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CIRURGIA DE

CABEÇA E
PESCOÇO
Autoria e colaboração

Alexandre Bezerra dos Santos Felipe Augusto Brasileiro Vanderlei


Graduado pela Faculdade de Medicina da Universidade Graduado pela Faculdade de Medicina da Universidade
de São Paulo (FMUSP). Especialista em Cirurgia Geral de São Paulo (FMUSP). Especialista em Cirurgia Geral e
pelo Hospital das Clínicas da FMUSP (HC-FMUSP) e em em Cirurgia de Cabeça e Pescoço pelo Hospital das Clí-
Cirurgia de Cabeça e Pescoço pelo Instituto Brasileiro nicas da FMUSP (HC-FMUSP). Título de especialista pela
de Controle do Câncer (IBCC). Título de especialista pela Sociedade Brasileira de Cirurgia de Cabeça e Pescoço
Sociedade Brasileira de Cirurgia de Cabeça e Pescoço (SBCCP).
(­SBCCP). Doutor pela FMUSP.
Rafaella Falco Bruhn
Caio Plopper Graduada pela Faculdade de Medicina do ABC (FMABC).
Graduado pela Faculdade de Medicina da Universidade Especialista em Cirurgia Geral e em Cirurgia de Cabeça e
de São Paulo (FMUSP). Especialista em Cirurgia Geral e Pescoço pela FMABC.
em Cirurgia de Cabeça e Pescoço pelo Hospital das Clí-
nicas da FMUSP (HC-FMUSP). Título de especialista pela
Rodney Smith
Sociedade Brasileira de Cirurgia de Cabeça e Pescoço Graduado pela Faculdade de Medicina da Universidade
(SBCCP). de São Paulo (FMUSP). Doutor em Cirurgia pelo Hospital
das Clínicas da FMUSP (HC-FMUSP). Especialista em Ci-
Christiana Maria Ribeiro Salles Vanni rurgia de Cabeça e Pescoço pela Sociedade Brasileira de
Graduada pela Faculdade de Medicina da Universida- Cirurgia de Cabeça e Pescoço (SBCCP).
de de Santo Amaro (Unisa). Especialista em Cirurgia de
Cabeça e Pescoço pela Faculdade de Medicina do ABC
Atualização 2019
(FMABC), onde é médica assistente da disciplina de Ci-
Alexandre Bezerra dos Santos
rurgia de Cabeça e Pescoço. Doutoranda pela Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Tí-
tulo de especialista pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Assessoria didática
de Cabeça e Pescoço (SBCCP). Fabio Colagrossi Paes Barbosa
Fabio Colagrossi Paes Barbosa
Graduado em Medicina pela Universidade Federal de
Mato Grosso do Sul (UFMS). Especialista em Cirurgia
Geral pela Santa Casa de Campo Grande e em Cirurgia
do Aparelho Digestivo pela Irmandade da Santa Casa de
Misericórdia de São Paulo (ISCMSP). Mestre e doutor em
Cirurgia pela ISCMSP. Membro titular do Colégio Brasilei-
ro de Cirurgia Digestiva (CBCD), do Colégio Brasileiro dos
Cirurgiões (CBC) e do Capítulo Brasil da International He-
pato-Pancreato-Biliary Association (IHPBA). Professor
adjunto de Cirurgia da Faculdade de Medicina da UFMS e
professor titular da Universidade Anhanguera-Uniderp.
Coordenador da Residência Médica em Cirurgia Geral do
Hospital Regional de Mato Grosso do Sul.
Prezado aluno,

Nós, da Medcel, sabemos o quanto é desafiador o caminho para se tornar médico


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Um grande abraço,
Time Medcel
Sumário

Capítulo 1 - Esvaziamentos cervicais...............9 Capítulo 5 - Doenças das paratireoides........55


