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HISTÓRIA GERAL DA ARTE

1/2022

12. ARTE GÓTICA

PROFA. LETÍCIA MARTINS DE ANDRADE


UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO JOÃO DEL-REI – UFSJ
ARTE GÓTICA
ARQUITETURA
C.1200-1450/1500
Abadia de Saint-Etiènne de
Caen, Normandia, França.
c.1068. planta baixa, fachada
ocidental e vista do interior
Catedral de Durham, Inglaterra. 1093-1130, fachada e lateral
Catedral de Durham, Inglaterra. 1093-1130. vista da nave central

Experimentos com abóbada de arestas e arcobotantes na catedral de Durham, Inglaterra. c. 1093. a abóbada foi
realizada em torno de 1130; protótipo de arcobotantes.
Principais sítios europeus do
desenvolvimento da arquitetura do
estilo gótico. Os exemplos mais
representativos encontram-se na
região que vai do leste de Paris
até a Alemanha. Também a
Inglaterra possui abundantes
monumentos góticos, mas com
características bem particulares.
A igreja de Saint-Denis, na Île de France, em
Paris, em sua forma atual, é uma
reconstrução cujo início foi empreendido
pelo abade Suger (1080-1151; abade de
1122-1051), um amigo e confidente dos reis
franceses Luís VI e Luís VII. Suger decidiu
reconstruir a igreja vinculada à abadia de
Saint-Denis, que abrigava os jazigos dos
reis franceses havia séculos. As obras foram
iniciadas em 1127, e a nova igreja foi
consagrada em 1144. No entanto, a nave
ainda foi refeita um século mais tarde.
Nessa ocasião, os transeptos ganharam
rosáceas, como a fachada principal.

[1] igreja da abadia de Saint-Denis, Paris, Île-de-


France. Reiniciada em 1127-1144; remodelada
em meados do século XIII; [2] gravura de
Philippe Benoîst mostrando o aspecto da
fachada em 1844.
O abade de Saint-Denis, Suger, decidiu
substuir a antiga abadia carolíngia
construída pelo abade Fulrad entre 768 e
Em Saint-Denis aparece pela
775. Ela tinha sido ampliada nos
primeira vez a ROSÁCEA, uma
séculos IX e X. Suger se queixa, em seus
abertura em forma circular, ou de
escritos, que a igreja carolíngia era muito
‘rosa’, que permite a iluminação.
pequena e por isso não permitia que todos
Fechada com vidros coloridos
os fieis fossem ali abrigados durante as
historiados – os vitrais –, a
grandes festas. Ele decide começar a
rosácea irá se tornar um dos
reforma pela reconstrução da fachada
elementos mais característicos
ocidental em torno de 1127-35, retomando
da arquitetura gótica.
o desenho de fachadas mais harmônicas
que tinha sido adotado para as abadias
normandas de Caen – abbaye aux
Hommes e abbaye aux Dames, de
Jumièges... mas acrescentando a primiera
ROSÁCEA para clarear a nave. A fachada
foi consagrada e 9 de junho de 1140.

Abadia de Saint-Denis
Paris, Île-de-France. Reiniciada em 1127-
1144; remodelada em meados do século
XIII. Portal do transepto.
Suger mandou gravar numa das
portas dos transeptos a seguinte
mensagem:

A nobre obra brilha, mas a obra


que brilha deve em sua nobreza
iluminar os espíritos para que
eles possam ir, através das
verdadeiras luzes, em direção à
luz verdadeira, para a qual o
Cristo é a verdadeira porta (...)
o espírito inflado se eleva em
direção à verdade através das
coisas materiais, e se antes
megulhava no abismo, à vista
da luz ele ressurge.

Abadia de Saint-Denis, rosácea do


transepto Norte (vitrais restaurados no
século XIX)
Abadia de Saint-Denis.
Paris, Île-de-France.
Vistas do coro a partir
da nave central;
cobertura em abóbada
de arestas
Suger tem uma ideia precisa do
que deseja obter e a vontade de
realizá-la: fazer a luz entrar na
igreja, colocar na arquitetura a
declaração do Pseudo-Denys
l’Aréopagite: «Deus é luz».

