (c + f) = b + c + d + e = (b + e) + (c + d)
a+f=b+e
Note que todo (a, b) ∈ ℕ x ℕ determina a classe de equivalência [(a, b)] dada por
Por exemplo,
Note que [(1, 2)] coincide com o conjunto com o qual definimos o número –1 na
discussão introdutória desta seção.
a=b+k
para algum k ∈ ℕ. Assim, temos que esse elemento k ∈ ℕ é o único número natural
que cumpre a = b + k. De fato, se l ∈ ℕ também satisfaz a = b + l, então, pela lei do
cancelamento da adição, teríamos que k = l. Em particular, é possível definir
a–b≔k
{(a, b) ∈ ℕ x ℕ| a ≥ b} ⊂ ℕ x ℕ
e não em ℕ x ℕ, como é o caso da adição. Mas, afinal, qual é a razão dessa discus-
são? Ela permite demonstrar que qualquer classe de equivalência [(a, b)] ∈ ℤ, isto é,
qualquer número inteiro, pode ser representada de uma forma bastante particular,
como demonstrado a seguir.
Teorema
70 Aritmética
Demonstração
pois
a + 0 = b + (a – b)
pois
a + (b – a) = b + 0
então
a+0=b+d⇔a=b+d⇒d=a–b
= {(x, y) ∈ ℕ x ℕ | x + 1 = y + 0} = {(x, x + 1) | x ∈ ℕ}
Analogamente,
= {(x, y) ∈ ℕ x ℕ | x + 0 = y + 1} = {(y + 1, y) | y ∈ ℕ}
Por exemplo:
Então, por que no ensino básico ensinam que todo número natural é um número
inteiro? Isso ocorre pelo fato de existir uma “cópia” do conjunto dos números natu-
rais dentro do conjunto dos números inteiros. Isso significa que existe um subcon-
junto de ℤ que está em bijeção comℕ, como mostra o teorema a seguir.
Teorema
Demonstração
x+0=y+0
72 Aritmética
Portanto, quando escrevemos ℕ ⊂ ℤ, isso significa, efetivamente, ℕℤ ⊂ ℤ. Contu-
do, conjuntos em bijeção são indistinguíveis do ponto de vista da teoria de conjun-
tos, logo, não há razão para qualquer confusão a respeito da escrita ℕ ⊂ ℤ.
Além disso, uma vez presente a adição de números naturais, deve ser possível
“estendê-la” ao conjunto dos números inteiros, de modo que quando adicionamos
dois inteiros não negativos, produzimos o mesmo resultado que obtemos ao adi-
cionar os dois números naturais correspondentes.
xℤ + yℤ = (x + y) ℤ
Logo, isso define a adição de inteiros para todos aqueles inteiros da forma
[(x, 0)]. Porém, relembre que um inteiro também pode ter o formato [(0, x)]; por
isso, também é necessário definirmos
com x, y ∈ℕ. Seguindo o raciocínio que foi discutido anteriormente, parece natural
colocarmos
[(x, 0)] + [(0, y)] = [(x, y)] e [(0, x)] + [(0, y)] = [(0, x + y)]
Definição
A adição de dois números inteiros [(a, b)] e [(c, d)] é o número inteiro
[(a, b)] + [(c, d)] = [(a + c, b + d)]
Mas será que [(a, b)] + [(c, d)] = [(a’, b’)] + [(c’, d’)]?
ainda que
Teorema
Demonstração
a + b’ = b + a’ e c + d’ = d + c’
e, consequentemente,
74 Aritmética
Para fechar a discussão teórica da definição de adição de inteiros, vamos de-
monstrar a compatibilidade da adição dos números naturais com a adição dos nú-
meros inteiros não negativos.
Proposição
Demonstração
De fato,
(x + y)ℤ = xℤ + yℤ
como queríamos.
No ensino básico você aprendeu que a adição de inteiros tem diversas proprie-
dades: associatividade, comutatividade etc. Para demonstrar essas propriedades e
outras, vamos formalizar alguns conceitos.
Definição
I. O inteiro zero é o número inteiro 0 = [(0, 0)].
II. O oposto de um número inteiro x = [(a, b)] é o número inteiro –x = [(b, a)].
Teorema
I. Associatividade: x + (y + z) = (x + y) + z.
II. Comutatividade: x + y = y + x.
V. –(–x) = x.
VI. –0 = 0.
Demonstração
Denotamos x = [(a, b)], y = [(c, d)] e z = [(e, f)] para demonstrar as afirmativas.
= [((a + c) + e, (b + d) + f)]
= (x + y) + z
= [(a + c, b + d)]
= [(c + a, d + b)]
=y+x
III. De fato,
Se 0’ ∈ ℤ é tal que
0’ + x = x = x + 0’
então
0’ = 0’ + 0 = 0
a+b=b+a
x + x’ = 0 = x’ + x
76 Aritmética
Nesse caso,
–x = –x + 0 = –x + (x + x’) = (–x + x) + x’ = 0 + x’ = x’
V. Com efeito,
Definição
Se x, y ∈ ℤ, definimos a subtração x – y como o inteiro
x – y = x + (–y)
então
x – y = x + (–y)
= [(a + d, b + c)]
Por exemplo,
= [(3, 2)]
= [(1, 0)]
=1
já que 3 + 0 = 2 + 1 em ℕ.
Novamente, a teoria está coerente com o que conhecemos. Para finalizar esta
seção, vamos demonstrar as propriedades da subtração de inteiros.
Teorema
II. 0 – x = –x.
III. x – x = 0.
V. –(x + y) = – x – y.
Demonstração
I. De fato, x – 0 = x + (–0) = x + 0 = x.
⇔x+0=a–b
⇔x=a–b
–x – y = –x + (–y)
= [(b + d, a + c)]
= –[(a + c, b + d)]
= –(x + y)
78 Aritmética
Motivados pela maneira como definimos a adição de números inteiros, seria
tentador buscar definir a multiplicação por meio da igualdade
Embora essa igualdade defina um número inteiro, essa “multiplicação” não teria
as propriedades bem conhecidas dessa operação com números inteiros. A título
de ilustração, não valeria 1 ⋅ x = x para todo número inteiro x como mostrado em
Definição
Sejam [(a, b)] e [(c, d)] número inteiros. A multiplicação de [(a, b)] por [(c, d)], denotada [(a,
b)] ⋅ [(c, d)], é definida por
[(a, b)] ⋅ [(c, d)] = [(a ⋅ c + b ⋅ d, a ⋅ d + b ⋅ c)]
Note que a multiplicação (⋅) é definida em termos dos representantes das clas-
ses de equivalência. Como é de praxe nessas situações, é necessário verificar que a
definição não depende da escolha do representante. No entanto, a verificação será
omitida, já que envolve extensos e trabalhosos cálculos. O importante é compreen-
der a necessidade de fazer esse tipo de verificação.
Teorema
VI. 1 ⋅ x = x = x ⋅ 1
VII. 0 ⋅ x = 0 = x ⋅ 0
X. x ⋅ y = y ⋅ x
• x ⋅ (–1) = –x II. 0 ⋅ x = [(0, 0)] ⋅ [(a, b)] = [(0 ⋅ a + 0 ⋅ b, 0 ⋅ b + 0 ⋅ a)] = [(0, 0)] = 0
• x ⋅ (–y) = –(x ⋅ y) Analogamente, é possível verificar que x ⋅ 0 = 0.
• (x – y) ⋅ z = x ⋅ z – y ⋅ z
III. –1 ⋅ x = [(0, 1)] ⋅ [(a, b)] = [(0 ⋅ a + 1 ⋅ b, 0 ⋅ b + 1 ⋅ a)] = [(b, a)]= –x
V. Com efeito,
enquanto
a⋅c+b⋅d=c⋅a+d⋅b
e
a⋅d+b⋅c=c⋅b+d⋅a
VI. De fato,
x ⋅ (y + z) = [(a, b)] ⋅ ([(c, d) + (e, f)])
= [(a, b)] ⋅ [(c + e, d + f)]
= [(a ⋅ (c + e) + b ⋅ (d + f), a ⋅ (d + f) + b ⋅ (c + e)]
Por outro lado, note que
x ⋅ y + x ⋅ z = [(a, b)] ⋅ [(c, d)] + [(a, b)] ⋅ [(e, f)]
= [(a ⋅ c + b ⋅ d, a ⋅ d + b ⋅ c)] + [(a ⋅ e + b ⋅ f, a ⋅ f + b ⋅ e)]
= [(a ⋅ c + b ⋅ d) + (a ⋅ e + b ⋅ f), (a ⋅ d + b ⋅ c) + (a ⋅ f + b ⋅ e)]
A igualdade desejada ocorre ao observarmos que
(a ⋅ c + b ⋅ d) + (a ⋅ e + b ⋅ f) = a ⋅ (c + e) + b ⋅ (d + f)
e
(a ⋅ d + b ⋅ c) + (a ⋅ f + b ⋅ e) = a ⋅ (d + f) + b ⋅ (c + e)
= (d + f) ⋅ a + b ⋅ (c + e)
80 Aritmética
VII. De fato, combinando as propriedades IV e VI, temos
x ⋅ (y – z) = x ⋅ (y + (–z))
= x ⋅ y + x ⋅ (–z)
= x ⋅ y + [–(x ⋅ z)]
=x⋅y–x⋅z
Teorema
Demonstração
Inicialmente, suponha que x = [(a, b)], y = [(c, d)] e z = [(e, 0)]. Em particular, e ≠ 0
pois, do contrário, z = 0. Agora, note que
a+d=b+c
Desafio
ou seja, x = y. Analogamente, é possível demonstrar o caso em que z = [(0, e)]. Comprove a forma análoga da
demonstração do teorema do
cancelamento da multiplicação, ou
seja, demonstre o caso em que z
Vale destacar que é convidativo justificarmos a implicação x ⋅ z = y ⋅ z ⇒ x = y = [(0, e)].
expressando que realizamos a divisão de ambos os membros da igualdade por
z. Entretanto, isso não é correto, dado que sequer foi definida uma operação de
divisão no conjunto ℤ.
