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Guia para mediação

de literatura infantil digital


Sumário

Literatura infantil digital (LID) 4

Obras digitalizadas não são o mesmo que literatura digital 5

Por que ler literatura infantil digital? 8

Em que espaços ler literatura infantil digital com as crianças? 9

Ações importantes na mediação da literatura infantil digital 10

Considerar as oportunidades de inclusão 11

Preparar o dispositivo 12

Preparar o ambiente 13

Considerar a duração e o momento da leitura 14

Estabelecer trocas 15

Releitura 15

Explorando as potencialidades da literatura infantil digital 17

Recursos de personalização e opções de leitura 18

Formando leitores da literatura infantil digital 18

A conversa não para por aqui… 25

Glossário 25
Guia para mediação
de literatura infantil digital

Este guia é sobre o encontro entre obra, adulto e criança. É a partir


da relação entre essas três figuras que acontecem momentos
significativos para o desenvolvimento infantil. O destaque especial
aqui é para a literatura infantil digital (LID), que tanto quanto as obras
impressas precisam contar com a presença dedicada do mediador.
Veremos, então, algumas estratégias para facilitar que a criança
leitora compreenda o funcionamento da obra literária digital e possa
desfrutá-la de maneira plena e segura nesse universo interativo.

Bons estudos!

3 Guia para mediação de literatura infantil digital


Literatura infantil digital (LID)

O que é? Onde encontrar?

A literatura infantil digital é um tipo de trabalho artístico com uma


linguagem que se utiliza das diferentes possibilidades das mídias digitais
para a construção de obras com narrativas e poéticas para crianças. Tem
como características fundamentais a interatividade e a multimodalidade.

Interatividade

Demanda a participação significativa do leitor na obra, que, por sua vez,


responde a essa participação.

Recursos de captação da participação do leitor

tela sensível câmera microfone movimento geolocalização


ao toque fotográfica do dispositivo

Multimodalidade

Utilização de diversas formas de linguagem: escrita, falada, imagética,


sonora, musical, gestual, entre outras, de forma articulada.

Múltiplos recursos semióticos

escrita Imagens Imagens em narração em música gestos


estáticas movimento voz alta e efeitos
sonoros

4 Guia para mediação de literatura infantil digital


Trata-se, portanto, de uma experiência literária que não pode ser
reproduzida com as mesmas características fora do meio digital.

A maioria das obras se apresenta na forma de aplicativos para celulares e


tablets e podem ser adquiridas em lojas virtuais, mas há também as obras
disponíveis diretamente pela internet, a partir de um computador.

Obras digitalizadas não são


o mesmo que literatura digital
e-books

PDF

Literatura digital Literatura digitalizada


A expressão literária faz uso dos recursos e contextos A expressão literária
do meio digital de forma significativa. A multimodalidade é a mesma do livro
e a interatividade estão a serviço do literário. impresso.

O impresso e o digital não estão em disputa. Pelo contrário, considerando


suas especificidades, esses formatos podem ser complementares. A
sensação física de tocar e virar a página de um livro impresso, por exemplo,
é inigualável, assim como é ímpar a possibilidade de levar uma biblioteca
inteira em um aparelho pequeno e leve.

Tendo em vista esses diferentes suportes, a educadora e neurocientista


americana Maryanne Wolf apresenta o conceito de “cérebro duplamente
letrado”. Esse conceito caracteriza “a passagem da cultura baseada no
letramento para a cultura baseada no digital” e aborda os impactos que
essa passagem causa à cognição humana e a necessidade da formação
de um cérebro nos contextos letrados e digitais. O desafio é formar um
leitor que, em meio a tantos estímulos e distrações, consiga fazer uma
leitura profunda tanto no suporte impresso quanto no digital, entendendo
como leitura profunda aquela em que o leitor é capaz de compreender

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e apreender plenamente o que está escrito, os processos imbricados no
texto e os desdobramentos que essa leitura pode implicar individual e
coletivamente.

Em que dispositivos posso ler a literatura infantil digital?


Computadores Dispositivos móveis
Laptops e Smartphones
desktops e tablets

Projetor
É possível fazer uma leitura coletiva apenas com um dispositivo acoplado
a um projetor ou lousa digital.

Internet
Em muitos casos, o acesso à internet só é necessário na hora de descarregar a
obra, site ou aplicativo, no dispositivo. Uma vez aberta, a obra pode ser lida de
modo off-line e, portanto, sem prejuízo caso a conexão seja instável ou ausente.

Em que canais posso encontrar a literatura infantil digital?