Bernard de Clairvaux (1090-


1153) foi opositor ferrenho do
luxo nas igrejas e da obra de
Suger. Para ele, o gosto pelos
ornamentos dos quais Suger
quer dotar sua igreja se opõe à
exigência de despojamento, de
recusa de todo ornamento e
de todo luxo ou de temas
figurativos que desviem os
monges da oração. Ele
escreve na sua Apologie à
Guillaume de Saint-Thierry:
A Igreja resplandece em
suas paredes, mas ela não
tem nada para os pobres.
Ela cobre de ouro suas
pedras e abandona seus
filhos inteiramente nus. Às
expensas dos miseráveis,
regalam-se os olhos dos
ricos. Os curiosos
encontram com o que se
divertir, mas não os infelizes
com o que se sustentar.
Entre 1140 e 1151, a cabeceira recebe
seu revestimento de vitrais do
deambulatório (restam apenas fragmentos
dos originais em seis janelas). Suger
escreve em seu Liber de rebus in
administratione sua gestis:

Nós mandamos pintar, pelas mãos


delicadas de numerosos mestres de
diversos lugares, uma esplêndida
variedade de novos vitrais, de cima a
baixo, do primeiro, que começa a série,
A árvore de Jessé, na cabeceira da
igreja, até a janela que coroa a porta da
entrada principal. Um desses vãos,
que nos impele à elevação do material
ao imaterial, representa o apóstolo
Paulo...

Abadia de Saint-Denis. Paris, Île-de-


France. Reiniciada em 1127-1144;
remodelada em meados do século XIII.
Vitrais da cabeceira.
Principais características da arquitetura do estilo
gótico:

●Verticalidade acentuada
●Uso de arcos ogivais
●Uso de abóbadas de cruzaria de ogivas (ou ‘de nervuras’)
●Feixes de pilares
●Emprego de arcobotantes associados a contrafortes:
exoesqueleto
●Pináculos e agulhas
●Plantas cada vez mais complexas
●Vitrais
●Rosáceas
●Gárgulas
●Ornamentação cada vez mais exuberante (gótico flamejante-
flamboyant)
VERTICALIDADE

A principal característica
da arquitetura gótica em
relação à românica é a
verticalidade
acentuada. Esse efeito
é dado não apenas
pelas maiores alturas
atingidas pelas
abóbadas
(possibilitadas pelo uso
dos arcos ogivais e de
exoestruturas), mas
também pelo gosto
pelas torres muito altas
complementadas por
pináculos e agulhas em
profusão. Algumas
torres de catedrais
góticas, como esta de
Ulm, na Alemanha,
podem ser vistas a
quilômetros de
distância, marcando a
paisagem.
A catedral de Ulm, na
Alemanha (iniciada em
1337) é a mais alta do
mundo. Sua torre está
a 162m de altura
(porém só foi
concluída no século
XIX). A altura da nave
central é de 41.6m,
enquanto as laterais
atingem 20.5m.
A catedral de Saint-Pierre
de Beauvais, na França,
possuía uma torre e agulha
que atingia 151m de altura,
mas foi demolida. A nave
central, contudo, é a mais
alta da Europa, com 48,5m.
Catedral de Colônia (Köln),
Alemanha. 1248-1473.
completada em 1880
[1] Catedral de Lincoln, Inglaterra. c.1200-1250; [2] Catedral de Freiburg, Alemanha. 1248-1473

A verticalidade da arquitetura sacra gótica


independe do número, da forma e da
disposição das torres
Comparação entre uma estrutura românica (esq.), e outra gótica (dir.).

Notre-Dame-la-Grande, Poitiers. c.1100-1150. Românica; Catedral de Notre- Dame-


de-Reims, França. c.1211-1311. Gótica.
GÓTICO PRIMITIVO GÓTICO CLÁSSICO GÓTICO RADIANTE GÓTICO FLAMEJANTE
1130-1200 1190-1240 1240-1370 1350-1450

Catedral de Noyon, inic. 1145 Notre Dame de Paris.1163-1345 Sainte Chapelle, Paris, 1241-1248 Saint-Etienne de Toul, séc. XIII-XV

EVOLUÇÃO DO ESTILO GÓTICO NA ARQUITETURA


ARCO OGIVAL

é um elemento de
origem oriental só
introduzido na arte
ocidental a partir do
século XI, aparece no
exterior e no interior
dos edifícios, como
estrutura e também
como adorno.

Portal da catedral
de Ulm, Alemanha
(iniciada em 1337)
Chartres

ARCO OGIVAL

Lyon
ARCO OGIVAL

Catedral de Wells,
Inglaterra; Vista da nave
central. c.1230
ABÓBADA DE NERVURAS

abóbada suportada por uma


intersecção de arcos =
ABÓBADA DE CRUZARIA DE
OGIVAS ou ABÓBADA DE
NERVURAS. Os arcos são
dispostos das maneiras mais
variadas e formando
desenhos diversos.
Os arcos que se cruzam
formam uma espécie de
rede que ‘amarra’ a
abóbada. Cada arco é
saliente (nervura) e tem
função estrutural. O arco se
reúne aos outros do mesmo
tramo (intervalo entre dois
pilares principais) na base
da pilastra e desce até o
chão, formando um “feixe de
pilastras”.
ABÓBADA DE CRUZARIA DE
OGIVAS OU ABÓBADA DE
NERVURAS