1. Introdução e histórico...............................................10 1. Introdução................................................................... 56
2. Anatomia do pescoço – níveis................................11 2. Hiperparatireoidismo...............................................57
3. Classificação................................................................ 13 3. Hiperparatireoidismo
4. Estadiamento de metástases primário........................................................................57
linfonodais – N............................................................ 15 4. Hiperparatireoidismo secundário....................... 59
5. Conclusões...................................................................19 5. Medida do paratormônio.......................................60
Resumo..............................................................................19 6. Câncer de paratireoide...........................................60
7. Hipoparatireoidismo................................................60
Capítulo 2 - Traqueostomias...........................21
8. Condução de caso habitual..................................... 61
1. Introdução................................................................... 22
Resumo............................................................................. 62
2. Indicações.................................................................... 22
3. Cuidados pré e pós-operatórios........................... 24 Capítulo 6 - Abscesso cervical....................... 63
4. Técnica operatória.................................................... 25
1. Introdução................................................................... 64
5. Complicações..............................................................27
2. Epidemiologia............................................................ 64
6. Tópicos especiais....................................................... 28
3. Fáscias cervicais........................................................ 64
7. Conclusão..................................................................... 29
Resumo..............................................................................73
Resumo............................................................................. 29

Capítulo 7 - Tumores de cavidade oral..........75


Capítulo 3 - Tumores cervicais benignos...... 31
1. Introdução e anatomia.............................................76
1. Introdução....................................................................32
2. Epidemiologia.............................................................76
2. Malformações congênitas.......................................32
3. Quadro clínico.............................................................77
3. Laringocele..................................................................35
4. Outros tumores benignos e malignos................ 78
4. Torcicolo congênito...................................................35
5. Estadiamento............................................................. 79
5. Teratoma......................................................................35
6. Malformações linfáticas......................................... 36 6. Diagnóstico.................................................................80

7. Hemangiomas............................................................. 36 7. Tratamento cirúrgico................................................81

8. Outros tumores benignos.......................................37 8. Reconstrução............................................................. 83

9. Tumores de origem neural..................................... 39 9. Tratamento adjuvante............................................. 85

Resumo............................................................................. 39 10. Complicações........................................................... 85


Resumo............................................................................. 86
Capítulo 4 - Doenças da glândula tireoide..... 41
1. Introdução................................................................... 42 Capítulo 8 - Tumores de faringe.................... 87
2. Embriologia................................................................. 42 1. Introdução...................................................................88
3. Anatomia..................................................................... 42 2. Nasofaringe................................................................88
4. Doenças benignas da glândula tireoide.............44 3. Orofaringe...................................................................90
5. Doenças malignas da glândula tireoide.............48 4. Hipofaringe..................................................................93
Resumo..............................................................................53 Resumo............................................................................. 98
Capítulo 9 - Tumores de laringe..................... 99 Capítulo 12 - Complicações em Cirurgia de
Cabeça e Pescoço............................................. 137
1. Introdução.................................................................100
2. Anatomia e fisiologia ............................................100 1. Introdução................................................................. 138

3. Pedículos neurovasculares.................................. 102 2. Hematoma cervical................................................ 138

4. Sub-regiões da laringe.......................................... 102 3. Fístulas e deiscência de suturas..........................139

5. Carcinoma de laringe............................................. 103 4. Fístulas linfáticas.....................................................145

Resumo.............................................................................111 5. Estenoses digestivas..............................................145


6. Estenoses/obstrução de via aérea.....................145
Capítulo 10 - Tumores de cavidade nasal e 7. Complicações vasculares...................................... 146
seios paranasais............................................... 113
8. Infecções....................................................................147
1. Introdução..................................................................114 9. Complicações do tratamento complementar..... 148
2. Diagnóstico pelas avaliações clínica e 10. Conclusão................................................................ 149
radiológica................................................................. 116
Resumo........................................................................... 149
3. Patologia dos tumores nasossinusais............... 117
4. Classificação..............................................................118
5. Carcinoma nasossinusais .....................................118
6. Estadiamento – tumor de seios maxilares...... 119
7. Tratamento................................................................ 120
Resumo............................................................................123

Capítulo 11 - Doenças das glândulas


salivares.............................................................125
1. Introdução..................................................................126
2. Patologia dos tumores de glândulas
salivares..................................................................... 128
3. Doenças não tumorais das glândulas
salivares......................................................................133
Resumo............................................................................135
Alexandre Bezerra dos Santos
Christiana Maria Ribeiro Salles Vanni
Rodney Smith