Glossário
Colorário: é uma proposição
que decorre logicamente de
Corolário outra já demonstrada.
Sejam x, y ∈ ℤ. Se x ⋅ y = 0, então x = 0 ou y = 0.
Demonstração
O conjunto dos números inteiros 81
Suponha que x ⋅ y = 0 e y ≠ 0. Nesse caso,
Desafio x⋅y=0=0⋅y
Comprove a forma análoga da
Aplicando o teorema demonstrado anteriormente, temos que
demonstração do corolário do
domínio de integridade, ou seja, x=0
demonstre o caso em que x ⋅ y =
0 e x ≠ 0. Analogamente, é possível demonstrar o caso em que x ⋅ y = 0 e x ≠ 0.
Neste momento, podemos operar com números inteiros, na maioria das vezes,
sem utilizar classes de equivalência, pois o que utilizamos na prática são as regras
operacionais – comutatividade, associatividade etc. Contudo, agora temos pleno
entendimento das razões de funcionamento daquelas regras.
a ≤ b ⇔ ∃ p ∈ ℕ| b = a + p
Será que é possível estender essa relação de ordem ao conjunto dos números
inteiros? Sim! Esse é o conteúdo do nosso estudo agora.
Definição
Sejam [(a, b)] e [(c, d)] dois números inteiros.
• Dizemos que [(a, b)] é menor que ou igual a [(c, d)] e escrevemos [(a, b)] ≤ℤ [(c, d)], caso
a+d≤b+c
• Caso [(a, b)] ≤ℤ [(c, d)] e [(a, b)] ≠ [(c, d)], escrevemos [(a, b)] <ℤ [(c, d)] e dizemos
que [(a, b)] é – estritamente – menor que [(c, d)].
• Em vez de [(a, b)] ≤ℤ [(c, d)] e [(a, b)] <ℤ [(c, d)], podemos escrever
[(c, d)] ≥ℤ [(a, b)] e [(a, b)] >ℤ [(c, d)]
No primeiro caso, dizemos que [(c, d)] é maior que ou igual [(a, b)]; no segundo caso, dize-
mos que [(a, b)] é – estritamente – maior que [(c, d)].
Σxemρlo 1
Considere os números inteiros –1 = [(0, 1)] e 4 = [(4, 0)]. Nesse caso, temos que
–1 <ℤ 4
pois
0+0=0<5=1+4 (I)
82 Aritmética
e, além disso, [(0, 1)] ≠ [(4, 0)], já que 0 + 0 ≠ 1 + 4.
Contudo, a teoria é feita para que coincida com nosso entendimento empírico
da ordenação de números inteiros.
Agora que ≤ℤ foi definida, cabe o seguinte questionamento: será que ≤ℤ é uma
relação de ordem em ℤ, assim como ≤ é uma relação de ordem em ℕ? A resposta é
afirmativa, conforme demonstramos a seguir.
Teorema
Demonstração
• Reflexiva.
a+b=b+a
• Antissimétrica.
a+d≤b+ceb+c≤a+d
a+d=b+c
• Transitiva.
Sejam x = [(a, b)], y = [(c, d)] e z = [(e, f)] em ℤ tais que x ≤ℤ y e y ≤ℤ z. Isso significa
que
a+d≤b+cec+f≤d+e
No entanto,
a+f+c+d≤b+e+c+d
Teorema
I. x < y
II. x = y
III. x > y
Demonstração
I. a + d < b + c
II. a + d = b + c
III. a + d > b + c
Proposição
84 Aritmética
I. Se x ≤ℤ y ⇒ x + z ≤ℤ y + z, para todo x, y, z ∈ ℤ.
II. Se x ≤ℤ y e z ≥ 0, então x ⋅ z ≤ℤ y ⋅ z.
Demonstração
I. Se x ≤ℤ y, então
a+d≤b+c
Consequentemente,
(a + d) + (e + f) ≤ (b + c) + (e + f)
(a + e) + (d + f) ≤ (b + f) + (c + e)
ou seja,
Proposição
Sejam x, y ∈ ℤ. Temos:
Demonstração
a+d+0≤b+c+0
Desafio
Ou seja, a + d ≤ b + c e, portanto, x ≤ℤ y.
Demonstre o item II da proposição,
ou seja, mostre que x < y se, e II. A demonstração é análoga ao item I.
somente se, 0 < x – y.
Definição
Seja x ∈ ℤ. O valor absoluto de x é o número inteiro |x|, definido por
|x| = x se x ≥ 0
–x se x < 0
Por exemplo:
• |0| = 0, pois 0 = 0.
Note que, pela própria definição, o valor absoluto de um número inteiro é sem-
pre um inteiro não negativo.
Como não poderia deixar de ser, o objetivo desta seção é fazer uma discussão
teórica a respeito das principais propriedades do valor absoluto de números intei-
ros. Isso é extremamente importante para a aritmética, dado que o valor absoluto
aparece frequentemente na discussão da teoria.
86 Aritmética
Teorema
Demonstração
|x| = |–x|
–x < 0 < x
x < 0 < –x
III. Este é o item mais trabalhoso, pois é necessário testar muitas possibilida-
des; apesar disso, o raciocínio é simples.
• Se x > 0 e y > 0, então x ⋅ y > 0 e, portanto,
|x ⋅ y| = x ⋅ y = |x| ⋅ |y|
• Se x > 0 e y < 0, então x ⋅ y < 0 e, portanto,
|x ⋅ y| = –(x ⋅ y) = x ⋅ (–y) = |x| ⋅ |y|
• Se x < 0 e y > 0, então x ⋅ y < 0 e, portanto,
|x ⋅ y| = –(x ⋅ y) = (–x) ⋅ y = |x| ⋅ |y|
• Finalmente, se x < 0 e y < 0, então x ⋅ y > 0 e, portanto,
|x ⋅ y| = x ⋅ y = (–x) ⋅ (–y) = |x| ⋅ |y|
x≤y
–y < 0 < x ≤ y
–x ≤ y
–y ≤ x < 0 < –x ≤ y
–|x| ≤ x ≤ |x|
–|y| ≤ y ≤ |y|
|x + y| ≤ |x| + |y|
VII. Essa propriedade é uma consequência direta das duas anteriores. A fim de
demonstrá-la, note que x = y + (x – y) implica
Consequentemente,
|x| – |y| ≤ |x – y|
Portanto,
Logo,
|x| – |y| ≤ |x – y|
A propriedade |x + y| ≤ |x| + |y|, válida para todo x, y ∈ ℤ, é uma das mais im-
portantes e recebe o nome de desigualdade triangular.
88 Aritmética
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O surgimento do conjunto dos inteiros veio da necessidade natural de se resolver
equações da forma x + b = a. Filosoficamente, os números inteiros consistem em todas
as possíveis soluções desse tipo de equação, em que se permite que a, b ∈ ℕ assumam
todos os valores possíveis. A teoria é desenvolvida de maneira que os resultados sem-
pre estejam de acordo com o entendimento intuitivo que se tem dos números inteiros.
De fato, a teoria é bastante coerente e modela a realidade. Esse tipo de desen-
volvimento permite expandir o entendimento pleno das nuances da teoria. Isso, em
particular, conduz a uma maior maturidade e a uma visão mais ampla a respeito do
assunto, o que traz maior segurança para tratar de tópicos mais avançados da aritmé-
tica, conforme o estudo avance.
ATIVIDADES
Vídeo 1. Demonstre que se x ≤ℤ y e z ≥ 0, então x ⋅ z ≤ℤ y ⋅ z.