[1] Catedral de Wells,


Inglaterra, c. 1230 [2]
catedral de Leon,
Espanha, c. 1225
[1] catedral de
Freiburg, Alemanha;
[2] catedral de Ulm,
Alemanha
A ABÓBADA DE
LEQUE se iniciou e
propagou na
Inglaterra. O
exemplo mais antigo
é o da catedral de
Gloucester, datada
de 1351. É um estilo
em que as nervuras
da abóbada têm
todas a mesma
curvatura e estão
espaçadas de modo
equidistante, de
modo que lembram
um leque aberto. No
entanto, há
exemplos tardios,
como é o caso da
abóbada que cobre
a escadaria na
Christ Church em
Oxford, datada de
1640.

[1] Lady Chapel, na Catedral de Peterborough, Cambridgeshire, Inglaterra. 1496-1508; [2] Capela do King’s College, Cambridge, Inglaterra.
ARCOBOTANTES

Catedral de Bath, Inglaterra Notre Dame de Chartres, França. c.1194-1220


Notre Dame de Chartres,
França. c.1194-1220

Do arcobotante o
peso da abóbada
vai sendo
transferido em
direção ao chão
gradualmente,
através de
contrafortes
muitas vezes
escalonados.
ARCOBOTANTE CONTRAFORTE

Notre Dame de Chartres, França. c.1194-1220


Notre Dame de Chartres, exoesqueleto
França. c.1194-1220.
Vista aérea mostrando o
exoesqueleto (conjunto das
estruturas externas) típico da
arquitetura gótica.
PINÁCULOS E AGULHAS

pináculos são arremates


em forma de pequena torre
cônica ou piramidal usados
para dar peso adicional aos
contrafortes e arcobotantes.
São frequentemente
terminados em uma
agulha, o que amplia a
altura do pináculo e acentua
o direcionamento vertical do
edifício

Catedral de Colônia. 1248-1473.


completada em 1880
O elemento arquitetônico cogulho, Ilustração de Viollet-le-Duc, de remate com cogulhos
também crochet, colchete ou cog e florão, 1856
oilo, designa um pequeno
elemento decorativo em pedra
representando folhas estilizadas,
de uso comum na
arquitetura gótica. No gótico
primitivo são bastante simplificados
e vão passando a formas
extremamente trabalhadas no
gótico flamejante, quando a
profusão de decoração atinge o
auge do estilo e se acentua a ideia
de verticalidade e de movimento
em direção ao céu.
PLANTAS MAIS COMPLEXAS

As plantas das catedrais góticas são mais


complexas do que as românicas. No gótico,
mantém-se a idéia do núcleo básico formado
pela nave central, naves colaterais e abside,
mas o acréscimo de capelas, e deambulatório e
coro ao redor da abside e nos lados do
transepto muitas vezes faz o transepto
desaparecer na planta externa, incorporando-se
à cabeceira: isso é comum na França. Já na
Inglaterra, a tendência é a de manter o transepto
saliente e até acrescentar outros. Costuma-se,
de modo geral, decorar os portais do transepto
com a mesma suntuosidade da fachada
ocidental, a de entrada. Pode acontecer também
o acréscimo à planta original de salas do
Capítulo e de outras capelas muito amplas
(Westminster). Um elemento importante é o
jubeu, como um pequeno edifício dentro do
edifício, suntuosamente decorado e que faz as
vezes do coro (é o coro deslocado da cabeceira,
interposto entre as naves e o altar).

Catedral de Wells
VITRAIS: A arquitetura gótica se caracteriza pela predominância de vazios (aberturas, janelas) sobre os plenos (paredes cegas). Isso é possibilitado porque o peso é suportado pelos arcos e
feixes de pilares e pelo exoesqueleto. A Sainte-Chapelle, em Paris, é dos edifícios mais abertos do estilo, dotada de uma sequência de janelões muito altos preenchidos com vitrais.

Sainte-Chapelle, Paris. Interior. 1241-1248


Catedral de São Vito,
Praga, República Tcheca.
Iniciada em 1344
vitral

O vitral é um trabalho de
desenhos feitos com pedaços
de vidro colorido e reunidos por
finas molduras de chumbo
soldadas. Podiam representar
cenas figuradas e/ou elementos
decorativos abstratos e
geométricos. A técnica
desenvolveu-se na França.
Inicialmente o vidro
transparente era pintado. Mais
tarde, desenvolveu-se a técnica
de colorir a massa do vidro em
fusão, o que deu mais
durabilidade às cores e facilitou
o trabalho final.

