Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
R$ 15.000,00*
*Valor bruto de IR (25%), conforme legislação vigente. Promoção vinculada a título de capitalização da
modalidade incentivo emitido por Sul América Capitalização S.A - Sulacap, CNPJ nº03.558.096/0001-04 e
Processo SUSEP nº 15414.901437/2013-09. Regulamento completo no site www.selecoes.com.br
Sumário JULHO 2016
ARTIGOS
P. | 64
2 | 05•2016
Aprovado pelos leitores em pesquisa prévia à publicação.
07•2016 | 9
...E VERSO
Natal em julho – onde se vê isso?
Numa província no leste da China!
O verão na cidade de Yiwu signi-
fica o pico da produção de decora-
ções natalinas – e isso apesar de
a maioria das pessoas que moram
ali nem conhecer o feriado.
Embora neve, pequenos elfos
e um homem gorducho de barba
branca só sejam encontrados ali
em plástico, cerca de 60% das
decorações de Natal no mundo
todo são produzidas e exportadas
dali, todos os anos.
10 | 07•2016
Interaja
CARTAS DOS LEITORES
12 | 07•2016
Você em Seleções
Vida de pedreiro não é
CONTE UMA HISTÓRIA ENGRAÇADA moleza, não...
E GANHE ATÉ R$ 400* É sempre trabalhando
pesado e dando
Sua história real pode ser publicada em Flagrantes da o máximo de si.
vida real (experiências do dia a dia que revelem a na- Ainda bem que
tureza humana), Ossos do ofício (humor no trabalho), o bom humor
Piadas de caserna (humor na carreira militar) e Essas
crianças... (o mundo do ponto de vista delas). Piadas
ajuda a tornar mais
podem ser publicadas em Rir é o melhor remédio. leve a maioria
das situações pelas
AS REGRAS quais passamos,
Por favor, inclua nome, endereço e telefone em suas não é mesmo?
contribuições. Todo material previamente publicado Quando três pedreiros
deve conter nome da fonte, data de publicação, nú-
entram de férias e se
mero da página, endereço na Internet ou outra forma
de identificação. Se não houver identificação de fonte,
desligam temporaria-
consideraremos o item como original, e atribuiremos mente do trabalho,
a garantia e responsabilidade de autor a quem o nada pode dar errado!
enviou. Itens originais, se forem escolhidos e pagos, Ou será que pode?
passam a ter todos os direitos de uso revertidos para Confira na piada
Seleções. As contribuições poderão ser editadas, e enviada pelo leitor
não haverá notificação do seu recebimento ou devo-
João José
lução. Podemos publicar sua contribuição em qual-
quer departamento da revista ou em qualquer outro
Cavalcante Leal,
produto do Reader’s Digest. Se recebermos mais de de Fortaleza (CE),
uma cópia da mesma contribuição ou contribuições na seção Rir é o
semelhantes, pagaremos apenas para a que for esco- melhor remédio,
lhida. O pagamento será feito após a publicação. na página 126.
07•2016 | 13
SAÚDE
A cirurgia que
pode provocar AVCs
Conheça os
fatos antes de
entrar na faca
para limpar
as carótidas
POR L AU R A B E I L
Caption-black
ducita sint. Ga.
Miliqui suntemp
orpo renihit
labor aut vendit
DURANTE UM EXAME de rotina ralisada, por causa de um acidente
quando fez 60 anos, Martha Bowes vascular cerebral (AVC) – o problema
descobriu que suas carótidas, as que a cirurgia deveria prevenir.
grandes artérias do pescoço que
levam sangue ao cérebro, estavam A ascensão de um risco
obstruídas por placas. Como se sen- Hoje Martha diz que, se conhecesse
tia bem, ela não se preocupou muito, as opções, pensaria duas vezes antes
até ir ao consultório de um cirurgião. de se submeter à cirurgia. Estima-se
O médico fizera um procedimento que 4% a 5% dos adultos de meia-
em seu marido e o casal voltava para -idade tenham alguma obstrução nas
o retorno. Enquanto juntavam suas carótidas, a chamada estenose. Todo
coisas, o médico perguntou a Martha ano, cerca de 100 mil a 140 mil pes-
como iam as carótidas (preocupado, soas fazem a mesma cirurgia para
o marido mencionara a obstrução). limpar as carótidas.
Sem dúvida ela precisava de uma Em outras, um tubinho de tela cha-
cirurgia, disse o médico. Com base mado stent é enfiado em uma das arté-
na descrição que ele fez, Martha rias para abri-la. Mas, ao contrário do
ficou com a impressão de que seria cirurgião que operou Martha, outros
rápido e simples como uma extração especialistas acreditam que provavel-
de amígdalas. “Fazemos uma incisão mente o risco de AVC era tão pequeno
no pescoço e limpamos a placa”, que ela ficaria bem se tomasse medi-
disse ele, segundo ela recorda. Ela camentos para baixar o colesterol e fi-
hesitou, ele insistiu. “Temos de fazer zesse uma alimentação saudável.
isso imediatamente, senão você terá As doenças cerebrovasculares, entre
um AVC”, disse ele. elas o AVC, são a causa mais comuns
Ela marcou a data mais próxima de morte e incapacidade física Brasil.
possível. No final daquela semana, Mas apenas cerca de 20% dos AVCs se
ILUSTRADO POR BRYA N CHRI STIE DESIGN
07•2016 | 17
Limpar a carótida obstruída pode A cirurgia ajuda ou não?
ser uma solução em busca de um pro- Em 2014, a Força-Tarefa de Serviços
blema. Durante o procedimento ou Preventivos dos EUA se declarou con-
depois dele, pedacinhos da placa po- trária a incluir a carótida nos exames
dem se soltar e se abrigar nos peque- de rotina. Mesmo assim, esses exames
nos vasos do cérebro, provocando o ainda são feitos com frequência. Um
AVC que se queria impedir. A probabi- relatório recente da revista JAMA In-
lidade depende de muitas variáveis, ternal Medicine citou o exame de ca-
inclusive da habilidade do cirurgião. rótida como um dos procedimentos
Um estudo de 2015 na revista Journal realizados com mais exagero em 2014.
of the American College Embora, intuitiva-
of Cardiology comparou mente, remover as pla-
o resultado de cirurgias Neurologistas e cas faça sentido, nem
para instalação de stents sempre os estudos cor-
na carótida feitas em
especialistas em roboram essa ideia.
188 hospitais. O risco AVCs se Dois estudos impor-
de AVC depois do pro- entusiasmam tantes que compararam
cedimento variou de cirurgias como a de
0% a quase 19%.
menos com Martha com o trata-
Para alguns especia- intervenções que mento clínico foram
listas, os medicamentos os cirurgiões. publicados em 1995 e
que baixam o colesterol 2010. O risco de AVC
e controlam o peso e a baixou cerca de 30%
pressão arterial são tão potentes que, depois da cirurgia, o que seria uma vi-
se o paciente não tiver sintomas, é me- tória decisiva da equipe cirúrgica se
lhor deixar as carótidas em paz. No en- não fosse o seguinte: o uso das estati-
tanto, quando o paciente tem nas, medicamentos potentes para bai-
sintomas, a maioria dos médicos xar o colesterol, só se tornou comum
aconselha a intervenção. “Esse é o de- depois que a pesquisa estava em anda-
bate mais acirrado sobre doenças car- mento, como explica o Dr. David
diovasculares”, diz o Dr. Christopher Spence, neurologista da Universidade
White, diretor do Instituto Cardiovas- do Oeste de Ontário. Os pacientes des-
cular Ochsner, em Nova Orleans. Um ses importantes estudos tomavam
encontro profissional de médicos teve principalmente anticoagulantes. Isso
uma sessão intitulada “Imprudência, tornou os resultados desatualizados.
negligência ou crime?” para descrever Também existe um debate sobre
a popularidade dos stents de carótida. qual procedimento – stents ou cirurgia
18 | 07•2016
– é melhor; outros estudos ainda mos- O que os pacientes
traram interpretações conflitantes. deveriam saber
Num artigo de 2009 da revista Stroke, a Não façam exames das carótidas sem
neurologista australiana Dra. Anne Ab- razão. Se o médico encontrar placas,
bott relatou que, quando há mudanças adote o gerenciamento clínico – esta-
do estilo de vida (deixar de fumar, con- tinas, exercícios, emagrecimento e
trolar o peso e baixar o colesterol e a controle da pressão arterial – mesmo
pressão), o benefício contra os AVCs que vá fazer o procedimento, aconse-
excede o histórico da cirurgia e dos lha o Dr. James Meschia, neurologista
stents. Mas seu resultado não obteve da Clínica Mayo e principal pesquisa-
concordância universal. O Dr. Richard dor do novo estudo em andamento.
Cambria, chefe de Cirurgia Vascular Se estiver pensando no procedi-
do Hospital Geral de Massachusetts, mento, peça uma segunda ou terceira
ressalta limitações das conclusões da opinião a especialistas diferentes. Um
Dra. Abbott. Ele diz que seus dados estudo constatou que os neurologis-
mostram que, em cerca de 40% dos tas e especialistas em AVCs se entu-
pacientes em terapia clínica, inclusive siasmam menos com as intervenções
com estatinas, as obstruções pioraram. do que os cardiologistas e cirurgiões.
Em dezembro de 2014, a Clínica Considere o modo como você se
Mayo iniciou um estudo que pode preocupa. “Quando contamos a al-
resolver a questão. Nele, estão envol- guns pacientes que há uma obstrução,
vidas 2.500 pessoas, direcionadas arruinamos sua vida”, diz o Dr. White,
aleatoriamente para cirurgia, coloca- do Instituto Ochsner. “Eles passam os
ção de stents ou tratamento clínico dias com medo de um AVC. Mas ou-
apenas. O resultado só estará dispo- tras pessoas dizem: ‘Sabe, doutor, não
nível por volta de 2020. Enquanto está me incomodando. Ligarei quando
isso, os pesquisadores trabalham tiver um problema.’ Para estes, a tera-
para determinar o que faz algumas pia clínica é melhor.”
obstruções terem mais probabilidade E é por isso que Martha Bowes
do que outras de causar AVCs. Há in- gostaria de ter podido escolher.
dícios de que as placas envoltas em Quinze anos depois do AVC, ela con-
revestimentos espessos e fibrosos segue andar com tala e bengala, mas
têm menos probabilidade de provo- o braço e a mão esquerdos estão pa-
car AVCs, segundo o Dr. David Tha- ralisados. Ela não condena ninguém
ler, presidente do Departamento de que prefira a cirurgia, mas aconselha:
Neurologia da Escola de Medicina “Entenda as alternativas. Não me
da Universidade Tufts. deram nenhuma.”
07•2016 | 19
SAÚDE
Problemas
da urina
P OR SAM A N T H A R I D E OUT
20 | 07•2016
infecção urinária afetar o paciente; não sejam raras, a ingestão de bas-
caso contrário, ele deve ser deixado tante líquido pode reduzir as repeti-
em paz, porque ministrar antibióticos ções. Um remédio caseiro popular é
em excesso fornece os o suco de cranberry
80%
supermicróbios resis- ou oxicoco: as fruti-
tentes a medicamen- nhas contêm proan-
tos. (Há exceções tocianidinas tipo A,
a 90%
quando se teme que o flavonoides que difi-
paciente desenvolva cultam a aderência
infecção renal ou ou- das bactérias à pa-
tras complicações.) rede da bexiga. Ape-
Às vezes, as infec- sar disso, os indícios
das infecções urinárias se
ções assintomáticas devem à bactéria E. coli. As de seu impacto no
provocam confusão cepas dessa espécie resis- tratamento ou na
mental e delírios. Se tente a antibióticos estão au- prevenção de infec-
esses sintomas surgi- mentando no mundo inteiro. ções não são conclu-
rem de repente, con- sivos. Não faz mal
sulte o médico, que pode descobrir tomar o suco, mas talvez ele não
se a origem é uma infecção urinária. faça mais efeito do que qualquer
Embora as infecções recorrentes outro líquido.
Notícias do mundo
da medicina
Doenças graves costumam sação de isolamento e os ataques de
provocar trauma fúria. Além disso, 40% das pacientes
Um ano depois do diagnóstico, mais que já tinham passado por algum
da metade das pacientes com câncer trauma – um assalto, digamos – clas-
de mama apresentam um ou mais sificaram o câncer de mama como
sintomas de transtorno de estresse mais perturbador. Esses achados
© I STOCK PHOTO
07•2016 | 21
SELEÇÕES
22 | 07•2016
CASA
Até a última
gota Suba aqui! Ainda
tem muito!
POR K E L SE Y K LOSS
Hummm!
Loção: AQUEÇA Deixe o recipiente
fechado numa vasilha com água
quente por alguns minutos para
aquecer e liquefazer o restinho.
Manteiga de amendoim:
MISTURE Ponha na embalagem par-
tes iguais de aveia em flocos e leite. Tá bom!
Acrescente ¼ de xícara de iogurte
grego, 1/2 banana picada, canela e Ei, traz um
açúcar a gosto. Sacuda e deixe na pouco de
geladeira durante a noite. Pela ma- geleia!
nhã, deleite-se.
