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Escola Superior de Geopolítica e Estratégia

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1. Definição corrente - Os dicionários e enciclopédias, em geral, definem o
maquiavelismo como ação astuta; de má fé, trama ardilosa e, inclusive,
ajuntam que se trata da doutrina em que os fins justificam os meios. Não
existe dúvida de que a visão corrente sobre o Maquiavelismo é extremamente
negativa.
2. Maquiavel - Niccoló MachiaveIli - 1469-1527 - nasceu em Florença,
família antiga e de posses, que pertencia ao Partido dos Guelfos (Pontifical).
Surge nos arquivos governamentais em 1494 como copista de Marcello
Virgilio Adriana, professor de literatura grega e latina e Secretário da
República de Florença. Em 1498, ao atingir 29 anos é nomeado Secretário da
Segunda Chancelaria e, posteriormente, elevado ao cargo de Secretario dos
Dez Magistrados da Liberdade e da Paz, isto é, o governo central da República
de Florença. Permanece neste alto cargo durante 14 anos, até ser afastado em
1512, depois da restauração no poder da Casa dos Médicis. Suas funções
incluíam a diplomacia e as embaixadas. Desempenhou vinte e três missões em
outros países, sendo que em 1502 foi enviado para negociar com César
Bórgia, o qual adotou como modelo do governante eficiente e de seu
“Príncipe”. Suas outras funções incluíam redigir e controlar a correspondência
do governo. Bem podemos inferir o grau de poder que exercia, nos bastidores,
e o seu conhecimento das tramas urdidas pelos governos, tanto de Florença
como aqueles com quem mantinha relações diplomáticas e comerciais. Em
1513 foi um dos acusados e torturados quando se descobriu uma conspiração
para matar o cardeal Giovanni de Médici (depois Papa com o título de Leão
X). Nada foi provado e sua pena foi o exílio para uma pequena localidade,
próxima de Florença. O fato de ter sido o braço direito e o autor de discursos e
de muitas das políticas implementadas por Soderini, presidente Perpétuo de
Florença e, talvez, sua remota descendência da nobreza (os Machiavelli
tinham sido, no passado, marqueses), fizeram com que fosse poupado.
Imediatamente, passou a escrever “O Príncipe” dedicado a Lourenço de
Médici, que concluiu em 1513. É importante salientar, entretanto, que este
tratado de política só foi publicado, pela primeira vez em 1532, depois de sua
morte. Maquiavel, nos anos de exílio escreveu outras obras, bem conhecidas,
mas deve ser ressaltado que era, na verdadeira acepção da palavra, um literato.
Em 1521 conseguiu a anulação de seu desterro na localidade de São Casciano
e, logo depois, a encomenda pelo cardeal Giulio de Médici da “História da
República de Florença”, que terminou em 1525. Como escritor, publicou e fez
representar diversas comédias, durante seus anos de exílio, inclusive diante da
corte papal, sendo as mais famosas “A Mandrágora”, descrita como
“licenciosa” e "Belphégor", sendo ambas imitadas pelo célebre La Fontaine,
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então iniciante. O Papa consultou-o, em várias ocasiões, sobre as reformas no
governo de Florença, sobre questões militares e o encarregou de organizar um
exército para a Liga formada contra Carlos V. Tinha também recebido o
encargo de recuperar as fortificações de Florença. Este período é muito
tumultuado. Leão X morre, ascende o cardeal holandês Adriano de Utrech, do
partido de Carlos V, sob o nome de Adriano VI . Em pouco mais de um ano
morre ou é morto, como talvez tenha acontecido com Leão X. Em 1523 sobe
ao trono papal outro Médici, o cardeal Juliano, justamente o que tinha
contratado Maquiavel para escrever a História de Florença. Conhecido e,
talvez, temido pelo seu livro sobre a “Arte da Guerra”, Maquiavel toma os
encargos da administração militar, como consultor, mas morre, dizem que
envenenado, em 1527.