[1] Visitação. vitral da catedral de Leon, Espanha; [2] vitral da Catedral de Reims, França
ROSÁCEAS
Rosácea do transepto norte da catedral de Notre-Dame de Paris, vista de fora e de dentro da catedral
ORNAMENTOS TRIANGULARES

ornamento flamboyant

Catedrais de Estrasburgo e Notre-Dame de Rouen, França


trifólio em Amiens quadrifólio em Estrasburgo pentafólio em Lincoln hexafólio no Camposanto de Pisa
GÁRGULAS As gárgulas são
elementos funcionais.
Elas recolhem a água
da chuva, lançando-a
para longe do corpo do
edifício.

Gárgula da catedral de Ulm, Alemanha. 1377-1890.


GÁRGULAS
GÁRGULAS

Freiburg, Breisgau, 1190-1513; alto gótico


O GÓTICO INGLÊS

Catedral de Wells, Inglaterra;


fachada e planta baixa.
c.1230
O GÓTICO ITALIANO

Na Itália, o gótico se revela mais nos detalhes, e


muitas vezes os elementos românicos aparecem
simultaneamente, sobretudo o arco romano, de
volta inteira. As estruturas não atingem as
alturas do gótico francês, os elementos de
exoesqueleto são reduzidos e modestos, não se
abrem janelas amplas e não se empregam os
vitrais (é uma arquitetura tão escura quanto a do
românico). Mantém-se o gosto pela decoração
em mármore colorido nas fachadas e nos
interiores. A decoração interior é caracterizada
pelo uso extensivo da pintura a fresco e não se
empregam os vitrais.
Anônimo. Fachada do duomo de
Milão em 1735. c.1816. Óleo sobre
tela.

Duomo di Milão, iniciado em


1386 e concluído no século XIX.
Torres, pináculos e agulhas em
abundância caracterizam a
catedral de Milão. Grande parte
dos trabalhos datam do século
XVI, do período maneirista. O
pavimento interno, em mámore,
foi concluído entre 1914 e 1940.
Nave central do
duomo de Milão
Basílica de São Francisco de Assis, Assis,
Itália. 1228-1253; detalhe da rosácea
Basílica de São Francisco
de Assis, Assis, Itália.
1228-1253; vista da nave
central coberta por
abóbada de ogivas. Na
decoração, predomina a
pintura em afresco.
Catedral de Santa Maria Assunta, Siena, Itália. c.1220-1370
Catedral de Santa Maria Assunta, Siena, Itália. c.1220-1370, detalhe do trabalho de mármore da fachada e vista da nave central
O GÓTICO ESPANHOL

Catedral de santa Maria de Burgos,


Espanha. Iniciada em 1225,
concluída no séc. XV
Catedral de santa Maria de Burgos, Espanha. Iniciada em 1225,
concluída no séc. XV
Salamanca, Espanha.
Na Espanha, os últimos
Catedral vieja
desdobramentos do gótico
avançam até o início do
século XVI. Esse estilo
recebeu o nome de
“plateresco”, pois sua
ornamentação muitas
vezes evoca o trabalho em
prata produzido nas
colônias recém-
descobertas da América,
como o Peru. O plateresco
se desenvolve
particularmente na região
de Salamanca,
empregando uma pedra
local de tonalidade
dourada.
Catedral (nova) de Salamanca foi construída entre 1513-1733. Sua
construção tem início no gótico tardio. A fachada é em estilo plateresco.
Foi construída anexa à Catedral velha, muito menor, construída entre os
séculos XII e XIV, de estilo românico e gótico.
Catedral Primada das Américas, Ciudad Colonial
Santo Domingo. República Dominicana. 1521-1541
O GÓTICO PORTUGUÊS

Afonso Domingues (1330-1402)


e David Huguet (irlandês, at.
1416-1438). Mosteiro de Santa
Maria da Vitória da Batalha,
Portugal. 1386-1517
Afonso Domingues (1330-1402) e David Huguet (irlandês, at. 1416-1438). Mosteiro de
Santa Maria da Vitória da Batalha, Portugal. 1386-1517
O Mosteiro dos Jerônimos, com sua igreja de
Santa Maria de Belém, em Lisboa, é o exemplo
mais emblemático da arquitetura manuelina. Foi
encomendado pelo rei D. Manuel I pouco depois de
Vasco da Gama ter regressado da Índia, em 1502.
Foi construído em pedra lioz

Karl Albrecht. Planta baixa do Mosteiro dos Jerônimos e


Diogo de Boitaca, João de Castilho, Diogo de Torralva, Jerônimo de Ruão. Mosteiro dos Jerônimos e igreja Santa Maria de igreja de Santa Maria de Belém, Lisboa (c.1880)
Belém, Lisboa, Portugal. 1502
Como acontece na Espanha, em
Portugal o estilo gótico se estende até
as duas primeiras décadas do século
XVI. O estilo do período coincidente
com o reinado de D. Manuel I (1495-
1521) é, por isso, chamado
Manuelino. Ele é caracterizado por
uma decoração abundante, marcada
pela presença de elementos
vinculados às navegações
portuguesas e simbólicos do poder
régio, criando um repertório tão rico
quanto o do contemporâneo
plateresco espanhol.