24 | 07•2016
pulseira discreta? E assim nasceu a
Atar Band, na qual o usuário insere
créditos em uma conta associada à
ATAR e pronto. Basta aproximar a
pulseira a uma máquina de débito e
o pagamento é feito. Sem senha e
sem complicações. Em caso de perda
ou roubo, é possível bloquear a pul-
seira por um aplicativo, onde tam-
bém ficam registrados todos os
gastos e o saldo disponível. Mike, Orlando e Luiz Fernando
conquistaram oito prêmios com a ATAR.
O que pode parecer futurístico é,
na verdade, uma maneira relativa- “No processo de pesquisa, imagi-
mente simples de aproveitar um sis- namos quantos pagamentos um mo-
tema já disponível em larga escala no rador de grandes centros faz todos os
Brasil. Mais de 85% das máquinas de dias. A pulseira que criamos tem o
débito no país funcionam utilizando propósito de ser um meio de paga-
tecnologia de comunicação por mento rápido, conveniente e, acima
campo próximo (NFC, na sigla em de tudo, seguro, pois não será mais
inglês). E o futuro é promissor: se- preciso sacar a carteira ou tirar o
gundo estimativas de operadoras de celular do bolso no momento da
cartão de crédito, mais de 1,9 bilhão compra, diminuindo a exposição”,
de dispositivos estarão aptos a reali- explica Purim, para quem os
zar pagamentos por NFC até 2018. wearables “vieram para ficar”.
07•2016 | 25
COMIDA
dos primeiros golpes a favor da lhar para um gordo que não comeu
igualdade racial e dos direitos civis nada desde que acordou. As sobras
dos negros no Sul dos Estados Uni- deveriam durar dias.
dos não aconteceram em tribunais, Acredito que, se você não ficar com
escolas e ônibus, mas junto às chur- molho sob as unhas ao comer, é por-
rasqueiras. Algumas salas de jantar, que está comendo errado. Penso que,
quintais e restaurantes de beira de se não manchar a camisa, é porque
estrada integraram brancos e negros você não está se esforçando.
muito antes dos outros lugares Acredito – sei – que churrasco de-
públicos. mais não existe. Bom, ruim ou inter-
Acredito que bons churrascos não mediário, na antiga churrasqueira de
exigem ambientação. Pratos de papel carvão ou moderno e tecnológico: não
resolvem. E talheres de plástico. E importa. Sem parafernália nem rebim-
desconfio que qualquer lugar cujo bocas, o churrasco é a verdade; é his-
cardápio tenha mais de uma página tória, é lar. A única coisa em que não
(ou melhor, que não seja apenas um acredito é que um dia vou enjoar.
NPR (29 DE MAIO DE 2006), © 2006 DE JASON SHEEHAN, NPR.ORG.
07•2016 | 27
Essas crianças...
28 | 07•2016
PAPO DE LIVRO
No meio do caminho
tinha uma barata
POR C L AU D I A N I N A
07•2016 | 29
SELEÇÕES
ILUSTRAÇÕES (PÁGI NA AN TERIO R): ( NINA) © ROD RIG O BIXIG ÃO; © ISTOCK
-rosa, é a de que as
Depois de real de publicação.
crianças se confron- Quando coloquei
tam com o insólito escrita, a minha filha na oficina
divertidamente, en- palavra ganha de redação no colé-
quanto o escritor asas... um gio, não podia imagi-
adulto faz do estranho
aprendizado nar que uma de suas
um ponto de repug- histórias iria virar
nância e de confronto que o tempo irá conto em uma anto-
com um desconhe- dimensionar. logia. Desde pequena,
cido que incomoda, ela percebeu a res-
enoja e, portanto, abre ponsabilidade com a
caminho para uma série de refle- palavra: a gente nunca sabe quais
xões sobre as relações humanas, o serão os caminhos que um texto
sagrado e o imponderável, como é o pode ter no futuro. Depois de es-
caso do texto de Clarice Lispector. crita, a palavra ganha asas... Mais
Bacana pensar em quanto essas um aprendizado que o tempo irá
crianças, estimuladas a colocar no dimensionar de outras diversas e
papel seus insólitos, irão mergulhar inusitadas formas.
depois na literatura adulta com olhos A vida é mesmo imprevisível.
mais aguçados, percebendo os cami- E, no meio do caminho, tudo pode
nhos da sensibilidade. Mesmo que acontecer – até toparmos, de
não se tornem autores, esses peque- repente, com uma
nos com certeza serão leitores mais barata cor-de-rosa,
assíduos, até porque nasceram e vi- filtrada por uma ma-
veram em casas de livros. O exercício nhã de sol colorido.
da escrita aguça a percepção da rea-
lidade e o sentido de organização – Filhos de peixe
Vários autores, organiza-
ainda que seja a organização do caos ção de Alexandre Gomes
e do mais absurdo improvável. (Mar de ideias)
30 | 07•2016
Informe
Publicitário
App Store Google Play Use seu leitor CUIDAR DE VOCÊ. ESSE É O PLANO.
de QR Code
para baixar o
aplicativo do
Guia Médico
Mobile da
Unimed.
HISTÓRIAS POSITIVAS QUE CHEGAM ATÉ NÓS
Boas-novas
P O R TIM H ULS E
32 | 07•2016
Embora o parque eólico só ali-
mente 20 mil residências, a ideia é HERÓIS
que esse seja o primeiro projeto do UMA PROFESSORA
tipo para aumentar de forma signifi- QUE INSPIRA
cativa a produção mundial de ener- Hanan Al Hroub cresceu num
campo de refugiados palestinos
gia eólica.
e hoje, especializada em ajudar
crianças traumatizadas pela vio-
Bactérias comem plástico lência, dá aulas a refugiados. No
MEIO AMBIENTE A maior parte das início deste ano, foi nomeada
300 toneladas de plástico produzidas “melhor professora do mundo”
todo ano vai parar em lixões ou no
oceano. É um grande risco ambien-
tal, mas os cientistas do Instituto de
Tecnologia de Quioto e da Universi-
dade Keio fizeram uma descoberta
importante que pode resolver parte
do problema.
A equipe encontrou uma espécie
de bactéria que come tereftalato de
polietileno (PET), que responde por
um sexto de toda a produção de plás-
ticos. Leve, forte e incolor, é usado na
num evento cheio de celebrida-
maioria das garrafas descartáveis, em des em Dubai. Ela pretende usar
roupas de poliéster, bandejas de su- o prêmio de um milhão de dóla-
permercado e embalagens. res para ajudar seus alunos e diz:
A bactéria Ideonella sakaiensis usa “Professores podem mudar o
duas enzimas para decompor o PET mundo.” O prêmio Global Tea-
e obter carbono e energia para cres- cher foi criado pela Fundação
cer. No entanto, o processo é lento: Varkey, instituição sem fins lucra-
tivos que visa a aumentar o
as bactérias levam seis semanas para
© REUTERS/MOHAMA D TOROKMAN
07•2016 | 33
COMPLETE A FRASE
...entrei
na selva só de
short e camiseta?
ADILSON MONTEIRO
Manaus, Am az o n a s
...passei por
baixo da cerca, indo para um
campo onde tinha uma vaca que
correu atrás de mim?
ANTONIA GARCIA
Brasília, D i str i t o Fe de ral
...me casei?
JUSCELINO SANTOS
Joinville, S ant a C at ar in a
O que eu estava
pensando quando…
34 | 07•2016
...me formei
em contabilidade se eu queria
ser engenheiro agrônomo?
JOSÉ ZEFERINO DOS SANTOS
Amélia Rodrigues, Bahi a
...não me
pendurei em seu pescoço
e tasquei um beijo para
nunca mais soltar?
NADJA MELO, Recife, Pern amb u c o
...comprei
um sapato com o número
maior que o meu só porque
era bonito?
SHEILA PEGGI
São Paulo, S ã o Paul o
...deixei de
agir com medo de errar?
ÉRICA LIBERATI, Maringá, Paran á
...cursei história
se tive a oportunidade de cursar
direito que era meu foco?
TÂNIA SOUZA
Imbé, R i o G ra n de do Sul
Flagrantes
DA VIDA REAL
“Eis o que acontece quando você ignora as coisas por tempo demais, Greg.”
07•2016 | 37
S E G R E D O S
S E G R E D O S
S E G R E D O S
S E G R E D O S
S E G R E D O S
S E G R E D O S
S E G R E D O S
que eu quero lhe contar
O que eu, seu corpo, realmente
preciso para ter boa saúde, ficar bem
nutrido, dormir, aliviar a dor e mais P O R TER ESA DU MA I N
40 | 07•2016
exercida quando você baixa a cabeça é importante falar disso. Às vezes, um
num ângulo de 60° para mandar medicamento ou combinação de me-
e-mails e mensagens pelo celular. E dicamentos me deixa esquecido ou
você faz isso durante até quatro horas confuso. A ansiedade e a depressão
(horas!) por dia. Por amor à integri- também podem causar esse efeito, as-
dade da coluna cervical, levante esse sim como a tireoide preguiçosa ou a
celular até sua linha de visão. deficiência de vitamina B12. Tudo isso é
tratável. E se, por acaso, os sintomas de
Pegar um agasalho assim que sentir memória estiverem ligados à demência,
frio. Aguente um pouco. Os pesquisa- o diagnóstico precoce é fundamental;
dores descobriram que tremer de frio ele dá à mente uma probabilidade me-
estimula hormônios que convertem a lhor de se beneficiar com o tratamento.
gordura branca que armazena energia
em gordura marrom que queima ca- AH, SE EU PUDESSE
lorias. Tremer durante 10 a 15 minu- EXPLICAR...
tos tem efeito hormonal semelhante a Por que pessoas saudáveis têm cân-
uma hora de exercício moderado. cer. Provavelmente você conhece
alguém que seguiu todas as “regras” –
Deixar os alongamentos de lado. usou filtro solar, comeu hortaliças, não
Você arranja tempo para o treina- fumou – e mesmo assim teve câncer.
mento aeróbico e de força, e gosto Eu gostaria de ter uma boa explicação
disso. Mas minhas articulações pre- para isso, mas a verdade é que cerca
cisam ser alongadas, principalmente de dois terços da variação do risco de
quando envelheço. O tecido conjun- câncer são explicados por mutações
tivo dos tendões e ligamentos fica genéticas aleatórias que provocam o
mais rígido e quebradiço com a idade, crescimento de tumores. Em essência,
o que provoca movimentos limitados e azar. No entanto, isso não o isenta de
redução da flexibilidade. Pilates e ioga seguir as regras. Embora alguns fatores
são duas boas opções, mas até alonga- de risco não possam ser controlados,
mentos controlados simples mantidos muitos outros podem.
por 10 a 30 segundos podem ajudar a
me mover com mais facilidade. Como funciona o placebo. Tomar um
comprimido de açúcar pode afetar o
“Esquecer” de contar ao médico os ritmo cardíaco, alterar a atividade ce-
lapsos de memória. Apenas um quarto rebral, aliviar a depressão e melhorar
dos adultos acima de 45 anos confessa os sintomas da doença de Parkinson:
que tem problemas de memória. Mas reações reais e fisiológicas a um trata-
07•2016 | 41
SELEÇÕES
42 | 07•2016
mento falso. Uma análise de 84 estudos cognitivos. Ele não foi projetado para
de medicamentos contra dor crônica processar coisas demais ao mesmo
revelou que o efeito placebo está fi- tempo. Numa rota conhecida, posso
cando mais forte. Em 2013, os pacientes escutar o rádio e, mesmo assim, pres-
que receberam placebos tiveram uma tar atenção à rua. Mas, se precisar ler
redução média de 30% do nível de dor, placas ou procurar o número de uma
comparada a 5% em 1990. Os cientistas casa, a música me distrai.
estão tentando descobrir por que uma
pessoa reage bem a um placebo e ou- Franzir os olhos me ajuda a ver com
tra não, o que acontece no organismo mais clareza. Estreitar os olhos de
e no cérebro de quem toma o placebo e leve muda o formato deles e reduz
como se benefiiciar desse poder. a quantidade de luz que entra pelas
pálpebras, o que me ajuda a focalizar.
Como o intestino afeta o humor.
Abrigo até cem trilhões de micróbios, a Conversar com desconhecidos me
maioria deles no intestino. As bactérias deixa feliz. Formar ligações com
“boas” me ajudam a metabolizar os ali- outras pessoas, mesmo que breves
mentos; as “más” provocam gases e au- – como conversar com o barista que
mentam inflamações. O desequilíbrio prepara seu café ou com a pessoa sen-
da flora intestinal está ligado a muitas tada a seu lado na volta do trabalho –,
doenças. A ligação menos conhecida me dá a sensação de fazer parte de um
é entre as bactérias do intestino e o grupo e melhora meu humor.
cérebro. Uma possibilidade é que as
bactérias produzam serotonina e do- Balanço os braços ao andar. Meus
pamina ou outras substâncias quími- braços são como pêndulos que balan-
cas reguladoras do humor e capazes de çam naturalmente quando me movo.
afetar a ansiedade e a depressão. Outra Gasto menos energia quando eles fa-
possibilidade: os micróbios ativariam o zem isso. Mantê-los parados quando
nervo vago, principal linha de comuni- ando gasta 12% mais energia.
cação entre o intestino e o cérebro. Os
cientistas estão superconcentrados nas O QUE A COR DOS OLHOS
bactérias, portanto, fique atento. PODE REVELAR
Se forem escuros (castanhos)
QUERO EXPLICAR POR QUE... n Menos risco de degeneração
Você desliga o rádio do carro macular
quando se perde. Meu cérebro tem n Menos risco de melanoma
uma quantidade limitada de recursos n Mais confiabilidade
07•2016 | 43
SELEÇÕES
44 | 07•2016
sacelerar aumenta o tempo para pen- de sete vezes mais vulnerável do que
sar nas palavras que quero usar para uma articulação saudável.
me exprimir com mais eloquência.