1
Esvaziamentos
cervicais
Neste capítulo, abordaremos o esvaziamento cer- As linfonodomegalias apresentam história aguda, com
vical, um procedimento cirúrgico em que é retirado rápido crescimento, são dolorosas e tendem a regredir
todo o tecido fibroconectivo da região de determi- espontaneamente. A conduta inicial é a observação dos
nada cadeia linfonodal, com finalidade terapêutica. linfonodos, com pesquisa do foco infeccioso/inflamatório
Historicamente, utiliza-se a classificação feita pelo inicial. Quando persistente, deve-se fazer uma investigação
Memorial Hospital, de Nova Iorque (1930) – níveis de I mais minuciosa, para pesquisar doenças linfonodais especí-
a V (submandibular, jugulocarotídeo alto, jugulocaro- ficas infecciosas (como tuberculose) ou neoplasias primárias
tídeo médio, jugulocarotídeo baixo, trígono posterior), de linfonodos (linfomas). A avaliação complementar pode
sendo utilizados 2 critérios: quanto à extensão – radi- ser feita com ultrassonografia cervical, tomografia e biópsia
cais (clássico, modificado e ampliado, ou estendido) e em casos suspeitos com punção aspirativa por agulha fina
seletivos (supraomo-hióideo, jugulocarotídeo, postero- ou incisional e PET-CT scan. Sempre que possível, o trata-
lateral, compartimento central) – e quanto à indicação mento deve ser realizado com a ressecção em monobloco,
– terapêutico, profilático, de oportunidade e resgate. ou seja, do tumor primário e do produto do esvaziamento
Posteriormente, foram incluídos 2 níveis: recorrencial, cervical juntos. Neste, deve-se sempre planejar a incisão,
devido à presença do nervo laríngeo recorrente, pos- podendo ser “em colar”, ou seja, da mastoide ipsilateral até
terior à glândula tireoide, e mediastinal superior. Há a a linha média (ou com extensão contralateral em casos de
modalidade com a preservação de estruturas linfáti- esvaziamento bilateral), e com uma trifurcação (uma incisão
cas, ou seja, a retirada apenas dos níveis linfonodais, longitudinal superior em que, em seu ponto médio, se traça
que são, em geral, os 3 primeiros níveis de drenagem, uma linha perpendicular até o nível da clavícula). Lembre-se
a depender da localização do tumor primário (chama- de que há o primário oculto, sendo a metástase evidenciada
dos esvaziamentos cervicais seletivos, ou parciais). antes do tumor inicial, e os locais mais comuns são rinofa-
Esvaziamentos superseletivos ainda não são consenso, ringe, loja tonsilar, supraglote e seio piriforme. A presença
e a técnica de linfonodo-sentinela vem ganhando de metástases linfonodais é o fator isolado de pior prog-
espaço. De todas as formas, é um procedimento que nóstico na sobrevida dos pacientes com carcinoma de via
exige grande conhecimento anatômico do pescoço. O aerodigestiva e sempre implicará a indicação de tratamento
estadiamento de metástases linfonodais tem 2 clas- radioterápico complementar. A combinação de quimiote-
sificações, uma para neoplasia de vias aerodigestivas rapia com radioterapia é eficaz no tratamento do tumor
altas e outra para as neoplasias de glândula tireoide. primário, mas nem tanto no pescoço.
10 cirurgia de cabeça e pescoço

1. Introdução e histórico Tabela 1 - Classificação

Nível I Submandibular
A - Definição Nível II Jugulocarotídeo alto
Denomina-se esvaziamento cervical o procedi- Nível III Jugulocarotídeo médio
mento cirúrgico por meio do qual é retirado todo
Nível IV Jugulocarotídeo baixo
o tecido fibroconectivo da região que compreende
uma determinada cadeia linfonodal. Passou a ter Nível V Espinal posterior
importância com o conhecimento da história na-
Nível VI Recorrenciais ou compartimento central
tural dos tumores do segmento cervicofacial, uma
vez que se observavam metástases linfonodais Nível VII Mediastino superior
para localizações específicas apresentadas por
determinados tumores, e que um tratamento ci-
rúrgico completo se dá pela retirada do tumor e
seus possíveis sítios de metástases.