O termo "Manuelino" foi criado


por Francisco Adolfo Varnhagen na
sua Notícia Histórica e Descriptiva do
Mosteiro de Belém, de 1842.

Diogo de Boitaca, João de Castilho,


Diogo de Torralva. Santa Maria de
Belém, Lisboa, Portugal. 1502. detalhe
do portal de entrada.
Interior da igreja de
Santa Maria de
Belém, Lisboa
O ESTILO MANUELINO

A característica dominante do Manuelino é a


exuberância das formas ornamentais, que
emprega um amplo repertório de motivos ao
mesmo tempo naturalistas e simbólicos,
tradicionais e originais. Janelas e portas são
os elementos arquitetônicos de maior
destaque nesse estilo. Mas a ornamentação
manuelina também aparece em pelourinhos,
túmulos e peças artísticas móveis.

Os motivos decorativos mais frequentes da


arquitetura manuelina são aqueles relativos
à iconografia marítima e a afirmadores do
poder régio. Entre os de maior recorrência
estão os acordoados e instrumentos de
navegação como a esfera armilar
(conferida como divisa por D. João II ao seu
primo e cunhado, o futuro rei D. Manuel I,
mais tarde, interpretada como sinal de um
desígnio divino para o reinado de D.
Manuel), e a Cruz da Ordem de Cristo.
Entre os elementos naturalistas
estão corais, algas, alcachofras, pinhas,
romãs, animais, Elementos fantásticos
também
comparecem: ouroboros, sereias, gárgulas,
etc.

Diogo de Boitaca, João de Castilho, Diogo de


Torralva, Jerônimo de Ruão. Mosteiro dos
Jerônimos, Belém, Lisboa, Portugal. 1502.
Diogo de Boitaca, João de
Castilho, Diogo de Torralva,
Jerônimo de Ruão.
Mosteiro dos Jerônimos,
Belém, Lisboa, Portugal.
1502. vista do claustro.
Diogo de Boitaca, João de
Castilho, Diogo de
Torralva, Jerônimo de
Ruão. Mosteiro dos
Jerônimos, Belém, Lisboa,
Portugal. 1502. detalhe da
ornamentação de janelas
voltadas para a rua
(romãs e esferas
armilares)
No Mosteiro dos
Jerônimos, em Lisboa, a
CRUZ DA ORDEM DE
CRISTO aparece esculpida
em vários pontos; aqui,
nos fechos das abóbadas.
Francisco de Arruda. Torre de Belém
(ou ‘Torre de São Vicente de
Saragoça’, ou ‘Baluarte de São Vicente
a par de Belém’). 1514-1520.
Aproximadamente 30m de altura e
40m de comprimento. Lisboa. Estilo
manuelino
A ESFERA ARMILAR é originalmente um
instrumento de navegação que se
tornou um dos símbolos do reinado
de D. Manuel. Esse elemento
simbólico aparece em vários tipos de
monumentos, coroando torres de
igreja ou pelourinhos. Representava
o mundo descoberto e evangelizado
pelos portugueses e também o
espaço de jurisdição, mundus civitatis
[espaço ordenado, em contraposição
ao espaço caótico que podia ser
associado ao sertão (visão
etnocêntrica dos colonizadores);
civitatis é a cidade não do ponto de
vista de sua materialidade (urbs),
mas significando o conjunto de seus
habitantes, regidos por leis e por uma
entidade administrativa].

FONSECA, Cláudia D. Arraiais e


vilas d’el Rei, p. 30-31.
GÓTICO - ESCULTURA
C.1200-1450
NO INÍCIO DO PERÍODO
GÓTICO, A ESCULTURA
DAS FACHADAS AINDA SE
PRENDE MUITO AO
SUPORTE
ARQUITETÔNICO; SÃO
COLUNARES, ALONGADAS
E COM POUCA
VOLUMETRIA.

Esculturas da jamba do
Pórtico Real de Notre-
Dame de Chartres,
França. c.1145-1155.
ACENTUA-SE
GRADUALMENTE O
SENTIDO VOLUMÉTRICO
DAS FIGURAS, QUE
CONTINUAM A SE DISPOR
NO PÓRTICO, OCUPANDO
TODO O ESPAÇO
ARQUITETÔNICO. AGORA
ELAS SE DESPRENDEM DO
FUNDO ARQUITETÔNICO,
APOIAM-SE EM PEANHAS E
SÃO PROTEGIDAS
INDIVIDUALMENTE POR UM
PEQUENO DOSSEL.