Quando os dedos voam pelo teclado, Último cigarro fumado: Apenas
só posso oferecer a primeira palavra cinco anos depois de largar o cigarro,
que me vem à cabeça. meu risco de desenvolver câncer de
boca, garganta, esôfago e bexiga cai
ATENÇÃO A ESTES MARCOS para a metade. Obrigado.
Primeira menstruação: Sinal de que
você se tornou mulher, disseram sua Primeira fratura: Trate o osso, é claro,
mãe, sua avó e a tia intrometida. Pes- mas, se você tiver 50 anos ou mais,
quisadores britânicos acrescentam peça também um exame de densi-
que a idade da menarca pode estar li- dade óssea. Cerca de 80% das pessoas
gada ao risco de doença cardíaca. Um pulam essa parte. A osteoporose pode
estudo com 1,2 milhão de mulheres ser responsável pela fratura, principal-
de meia-idade mostrou que as que ti- mente se a lesão não resultou de um
veram o primeiro ciclo menstrual aos grande trauma, como um acidente de
13 anos apresentaram menos risco de trânsito. Se minha massa óssea estiver
problemas cardíacos; as que tinham baixa, é bom saber logo para tomar
aos 10 anos ou menos e aos 17 ou providências e retardar a perda.
mais tiveram risco mais alto. A idade
da menarca pode indicar algo sobre a TRUQUES QUE ME DEIXAM
saúde metabólica geral. Outros estu- MAIS SAUDÁVEL
dos encontraram vínculos com o risco Misture o iogurte. Aquele líquido em
de diabetes e a baixa massa óssea. cima é o soro, rico em proteínas, cálcio
para os ossos, vitamina D e probióticos
Primeira lesão do joelho: Basta uma para o intestino. Quando você o joga
para aumentar a probabilidade de na pia, saio perdendo.
artrite pós-traumática. E a lesão não
precisa ser grave: o comuníssimo rom- Asse as batatas. Assá-las no forno con-
pimento do menisco ou do ligamento vencional ou no micro-ondas retém
cruzado anterior depois de uma queda mais nutrientes. Se descascá-las e fer-
pode deixar meu joelho instável e re- vê-las, você perde toda a fibra da casca
sultar em desgaste mais rápido. Nem e cerca de dois terços da vitamina C.
sempre a lesão provoca osteoartrite (a
idade, o peso e os genes influenciam), Deixe o alho picado descansar.
mas uma articulação lesionada é cerca Quando o dente é picado ou esma-
07•2016 | 45
SELEÇÕES
46 | 07•2016
gado, libera-se uma enzima chamada Colorir reduz o estresse. Hoje há
alinase que provoca a formação de muitos livros de colorir feitos para
compostos que combatem doenças. adultos, embora você também possa
Deixe-o descansar de 10 a 15 minu- pegar emprestado o de sua sobrinha.
tos. O cozimento do alho cedo demais Não importa: colorir pode eliminar a
pode desativar a enzima. ansiedade. Quando me concentro em
algo concreto e repetitivo, aciono por-
Esprema limão no espinafre. Esta ções de meu lobo parietal, a mesma
verdura escura é boa fonte de ferro, área do cérebro ligada à espirituali-
mas, para facilitar a absorção das dade e que tende a ficar ativa durante
formas vegetais desse mineral, o es- a meditação e as orações.
pinafre precisa ser consumido com
vitamina C (por isso o suco de limão). Fazer cara feia ganha a negociação.
Numa negociação difícil (quando
Descasque o abacaxi. Sei que dá tra- você quer escapar da “última” oferta
balho, mas comprar abacaxi fresco já ou da insistência de um vendedor,
descascado e picado pode lhe furtar por exemplo), fazer cara feia pode
alguns nutrientes. De acordo com as ter mais resultado do que uma cara
pesquisas, depois de seis dias na gela- de paisagem. Segundo as pesquisas,
deira os cubos de abacaxi perdem 10% ela pode dar mais credibilidade às
da vitamina C e 25% dos carotenoides ameaças.
(antioxidantes) se comparados à fruta
inteira picada no dia em que é comida. Gelar a mão alivia a dor de dente.
Esfregue um cubo de gelo na mem-
TRUQUES QUE ME ALEGRAM brana entre o polegar e o indicador.
Batucar na testa controla a vontade Os nervos desse ponto enviam sinais
de comer. Esquisito? Pois é. Mas os de frio ao cérebro que podem reduzir
pesquisadores testaram algumas téc- os sinais de dor vindos do dente. Cien-
nicas de 30 segundos para impedir o tistas canadenses afirmaram que, com-
ato de comer sem pensar. Esse foi o parado a massagear o ponto sem usar
que funcionou melhor para afastar os gelo, esse método reduziu em até 50%
participantes obesos de seus alimentos a dor de dentes.
favoritos, reduzindo assim a vontade Especialistas que contribuíram: Dr. Joseph Borrelli, cirurgião
ortopédico e diretor de Ortopedia do Texas Health
de comer. A próxima vez que um so- Arlington Memorial Hospital; David Bucci, professor de
Ciências Psicológicas e Cerebrais do Dartmouth College;
nho de chocolate chamar seu nome, Jeffrey Mogil, professor da cátedra E. P. Taylor de Estudos
da Dor da Universidade McGill; Ben Michaelis, psicólogo
ponha o dedo na testa e batuque para clínico e autor de Your Next Big Thing: Ten Small Steps to
Get Moving and Get Happy; Dra. Andrea J. Singer, diretora
o desejo ir embora. clínica da National Osteoporosis Foundation
07•2016 | 47
UM
H E RÓ I
NA
48 | 07•2016
DRAMA DA VIDA REAL
Um apartamento em chamas.
Crianças desaparecidas. Jordan
Sullivan recebe o chamado.
F U M AÇ A
P O R N. R. KLE INFIELD
D O T H E N E W YO R K T I ME S
07•2016 | 49
P
SELEÇÕES
50 | 07•2016
candidatos negros e latinos convidados ombro e uma vara de madeira de 1,80
a fazer a nova prova. Ele ficou espan- metro com uma ponta de metal para
tado e agradecidíssimo por essa ajuda sondar e rasgar paredes. Presos ao ca-
da Providência. Passou na prova e no pacete estavam uma cunha de madeira
exame físico e foi aceito na contratação e sete pregos para arrombar portas. Ele
prioritária, um dos 76 que formariam a mede 1,75 metro e pesa 70 quilos. Co-
classe mais diversificada da história do berto de equipamento, pesava 45 qui-
departamento. Em julho de 2013, com los a mais. A frente do capacete exibia
36 anos, Jordan Sullivan, que achou o “emblema abóbora”, a insígnia cor de
que nunca conseguiria ser bombeiro, laranja com as letras PROB gravadas
entrou na Academia de para anunciar sua con-
Combate a Incêndios. dição de novato.
Os três homens subi-
O C A M I N H ÃO dos Havia ram pela escada enfu-
bombeiros parou diante fumaça na maçada, com Sullivan
de Wyckoff Gardens, escada. E na retaguarda. Em pré-
um desbotado prédio uma mulher dios altos, uma das es-
residencial de 21 an- gritava, em cadas é utilizada para o
dares. Para Sullivan, o pânico: ataque com a mangueira
tempo pareceu acelerar. “Meu Deus, e para a equipe interna,
Na porta da frente, um meus bebês enquanto a outra fica
morador virou a cabeça
estão lá para evacuação. Na lista
para cima e gritou: “É do sim e não: em incên-
no quinto andar!”
dentro!” dios até o sétimo andar,
Todos têm uma fun- use a escada. E só use o
ção na coreografia do elevador até dois anda-
combate ao fogo. Três integrantes da res abaixo do incêndio, para não ficar
guarnição formavam a equipe que preso acima dele.
encontraria o fogo para o caminhão Havia fumaça na escada. A cada
apagar e procuraria vítimas. Era co- lance, ela engrossava. No quinto andar,
mandada pelo tenente John LaBar- um homem que apertava a camisa no
bera e formada pelo bombeiro John rosto apontou: “É lá.” E Gloria Mea-
Crowley, o “homem dos ferros”, que dows, de 64 anos, gritava em pânico:
levava as ferramentas para arrombar “Meu Deus, meus bebês estão lá dentro!
portas, e Sullivan, o “homem da lata”. Meu Deus, meus bebês estão lá dentro!”
Sullivan levava um extintor de 2,5 ga- Gloria escapara com dois netos,
lões de água (9,5 litros) pendurado no o de 1 ano e o de 14, mas os outros
07•2016 | 51
SELEÇÕES
52 | 07•2016
A CÔMODA DO QUARTO de dormir Os bombeiros aprendem que, sem
estava em chamas, com labaredas combate, o fogo tende a dobrar a
lambendo o teto. Crowley foi para a cada trinta segundos. Onde estavam
esquerda, mantendo o pé esquerdo as crianças? Quanto tempo viveriam?
em contato com a parede. Sullivan foi Sullivan tateou à frente com a mão
para a direita, uma das mãos tocando esquerda e sentiu alguma coisa. A
a parede, navegando pelas espirais de perna fina de um móvel. Tateou
fumaça. Não perca a parede. mais alto. Grades. Ele sabia o que era
O tempo passava. Estavam vários aquilo: um berço.
minutos dentro de um apartamento Ele se levantou, pôs as mãos lá den-
em chamas, ainda sem a mangueira. tro e, cautelosamente, tateou o que
achou que fossem cobertores e brin-
“A adrenalina bombava”, diz Sullivan. quedos; não conseguia enxergar.
“Estava ansioso para me pôr à prova.” A lanterna estava presa ao ombro;
07•2016 | 53
SELEÇÕES
ele se inclinou e ela iluminou alguma joelhos, jogaram no fogo mil litros
coisa. Era branca e macia. Ele também d’água por minuto, apagando-o.
sabia o que era: uma fralda. Sullivan entrou no segundo quarto.
Estranhamente, encontrar o bebê o
ASSIM QUE VIU a fralda e sentiu a acalmara. Um minuto e meio tinha se
maciez do corpo, ele soube que era o passado desde que o achara. Ele ou-
bebê. Sullivan o pegou no colo. viu alguém gritar 10-45. Bryan Kelly,
O treinamento diz para manter a bombeiro do Esquadrão 1, localizara a
calma. Transmita informações com menina de 8 anos caída, inconsciente.
frases claras e concisas. No primeiro quarto,
Ele não estava calmo, os homens da man-
nem um pouquinho. gueira ouviram um
Quando sentiu o bebê, Assim que ruído abafado, talvez
berrou: “Achei o bebê, viu a fralda e um brinquedo. Debaixo
senhor!” sentiu a da cama estava um cão-
Pelo rádio, Crowley maciez do zinho minúsculo, vivo e
transmitiu o código corpo, encharcado.
10-45, ou seja, uma ví- Sullivan Nos dez minutos se-
tima fora encontrada. soube que guintes, os homens da
Ele não pôde deixar de
era o bebê e mangueira contiveram
rir, porque, mesmo na- o fogo. Novos bombei-
quelas circunstâncias
o pegou. ros chegaram para fazer
difíceis, Sullivan con- uma segunda busca.
tinuava terminando Nisso, o número de
tudo com “senhor”, sempre o novato bombeiros no local já era cerca de 60.
perfeito. Os outros do carro 105 tiraram a más-
Sullivan aconchegou a criança des- cara. LaBarbera notou que Sullivan
falecida contra o ombro e saiu cor- ainda usava a dele e lhe disse que po-
rendo do apartamento. No corredor, dia retirá-la. Ele tinha ar. O alarme de
encontrou Dale Ford, bombeiro do falta de ar não soou.
carro 110, que disse: “Me dê o bebê A fumaça se dissipou e a escuridão
e volte lá para dentro.” Ele entregou a se desfez. O apartamento encharcado
criança e retornou ao apartamento à e carbonizado parecia ter passado por
procura da menina. uma imensa tempestade.
O resto aconteceu depressa. Os
homens do caminhão estenderam a LÁ EMBAIXO, ENQUANTO a lua su-
mangueira até o apartamento e, de bia no céu, os bombeiros fizeram seu
54 | 07•2016
relatório a Matthew Ferris, coman- se confundira, sem saber quem estava
dante do batalhão, recapitulando os onde. Mas fora batizado. E sentiu-se
fatos. Ele deu parabéns a Sullivan, humilde com o fato estonteante aconte-
que ainda não parara com o “senhor”. cido dentro daquele prédio: ele pegara
O chefe lhe disse: “Calma, não preci- uma criança e lhe devolvera a vida.
samos de senhores aqui.” Entre as ordens que os novatos têm
Naquele momento, as crianças, de obedecer está a de não usar o ce-
aconchegadas em leitos de hospital, lular no trabalho. Dessa vez, Sullivan
estavam sendo tratadas. Elas se re- quebrou a regra. Um pouco depois
cuperariam e receberiam alta. (O ca- das quatro, nas primeiras horas da
chorro também sobreviveu.) manhã, ele ligou para o pai.