REFERÊNCIAS
ALENCAR FILHO, E. Iniciação à lógica matemática. São Paulo: Nobel, 2002.
DOMINGUES, H. H.; IEZZI, G. Álgebra moderna. São Paulo: Atual, 2003.
HEFEZ, A. Elementos de aritmética. Rio de Janeiro: SBM, 2006.
IEZZI, G.; MURAKAMI, C. Fundamentos de matemática elementar: conjuntos e funções. São Paulo: Atual,
2004. v. 1.
4.1 Divisibilidade
Nesta seção, daremos início à discussão de um dos conceitos centrais da aritmé-
Vídeo
tica: a divisão. O ponto de partida será a divisão de números naturais na definição
a seguir e, posteriormente, a divisão dos números inteiros.
90 Aritmética
Definição
Sejam a, b ∈ ℕ. Dizemos que a divide b se existe c ∈ ℕ tal que
b=a⋅c
Nesse caso, escrevemos
a|b
e lemos a divide b.
Se a|b, dizemos também que:
• a é um divisor de b;
• b é divisível por a;
• b é múltiplo de a.
Se a não divide b, escrevemos a∤b.
Notamos que a definição anterior coincide com a que conhecemos desde o en-
sino básico. Contudo, vamos ilustrá-la.
Σxemρlo 1
Sendo assim, é possível escrevermos 2|6. Contudo, 2∤3, pois não existe um nú-
mero natural c tal que 3 = 2 · c.
Σxemρlo 2
a=1⋅a
0=0⋅c
0=0⋅1
Ainda sobre o exemplo anterior, não devemos confundir a relação a|b com a fra-
ção a . Enquanto 0|0 tem um sentido bem definido, 0 é uma forma indeterminada.
b 0
De fato, | (divide) é uma relação de ordem no conjunto dos números naturais
por ser reflexiva, antissimétrica e transitiva, conforme demonstrado a seguir.
Proposição
Demonstração
II. Suponhamos que a, b ∈ ℕ são tais que a|b e b|a. Então, existem c, d ∈ ℕ
tais que
b=a⋅cea=b⋅d
a ⋅ 1 = a = b ⋅ d = (a ⋅ c) ⋅ d = a ⋅ (c ⋅ d)
a=b⋅d=b⋅1=b
III. Suponhamos que a, b, c ∈ ℕ são tais que a|b e b|c. Nesse caso, existem c,
d ∈ ℕ, de modo que:
b=a⋅cec=b⋅d
(Continua)
92 Aritmética
Consequentemente, pela associatividade da multiplicação em ℕ temos que
c = b ⋅ d = (a ⋅ c) ⋅ d = a ⋅ (c ⋅ d)
Além de ser uma relação transitiva, antissimétrica e transitiva, | tem outras pro-
priedades que costumamos utilizar com frequência. Elas estão enunciadas e de-
monstradas a seguir.
Teorema
Demonstração
I. Aceitemos que b = a ⋅ k e c = a ⋅ ℓ. Se x, y ∈ ℕ:
b ⋅ x + c ⋅ y = (a ⋅ k) ⋅ x + (a ⋅ ℓ) ⋅ y = a ⋅ (k ⋅ x + ℓ ⋅ y)
u = b – a = c ⋅ ℓ – c ⋅ k = c ⋅ (ℓ – k)
V. Consideremos que d|b e d|a com b ≤ a. Por IV, segue que d|(a – b). No en-
tanto, suponhamos que d|b com b ≤ a e d|(a – b). Aplicando III, temos que
(Continua)
b = a ⋅ k = a ⋅ (1 + ℓ) = a ⋅ 1 + a ⋅ ℓ = a + a ⋅ ℓ
Definição
Dizemos que um número inteiro a divide um inteiro b e escrevemos a|b quando b = a · c para
algum c ∈ ℤ. Nesse caso, afirmamos que a é um divisor de b ou que b é divisível por a, ou
ainda que b é múltiplo de a. Se a não divide b, escrevemos a∤b.
Σxemρlo 4
O número inteiro –2 divide o inteiro 6, pois 6 = (–2) ⋅ (–3). Porém, o inteiro 2 não
divide o inteiro –5, pois não existe um número inteiro c tal que
–5 = 2 ⋅ c
Teorema
94 Aritmética
II. Por hipótese, a = b ⋅ k e b = a ⋅ ℓ para determinados k, ℓ ∈ ℤ. Se a = 0, então,
b = 0 e não há o que provar. Admitamos a ≠ 0. Nesse caso, Desafio
a = b ⋅ k = (a ⋅ ℓ) ⋅ k = a ⋅ (ℓ ⋅ k) Para verificar que as afirmativas I,
III e IV são análogas àquelas dos
Isso implica ℓ ⋅ k = 1. Consequentemente, ℓ = k = 1 ou ℓ = k = –1. Portanto, números naturais, demonstre essas
a = b ou a = –b. propriedades, ou seja, mostre que:
• | é reflexiva: a|a para todo a
V. Por hipótese, b = a ⋅ k com k ∈ ℕ. Como consequência,
∈ ℤ.
|b| = |a ⋅ k| = |a| ⋅ |k| • | é transitiva: se a, b, c ∈ ℤ são
Em particular, |a|│|b|. Por outro lado, suponhamos que |b| = |a| ⋅ k para tais que a|b e b|c, então, a|c.
algum k ∈ ℕ. Como |a| ≥ 0 e |b| ≥ 0, k ≥ 0. Dessa forma, k = |k| e, portanto, • Se a, b, c ∈ ℤ são tais que a|b e
a|c, então, a|(b + c).
|b| = |a| ⋅ k = |a| ⋅ |k| = |a ⋅ k|
7=2·3+1
a=b·q+rer<b
(Continua)
X ≔ {n ∈ ℕ | b ⋅ n > a}
b≥1⇒a⋅b≥a
⇒a⋅b+b≥a+b
⇒ b ⋅ (a + 1) ≥ a + b > a
b ⋅ q ≤ a < b ⋅ (q + 1)
a=b⋅q+r
(a – b ⋅ q) + b ⋅ q ≥ b + b ⋅ q
a=b⋅q+r
com r < b. Por fim, devemos checar a unicidade, isto é, suponhamos que
a = b ⋅ q + r = b ⋅ q1 + r1
0 < r – r1 < b
b ⋅ q + (r – r1) = b ⋅ q1
Definição
Sejam a, b, q, r ∈ ℕ tais que
a=b⋅q+r
com r < b. Os elementos a, b, q e r são denominados, respectivamente, de divisor, dividendo,
quociente e resto da divisão de a por b.
96 Aritmética
Σxemρlo 5
7 ⋅ 3 < 25 < 7 ⋅ (3 + 1)
Logo, q = 3 e r = 25 – 7 ⋅ 3 = 25 – 21 = 4.
Portanto,
25 = 7 ⋅ 3 + 4
Essa discussão da divisão euclidiana pode ser estendida para o conjunto dos
números inteiros, conforme discutiremos na sequência de nossos estudos.
Demonstração
Definimos o conjunto:
X ≔ {n ∈ ℕ | n ≠ 0, n ⋅ b > a}
n ⋅ b ≥ n = |a| + 1 > a
q ⋅ b ≤ a < (q + 1) ⋅ b
0≤a–q⋅b<b
Σxemρlo 6
−21 = (q + 1) ⋅ 7
O livro Introdução à teoria
o que implica q = −4. Consequentemente,
dos números, do autor
José Plínio de Oliveira
r = a – q ⋅ b = −25 – (−4) ⋅ 7 = −25 + 28 = 3
Santos, é impecável
quanto à exposição e ao Portanto, −25 = 7 ⋅ (−4) + 3, sendo −4 o quociente e 3 o resto.
rigor desse tema. É uma
fonte interessante para
aprofundamentos, cuja
leitura pode ser feita em
paralelo com os tópicos Além do algoritmo da divisão euclidiana, existem alguns tópicos relacionados à
aqui discutidos.
divisão de números naturais e inteiros muito presentes no currículo do ensino bá-
SANTOS, J. P. O. 3. ed. [s.l.]: Impa,
2018. sico. Entre eles, destacamos o máximo divisor comum e o mínimo múltiplo comum,
que serão os próximos temas abordados.
Definição
Sejam a, b ∈ ℕ. O máximo divisor comum de a e b é um número d ∈ ℕ tal que
I. d|a e d|b.
II. Se c é um número natural tal que c|a e c|b, então, c|d.
98 Aritmética
Σxemρlo 7
I. 2|6 e 2|8.
1. Será que sempre existe o máximo divisor comum de dois números naturais?
2. Se existe o máximo divisor comum de a e b, ele é unicamente determinado por a e b?
Proposição
Demonstração
mdc (a, b)
É necessário mostrar que mdc (a, b) efetivamente existe. Para tanto, será de-
monstrado um resultado preliminar que, por sua importância, deve ser categori-
zado como teorema.