Obras na web Aplicativos literários ou livros-aplicativos

Acesso: navegador de internet (Chrome, Safari etc.) Acesso: lojas de aplicativos


Dispositivos: qualquer um com navegador Dispositivos: tablets e smartphones

Recursos de destaque Obras transmídia

Realidade Mídias locativas


Aumentada (RA) Utiliza a geolocalização Podem apresentar a mesma obra em
Sobrepõe elementos do leitor por meio múltiplos formatos (livro, filme, website)
virtuais ao mundo real do GPS como elemento ou exigir mais de uma mídia para a
ou a objetos específicos, da leitura da obra compreensão da obra.
como um livro impresso

6 Guia para mediação de literatura infantil digital


Exemplos de obras digitais

Estante Inventeca Quanto The End HQ, Natu Contos, Passarinho às


Digital, Storymax Bumbum, Editora SOS Mata oito e pouco,
programa Editora SESI-SP Atlântica. de Jaqueline
Leia com Caixote livro + app Histórias Conte e Adilson
uma criança, para ler em Farias. Livro
Itaú Social determinados impresso com
parques, em 4 complementos
cidades digitais em
website

Por que é importante fazer


mediação da leitura literária digital?
O ambiente digital oferece novas formas de leitura, com ricas
possibilidades e também com novos desafios para leitores e leitoras.
A literatura infantil digital é uma dessas formas e possibilita uma maneira
diferente de apresentar a leitura literária em um contexto com muitas
especificidades. Para que as crianças possam conhecer o ambiente virtual,
aprender a selecionar as obras, a interagir com segurança, construir
sentido a partir dessa experiência e a desfrutar das potencialidades
narrativas e poéticas, a mediação de um adulto é fundamental.

Quais são os papéis do mediador?

1. Em primeiro lugar, o mediador é aquele que cria oportunidades de


leitura a partir de uma seleção criteriosa de obras que ajuda de forma
acolhedora e estimulante o leitor a enfrentar os desafios de entrar em um
novo universo literário.

7 Guia para mediação de literatura infantil digital


2. O mediador também tem o papel de dar suporte ao leitor infantil
na compreensão da obra, na observação atenta dos seus recursos, no
manuseio, navegação e no modo de realizar as interações, que nem
sempre são simples.

3. Cabe ainda ao mediador oferecer uma escuta ativa e proporcionar


trocas que desenvolvam laços afetivos e ampliem os sentidos da leitura,
por meio de conversas ou abrindo espaço para que o leitor expresse de
outras maneiras os efeitos que a experiência literária lhe causou.

Por que ler literatura infantil digital?


O que ela tem a oferecer ao leitor?

Diferentes itinerários

A literatura infantil digital solicita a participação do leitor, o que permite


que ele deixe suas marcas na leitura. Assim, a coconstrução do itinerário de
leitura por meio do uso dos recursos digitais interativos, sejam eles simples
ou complexos, pode resultar em uma experiência diferente a cada leitura.

Ação, imersão e participação

Na literatura infantil digital, o leitor é convidado a agir durante a leitura e,


em alguns casos, a participar efetivamente da narrativa. Essa participação
pode acontecer emprestando características pessoais ao narrador ou aos
personagens, ou ainda escolhendo cenários, elementos e caminhos da
história.

Outra característica da leitura digital é que ela é multissensorial, ou seja,


envolve mais do que o sentido da visão, podendo requerer do leitor
escutar, tocar, falar, mover-se, mover o aparelho etc. Assim, a leitura digital
pode gerar diferentes tipos de respostas físicas, emocionais e cognitivas
nos leitores.

8 Guia para mediação de literatura infantil digital


Experiência segura com o ambiente digital

A maioria das obras de literatura infantil digital permite uma leitura


off-line, sendo mais controlável que outros conteúdos digitais. Dessa
forma, possibilitam que as crianças sejam apresentadas aos desafios e
possibilidades do ambiente virtual em um contexto mais seguro, lúdico e
artístico, o que não dispensa, contudo, o papel do mediador.

Outras ludicidades e poéticas

A literatura infantil digital traz novas formas de brincar com a linguagem


verbal e explorar outras linguagens, estimulando a sensibilidade estética,
desafiando a capacidade interpretativa e promovendo a ludicidade de
forma híbrida, em que convergem diferentes formas artísticas, como o
audiovisual, as artes gráficas, os jogos eletrônicos e a música. Muitas obras
também inovam na forma de narrar, podendo ser multilineares ou ter uma
estrutura circular, por exemplo.