Quatro dias ainda se passariam até – Achei um bebê – disse. – Não posso
alguns bombeiros visitarem a família falar agora. Estou no quartel.
numa escola local, quando Sullivan O pai, um homem rígido, respondeu:
voltou a pegar o bebê no colo. – Tudo bem. Conversamos depois.
O resto do turno foi tranquilo. E en-
DEPOIS DO RELATÓRIO, os bom- tão ele se dirigiu ao ginásio do quartel,
beiros subiram no caminhão, com onde se exercitou antes de ir para casa.
fumaça e água nas roupas. Na tran- Estava inquieto demais para dormir.
quilidade do quartel, tiraram o equi- Logo chegou a hora de cumprir seu
pamento encharcado e tomaram próximo turno. O pessoal de relações
banho. Sullivan estava cansado. públicas do Corpo de Bombeiros
Ele sabia que continuava a ser um combinara com alguns canais de TV
bombeiro ainda novato que tinha para entrevistá-lo diante do quartel.
muito a aprender. Depois que os jornalistas partiram, ele
Ao relembrar a noite, achou que po- voltou ao território dos novatos: a pia
deria ter ficado mais atento. Às vezes cheia de louça para lavar.
NEW YORK TIMES (20 DE JUNHO DE 2014), © 2014 THE NEW YORK TIMES CO., NYTIMES.COM.
07•2016 | 55
Ossos
DO OFÍCIO
meio da noite.
■■ Um homem avisou que um esquilo
corria em círculos na Rua Davis e
que ele não sabia se o animal estava
doente ou se fora atropelado. Um
policial foi averiguar e, ao passar
pela rua, atropelou o esquilo.
Fonte: uniformstories.com
07•2016 | 57
Ouvindo Uma mulher
que nasceu
pela
surda resolve
correr o risco
e escapa de
um mundo
primeira
de silêncio
vez...
FOTOGRAFADO P OR NADAV KANDER
…aos 39 anos
P O R JO M ILNE
D O LI V R O BR E AK I N G T H E S I L E N CE
07•2016 | 59
M
SELEÇÕES
60 | 07•2016
DOIS DIAS DEPOIS DA CIRURGIA, sores que cuspiam em minhas costas
estou em casa, em Gateshead, na In- no ônibus da escola e achavam engra-
glaterra. Os especialistas acham que çado eu não conseguir ouvi-los.
tudo deu certo, mas tenho de esperar Três minutos: olho a tela e engulo
um mês até ligarem os implantes. Só em seco.
então saberemos se foi um sucesso. Um minuto: estou fitando o chão e
De repente, fiquei incapaz. Não vejo um par de sapatos pretos surgir à
posso mais usar o aparelho auditivo minha frente. Ergo os olhos, vejo um
e, sem ele, o ruído branco que me rosto amistoso aparecer em meu túnel
guiava todos os dias sumiu. O silêncio e sinto as vibrações de mamãe, que se
total e completo é um companheiro levanta a meu lado.
deprimente.
O que mais me assusta é a ideia de SENTO-ME DIANTE DE LOUISE, a au-
ficar assim para sempre. diologista, em seu consultório. Antes
de ligar os implantes, ela precisa usar
U
M MÊS DEPOIS, volto ao hos- o computador para alinhar 22 eletro-
pital. Mamãe e eu estamos dos em cada ouvido. É um processo
na sala de espera. Uma TV de demorado, em que Louise prende no
tela grande mostra o nome e o tempo computador os fios de meus novos
de espera de cada paciente. aparelhos auditivos. Quando os co-
Joanne Milne, dez minutos. loca atrás da minha orelha pela pri-
Seis minutos: aquele medo impor- meira vez, parecem duros e frios.
tuno que não desaparece. E se a ope- Depois de repetir várias vezes o
ração não deu certo? mesmo processo laborioso em cada
Cinco minutos: penso em outras eletrodo, Louise pousa a caneta e sorri
coisas. O medo no rosto de mamãe para mim.
ao sair correndo de casa quando fui “Conseeeeegue... meeeee... ouviiiiir?”
atropelada ainda pequena porque não As primeiras palavras que já escutei.
consegui ouvir o carro se aproximar. A Cada letra, cada sílaba ricocheteia
vez em que consegui me soltar do car- nas paredes, no teto, nas portas, soa
rinho enquanto mamãe olhava uma pela sala, nos meus ouvidos e choca-
vitrine. As duas horas frenéticas que lha dentro do cérebro, que, desespe-
ela passou me procurando no meio da rado, tenta filtrar todos os novos sons
multidão, sabendo que não adiantava que saíram girando da boca de Louise
chamar meu nome. A briga que teve e atingiram minhas orelhas, explo-
para me pôr na mesma escola em que dindo como fogos de artifício.
estudavam minhas irmãs. Os agres- É assim que soa? Não é um ruído
07•2016 | 61
SELEÇÕES
branco nem um zumbido suave. É as- comuns, mas, para mim, são as mais
sim que é não ser surdo. Isso é audição. lindas que existem.
“Vou dizer os dias da semana”, ex- Mamãe está em pé à minha direita,
plica Louise devagar. A voz dela é filmando o momento. Tento falar e te-
como imaginei que seria a de um robô: nho essa estranha sensação por den-
aguda, guinchada, eletrônica. “Segun- tro. Uma voz em minha cabeça. Minha
da-feira... terça-feira... quarta-feira...” própria voz.
As emoções saem borbulhando de – Soa muito agudo – digo.
meu corpo como de uma lata de refri- – Vai soar agudo a princípio – Louise
gerante sacudida. As lágrimas pingam concorda. – Seu cérebro se acostumará
no colo enquanto tento absorver tudo e não soará assim para sempre.
aquilo. “Quinta-feira... sexta-feira... sá- Baixo a cabeça até o colo e choro.
bado... domingo...” – Sorria – diz mamãe, em pé com
Palavras que conheço a vida inteira, a câmera.
mas que ouço pela primeira vez. Tão Ela tem sido minha porta-voz, meus
ouvidos, meus olhos a vida inteira, e
até agora eu nunca soube como era a
voz dela. Meu cérebro tenta registrar a
diferença entre a voz dela e a de Louise
e percebe instantaneamente: o sotaque
do norte da Inglaterra de mamãe. En-
tão é assim que falamos.
A operação deu certo. Posso ouvir.
Se fosse possível medir a alegria em
grau máximo, era o que eu faria. Em
todos esses anos em meu mundo silen-
cioso, as palavras de nada me adianta-
vam, eram desconhecidas com quem
eu desejava, de longe, fazer amizade.
E, sim, há uma pergunta óbvia: como é
que sei o que significam essas palavras
pronunciadas se nunca as ouvi? Todos
esses anos lendo lábios ensinaram a
meu cérebro o formato e a sensação
das palavras faladas, antes mesmo que
eu as ouvisse. Agora, de repente, som e
significado se juntam.
62 | 07•2016
Saio do consultório de Louise como fos batendo nos pratos, o zumbido
uma mulher que ouve. Enquanto an- das conversas. Então noto mais uma
damos, ouço o batuque dos passos no coisa: o som de meus talheres ras-
chão. Depois surge outro som. pando o prato.
– Que barulho é esse? – pergunto a – Faço muito barulho quando como
mamãe. – digo rindo a mamãe.
– É o telefone tocando – diz ela, e, Para mim, tudo é maravilhoso: o
quando ergo os olhos, minha visão tu- fato de responder à garçonete quando
nelar revela a recepcionista pegando ela pergunta se quero parmesão na
o aparelho. massa, embora eu esteja olhando para
– Que barulho é esse? – pergunto o outro lado; o ruído que o copo faz
de novo, quando um clinque-clinque quando o pouso com força demais na
passa por mim. mesa; o gelo que tilinta entre as fatias
– É o carrinho do café. de limão dentro do copo.
Os sinais que, de tão comuns pas- Eu achava que as bebidas eram
sam despercebidos, colorem meu silenciosas e que copos não faziam
mundo, dando-lhe uma vida que barulho. E também que a gente só
nunca senti. podia se comunicar quando olhasse
os outros. Tudo isso são segredos que
Q
UANDO SAÍMOS DO hospi- o mundo sonoro agora me revela.
tal e entramos naquele dia de Ao voltarmos a nosso quarto de
março, o vento açoita o chão, hotel, meu cérebro está exausto com
levantando as folhas em redemoinho. o esforço de escutar. Quando mamãe
E então percebo que o vento faz ba- pendura o casaco no guarda-roupa,
rulho, um barulho soprado, corrido. peço-lhe, pela primeira vez na vida,
Paramos num restaurante e me es- que faça silêncio.
panto com a barulheira do mundo: – Oooh, desculpe! – diz ela.E caímos
o estrépito da cozinha, facas e gar- na gargalhada.
BREAKING THE SILENCE: MY STORY AS I LEARNED TO HEAR FOR THE FIRST TIME, DE JO MILNE E ANNA WHARTON, © 2015 DE JO MILNE,
PUBLICADO POR CORONET BOOKS, CORONETBOOKS.COM.
O IMPORTANTE É A AMIZADE
07•2016 | 63
O Rio de Janeiro está se arrumando para as
Olimpíadas. Mas, de barbas a biquínis, regras
rigorosas determinam o que os atletas podem vestir
Vestidos
vencer
para
POR DAV I D T H O M AS
66 | 07•2016
A vida dela foi poupada. Mas, a par- Atletas do Irã e da Rússia nas Olimpíadas de
tir de então, todos os treinadores, as- Londres, em 2012: a barba dos lutadores em
eventos olímpicos deve ter no mínimo 5mm.
sim como os atletas, foram obrigados
a ficar sem roupas, a fim de provar sua bém foram proibidos de ter qualquer
masculinidade. suor no corpo quando chegassem ao
Hoje, as regras que regem os espor- tatame para o início de uma luta, ou
tes individuais são formuladas por no início de cada round. Não podem
suas diversas entidades responsáveis, “aplicar qualquer substância oleosa
supervisionadas pelo Comitê Olím- ou pegajosa no corpo”. As competi-
pico Internacional (COI). doras não podem usar sutiã com aro
Num primeiro momento, algumas no bojo.
parecem um pouco estranhas. Por Existem bons motivos para todo
© RIA N OVOSTI/TOPFOTO
07•2016 | 67
SELEÇÕES
68 | 07•2016
das para que os uniformes adotados A equipe canadense de nado sincronizado,
sejam o mais convencionais possível. em Pequim, 2008: as atletas são proibidas
de usar “maquiagem teatral”.
Todo fabricante cujas roupas serão
usadas nas provas de natação devem força, flexibilidade e uma tremenda
fornecer um metro quadrado do te- resistência cardiovascular. Mas, por-
cido a partir do qual elas serão feitas, que usam roupas coloridas e brilhan-
para assegurar que sejam adequadas. tes, maquiagem pesada e ostentam
um sorriso congelado no rosto, elas
O NADO SINCRONIZADO TAMBÉM podem ser vistas como estereótipos
é alvo de investigação. Junto com a de uma feminilidade submissa.
ginástica rítmica, ele é um esporte Enquanto discutem a aparência das
© SIPA PRESS/REX/SHUTTERSTOCK
07•2016 | 69
SELEÇÕES
tipo de coreografia das nadadoras. tanto, quem decide que tipo de uni-
Mas não há nada nas regras que as forme usar são os corredores e suas
impeça de chorar copiosamente du- federações nacionais.
rante a “Marcha fúnebre”. Esses atletas, geralmente, ainda
Assim, talvez, como acontece com usam shorts e camisetas que quase
as jogadoras de vôlei de praia, as não sofreram alteração nos últimos
meninas do nado sincronizado sim- 50 anos, apesar de os velocistas agora
plesmente gostem de usar maiôs cha- tenderem a usar uniformes justos,
mativos. Afinal, atletas de ambos os para diminuir a resistência do ar. As
70 | 07•2016
mulheres, no entanto, mudaram de um homem em boa forma vestindo
shorts e camisetas, como os homens, roupas de equitação aderidas ao corpo,
para uniformes de duas peças bem da mesma forma que homens sejam
menores e mais justos, cada vez mais atraídos por lindas mulheres de biquíni.
parecidos com os biquínis das jogado- Mas isso não significa que o sexismo
ras de vôlei de praia. não exista no esporte, ou que as roupas
Nenhuma regra causou esta mu- não sejam parte de sua causa.
dança. Trata-se apenas do que os atle- Vejamos a história de Niklas Stoe-
tas querem vestir. E, mesmo quando pel, de Wattenscheid, na Alemanha.
atletas olímpicos de ambos os sexos Ele treinou seu esporte desde os 7
parecem vestir uniformes tradicio- anos, alcançou o mais alto padrão e
nais, mudanças estão acontecendo. deveria ter sido indicado para a sele-
As competições equestres, que são ção alemã. Ele sonhava em competir
únicas pelo fato de que homens e mu- nos Jogos Olímpicos.
lheres competem diretamente entre Só havia um problema. Niklas,
si, ainda exigem uniformes de equita- como um número crescente de jovens
ção cujos designs datam do século 19. meninos, era um nadador de nado
Mas, apesar de as versões atuais pa- sincronizado. Ele não se incomodava
recerem semelhantes, antigos culotes em raspar as pernas, como os nada-
de tecido de lã penteada e casacas de dores e os ciclistas fazem, ou em usar
lã estão sendo substituídos por teci- roupas cheias de purpurina, como fa-
dos modernos que deixam a pele de zem os dançarinos de balé.
cavaleiros e amazonas transpirar, re- Mas o COI não permite que atle-
movendo o suor e esticando à medida tas do sexo masculino entrem em
que os atletas se movimentam. competições de nado sincronizado.
