FEVEREIRO 2020

DRAMA DA VIDA REAL

Uma serpente morta ataca!
PÁGINA 94

REPORTAGEM ESPECIAL
O professor que mudou
a minha vida
PÁGINA 110

RESPIRE
FUNDO
A ocorrência de doenças respiratórias
está aumentando no mundo todo.
Saiba como se proteger.
PÁGINA 78 O verdadeiro
amor não
ISSN 1516-7038

Leia um livro, morre

02002 >

entre para o clube 9 771516 703006 PÁGINA 52

PÁGINA 86

Vamos parar de ISSN 1516-7038

02002 >

desperdiçar comida 9 771516 703006

PÁGINA 44
Fevereiro 2020 • R$ 14,90
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 CONTENTS
SUMÁRIO
Artigos
44 Vamos parar de
desperdiçar comida
Da infância difícil na Rússia
soviética à sua escolha como
Europeu do Ano pelo Reader’s
Digest, Selina Juul vem travando
uma longa luta contra o
desperdício de alimentos.
52 “Nunca me esqueci de você”
Passadas mais de seis décadas,
aquele romance adolescente
ainda tem uma chance?
62 O vilarejo que deu a
volta por cima
Um homem decidido e
empreendedor prova que,
com criatividade, é possível
salvar pequenas comunidades
da decadência.
70 Vida de inseto
Preparamos uma festa visual
multicolorida. Conheça seus
pequenos protagonistas.
78 Respire fundo
A doença pulmonar obstrutiva
crônica (DPOC) afeta milhões
de pessoas no mundo todo. O
2 seleções 02.2020
mais grave é que esse número
está aumentando. Aprenda a
identificar seus sintomas.
86 Livros que falam
Os clubes de leitura estão trans-
formando uma atividade solitária
em movimento de socialização.
Drama Da viDa real
94 A vingança da serpente
Para salvar a mulher, Jeremy
Sutcliffe decapita a cascavel que
a ameaçava, supondo que seria
o fim da cobra. Engano seu.
102 Joias do Pacífico Sul
Está em busca de um destino
paradisíaco para a lua de mel?
© AndreAs Mikkel HAnsen; © AlAn Henderson
Ou para as férias com a família?
Descubra cinco ilhas que vão
tornar sua viagem inesquecível.
reportagem especial
110 O professor que mudou
a minha vida
Quatro educadores que
marcaram a vida de seus alunos,
realizando o verdadeiro sentido
da educação. Conheça suas
histórias inspiradoras.
 Departamentos
6 Frente e verso
10 Interaja
23 Papo de livro A pesca milagrosa
por claudia nina
25 Boas novas
30 Essas crianças...
42 Flagrantes da vida real
60 Entre aspas
76 Ossos do ofício
121 Enriqueça seu vocabulário

44
123 Piadas de caserna
124 Desafio Seleções
126 Rir é o melhor remédio
128 Sorriso final

17
70 Neste mês
12 Saúde
Combate à fadiga
Um menino muito doente
Notícias do mundo da medicina
20 Pets
Quatro motivos para o seu gato
ficar mal-humorado
28 Brasil
Visão de moda includente
32 Vida bem vivida
Ninguém é velho demais
para aprender
35 Demos um jeito
38 Ponto de vista
Papai urso

02.2020 seleções 3
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Editora de Arte Tanara Vieira Presidente e CEO Bonnie Kintzer
Estagiários Douglas Ferreira e Julia Monsores Vice-presidente e Diretor de Operações Internacionais
Gerente de Assinaturas e Circulação Avulsa Brian Kennedy
Nicole Ingouville Editor-chefe, Edições Internacionais Raimo Moysa
Supervisor de Produção Felipe Figueiredo
Gerente de Negócios Rodrigo Alvim
Coordenadora do Serviço ao Cliente Keith Ferreira
Diretor-executivo Luis Henrique Fichman

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4 seleções 02.2020
 VOCÊ EM SELEÇÕES

Nem o céu é o limite quando se trata de piadas,

e isso nosso leitor Amaury Bentes pode confirmar
com propriedade. Confira sua história
divertida e outras em “Flagrantes da vida real”,
na página 42.

CONTE UMA HISTÓRIA ENGRAÇADA E GANHE ATÉ R$ 400*

Sua história real pode ser
publicada em Flagrantes
da vida real (experiências
do dia a dia que revelem a
natureza humana), Ossos
do ofício (humor no traba-
lho), Piadas de caserna
(humor na carreira militar)
e Essas crianças... (o
mundo do ponto de vista
delas). Piadas podem ser
publicadas em Rir é o
melhor remédio.
As regras
Por favor, inclua nome, en-
dereço e telefone em suas
*O critério de atribuição de valor abrange: originalidade e extensão da contribuição.
contribuições. Todo mate-
rial previamente publicado
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02.2020 seleções 5
6 seleções 02.2020
04.2019
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04.2019 seleções
02.2020 7
8 seleções 02.2020
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 …E VERSO
O que parece um salão de baile
abandonado, na verdade, é o interior
de um violino! O artista Adrian Borda
costuma trabalhar mais com o pincel
do que com a câmera, mas uma
campanha publicitária da Berliner
Philharmoniker inspirou o pintor
romeno a criar uma série de fotos
extraordinárias: em sua cidade natal,
Reghin, também chamada de cidade
dos violinos, ele começou a usar
instrumentos velhos e aposentados
para criar essas extraordinárias
catedrais de luz.

02.2020 seleções 9
 INTERAJA
A edição de fevereiro da revista Seleções é dedicada aos leitores
Ana Cristina Heylmann, Taquara (RS), Luciana Silva Ribeiro,
Salvador (BA), e Beatriz Perosi, Piracicaba (SP).

AÇÃO URGENTE
A matéria “Batalha pela
sobrevivência”, da edição de
janeiro de 2020, que aborda o BATA L H A P E L A O debate sobre a morte ou não da Grande Barreira
de Coral continua acirrado. DAVID LEVELL

debate sobre a morte ou não da SOBREVIVÊNCIA investiga o que está realmente acontecendo no
mais renomado parque marinho da Austrália.

Grande Barreira de Coral, é um

alerta para todos nós. A ação
humana está mudando o clima 82 83

do planeta e todos nós somos

responsáveis por isso. Se não mudarmos logo, iremos acabar
com o planeta! —Laura Gonçalvez, São Paulo (SP)
PONDO OS PONTOS NOS IS todos os “erros” listados. Digo quase
De grande importância essa matéria todos porque pelo menos o primeiro
sobre o canabidiol (janeiro de 2020). item eu nunca fiz. Sempre vou conhe-
Eu mesmo acreditava que essa subs- cer meus amigos de quatro patas
tância era o mesmo que a maconha – pessoalmente.
e agora sei que não é. Acho que toda —Marília Gonçalves, Vitória (ES)
a polêmica em torno deste assunto é
fruto da desinformação.
—Jorge Cotias, São Paulo (SP) QUEREMOS OUVIR VOCÊ
Entre em contato conosco por e-mail:
CUIDADO COM OS AMIGOS selecoes@selecoes.com.br ou por carta:
PELUDOS Revista Seleções – Caixa Postal 13.525
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A seção sobre pets da edição de
nome completo, endereço, CPF e telefone. Cartas
janeiro (“Mancadas comuns”) é e e-mails podem ser editados por motivo de con-
ótima. Percebi que já cometi quase cisão e usados em mídia impressa e eletrônica.

10 seleções 02.2020
 Festival de Prêmios do
26º¯ Grande Concurso

Conheça o mais novo ganhador de Seleções!

PRÊMIO DE AGRADECIMENTO

R$ 5.000,00*
Aldo Mattos
Rio de Janeiro - RJ
Número da sorte: 128768

Aldo Mattos, do Rio de Janeiro, acaba de se

juntar ao time de ganhadores de Seleç�es!
Faça como ele e fique atento �s promoç�es
de Seleç�es do Reader's Digest.
Voc� pode ser o próximo ganhador!