Esculturas da jamba do Pórtico central da catedral de Notre-Dame de Reims; c.1230


A ESCULTURA DOS
CORPOS
GRADUALMENTE VAI
RETOMANDO AS
PROPORÇÕES
CLÁSSICAS. A ISSO
ACRESCENTA-SE A
MOBILIDADE E O
NATURALISMO NOS
GESTOS, NA
VOLUMETRIA DOS
TECIDOS E NA PRÓPRIA
REPRESENTAÇÃO
ANATÔMICA. AS
FUGURAS INTERAGEM, E
NARRATIVAS QUE
SURGEM DESSA
INTERAÇÃO SÃO MAIS
CLARAMENTE LEGÍVEIS.

Anunciação e
Visitação
(c.1230)
Catedral de
Notre Dame de
Reims, França.
Fachada oeste,
portal central,
jamba direita
Visitação (c.1230) Catedral de Notre
Dame de Reims, França. Fachada
oeste, portal central, jamba direita
Detalhe da Anunciação (c.1230)
Catedral de Notre Dame de Reims,
França. Fachada oeste, portal
central, jamba direita
ATENÇÃO RENOVADA AOS DETALHES DAS
TEXTURAS DAS SUPERFÍCIES

Figuras do portal sul da


catedral de Notre-
Dame de Chatres,
destaque para o São
Teodoro. c.1230
No tímpano das portadas das
catedrais góticas, o tema central
muitas vezes ainda é aquele
herdeiro do mundo românico: o
Cristo do Juízo, Cristo Pantocrator,
acompanhado do Tetramorfo.
Como no período românico, a cena
principal é comumente completada
nas arquivoltas com os 24 anciãos
do Apocalipse e o grupo dos
Apóstolos. De uma forma geral, as
cenas do Inferno e as aparições
diabólicas tendem a diminuir ou ser
colocadas em posição de menor
destaque.

O Cristo do Juízo, escultura do


tímpano do Pórtico real da
catedral de Notre-Dame de
Chartres, França, c. 1145-1155.
Notre-Dame d'Amiens. Robert de Luzarches, Thomas e Renaud de Cormont. inicio 1220
Tímpano do portal
central da fachada
oeste da catedral de
Notre-Dame
d'Amiens. Iniciada
em 1220
Portal central da fachada oeste de Notre-Dame d'Amiens. Iniciada em 1220
O Cristo do Juízo do Portal central
da fachada oeste da catedral de
Notre-Dame d'Amiens. Iniciada em
1220
Os danados,
condenados ao inferno,
no Portal central da
fachada oeste da
catedral de Notre-
Dame d'Amiens
A ressurreição dos mortos no portal central da fachada oeste da catedral de Notre-Dame d'Amiens
No parte-luz dos portais
góticos, aparece
comumente uma figura
amável que dá as boas
vindas aos fiéis: o Cristo
ou a Virgem em Majestade
com o Menino.
O portal simboliza agora
não mais a advertência
aos fiéis, mas a entrada
que leva à admissão ao
paraíso. Como no
Românico, estas fachadas
podem incorporar
elementos profanos, mas
ocupando lugares
secundários.

Portal de Notre-Dame de
Reims, França, c.1240.
Portal direito da fachada oeste de Notre-Dame d'Amiens.
Iniciada em 1220
Também se esculpe
a Morte da Virgem
(Koimesis) ou sua
Coroação.

A morte da Virgem
(koimesis). c.1230.
Tímpano da porta
esquerda do
transepto sul da
catedral de
Estrasburgo,
França.
Santa ceia. c.1250-
1260. relevo em pedra
da catedral de
Naumburg
IMAGEM HUMANIZADA: GOSTO PELA
EXPRESSÃO DE SENTIMENTOS (PATHOS).

Esse fenômeno de humanização e


localização no tempo e espaço se
percebe nas figuras mais representadas
da escultura gótica. No caso da Virgem
com o Menino, Maria adota a forma de
mãe alegre e carinhosa que atende seu
filho com amor maternal. É fácil encontrar
sorrisos ligeiros ou abertos em seu rosto.

Duas cabeças de Maria. c.1250-1260. Catedral de Naumburg, Alemanha


Românico: imagem Gótico: imagem
atemporal humanizada

A IMAGEM DEVOCIONAL
GÓTICA
Temas marianos ou cenas da vida da
Virgem. Desde o final do período
românico, a Virgem Maria é muito
representada, mas é no gótico que
adquire o papel de protagonista. A figura
da Virgem aparece principalmente com o
Menino: é representada como mãe, bela,
idealizada e dotada de emoções e
humanização, atendendo seu filho com
delicadeza.