B - História
Curiosamente, o 1º autor a descrever os vasos lin-
fáticos foi Aselli, em 1622, ao dissecar cães após
refeições e observar vasos linfáticos mesentéri-
cos. Porém, o 1º tratado moderno sobre o sistema
linfático humano foi feito somente em 1932, por
Rouvière, que classificou os linfonodos de acordo
com a sua topografia.
Até meados do século XIV, a presença de me-
tástase cervical constituía sinônimo de incu-
rabilidade, e algumas tentativas de ressecção
cirúrgica foram feitas sem sucesso. Em 1888,
houve a 1ª publicação de um esvaziamento cer-
vical, na Polônia. No entanto, o verdadeiro difu-
sor do procedimento cirúrgico foi G. W. Crille, em
1905, que utilizou os conceitos de ressecção “em
bloco”, propostos por Halsted para cirurgias de
mama, e realizou uma grande série de esvazia-
mentos cervicais. A cirurgia consistia na remoção Figura 1 - Níveis linfonodais cervicais
de toda a cadeira linfonodal vertical, em conjunto
com o músculo esternocleidomastóideo (MECM),
o nervo espinal acessório (NC XI) e a Veia Jugu-
lar Interna (VJI), em um procedimento até hoje
denominado “esvaziamento cervical radical à
Tratamento
Crille”. Esses conceitos foram amplamente sedi- Ressalte-se que o procedimento dito esva-
mentados por Hayes Martin, em 1951, com a pu- ziamento cervical radical clássico, tal como o
blicação de 1.450 casos operados, consolidando proposto inicialmente por Crille, consiste na
as indicações e a técnica. ressecção em bloco dos 5 primeiros níveis linfo-
Na década de 1930, um importante estudo foi re- nodais, em conjunto com o MECM, o NC XI e a VJI.
alizado no Memorial Hospital, em Nova Iorque, a
partir de tumores malignos de boca, em que se
notou que as metástases linfonodais tinham um No entanto, observou-se que os pacientes sub-
caráter “descendente”, e, com isso, criou-se uma metidos a essas cirurgias apresentavam seque-
classificação dos níveis linfonodais cervicais que las, principalmente devido à lesão do NC XI (XI
se tornou o padrão utilizado até hoje. par craniano, responsável por inervar o músculo
Caio Plopper Christiana Maria Ribeiro Salles Vanni
Rodney Smith Alexandre Bezerra dos Santos

12
Neste capítulo, serão revisadas as principais complica-
ções em Cirurgia de Cabeça e Pescoço – principalmente
as complicações pós-tireoidectomia, por serem as mais
comuns, devendo ser bem conhecidas pelos cirurgiões
e candidatos nos concursos médicos. Quando estamos
diante de cirurgias de cabeça e pescoço, essas com-
plicações se tornam mais potenciais e específicas,

Complicações
por considerar porte cirúrgico, estruturas envolvidas,
cirurgias longas e oncológicas e perfil do paciente. As
complicações mais comuns são hematoma cervical, fís-
tulas e deiscência de suturas e hipoparatireoidismo. Os
hematomas cervicais têm riscos específicos (podem
levar a insuficiência respiratória alta de rápida progres-
são e virtual obstrução da luz respiratória) e levam a
em Cirurgia
de Cabeça e
urgências e emergências, necessitando de imediato
reconhecimento e condutas, e o tratamento inicial
envolve a simples abertura da incisão cirúrgica e a