Um porta-voz da Federação Eques- Em 2014, a Federação Internacional
© ROSS K INNA IRD/A LLS PORT/GETTY IMAGES
07•2016 | 71
FOTOGRAF IA DE CLAIRE BENOIST ADEREÇOS: SA RAH GUI DO-LAAKS O PARA HAL L E Y RE SOU RCE S
A ciência
diz que você
pode viver
100 anos
São mais de 30 mil centenários hoje
no Brasil, número que triplicou na última
década. Eis como se tornar um deles.
POR A LYSSA J U N G
07•2016 | 73
SELEÇÕES
74 | 07•2016
OS CENTENÁRIOS FALAM
07•2016 | 75
SELEÇÕES
76 | 07•2016
Entre aspas
A PARTI R DO ALTO: © SGRA NITZ/GETTY IMAGES. © TIBRI NA HOBSON/GETTY IMAG E S. © TONY BARSON/G E TTY IMAG E S
07•2016 | 77
Guia de etiqueta em viagens
Armadilhas
para
evitar
nas férias
POR J UL I U S SC H O P H O FF
E
M ROMA, como os romanos. Uma
saudação casual e até o gesto mais
bem-intencionado podem bastar
para ofender seus anfitriões, como
lhe contarão nossos colegas do Reader’s Digest
em quatro continentes. Nosso guia de férias
lhe dará algumas orientações para você não
tropeçar em viagens pelo mundo.
e deixar que embarque primeiro”, diz “Nunca tome mais bebida alcoólica
Alex Finer, editor-chefe da redação do que levou consigo e, aconteça o
europeia da revista Reader’s Digest que acontecer, nem pense em acen-
em Londres. der um cigarro!”, diz Ilkka Virtanen,
E não chegue perto demais; essa editor-chefe da Valitut Palat, a revista
atitude é vista como invasão do es- Reader’s Digest na Finlândia. “Os fin-
paço pessoal. Por outro lado, se você landeses não se incomodam com o
ficar muito longe, pode ter certeza vapor da sauna, mas não toleram fu-
de que, quando outras pessoas che- maça dentro de casa!”
garem, vão lhe perguntar enfatica-
mente se você está na fila. O jornal FRANÇA Nesse país, a boa educação
The Guardian recomenda que, como é tudo. O tratamento formal tam-
regra geral, você deixe o mesmo es- bém se usa nos cumprimentos e até
paço que manteria “ao dançar com a nas respostas mais curtas: “Bonjour,
tia-avó Hildegard”. Monsieur”, “Merci, Madame”. Sua me-
80 | 07•2016
lhor oportunidade de se aproximar de
um francês é durante o ritual do beijo,
que ocorre sempre que se encontra
alguém. “Dependendo da região, o
ritual pode envolver dois, três e até
quatro beijos. Mas, por favor, resista
à tentação de forçar um grande beijo
estalado neles; um soprinho no om-
bro é mais do que suficiente”, diz
Stéphane Calmeyn, editor-chefe de
nossa revista francesa.
A não ser que você seja real-
mente íntimo da pessoa, não deve
haver nenhum contato com o rosto.
07•2016 | 81
E, se chegar até lá sem incidentes, com 5 anos, treinando com a irmã
não estrague tudo pedindo contas mais velha.
detalhadas e separadas. Na Itália, a
conta é dividida igualmente por todos ESPANHA Os espanhóis adoram ba-
na mesa – finito! rulho. Motonetas matraqueantes, bu-
zinas, TVs aos berros: eles parecem
POLÔNIA Os poloneses são cava- ter uma necessidade inata de fazer
lheiros de verdade. “Eles abrem a algazarra. Portanto, nem pense em
porta para a dama, ajudam-na a tirar se queixar à recepção do hotel por-
o casaco e puxam a cadeira para ela, que os lixeiros o acordaram no meio
soltando pelo caminho todo tipo de da noite.
cumprimento encantador”, diz Mal- O melhor a fazer é, para começar,
gorzata Makowska, da equipe edito- escolher o quarto com cuidado: veja
rial da Polônia. “Os mais velhos até se fica nos fundos do hotel, no andar
cumprimentarão as damas tocando a mais alto possível. “Muitos restau-
mão delas com os lábios.” rantes e outros lugares públicos são
As mulheres polonesas gostam cheios de pessoas berrando umas
dessa atenção cavalheiresca, embora com as outras a plenos pulmões”, diz
turistas emancipadas as vejam como Natalia Alonso, editora-chefe da Rea-
galanteios. Portanto, senhoras, tentem der’s Digest na Espanha.
se lembrar de que os meninos polo- O poeta espanhol Leon Felipe
neses são criados, desde pequenos, explicou com ironia por que seus
para serem corteses e galantes com compatriotas falam tão alto: todos
as mulheres, e não tenham medo de descendem de Rodrigo de Triana, o
entrar na dança! Quando conhecer vigia de Cristóvão Colombo que avis-
um polonês, ofereça-lhe a mão reca- tou o Novo Mundo e gritou: “Terra à
tadamente. Talvez ajude se o imaginar vista!”
82 | 07•2016
Américas Aceite que, se não pode vencê-los,
BRASIL Os brasileiros gostam de se o melhor é se juntar a eles. Adie todos
apresentar imaculadamente em todas os compromissos para o dia seguinte
as ocasiões. Sempre de banho tomado como questão de princípios. No Mé-
e bem-vestidos, nunca têm um fio de xico, a pontualidade é rara, portanto
cabelo fora do lugar. Mesmo em ôni- tome o cuidado de chegar pelo menos
bus lotados e boates cheias, o aroma meia hora atrasado.
de loção pós-barba e perfume enche o
ar. Portanto, não importa se você vai a ESTADOS UNIDOS Bem-vindo à terra
um restaurante de alta classe ou ape- do papo furado sem fim. Quando al-
nas à praia – arrume-se! guém lhe perguntar “How are you?”
A Praia de Copacabana é uma pas- (“Como vai?”), você pode lhe contar
sarela de areia. Se quiser parecer da que levou quatro horas para passar
terra, jogue fora aqueles calções largos pela segurança do aeroporto, que seu
e velhos e arranje uma sunga decente. carro alugado ficou sem combustível
“Embora os biquínis reveladores sejam no meio da estrada e que você se quei-
de praxe no Brasil, é necessário usar al- mou com o sol enquanto andava até o
gum tipo de cobertura. Fazer topless e posto de gasolina mais próximo. Mas
nadar sem roupa são tabus”, diz Raquel só em poucas frases. Dê à pessoa com
Zampil, editora da edição brasileira. quem estiver falando a oportunidade
de participar da conversa ou, educa-
MÉXICO Para demonstrar que se in- damente, saia dela. “Os americanos
teressa pela rica cultura desse país, gostam de bater papo e adoram uma
aprenda algumas expressões em es- boa anedota que possam contar aos
panhol. Uma das primeiras palavras amigos”, diz Markus Ward, diretor de
que você vai ouvir será mañana – arte da revista alemã natural dos Es-
amanhã. Espere ouvi-la sempre que tados Unidos.
um mexicano precisar de um serviço Mas no elevador as regras são dife-
com urgência, como consertar o carro rentes: “Não converse com ninguém
ou chamar o encanador. Nesse caso, nem olhe ninguém no rosto”, diz ele.
não cometa o erro de supor que ama-
nhã realmente significa o dia seguinte. Austrália
“Mañana é um conceito elástico; AUSTRÁLIA Os australianos têm um
quando amanhã chegar, ‘amanhã’ será bom humor abençoado. São amistosos
o dia seguinte, e assim por diante”, diz e solícitos. Não gostam muito de cum-
Mitssue Guzmán, coordenadora edi- primentos formais e preferem um sim-
torial no México. ples “How y´re going?” (Como vai?).
07•2016 | 83
SELEÇÕES
contribuição para a refeição. Não leve ÍNDIA Ali, pechinchar faz parte das
simplesmente um prato vazio.” compras. Mas uma cena especial-
mente dramática acontece várias ve-
Ásia zes nas feiras. O indiano que vende a
CHINA Nesse país, quase tudo acon- mercadoria – uma echarpe de seda,
tecia na hora de comer. Você talvez por exemplo – diz um preço. O turista
ainda veja e ouça membros da gera- que quer comprar oferece a metade.
ção mais velha sugando, mascando O indiano balança a cabeça. O turista
com ruído e arrotando. Não lhes falta continua aumentando a oferta, mas
boa educação; eles estão demons- o vendedor continua balançando a
trando que gostam da comida. Isso cabeça, cada vez com mais força, até
não significa que você também deva chegarem ao preço original pedido.
fazer isso! Apreciar a boa comida é E até esse é recebido com o mesmo
bom; parecer voraz, não. Siga a eti- gesto de cabeça do vendedor. Nesse
queta chinesa correta e, sempre com momento, os dois lados estão arran-
educação, recuse a comida e a bebida cando os cabelos; o turista porque
que lhe oferecerem quando visitar acha que o vendedor se recusa a ce-
uma casa chinesa. Não se preocupe: der; o vendedor, porque na verdade
oferecerão de novo. Os presentes concordou com o preço faz tempo.
são bem-vindos. Mas há algo que Se quiser evitar um roteiro pare-
você deve saber: “Os chineses nunca cido, lembre-se de que, em alguns
84 | 07•2016
lugares da Índia, balançar a cabeça los tatames da sala com as pantufas
de um lado para outro é sinal de con- do banheiro.”
cordância. “Os viajantes não devem
confiar apenas nos gestos. É bom TAILÂNDIA Os tailandeses acreditam
aprender as palavras locais para sim e que nunca se deve perder o autocon-
não”, aconselha Sanghamitra Chakra- trole. “É tabu demonstrar qualquer
borty, editora-chefe em nossa redação sinal de raiva”, diz o renomado ilus-
de Nova Délhi. trador Ingo Fast, que se mudou para
Bangcoc com a família há mais de
JAPÃO Os japoneses têm imensa ne- cinco anos. “Você nunca verá ninguém
cessidade de que tudo esteja impe- levantando-se de um salto, gritando
cável. A limpeza e a higiene estão no nem batendo o punho na mesa.”
âmago de sua identidade nacional, e Aconteça o que acontecer, os tai-
é bom se lembrar disso quando en- landeses sempre têm um sorriso nos
trar na casa de alguém no Japão. Não lábios. Compre uma estátua do Buda,
se esqueça de tirar os sapatos e vestir estude sua expressão e treine diante do
as pantufas oferecidas pelo anfitrião. espelho. Seja resoluto na crença de que
“Na hora de ir ao banheiro, você nada poderá irritá-lo. Depois de domi-
precisa trocar as pantufas por ou- nar o sorriso permanente na praia de
tras específicas”, diz Matthias Reich, Koh Samui, ponha-o à prova nas ruas
escritor alemão casado com uma ja- movimentadas de Bangcoc. O que fazer
ponesa e que mora no Japão há dez se o seu ônibus ficar preso num engar-
anos. “E não se esqueça de calçar as rafamento enorme, o ar-condicionado
pantufas domésticas quando termi- não estiver funcionando e, quando por
nar; não seja um daqueles pobres es- fim descer, você descobrir que sua car-
trangeiros que se esquecem do que teira sumiu? Basta sorrir e dizer: “Mai
calçam e acabam perambulando pe- pen rai” (Nada preocupante).
DIFÍCIL ACREDITAR...
07•2016 | 85
Não é só a vitória que conta.
Às vezes, os atletas olímpicos
dão uma dramaticidade
diferente à competição.
P O R JAM ES HA DLEY
Momentos
mágicos
Uma lenda na piscina bos desclassificados por queimarem
Eric Moussambani, nadador da Guiné a largada. Isso deixou Moussambani
Equatorial, chegou à Olimpíada de sozinho para competir com o relógio,
2000, em Sydney, por uma repesca- observado por 17 mil espectadores.
gem que permitiu a participação de Ele pareceu começar bem: mergu-
atletas de países em desenvolvimento. lhou com confiança e foi bastante ve-
Oito meses antes, ele mal sabia nadar; loz nos 10 ou 15 primeiros segundos.
aprendeu nado livre sozinho e treinou Mas logo se desacelerou, seu avanço
(sem a ajuda de um treinador) na pis- dolorosa e comicamente lento. Alguns
©SI PA PRESS/REX/S HUTTERSTOC K
86 | 07•2016
Sydney, 2000: Eric
Moussambani, ou
Eric, a Enguia,
conquista corações.
quase sete segundos maior do que o do na bateria feminina dos 800 metros.
nadador australiano Ian Thorpe, que Quando ela atravessou a linha de che-
nadou o dobro da distância na mesma gada, a reação do público foi uma ova-
piscina no dia anterior. Mas Moussam- ção em pé de centenas de espectadores.
bani se tornou uma lenda instantânea A razão: coberta dos pés à cabeça
pela valentia e perseverança heroica e usando véu, ela acabara de se tor-
e foi apelidado de Eric, a Enguia. Se- nar a primeira mulher a competir
gundo Thorpe observou: “É disso que num evento atlético por seu país, a
©OLIVI ER MORI N/AF P/GETTYIM AGES
07•2016 | 87
SELEÇÕES
as mulheres”, disse Sarah. “Sei que isso uma atitude de excepcional espírito es-
pode fazer uma enorme diferença.” portivo. “O que fiz qualquer um faria.