Promoção Comercial vinculada a Títulos de Capitalização da modalidade incentivo emitidos por ICATU CAPITALIZAÇÃO S/A, CNPJ/MF nº 74.267.170/0001-73 e Processo SUSEP nº
15414.900632/2019-07 . Período: 08/05/2019 a 14/12/2019 . 1 Prêmio no valor de R$ 5.000, (Prêmio de Agradecimento) bruto de imposto de Renda – IR (25%), conforme legislação
em vigor. O Regulamento está disponível em www.selecoes.com.br. SAC Icatu Capitalização 08000 286 0109 . Ouvidoria Icatu Seguros 0800 286 0047. Imagens meramente ilustrativas.
 SAÚDE
O primeiro passo
é se observar para
descobrir a causa
Combate
à fadiga
por Christina Frangou
V
ocê não sente vontade de sair
da cama e, quando finalmente
consegue, não tem energia para
se exercitar. Durante o dia, não tem
condições de se concentrar em nada.
Assim como ter pesadelos e cortar
o dedo com papel, a fadiga acontece
com todo mundo em algum mo-
mento. Ela é citada por até um terço
dos que consultam o clínico geral.
A fadiga costuma ser uma reação
normal a coisas como estresse, mu-
dança dos padrões de sono ou carga
pesada de trabalho. Como nem sem-
pre podemos evitar essas coisas, o Dr.
12 seleções 02.2020
Tom Declercq, professor de medicina
da Universidade de Ghent, na Bél-
gica, sugere descansar mais do que
de costume nessas épocas para res-
taurar o nível de energia. “É impor-
tantíssimo dar ouvidos ao corpo
quando ele pede mais sono”, explica.
Mas essa é a parte complicada:
© istock.com/drb images
embora muitas vezes se resolva com
mais repouso e mudanças do estilo
de vida, a fadiga também pode ser
sintoma de algo mais grave. Declercq
recomenda consultar o médico
quando qualquer outra mudança
física for percebida junto do cansaço
ou se a fadiga persistir por mais de
15 dias depois das alterações do
estilo de vida.
Quando falar com o médico, é es-
sencial que você descreva com deta-
lhes a experiência de exaustão, para
ajudá-lo a identificar a causa subja-
cente. Embora geralmente a fadiga
seja definida como falta de energia e
motivação, ela pode se manifestar de
forma física, mental ou ambas. Algu-
mas perguntas a fazer antes da con-
sulta médica: você não se sente
renovado nem depois de uma longa
A FADIGA
TEM UM PAPEL EM
10% DE TODOS OS
ACIDENTES DE
TRÂNSITO.
noite de repouso? Acha difícil se
concentrar em projetos? Cansa-se
depressa com a atividade física?
A fadiga acompanhada de febre
pode indicar infecção, enquanto a
tontura pode ser sintoma de anemia.
Dificuldade de respirar pode indicar
doença cardíaca. Caso sinta tristeza
ou nervosismo, a depressão ou o
transtorno de ansiedade pode ser a
causa da fadiga, que pode melhorar
com um antidepressivo ou com tera-
pia cognitivo-comportamental.
A fadiga que surge de repente e
persiste, associada a emagrecimento
inesperado ou suores noturnos, pode
ser sintoma de câncer.
Naturalmente, a qualidade e a
quantidade de sono devem ser leva-
das em conta. A má higiene do sono –
como dividir a cama com um animal
de estimação ou ficar de olho na tela
dos aparelhos eletrônicos tarde da
noite – pode perturbar o repouso. A
apneia do sono é outro culpado co-
mum; quem tem a doença fica sem
respirar por períodos de pelo menos
dez segundos enquanto dorme.
Qualquer quantidade de álcool
pode piorar o sono, mas quanto
maior o consumo, pior. Embora possa
ajudar a adormecer, o álcool inter-
rompe o ritmo circadiano, sendo um
obstáculo ao repouso restaurador.
Quando a fadiga se transforma em
síndrome da fadiga crônica (SFC)?
Não há exame diagnóstico específico,
mas a SFC (também chamada de en-
cefalomielite miálgica ou doença sis-
têmica de intolerância ao esforço) é
definida como uma fadiga profunda e
prolongada que dura pelo menos seis
meses sem causa identificável, preju-
dica a função cognitiva e provoca uma
exaustão debilitante mesmo depois de
esforço físico ou mental pequeno. Não
se sabe quantos sofrem com a SFC
nem o que está por trás dela.
Embora não cure, o exercício
pode ajudar em casos persistentes.
“Quando a pessoa tende a sofrer de
fadiga crônica, ficar na poltrona não
é uma boa ideia. É muito melhor se
mexer”, aconselha Declercq.
02.2020 seleções 13
 MISTÉRIO
MÉDICO
Um menino
muito doente
por Lisa Bendall
PACIENTE: Daniel*, 3 anos
SINTOMAS: Dor de barriga e febre
MÉDICO: Dr. Saar Hashavya, chefe do
pronto-socorro pediátrico do Centro
Médico Hadassah, Jerusalém, Israel
A
princípio, os pais de Daniel
não se surpreenderam quando
o menininho se queixou de dor
de barriga. Estavam no fim de março
de 2019, não muito depois da festa
judaica de Purim, e o menino de
3 anos tinha exagerado nos doces.
Mas, quando Daniel começou a
recusar comida e a vomitar, eles o
levaram a uma clínica. O médico
concluiu que, provavelmente, era
gastroenterite causada por um vírus
*Dados alterados para proteger a privacidade.
14 seleções 02.2020
e que terminaria em três dias. Os
pais foram aconselhados a dar ao
filho repouso e líquido.
No entanto, na manhã do quarto
dia, a dor estava muito pior. Em vez
de brincar como de costume, Daniel
estava encolhido, febril e não conse-
guia defecar. Não comia quase nada.
Preocupados, os pais o levaram ao
pronto-socorro pediátrico do Centro
Médico Hadassah.
“Para nós, pediatras, há uma linha
muito clara entre uma criança de
ilustrado por Victor WoNg
boa aparência e uma criança de má
aparência”, diz o Dr. Saar Hashavya.
“São muitos detalhes: a cor da pele,
a postura, o modo de falar. Tudo isso
compõe o quadro maior de uma
criança que não está bem.”
Aquele menino não tinha uma
gastroenterite comum, intuiu
Hashavya.
Outra dica de que o estado de
Daniel talvez fosse grave era a sensi-
bilidade no quadrante inferior di-
reito do abdome. Isso não é comum
com vírus intestinais simples, explica
Hashavya. Enquanto isso, o exame
de sangue de Daniel revelou alta
contagem de leucócitos e marcado-
res de inflamação, sugerindo a pre-
sença de uma infecção.
Para os médicos, esses sintomas
indicavam apendicite aguda, que
ocorre quando o apêndice, uma
bolsa estreita presa ao cólon, se in-
fecciona por causa de uma obstrução.
Não é comum em crianças tão pe-
quenas, mas pode ocorrer. O trata-
mento é a remoção do apêndice.
“Ficamos ansiosos e atordoados”,
conta Adam, pai de Daniel. “Imagi-
namos as piores possibilidades.”
Quando um apêndice infeccionado
se rompe, as bactérias podem se
espalhar pelo intestino.
Aparentemente, a ultrassonografia
confirmou o diagnóstico. O técnico
não conseguiu ver direito o apên-
dice; minúsculo, o órgão nem sem-
pre aparece. Mas claramente havia
muito líquido presente, o que indi-
cava inflamação do intestino. “Todas
as peças do quebra-cabeça indica-
vam apendicite”, diz Hashavya. “Na-
quele momento, não havia razão
para pensar que outra coisa surgiria.”
Também não parecia haver motivo
para mais exames. Uma tomografia
daria aos médicos uma visão melhor
do abdome de Daniel, mas expô-lo à
radiação desnecessária não mudaria
o fato de que ele precisava de cirurgia
com urgência. “Sabíamos que havia
algo errado e precisávamos agir de-
pressa”, lembra Hashavya.
OS CIRURGIÕES
ENCONTRARAM
ESTRANHOS OBJETOS
ESFÉRICOS NO
INTESTINO DE DANIEL.
Três horas depois de chegar ao
hospital, Daniel estava na sala de ci-
rurgia, e a equipe médica fez uma
pequena incisão no abdome do jo-
vem paciente. Eles inseriram uma
câmera para “caçar” o apêndice in-
feccionado. Enquanto exploravam a
cavidade abdominal e olhavam o
monitor, os cirurgiões viram muito
pus. Inesperadamente, também vi-
ram aderências – alguns tecidos esta-
vam literalmente grudados – e, para
sua surpresa, um apêndice de apa-
rência normal.
Então a situação ficou ainda mais
estranha. Ao mover a câmera, os ci-
rurgiões descobriram no intestino
um grupo de objetos estranhos, pe-
quenos e esféricos. Eram lisos, bri-
lhantes e de várias cores: vermelho,
roxo, azul e verde. Parecia que essas
bolinhas bonitas estavam provo-
cando o caos no abdome de Daniel.
02.2020 seleções 15
 Sem que os pais soubessem, cerca
de uma semana antes de surgirem os
sintomas, um dos colegas de Daniel
na pré-escola levara um jogo de ímãs
para mostrar aos amigos. Para uma
criança pequena que adora doces
coloridos, as bolas magnéticas pare-
ceram tentadoras, e ele não resistiu e
as engoliu.
DANIEL SOFRIA DA
MESMA DOENÇA QUE
MATOU RODOLFO
VALENTINO, ASTRO DO
CINEMA MUDO.
Um ímã sozinho passaria de forma
inofensiva pelo corpo, mas Daniel
engoliu 18 deles. Os ímãs tinham se
unido em dois grupos e se abrigado
em partes diferentes do sistema di-
gestivo: o duodeno, no alto do intes-
tino delgado, e mais abaixo. A
atração magnética puxara as duas
partes do corpo uma para perto da
outra, espremendo os tecidos entre
elas, cortando o suprimento de san-
gue e, por fim, perfurando-os.
Daniel tinha uma versão da sín-
drome de Valentino, na qual uma
Viver no aqui e agora
Não desista de toda a sua alegria por uma ideia que você
tinha sobre si mesmo e que agora não é mais verdadeira.
C H E RY L S T R AY E D, E S C R I TO R A
16 seleções 02.2020
ruptura rara do duodeno provoca
sintomas que imitam perfeitamente
a apendicite aguda. Geralmente, o
problema, cujo nome se deve ao fato
de Rodolfo Valentino, astro do ci-
nema mudo da década de 1920, ter
morrido por essa infecção, é causado
por uma complicação da úlcera pép-
tica. “Como em nosso caso, os médi-
cos foram extrair o apêndice de
Valentino e descobriram que estava
normal”, explica Hashavya. “O que
parece apendicite pode ser uma
perfuração.”
Os ímãs foram removidos do ab-
dome de Daniel e o tecido lesionado
foi suturado. Nem sempre infecções
tão extensas saram com perfeição,
e o paciente pode desenvolver um
vazamento intestinal pós-cirúrgico.
Mas, felizmente, o reparo foi bem-
-sucedido. Daniel tomou antibióticos
durante uma semana e, aos poucos,
voltou a comer. Os pais dizem que,
embora tenham sido necessários
cerca de dois meses para ele se
recuperar totalmente, não houve
efeitos duradouros.
“Agora ele se sente ótimo”, diz o
pai. “Não fazíamos ideia de que os
ímãs eram um perigo tão grande
para as crianças.”