Teorema
Demonstração
Teorema
Demonstração
I. b|0 e b|b.
a = b ⋅ q1 + r1 (r1 < b)
Com isso, chegamos à seguinte sequência: b > r1 > r2 > r3 > .... Porém, existe n ∈ ℕ
tal que rn+1 = 0, pois do contrário o subconjunto não vazio {b, r1, r2, …} ⊂ ℕ não teria
um menor elemento. Assim, para algum n temos
rn–2 = rn–1 ⋅ qn + rn
rn–1 = rn ⋅ qn+1
rn = mdc (rn–1, rn) = mdc (rn–2, rn–1) = ... = mdc (b, r1) = mdc (a, b)
100 Aritmética
Percebemos que a demonstração do teorema anterior é construtiva, ou seja,
fornece uma maneira de obter o máximo divisor comum de modo explícito. Isso é
ilustrado no exemplo a seguir.
Σxemρlo 8
51 = 14 ⋅ 3 + 9
14 = 9 ⋅ 1 + 5
9=5⋅1+4
5=4⋅1+1
4=4⋅1+0
Portanto, mdc (51, 14) = 1, pois o último valor de r (resto) antes de obtermos o
resto 0 é o número 1 em destaque.
Σxemρlo 9
55 = 22 ⋅ 2 + 11
22 = 11 ⋅ 2 + 0
Teorema
(Continua)
a = b ⋅ q1 + r1
b = r1 ⋅ q2 + r2
r1 = r2 ⋅ q3 + r3
rn–2 = rn–1 ⋅ qn + rn
rn–1 = rn ⋅ qn+1
c ⋅ a = (c ⋅ b) ⋅ q1 + c ⋅ r1
c ⋅ b = (c ⋅ r1) ⋅ q2 + c ⋅ r2
c ⋅ r1 = (c ⋅ r2) ⋅ q3 + c ⋅ r3
c ⋅ rn-2 = (c ⋅ rn-1) ⋅ qn + c ⋅ rn
Mas,
Corolário
a b
I. Se a, b ∈ ℕ \ {0} e d = mdc (a, b), então, mdc , =1 .
d d
II. Se a|b ⋅ c e mdc (a, b) = 1, então, a|c.
Demonstração
I. Note que
a b a b
d = mdc (a, b) = mdc d · , d · = d · mdc ,
d d d d
a b
mdc , = 1
d d
102 Aritmética
mdc (a ⋅ c, b ⋅ c) = c
a|mdc (a ⋅ c, b ⋅ c) = c
III. Como mdc (a, b) = 1, temos que mdc (a ⋅ c, b ⋅ c) = c. Mas, a ⋅ b|a ⋅ c, pois b|c
e a ⋅ b|b ⋅ c, dado que a|c. Portanto,
a ⋅ b|mdc (a ⋅ c, b ⋅ c) = c
A discussão do máximo divisor comum também pode ser feita para o conjunto
dos inteiros, conforme explicado a seguir.
Definição
Sejam a e b dois números inteiros. O máximo divisor comum de a e b, denotando mdc (a, b), é
definido por
mdc (a, b) ≔ mdc (|a|, |b|)
mdc (a, b) = mdc (|a|, |b|) = mdc (|b|, |a|) = mdc (b, a)
para todo a, b ∈ ℤ.
Σxemρlo 10 Leitura
Para conhecer mais a
respeito do máximo divisor
Temos que: comum entre o número 0
e outro número inteiro, su-
• mdc (–8, 2) = mdc (|–8|, |2|) = mdc (8, 2) = 2. gerimos a leitura do artigo
O algoritmo euclidiano, da
• mdc (0, –5) = mdc (|0|, |–5|) = mdc (0, 5) = 5. plataforma Khan Academy.
I. d ≥ 0;
Demonstração
1 1
(⇒) Inicialmente, supomos que d é o máximo divisor comum de a e b em ℤ para
Nas demonstrações com a propo- validar os itens I, II e III. Por definição, temos que
sição “se, e somente se”, o símbolo
(⇒) ou ⇒ indica que a prova d = mdc (a, b) = mdc (|a|, |b|)
será feita considerando a hipótese
Portanto, d ≥ 0.
(se) para validar a tese (então).
Agora, por hipótese, d│|a| e d│|b|. Em particular, d|a e d|b, pois |a| e |b|
diferem de a e b, respectivamente, apenas por um sinal.
Supomos, então, que c|a e c|b. Logo, |c|│|a| e |c|│|b| e, portanto, |c|│mdc (|a|,
2
|b|) = d.
Nas demonstrações com a propo-
2
sição “se, e somente se”, o símbolo (⇐) Agora consideramos que vale I, II e III para comprovar que d é o máximo
(⇐) ou ⇐ indica que a prova será
divisor comum de a e b em ℤ.
feita considerando a tese (então)
para validar a hipótese (se). Como d|a e d|b, resulta em d│|a| e d│|b|. Admitamos que c│|a| e c│|b|.
Logo, c|a e c|b. Consequentemente, em III, c|d. Isso mostra que
O máximo divisor comum no conjunto dos inteiros tem outras propriedades inte-
ressantes, conforme demonstramos a seguir.
Proposição
Demonstração
I. Vamos utilizar a proposição anterior. Para tanto, vemos que |a| ≥ 0 e que
a é múltiplo de |a|, uma vez que a = |a| ⋅ (±1). Em particular, |a||a. Além
disso, como a|b, decorre |a||b. Finalmente, se c|a e c|b, logo, c||a|. Isso
mostra que mdc (a, b) = |a|.
(Continua)
104 Aritmética
II. A demonstração é completamente análoga ao resultado já obtido para o Desafio
máximo divisor comum em ℕ. De modo semelhante ao que
∎ fizemos no conjunto dos números
naturais, demonstre que se
a = b ⋅ q + r, então,
mdc (a, b) = mdc (b, r) com a,
O próximo resultado apresentado costuma surgir frequentemente em
b ∈ ℤ.
discussões teóricas.
Teorema
d = a ⋅ x0 + b ⋅ y0
Demonstração
X ≔ {a ⋅ x + b ⋅ y | x, y ∈ ℤ}
como
a ⋅ a + b ⋅ b = a2 + b2 ∈ X e a2 + b2 > 0
d = a ⋅ x0 + b ⋅ y0
a=d⋅q+r
a = (a ⋅ x0 + b ⋅ y0) ⋅ q + r
o que implica
r = a – (a ⋅ x0 + b ⋅ y0) ⋅ q = a ⋅ (1 – x0 ⋅ q) + b ⋅ (q ⋅ (–y0))
Corolário
Demonstração
Definição
Sejam a, b ∈ ℕ. Um mínimo múltiplo comum de a, b ∈ ℕ é um número m ∈ ℕ tal que
I. a|m e b|m.
II. Se a|m’ e b|m’ ⇒ m|m’.
Teorema
m1|m2
m2|m1
m1 = m2
mmc (a, b)
A seguir demonstramos que mmc (a, b) existe para quaisquer que sejam a, b ∈
ℕ. Para tanto, verificamos um resultado auxiliar.
Proposição
ab
m
d
Demonstração
Inicialmente, observamos que d| ⋅ (a ⋅ b), uma vez que d|a e d|b. Em particular,
m ∈ ℕ. Agora notamos que
b ab
a m
d d
m’ = a ⋅ k e m’ = b ⋅ ℓ
Consequentemente,
a⋅k=b⋅ℓ
o que implica
a b
k
d d
a a b b
Essa igualdade revela que k k . Mas,
divide
d d d d
(Continua)
a ab
m' b t t m t
d d
Σxemρlo 11
Proposição
108 Aritmética
para todo c ∈ ℕ.
Demonstração
Se a = 0 ou b = 0, m = 0 e c ⋅ a = 0 ou c ⋅ b = 0. Mas,
mmc (c ⋅ a, c ⋅ b) = 0 = c ⋅ m
c ac b c2 a b ab
mmc (c a, c b) c c mmc (a, b)
mdc (c a, c b) c mdc (a, b) mdc (a, b)
Assim como feito para o máximo divisor comum, é possível estendermos o mí-
nimo múltiplo comum para o conjunto dos números inteiros. Comecemos com a
definição do mínimo múltiplo comum nesse conjunto.
Definição
Sejam a, b ∈ ℤ. O mínimo múltiplo comum de a e b é
mmc (a, b) ≔ mmc (|a|, |b|)
mmc (a, b) = mmc (|a|, |b|) = mmc (|b|, |a|) = mmc (b, a)
Teorema
Demonstração
(⇒) Supomos que m = mmc (a, b) = mmc (|a|, |b|). Em particular, m ≥ 0. Como
m é múltiplo de |a| e |b|, m também é múltiplo de a e b, pois a e b diferem de |a|
e |b|, respectivamente, apenas por um sinal.