Era o que tinha de ser feito”, observou
Uma ação altruísta Lemieux depois. “Não foi diferente de
O velejador canadense Lawrence Le- ver alguém num carro no acostamento,
mieux voltou das Olimpíadas de 1988 obviamente precisando de ajuda.”
em Seul com uma medalha, mas não
a que buscava. Quando chegou a hora O poder da determinação
de sua bateria na classe Finn mascu- Como muitos atletas, o corredor britâ-
lina solo, as águas ao largo de Busan nico Derek Redmond foi atormentado
estavam revoltas, com o vento so- por lesões. Em 1988, ele deixou a Olim-
prando a 35 nós (64,8 km/h) e produ- píada de Seul com uma lesão no tendão
zindo ondas excepcionalmente altas. de Aquiles, mas quatro anos depois, na
Mesmo assim, Lemieux avançou até Olimpíada de Barcelona, competiu pela
notar um barco virado que competia medalha dos 400 metros. Na primeira
por Cingapura em outra bateria. Os bateria, obteve seu menor tempo em
dois tripulantes estavam feridos, um quatro anos. Na semifinal, começou
boiando, o outro agarrado ao com confiança. Então, com 250
casco da embarcação. “Tive metros percorridos, veio o
de tomar uma decisão, desastre. Redmond pa-
e, assim que percebi rou em agonia, com
a dinâmica do pro- um tendão rom-
blema, não havia pido. Poderia ter
o que questionar”, sido o fim de sua
explicou Lemieux Olimpíada. Mas,
mais tarde. apesar da dor,
Ele abandonou Redmond pros-
Barcelona, 1992: Derek
seu curso para sal- seguiu na prova,
Redmond, lesionado e
var os outros dois ve- ajudado pelo pai. mancando.
lejadores, que arrastou Então, outra sur-
©ANL/REX/SHUTTERSTOCK
88 | 07•2016
Erro de identidade
Em 1984, nas Olimpíadas de
Los Angeles, depois de se lesio-
nar no salto em distância, Ma-
deline de Jesús, de Porto Rico,
se viu diante de um dilema. Ela
também teria de competir na
equipe de seu país na corrida
de revezamento 4 × 400.
A solução de Madeline foi pe-
dir a Margaret, sua irmã gêmea
idêntica, também atleta e espec-
tadora nos Jogos, que ocupasse
seu lugar na bateria de classifi-
cação. O plano secreto deu certo,
mas, depois da corrida, Freddie
Vargas, o treinador-chefe por-
to-riquenho, descobriu o logro,
não gostou nem um pouquinho México, 1968: Tommie Smith
e tirou a equipe das finais. (ouro) e John Carlos (bronze)
passam sua mensagem.
Mensagem ao mundo
É uma imagem famosa: os corredores O gesto virou manchete no mundo
afro-americanos Tommie Smith e John inteiro e fez com que os dois fossem
Carlos, em pé no pódio dos vencedo- vilipendiados em sua terra natal, in-
res dos Jogos da Cidade do México, clusive com ameaças de morte. A
em 1968, a cabeça baixa e o punho história, no entanto, os considerou
erguido, de luva preta e fechado, en- heróis, por mandarem ao mundo uma
quanto o hino americano tocava. Seu oportuna mensagem. “Éramos ape-
protesto potente, calado e desafiador nas seres humanos que viram a ne-
contra a desigualdade racial seis meses cessidade de chamar a atenção para
©REX /SHUTTERSTOC K
07•2016 | 89
Depois de décadas de vergonha, eu
sonhava em me soltar na pista de dança
P O R LISA FIELDS
A música
em mim
H
AVIA APENAS um mês Com meu melhor sorriso de descul-
que Michael e eu estáva- pas, confessei:
mos namorando quando – Não danço muito bem.
ele me fez uma pergunta Ele não se intimidou.
que me causou muito mal-estar. – Ué, mas você gosta de dançar?
Ele não queria pescar detalhes sórdi- Parei, surpresa com a pergunta.
dos de meu divórcio. Não me sondava Lá no fundo, sempre adorei a liber-
ILUSTRAÇÃO DE CHRIS SILAS NEAL
para descobrir quanto eu ganhava. O dade que senti nas poucas ocasiões
que ele perguntou foi muito pior: em que me permiti dançar sem amar-
– Quer sair para dançar comigo um ras. Numa boate lotada. De brinca-
dia desses? deira, com minha amiga Jacki e seu
A maioria teria respondido que sim Just Dance, do Wii. Na maioria das
sem hesitar. Quem não gostaria de ir vezes em que me senti obrigada a dan-
a uma boate na cidade e se entregar çar, fiquei tensa, sem graça, com medo
à música a noite toda? Pois é, eu não, de que todo mundo estivesse olhando
porque nunca aprendi a dançar. e visse que eu fazia tudo “errado”.
90 | 07•2016
SELEÇÕES
92 | 07•2016
campus Sudeste da Universidade de Lá dentro, a música estava animada.
Indiana, me disse para pensar positi- Os casais giravam pela pista. Eu e Mi-
vamente, porque sempre me agarrara chael nos sentamos e nos envolvemos
às críticas dos outros à minha dança. na conversa. Uma hora depois, ainda
“Quem é muito envergonhado se con- não tínhamos nos levantado, e, com
centra nas características negativas e ousadia, eu o convidei para dançar.
prefere recordar um único comentário Segurei a mão dele e o levei até a
negativo em vez das muitas coisas cer- massa que girava, embora uma vozi-
tas que fez”, disse ele. “A verdade é que nha dentro da minha cabeça sussur-
ninguém liga para seu modo de dan- rasse: “Não é a música certa... Como é
çar; cada um só liga para si.” que vou dançar com música ao vivo?”
Carducci também insistiu para que Foi aí que percebi que o que acon-
eu não bebesse, porque quem bebe tecesse naquela noite não teria im-
para superar a timidez atribui o su- portância. Minha verdadeira dança
cesso ao álcool, e não a si mesmo. da vitória, por assim dizer, foi quando
Naquela semana, convidei minha saí com Paula. Não precisava provar a
amiga Paula, dançarina de salsa, para Michael que tinha coragem para dan-
ir à boate do bairro. Fiquei tomando çar na pista; precisava provar isso para
água tônica até o DJ tocar uma música mim, e já provara. Se tinha dançado
de que eu gostava, e fomos para a pista. numa pista cheia de desconhecidos, é
Só dez pessoas dançavam, e não ha- claro que conseguiria dançar de novo
via multidão para me camuflar. Mesmo com o homem que me amava.
assim, dancei como treinara em casa. A orquestra tocava e eu me balancei
Foi revigorante! Cheguei a levantar e dancei com Michael, que não tinha
os braços acima da cabeça, coisa que a mínima ideia do esforço que eu fi-
nunca tinha feito em público. “Você zera para chegar àquele momento.
não dança mal!”, gritou Paula acima Foi fortalecedor me mover sem pedir
da música, com cara de quem não desculpas nem sentir vergonha. Eu
entendia por que estávamos ali. me senti livre.
Isso foi bom. Mais tarde, percebi que não consigo
me lembrar de Michael quando está-
N
ÃO MUITO DEPOIS, Michael vamos dançando, o que me fez sorrir.
e eu passamos por um bar Carducci tinha razão. Fiquei tão obce-
específico e sugeri que en- cada comigo que nem prestei atenção
trássemos. (Não mencionei que havia ao homem que amo. Acho que em
anos que queria ir lá, mas sempre evi- breve terei de convidá-lo para dançar
tara por causa da pista de dança.) de novo.
07•2016 | 93
94 | 07•2016
© TJETJEP RUSTAN DI/ALA MY STOCK P HOTO
Rumo
céu
ao
07•2016 | 95
96 | 07•2016
SELEÇÕES
(NO ALTO) © L ASSE ANSAHARJ U/AL AMY; (AB AIXO) © MAR K WAU G H /
AL AMY; (À D IRE ITA) G E TTY IMAG E S/ LONE LY PL ANE T IMAG E S
O elevador Bailong (página anterior)
leva cerca de um minuto para trans-
portar os passageiros cerca de 330
metros rumo ao céu. Instalado no meio
de um parque nacional chinês, o “ele-
vador dos cem dragões” é o elevador
externo mais alto do mundo.
Um passeio nas cabines de vidro
do Globe permite uma vista inesquecí-
vel de Estocolmo, a capital da Suécia.
Os dois elevadores arredondados le-
vam os passageiros pela fachada exte-
rior até o teto do maior prédio esférico
do mundo. Pouco aconselhável para
quem tem medo de altura!
O caminho mais rápido para chegar
ao ponto mais alto de Lucerna, na
Suíça, é pegar o elevador Hammetsch-
wand. Com paredes de vidro, é o mais
alto da Europa ao ar livre, e se eleva
152,8 metros acima do solo.
O sistema de elevadores do Hotel
Marriott Marquis, em Nova York, é
nota 10 na inteligência do projeto. Ele
conduz os hóspedes ao elevador que
os levará mais depressa ao destino.
O hotel afirma que o sistema reduz
à metade o tempo de viagem nas
futuristas cabines de vidro.
O primeiro elevador paternoster
começou a funcionar em 1876, em Lon-
dres. Esses elevadores circulam para
cima e para baixo numa volta contínua,
como uma roda-gigante. No entanto,
com velocidade máxima de apenas
0,45 metro por segundo, são bem mais
98 | 07•2016
07•2016 | 99
A estação
do ano mais
perfeita
na Suécia
O porto de
Fjällbacka
07•2016 | 101
Läckberg, famosa escritora de roman-
ces policiais. Seus oito livros são am-
bientados nessa cidade preguiçosa
de 900 habitantes (durante o verão a
população pula para 15 mil pessoas).
Eu já li alguns livros dela, e sua ima-
ginação pareceu ainda mais impres-
sionante quando vi Fjällbacka à luz
do dia. Sério? Este lugar, uma cidade
sinistra, cheia de mistérios? Parecia
mais uma cidade miniatura daquelas
ferrovias de brinquedo.
Quando saí na minha primeira ma-
nhã, uma fila já havia se formado do
lado de fora da Setterlinds Bageri, velha
favorita de Ingrid Bergman, que fazia
verdadeiras peregrinações em busca
do seu delicioso bolo de amêndoas
Frutos do mar e cerveja artesanal
Mandelberg e de kardemummabullar
em Everts Sjöbod. (pãezinhos doces de cardamomo).
No píer, crianças muito louras de-
rio de Bohuslän podem parecer iguais, voravam saquinhos de jujuba. Lindas
mas há diferenças – principalmente mulheres e homens impossivelmente
quanto ao pescado. Há Lysekil, no sul, bronzeados caminhavam até Vette-
e seus mexilhões com sabor nitida- berget, uma colina de rocha graní-
mente de nozes. Grebbestad, ao norte, tica, no centro da cidade, com quase
e suas celebradas ostras. E Smögen, no 80 metros de altura. Em um lado me-
meio do caminho, com seu camarão nos íngreme, sobre o cais, caminhos
cor-de-rosa, de sabor adocicado. de paralelepípedos levavam a chalés
Fjällbacka, a mais bonita dessas com telhados vermelhos e fachadas
comunidades, é conhecida por dois em estilo vitoriano, conhecidos como
ilustres moradores. Ingrid Bergman snickarglädje ou “alegria do carpin-
manteve uma casa na ilha de Dannhol- teiro”. Cada jardineira nas janelas es-
men, na costa de Fjällbacka, de 1958 tava repleta de gerânios, e a bandeira
até sua morte, em 1982. Há um busto azul e amarela da Suécia tremulava
de bronze da atriz na praça da cidade. nos telhados.
Tours a pé são dedicados a Camilla Essa estranha mistura de aspereza e
102 | 07•2016
delicadeza – de rochas marcadas pelo estamos em 1884: velas derretem de
vento e roseirais – é o que dá a Bohus- garrafas de cerveja âmbar; lampiões
län sua comovente beleza. Mas seus descansam sobre barris de madeira;
recursos mais valiosos estão escondi- cordas e redes de pesca pendem dos
dos debaixo d’água. Dessas baías frias caibros nodosos.
e cristalinas vêm alguns dos melhores Em maio passado, os irmãos acres-
frutos do mar da Europa Setentrional, centaram seis quartos com cozinhas
entre eles os cobiçados e deliciosos la- e revestidos de madeira clara. Per me
gostins. Aqui, o mar é tudo. levou até uma das menores suítes no
Se você, como eu, veio a fim de de- andar de cima, com vista para a baía.
vorar a maior quantidade possível de Depois, saímos para coletar ostras.
frutos do mar, deveria programar uma Foi mais fácil do que eu esperava.
ida até Grebbestad, onde são cultiva- Do píer da casa de barcos, Per mergu-
dos metade das lagostas da Suécia, lhou seu ancinho de pegar ostras, de
70% de seus lagostins e 90% de suas quase três metros, vasculhou o fundo
ostras. Uma dica é dirigir de Fjäll- do mar e coletou meia dúzia de ostras
planas europeias, do tamanho e da
cor de bolachas-da-praia. Logo tínha-
mos três dúzias delas. Levamos nosso
ESSA ESTRANHA balde cheio para o pequeno barco
MISTURA DE ASPEREZA de pesca dos irmãos, e, com Lars no
E DELICADEZA É O QUE leme, fomos em direção à baía.