Notícias do
MUNDO DA
MEDICINA
Flavonoides podem
compensar hábitos insalubres
Embora seja claríssimo que frutas,
legumes e verduras promovem a
saúde, os cientistas ainda procuram
todos os motivos disso. Um deles
pode ser os flavonoides, compostos
celular: © istock.com/lVcaNdy
anti-inflamatórios fáceis de encon-
trar nas plantas. Num grupo de mais
de 56 mil dinamarqueses que foram
acompanhados durante 23 anos,
os que consumiram pelo menos
500 mg de flavonoides por dia
tiveram menos risco de morrer.
O efeito positivo aparente dos
fotografia de the Voorhes
flavonoides foi maior entre os fu-
mantes e bebedores inveterados. O
risco maior de mortalidade desse
grupo não foi completamente com-
pensado, mas, se você tem dificul-
dade de abandonar os maus
hábitos, o consumo
abundante de alimen-
tos ricos em flavonoi-
des, como maçã, chá ou
brócolis, pode lhe ofere-
cer alguma proteção.
Jogo de celular na
recuperação pós-
-trabalho
Jogos informais no celular podem
ajudar a dissipar o estresse ligado ao
trabalho, como indica um experi-
mento britânico. Durante cinco dias,
os participantes passaram dez minu-
tos diariamente relaxando com um
jogo de encaixar formas ou um apli-
cativo de meditação. A recuperação
da tensão do trabalho foi medida
pelo sentimento de estar relaxado,
afastado do trabalho, capaz e no
controle. O aplicativo de meditação
foi associado a mais relaxamento no
primeiro dia, mas parece que o jogo
ofereceu benefício crescente com o
passar do tempo. Talvez seja porque
os jogadores ficaram cada vez me-
lhores, aumentando o prazer do
jogo. Portanto, se os joguinhos são
sua ideia de diversão, não se sinta
culpado com uma sessão curta: ela
pode até lhe fazer bem.
02.2020 seleções 17
Mesmo baixa, a poluição
do ar ameaça o pulmão
Não são só os moradores das cidades
mais fumacentas do mundo que têm
razões para defender o ar mais
limpo. Na Europa, três quartos dos
habitantes urbanos moram em áreas
que não atendem às diretrizes da
Organização Mundial da Saúde
(OMS) para matéria particulada
(partículas pequenas de fontes como
o escapamento dos carros, por exem-
plo). Numa amostra de pesquisados
de 40 a 69 anos, a doença pulmonar
obstrutiva crônica foi mais preva-
lente nos que residiam em lugares
que ultrapassavam a diretriz do que
nos que estavam expostos à fumaça
passiva dos cigarros em casa. “Nossa
pesquisa também indica que a expo-
sição à poluição do ar contribui com
o processo de envelhecimento do
pulmão”, acrescenta Dany Doiron,
do Centro de Saúde da Universidade
McGill, de Montreal, principal autor
do estudo.
18 seleções 02.2020
Como não se esquecer dos
conselhos do médico
O estado de espírito negativo antes de
uma consulta tende a reduzir a aten-
ção a tópicos desagradáveis. Portanto,
é preciso se acalmar para estar bem e
guardar informações importantes
sobre sua saúde. Num estudo ameri-
cano recente, quase 1.450 participan-
tes receberam informações sobre
gripe, câncer, HIV, herpes e gonorreia.
Os que fizeram um exercício de rela-
xamento antes absorveram melhor a
mensagem. Respirar fundo algumas
vezes ou ouvir música calmante na
sala de espera pode valer a pena. Os
pesquisadores sugeriram também le-
var um amigo para fazer anotações.
O perigo do tratamento
excessivo do diabetes
Para os diabéticos, não controlar o ní-
vel elevado de glicose aumenta a pro-
babilidade de complicações graves,
como lesões nervosas ou insuficiência
renal. Mas medicar em excesso tam-
bém é arriscado. Estudos recentes dos
Estados Unidos, do Canadá e da Eu-
ropa indicam que não é raro receber
tratamento mais intensivo do que o
© istock.com/loNdoNeye
indicado pelo nível de hemoglobina
A1C (uma média dos níveis mais re-
centes de açúcar no sangue). O trata-
mento em excesso aumenta o risco de
hipoglicemia e pode causar tontura,
confusão mental, quedas e internação
hospitalar. Às vezes, episódios graves

levam à morte. Os idosos são mais
vulneráveis à hipoglicemia, e para
alguns talvez fosse bom reduzir a
terapia do diabetes depois de discutir
os detalhes com o médico.
Proteja os netos dos remédios
A maioria dos avós não se preocupa
muito com os riscos que seus remé-
dios representam para os netos, como
indica a Pesquisa Nacional Americana
sobre Envelhecimento Saudável. Mais
de 80% dos avós pesquisados disseram
que, quando recebem visita de crian-
ças, os remédios permanecem no lu-
gar de sempre, em geral armários ou
bancadas. “E, quando viajam para visi-
tar os netos, 72% responderam que
guardam os remédios na bolsa”, diz a
Dra. Preeti Malani, diretora da pes-
quisa. Só uma pequena minoria
guarda os remédios em lugar seguro,
como um armário trancado a chave.
Os medicamentos são uma causa
importante de envenenamento de
crianças no mundo inteiro, segundo a
© istock.com/clubfoto
OMS. Crianças pequenas os ingerem
pelo hábito de pôr coisas na boca.
Quanto às maiores, o acesso fácil
aumenta a chance de abusar de anal-
gésicos e de outros medicamentos
com potencial recreativo.
Quando os produtos vêm em emba-
lagens à prova de crianças, muitos
idosos preferem transferi-los para reci-
pientes mais fáceis de abrir. Talvez
você tenha artrite, por exemplo, ou
recorra a um organizador de compri-
midos para seguir o horário certo. Se
assim for, é importantíssimo manter
tudo fora do alcance dos pequenos.
Na maioria dos acidentes, “o pri-
meiro passo seria ligar para um cen-
tro de controle de envenenamento”,
alerta Malani. “A equipe pode ajudar
na tomada inicial de decisões, inclu-
sive se a criança precisa ser levada ao
pronto-socorro mais próximo.”
Melhore o sono com um
banho na hora certa
Um banho morno à noite pode me-
lhorar o sono, segundo uma revisão
americana que associou o banho ao
percentual maior do tempo passado
dormindo na cama e, quando tomado
uma a duas horas antes de se deitar, a
adormecer mais depressa. Isso não se
deve só ao fato de que mergulhar na
banheira é calmante, mas também
porque o ciclo sono-vigília é entrela-
çado com a temperatura do corpo,
que chega ao máximo no início da
noite e depois baixa quando o sono
se aproxima. A água morna ajuda o
ritmo circadiano natural porque leva
sangue e calor do interior do corpo
para as extremidades, as mãos e os
pés. Daí, o calor escapa mais facil-
mente à medida que o dia termina.
02.2020 seleções 19
 PETS

4 motivos para
seu gato ficar
mal-humorado
pela Dra. Katrina Warren

Mudanças súbitas
do comportamento
de seu gato podem
significar problemas
de saúde.

20 seleções 02.2020
 H 2
á muitas razões para
alguns gatos serem mal-
-humorados; seu tempera-
mento pode ser influenciado
pela criação ou, simplesmente,
nascem assim. No entanto, até os
gatos mais doces e afetuosos podem,
de repente, perder o bom humor e
se comportar de forma estranha. Em
geral, o problema pode ser resolvido,
mas é preciso procurar as causas que
estão por trás dessa atitude.
1 Dor/Questões médicas
Frequentemente, a mudança
no comportamento dos gatos
é explicada por problemas de
saúde. A dor pode fazer os gatos se
comportarem de maneira muito
diferente, e é fácil achar que o
problema é comportamental
quando, na verdade, é clínico. Se
observar uma mudança significativa
no comportamento de seu gato,
o melhor a fazer é uma visita ao
veterinário. Observe mudanças nos
hábitos de se alimentar, beber água
e usar a caixinha, ou se o gato se
esconde e evita ser tocado. Descreva
todas as mudanças ao veterinário.
Há muitos problemas de saúde felina
que podem ser facilmente tratados
para aliviar os sintomas e a dor de
seu animal.
©SHUTTERSTOCK
A Dra. Katrina Warren é veterinária em
Sydney, na Austrália. Apresentou vários
programas de TV sobre animais de
estimação na Austrália e nos Estados Unidos.
Morar numa casa
com muitos gatos
É bom lembrar que os gatos não
gostam de dividir nada nem de
fazer fila. Compartilhar “recursos”,
como a caixinha de areia e o prato
de comida, pode provocar estresse
e ansiedade em muitos deles. É
sempre bom fornecer a cada gato
sua caixinha de areia, seus pratos de
água e comida e sua cama própria.
Uma caixinha de areia para cada gato
e mais uma extra é ainda melhor,
TENTE MANTER O
AMBIENTE DO GATO
O MAIS CALMO
POSSÍVEL
assim como vários arranhadores e
lugares para dormir.
A falta de espaço para se esconder
ou para evitar outros gatos, a
competição pelo território e a falta
de atenção individual também
aumentam o atrito doméstico. Se seu
gato estiver ansioso, oferecer-lhe um
lugar elevado para ficar, como um
castelo, pode ajudar.
3 Mudanças
A mudança para uma nova casa, a
chegada de um bebê, novos animais
e outros tipos de alteração de rotina
podem causar grande impacto sobre
o comportamento do felino. Os gatos
são criaturas de hábitos e tendem
02.2020 seleções 21
a ser territoriais. Mudanças em sua
rotina podem causar várias reações,
como isolamento ou agressão. Tente
manter o ambiente do gato o mais
calmo possível e cuide para que haja
lugares onde ele se sinta seguro. Às
vezes, confiná-lo num único cômodo
com uma caixinha de areia, uma
caminha e confortos domésticos
pode ajudá-lo a se ajustar.
VOCÊ SABIA?
ArrAnhAr é um comportamento
natural dos gatos. É assim que remo-
vem as bainhas externas das garras,
portanto não dá para impedir que arra-
nhem coisas. Forneça-lhes um arra-
nhador robusto que lhes permita se
alongarem. Ensine-os a usá-lo com
brincadeiras que os incentivem a só
arranhar ali até que adquiram o hábito.
22 seleções 02.2020
4 Personalidade
Alguns gatos simplesmente não
gostam de ser tocados e manuseados.
Em geral, são gatos que tiveram
pouca socialização com seres
humanos quando filhotes. Esses
gatos se sentem melhor numa casa
tranquila sem crianças e exigem
compreensão e paciência para
construir a confiança.
SIM OU NÃO
não use suas mãos como brin-
quedo. Balançar os dedos na frente
do gato é um jeito fácil de atrair sua
atenção e começar a brincadeira,
mas vai lhe passar a mensagem de
que não há problema em caçar seus
dedos e morder sua mão. O com-
portamento perseguidor é normal
porque é assim que os gatos
caçam, mas não é bom que sua
mão seja a presa!
Sim, use brinquedos, como um ber-
loque, que você possa atirar, ou pe-
nas penduradas numa varinha. Isso
mantém suas mãos a salvo e é um
jeito divertido e inte-
rativo de brincar.
©SHUTTERSTOCK
 PAPO DE LIVRO
por Claudia Nina
A pesca
milagrosa
S
ei que pode ser uma tremenda
incongruência: detesto andar de
barco, navio e similares porque
não gosto de sentir o chão balançar
como se eu estivesse pisando areia
movediça. Mas... adoro ver barcos,
assim como adoro ver telhados.
Posso ficar horas a fio nessa contem-
plação. Não gosto de grandes velei-
ros ou transatlânticos que me dão
profunda agonia – como conseguem
flutuar? Gosto dos barquinhos de
pesca, aqueles coloridos que atracam
nas pequenas cidades à beira-mar.
A sensação de paz que essas
cenas me dão são inexplicáveis. Posso
pensar na pesca milagrosa, referência
aos discípulos do Cristo que eram
pescadores... Aquela ideia de fartura
a partir da sugestão de que a gente
precisa aprender a jogar a rede do lado
© istock
certo das águas é de uma simbologia
que me encanta. Curioso é que, na
sincronia deste movimento, eu estava
de férias em um lugar cheio dessas
pequenas embarcações coloridas, e o
livro que eu tinha nas mãos para esta
coluna não era outro senão Histórias
guardadas pelo rio, da Lúcia Hiratsuka.
“Quero conhecer o segredo da
pesca. Pode me ajudar?”
Este é o Pedro (me lembrei do
discípulo) que decide sair à procura
de alguém que explique a ele o
segredo da pesca de... histórias!
Ele precisava encontrar uma pessoa
capaz de lhe ensinar. Mas quem disse
que o segredo se aprende de uma
vez só? Ele começa a perambular de
ponto a ponto, de palavra em palavra,
ouvindo conselhos e ensinamentos,
Claudia nina é jornalista e escritora,
autora, entre outros, de Paisagem de
porcelana (Rocco).
02.2020 seleções 23
uma aprendizagem longa que o trans-
forma em andarilho.
Pensei se o escritor não é esse
pescador que está sempre à procura
O BARCO ONDE
SINGRAMOS É UM
ARMAZENAMENTO
DA MEMÓRIA.
do lado mais farto dos rios, desse
“milagre” que é o surgimento de uma
nova história. E quantas vezes um
texto não surge exatamente de uma
perambulação íntima, quando a ima-
ginação solta as redes em busca de
ideias (peixes, histórias) para rechear
nosso barco?
A partir deste livro tão singelo e
lindamente ilustrado pela própria
Lúcia, que tem um trabalho incrível
com desenhos de peixes, diga-se
de passagem (basta olhar a sua bi-
bliografia), pensei que o barco onde
singramos é um armazenamento da
memória; assim como os pescado-
res, acumulamos as histórias de na-
vegações pelo mundo e pelo mundo
das pessoas que fazem parte de
nossa trajetória ao longo dos anos.
“Qual das estradas tomar? A da
direita ou da esquerda? Não fazia
ideia do lugar a que cada uma delas
levava. Sentou-se em uma pedra,
indeciso, observando a paisagem.”
Sim, Pedro, contemplar também
é pescar histórias.
Um 2020 cheio de
redes plenas para nós.
HistóriAs guArdAdAs
pelo rio
Lúcia Hiratsuka
sM