Em que espaços ler literatura


infantil digital com as crianças?
Em casa

A mediação de leitura digital em contexto familiar permite promover


momentos lúdicos e de descoberta sobre as possibilidades do digital para
contar histórias e explorar outras formas de literatura. Ao mesmo tempo, é
uma estratégia-chave para desenvolver boas trocas entre as crianças e seus
cuidadores sobre o uso seguro e adequado de dispositivos digitais. O afeto,
o acolhimento e a escuta são essenciais e ajudam a negociar e a descobrir
novos modos de ler e navegar por cada obra.

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Nas escolas e nas organizações sociais

Incluir a literatura infantil digital nos momentos estruturados de leitura


favorece novos letramentos e amplia as experiências literárias das crianças.
Introduzir obras digitais nos itinerários de leitura, planejar situações de
Leitura Literária Digital, considerando a potencialidade estética das obras,
os recursos disponíveis e o papel mediador de educadores, faz parte de
uma formação leitora plena nos dias atuais.

Na biblioteca

As bibliotecas são espaços culturais estratégicos para o acesso


democrático às diferentes formas de leitura e de experiência estética. A
literatura digital, como parte da cultura letrada contemporânea, precisa
ser incluída nos acervos e nas atividades promovidas pelas bibliotecas, que
devem oferecer suporte aos leitores na exploração dessa nova modalidade
de leitura literária.

E onde mais se desejar…

Praças, parques, salas de espera... onde houver a possibilidade do encontro


entre a obra, a criança e o mediador, com o tempo e o desejo pela leitura, há
também a oportunidade de uma experiência significativa com a obra digital.

Ações importantes na mediação


da literatura infantil digital
Selecionar

Uma boa obra literária, impressa ou digital, estimula os sentidos e a


imaginação do leitor. Assim, a seleção de obras de qualidade é o primeiro
passo da mediação também quando falamos da literatura infantil digital.
O processo pode ser desafiador, pois a oferta de produções digitais não
está sistematizada, e o mediador deve considerar diversos fatores, como

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a qualidade literária, um acesso seguro e a qualidade da execução do
conteúdo nos dispositivos. Para ajudar você nessa tarefa, disponibilizamos
uma matriz de critérios de qualidade de obras de literatura infantil digital,
produzida por especialistas da área, que pode ser acessada aqui.

Conhecer a obra

Antes da aquisição, é importante fazer uma pré-avaliação a partir das


informações disponíveis nas lojas de aplicativos, no site do desenvolvedor e
nos comentários de outros leitores. Essas informações fornecem uma ideia
da qualidade geral da obra, indicam se atende aos objetivos da mediação e
se pode interessar às crianças.

Após a aquisição, é fundamental ler a obra e avaliar suas características


e potenciais para explorá-los durante a mediação. É importante indagar:
quais são os diferenciais da obra? Como se navega por ela? Como
funciona? Quais recursos literários se destacam? Quais podem ser
explorados durante a leitura compartilhada? Como pretende fazê-lo?

Considerar as oportunidades
de inclusão
A leitura, a literatura e o livro são direitos de todos e todas, sem exceção,
e a acessibilidade deve ser garantida tendo em vista a efetivação desses
direitos. Marcos legais, como o Estatuto da Pessoa com Deficiência e o
Tratado de Marraqueche, frutos da luta das pessoas com deficiência, entre
outros assuntos, versam sobre o universo literário.

Infelizmente, alguns direitos não estão garantidos e outras estratégias


precisam ser criadas visando ao acesso e à participação plena das pessoas
com deficiência na sociedade. Considerando especificamente o acesso à
leitura e literatura, destacamos a necessidade de abarcar as modalidades
impressas e digitais.

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Por serem obras multimodais, ou seja, que se apoiam em diferentes
linguagens para produzir sentido, a literatura infantil digital traz novas
oportunidades de inclusão, mesmo que não apresente um projeto explícito
de acessibilidade.

Alguns recursos disponíveis favorecem que crianças com deficiência


possam participar, construir sentido e desfrutar da experiência estética
proposta. Cabe ao mediador avaliar como esses recursos podem contribuir
para a inclusão e criar estratégias que permitam à criança participar da
leitura de forma ativa.

As crianças com deficiência visual, mesmo que não possam ver as


ilustrações, podem ouvir a narração, os efeitos sonoros, a música, usar
os hotposts e virar as páginas com auxílio do mediador. Numa segunda
leitura, o mediador pode fazer a descrição das imagens para a criança.

Para as crianças surdas ou com deficiência auditiva, os recursos visuais


são fundamentais. Imagens em movimento, gestos e interatividade
contribuem para a compreensão e a fruição da obra. O mediador também
pode traduzir e interpretar em Libras os elementos poéticos e linguísticos
que compõem a literatura infantil digital.

Preparar o dispositivo
Ter as obras instaladas ou abertas no dispositivo de antemão e não revelar
senhas e outras informações que possibilitem à criança modificar as
configurações do tablet ou comprar obras sem seu consentimento.