DÁ A BOHUSLÄN SUA Depois que o barco ancorou em
BELEZA COMOVENTE. uma ilhota onde focas se esbaldavam
ao sol, Per me deu uma faca, e estáva-
mos prontos para iniciar os trabalhos.
backa até Grönemad, e passar um dia Mesmo no verão, as ostras eram gran-
e uma noite numa vila de pescadores des e muito saborosas. Ainda geladas
que parece um acampamento viking, por causa da água do mar, elas nem
no fim do mundo. Se Fjällbacka é precisaram ficar no gelo. E combinavam
uma cidade que dorme, Grönemad perfeitamente com a excelente cerveja
definitivamente está em coma. artesanal de Per.
Os irmãos navegadores Per e Lars Depois de várias goladas e mastiga-
Karlsson promovem “safáris” de os- das, eu estava inebriado. Era início da
tras e lagostas do lado de fora de noite, mas o sol ainda estava a pino.
Everts Sjöbod, sua casa de barcos de “Vamos voltar para Sjöbod?”, pergun-
130 anos de idade. Dentro dela, ainda tou Lars, sugando a última ostra. Mais
07•2016 | 103
N O RU E G A
104 | 07•2016
No sentido horário, a partir do alto,
à esquerda: Mergulhando das docas
em Smögen; casas de barcos no
principal calçadão de Smögen;
vista de Fjällbacka a partir do mar;
ALL P HOTOS: ©M IKKEL VANG/TAVERNEAGENCY
07•2016 | 105
SELEÇÕES
DICAS DE VIAGEM
ONDE FICAR Gullmarsstrand Hotel, a partir de
Lysekil, atravessando o fiorde, este
Everts Sjöbod Grebbestad, gues-
moderno hotel e centro de conferên-
thouse rústica, com seis quartos, em
cias fica em uma península fora de
Grönemad. “Safáris” de crustáceos,
Fiskebacksil, quartos duplos a partir
festivais de frutos do mar, a partir de
de 183 euros: gullmarsstrand.se
75 euros: evertssjobod.se
ONDE COMER
Stora Hotellet Bryggan, hotel próximo
ao píer principal de Fjällbacka, quartos Setterlinds Bageri, Falkevägen 2A,
duplos a partir de 250 euros: storaho- Fjällbacka, melhor padaria da cidade.
telletbryggan.se Restaurang Matilda & Café Bryggan,
Hotell Smögens Hafvsbad, quartos Ingrid Bergmans Torg, Fjällbacka. Res-
contemporâneos no centro de Smö- taurante-bar-cafeteria popular com vá-
gen, duplos a partir de 182 euros: rios andares no calçadão:
smogenshafvsbad. se storahotelletbryggan.se
Smögens Rum o Stuga. Agência de Göstas Fisk, Fiskhamnsgatan 32,
aluguéis de temporada que oferece Smögen. Este restaurante simples de
quartos e chalés nas cercanias de frutos do mar é o favorito de Marcus
Smögen: info@rumostuga.se Samuelsson: gostasfisk.se
Strandflickornas Havshotell, principal Lyckans Stenugnsbageri, fabuloso
casa de quatro andares em Lysekil, de café e padaria orgânica de estrada,
caracaterística antiga, quartos duplos entre Smögen e Lysekil na estrada 171:
a partir de 195 euros: strandflickorna.se stenugnsbageri.se
106 | 07•2016
Vestindo capas impermeáveis os preços alcançaram a alta da esta-
amarelas, macacões e grossas botas ção: 18 euros cada 450 gramas.
de borracha, navegamos por alguns Mais cedo, no píer ensolarado, achei
quilômetros com Martin e sua tripu- que a capa de chuva fosse dispensável.
lação. As armadilhas para este tipo Mas agora, à medida que o céu escu-
de crustáceo lembram as de lagosta, rece, percebo o que nove gerações de
e recolhê-las do fundo do mar foi Olofssons podem ensinar a um Lind-
bem simples: Martin se aproximou berg sobre o clima no oeste da Suécia.
das boias laranja, e, com longas va- Podíamos avistar Hållö, o icô-
ras com ganchos na ponta, Marcus nico farol de Smögen, ainda sendo
e eu puxamos as linhas. Com uma sacudido por fortes ondas como se
manivela, içamos as armadilhas. A estivesse no coração do Atlântico.
maioria continha pelo menos alguns Deslizando pelo deque molhado,
lagostins, além de caranguejos ou me- adernando um contra o outro, Mar-
dusas. Trabalhando rapidamente, es- cus e eu conseguimos jogar todas as
vaziamos as armadilhas – as patas dos armadilhas de volta ao mar. Martin,
caranguejos beliscando nossos dedos enquanto isso, permanecia firme e
–, recolocamos pedaços de arenque sorridente no leme, seguro, na sua
salgado como isca e as deixamos no zona de conforto.
deque para serem usadas depois. – Jag älskar sommaren! – gritou ele,
Foi cansativo, mas emocionante. abrindo um sorriso enquanto uma
Depois de uma hora, recolhemos 63 onda gigantesca atingia o casco.
lagostins. O momento não poderia ser – Eu também amo o verão! – Marcus
melhor, disse Martin: naquela manhã, exclamou, e todos nós gargalhamos.
© 2015 POR PETER JON LINDBERG. TRAVEL+LEISURE (JUNHO DE 2015) TRAVELANDLEISURE.COM
07•2016 | 107
LIVRO DO MÊS
Ataque de
tubarão!
BY PE
POR
FROM
DO
PETETR
LIVRO
E RJEJE
SH A SH
N N INNI G
RK AASSAULT:
NSG SA ND
RK ASSAUALT:
N AMAZ
E NICO
NICO
AN AMAZ
LELEM M
I NG ISTO
NG RY
O O RE
STOORY
O RE
F SU
O FRV
SUI VAL
RV I VA L
108 | 07•2016
© HEATHER PERRY/GETTY IM AGES
07•2016 | 109
N
SELEÇÕES
Nicole ergue os olhos e avista dois Não importa; instintivamente, ele faz
jet skis cujos pilotos acenam para ela. o que seus ancestrais vêm fazendo du-
Ambos gritam em espanhol. Nicole rante séculos e acelera para examinar
acena de volta e ri, achando que estão a possível presa. O animal esbarra em
se divertindo. Nicole, que se vira. O que foi isso?!
O que ela não sabe é que os homens Ela sente um frio na barriga ao
estão gritando para que saia da água. perceber o que acabou de acontecer.
Viram dois tubarões na área e tentam Mas, antes que consiga reagir, o tuba-
avisá-la enquanto se esforçam para rão rasga sua coxa esquerda. Os den-
enxotar los tiburones em direção a tes, serrilhados como facas, dilaceram
águas profundas. a carne até o osso. O tubarão arranca
Um dos tubarões parte, mas o ou- mais de 30 centímetros de pele e mús-
tro se mostra persistente. Em vez de culo da perna de Nicole.
voltar para o mar aberto, ele segue Na mesma hora a água se incendeia
para a praia, pronto para combater os com ondas de sangue vermelho-vivo.
atacantes. A princípio, Nicole não sente dor.
Os pilotos gritam outra vez para Ni- Mas ela sabe a difícil situação em que
cole. E só então ela percebe que eles se encontra. Tubarões gostam de san-
não estão brincando. Há algo errado. gue. Ela precisa sair da água. Mas o
Ela gira na direção da praia e se tubarão destruiu sua perna esquerda.
apressa naquela direção. Mas o tu- Está imprestável. Então Nicole co-
barão-de-cabeça-chata está a poucos meça a usar os braços a fim de se
metros. É possível que tenha confun- impelir em direção à praia, esforçan-
dido Nicole com um peixe ou com o do-se para avançar na água. Mas sem
responsável pelo ataque dos jet skis. a perna esquerda o avanço é lento.
110 | 07•2016
O tubarão então circunda seu corpo, instinto, Nicole levanta o punho di-
mergulha sobre o braço esquerdo e o reito e soca com vontade o focinho do
abocanha com os maxilares preda- animal, ao mesmo tempo que puxa o
dores, aplicando uma pressão monu- braço esquerdo na direção do corpo.
mental. Nicole não acredita que aquilo Para seu alívio, a pressão da mandí-
esteja acontecendo. “Não!”, grita. bula se afrouxa. O tubarão a solta,
O tubarão está com seu braço in- submerge e se afasta.
teiro dentro da boca. Ele morde com Nicole fica se debatendo num mar
força e começa a puxá-la para debaixo de sangue, tomada pelo choque e pelo
d’água. Será o fim? Será desse jeito que trauma, e correndo o risco de perder a
minhas filhas perderão a mãe? A per- consciência. O braço esquerdo pende,
gunta cruza a mente de Nicole. quase arrancado. A perna esquerda
Ela vislumbra os olhos negros e ví- não se mexe. E a água continua fi-
treos do atacante. Penetrantes, indi- cando vermelha, o sangue que verte
ferentes. Ele olha para ela, gengivas de seu corpo se espalhando.
puxadas para trás, dentes à mostra. Ela tenta se mover na direção da
A força do tubarão é inacreditável. praia, mas está lerda. Fitando com
Mas, sem saber como, movida pelo olhos nebulosos os pilotos dos jet skis
CORTESI A DE NICOLE MOORE
07•2016 | 111
SELEÇÕES
e lutando para manter o autocontrole, com o rosto para cima. Está coberta
reúne forças e grita: “Vocês têm de me de sangue e areia.
tirar daqui!” Todos em torno de Nicole se acham
Os homens permanecem sentados em choque, tontos. Movem-se em câ-
em suas máquinas, imóveis, atordoa- mera lenta. A própria Nicole, ainda
dos com o que ocorreu. consciente, tenta juntar forças e fazer
Ela se pergunta se a escutaram. um exame em si mesma. Apoiando-se
De repente, um deles acelera na di- na areia, levanta um pouquinho a ca-
reção de Nicole, que se debate e corre beça e os ombros para olhar a perna,
o risco de afundar sob as ondas. O depois o braço. E vê como os ferimen-
homem estende o braço e, ao mesmo tos são graves, como sua situação é
tempo, ela salta com toda a força que desesperadora.
lhe resta na perna direita. As pontas “Socorro...”, ofega ao deixar a cabeça
dos dedos se encontram. O piloto lhe cair de volta na areia. Ela só tem von-
agarra a mão direita e acelera o jet ski, tade de se entregar à exaustão. Mas
rebocando-a até a praia e deixando seu treinamento médico lhe diz para
na água uma trilha de sangue. não ceder a um sono que pode ser
seu último adeus. “Falem... comigo!”,
“FALEM COMIGO... apela com a voz fraca. “Me mante-
POR FAVOR...”
O
nham acordada, por favor...”
piloto para o jet ski na beira Tinha perdido tanto sangue que res-
da praia, pula e puxa Nicole pirar se tornou quase impossível. O
pela areia, o rosto voltado coração não consegue bombear sangue
para baixo. Em seguida ele se apruma, suficiente para os pulmões. E, se o san-
incerto sobre o que fazer, achando gue não chega aos pulmões, a troca de
que ela está quase morta. oxigênio não acontece, o que provoca
Uma multidão começa a se formar, insuficiência respiratória. Uma torrente
falando em inglês e espanhol. Final- de sangue jorra da perna, lançando no
mente alguém percebe que ela precisa ar um esguicho de uns 30 centímetros
ser virada, e várias pessoas se incli- a cada vez que o coração bate.
nam para rolar seu corpo e colocá-la A voz de Nicole parece despertar as
112 | 07•2016
Ela tenta ficar calma, desa-
celerar a respiração e manter
o ritmo cardíaco lento, lu-
tando a cada minuto. Dá para
ver o sangue sair pulsando do
braço.
“Meu braço...”, diz, com a
voz enfraquecida. “Preciso de
um torniquete...”
Duas moças se dizem en-
fermeiras. Uma grita: “Alguém
aí tem um barbante?” Um
homem arranca o cordão da
bermuda e o entrega a uma
das enfermeiras, que faz um
torniquete no braço dilace-
rado de Nicole. Um especta-
dor sussurra: “Ela vai morrer.
Ninguém perde tanto sangue
assim e sobrevive.”
Mas as enfermeiras con-
tinuam falando com Nicole,
tentando mantê-la acordada.
O homem se concentra em sua
CORTESI A DE P ESO QUINTANA ROO, VI A S IPS E.COM
07•2016 | 113
SELEÇÕES
A
ao hospital.
equipe do pronto-socorro cor- Outro amigo ligou para Jay Moore,
reu contra o relógio para man- o marido de Nicole, no Canadá. Como
ter Nicole viva. Em oito horas policial, às vezes tinha de dar péssimas
de cirurgia, inseriram um cateter ve- notícias; depois do choque inicial, ele
noso central diretamente no coração entrou em ação. Alberto, pai de Nicole,
e bombearam bolsas e mais bolsas mora com o casal. Jay lhe deu a notí-
de sangue e produtos do sangue para cia, e ambos perceberam que tinham
mantê-lo funcionando. de ir imediatamente para Cancún.