O mundo é um zoológico!
Achamos que o nome dos países vêm de... bom, de onde eles vêm?
(Além da Finlândia. Esse é fácil.) Acontece que, nos idiomas nativos,
o nome de muitos países se inspirou em animais. Alguns exemplos:
Albânia: Terra da Águia
Butão: Terra do Dragão dos Trovões
Camarões: Rio dos... pois é, dos camarões.
Kosovo: Campo dos Melros
Cingapura: Cidade do Leão
digg.coM

24 seleções 02.2020
 BOASporNOVAS
um
mundo melhor
A INIMIGA DOS FRAUDADORES EUROPEUS
JUSTIÇA Criminosos envolvidos em
fraudes têm um novo inimigo na pes-
soa do dínamo anticorrupção romeno
Laura Kövesi, nomeada primeira pro-
motora pública da União Europeia.
Kövesi fez seu nome na Romênia,
onde, como chefe da diretoria anti-
corrupção do país, iniciou centenas
LCV/ShutterStoCk.Com
de investigações contra autoridades
importantes.
Isso lhe conquistou muito respeito
do público e diversos inimigos em
posição elevada. Uma de suas víti-
mas foi o ex-primeiro-ministro
Laura Kövesi encabeçará o novo órgão
anticorrupção da União Europeia.
Adrian Nastase, condenado a quatro
anos de prisão por suborno em 2014.
Kövesi, de 46 anos, dirigirá uma
equipe de até 200 pessoas na Promo-
toria Pública em Luxemburgo, investi-
gando crimes contra o orçamento da
União Europeia, como fraude, corrup-
ção e sonegação tributária entre
fronteiras. “Foi para isso que me
candidatei, era o que eu queria”, diz
Kövesi. “Por enquanto, minha maior
preocupação é assegurar que a insti-
tuição tenha o orçamento e os recur-
sos de que precisa para trabalhar.”
02.2020 seleções 25
 Juan Fernando López Aguilar, pre-
sidente do comitê de liberdade civil
do Parlamento Europeu, comenta:
“De agora em diante, ela será uma
das mulheres fortes que lideram a
União Europeia.”
Os ursos no norte da Espanha
CONSERVAÇÃO Os amantes da natu-
reza comemoram o retorno do urso-
-pardo-europeu às montanhas do
noroeste da Espanha depois que o
mamífero (na foto) foi levado à beira
da extinção.
O desmatamento, a infraestrutura
feita pelo homem, as armadilhas e as
caçadas se combinaram para reduzir
drasticamente o número de ursos
nos Montes Cantábricos, que,
no ponto mínimo, chegou a
65 indivíduos.
Depois da campanha de grupos
conservacionistas, a população au-
mentou, e o número chegou a 350
indivíduos, com mais 40 nos Pire-
neus. A recuperação tem sido atri-
buída a uma mistura de educação
e proteção ambiental. A observa-
ção de ursos também promoveu
a economia turística da região.
Cidade holandesa e
as bicicletas
TRANSPORTES Os Países Bai-
xos têm mais bicicletas do que
habitantes – 22 milhões delas
para uma população de
26 seleções 02.2020
17 milhões – e encontrar lugar para
estacionar pode ser um desafio. Para
resolver o problema, a cidade de
Utrecht abriu, em sua estação ferro-
viária, o maior estacionamento mul-
tiandares do mundo para bicicletas.
A estrutura de concreto e vidro tem
espaço para 12.500 bicicletas em três
andares e até bicicletas para alugar.
Isso faz parte da iniciativa constante
de melhorar a infraestrutura ciclística
dos Países Baixos. “Há muito mais a
ser feito”, diz Stientje van Veldhoven,
secretária de infraestrutura. “Gostaria
que usássemos melhor essa que é
uma arma secreta contra os engarra-
famentos, a má qualidade do ar ur-
bano e a mudança climática.”
Paris aprova plantações
no telhado
AGRICULTURA A ideia de produção agrí-
cola em Paris pode soar estranha, mas
o alto de um prédio de seis
© JaVier Fernandez SanChez/moment/Getty imaGeS
andares no centro da capital
francesa pretende ser a
maior fazenda de telhado
do mundo.
O oásis urbano, sob
construção no 15-º ar-
rondissement de Paris,
tem 14.000 m² e
cultivará mais de
30 espécies de plantas.
Espera-se que produza
cerca de uma tonelada
de frutas, legumes e
verduras por dia
 neste verão, com cerca de 20
horteleiros usando métodos orgâni-
cos. “A meta é tornar a fazenda um
modelo globalmente reconhecido
de produção sustentável”, diz Pascal
Hardy, da Agripolis, empresa de fa-
zendas urbanas por trás do projeto.
Situado acima do centro de expo-
sições Expo Porte de Versailles, no
sudoeste de Paris, a fazenda terá
no local um bar e restaurante para
300 clientes que usará as frutas e os
legumes ali produzidos.
em toda a Europa o conserto de ele-
trodomésticos como geladeiras, má-
quinas de lavar e televisores. A partir
do próximo ano (2021), os fabrican-
tes terão de tornar os aparelhos mais
duráveis e fornecer peças de reposi-
ção a mecânicos profissionais inde-
pendentes durante até dez anos
após a data da compra.
Estima-se que essa providência
reduzirá a conta de energia em
20 bilhões de euros por ano na
Europa a partir de 2030.

União Europeia conserta Compilado por James Hadley.

aparelhos
SUSTENTABILIDADE A nova legislação
sobre o “direito a consertar” facilitará
Fontes: ( Justiça) euractiv.
(conservaçÃo) lonely Planet.
(transPortes) the guardian .
(agricultura) the guardian .
(sustentaBilid a de) good news network.
(herÓis) BBc news.

HERÓIS: Adolescentes com câncer

triunfam angariando recursos
As adolescentes Molly Cuddihy, 17 anos, e Sara Millar, 16, se conheceram no
Royal Hospital for Children, em Glasgow, na Escócia, onde a sala comunitária era
um refúgio do tratamento horrível que ambas
faziam contra o câncer. Mas as duas garotas
ficaram chocadas quando um menino mais
novo foi expulso da sala comunitária porque o
cortesia de teenage cancer trust

espaço era reservado só aos adolescentes.

Cuddihy e Millar (foto) prometeram ajudar o
hospital a criar instalações semelhantes para
pré-adolescentes. Elas tiveram a ideia de dar
um baile, que angariou notáveis 250 mil libras de pessoas físicas e empresas.
A professora e hematologista pediátrica Brenda Gibson fez parte da equipe
médica que compareceu ao baile. “Sara e Molly são extraordinárias. Estou espan-
tada, mas muito contente, com a quantia obtida”, diz ela. E a autoridade de saúde
da área agora planeja abrir instalações para crianças menores.