(Continua)
(⇐) Supomos que m é um inteiro não negativo e múltiplo de a e b, tal que todo
múltiplo de a e b também é múltiplo de m. Mas, então, m é múltiplo de |a| e |b|.
Se m’ é múltiplo de |a| e |b|, m’ é múltiplo de a e b e, portanto, é múltiplo de m.
Logo, m = mmc (|a|, |b|) em ℕ e, como consequência, m = mmc (a, b) em ℤ.
Proposição
Sejam a, b ∈ ℤ:
Em particular, se a ≠ 0 e b ≠ 0:
| a ⋅ b|
mmc (a, b) =
mdc (a, b)
Demonstração
| a | ⋅ |b |
mmc (|a|,|b|) =
mdc (|a|,|b|)
temos que
|a| |b|
mmc (|a|,|b|) mmc (|a|,|b|) = mdc (|a|,|b|) |a| |b| = |a b|
mdc (|a|,|b|)
Com
mdc (|a|, |b|) = mdc (a, b) e mmc (|a|, |b|) = mmc (a, b)
temos que
| a b|
mmc (a, b)
mdc (a,b)
110 Aritmética
Livro
Σxemρlo 12 A obra Elementos de
aritmética, muito bem es-
crita por Abramo Hefez, é
Para calcularmos o mínimo múltiplo comum entre os inteiros –52 e 16, fazemos: uma leitura essencial para
complementar e aprofun-
mdc (–52, 16) = mdc (|–52|, |16|) = mdc (52, 16) = 4 dar os tópicos desenvolvi-
dos em nossos estudos.
Consequentemente, HEFEZ, A. Rio de Janeiro: SBM,
2005. (Coleção Profmat).
| 52 ||16 | 52 16
mmc ( 52, 16) = 208
mdc ( 52,16) 4
Definição
Um número p ∈ ℕ é denominado primo se
I. p ≠ 0 e p ≠ 1;
II. os únicos divisores de p forem 1 e p.
Um número a ∈ ℕ tal que a ≠ 0 e a ≠ 1, que não é primo, é dito composto.
a=b·c
com b ≠ 1 e c ≠ 1.
• O número 2 é primo.
Proposição
Demonstração
mdc (a, p) = 1
p|b
112 Aritmética
Lema
X = {x ∈ ℕ | x > 1, x|a}
é um número primo.
Demonstração
Percebemos que a ∈ X, pois a > 1 e a|a. Pelo princípio da boa ordenação dos
naturais, X tem um menor elemento p. Em particular, p ≠ 0 e p ≠ 1. Se p não fosse
primo, existiriam b, c ∈ ℕ tais que b ≠ 1 e c ≠ 1, de modo que
p=b⋅c
Mas, nesse caso, teríamos b < p. Porém, b sendo divisor de p, também divide
a. Logo, b ≠ 1 seria um divisor de a menor que p, e isso é um absurdo. Portanto,
p é primo.
Para todo número natural a > 1 existem números primos p1, …, pn, n ≥ 1 tais que
a = p1 ⋅ p2 ⋅ ... ⋅ pn
Demonstração
• Suponhamos que a > 2 e que o teorema seja válido para todo b tal que
2≤b<a
(I) a = p1 ⋅ a1
para algum a1 ∈ ℕ \ {0}.
(Continua)
a1 = p2 ⋅ p3 ⋅ ... ⋅ pn
a = p1 ⋅ p2 ⋅ ... ⋅ pn
a = p1 ⋅ p2 ⋅ ... ⋅ pn = q1 ⋅ q2 ⋅ ... ⋅ qm
com p1, …, pn, q1, …, qm primos, logo, m = n e {p1, …, pn} = {q1, …, qm}. A igualdade
p1 ⋅ p2 ⋅ ... ⋅ pn = q1 ⋅ q2 ⋅ ... ⋅ qm
implica p1 |(q1 ⋅ q2 ⋅ ... ⋅ qm) e, portanto, p1|qi para algum i. Analisando a numeração,
é possível deduzirmos que i = 1, ou seja, p1|q1. Mas como 1 e q1 são os únicos divi-
sores de q1 e p1 ≠ 1, segue que p1 = q1. Cancelando p1 e q1 na igualdade, obtemos
p2 ⋅ p3 ⋅ ... ⋅ pn = q2 ⋅ q3 ⋅ ... ⋅ qn
Σxemρlo 14
60 2
30 2
15 3
5 5
1
Assim,
60 = 2 ⋅ 2 ⋅ 3 ⋅ 5 = 22 ⋅ 3 ⋅ 5
114 Aritmética
em que ri conta o número de vezes que o fator pi se repete. Observamos que 1 ≤ k
≤ n e pi ≠ pj sempre que i ≠ j e ri ≥ 1 para i = 1, …, k. Quando p1 < p2 < ⋯ < pk, obtemos
a decomposição canônica de a. Por exemplo:
60 = 22 ⋅ 3 ⋅ 5
60 = 22 ⋅ 3 ⋅ 5 ⋅ 70 e 350 = 2 ⋅ 30 ⋅ 52 ⋅ 7
Corolário
I. Se a p1r1 pr22 ... pkrk , então, b|a se, e somente se, b p1s1 p2s2 ... pksk com 0 ≤
si ≤ ri para todo i ∈ {1, …, k}.
então,
então, Glossário
mdc (a, b) = p1t1 ⋅ p2t 2 ⋅ ... ⋅ pktk O termo max é a abreviação de
máximo, ou seja, ti é o elemento
máximo do conjunto {ri, si}.
sendo ti = max {ri, si} para todo i ∈ {1, …, k}.
Demonstração
com 0 ≤ ui ≤ ri e 0 ≤ ui ≤ si para todo i ∈ {1, …, k}. Mas para cada índice i temos
0 ≤ ui ≤ min{ri, si} = ti
uma vez que min {ri, si} = ri ou min {ri, si} = si.
Σxemρlo 15
Curiosidade
Para determinar o máximo divisor comum entre 36 e 52, fazemos:
O teorema de Euclides
enuncia que o conjunto
36 = 22 ⋅ 32 ⋅ 130 e 52 = 22 ⋅ 30 ⋅ 131
dos números primos é
infinito, porém podemos Consequentemente,
questionar: qual é o maior
número primo? Até o mdc (36, 52) = 22 ⋅ 30 ⋅ 130 = 4
momento, o maior já des-
coberto tem quase 25 mi- Analogamente,
lhões de dígitos! Para saber
mais a respeito, sugerimos mmc (36, 52) = 22 ⋅ 32 ⋅ 131 = 468
duas matérias:
• Maior número primo do mundo
é descoberto por engenheiro
voluntário nos EUA. Disponível em:
https://g1.globo.com/educacao/ Finalmente, utilizando o teorema fundamental da aritmética é possível demons-
noticia/maior-numero-primo-do- trar que o conjunto dos números primos é infinito. Esse teorema é conhecido como
-mundo-e-descoberto-por-enge-
teorema de Euclides, e será demonstrado a seguir.
nheiro-voluntario-nos-eua.ghtml.
Acesso em: 6 maio 2021.
• Descoberto número primo com
quase 25 milhões de dígitos. Dispo-
nível em: https://impa.br/noticias/
descoberto-numero-primo-com-
Teorema de Euclides
-quase-25-milhoes-de-digi-
tos/#:~:text=H%C3%A1%20 O conjunto dos números primos é infinito.
menos%20de%20quatro%20me-
ses,de%20aproximadamente%20 Demonstração
R%24%2011%20mil. Acesso em:
6 maio 2021. Suponhamos, por absurdo, que o conjunto P dos números primos é finito. Nesse
caso, seria possível escrevermos:
116 Aritmética
para algum r ∈ ℕ. Definimos:
n ≔ p1 ⋅ p2 ⋅ ... ⋅ pr + 1
Como n admite um divisor primo p e p1, …, pr são primos, segue que p = pi para
algum i ∈ {1, …, r}. Sendo assim
1 = n – p1 ⋅ p2 ⋅ ... ⋅ pr
Definição
Um número p ∈ ℤ é um inteiro primo (ou simplesmente primo) se |p| é primo em ℕ.
Σxemρlo 16
Os números –2, –3, –5, –7 são inteiros primos, pois os números naturais 2, 3, 5
e 7 são primos em ℕ.