Pescoço
evacuação do hematoma. As fístulas pós-operatórias
são habitualmente autolimitadas, e seu tratamento
com curativos compressivos e cuidados de higiene
local geralmente é suficiente. De maneira geral, as fís-
tulas, na grande maioria, são salivares, comunicando
a saliva com o meio. As demais e menos comuns são sia facial completa (em caso de lesão do tronco do nervo) ou
liquórica e linfática (quilosa). A perda de retalhos utili- parcial. As operações que envolvem a parótida podem levar
zados para a reconstrução de cabeça e pescoço é uma também à síndrome de Frey, ou sudorese gustatória. Outra
complicação importante, que requer intensa atenção. lesão neural comum às parotidectomias é a do nervo auricu-
Nas tireoidectomias, as complicações mais frequen- lar magno, levando a hipoestesia da porção inferior da orelha
tes são hipoparatireoidismo e hipocalcemia transitória ipsilateral. Na maior parte dos casos, são de débito baixo e
ou persistente (tratamento com reposição de cálcio – autolimitadas, evoluindo bem com punções esvaziadoras e
intravenoso, nos casos de sintomas mais significativos, curativos compressivos. Uma complicação dos esvaziamen-
ou oral, nos casos mais leves), paresia/paralisia de ner- tos cervicais que pode ter grande impacto pós-operatório é a
vos laríngeos, em que a simples manipulação do nervo, fístula linfática ou quilosa, em geral resolvidas com a retirada
em qualquer tireoidectomia, em especial nos casos de do vácuo de drenos cervicais, curativos compressivos e o uso
grandes bócios, tumores malignos e esvaziamentos de dietas ricas em Triglicérides de Cadeia Média (TCMs). As
cervicais de nível VI, aumenta o risco de paresia, com estenoses digestivas são uma outra complicação frequente
recuperação da função em até 6 meses da operação. e de difícil tratamento, com sessões de dilatação endoscó-
Uma complicação rara, porém potencialmente fatal, é a pica. As estenoses de via aérea e sua obstrução podem ser
paralisia bilateral de pregas vocais em posição mediana complicações devastadoras e graves, levando a emergên-
(fechada), decorrente da manipulação ou lesão bilateral cias cirúrgicas. Pacientes submetidos a laringectomia total,
de nervos laríngeos inferiores. Nos casos de paralisia com traqueostoma definitivo maturado na pele anterior do
bilateral, a formação de fenda glótica para a respiração pescoço, podem desenvolver estenoses, geralmente asso-
fica comprometida, podendo levar a insuficiência res- ciadas a tratamento radioterápico e de evolução tardia. A
piratória imediata após a extubação. Relativamente ligadura da jugular interna bilateral e simultaneamente pode
a complicações das cirurgias de glândulas salivares, a evoluir com amaurose, hipertensão intracraniana, além de
lesão do nervo hipoglosso pode levar à hipomotilidade edema facial. Outra complicação importante pós-tratamento
de metade da língua, facilmente identificada ao exame oncológico e radioterápico é a osteonecrose (uso de bisfosfo-
físico. Já o nervo lingual é responsável pela função sen- natos) e a osteorradionecrose, uma espécie de osteomielite
sitiva desta, e sua lesão leva a anestesia e deficiência de por diminuição da oxigenação e suporte vascular ósseo com
propriocepção do órgão. Por sua vez, a lesão do nervo consequentes necrose e infecção. As complicações do tra-
mandibular marginal leva a paresia facial, com desvio da tamento complementar ainda incluem mucosite, monilíase,
rima e consequente assimetria. A lesão do nervo facial, dermatite actínica, neutropenia febril, anemia, cinetose com
ou seu sacrifício devido à invasão tumoral, leva a parali- hiperêmese, agranulocitose e desnutrição.
138 cirurgia de cabeça e pescoço

1. Introdução
Qualquer procedimento cirúrgico apresenta ris-
Quadro clínico
cos, independentemente do tipo de cirurgia. A Hematomas cervicais, mesmo que não sejam
maioria está relacionada ao status do paciente e, de grande volume, podem levar a insuficiência
principalmente, às doenças de base. No caso de respiratória alta de rápida progressão e virtual
cabeça e pescoço, essas complicações se torna- obstrução da luz respiratória.
rão mais potenciais e específicas, por considerar
porte cirúrgico, estruturas envolvidas, cirurgias
longas e oncológicas e perfil do paciente. Algu-
mas particularidades anatômicas, funcionais e de Ter em mente que hematomas cervicais podem
tratamento específicas do território de cabeça e levar a insuficiência respiratória alta de rápida
pescoço merecem destaque, sendo elas o assunto progressão é particularmente importante para
cirurgias que abordam a loja visceral do pescoço
deste capítulo.
com pequenas áreas de descolamento, como ti-
reoidectomias e ressecção de cistos tireoglossos
2. Hematoma cervical (cirurgias de Sistrunk). Nesses casos, mesmo san-
gramentos de volume moderado podem levar a
Complicações hemorrágicas são possíveis em elevações grandes de pressão e restrição ao re-
qualquer sítio cirúrgico; entretanto, em particular torno venoso da laringe.
nas cirurgias de cabeça e pescoço, estamos diante
A partir do momento em que a intubação é rea-
de vasos como a artéria carótida e a veia jugular,
lizada, a emergência respiratória cessa. Infeliz-
e ambas em um compartimento pequeno que não mente, em certas situações, o edema da laringe
comporta muito volume. e a dissecção de planos profundos pelo hema-
Além da habitual revisão de hemostasia rigo- toma são tão grandes que a intubação se torna
rosa com manobras de Valsalva associada (re- muito difícil, sendo vitais a traqueostomia ime-
ver sangramentos venosos, por aumento da diata, a abertura dos pontos e o esvaziamento do
pressão intratorácica e compressão da cava, hematoma.
mantendo as veias túrgidas), os pacientes de-
vem evitar esforços abruptos e atividade física
no pós-operatório precoce, a fim de prevenir
complicações hemorrágicas. Isso se deve ao Tratamento
fato de que esforços abruptos podem levar à Quando o cirurgião depara com um paciente no
súbita elevação de pressão venosa torácica, co-
pós-operatório de cirurgia cervical com hema-
locando em risco a área operatória.
toma e repercussões respiratórias significativas,
a simples abertura da incisão cirúrgica e a eva-
cuação do hematoma formam a conduta inicial
Dica recomendada, devendo ser realizadas mesmo à
beira do leito, caso o trânsito ao centro cirúrgico
Os hematomas cervicais apresentam riscos seja lento e difícil.
específicos e levam a urgências e emergências,
necessitando de imediato reconhecimento e
condutas. Em casos extremos, quando há impossibilidade
de intubação em insuficiência respiratória grave,
deve-se realizar traqueostomia de emergência
para o estabelecimento de via aérea adequada e
Devido ao súbito aumento de pressão nos com- segura. Isso é particularmente mais fácil no pós-
partimentos cervicais, em especial na loja vis- -operatório de tireoidectomias, uma vez que a
ceral do pescoço, hematomas podem levar à traqueia se encontra dissecada e de fácil acesso
diminuição do retorno venoso do complexo la- após a abertura da incisão prévia e da linha
ringotraqueal, com edema significativo, especial- média. Na maior parte dos casos, porém, esse
mente na altura da glote, onde o diâmetro da via procedimento pode ser evitado pelo reconheci-
aérea é menor. mento rápido e manejo adequado dessa compli-
R3
CIRURGIA DE
CABEÇA E
PESCOÇO