3. Maquiavelismo e realidade política – O ponto central da doutrina de
Maquiavel é, entretanto, o que nos interessa hoje. E por várias razões. Em
primeiro lugar porque Maquiavel coloca, claramente, a questão do realismo
em política, ou seja, não se trata de pregar utopias, por mais bonitas e bem
intencionadas que aparentem ser, mas trata-se de analisar a política, o homem
político e seus fins, sob a luz da razão, da realidade, daquilo que eles
realmente praticam e não daquilo que eles dizem que vão praticar. Acho que
este é o ponto fundamental em Maquiavel e deve ser entendido como uma
colocação da ação política naquilo que é seu fim básico: a luta pelo poder, sua
ampliação, sua manutenção. Maquiavel jamais fala em questões religiosas ou
moralísticas. Maquiavel estabelece uma clara distinção entre a ação política
como era pregada (mas não praticada) pela Igreja e pelos príncipes
consagrados pela autoridade religiosa e a ação política como era realmente
praticada pelos governantes ou pelos aspirantes a governar. Isto é, mentira,
fraude, brutalidade, traição. Neste aspecto, Maquiavel pode ser entendido
como um romântico desiludido, que despertou para a realidade crua da luta de
bastidores pelo poder. Maquiavel descrê da bondade humana, que é pregada
pela Igreja e pelos hipócritas que a rodeiam ou se valem de sua imagem para
praticar patifarias. Mas Maquiavel também acha que é possível aos detentores
do poder ornar-se da virtú como diziam os romano, isto é, uma vez no poder,
os homens podem deixar de ser políticos e tornar-se estadistas e praticar a arte
do governar de acordo com a realidade de seu país, de seu tempo e de seus
costumes. Assim, a visão de Maquiavel não é nem positiva nem negativa. Ela
é essencialmente realista. Existem homens bons na política, assim como
existem os mal-intencionados. Para favorecer a uns e cercear os outros, e
necessário ao Governo uma constituição, que ele diz ser a melhor a
republicana, entre as que conhece. Maquiavel despreza e ataca, diretamente, o
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poder religioso ou todo o poder que procura derivar sua legitimidade da
religião e dos ensinamentos morais e éticos de fundo místico. Maquiavel só
concorda na utilização da religião como um fator estabilizador da ordem
pública. Para ele, a religião é um instrumento do poder, nas mãos dos bons
governantes que, entretanto, não devem ser crentes nem se guiar pelos
princípios religiosos. A Igreja de Roma, diz Maquiavel, foi a corruptora da
Itália e fez dos italianos “cattivi”, o que quer dizer, quase escravos, seres
apodrecidos. Ele diz mais: se o papado for transferido para a Suíça, também
dentro de duas gerações os suíços seriam “tão podres quanto os italianos”.
Maquiavel é muito duro em sua apreciação da natureza humana, hoje
diríamos, das massas. Efetivamente, ele diz: “há três espécies de cabeças, uma
que entende as coisas por si mesma, outra que sabe discernir o que os outros
entendem, e, finalmente, uma que não entende nem por si, nem sabe ajuizar do
trabalho dos outros. A primeira é excelente, a segunda muito boa e a terceira
inútil”. Antes, Maquiavel já tinha assegurado que “nas ações de todos os
homens, o que importa é o êxito, bom ou mau. Procure, pois, um príncipe,
vencer e conservar o Estado. Os meios que empregar serão sempre
considerados honrosos e louvados por todos, porque o vulgo é levado pelas
aparências e pelos resultados dos fatos consumados, e o mundo é constituído
pelo vulgo”.
4 - O problema da Igreja em Maquiavel - Maquiavel viu, com clareza, que
o seu tempo tinha superado o suposto “Estado Universal”, em que o Papa era
um árbitro internacional. Maquiavel sentiu, igualmente que a série de
descobertas geográficas, com a abertura do caminho para as Índias e a
descoberta da América, haviam criado um mercado mundial. A única forma
de resistir a estas inovações e ao nascimento do capitalismo mundial (ou
globalizado, como dizemos hoje) era reforçando os nascentes Estados
Nacionais. Neste sentido, a Itália era um grande perdedor e a causa desta
perdição era a Igreja ou, mais precisamente, o poder temporal do papado, que
contribuía para manter a Itália dividida e objeto de intervenções, em favor ou
contra o papa, pelas potências estrangeiras, em especial o Império, a Franca e
a Espanha. Assim, o objetivo das ações políticas que Maquiavel desejava era
que os líderes italianos empreendessem lutar contra o poderio do Vaticano,
eliminar os Estados Papais e unificar a Itália, libertando-a, no processo, do que
chama de opressão dos bárbaros. Efetivamente, o livro XXVI e final de “O
Príncipe” é uma “exortação ao Príncipe para livrar a Itália das mãos dos
bárbaros”. Maquiavel acha que o salvador e unificador da Itália seria Lorenzo
de Médici ou sua casa. E afirma: “não se deve, portanto, deixar passar esta
ocasião a fim de fazer com que a Itália depois de tanto tempo, encontre um
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redentor... já está fedendo, para todos, este domínio dos bárbaros. Tome, pois,
a vossa ilustre casa esta tarefa...”
