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Alimentação Agroecológica: Por que? Como? Para Quem?


Denise Bloise*

A escolha da alimentação envolve uma postura política. Como o alimento pode


alavancar a mudança de consciência e de atitude? Através de uma discussão
política sobre esse alimento, como ele foi produzido, em que condições, quem o
produziu, com que finalidade, que interesses envolvem a comercialização desse
alimento. E como essa discussão pode ser feita? Através de um trabalho de
educação ambiental seja formal, não-formal ou informal. A questão é como o
trabalho vai ser feito, isso é o que vai determinar seu viés crítico e transformador.
O pensamento crítico acredita na transformação social pelo questionamento
dos meios de produção capitalista e na reorganização da base civilizacional, da
estrutura política, econômica, social e cultural como solução.
Alimentar-se com produtos agroecológicos é ser contra a alimentação
artificial, repleta de aditivos químicos, vendida pelas grandes corporações; é ser
contra a globalização alienante imposta pelas multinacionais; é ser contra a
indústria do “fast food” e a favor do “slow food”.Cabe aqui ressaltar a importância
do movimento conhecido como “Slow Food”, definido por seu criador, Carlo Petrini,
como um movimento eco-gastronômico, que valoriza os prazeres tradicionais da boa
mesa, em oposição à velocidade louca da vida moderna, em que tudo é muito rápido
– “fast life”= “fast food” – um modo de vida e de produção da comida que leva a
uma homogeinização do sabor e erosão da cultura. Compreender o “slow food” é ter
consciência crítica. Os sabores resgatados pelo “slow food” estão intimamente
ligados ao trabalho das pessoas: fazendeiros e pequenos agricultores que, com seu
conhecimento ancestral são os verdadeiros guardiões da biodiversidade e da terra.
Foi estabelecida a conexão entre a agricultura sustentável e a gastronomia,
segundo Petrini em entrevista dada à Ecololgist On line. Os seguidores do “slow
food” acreditam que o esforço para criar um mundo melhor começa com o processo
através do qual a pessoa produz a sua comida, o seu alimento e termina com a
maneira como a pessoa consome essa comida. Pertinente aqui a correlação com a
MacDonaldização da educação apontada por Gentili(2007).
Importante lembrar da grande ecologista indiana Vandana Shiva, que luta
ativa e firmemente contra a globalização da agricultura, que está aumentado a má
nutrição no terceiro mundo em virtude do desvio de ecossistemas férteis para o
luxo da exportação de sementes e da destruição dos mercados domésticos, em
prol do subsídio do mercado internacional. A globalização da agricultura está
destruindo a cultura ancestral das populações, ao introduzir as sementes
transgênicas, reduzindo a riqueza de sua variedade tradicional. Porto
Gonçalves(2008) afirma que o verdadeiro notório saber é o dos grupos populares,
nativos. A chamada Revolução Verde provocou uma erosão genética massiva nos
campos das fazendas e no conhecimento, aumentando em larga escala a poluição
ambiental através do uso de agrotóxicos e com desperdício da água.
O filósofo francês Félix Guatarri, em seu livro “As Três Ecologias”(1990),
fala interconexão entre ecologia mental (o indivíduo na relação consigo próprio),
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ecologia social (o indivíduo na relação com os outros seres humanos) e ecologia


natural ou ambiental ( o indivíduo na relação com os demais seres da natureza).
A questão da produção agrícola dos alimentos que consumimos é uma
questão bastante séria, que preocupa os ecologistas, pois vai desde a utilização de
adubos químicos e agrotóxicos, até a prática de monoculturas e manipulação
genética das sementes, passando por outras práticas igualmente danosas e
autoritárias. Partindo de uma visão holística de mundo e tendo em vista uma
sociedade sustentável, nos deparamos com a agricultura orgânica, ou seja, com
práticas agrícolas de produção de alimentos que utilizam adubos orgânicos (nenhum
veneno, agrotóxico ou produto químico ou artificial).
Nestas práticas a observação cuidadosa e atenta da Natureza é
fundamental, para que ela nos diga, então como agir. HIROSHI SEÓ (1989) diz que
o plantar deve voltar a ser como o nosso próprio respirar e chama essa agricultura
de Agricultura Zen, explicando que o significado da palavra Zen está ligado ao da
palavraMeditação,ouseja,parar de pensar, penetrando na essência.
A Agricultura Zen envolve a percepção dos desejos da Natureza em relação
à produção de alimentos e a desarmonia surge quando essa lei não é observada e
conseqüentemente surgem as "pragas e doenças". Um grande agricultor do Espírito
Santo, Nasser Youssuf, implantou um sistema de hortas comunitárias orgânicas, diz
que não existe praga, mas sim inseto com fome. Existe um grande mecanismo de
seleção natural que destina um tipo de predador para cada espécie de ser vivo,
incluindo o homem. Chama atenção para o fato de nas cidades grandes, onde existe
grande concentração de gente, aparecerem muitas doenças incuráveis e mortes
violentas.
Importantíssimo lembrar aqui o trabalho de Fukoka, agricultor japonês, que
trabalha com nesse caminho há muito tempo.
A alimentação da humanidade é uma questão essencialmente política, diz
Hiroshi Seó (1989), que denuncia a manipulação existente por trás da divulgação
das pseudo-vantagens da agroindústria, que está, na verdade, a serviço do capital e
do lucro. A agricultura de exportação e suas monoculturas faz com que os países do
3º Mundo plantem os alimentos que os países do mundo dito desenvolvimento vão
comer e morram de fome. E afirma "A ecologia é inexorável. É como a nossa
consciência: não deixa passar nada".

*Denise Bloise é Pesquisadora, Educadora Ambiental e Líder de Danças da Paz Universal.


Dedica-se ao estudo da “Educação Ambiental através do Alimento e das Danças” desde
1985. É doutoranda do Programa EICOS (Psicossociologia de Comunidades e Ecologia
Social) do Instituto de Psicologia da UFRJ.
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