Teorema
I. p ≠ 0 e p ≠ 1;
(Continua)
|p| = c ⋅ q
com q ∈ ℕ. Em particular,
|p| = |c ⋅ q|
Então,
p = ±c ⋅ q = c ⋅ (±q)
Seja a ∈ ℤ tal que a ≠ 0 e a ≠ ±1. Então, existem números primos p1, p2, …, pn ∈ ℤ
com n ≥ 1, todos maiores que 1, tais que
Demonstre a unicidade da de- conforme a > 0 ou a < 0. Além disso, essa decomposição é única, a menos na ordem
composição a = p1 ⋅ p2 ⋅ ... ⋅ pn dos fatores.
ou a = –p1 ⋅ p2 ⋅ ... ⋅ pn, enun-
ciada no teorema fundamental Demonstração
da aritmética no conjunto dos
números inteiros. Basta considerarmos que a = ±|a| e aplicarmos o teorema fundamental da
aritmética válido para ℕ. É possível, ainda, demonstrarmos a unicidade com o
mesmo argumento utilizado na demonstração da unicidade no teorema funda-
Livro
mental da aritmética válido para ℕ.
O livro Introdução à
teoria dos números, escrito ∎
por Ana Maria Amarillo
Bertone, traz uma exposi-
ção da teoria dos números
muito próxima da maneira
A seguir apresentamos um exemplo que ilustra o emprego do teorema anterior.
com a qual desenvolve-
mos nossos estudos até o
momento. Fica o convite
para conferir, sobretudo,
Σxemρlo 17
a exposição a respeito dos
números primos.
O número inteiro –120 decompõe-se em fatores primos da seguinte forma:
BERTONE, A. M. A. Uberlândia UFU,
2014. –102 = –2 ⋅ 3 ⋅ 17
118 Aritmética
O teorema fundamental da aritmética é um dos principais resultados da
aritmética, merecendo, portanto, atenção especial. Certifique-se de que todo o con-
teúdo que estudamos está claro e consulte as referências indicadas ao longo do
capítulo para ampliar seus conhecimentos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Grande parte da aritmética é dedicada ao estudo de tópicos relacionados à divisão
de números naturais e/ou inteiros. Nesse contexto, destacam-se as noções de máxi-
mo divisor comum, mínimo múltiplo comum e números primos.
O estudo desses conceitos permite melhor compreender a estrutura dos nú-
meros naturais e inteiros e a álgebra elementar como um todo. De modo adicio-
nal, diversas aplicações, tanto teóricas quanto práticas, decorrem do estudo aqui
apresentado. Ainda existem muitos problemas e mistérios a serem explorados, por
exemplo qual é o maior número primo.
Basta uma pesquisa rápida na internet para descobrimos muitas conjecturas en-
volvendo a teoria dos números. Diante disso, destacamos que este capítulo pode e
deve servir como ponto de partida para o estudo de tópicos adicionais.
ATIVIDADES
Vídeo 1. É verdade que se a e b são números naturais não nulos, mdc (a, b) = mdc (a, b – a)?
Justifique sua resposta.
REFERÊNCIAS
ALENCAR FILHO, E. de. Iniciação à lógica matemática. São Paulo: Nobel, 2002.
DOMINGUES, H. H.; IEZZI, G. Álgebra moderna. São Paulo: Atual, 2003.
HEFEZ, A. Elementos de aritmética. Rio de Janeiro: SBM, 2006.
IEZZI, G.; MURAKAMI, C. Conjuntos/funções. São Paulo: Atual, 2004. (Coleção Fundamentos de Matemática
Elementar, v. 1).
59.048 = 11 ⋅ 5.368
Pierre de Fermat
Com o que discutimos até o momento, é possível demonstrar o pequeno teore-
ma de Fermat sem grandes dificuldades.
120 Aritmética
Teorema – Pequeno teorema de Fermat
Demonstração
a = p ⋅ q1 + r1 (0 < r1 < p)
2a = p ⋅ q2 + r2 (0 < r2 <p)
i ⋅ a = p ⋅ qi + r e j ⋅ a = p ⋅ qj + r
temos que
(i – j) ⋅ a = i ⋅ a – j ⋅ a = p ⋅ qi + r – p ⋅ qj – r = p ⋅ (qi – qj)
Isso mostra que p é um divisor de i – j, pois p é primo e não divide a. Mas isso é
possível apenas se i = j, pois |i – j| < p.
Congruências 121
Σxemρlo 1
100.000 = 6.250 · 16
de forma que
Σxemρlo 2
Utilizando o pequeno teorema de Fermat é possível verificar que 250 + 350 é divi-
sível por 13. De fato,
250 = 24 · 12 + 2 = (214)4 · 2
de modo que
Analogamente,
350 = 34 · 12 + 2 = (312)4 · 32
e, portanto,
Logo,
Concluímos que
Pierre de Fermat trouxe muitas grandes contribuições para a teoria dos núme-
ros. Cabe destacar que foi ele quem introduziu sistemas de eixos perpendiculares,
ideia geralmente atribuída a René Descartes. De fato, as coordenadas cartesia-
nas deveriam ser chamadas de coordenadas fermatianas. Além disso, atribui-se a
122 Aritmética
Fermat a descoberta das equações da circunferência, da reta, bem como as mais
simples equações das seções cônicas: elipse, parábola, hipérbole.
Essa relação dará origem ao conjunto dos inteiros módulo m, importante mode-
lo conceitual de um grupo aditivo abeliano que pode ser encontrado na teoria de
grupos estudada em outras disciplinas de álgebra.
Definição
Sejam a, b ∈ ℤ e m ∈ ℤ \ {0}. Dizemos que a é congruente a b módulo m e escrevemos
a ≡ b (mod m) se m|(a – b)
a–b=m⋅q
a=b+m⋅q
7 ≡ 3 (mod 2)
pois
2|(7 – 3) = 4
Também,
7 ≡ 3 (mod 4)
pois
4|(7 – 3) = 4
Teorema
(Continua)
Congruências 123
Demonstração
De fato, se a ∈ ℤ, então
m|0 = (a – a)
Suponha que a, b ∈ ℤ são tais que a ≡ b (mod m). Isso significa que
m|(a – b)
Mas então,
m| –(a – b) = (b – a)
m|(a – b) e m|(b – c)
Consequentemente,
m|(a – b) + (b – c) = a – c
Note que m|(a – b) se, e somente se, |m|│(a – b), logo basta desenvolver a teo-
ria para o caso em que m > 0. Em virtude disso, de agora em diante, será suposto
que m > 0 sempre que se tratar da congruência módulo m.
Teorema
Dois inteiros a e b são congruentes módulo m se, e somente se, têm o mesmo
inteiro como resto da divisão por m.
Demonstração
a = m ⋅ q1 + r1 e b = m ⋅ q2 + r2
(Continua)
124 Aritmética
Consequentemente,
Dessa forma,
Mas, como 0 ≤ |r1 – r2| < m, temos que m|(r1 – r2) se, e somente se, r1 – r2 = 0, ou
seja, r1 = r2.
Teorema
III. Se a ≡ b (mod m), então an ≡ bn (mod m), para todo inteiro positivo n.
Demonstração
a – b = (a + c) – (b + c)
a = b + q1 ⋅ m e c = q + q2⋅ m
a ⋅ c = (b + q1 ⋅ m) ⋅ (d + q2 ⋅ m)
= b ⋅ d + b ⋅ q2 ⋅ m + q1 ⋅ m ⋅ d + q1 ⋅ q2 ⋅ m
= b ⋅ d + (b ⋅ q2 + q1 ⋅ d + q1 ⋅ q2) ⋅ m
III. Decorre de II usando indução sobre n. Para verificar isso, defina o conjunto
X = {n ∈ ℕ | an ≡ bn (mod m) ∀ a, b ∈ ℤ}
Congruências 125
Considere n ∈ X, ou seja, n ∈ ℕ e
an ≡ bn (mod m)
Mas,
an ≡ bn (mod m) e a ≡ b (mod m) ⇒ an + 1 ≡ bn + 1 (mod m)
Proposição
a ≡ b (mod m)
Demonstração
m|[(a + c) – (b + c)] = (a – b)
Será que vale uma propriedade análoga para a multiplicação? Em outros ter-
mos, se a ⋅ c ≡ b ⋅ c (mod m), será que a ≡ b (mod m)? Não, pois, um contraexem-
plo seria
3 ⋅ 3 ≡ 3 ⋅ 5 (mod 6)
Proposição
Demonstração
m|(a – b) ⋅ c
Logo, m|(a – b) ou m|c. Como mdc (c, m) = 1, segue que m|(a – b), ou seja, a ≡
b (mod m).
126 Aritmética
A seguir, apresentamos um exemplo de natureza prática de um problema que
pode ser resolvido facilmente usando congruências lineares.