QUESTÕES E COMENTÁRIOS
Questões
Cirurgia de Cabeça e Pescoço

Os linfonodos ressecados foram os dos níveis II, III, IV


e VI. Eles estão representados, respectivamente, pelas
Esvaziamentos cervicais
letras:
a) A, C, E e D
2018 - UFAL - CLÍNICA CIRÚRGICA b) B, C, E e A
1. Os gânglios linfáticos cervicais são frequentemente en- c) C, B, D e E
d) E, A, B e C
volvidos por metástases de tumores malignos de cabeça e
pescoço. Uma abordagem sistemática da dissecção do pes- Tenho domínio do assunto Refazer essa questão
coço foi publicada por George Washington Crile e, a partir Reler o comentário Encontrei dificuldade para responder

de então, houve modificação das técnicas de acordo com


2017 - SES-PE - CLÍNICA CIRÚRGICA
o sítio primário da lesão e seu estadiamento. Quanto aos
3. Em relação ao esvaziamento cervical supraomo-hiói-
esvaziamentos cervicais, é correto afirmar que:
deo, quais níveis cervicais devem ser ressecados nesse
a) a radioterapia pré-operatória não altera os índices de
tipo de esvaziamento?
isquemia e necrose de retalhos de pele, principalmen-
a) II, III e IV
te em pacientes que receberam doses acima de 50Gy
b) II, III, IV e V
b) o nervo frênico, cujo trajeto percorre a superfície no
c) I, II, III, IV e V
músculo trapézio, não pode ser visualizado e preser-
d) I, II e III
vado, principalmente nos esvaziamentos completos
e) I, II, III, IV, V e VI
c) a embolia gasosa pode ocorrer em lesões das veias
linguais, que colabam com dificuldade por percorre- Tenho domínio do assunto Refazer essa questão
Reler o comentário Encontrei dificuldade para responder
rem trajetos entre 2 camadas de fáscia cervical
d) a lesão de vasos linfáticos, particularmente o ducto 2016 - HNMD - CLÍNICA CIRÚRGICA
torácico, pode resultar em uma complicação relativa- 4. No estudo da propagação linfática dos tumores de
mente grave cabeça e pescoço, destacam-se as bacias ganglionares
e) as principais complicações decorrentes de lesões ou linfáticas cervicais, que contêm entre 50 e 70 linfonodos
ligaduras arteriais são relativas à veia subclávia por lado e dividem-se em 7 níveis. Identificando esses
Tenho domínio do assunto Refazer essa questão
níveis, assinale a alternativa correta:
Reler o comentário Encontrei dificuldade para responder a) o nível IB contém a glândula submandibular
b) o nível IA é limitado pelos ventres anterior e posterior
2017 - UERJ - CLÍNICA CIRÚRGICA do músculo digástrico e a borda inferior da mandíbula
2. Durante a cirurgia de um paciente de 20 anos com c) o nível III começa na borda superior do nível II
diagnóstico de carcinoma papilífero de tireoide, foram d) os linfonodos do grupo V estão nas regiões paratra-
realizadas tireoidectomia total e linfadenectomia com queais perto da glândula tireoide
ressecção de linfonodos. e) o nível VI corresponde à área do mediastino superior
Observe a Figura a seguir:
Tenho domínio do assunto Refazer essa questão
Reler o comentário Encontrei dificuldade para responder