[1] Madona de Krużlowa. c.1410. Madeira


policromada e dourada; h:119 cm. Cracóvia,
National Museum, Palace of Edward Ciołe;
[2] Mestre das Belas Madonas (da Silésia ou
Boêmia). Madona com o Menino. c. 1390. h:
119 cm. Museu Nacional de Varsóvia
As estátuas já são independentes das
colunas e aparece possivelmente pela
primeira vez na Idade Média o uso
do contraposto para dar maior graça e
movimento às imagens, complementado
com atitudes mais dinâmicas nos
membros e um tratamento de volumes
anatômicos que em muitos casos já não
são mais ocultos pelo vestuário.
Entretanto, o contraposto gótico difere
do clássico quando parece mais
imposto a partir de fora e não o
resultado de uma compreensão correta
da anatomia, sendo mais ornamental
do que orgânico

Virgem com o Menino.


c1330. pedra. Notre Dame
de Paris
CONTRAPOSTO
GÓTICO
MARFINS

[1] Virgem e Menino. c.


1320-1330. Marfim.
Proveniente de Paris
Londres, British Museum;

[2] Anônimo alemão. 1350-


75. Madona e Menino.
marfim e pintura; 21,2 x 8 x
3,2cm. Baltimore, Walters
Art Museum
Virgem com Menino. 1324-1339. Prata
dourada e esmalte; h: 69 cm. Paris,
Museu do Louvre.
Obra encomendada pelo rei Carlos IV da
França (1322-28) para sua esposa,
Jeanne d'Evreux. Foi depois doada à
abadia de St.Denis.
As esculturas do período gótico são marcadas por alguns maneirismos na construção do corpo e dos rostos: os olhos são amendoados-
puxados, com traços orientáis, e as bocas comumente esboçam um sorriso ideal que evoca o sorriso da escultura arcaica-severa grega

[1] Anjo sorridente. Portal da catedral de Reims, séc. XIII. Fachada oeste; [2] atr. Mestre Heinrich de
Konstance (at.c.1300). A Visitação (detalhe). c1310-1320. Alemanha. Madeira; H: 59,1 cm. Nova Iorque,
Metropolitan Museum; [3] Virgem e Menino (detalhe). c.1270. Da Picardia. Carvalho; H: 116 cm
VESPERBILDEN-PIETÀ:
literalmente, “imagem do
entardecer”, “do crepúsculo”.
São representações de
passagens que retratam o
sofrimento do cristo ou de
Maria, em especial as
piedades (pietà)

Pietà. 1435-1440. Da Suábia


(Alemanha). madeira
policromada. H: 88,9cm. Nova
York, Metropolitan Museum
Vesperbild (Pietà de
Roettgen). c.1360. Madeira
policromada; h: 88 cm.
Bonn, Provinzialmuseum
Vesperbild (Pietà de Roettgen).
c.1360. Madeira policromada; h: 88
cm. Bonn, Provinzialmuseum
Vesperbild (Pietà de Roettgen). c.1360.
As cenas do calvário de Cristo têm
destaque, em especial a Crucificação e
crucificados. O Cristo aparece
humanizado, sofredor, como um homem
normal enfrentando a sua morte.
Esse tipo de Cristo é chamado então
Christus Patiens, ou seja, Cristo sofredor,
e se opõe ao Christus triumphans – Cristo
triunfante, do início da IM. É um Cristo que
carrega o fardo e a dor da humanidade.

Crucificado. c1300. Francês. Madeira


policromada; 140 x 105 x 30.8 cm.
Nova York, Metropolitan Museum
COMO RESULTADO DA
RENOVAÇÃO DO INTERESSE
PELO NATURALISMO,
RESSURGEM OS RETRATOS

Mestre de Naumburg (at. c.


1225). Ekkehard, marquês de
Meissen, e Uta, fundadores do
coro ocidental da catedral de
Naumburg, c. 1260.
Mestre de Naumburg (at. c. 1225). Hermann e Reglindis, fundadores do coro ocidental da catedral de Naumburg. Escultura em pedra. c. 1260. Pedra
policromada. Catedral de Naumburg, Alemanha
Adelheid e Otto I. c. 1260.
esculturas em pedra
policromadas. Catedral
de Meissen, Alemanha
O caveleiro de Bamberg
(São Jorge a cavalo?
Retrato de Frederico II?).
Escultura em mármore
anterior a 1237. h: 267 cm.
Catedral de Bamberg,
Alemanha
OS SEPULCROS ESCULPIDOS

Outra importante manifestação escultórica do


período gótico é a dos sepulcros esculpidos, que
podem ser de dois tipos:
Adossados: encostados na parede ou em nicho
Exentos: a cama funerária está separada da
parede, possuiu os lados decorados e se apoia
em figuras de animais. Costuma-se representar
o defunto em posição jacente ou orante. São
sepulcros realizados sob a comitência de reis,
burgueses e nobres, e se encontram em suas
capelas familiares particulares, dentro das
grandes igrejas.