Σxemρlo 3
Mas então, elevando ao quadrado ambos os lados da congruência anterior, BERTONE, A. M. A. Uberlândia:
temos UFU, 2014. Disponível em:
https://repositorio.ufu.br/
54 ≡ (–1)2 (mod 26) bitstream/123456789/25317/1/
Introdu%C3%A7%C3%A3o%20
ou seja, a%20Teoria%20dos%20
N%C3%BAmeros.pdf. Acesso em: 17
54 ≡ 1 (mod 26) maio 2021.
a ≡ b (mod m)
Congruências 127
Explicitamente,
= {b ∈ ℤ | m|(b – a)}
= {b ∈ ℤ | b – a = q ⋅ m, q ∈ ℤ}
= {b ∈ ℤ | b = a + q ⋅ m, q ∈ ℤ}
= {a + q ⋅ m | q ∈ ℤ}
Definição
Seja m > 0 um inteiro e a ∈ ℤ , a classe de congruência de a módulo m é o conjunto
[a] = {a + q ⋅ m | m ∈ ℤ }
Em particular, se a, b ∈ ℤ, então
a ≡ b (mod m) ⇔ [a] = [b]
Σxemρlo 4
[0] = {0, ± m, ± 2 ⋅ m, ± 3 ⋅ m, …}
[1] = {1, 1 ± m, 1 ±2 ⋅ m, 1 ± 3 ⋅ m, …}
[2] = {2, 2 ± m, 2 ± 2 ⋅ m, 2 ± 3 ⋅ m, …}
[m – 1] = {m –1,m –1 ± m, m – 1 ± 2 ⋅ m, …}
Agora,
[m + 1] = {m + 1,m + 1 ± m, m + 1 ± 2 ⋅ m, …} = [1]
(Continua)
128 Aritmética
Geralmente, para qualquer m fixado haverá apenas um número finito de clas-
ses de inteiros módulo m. Isso é uma consequência do teorema da divisão euclidia-
na conforme explicaremos posteriormente.
Definição
Seja m > 0 um inteiro, o conjunto dos inteiros módulo m, denotado ℤm, é o conjunto
quociente de ℤ módulo a relação ≡.
Teorema
Demonstração
a=q⋅m+r
a ≡ r (mod m)
[a] = [r]
Resta deduzir que [r] = [x] com x ∈ {0, ..., m}. Mas
Como
[-2] = [m – 2]
[-1] = [m – 1]
Decorre a igualdade,
Congruências 129
Isso mostra a inclusão ℤm ⊂ {[0], [1], …, [m – 1]}. A inclusão contrária é direta, pois
[0], [1], …, [m – 1]} são elementos de ℤm. Isso encerra a demonstração.
[a] + [b] ≔ [a + b]
[a] ⋅ [b] ≔ [a ⋅ b]
Proposição
Demonstração
a ≡ a’ (mod m) e b ≡ b’ (mod m)
Mas,
Agora,
130 Aritmética
Tabela 1
Tábua de adição em ℤ3
+ [0] [1] [2]
[0] [0] [1] [2]
[1] [1] [2] [0]
[2] [2] [0] [1]
Note que existe uma simetria em relação à diagonal dessa tabela. Isso ocorre
pelo fato de a adição ser comutativa. Analogamente, podemos construir a tábula da
multiplicação em ℤ3 conforme a tabela a seguir.
Desafio
Tabela 2
Construa as tábuas da
Tábua de multiplicação em ℤ3
adição e da multiplicação
· [0] [1] [2] em ℤ5.
[0] [0] [0] [0]
[1] [0] [1] [2]
[2] [0] [2] [1]
Teorema
Demonstração
= [a + (b + c)]
= [(a + b) + c]
= [a + b] + [c]
Congruências 131
II. Se a, b ∈ ℤ, então usando a comutatividade da adição em ℤ resulta que
Se [x] ∈ ℤm satisfaz
então
[a + x] = [a]
e, portanto,
0 + a ≡ x + a (mod m)
0 ≡ x (mod m)
IV. Se a ∈ ℤ, então
Nesse caso,
[a + x] = [0]
x + a ≡ x + (–x) (mod m)
a ≡ –x (mod m)
Logo,
–a ≡ x (mod m)
Assim como ocorre com a adição em ℤm, a multiplicação tem propriedades aná-
logas às da multiplicação em ℤ, conforme enunciado a seguir.
Teorema
132 Aritmética
I. Associatividade: [a] ⋅ ([b] ⋅ [c]) = ([a] ⋅ [b]) ⋅ [c].
Demonstração
I. Associatividade:
[a] ⋅ ([b] ⋅ [c]) = [a] ⋅ [b ⋅ c] = [a ⋅ (b ⋅ c)] = [(a ⋅ b) ⋅ c] = [a ⋅ b] ⋅ [c] = ([a] ⋅ [b]) ⋅ [c]
[a ⋅ (b ⋅ c)] = [(a ⋅ b) ⋅ c]
Comutatividade:
Desafio
Utilizando a comutatividade da multiplicação em ℤ para escrever Demonstre as propriedades
da multiplicação (⋅) em ℤm
[a ⋅ b] = [b ⋅ a]
a seguir:
Temos que • Existência do neutro: [1] é
o único elemento de ℤm,
[a] ⋅ [b] = [a ⋅ b] = [b ⋅ a] tal que
[a] ⋅ [1] = [a]
Com o auxílio dessas demonstrações, é possível verificar a existência do neutro
para todo [a] ∈ ℤm.
e a propriedade distributiva da multiplicação (⋅) em ℤm.
• Distributividade: [a] ⋅ ([b] +
∎ [c]) = [a] ⋅ [b] + [a] ⋅ [c].
Definição
Um elemento [a] ∈ ℤm não nulo, isto é, [a] ≠ [0], é um divisor do zero se existe [b] ∈ ℤm
tal que [a] ⋅ [b] = [0].
Congruências 133
Proposição
mdc (a, m) ≠ 1
Demonstração
Suponha que [a] seja um divisor do zero e considere [b] ∈ ℤm não nulo, tal que
Mas
significa que
a ⋅ b ≡ 0 (mod m)
Supondo por absurdo que mdc (a, m) = 1, segue que m|b e, portanto, [b] = [0],
uma contradição.
Por outro lado, suponha que mdc (a, m) = k > 1. Queremos encontrar [b] ≠ [0] em
ℤm, tal que [a] ⋅ [b] = [0]. Como k divide a e divide m, podemos escrever
a = q1 ⋅ k e m = q2 ⋅ k
a ⋅ q2 = q1 ⋅ k ⋅ q2 = q1 ⋅ m
Consequentemente,
Corolário
(Continua)
134 Aritmética
Demonstração
Desafio
I. Decorre diretamente do teorema anterior.
Demonstre que se p > 1
II. Suponha, por absurdo, que m não seja primo. Então é possível escrever é um inteiro primo, então
ℤp não contém divisores
m = k ⋅ l com 1 < k < m e 1 < l < m de zero.
Mas então
Teorema
Demonstração
Suponha que m seja primo e sejam [a], [b], [c] ∈ ℤm com [a] ≠ [0] tais que
Mas então
Como [a] ≠ [0] e ℤm não têm divisores de zero, segue que [b] – [c] = [0] e, portanto,
[b] = [c].
Por outro, basta demonstrar que ℤm não contém divisores do zero. Para tanto,
sejam [a], [b] ∈ ℤm tais que [a] ⋅ [b] = [0]. Se [a] ≠ [0], então aplicando a lei do cance-
lamento à igualdade
Congruências 135
Definição
Dizemos que um elemento [a] ∈ ℤm é invertível se existe [b] ∈ ℤm tal que [a] ⋅ [b] = [1].
Nesse caso, dizemos que [b] é um inverso de [a].
Entretanto, note que [0] não é invertível em ℤm, qualquer que seja m. De fato,
para qualquer [a] ∈ ℤm temos [0] ⋅ [a] = [0] ≠ [1].
Teorema
Seja [a] um elemento não nulo em ℤm. Então, [a] é invertível se, e somente se,
mdc (a, m) = 1.
Demonstração
Suponha que [a] seja invertível e que mdc (a, m) ≠1. Em particular, [a] é divisor
do zero. Logo, existe [b] ≠ [0] tal que [a] ⋅ [b] = [0]. Nesse caso, [a] não pode ser in-
vertível. De fato, se existisse [c] ∈ ℤm tal que [a] ⋅ [c] = [1], então teríamos que
[b] = [b] ⋅ [1] = [b] ⋅ ([a ⋅ c]) = ([a] ⋅ [b]) ⋅ [c] = [0] ⋅ [c] = [0]
uma contradição.
a⋅k+m⋅l=1
Consequentemente,
[1] = [a ⋅ k + m ⋅ l]
= [a ⋅ k] + [m ⋅ l]
= [a] ⋅ [k]
136 Aritmética
Note que a demonstração do teorema anterior fornece uma maneira explícita
de obter o inverso de um elemento em ℤm. Por exemplo, para achar o inverso de [4]
em ℤ37, encontramos a, b ∈ ℤ tais que
a ⋅ 4 + b ⋅ 37 = 1
Nesse caso, a = –9 e b = 1.