Organizar as obras em um único local, de forma que a(s) criança(s)


possa(m) reconhecê-las e acessá-las com facilidade. Por exemplo, criar
uma pasta ou tela no dispositivo exclusiva para as obras literárias e salvar
as “obras da web” na pasta de favoritos.

Verificar as possibilidades de controle parental do dispositivo e ativar as


que julgar necessárias.

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Caso a obra permita a leitura off-line, o ideal é desativar a internet do
dispositivo, bem como as notificações, para proporcionar um ambiente de
leitura mais seguro e sem interrupções.

Verificar a necessidade de fones de ouvido em obras em que os detalhes


sonoros são fundamentais para a fruição do texto ou em ambientes em
que pode haver interferência sonora. Atenção ao volume do som para não
prejudicar a audição da criança.

Preparar o ambiente
Em qualquer contexto de leitura, uma ambientação lúdica, um espaço
confortável e adequado aos movimentos corporais são elementos a
considerar na mediação. Quando há o recurso da realidade aumentada,
por exemplo, o espaço físico escolhido para a experimentação da obra
deve ser adequado à exploração integral de suas possibilidades, já que a
criança pode ser estimulada a se movimentar ou circular pelo ambiente.
Por se tratar de obras multimodais, deve-se garantir que as crianças
consigam ver as imagens, escutar adequadamente os recursos sonoros e
manusear os aparelhos com segurança.

Nos espaços de leitura e em mediações coletivas, a organização e a divisão


do grupo, assim como o uso do espaço, importam muito na forma como
as crianças experimentam a leitura de obras digitais. Essas decisões
dependem da quantidade e do tipo de dispositivos digitais e também
das potencialidades da obra e do tipo de participação que requer do
leitor. É importante ter em vista que nem sempre o que é planejado flui
adequadamente no momento da leitura. Imprevistos técnicos podem
ocorrer, sendo fundamental estar aberto a adaptações e usar a criatividade
para superar eventuais dificuldades.

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Considerar a duração
e o momento da leitura
Na mediação em casa, não há uma regra sobre o momento certo de ler
literatura infantil digital. Considere, no entanto, que a luz das telas pode
interferir nos padrões de sono de crianças e adultos; portanto,
é recomendável evitá-las ao menos uma hora antes de ir para a cama.
Nos espaços de leitura, é preciso considerar a temporalidade da mediação,
tanto no que tange ao tempo da leitura, quanto das trocas com o
mediador e entre as crianças. Em geral, as obras de literatura infantil digital
demandam um tempo relativamente curto de leitura. No entanto, quanto
mais possibilidades interativas dispõem, mais tempo é necessário para
ler a obra. Assim, o mediador precisa avaliar se é viável realizar a leitura
completa em uma única sessão ou se fará uma sessão voltada para uma
experiência parcial e exploratória com a obra. A maioria dos aplicativos não
salva o percurso de leitura realizado, como em alguns jogos eletrônicos, e
não permitem que as leituras sejam feitas por partes a cada sessão.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que o uso de telas
seja limitado na primeira infância. A maioria das obras de literatura infantil
digital pode ser lida integralmente em menos de 30 minutos, e, portanto,
não ultrapassa a recomendação diária para crianças acima de 2 anos.
Conheça as orientações da OMS e tenha ainda em mente que observar a
qualidade dos conteúdos é também fundamental.

Tempo sedentário frente às telas


Crianças Crianças de 2 a 4
menores de anos: máximo de
2 anos: 0 minuto 60 minutos por dia
Fonte: Organização Mundial da Saúde. Diretrizes para atividade física, comportamento sedentário e
sono para crianças com menos de 5 anos de idade. Disponível em https://apps.who.int/iris/bitstream/
handle/10665/311664/9786500208764-por.pdf?sequence=61&isAllowed=y

Compreendemos tempo sedentário frente às telas aquele que ocorre de


forma passiva, sem intuito ou intencionalidade.

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Estabelecer trocas
Antes da leitura

Antes da leitura, além de provocar uma aproximação afetiva com a obra,


o mediador pode trocar ideias ao explorar as telas de abertura, seus
sons, links e imagens para instigar a curiosidade e conversar sobre as
informações paratextuais, como informações de autoria, instruções e
imagens que indicam como navegar e interagir.

Durante a leitura

Durante a leitura, que pode ser individual ou compartilhada, dependendo


do contexto, da quantidade de dispositivos e do propósito, é importante
incentivar a participação e dar tempo para que a(s) criança(s) possa(m)
interagir. Cabe ao mediador observar o movimento de leitura da(s) criança(s)
e avaliar a necessidade de lançar perguntas ou comentários que estimulem
os leitores a descobrirem novos recursos e a refletirem sobre a obra.