A unificação da Itália como estado nacional e a supressão do poder temporal
da Igreja é o fator decisivo, o ponto central da pregação de Maquiavel e é por
isto que ele é tão combatido, mal-interpretado e objeto de uma campanha de
difamação. Não foi Maquiavel que inventou as máximas da hipocrisia, do
fingimento e da falsidade, na política e no governo. Quem a praticava era a
Igreja, eram os cardeais, era o papa. Todos escandalizavam a Itália e a Europa.
Eram cínicos, rapaces, torturadores e envenenadores. Foi a igreja que criou a
Inquisição e a tortura sistemática, junto com a censura e o estado policial. E
era a Igreja que pregava, no púlpito, a bondade, a retidão, a moral, a ética,
apenas para, na prática, renegar tudo isto, cotidianamente. Maquiavel, e eis
sua grandeza, e perenidade, foi capaz de, pela primeira vez, desvendar como,
na realidade, operavam as engrenagens do poder e, em especial, do poder
amparado nos dogmas religiosos. E colocando esta realidade ao alcance de
todos contribuiu, poderosamente, não só para solapar e fazer definhar o
poderio religioso; mas também o absolutismo. Maquiavel era, em sua luta, um
defensor da república, das eleições e dizia, claramente: os mandatos políticos
devem ser curtos e alternados. Se ele pregou a necessidade do Príncipe, foi
para realizar a tarefa da unificação da Itália. Depois, era sua idéia, devia-se
passar ao governo na forma de república, mas devia-se combater para evitar
que a república, por um golpe de Estado, se transformasse numa tirania.
5 - A atualidade de Maquiavel - Naturalmente, devemos perguntar o que
tem isto a ver com a nossa realidade, com os dias que correm. Tem tudo. O
recente chamado "Fórum Social Mundial", que para aqui trouxe os mais
atrasados pensadores de uma chamada esquerda, que, na realidade é um novo
direitismo (fascismo) nos coloca, novamente, as questões que Maquiavel
enfrentou e denunciou, em seu tempo. Como todos sabem e é notório, o
objetivo dos assim chamados esquerdistas é criar um outro mando ou uma
outra realidade é possível... Que realidade é esta? É a utopia, um estado ideal,
baseado em crenças e dogmas de fundo religioso, ético, moralístico. Não
temos nada contra a ética. Pelo contrário. Mas somos completamente
contrários ao uso de ética como arma política, em especial pelos que não tem
qualquer autoridade para utilizar esta mesma ética. Na verdade, todos
sabemos que para fazer valer este outro mundo utópico, só com uma guerra
civil, com matança, tortura, censura, estado policial, campos de concentração.
Seria válido, portanto, atacar o atual estado democrático e laico, em nome de
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ideais "morais" ou "éticos", baseados nos dogmas da religião, em especial a


religião cristã? Eis a nossa dúvida. Eis a atualidade de Maquiavel e dos
Maquiavelistas. E aqui entramos em outro aspecto da questão.
6- Maquiavelismo e Maquiavelistas - Existe uma distinção, histórica e
filosófica entre o Maquiavelismo, que é uma doutrina, ou antes, uma maneira
de agir de má fé e que está no cerne da nossa atual dita esquerda. Pregam a
ética, a moral, etc, mas agem de forma contrária às Leis, à Constituição e ao
direito dos outros. São agressivos e mal educados. Donos da verdade,
dogmáticos. Recendem a ódios. Mas querem nos convencer que, com tais
ingredientes, irão fundar um novo mundo justo e bom. É muita ingenuidade
acreditar em tal. Mas e os Maquiavelistas, o que pensam? Estes são os
verdadeiros discípulos de Maquiavel, como dizia o professor Tanges
Burnham, em seu conhecido ensaio sobre este polêmico assunto. Burnham,
escrevendo ainda durante a 2ª Guerra Mundial, discorria sobre a natureza dos
tempos presentes e defendia o que ele chama de princípios de Maquiavel,
sendo que a busca de liberdade é o principio básico. Para Burnham, para bem
conduzir os negócios políticos é preciso:
1º - a ciência política deve ser objetiva e não baseada em dogmas;
2° - a temática principal que a ciência política deve observar é a luta
pelo poder social de forma explícita ou implícita; Burnham chama aqui
a atenção para um ponto de inegável atualidade: “os contrários aos
princípios de Maquiavel sustentam que o pensamento político se ocupa
do bem estar geral, o bem comum e outras entidades (metafísicas)
inventadas pelos teóricos."
SOBRE TAL PONTO, quero inserir, aqui, uma observação recente do prof.