Corolário Livro
Se p > 0 é um inteiro primo, então todo elemento não nulo de ℤp é invertível. Teoria elementar dos nú-
meros, escrito por Edgard
Demonstração de Alencar Filho, é um
excelente livro para quem
Considere [a] ∈ ℤ p um elemento não nulo. Como ℤp = {[0], [1], ..., [p – 1]} e [a] ≠ 0, deseja conhecer mais sobre
podemos supor que 1 ≤ a ≤ p – 1. Porém os únicos divisores de p são 1 e p. Isso, jun- inteiros módulo m.
tamente com a desigualdade 1 ≤ a ≤ p – 1, mostra que os únicos divisores comuns ALENCAR FILHO, E. T. São Paulo:
de a e p é 1 e, portanto, mdc (a, p) = 1. Pelo teorema anterior, [a] é invertível em ℤ p. Nobel, 1992.
Sejam n1, n2, …, nk inteiros positivos tais que mdc (ni, nj) = 1, para todo i ≠ j. Então,
o sistema de congruências lineares
x a1 (mod n1)
x a (mod n )
2 2
x ak (mod nk )
(Continua)
Congruências 137
admite uma solução simultânea, que é única módulo o inteiro n = n1 ⋅ n2 ⋅ ... ⋅ nk, ou
seja, se x e x’ são soluções para o sistema, então
Demonstração
n
Nr n1 n2 ... nr 1 nr 1 ... nk
nr
Nr ⋅ x ≡ 1 (mod nr)
admite uma única solução, digamos xr, já que mdc (Nr, nr) = 1.
x = a1 N1 x1+ a2 N2 x2 + ⋅⋅⋅ + ak Nk xk
Ni ≡ 0 (mod nr)
Além disso,
x = ar ⋅ 1 = ar (mod nr)
Resta mostrar que a solução é única e módulo n = n1 ⋅ n2 ⋯ nk. Para tanto, seja x’
outra solução, ou seja,
x ≡ ar (mod nr) ≡ x’
para r ∈ {1, …, k}. Consequentemente, nr divide x – x’, para todo r. Como mdc
(ni, nj) = 1, temos, necessariamente, que
n = n1 ⋅ n2 ⋅ … ⋅ nk |x -x’
Σxemρlo 5
x 2 (mod 3)
x 3 (mod 5)
x 2 (mod 7)
(Continua)
138 Aritmética
A solução x para esse sistema de congruências lineares é um inteiro cuja divisão
por 3, 5 e 7 tem como resto 2, 3 e 2 respectivamente. A solução será obtida seguin-
do o procedimento descrito no teorema chinês dos restos. Para tanto, sejam
• a1 = 2;
• a2 = 3;
• a3 = 2.
E
• n1 = 3;
• n2 = 5;
• n3 = 7.
n = n1 ⋅ n2 ⋅ n3 = 3 ⋅ 5 ⋅ 7 = 105
enquanto
• N1 = 5 ⋅ 7 = 35;
• N2 = 3 ⋅ 7 = 21;
• N3 = 3 ⋅ 5 = 15.
N1 ⋅ x1 ≡ 1 (mod 3)
N2 ⋅ x2 ≡ 1 (mod 5)
N3 ⋅ x3 ≡ 1 (mod 7)
são
35 ⋅ x1 ≡ 1 (mod 3)
21 ⋅ x2 ≡ 1 (mod 5)
Livro
15 ⋅ x3 ≡ 1 (mod 7)
A obra Números: uma
Essas congruências, por sua vez, equivalem a introdução à matemática,
escrita por César Polcino
2 ⋅ x1 ≡ 2 (mod 3) Milies e Sônia Pitta Coelho,
traz diversos exemplos
x2 ≡ 1 (mod 5) e aplicações do teorema
chinês dos restos.
x3 ≡ 1 (mod 7)
MILIES, F. C. P.; COELHO, S. P. 3. ed. São
Portanto, a solução do sistema é dada por Paulo: USP, 2001.
x = 2 ⋅ 35 ⋅ 2 + 3 ⋅ 21 ⋅ 1 + 2 ⋅ 15 ⋅ 1 = 233 (mod 105)
A título de curiosidade, o teorema chinês dos restos recebe esse nome pelo fato
de sua descoberta ser atribuída ao matemático chinês Tzu Suan Ching, aparecendo
na obra Manual de aritmética do Mestre Sun, livro datado entre 287 d.C. e 473 d.C.
Congruências 139
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A aritmética é uma ferramenta teórica que possibilita a compreensão, principal-
mente, de questões relacionadas aos números naturais e inteiros. Nesse contexto,
uma variedade de problemas e aplicações podem ser encontrados. Isso ficou eviden-
ciado em nosso estudo. Além de aplicações, existem diversos problemas em aberto
envolvendo os números inteiros, sobretudo, em relação aos números primos. Pode-
mos destacar, por exemplo, a conjectura de Goldbach e a hipótese de Riemann.
Além disso, há vários outros aspectos da teoria dos números que podem ser in-
vestigados, cujos tópicos abordados neste capítulo podem servir de base. Encare esse
texto como o ponto de partida para construir outros conhecimentos e aprofundar seu
entendimento das questões teóricas e práticas relacionadas aos números.
ATIVIDADES
Vídeo 1. Encontre um contraexemplo para mostrar que a recíproca “se an – 1 ≡ 1 (mod n)
para todo inteiro a, tal que mdc (a, n) = 1, então n é primo” do pequeno teorema de
Fermat não é válida.
REFERÊNCIAS
ALENCAR FILHO, E. Teoria elementar dos números. São Paulo: Nobel, 1992.
HEFEZ. A. Elementos de aritmética. Rio de Janeiro: SBM, 2006.
MILIES, F. C. P. Números: uma introdução à matemática. 3. ed. São Paulo: USP, 2001.
140 Aritmética
GABARITO
ℛ = {(1, 1), (1, 2), (1, 3), (2, 1), (2, 2), (2, 3), (3, 1), (3, 2), (3, 3), (4, 4)}.
Gabarito 141
3. Comente a respeito da importância do princípio da indução finita no
desenvolvimento da teoria deste capítulo.
O princípio da indução finita permite demonstrar os resultados fundamentais a
respeito da adição, da multiplicação e da ordenação de números naturais. Todas
as resoluções que decorrem desses resultados estão indiretamente embasadas
nesse princípio.
a+d≤b+c
f=0+f≤e+0=e
e=f+p
a⋅p+d⋅p≤b⋅p+c⋅p
af + ap + bf + cf + df + dp ≤ cf + cp + df + af + bf + bp
Isso equivale a
a ⋅ (f + p) + bf + cf + d ⋅ (f + p) ≤ c ⋅ (f + p) + df + af + b ⋅ (f + p)
ou seja,
a⋅e+b⋅f+c⋅f+d⋅e≤c⋅e+d⋅f+a⋅f+b⋅e
x⋅z≤y⋅z
pois
x ⋅ z = [(a ⋅ e + b ⋅ f, a ⋅ f + b ⋅ e)]
y ⋅ z = [(c ⋅ e + d ⋅ f, c ⋅ f + d ⋅ e)]
a+d≤b+c
e=e+0<0+f=f
f=e+p
142 Aritmética
a⋅p+d⋅p≤b⋅p+c⋅p
ce + de + dp + ae + ap + be ≤ ae + be + bp + ce + cp + de
Isso equivale a
ce + d ⋅ (e + p) + a ⋅ (e + p) + be ≤ ae + b ⋅ (e + p) + c ⋅ (e + p) + de
ou seja,
c⋅e+d⋅f+a⋅f+b⋅e≤a⋅e+b⋅f+c⋅f+d⋅e
y⋅z≤x⋅z
pois
x ⋅ z = [(a ⋅ e + b ⋅ f, a ⋅ f + b ⋅ e)]
y ⋅ z = [(c ⋅ e + d ⋅ f, c ⋅ f + d ⋅ e)]
= [(b ⋅ d + a ⋅ c, b ⋅ c + a ⋅ d)]
= [(a ⋅ c + b ⋅ d, a ⋅ d + b ⋅ c)]
=x⋅y
600 = 2³ · 31 · 5²
252 = 2² · 32 · 7
Gabarito 143
a·b
mmc (a, b) = =a·b
1
5 Congruências
1. Encontre um contraexemplo para mostrar que a recíproca “se an – 1 ≡ 1 (mod
n) para todo inteiro a, tal que mdc (a, n) = 1, então n é primo” do pequeno
teorema de Fermat não é válida.
Por exemplo, o inteiro 561é tal que
para todo a inteiro, tal que mdc (a, 561) = 1. Contudo, 561 não é primo.
144 Aritmética
ARITMÉTICA
DION PASIEVITCH
DION PASIEVITCH
Código Logístico
ISBN 978-65-5821-028-3