Após a leitura

Após a leitura, as conversas literárias com o mediador ou entre as crianças,


em que se compartilham impressões, dificuldades, efeitos emocionais,
além das diversas interpretações, são excelentes oportunidades para
ampliar a compreensão da obra e para mostrar o caráter polissêmico
da literatura. Também pode ser o momento de explorar os recursos
complementares que muitos títulos oferecem, como jogos, clipes etc.

Releitura
A literatura infantil digital, por apresentar uma diversidade de elementos
para se interpretar e com os quais interagir, requer mais de uma leitura para
que o leitor possa se aprofundar nas suas camadas de sentido e também
explorar as potencialidades da obra. É importante promover situações de

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releitura, tantas quantas o leitor desejar e necessitar para que se aproprie
do texto literário. Nos espaços de leitura, é preciso planejar as releituras
de forma progressiva, considerando a alternância entre leituras livres,
autônomas, compartilhadas ou guiadas.

Etapas de mediação nos espaços de leitura

Antes do encontro

Escolha e análise Planejamento das sessões Preparação dos Preparação


da obra a partir de de leitura considerando dispositivos do ambiente
critérios de qualidade espaço, recursos, tempo e organização
e perfil do grupo do mobiliário

Durante o encontro

Combinados Exploração dos Leitura livre ou


sobre uso dos paratextos iniciais da obra compartilhada
dispositivos (título, ilustração, ícones) da obra

Conversas Releituras Outras atividades que


literárias sobre expandem o universo
a obra da obra

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Explorando as potencialidades
da literatura infantil digital
Interatividade
Numa obra de qualidade, a interatividade está articulada com os efeitos
de sentido, cabendo ao mediador, além de ajudar o leitor a explorar essa
interatividade, atentar para seu potencial interpretativo.

O mediador precisa conhecer cada recurso interativo e adquirir destreza


no seu manejo para que, no momento da mediação, possa oferecer pistas
e exemplos de como explorá-los, com o cuidado de não antecipar efeitos e
resultados que tirem do leitor o prazer da descoberta.

Multimodalidade
As possibilidades poéticas e narrativas da literatura infantil digital se
realizam por meio da música, dos efeitos sonoros, da imagem, do gesto, da
palavra escrita e falada, fornecendo muitos elementos a partir dos quais
constrói sentido. Cabe ao mediador explorar esses recursos de forma
articulada e lúdica durante a leitura e também de forma isolada na pré
e na pós-leitura. É possível propor que as crianças façam antecipações
a partir de um desses elementos, que investiguem as emoções e
sensações provocadas por esses recursos e também que reflitam sobre as
informações e as camadas de sentido que eles agregam ao texto.

Multilinearidade
Trata-se da possibilidade de realizar diferentes percursos de leitura e fazer
escolhas que interferem na história. Esse recurso pode provocar o desejo
de voltar à obra várias vezes e também de conhecer os efeitos das decisões
de outros leitores. Procure aproveitar essas múltiplas possibilidades
narrativas para propor releituras. Esse aspecto pode ainda atuar como
disparador de conversas sobre as diferentes experiências de leitura dos
membros do grupo, ou levar, durante a leitura compartilhada, à formulação
de hipóteses e de antecipações sobre a história.

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Recursos de personalização
e opções de leitura
Em contextos com muitos dispositivos, as diferentes opções de
personalização das obras, como a escolha de avatares, de foco narrativo,
de voz narrativa, de ativar ou desativar o som etc., são excelentes
oportunidades para comparar experiências de leitura entre as crianças
e refletir sobre os efeitos dessas escolhas. Nos contextos de leitura
compartilhada, por meio da leitura com um projetor, o mediador pode
explorar a partir de negociações com o grupo, diferentes opções de
personalização, realizando diferentes leituras de uma mesma obra e, em
seguida, discutir essas distintas experiências.

Formando leitores da literatura


infantil digital
Sugestões para a mediação de leitura da obra
Marina está do contra

Criadores: Gunilla Wolde (autora), Editora Caixote (desenvolvedor)

Temática: emoções da criança; experimentação; ludicidade no cotidiano.

Sinopse: Marina gosta de fazer tudo do jeito dela, mas nem sempre do
mesmo jeito, nem do jeito que os outros fazem. Essa divertida história é
contada por meio de uma ilustração cativante e de um texto breve; usa
recursos de som e animação e sua navegação explora as possibilidades do
dispositivo para divertir a criança e convidá-la a participar da brincadeira
de Marina sempre estar do contra.