Eiiti Sato, coordenador ele Estudos Estratégicos da Universidade de Brasília
no ensaio "Inserção Internacional do Brasil: potenciais e limitações". Diz o
prof. Sato: "a considerável complexidade alcançada não apenas pela
economia, mas pelo próprio perfil sócio-político do país como um todo, torna
inviável a busca de objetivos e metas que satisfaçam, simultaneamente, os
diferentes segmentos da sociedade. Assim, a construção do utópico “outro
mundo é possível”, mesmo no micro-cosmos de nosso país é uma
inviabilidade e só poderia se tornar possível pela força. Maquiavel já dizia
que “os mais desprezíveis dentre os homens são aqueles que destroem uma

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ordem constitucional”, no caso para censurar Júlio César e justificar sua


morte. Mas, voltemos a Burnham:
3º - os Maquiavelistas sustentam que não é possível descobrir as
verdadeiras leis da vida política mediante a análise do sentido literal
das palavras e crenças dos atores políticos. As palavras, programas,
declarações, etc, são isto mesmo, retórica.
4º - os Maquiavelistas defendem que a ação não lógica, o instinto, os
impulsos e os interesses próprios são os elementos chaves na vida
política dos indivíduos, dos grupos e das sociedades. A ação racional
desempenha um papel secundário nas transformações políticas e
sociais. Daí podermos entender a facilidade com que o discurso
mentiroso, falso e mal-intencionado logra tanto sucesso. Na verdade ele
atende aos interesses particulares ou contrariados de uma enorme gama
da população. Esta a raiz do êxito de um Mussolini ou de um Hitler ou,
ainda, de um Stálin.
5 - os Maquiavelistas dizem que para bem poder compreender o
processo social a divisão social mais importante que deve ser estudada e
perfeitamente reconhecida é a existência de uma elite e de uma
não-elite, ou seja, deve-se reconhecer que sempre existirão uma classe
governante e uma governada. O contrário é o mito da "participação
popular", do "governar juntos" e outras baboseiras, tão populares, no
entanto, por atingirem a vaidades daquelas pessoas que Maquiavel
chamava de “o vulgo” e cujas cabeças, como ele dizia, eram inúteis. Os
chamados esquerdistas persistem e são acreditados, apesar de todo o
conhecimento histórico em contrário, em dizer que nos antigos países
comunistas não existia uma nova classe exploradora que governava e
tirava vantagens, a custa dos governados.
6º - os Maquiavelistas defendem e são muito mal vistos por isso, que só
se entende o processo histórico-político pelo estudo das elites, de sua
composição, de sua estrutura e articulação e, sobretudo, da forma como
estas elites se relacionam com as não-elites. Citando Mosca, Burnham
frisa: “uma sociedade é a sociedade de sua classe governante... a força
ou debilidade de uma nação, sua cultura, sua capacidade de perdurar,
sua prosperidade e sua decadência dependem, em primeiro lugar, da
qualidade de sua classe governante. O método mais adequado para
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compreender uma nação e prever o que sucederá com ela, exige uma
análise de sua classe governante.”
ESTA COLOCAÇÃO é básica para nós, mas deve ser complementada pelas
seguintes observações, que Burnham tira de Mosca: "dentro da classe
governante é possível distinguir dois estratos; um grupo muito pequeno de
dirigentes máximos e um grupo muito mais numeroso de figuras secundárias
que se constitui uma espécie de classe média, que não sendo tão proeminentes
como os anteriores, são os dirigentes ativos da vida da comunidade em seu dia
a dia”. E ressalta: “sem os indivíduos pertencentes a este segundo tipo
nenhuma forma de organização política seria possível. O estrato mais alto não
chega para dirigir as atividades das massas. Portanto, a estabilidade de
qualquer organismo político depende da capacidade moral e intelectual e da
atividade deste segundo estrato. Conseqüentemente, as deficiências
intelectuais ou morais deste segundo estrato representam para a estrutura
política um perigo muito mais grave e muito mais difícil de contornar que
estas mesmas deficiências nas poucas pessoas do tipo I , que controlam o
funcionamento da máquina do Estado.”
7 - os Maquiavelistas sustentam, cruamente, que o primeiro objetivo de
toda a elite ou classe governante é manter seu próprio poder e
privilégios. Sustentam, ainda, que é falso o que os membros de uma
elite política desejam, unicamente e acima de tudo, servir à
comunidade. As elites tratam de seus interesses e fazem, com maior ou
menor habilidade, eles serem os mesmos que os interesses públicos.
Daí a impossibilidade política dos partidos ditos de esquerda, que
pregam interesses contrários, uma vez, vendo-se no governo, poderem
cumprir suas metas de propaganda eleitoral.