Túmulo de Thomas
Beckington, catedral de
Wells, Inglaterra .c.1450.
Túmulos de Inês de Castro e D. Pedro I no Mosteiro de Alcobaça, Portugal. Mármore. 1358-1367
Claus Sluter (Haarlem, c. 1355-Dijon,
1406). Túmulo de Philippe le Hardi. c.
1383-1412. Alabastro e mármore.
Dijon, Musée Archéologique.
Claus Sluter. Túmulo de Philippe le Hardi. c. det.1383-1412.
Alabastro e Mármore. Dijon, Musée Archéologique

Escola flamenga. Philippe II de


Bourgogne. c 1500. Copie,
Schweizerhof (trésor impérial), palais
de la Hofburg, Vienne.
Claus Sluter. Túmulo de
Philippe le Hardi. c. det.1383-
1412. Alabastro e Mármore.
Dijon, Musée Archéologique.
Claus Sluter. Túmulo de Philippe, le Hardi. c.1383-1412.
Alabastro e Mármore. Dijon, Musée Archéologique
Claus Sluter. A fonte de Moisés.
c.1395. Mármore, h: 183cm.
Dijon, Cartuxa de Champmol
Claus Sluter. A fonte de Moisés. c.1395.
Mármore, H: 183 cm. Dijon, Cartuxa de
Champmol
Claus Sluter.
A fonte de Moisés.
c.1395. Mármore, h:
183 cm. Dijon,
Cartuxa de Champmol
Nicola Pisano (c.1220-1284). Púlpito hexagonal do Batistério de Pisa, Itália. c. 1260. Mármore; H: 465 cm. Anunciação, Natividade e Adoração dos pastores.
O NU MASCULINO FAZ
APARIÇÕES DISCRETAS. NO
CASO DE Nicola PISANO, HÁ UMA
CLARA REFERÊNCIA AO NU
HERÓICO CLÁSSICO

Nicola Pisano (c.1220-1284).


Fortitudo (Fortaleza)
c.1260. Mármore. Púlpito do
Batistério de Pisa
RELICÁRIOS E CUSTÓDIAS

[1] Custódia alemã de c. 1500.


Londres, Victoria & Albert Museum; [2] Custódia talvez italiana. c.1400-1450. bronze dourado e cristal de rocha; h14cm. Londres, Victoria & Albert Museum;
[3] Relicário de Palma de Maiorca. 1450-1475. Bronze dourado e esmalte; h41,5cm. Londres, Victoria &Albert Museum
Relicário franco-
flamengo para osso
de dedo. Final do
século XV. Prata,
cobre dourado e
vidro; h: 22,5cm.
Walters Art
Museum..

Relicário carolíngio com o dente de São João


Batista. Século IX. Monza, Museo e tesoro
del Duomo di Monza
A Custódia de Belém, ou dos Jerônimos, é
um ostensório português de ouro e esmalte datado
de 1506 cuja autoria é atribuída a Gil Vicente. Foi
encomendada por D. Manuel I de Portugal para a
Capela Real. D. Manuel deixaria este tesouro em
testamento ao Mosteiro dos Jerônimos, em Belém,
que fundou e escolheu para seu enterramento.
De estilo gótico tardio, na sua manufatura foram
utilizadas "1500 miticais de ouro" trazidas por Vasco
da Gama no regresso da sua segunda viagem à
Índia em 1502, enviadas como tributo
pelo régulo de Quíloa (Tanzânia), que assim
reconhecia vassalagem ao rei de Portugal.

Gil Vicente (atr.). Custodia de Belém.


1506. Ouro e esmalte. Lisboa, Museu
Nacional de Arte Antiga
Gil Vicente (atr.). Custodia de Belém. 1506. Ouro e esmalte. Lisboa, Museu Nacional de Arte Antiga
Gil Vicente (atr.). Custodia de Belém. 1506. Ouro e
esmalte. Lisboa, Museu Nacional de Arte Antiga
Relicário de Saint-Taurin, Évreux. 1240-1255. Relicário de Santo Antônio Abade em Warfhuizen (Holanda)

O relicário arquitetônico evoluiu a partir do relicário-caixa, ou cofre fechado. O seu


desenvolvimento foi paralelo ao da arquitetura gótica, com estatuetas e painéis esmaltados
imitando respectivamente a escultura monumental e as janelas com vitrais.

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