18 Guia para mediação de literatura infantil digital


Formato: aplicativo literário

Dispositivos de leitura: celular ou tablet, com sistema operacional


Android ou iOS.

Forma de aquisição: a obra pode ser encontrada nas lojas de aplicativo


dos dispositivos. As buscas mais eficientes são pelo nome do aplicativo ou
do desenvolvedor do aplicativo. A compra de uma única licença permite
descarregar o app em múltiplos dispositivos – a quantidade depende das
regras de cada loja.

Links de acesso: www.editoracaixote.com.br/apps-marina-esta-do-contra

Características e potencialidades da obra a explorar

Paratextos iniciais

A tela de abertura traz um conjunto de elementos que orienta a leitura e


apresenta a obra, como a ilustração de Marina, que se move ligeiramente
indicando que há recursos de animação, assim como outros elementos que
ajudam a antecipar aspectos da narrativa. As letras do título que estão em
sentido contrário ao da escrita reforçam o seu significado. O tom alegre da
música de abertura, com ritmo suave, evoca um clima de cotidiano feliz e
antecipa a atmosfera geral da obra.
Ícones e textos
dentro de balões
informam sobre as
opções de leitura:
“leio sozinho”, “com
narração por Tiê”
e “leitura especial”
(possibilidade
de gravação da
leitura em voz alta).

19 Guia para mediação de literatura infantil digital


Uma imagem
pequena de Marina
e o texto Brinque
com a Marina
indicam o link para
uma atividade
complementar.

Recursos expressivos e narrativos

A obra utiliza palavras,


imagens em movimento,
som, voz, gestos e
interatividade para
contar a história de
Marina. Esses diferentes
recursos semióticos se
complementam
e se reforçam.

Cada tela apresenta diagramação simples com texto e ilustração


compartilhando o espaço. A imagem da protagonista reage ao toque,
expressando sua emoção naquele momento. Marina olha diretamente
para o leitor, sinalizando uma comunicação direta com ele.

A página com fundo branco e a ilustração da personagem ao centro


reforçam a ideia de que a história está centrada nas ações e emoções
da personagem e, por meio desse recurso, sinaliza para o propósito de
identificação com o leitor da primeira infância.

20 Guia para mediação de literatura infantil digital


O fio narrativo é linear, em que a sequência das telas acompanha a
temporalidade do dia de uma criança, desde o vestir-se, ao acordar, até
a hora de dormir. Esse marco espaço-temporal muito semelhante ao do
cotidiano da criança pequena, assim como as reações emotivas de Marina,
favorece o reconhecimento, pelo leitor, do seu próprio mundo objetivo e
subjetivo.

O texto é breve e se apresenta por meio da narração da cantora Tiê e do


texto escrito em caixa-alta – mais acessível para o leitor iniciante – ainda
com a opção de gravação da leitura pelo usuário.

Interfaces de navegação

Gestual, sonora e gráfica.


Um sinal sonoro e um ícone
sinalizam ao leitor quando
deve tocar na imagem
de Marina e provocar
sua reação. As setas e
gestos permitem o passar
das páginas. O gesto
de girar o dispositivo se
converte em um “virador
de páginas” que se associa
às mudanças de humor de Marina. Tal gesto ajuda a implicar o leitor nessa
mudança, gerando expectativas.

Sugestões para a leitura orientada nos espaços de leitura

Planejamento

A leitura orientada deve ter como objetivo ajudar as crianças a navegar


pela obra e a perceber os recursos expressivos e criativos que constroem
o mundo ficcional de Marina. Outro objetivo é provocar e acolher as
respostas pessoais ao jogo de identificação entre a personagem e o
leitor proposto pela obra, tendo em conta que a criança pode reconhecer

21 Guia para mediação de literatura infantil digital


aspectos semelhantes entre seu mundo pessoal e o da protagonista e
desfrutar de outras possibilidades expressivas da obra.

O mediador pode lançar mão de distintas formas de entrada e de retorno


à história: via leitura coletiva, leitura individual ou em duplas, trios e
grupos (usando o recurso de narração) e ainda explorar o recurso de
gravação. Sugere-se que cada uma dessas leituras seja realizada em
sessões separadas para que não haja pressa na fruição da obra e no
desenvolvimento das atividades.

A preparação do dispositivo e dos recursos, assim como a organização


da sala para cada sessão, deve ser pensada ainda no planejamento,
considerando o tipo de leitura e o que se quer explorar no momento
e diminuir os imprevistos (consulte os itens “Preparar o dispositivo” e
“Preparar o ambiente” deste guia).