8° - os Maquiavelistas sustentam que a regra básica do poder se exerce
pelo engano ou pela força. A força pode estar oculta, a maior parte do
tempo, mas existe e pode ser empregada se necessário. Já o engano ou
fraude, pode não ser consciente, ainda mais em tipos exaltados, que se
julgam baseados em razões sobrenaturais para impor a moral ou a
justiça.
9° - os Maquiavelistas sustentam que toda a estrutura social esta
integrada e é sustentada por uma fórmula política, a que pode se
associar uma religião, uma ideologia ou um mito, que seja
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pacificamente aceito como verdadeiro pela maioria. Mas tais mitos,


ideologias ou religiões não são ''verdades'', como pregam os fanáticos,
são crenças partilhadas por tradição e educação.
CABE OBSERVAR que Raphael Patai em seu "O mito e o homem moderno",
enfatizava que uma das fraquezas da democracia é ela não contar com este
mito, não ser uma religião nem uma ideologia e daí sua fraqueza e certa falta
de funcionalidade, que abre o flanco para ataques de ideologias totalitárias.
10 - os ideais e regras da elite coincidem, às vezes mais, às vezes
menos, com os integrantes da não-elite. Burnham detalha, aqui, que
estas diferenças serão vencidas na medida em que: a) aumentar a força
da comunidade em relação a outras comunidades (aumento do poder
nacional no quadro internacional); b) o nível de civilização alcançado
pela comunidade (o Brasil) e Burnham define isto pelos seguintes
parâmetros - a capacidade de deixar circular uma variedade sempre
maior de interesses criadores e alcançar um grande progresso material e
cultural; c) manter a liberdade, ou seja, as garantias que possuem os
indivíduos contra o exercício do poder arbitrário e irresponsável.
11º - em toda a elite atuam sempre duas tendências opostas: uma que
tende a conservar as posições adquiridas por seus membros e passá-las
aos descendentes, ao mesmo tempo em que procura impedir a ascensão
de novos membros de fora da elite. Ao mesmo tempo, existe uma
tendência democrática, para receber novos membros nesta mesma elite.
Ou seja, a elite não é fechada nem aberta, mas permeável.
12º - desta forma, ao longo do tempo, as elites se transformam, pela
chegada de novos elementos, disto resultando que nenhuma estrutura
social é permanente e, assim, nenhuma utopia estática pode
converter-se em realidade. Uma sociedade “sem classes” e sem
possibilidades de mudanças ou ascensões (e declínios) seria uma
sociedade morta, pela própria ausência da circulação entre as elites e as
não-elites;
13° - podem existir transformações muito rápidas na composição e
estrutura das elites, por um processo revolucionário, em que uma
antielite elimina a elite dominante e assume seu papel e o poder. Isto
pode ser obtido pela fraude, mas mais comumente pela espada.

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Considerações finais - Esta rápida visão do Maquiavelismo destina-se a fazer


circular, entre nós, idéias políticas que são importantes. Estamos, como no
tempo de Maquiavel, diante de propostas utópicas, que escondem interesses
muita particulares e essencialmente antidemocráticos. Assim como no tempo
de Maquiavel, a Igreja católica assoma, hoje, como grande força
desestabilizadora no Brasil e em outros países mais atrasados. A recente
matéria em Carta Capital (14/02/2001 ,p.48) sobre o futuro do papado mostra
que o Vaticano, depois da derrota do chamado "comunismo ateu", volta-se
contra o "capitalismo ateu". Hoje, trava-se uma luta surda na igreja entre duas
correntes: uma que prega irresponsavelmente o cancelamento das dívidas
externas e pontifica sobre questões econômico-sociais, que pretende resolver
com passes de mágica. Outra corrente prega a moralidade absoluta contra o
aborto, contra a pílula, contra o divórcio, pelo ensino religioso contra o ensino
cientifico. Apenas uma minoria acha que é preciso adequar a religião ao
mundo atual e esta, certamente, não será vencedora. A Igreja reacionária,
sonha voltar aos tempos pré-Maquiavel, em que imperava sua visão, detentora
do "estado universal", que se baseava nas falsificações das doações de
Constantino e no mito de ser o papa o representante de um deus na Terra. Se
tais visões, aliadas aos chamados esquerdistas, conseguirem uma força
política em nível nacional, um grande choque se dará no Brasil, pois a
tendência à integração internacional e a necessidade de utilizar ao máximo a
racionalidade vão ser posta em cheque. Disto pode resultar um atraso mortal
em nossa modernização.

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