02.2020 seleções 27
 O
olhar para o mundo da moda
começou a tomar outra forma
no ano de 2015. Rozi Marinho,
BRASIL booker (agente de modelos) há 24
anos e proprietária da agência Becs
Model, que fica em Niterói (RJ), já
estava acostumada a revelar nomes
para o mercado. Porém, ao receber
A empresária percebeu uma mensagem de texto em uma rede
que o mercado estava social, viu que era possível fazer mais.
A jovem Taiane Quintanilha, porta-
aberto a uma dora de deficiência auditiva, a procu-
rou e revelou que tinha vontade de ser

Visão modelo, de seguir com o sonho de ser

fotografada para editoriais de moda

de moda
e de desfilar, mas, por causa da defi-
ciência, as portas estavam sempre fe-

includente
chadas para ela, ninguém se mostrava
disposto a investir em sua carreira.
“Aquilo mexeu comigo. E eu resolvi
conhecê-la, saber quem era aquela
menina. Marcamos um encontro e re-
por Márcio Gomes cebi a Taiane com todo carinho. Vi que
ela tinha um futuro promissor. Bastava
alguém dar a oportunidade – e foi o
que eu fiz. E ela se tornou uma grande
modelo”, explica Rozi.
Hoje, Taiane acumula no currículo
mais de 50 trabalhos e já esteve à
frente de campanhas para noivas, tu-
toriais para marcas de maquiagem, di-
versos editoriais de moda e desfiles de
moda praia. Recentemente, ela abriu
o desfile de uma nova marca de rou-
pas de praia, sendo um dos destaques
do evento.
A atitude da booker fez a diferença
na vida de Taiane e de outras meninas.
Rozi Marinho Depois de revelar a primeira modelo

28 seleções 02.2020
com deficiência au-
ditiva da sua agência,
Rozi Marinho não pa-
rou mais. Tanto que,
até agora, já lançou
para o mercado mais
16 modelos com al-
gum tipo de deficiên-
cia. “Eu notei que o
mercado não tinha
visão para esse nicho.
Mas é preciso ter, os
deficientes precisam estar pre-
sentes. Afinal, eles são consumidores
de diversas marcas e produtos. Por que
não os incluir?”, questiona.
Em suas mãos muitos jovens con-
seguiram alcançar a inclusão. Um
exemplo é Ane Caroline (amputada
até a coxa da perna direita). A mo-
delo também participou de editoriais
de moda e de alguns desfiles, como o
do encerramento do curso superior
de designer de moda da Universo.
Sensação maravilhosa
Quem “causou” este ano no maior
evento do país, a São Paulo Fashion
Week, na edição de agosto, foi a mo-
delo Rebeca Costa, que tem nanismo.
A jovem finalizou o curso de direito e
se tornou modelo com a ajuda de Rozi
Marinho. “Foi um sucesso a partici-
pação dela no evento. A Rebeca vol-
tou da São Paulo Fashion Week com
a agenda lotada de compromissos.
Tornou-se palestrante e hoje motiva
os jovens contando a sua história. Ela
Desfile para a Universo, com os modelos:
Leticia Andrade, Pamela Almeida,
Taiane Quintanilha, Jhennifer Guerra,
Bruna Caroliny, Rayane Vitoria, Caio
Cócaro, Felipe Brandão, Alef Jordão,
Rackel Campos, Vitoria Fi.
ainda escreve para o próprio blog:
Look Little”, conta Rozi.
Quando olha para trás e vê tudo
que trilhou até aqui, Rozi afirma que
faltam palavras para explicar a sen-
sação que experimenta quando vê a
felicidade das meninas. “É assim que
eu me sinto ao ver o brilho no olhar
de cada uma delas. É uma sensação
maravilhosa incluir e dar oportuni-
dade a quem quer e precisa. Isso não
tem preço”, diz.
E ela deixa um recado: “É possível
mudar! Já estamos mudando. A maior
barreira que existe é o preconceito.
Quando os empresários de diversos
segmentos enxergarem os deficien-
tes como consumidores, numa visão
totalmente includente, essa realidade
muda. É só querer”, finaliza.
02.2020 seleções 29
 ESSAS CRIANÇAS...

“Quanto você acha que consigo por isso no mercado do quadro-negro?”

Meu filho de 4 anos: Mãe, você ouviu?
Eu: Ouvi o quê?
Meu filho de 4 anos: A música que eu
estava cantando dentro da cabeça.
—ASHLEY ASHFIELD
– Argh, que nojo. Eu nunca come- ilustrado por susan Camilleri Konar
ria o que tem dentro de um bicho.
Rejeitando as costelas, ele se
contentou com um hambúrguer.
—Debbie Summerell

Meu neto, Dax, tem 6 anos e muita Dentista: Então você escova os
consciência social. Ele observava a dentes, passa o fio dental e enxágua
mãe fazer costelas para o jantar e, ao com flúor todo dia?
saber de onde vinham, disse: Meu filho de 8 anos: Sim.

30 seleções 02.2020
Dentista: Que ótimo!
Filho de 8 anos: Minha mãe me pro-
meteu um picolé depois da consulta
se eu dissesse isso.
— @MISSHAVISHAM
Parece que minha filha não se lembra
como calçar os tênis de velcro, mas
se lembra de que, quatro semanas
atrás, eu lhe prometi uma bala e
ainda não dei.
— @STAYATHOMIES
A filha de 5 anos de uma amiga
entrou com a mãe no banheiro de
um shopping e, observando uma
senhora retocando a maquiagem,
perguntou com inocência:
– Mãe, o que ela está fazendo?
– Refazendo a maquiagem para fi-
car mais bonita – respondeu a mãe.
– E por que ela não fica?
—Admar Dias, Gravataí (RS)
[Na janelinha do drive-through]
Menino pequeno: Posso dizer oi?
Eu: Ah, que gracinha. *Abro a janela*
Menino pequeno: Dois milkshakes,
por favor!
— @DADZZZASLEEP
Certo dia, meu filho de 8 anos
perguntou quanto dinheiro tinha
a rainha da Inglaterra.
– Provavelmente, milhões e
milhões de libras – respondi.
– Ela deve ser muito boa nos
concursos da TV! – respondeu ele.
—MARJORIE F. MURPHY
Eu: [cantando]
Filho de 6 anos: Mãe, quem canta
essa música?
Eu: O grupo Queen.
Filho de 6 anos: Então deixa eles
cantarem, tá?
— @BUNANDLEGGINGS
Eu disse à minha filha de 4 anos que
pulasse na banheira e, com ar de
superioridade, ela respondeu:
– Mas não pular literalmente.
Se alguém aí estiver precisando de
revisor...
— @THECATWHISPERER
Ontem, no jantar, minha filha puxou
minha blusa.
– O que é que você quer, filha? –
perguntei, exausta. – Mamãe está
muito cansada, e não me resta
mais nada.
Ela respondeu olhando bem fundo
em meus olhos e então pegando as
últimas batatas fritas do meu prato.
Aceitei a correção.
— @THENYAMPROJECT
Filha de 5 anos: Por que você é tão
alto?
Eu: Porque quando eu era criança
comi todos os legumes.
Filha de 5 anos: Não vale a pena.
— @XPLODINGUNICORN
sua história pode valer até
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02.2020 seleções 31
 VIDA BEM VIVIDA

Ninguém é velho
demais para aprender
Com 63 anos, Jerry Valencia decidiu se formar na
universidade – e fazer o mestrado também

por Steve Lopez

do Los AngeLes Times

O
aluno chegou cedo, sentou-se
na frente e, de várias maneiras,
se destacou. Eu diria que ele
tinha uns 40 anos a mais que seus
colegas da turma de comunicação no
campus de Los Angeles da Universi-
dade da Califórnia. Participava com
animação das discussões em sala,
com humor autodepreciativo e a sabe-
doria da experiência. E sempre respei-
tava o ponto de vista dos outros alunos,
como se cada um fosse um professor.
Jerry Valencia entrava com um sorriso
– e ia embora sorrindo também.
“Aqueles alunos me deram a con-
fiança de que eu não precisava me
sentir mal por causa da idade”, diz ele.
Certo dia, avistei Valencia no
campus. Ele disse que teria de
interromper as aulas naquele semes-
tre para voltar no ano seguinte. Até
lá, esperava ter ganhado dinheiro
suficiente com trabalho na constru-
ção civil e arrumado a documentação
do crédito educativo. Mas disse que
ainda viria ao campus para participar
de eventos ou ver amigos. E pergun-
tou timidamente se ainda podia assis-
tir à minha aula de comunicação.
Claro, respondi. Mas não receberia
nenhum crédito.
Logo, lá estava Valencia de volta
à antiga carteira, na frente, parti-
cipando de nossa discussão sobre
como encontrar e contar histórias
em Los Angeles – um estudante de 63
anos com tanta energia e curiosidade
quanto qualquer jovem da turma.