Antes da Leitura

Momento favorável à exploração com as crianças dos paratextos iniciais


da obra, como as telas de abertura e de instrução, bem como os elementos
que trazem informações: palavras, imagens, ícones, música etc. (consulte
o item “Paratextos iniciais”). Sugere-se a projeção dessas telas para que
sejam apresentadas para todo o grupo. A partir da projeção, pode ser
iniciada uma conversa com combinados sobre como usar o dispositivo nos
espaços de leitura e ainda discutir as maneiras de interagir. A partir desses
elementos, é oportuno também estimular a criação de hipóteses pelas
crianças a respeito do conteúdo da obra.

Durante a leitura

A leitura livre (individual, em duplas, trios ou grupos) é um momento


importante de exploração autônoma da obra. Como se trata de uma
obra acessível para as crianças, pode ser proposta como forma de ter um
primeiro contato com a história.

A leitura compartilhada, projetada no telão, é uma opção quando só há um


dispositivo e também pode ser o momento para intervenções que levem
as crianças a perceberem o valor expressivo de cada recurso, como os sons

22 Guia para mediação de literatura infantil digital


e o gesto de girar o dispositivo (virador de página que gera expectativa
sobre a nova reação de Marina). O mediador pode, durante a leitura,
introduzir perguntas como: (ao girar o dispositivo) o que a Marina vai fazer
agora? E esse som, por que a Marina fez esse ruído?

Depois da leitura

A conversa sobre a obra pode acontecer após cada leitura individual ou


compartilhada e abordar as impressões das crianças: do que gostaram, do
que não gostaram, o que elas acharam das coisas que Marina fez, se elas já
fizeram algo parecido.

Durante a conversa, vale a pena ajudar a “sublinhar” alguns aspectos


como os sons e detalhes da ilustração que expressam a emoção de Marina
com perguntas e observações do tipo: o que vocês acham que a Marina
estava sentindo aqui? Como vocês sabem que ela está sentindo isso?
(Essa pergunta direciona a atenção para os recursos que mostram as
expressões.). Quem já se sentiu do mesmo jeito?

O recurso de gravação da leitura pelas crianças pode ser explorado após


as sessões de leitura. O mediador de leitura pode projetar a obra sem som
ou se apoiar em projeções de slides feitos com capturas de tela de todas as
cenas, com o objetivo de ajudar que se apropriem da sequência narrativa e
propor um reconto coletivo antes de fazer a gravação.

A proposta de brincar com a Marina pode envolver um divertido trabalho


corporal com as crianças pequenas, que se relaciona com os sentidos da
obra, em que o mediador propõe que elas escolham um elemento para
clicar e imitem o gesto que faz Marina ao reagir a esse elemento.

Outras reflexões…
A mediação nas bibliotecas está centrada principalmente em facilitar o
acesso às obras e, nesse caso, ajudar o usuário a explorar o universo da
literatura infantil digital.

23 Guia para mediação de literatura infantil digital


Por ser uma obra de qualidade acessível, que articula significativamente
os elementos fundamentais da literatura infantil digital, Marina está do
contra é excelente para introduzir as crianças nesse novo sistema cultural.
O importante é a exploração livre e a experimentação das possibilidades de
prazer e significação que a obra traz.
Se houver oportunidade de uma mediação mais prolongada e direcionada,
vale se apoiar nas sugestões sobre a mediação nos espaços de leitura
e com a família, considerando as especificidades desses contextos de
mediação, em especial, a transitoriedade e a pluralidade dos leitores.
Vale aproveitar ainda as possibilidades de promover momentos de
exploração das obras pelas crianças junto aos pais ou cuidadores.

Dicas para a leitura compartilhada em casa

Prepare o dispositivo O que vem por aí? Durante a leitura


Desativar notificações Explorar tela de Oferecer uma escuta ativa
e elementos que possam abertura, imagens estabelecendo um diálogo
dispersar a leitura. Se e outros paratextos acolhedor sobre as emoções
possível, colocar o iniciais. que a criança expressar.
dispositivo em modo off-line.

Após a leitura Releitura Gravando a história Explorando elementos


Conversar sobre o Que tal ler Explorar livremente extras
que a criança gostou, a história os recursos da leitura A partir da seção
sobre as expressões e novamente, especial. Que tal “Brinque com a Marina”
sentimentos de Marina, explorando o experimentar com que tal propor um jogo
se a criança já se sentiu mesmo ou outro diferentes tons de voz, de imitação com a criança
assim, como ela mostra modo de leitura? falando em coro, ou a partir dos gestos da
o que sentiu. alternando a criança? personagem?