Enquanto isso, depois que a ambu- Alberto embarcou no primeiro avião.
lância partiu, o gerente do hotel, em Jay ligou para os pais, que moram a
pé na praia com o chefe da segurança, três horas de distância, para que fos-
tentava entender o que tinha aconte- sem ficar com as meninas. Enquanto
© JOSE AN GEL ASTOR
cido. De repente, ele notou algo flu- isso, ele se preparou para ir a Cancún,
tuando na água. e partiu de Toronto no dia seguinte, no
– O que é aquilo? meio de uma nevasca.
– Meu Deus! – disse o chefe da se- Quando recuperou a consciên-
gurança. – É o pedaço da perna dela cia, Nicole estava num leito. Presa a
que o tubarão arrancou! um respirador mecânico, tinha um
114 | 07•2016
tubo passando pela garganta. Ela re- que achava que ela não conseguiria
cordou a sala de trauma. A tesoura. respirar sozinha.
Uma enfermeira se preparava para Nicole balançava a cabeça, tentando
cortar o biquíni caro que o pai lhe lhe dizer que não precisava do respi-
dera como presente de férias. Que es- rador mecânico. Ela sabia que conse-
quisito, pensou, estou morrendo, mas guiria respirar sem ele. “Não, não, está
me preocupo com uma coisa tão sem tudo bem”, o médico insistia. “Confie
importância quanto um biquíni. em mim, você ainda precisa dele.”
Ela estava zonza, em estresse trau- Incansável, Nicole continuou pe-
mático. Nem tinha certeza de estar dindo que o médico removesse o
viva. Teria perdido o braço? A perna? tubo. Finalmente, para seu alívio, ele
Não sabia de nada, e não havia nin- a desentubou. E ela respirou sozinha.
guém por ali para lhe dar respostas. Nicole soube que o tubarão arran-
O aparelho estava regulado para cara metade de sua coxa. O pedaço
respirar por Nicole num ritmo deter- fora levado ao hospital por seus ami-
minado pelo médico. Mas seu cérebro gos, e os médicos o tinham costurado
desperto queria assumir o controle e na perna. Mas o procedimento fora
respirar em ritmo próprio. O aparelho feito sem recuperar a corrente san-
não cedia. A impressão de Nicole é guínea, e era inevitável que o tecido
que tinha sobre a cabeça um traves- necrosasse.
seiro que a sufocava lentamente. Não Ela soube que o braço estava muito
entre em pânico, disse a si mesma. dilacerado. Os médicos achavam que
Sem ninguém por perto, ela percebeu poderia ser salvo. Mas aparentemente
que a única opção era respirar junta- nada tinham feito além de enfaixar, e,
mente com a máquina em vez de lutar no segundo dia, Nicole notou que a
contra ela. Inspire... pausa. Expire... mão estava ficando preta.
pausa. Inspire... A dor no braço continuava aumen-
Finalmente, o médico entrou no tando. Ela ainda estava com o cateter
quarto. Da melhor maneira possí- venoso central indo diretamente ao
vel, Nicole pediu com gestos que ele coração. Havia muitas toxinas cor-
tirasse o tubo. Ele sorriu e lhe disse rendo pelo corpo, decorrentes do
07•2016 | 115
SELEÇÕES
J
aos curativos. O cheiro de pus e das
ay entrou em contato com a se- secreções era avassalador. O fato de
guradora e depois telefonou para o pedaço costurado na perna de Ni-
a mãe, que trabalhava para um cole não ter circulação sanguínea e
médico num hospital no norte de estar simplesmente apodrecendo era
Ontário. A mãe de Jay conversou com chocante. E a alteração da cor dos de-
seu chefe, que ligou para a Dra. Laura dos não era um bom augúrio para a
Snell, do Centro Sunnybrook de Ciên- salvação do braço. Os dedos estavam
116 | 07•2016
esverdeados, havia pus e mui-
tas secreções.
Na sala de cirurgia, a Dra.
Snell lavou a areia e os detri-
tos dos ferimentos. Os dois
médicos limparam a área e
removeram os tecidos mortos,
danificados e infeccionados.
Viram que não havia corrente
sanguínea no braço além do
ponto onde estava a maior
parte da lesão.
Eles ligaram para o serviço
de doenças infecciosas do
Sunnybrook, porque sabiam
que as mordidas de animais
são os piores ferimentos; a
boca do tubarão é um ninho
de culturas bacterianas. De-
pois que o organismo começa
a gerar a reação inflamató-
ria à infecção, recuperar-se
pode ser difícil. Se entrasse Jay e Nicole, vestida e pronta para encontrar as
em sepsia, Nicole talvez não duas filhas para jantar na lanchonete.
sobrevivesse.
A equipe médica removeu o pe- conversar. Nicole era extremamente
daço morto suturado na perna de positiva e disposta, ansiosa para sa-
Nicole e o substituiu por um grande ber tudo e pronta para avançar. Não
curativo. Depois a Dra. Snell soltou as importava o que a Dra. Snell lhe dis-
suturas do braço, para aliviar parte da sesse, a resposta era sempre: “Tudo
CORTESI A DE NICOLE MOORE
07•2016 | 117
SELEÇÕES
para elas”, recordou Nicole depois. quietante: a operação não dera certo.
“Mas tudo deu certo. Elas entraram Aquele foi um dia de derrota.
e foi ‘Mamãããããããe!’. Muitos abra-
HORA DE IR EM FRENTE
A
ços. Em menos de uma hora, estavam
aconchegadas na cama comigo.” o ser informada, Nicole per-
Em 8 de fevereiro, Nicole voltou cebeu que voltara para onde
ao centro cirúrgico pela terceira vez estava quando chegara do
depois de chegar ao Sunnybrook. Os México. O braço ainda estava aberto.
médicos tirariam tecido da perna A perna tinha uma ferida enorme, o
direita para tentar cobrir o fêmur es- osso ainda exposto. Eles não sabiam
querdo. Passaram dez horas retirando a gravidade de sua infecção. E a dor
pele, deslocando gordura e refazendo ainda era intensa.
a rede sanguínea. A equipe cirúrgica A má notícia finalmente alquebrou
ficou satisfeita com o resultado. Mas o espírito de Nicole Moore. “Fiquei ar-
sabiam que enxertos, como qual- rasada, esmagada”, recordou ela. “Eu só
quer transplante de órgãos, podem pensava: Será que tudo vai dar errado?
ser rejeitados. Em geral, a rejeição Chorei, chorei e falei que não queria
acontece nas primeiras 48 horas. As- mais receber visitas. ‘Me deixem em
sim, no terceiro dia a esperança era paz’, era o que eu dizia a todo mundo.”
grande. O quarto dia veio e se foi. O Na manhã seguinte, ela acordou
quinto também. com o coração apertado. Fez a si
Mas aí chegou o sexto dia. Eles ve- mesma a costumeira exortação e
rificavam o enxerto de tantas em tan- pensou em todas as pessoas que a
tas horas, até que uma enfermeira viu ajudavam, a incentivavam, a anima-
algo errado. Chamaram a Dra. Snell, vam. “Quando não consegui mais
que começou a remover os grampos e me aguentar, foram os outros que
a cortar, para ver se havia circulação. me ergueram”, disse mais tarde. Ela
Não havia. Nicole voltou à sala de viu as fotos na parede, as páginas dos
cirurgia. Os médicos passaram algu- cadernos de recordações das filhas,
mas horas tentando salvar o enxerto. os cartões, os anjos, as obras de arte.
Mas tiveram de enfrentar um fato in- Uma amiga levou-lhe uma enorme
118 | 07•2016
embalagem cheia de ba-
las em forma de tubarão, e
criou-se um ritual: todas as
visitas tinham de morder
ou atacar uma das balas.
“As pessoas me deram
todo tipo de coisa para ani-
mar meus dias e demons-
traram apoio”, recordou
Nicole. “Sua atenção e seu
carinho me comoveram
profundamente.”
Ela recorreu ao laptop e,
com uma só mão, come-
çou a escrever aos outros
para exprimir seu apreço.
Criou um blog para contar
sua história, se comunicar
com amigos e familiares e
agradecer a todos o apoio.
E assim foi se recupe-
rando, dizendo à enfer-
meira: “Hoje é um novo
Nicole com Tia e Ella, felizes de estar com a mãe,
dia. Eu me sinto um lixo,
que voltou para casa dois meses depois do ataque.
mas vamos erguer o queixo
e continuar avançando.” mais uma vez e viram que mais tecido
A Dra. Snell e o Dr. Fagan não enten- morria e apodrecia. Concluíram que a
diam por que o enxerto fora rejeitado. amputação era inevitável.
Todos os tecidos pareciam limpos e Quando foi informada da decisão,
viáveis. O osso parecia saudável. E Nicole manteve a calma. Ela já sabia
CORTESI A DE NICOLE MOORE
durante cinco dias a pele estivera boa. que houvera lesões nervosas graves.
Mesmo assim, o que ocorrera não po- Mesmo se conseguissem salvar o
dia ser revertido. Era hora de avançar, braço, ele seria praticamente um peso
ou seja, descanso para Nicole no hos- morto. E ela foi forte, na esperança de
pital seguido por cirurgias semanais e que a dor constante cessasse. “Isso
limpeza contínua do braço e da perna. aconteceu comigo”, disse. “Tenho de
Eles verificaram o braço de Nicole melhorar.”
07•2016 | 119
SELEÇÕES
E
– Mamãe, dói muito? m 4 de março de 2011, o braço
Nicole respondeu com a verdade: de Nicole foi amputado. A ci-
– Dói. rurgia correu bem, e ela con-
– Então tudo bem – disse Ella. – tinuou se esforçando. Com cuidado,
CORTESI A DE NICOLE MOORE
120 | 07•2016
Em seis dias, Nicole parou de tomar Em novembro de 2011, menos de um
os analgésicos. Começou a andar com ano depois do ataque, Nicole voltou à
bengala e aprendeu a subir escadas. praia de Cancún. Queria enfrentar o
Ainda tinha um buraco na perna e dor medo, além de descobrir mais sobre
no toco do braço esquerdo. Mas, final- seu tratamento médico no hospital
mente, dois meses depois do ataque mexicano. Ela também pediu maior
do tubarão, ela estava pronta. segurança na praia. Os ataques de tu-
Era 1-º de abril, o Dia da Mentira. barões são raros, mas devastadores. E
Nicole e Jay não disseram nada às me- a associação de hotéis de Cancún de-
ninas. Quando Tia e Ella voltaram da senvolveu várias recomendações para
escola, Jay lhes disse que tinha uma prevenir ataques, como guarda-vidas
surpresa para elas e mandou que a equipados com binóculo e um sistema
procurassem. Elas olharam por toda de alerta com bandeiras vermelhas.
parte, seguindo as pistas que o pai Hoje, Nicole trabalha com várias
lhes dava. Mas nada encontraram. entidades para dar apoio aos sobrevi-
– Primeiro de Abril! – gritou Jay, fi- ventes de ataques de tubarões e para
nalmente. conservar a população de tubarões do
– Puxa, pai – responderam as me- mundo, que vem se reduzindo. Ela faz
ninas, desapontadas. – Pensamos que apresentações públicas que sempre
você tinha comprado o Nintendo que a deixam a plateia inspirada. Voltou a
gente queria. trabalhar como supervisora hospita-
Então as duas seguiram juntas para lar e, desde 2012, participa da Corrida
a cozinha e a encontraram. “Não há dos Guerreiros, uma cansativa prova
palavras para descrever aquela efu- de obstáculos de cinco quilômetros
são de emoções”, conta Nicole. “Foi por pântanos e estradas de terra
um dos momentos mais preciosos de cheias de lama.
minha vida.” E diz: “Acredito que podemos esco-
Nicole enfrentou uma extenuante lher como enfrentar a vida. Podemos
rotina de reabilitação e sofreu várias vivê-la ou nos recostar e deixar que
outras cirurgias para reparar a perna. ela passe. Por mim, digo: vamos em
Ela ainda tinha dificuldade para se ves- frente!... Detesto me queixar, e, quando
tir, tomar banho e fazer o serviço do- dá vontade, me lembro de que estou
méstico. E, como muitos amputados, viva e que isso é precioso.”
sofria com a dor fantasma, o que não
lhe permitia usar a prótese de braço. Leia mais sobre Nicole em
www.sharkassault.com.
SHARK ASSAULT: AN AMAZING STORY OF SURVIVAL, DE PETER JENNINGS E NICOLE MOORE. © 2015 PETER JENNINGS E NICOLE MOORE,
PUBLICADO POR DUNDURN PRESS LIMITED.
07•2016 | 121
Piadas de caserna
Respostas
1. aça – C: mulato alourado (vem 9. impala – C: tipo de antílope (veio
do quimbundo hasa, ‘esbranquiçado pelo quimbundo mpala; parece ser
[albino]’). na origem uma palavra importada do
2. babaça – B: irmão ou irmã gêmea zulu, igualmente língua banta, com
(do quimbundo babasa, ‘gêmeos’, presença em vários idiomas africanos
plural de kabasa, ‘gêmeo’). da família, em geral através do inglês).
SOME OS PONTOS E CONHEÇA SEU NÍVEL: 4–9: bom 10–12: excelente 13–15: excepcional
124 | 07•2016
Desafio Seleções
Responda a estas perguntas e revele seu gênio interior.
07•2016 | 125
Rir
É O MELHOR REMÉDIO
“É tão calmante...”
07•2015 | 127
128 | 07•2016
Sorriso final