32 seleções 02.2020
 Jerry Valencia
sempre adorou
ler – “muito”,
diz ele.
Num trabalho sobre mudanças no
bairro, Valencia escreveu sobre a lan-
chonete favorita de uma cadeia local
que foi “fechada sem cerimônia”.
Ele chamou o fato de “terremoto” e
furto da infância. “É quase como se
alguém roubasse aquela infância e
a substituísse por um morro escor-
regadio onde tudo o que gostamos
descerá para longe”, escreveu.
Muitos colegas de Valencia sabiam
que ele não conseguiria pagar o se-
mestre, mas ainda fazia o dever de
© Steve Lopez/LoS AngeLeS timeS
casa. “Aqui está ele, assistindo às au-
las de boa vontade, só pelo prazer e
pelo benefício de aprender”, diz Jes-
sica Espinosa, estudante de 25 anos.
“Não se vê isso em nossa geração.”
Valencia também compareceu
para fazer as provas finais. Depois, os
alunos estavam batendo papo e ouvi
Valencia dizer que queria ficar na
faculdade até terminar o mestrado,
mas que levara 12 anos para fazer o
community college (curso pré-univer-
sitário de dois anos), portanto ainda
teria um longo caminho pela frente.
Doze anos? Ele entrava e saía da
escola, explicou, sujeito ao horário de
trabalho e a ter dinheiro para pagar as
mensalidades. Conseguira o diploma
em letras e artes durante o verão e se
transferiu para a Universidade da Ca-
lifórnia para o bacharelado.
Eu precisava saber mais.
P
or enquanto, Valencia mora
num estacionamento de moto-
casas. Ele me recebeu quando
cheguei e me serviu um cafezinho.
Disse que seu pai trabalhara numa
olaria fazendo tijolos e na montagem
de automóveis. A mãe trabalhava em
casa. A maioria dos sete irmãos e irmãs
02.2020 seleções 33
não foi para a faculdade, e nenhum da equipe de debate jurídico de que
terminou. Valencia está decidido a ser Valencia participou. “Mas era o mais
o primeiro, apesar do início tardio. motivado, o mais dedicado.”
Ele disse que foi um aluno me- Tovmasian diz que nos debates Va-
diano que teve dificuldade com a lencia foi um ótimo participante que
matemática e foi para o community incentivava os colegas e os inspirava
college um ano depois de terminar o com seu desejo de se instruir e ter
ensino secundário, mas logo decidiu uma vida mais gratificante.
que não era para ele. Foi trabalhar Sindi Majors, irmã de Valencia, diz
na construção civil, depois no setor que o irmão sempre foi brilhante, mas
de seguros, mas passou por pe-
sempre gostou ríodos difíceis na
de escrever e vida. “Ele ficou
resolver pala- praticamente
vras cruzadas. sem teto”, diz
“E adorava ler. Majors, eletri-
Muito”, contou. cista aposentada.
Também gos- Ela comprou
tava de assistir uma motocasa
com a mãe ao para ajudar o
programa de irmão, e foi onde
perguntas e res- Valencia em aula na universidade. ele morou de
postas Jeopardy! 2009 a 2018.
e brincava que, se ganhasse na lo- Há algo esplendidamente irracio-
teria ou participasse do programa, nal na determinação de Valencia de
ele usaria o prêmio para pagar a se formar na faculdade e depois fazer
faculdade. o mestrado. No ritmo atual, ele terá
Foi aproximadamente em 2007 que 90 anos quando pendurar todos os
ele se cansou de dizer a si mesmo que diplomas na parede.
ia voltar e contou à mãe que agora Mas isso não parece relevante. © Steve Lopez/LoS AngeLeS timeS
seria de verdade. “Quando recomecei Ele acha estimulantes a energia juve-
a estudar, ela me disse que tinha es- nil e a oportunidade acadêmica.
peranças de que eu conseguisse. E eu A nota de Valencia em meu curso
lhe disse: ‘Vou conseguir, mãe’.” desse semestre não vai aparecer no
O plano era aproveitar sua expe- boletim. Mas vou lhe dar um 10 –
riência em obras e estudar engenha- e, naquilo que é mais importante,
ria civil. Mas ele descobriu outros isso conta.
interesses. “Não era o aluno mais jo-
LoS AngeLeS timeS (5 de dezemBRo de 2018),
vem”, diz Grant Tovmasian, treinador © 2018 de LoS AngeLeS timeS, LAtimeS.Com.

34 seleções 02.2020
 DEMOS
UM
JEITO
9 truques para
melhorar sua vida*

1
Carregue seu celular
mais depressa
tecnologia Para carregar a bate-
ria mais depressa, ponha o celu-
lar em modo avião. Isso impede
o “ruído de fundo” do aparelho
(como notificações aleatórias e
© MATTHeW COHeN

o GPS atuando), que tende a

gastar bateria. O tempo total
não será muito menor, mas, na
pressa, cada pouquinho ajuda.

*Da RD.com 02.2020 seleções 35

 2
Proteja as patas do seu cão
4
Deixe as portas
BichoS de eStimação Se você mora em lugar muito frio e do box impecáveis
seu cão detesta “botinhas” protetoras, cuide das patas por mais tempo
dele aplicando nelas, antes de sair, um bálsamo à base limpeza Sprays que
de cera de abelha, depois limpe quando terminar o pas- repelem água são práticos
seio. Vaselina comum também funciona. No verão, não não só no para-brisa do
saia com o animal entre 10 horas e 16 horas para não carro. Aplique uma
correr o risco de ele queimar as patas no chão quente. camada nas portas do
box do chuveiro para
evitar o acúmulo de mofo
e outros resíduos.

5
3
Deixe a massa
Trate a tosse
com orégano
Saúde “O orégano é uma
potência na luta contra a
descansar gripe, por ser antibacte-
culinária Para seus riano, antifúngico e antioxi-
biscoitos terem um dante”, diz o Dr. Patrick
Fratellone, que pratica me-
sabor mais rico, refri- dicina integrativa em Nova
gere a massa algumas York. A erva também ajuda
horas antes de assar. nos resfriados, diz ele.
Tome uma cápsula de oré-
Isso ajudará a umi- gano duas vezes por dia às © katherine austin/shutterstock
dade e a gordura a se refeições ou faça chá de
espalharem unifor- orégano despejando 1 xí-
cara de água fervente em
memente pela massa. 2 colheres (chá) de oré-
Seus biscoitos tam- gano seco e deixando 2 mi-
bém ficarão com o nutos em infusão. Se o
sabor for muito amargo,
miolo mais macio acrescente um pouco de
e gostoso. mel. Tome 2 vezes por dia.

36 seleções 02.2020
 6
Limpadores mais duráveis
8
Escureça a tela
carroS Se os limpadores de para-brisa do computador
não estiverem fazendo o serviço di- dinheiro Eric Potkin, ex-
reito, é possível que estejam com al- -gerente de energia da Es-
gum tipo de resíduo que impede que cola de Direito de Harvard,
fiquem bem grudados no vidro. descobriu que reduzir em
Algum dia será preciso trocá-los, mas 30% o brilho do monitor
ganhe tempo raspando esses depósi- (de 100 para 70) econo-
tos. Para isso, passe algumas vezes miza até 20% de toda a
uma lixa de unhas em toda a extensão energia que o monitor
de cada lâmina. gasta.

9
Proteja a saúde
nos hotéis
Viagem Não surpreende
que o controle remoto da
TV dos hotéis esteja co-
berto de germes, como
descobriram vários estu-
dos de saúde. Mas um dos
pontos mais sujos é bem
chocante: a bancada do
banheiro, de acordo com a
contagem de bactérias de
nove hotéis feita pelo site

7
travelmath.com. Diminua
o risco desinfetando as
© fotoslaz/shutterstock

superfícies com álcool

Cate os caquinhos com facilidade antes de se instalar.
caSa Recolher os pedaços maiores de vidro ou louça
quebrada é fácil, mas catar aqueles caquinhos minúscu-
los é bem complicado. Um jeito de fazer isso é pressionar
sobre toda a área uma fatia de pão macio. Só tome cui-
dado para não se cortar quando jogar o pão no lixo.

02.2020 seleções 37
 PONTO DE VISTA

Um homem adota como missão na vida

salvar o urso-malaio da extinção

Papai urso
por Siti Rohani

N
a véspera do Natal de 2017,
imagens chocantes de um ur-
so-malaio esquartejado numa
feira livre de Kuching, em Sarawak,
na Malásia Oriental, viralizaram nas
mídias sociais. A cabeça e partes do
corpo estavam sendo vendidas como
carne exótica.
Os ursos-malaios, que têm uma ca-
racterística mancha branca ou amare-
lada no peito, são os menores animais
da espécie dos ursos. Os adultos têm
cerca de 120 a 150 cm de compri-
mento e pesam até 80 kg. Na Malásia,
belas criaturas ameaçadas, também
chamadas de ursos-do-sol e ursos-
-dos-coqueiros. Em 2008, ele fundou
o Bornean Sun Bear Conservation
Centre (BSBCC, Centro de Conserva-
ção de Ursos-Malaios de Bornéu) em
Sepilok, no estado malaio de Sabah.
Na época, Wong estava no douto-
rado e tinha se mudado para Sepilok
depois de fazer a pesquisa de campo.
Era responsável por cuidar de sete
ursos-malaios resgatados no Centro
de Reabilitação de Orangotangos de
Sepilok. “O prédio que abrigava os
© CEphoto/UwE ArAnAs

é ilegal caçar, matar ou vender ursos-
-malaios. Infelizmente, isso não pôs
fim a essas atividades.
Wong Siew Te, biólogo especiali-
zado em animais selvagens, adotou
como missão de vida proteger essas
ursos estava dilapidado e não tinha
instalações adequadas, só jaulas”,
recorda o biólogo de 49 anos.
Wong tinha uma visão: primeiro,
transformar o prédio num centro de
conservação bem equipado, com

38 seleções 02.2020
 Pioneiro na
conservação
animal: Wong
Siew Te.