24 Guia para mediação de literatura infantil digital


A conversa não para por aqui…
Este guia busca ser o disparador das conversas sobre a mediação da
literatura infantil digital. Esse é um tema amplo, dinâmico e aberto
às transformações que surgem a cada dia. Portanto, é preciso seguir
refletindo, sem buscar soluções definitivas, sobre as formas de contribuir
para a construção e o fortalecimento dessa nova forma de arte que
emerge na cultura digital e sobre as melhores formas de favorecer que
as crianças e os adultos se apropriem dela.

Glossário
Desenvolvedor: empresa que realiza a produção de uma obra de
literatura infantil digital e geralmente é responsável por sua publicação
nas lojas de aplicativos. Assim, nessas lojas, as obras aparecem como
publicações de determinado desenvolvedor. Pode ser a própria editora
ou uma empresa parceira da editora.

Multimodalidade: refere-se ao reconhecimento de que a comunicação


ocorre por meio de diversos sistemas (ou modalidades) semióticos que se
relacionam entre si. A linguagem verbal, nas modalidades oral e escrita,
é, portanto, um desses sistemas, mas não o único nem o mais importante
deles, e cada sistema tem um potencial próprio de comunicação de acordo
com sua materialidade e assume papéis específicos dentro de cada ato e
contexto comunicativos.

Paratextos: textos que compõem a obra e acompanham o texto literário,


interferindo no modo como ele é recebido e interpretado pelo leitor. Esses
textos podem estar no mesmo objeto que o texto literário, por exemplo,
como parte de um aplicativo que contém a obra (quando são chamados
de peritextos), ou fora desse objeto, como na loja virtual ou no site do
desenvolvedor (quando são chamados de epitextos).

25 Guia para mediação de literatura infantil digital


Pontos quentes (hotspots): áreas ou elementos das ilustrações que são
interativos e podem ser ativados por meio do toque ou de algum gesto
específico de interação com a tela sensível ao toque.

Recursos semióticos: recursos usados social e culturalmente para a


construção de significados. Muitos desses recursos são organizados em
sistemas de significados de acordo com a sua materialidade, como os
sistemas da linguagem visual, da linguagem escrita, da linguagem sonora,
da linguagem gestual etc.

26 Guia para mediação de literatura infantil digital


FUNDAÇÃO ITAÚ

CONSELHO CURADOR Gestora do Leia com uma criança


Gabriela Passos Conserva
Presidente
Alfredo Egydio Setubal Comunicação Integrada
Fundação Itaú
Vice-presidentes
Ana Lúcia de Mattos Barreto Villela Gerente de Comunicação
Maria Alice Setubal Ana de Fátima Oliveira de Sousa

Conselheiros Coordenação de Comunicação


Candido Botelho Bracher para a Educação
Claudia Politanski Alan Albuquerque R. Correia
Danilo Santos Miranda
Heitor Sant’anna Martins Equipe de Comunicação
Osvaldo do Nascimento Juliana Araujo
Priscila Fonseca da Cruz
Ricardo Manuel dos Santos Henriques
Rodolfo Villela Marino CRÉDITOS DA PUBLICAÇÃO

Diretoria Pesquisa e coordenação


Presidente da Fundação Itaú Dra. Aline Frederico
Eduardo Saron Nunes Dra. Giselly Lima de Moraes

Diretores Especialistas consultados


Álvaro Felipe Rizzi Rodrigues Benita Prieto
Cristiano Angulski de Lacerda Dra. Mônica Daisy Vieira Araújo
Luciana Nicola Schneider Dra. Rafaela Vilela
Paulo Sergio Miron
Valéria Aparecida Marreto Professora consultada
Fabiana Rocha Rezende

Leitura crítica
Angela Dannemann
ITAÚ SOCIAL Dianne Melo
Gabriela Passos Conserva
Gerente de Fomento
Camila Feldberg Macedo Pinto Diagramação
Visuh Design
Coordenadora de Engajamento
Social e Leitura Revisão
Dianne Melo Umberto Rodrigues

27 Guia para mediação de literatura infantil digital


Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Guia para mediação de literatura infantil digital


[livro eletrônico] / coordenação Aline
Frederico, Giselly Lima de Moraes. --
São Paulo : Fundação Itaú para a Educação e
Cultura, 2022.
PDF.

Vários colaboradores.
Bibliografia.
ISBN 978-65-86771-20-6

1. Educação 2. Ensino - Métodos 3. Leitores -


Formação 4. Leitura 5. Literatura infantil
6. Tecnologia digital 7. Tecnologia educacional
I. Frederico, Aline. II. Moraes, Giselly Lima de.

22-139429 CDD-372.71
Índices para catálogo sistemático:

1. Leitura : Educação infantil 372.71

Aline Graziele Benitez - Bibliotecária - CRB-1/3129

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