2012 - FMRP-USP - CLÍNICA CIRÚRGICA


R3 Questões

5. O esvaziamento cervical radical clássico, indicado


para tratar metástases linfáticas de carcinoma espino-
celular de trato aerodigestivo alto:
a) refere-se à retirada de linfonodos presentes nas ca-
deias que compõem os níveis I, II, III, IV e V do pescoço
e deve ser realizado quando existe linfonodo palpável
no pescoço
b) deve ser realizado na presença de linfonodo palpável
no pescoço, >1cm
Comentários
Cirurgia de Cabeça e Pescoço

Esvaziamentos cervicais

Questão 1. Analisando as alternativas:


a) Incorreta. Justamente o contrário, a isquemia do reta-
lho cutâneo é uma das principais complicações do esva-
ziamento cervical de resgate.
b) Incorreta. Faz parte da técnica identificar o frênico
quando da dissecção do nível IV, acima dos escalenos,
para sua preservação.
c) Incorreta. Não é incomum a presença de pequenas
bolhas de ar em veias cervicais durante o esvaziamento
cervical, mas a evolução para embolia gasosa em geral Gabarito = A
não ocorre. Além disso, não há diferença entre as veias
línguas e outras veias cervicais nesta questão, uma vez Questão 5. O esvaziamento radical clássico inclui a re-
que todas elas acabam por sempre estarem entre 2 ca- tirada dos níveis cervicais I, II, III, IV e V e do músculo
madas de fáscia cervical. esternocleidomastóideo (MECM), veia jugular interna e
d) Correta. A complicação decorrente da lesão linfática é nervo espinal acessório.
a fistula linfática, que faz com que o paciente tenha uma Analisando as alternativas:
grave perca proteica se não solucionada efetivamente. a) Faltam VII, MECM e nervo XI.
e) Incorreta. Não há sentido em dizer lesão arterial rela- b) O esvaziamento radical clássico está indicado em ca-
tiva à veia subclávia. sos de linfonodo positivo associado a comprometimento
Gabarito = D extralinfonodal de estruturas não linfáticas.
c) Faltam XI par craniano e MECM.
Questão 2. Questão básica de anatomia cirúrgica cervi- d) Correta.
cal: Gabarito = D
- Nível II: jugulocarotídeo alto (B);
- Nível III: jugulocarotídeo médio (C); Questão 6. Analisando as alternativas:
- Nível IV: jugulocarotídeo baixo (E);
a) A lesão nervosa mais frequente é a do nervo acessório
- Nível VI: central ou recorrencial (A).
XI.
Gabarito = B
b) Correta.
c) A fístula quilosa é de difícil resolução.
Questão 3. O músculo omo-hióideo é o divisor entre os
d) Fístulas salivares não são frequentes.
níveis III e IV do pescoço, de forma que o esvaziamento
Gabarito = B
dito supraomo-hióideo é exatamente o que inclui os ní-
veis acima dele, ou seja, níveis I, II e III.
R3 Comentários

Gabarito = D Questão 7. A origem do laríngeo inferior e superior é a


mesma, nervo vago. O laríngeo superior se divide, dando
Questão 4. O nível I é dividido em A, submentoniano, li- origem ao ramo interno e ao ramo externo. O laríngeo
mitado posteriormente pelo ventre anterior do digástri- inferior é também chamado de laríngeo recorrente. E o
co e medialmente pela linha média, e B, limitado pelos hipoglosso é um par craniano.
ventres anterior e posterior do digástrico, que contém Gabarito = D
a glândula submandibular. O nível III está situado infe-
riormente ao nível II, o nível V é posterior ao esterno- Questão 8. A 1ª estação de drenagem cervical dos tumo-
cleidomastóideo, e o nível VI corresponde ao mediastinal res de tireoide e esôfago são VI e VII preferencialmente e
superior. Os níveis cervicais estão ilustrados na Figura podem drenar adicionalmente para II, III e IV.
a seguir: Gabarito = E

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