02.2020 seleções 39
cercados na floresta que permitis-
sem aos ursos ir e vir durante o dia, e
depois criar um centro de educação
onde o público pudesse se informar
sobre o sofrimento dos ursos-malaios.
Antes, porém, Wong precisava de
dinheiro para seu plano ambicioso.
Em janeiro de 2014, depois de várias
campanhas para levantar recursos,
que incluíram doações do Minis-
tério de Turismo, Cultura e Meio
Ambiente da Malásia e da Fundação
Sime Darby, o BSBCC foi aberto ao
público.
Hoje, os visitantes podem subir
SOB AMEAÇA
O ursO-malaiO, antes numeroso nas
florestas das planícies do sudeste da
Ásia, praticamente desapareceu
da maioria das regiões.
Não há números confiáveis sobre
a população de ursos-malaios,
segundo a WWF (Fundo Mundial
para a Natureza) e a IUCN (União
Internacional pela Conservação da
Natureza), mas estima-se que a po-
pulação caiu mais de 30% nos últimos
vinte anos. É possível que o número
de ursos-malaios em ambiente selva-
gem não passe de mil.
A Lista Vermelha de espécies amea-
çadas da IUCN classificou o urso-
-malaio como vulnerável, ou seja, con-
sidera-se que sua população correrá
risco de extinção em futuro próximo.
—Victoria Polzot
40 seleções 01.2020
numa plataforma de observação para
ver os ursos, ouvir palestras e assistir
a vídeos sobre os animais. O centro,
que ainda divide cinco hectares de
terra com o Centro de Reabilitação de
Orangotangos de Sepilok, tem 28 fun-
cionários em tempo integral que cui-
dam de 44 ursos-malaios. Na última
década, 58 ursos fizeram do centro
seu lar, e dois foram libertados com
sucesso em ambiente selvagem.
As maiores ameaças para a popu-
lação de ursos-malaios em todo o
sudeste da Ásia são o desmatamento
e a caça ilegal. Os animais são mortos
por causa da crença ilusória de que
sua carne tem valor medicinal, e suas
partes são vendidas em feiras locais.
As mídias sociais também facilitaram
a venda pela internet de produtos
como vesículas biliares, patas e gar-
ras de urso por comerciantes ilegais.
“Enquanto houver gente disposta a
comprar essas coisas, haverá alguém
disposto a vendê-las”, diz Wong.
C
riado em Penang, no norte da
Malásia peninsular, Wong amava
os animais. Ele se lembra de
quando os pais levaram para casa
filhotes de pardal que haviam caído
do ninho. Ele, com 5 anos, cuidou dos
passarinhos até crescerem.
Desde essa época, ele queria ser
especialista em animais. “Eu sabia o
que queria fazer desde bem pequeno”,
conta ele. “Estava decidido, e minha
ambição nunca mudou.”
Em 1994, Wong foi para a Universi
 dade de Montana, nos EUA, estudar
biologia de animais selvagens. Lá,
conheceu Christopher Servheen, que
procurava um aluno da Malásia para
um estudo sobre ursos-malaios. O
projeto o pôs no caminho de sua vida.
Avancemos quase duas décadas:
Wong trabalha regularmente 18 ho-
ras por dia no BSBCC. Dá palestras,
examina os ursos e toma as decisões
necessárias a fim de administrar um
santuário para animais. O trabalho é
difícil, mas compensador. “Quando
os ursos estão felizes, fico feliz tam-
bém”, diz ele. “A realidade é que ainda
estou numa zona de guerra. É bom
estarmos estabelecidos, mas nosso
trabalho não acabou. Ainda temos
muito a fazer para realmente salvar
os ursos-malaios.”
Wong admite que o reconheci-
mento, como o prêmio CNN Hero
de 2017 que recebeu da rede jorna-
lística global, o motiva a continuar,
apesar das dificuldades. “Isso for-
talece minha crença de que estou
fazendo a coisa certa para a socie-
dade”, alegra-se ele.
E
m qualquer comércio, é pre-
ciso haver oferta e procura.
Infelizmente, admite Wong, a
educação só vai até certo ponto para
sufocar a procura por partes do corpo
do urso. “Podemos dizer às pessoas
© shUttErstoCk
que não comprem isso e aquilo, mas,
depois de anos trabalhando com edu-
cação, ainda há um pequeno grupo
que arruína a coisa toda.”
A procura de partes do corpo é uma
grande ameaça para os ursos-malaios.
O passo seguinte e importantíssimo
é impor o cumprimento da lei. De
acordo com Wong, isso só vai acon-
tecer quando os órgãos da lei come-
çarem a levar a sério os crimes contra
animais. “A caça ilegal deveria ser
tratada como homicídio. Deveríamos
pegar todos os caçadores e puni-los
adequadamente”, afirma ele.
Wong avisa que o tempo está aca-
bando. “Os próximos dez anos serão
fundamentais. Se falharmos, muitas
espécies deixarão de existir.”
Às vezes, a tarefa parece uma difícil
batalha morro acima. Wong admite
que fica aborrecido com a situação,
mas diz que ainda se considera com
sorte porque teve a oportunidade de
estudar os ursos-malaios. Por essa
razão, tenta se manter positivo e
inspirar o máximo possível de pes-
soas. “Os ursos-malaios não têm voz,
e temos de falar em seu nome. Temos
de lutar por seus direitos. Temos de
fazer justiça por eles.”
02.2020 seleções 41
 FLAGRANTES
da Vida Real

No consultório médico,
um homem de uns 20 e CASO SE
EM CASO DE CORTE
poucos anos tentava
EMERGÊNCIA, QUEBRANDO
marcar hora para a Sra. O VIDRO,
Brown. Por mais que QUEBRE O
VIDRO. QUEBRE ESTE
tentasse, não conseguia VIDRO.
lembrar o primeiro
nome da mulher. Desa-
pontado, saiu. Alguns
minutos depois, no cor-
redor, passei por ele,
EXTINTOR DE INCÊNDIO

que falava ao telefone.

– Oi, pai – dizia. –
Qual é o primeiro
nome da mamãe?
—James Secor

Na casa da minha so-

gra, tentando entrar na
internet, eu passava os
olhos pelas várias co- manhã em que minha colégio católico com
nexões, quando o Wi-Fi amiga entrou em traba- padres espanhóis. Um
de um vizinho me cha- lho de parto, passei deles era Frei Valentin,
mou a atenção: “Mole- pela casa dela, me per- que vivia falando sobre
ques, saiam da minha guntando o sexo do o inferno, para nos
REDE!” bebê. Um cartaz na meter medo.
—Nancy Lawson varanda me deu a res- – Ah, o inferno! Que
posta: “É um Tio!” lugar terrível… Lá, to-
Uma amiga daria à luz —Pam Lester das as almas infelizes
mais ou menos na vivem mergulhadas
mesma época que sua Eu tinha 7 anos quando nas mais profundas
filha mais velha. Na fui matriculada em um trevas.

42 seleções 02.2020 ilustrado por Jon Carter

 Nossa gata Cerimônia geralmente é chamada mim. Alarmada, me le-
de Gata. Mas, quando recebemos visitas, vantei e fui embora.
Quando dobrei a es-
voltamos ao nome real, para podermos dizer: quina, ouvi o dono lhe
“Entre, mas não fique com Cerimônia.” dar uma bronca em voz
—@7upislemonade (Kieron Callaghan) baixa: “Você sempre faz
isso, Oscar. Expulsa
todos os seus amigos.”
Um dia um dos meus Gosto de escutar os do- — @juliagalef
colegas perguntou o nos falando com seus
que significava a pala- cachorros. Recente- Ser pai é como ser
vra “trevas” e Frei Va- mente, fiz carinho num malabarista, só que
lentin respondeu: filhote que parecia con- todas as bolas estão
– Trevas quer dizer tente até que, de re- aos berros.
escuridão. O inferno é pente, ele rosnou para — @kalvinmacleod
aBraMoVa elena/sHutterstoCK (BaCon), ollliKeBalloon/sHutterstoCK (BraÇos+pernas)

um lugar completa-
mente escuro e cheio
de sofrimento.
Na ingenuidade dos MANHÃ DE DOMINGO? SIM, ESTOU LIVRE
meus meros 7 anos, Thom S. Rainer, fundador da comunidade Church
perguntei: Answers para líderes de igrejas, pediu que pastores e fiéis
– Mas, Frei Valentin, lhe contassem as melhores desculpas que já ouviram
o senhor não vive di- para alguém não ir ao culto:
zendo que no inferno ✦ “Não consegui destam- ✦ “Minha mulher fez
tem fogo por todo lado? par a manteiga de bacon no café da manhã,
Então, que fogo é esse amendoim.” e a família inteira
que não clareia nada? ✦ “A igreja fica perto ficou com cheiro
demais para ir de carro de bacon.”
Meus colegas caíram
e longe demais para ir ✦ “O líder do culto
na gargalhada, e eu fui
a pé.” puxa as calças para
suspenso por dois dias. ✦ “Minhas duas na- cima toda hora.
—Amaury da Gama moradas frequentam Assim, eu me
Bentes, por e-mail essa mesma igreja.” distraio.”
✦ “O pastor fala ✦ “Minhas hemor-
da Bíblia em excesso.” roidas sempre ata-
sua história pode ✦ “O pastor é bonito cam no domingo.”
valer até R$ 400. Visite demais. Quando está ✦ “Alguém me
o site selecoes.com.br pregando, tenho pen- chamou de ‘irmão’
ou veja os detalhes na samentos impuros e em vez de usar meu
página 5. me distraio.” nome.”

02.2020 seleções 43
 Comida é um bem
muito precioso,
diz a ativista
antidesperdício
Selina Juul.

44 seleções 02.2020
 A infância passada na Rússia soviética ensinou
Selina Juul a nunca subestimar a comida em
sua mesa. Hoje, ela encabeça um movimento
crescente para eliminar da sociedade o
esbanjamento de alimentos.

VAMOS
PARAR DE
DESPERDIÇAR
COMIDA
por Tim Hulse

O
utubro de 2019. Selina Juul está sentada na ter-
ceira fila da plateia no Tivoli Congress Hall, em
Copenhague, quando o ex-vice-presidente ame-
ricano Al Gore sobe no palco amplo e curvo. Ele
está ali para fazer uma palestra sobre a crise cli-
mática. Graças aos anos de campanha ambiental, Gore é
© AndreAs Mikkel HAnsen

apresentado como “superastro do clima global”. “Esta é a

batalha de vida ou morte de nossa geração”, declara ele.
E diz que só restam três questões a discutir: “Devemos
mudar? Podemos mudar? Vamos mudar?”
Para Selina, as palavras de Gore têm importância espe-
cial. Quatorze anos atrás, o documentário Uma verdade
inconveniente, apresentado por Gore, mudou sua vida e

02.2020 seleções 45
a inspirou a tentar
mudar o mundo a
seu próprio modo.
Antes da fala de
Gore, ela teve a opor-
tunidade de lhe con-
tar isso e explicar que
criou um movimento
chamado Stop Spild
Af Mad (Pare de Des-
perdiçar Comida), que
teve imenso impacto na
Dinamarca. Seu encontro foi trans-
mitido pelos noticiários noturnos da
TV dinamarquesa: Selina, nascida
na Rússia, é uma celebridade no país
adotivo, e o que ela diz ou faz vira no-
tícia. “Foi uma grande honra conhe-
cê-lo”, diz ela, mostrando com orgulho
a selfie no celular. Selina é uma pes-
soa amistosa e empática que prefere
abraços a apertos de mão e fala com
paixão articulada sobre o tema que
guarda no coração.
Sua ambição é que algum dia o des-
perdício de comida seja considerado
socialmente tão inaceitável quanto
fumar em recinto fechado. “Ver as
pessoas desperdiçando comida me
deixa muito triste”, diz ela. “Estão des-
perdiçando dinheiro e recursos. Neste
planeta, quase um bilhão de pessoas
passam fome hoje, enquanto comida
suficiente para alimentar dois bilhões
é perdida ou desperdiçada.”
Selina tem uma aparência extraor-
dinária: toda vestida de preto e cabelo
louro platinado. Enquanto fala, os bra-
ços se agitam, os dedos abertos, como
46 seleções 02.2020
Uma selfie com Al Gore, que
inspirou a campanha de Selina.
se indicassem a importância
e a urgência da causa. “So-
lucionar esse problema será
um dos segredos para atin-
gir a paz mundial”, diz ela.
“Se toda criança, mulher e
homem tivesse o suficiente
para comer, muitos confli-
tos do mundo cessariam.”
D
esde 2008, quando Selina
lançou o movimento Pare de
Desperdiçar Comida, estima-
-se que a Dinamarca tenha re-
duzido em mais de um quarto
a perda de alimentos, e ela pode levar
boa parte do crédito. É justo dizer que
sua causa é parte importante de sua
vida, e hoje é apenas mais um dia de
uma semana tipicamente caótica que
começou com uma palestra numa es-
cola da Jutlândia.
Também haverá algum tempo para
planejar a viagem ao Vaticano – aonde
ela irá, convidada a falar numa confe-
rência sobre desperdício de alimentos
– e para organizar um jantar na em-
baixada da Suécia em Copenhague,
onde suecos influentes e tomadores
de decisões internacionais partici-
cortesiA de selinA Juul
parão de uma refeição feita com ali-
mentos excedentes, na esperança de
que se inspirem a pôr o desperdício
de comida na pauta política.
O Jantar Internacional Pare de Des-
perdiçar Comida se tornou um evento
 Com apoiadores num
evento culinário em
Copenhague, em 2016.
anual para Selina. Ano passado, ela o
organizou na embaixada holandesa, e
no ano que vem será a vez da francesa.
A semana terminará na editora
© MinistÉrio do Meio AMBiente e dA AliMentAÇÃo dA dinAMArcA
onde Selina verá pela primeira vez um
exemplar de seu livro Mad Med Respekt
(Comida com respeito), com conselhos
às famílias para evitar o desperdício e
80 receitas com sobras criadas por vá-
rios luminares das culinárias dinamar-
quesa e francesa, além de Sua Alteza
Real, a princesa Marie, nora da rainha
da Dinamarca. Todos os colaborado-
res ofereceram seus serviços de graça,
e um percentual da venda do livro irá
para a entidade DanChurchAid, que
ajuda crianças famintas da África.
Selina está empolgada com o envol-
vimento da princesa. É um sinal de que
sua campanha contra o desperdício de
comida foi além do nicho do ativismo
e chegou à linha dominante da socie-
dade dinamarquesa. “A princesa é uma
pessoa muito doce e realmente se de-
dica a isso”, diz Selina. “É uma ótima
embaixadora de todo o movimento
contra o desperdício de alimentos.”
Com mais de 200 projetos lançados
na última década, não há dúvida de
que Selina está deixando sua marca,
mas a posição em que se encontra hoje
ao se aproximar dos 40 anos é algo que
ela nunca imaginaria no início da car-
reira de programadora visual. “Eu não
acreditaria que hoje estaria fazendo
isso”, diz ela, rindo. “Não sou política
nem ligada em comida.”
As sementes do ativismo de Selina
foram plantadas bem cedo, quando
ela era criança na Rússia soviética.
No fim da década de 1980, houve a
02.2020 seleções 47
ascensão de Mikhail Gorbachev, e
palavras como perestroica e glasnost
se tornaram conhecidas do público.
A sociedade soviética estava ficando
mais liberal, mas ao mesmo tempo o
país enfrentava uma crise econômica.
Quando criança, morando num
apartamento em Moscou com os pais
e avós, Selina sofreu em primeira
QUANDO TRABALHOU NUMA PADARIA, SELINA FICOU
CHOCADA AO VER O PÃO JOGADO FORA NO FIM DO DIA.
mão as privações de um sistema em
declínio terminal. “O comunismo des-
moronou e, de repente, não havia co-
mida nos supermercados”, recorda ela.
“A piada sobre o supermercado russo
é que a gente entra e não tem comida.
Foi o que aconteceu na década de 1980.
Era minha avó que fazia as compras e
cuidava da casa, e me lembro que ela
dizia que não devíamos desperdiçar
48 seleções 02.2020
nada, porque não sabíamos se haveria
comida amanhã. É uma sensação as-
sustadora. Mais de uma vez, ela voltou
do supermercado sem nada. Fazia de
tudo para que a comida durasse e ainda
tivéssemos o que comer na mesa. Ela é
minha maior heroína, porque foi ela
quem realmente me ensinou tudo isso.”
A situação ficou tão ruim que as
famílias russas começaram a receber
auxílio alimentar do Ocidente. “Basi-
camente, era presuntada em lata”, ri
© nordic Business ForuM
Selina. “Não conhecíamos e pensa-
mos: Uau, é comida do Ocidente, tem
de ser muito boa! Minha avó dizia:
‘Não podemos desperdiçar. Temos
de comer pedaços bem pequenos, é
delicioso.’”
Não muito depois, Selina, com 13

anos, se mudou para Copenhague
com a mãe cientista, que arranjou
emprego na universidade. (Nessa
época, seus pais estavam divorcia-
dos.) Quando ela contou aos novos
colegas a história da presuntada, eles
não acreditaram.
Mas Selina também se espantou
com a forma desleixada com que os
colegas desperdiçavam comida. “Os
pais preparavam o lanche dos filhos,
que jogavam tudo no lixo antes de ir
ao McDonald’s”, recorda ela.
A primeira vez que visitou um su-
permercado na Dinamarca, ela se
surpreendeu com a quantidade de
comida exposta. Depois, como esta-
giária numa padaria, ficou perplexa
ao ver o pão que sobrava no fim do
dia ser ensacado e jogado fora.
Quando terminou o secundário,
Selina foi estudar jornalismo e pro-
gramação visual na faculdade e, em
seguida, começou a trabalhar como
Palestra no Fórum
Empresarial Nórdico
sobre desperdício
de alimentos.
Helsinque, 2017.
ilustradora autônoma, com empresa
própria. “Aí assisti a Uma verdade in-
conveniente”, diz ela. “E acordei.”
J
ulho de 2008. É a última noite
das férias de Selina e do na-
morado Jakob na Croácia, e
eles estão jantando no terraço
do hotel, perto da pitoresca
cidade costeira de Šibenik. Dois anos
se passaram desde que Selina assis-
tiu a Uma verdade inconveniente e
decidiu que precisava fazer alguma
coisa para provocar mudanças. Nessa
noite, a resposta lhe vem de repente,
do nada. Por que ninguém se concen-
tra no desperdício de comida? Afinal,
a produção de alimentos é o terceiro
maior emissor de CO2 do mundo.
“Naquela noite, fiquei empolgada
demais para dormir”, diz Selina. Ela faz
anotações e chega a rabiscar rapida-
mente o logotipo do movimento que
toma forma em sua cabeça: simples
02.2020 seleções 49
palavras em branco e vermelho num
quadrado preto. No dia seguinte,
quando volta a Copenhague, há uma re-
portagem num dos jornais dizendo que,
todo ano, os dinamarqueses desperdi-
çam, em média, 63 quilos de alimentos
por pessoa. “Foi um sinal”, diz ela.
Naquele mesmo dia, ela cria no Fa-
cebook o grupo Pare de Desperdiçar
Comida. As pessoas entram. O ímpeto
cresce. Em 15 dias, Selina chama a aten-
ção da mídia dinamarquesa e dá entre-
vistas sobre o desperdício de alimentos.
Então ela recebe um telefonema de An-
ders Jensen, diretor de compras e mar-
keting do REMA 1000, a maior rede de
supermercados da Dinamarca. “Eu a
ouvi no rádio falando que os varejistas
tinham uma grande responsabilidade”,
recorda Jensen. “Liguei para ela e per-
guntei: o que podemos fazer?”
Os dois se encontraram num café na
Praça Nova do Rei, em Copenhague,
e concordaram que era loucura que
um terço da produção de alimentos
do mundo fosse simplesmente jogada
fora. Jensen disse que nunca gostara
muito de dar descontos por volume,
do tipo “pague dois e leve três”. Ele
achava que isso só incentivava o des-
perdício. Selina concordou. Depois da
reunião, o REMA 1000 anunciou que
não daria mais descontos por volume.
“E foi como se uma bomba explodisse”,
diz Jensen com uma risada. “Foi uma
grande notícia. Todos os concorrentes
disseram que era loucura.” Ele sabia
que, pelo menos a princípio, suas lo-
jas venderiam menos. “Mas cruzamos
50 seleções 02.2020
os dedos, torcendo para que, a longo
prazo, mais gente viesse, porque nin-
guém gosta de jogar comida fora. Fe-
lizmente, agora temos cada vez mais
clientes satisfeitos”, diz ele. “Talvez a
margem seja um pouco menor, mas
estamos vendendo mais. Leva tempo
até as pessoas se acostumarem.”
P
ara Selina, foi só o começo.
Nos últimos 11 anos, ela pro-
vou ser uma astuta operadora
de mídia, com campanhas que
agradam ao público: conven-
cer os supermercados a vender “legu-
mes feios”, por exemplo, incentivar as
pessoas a levarem para casa o que so-
brou no restaurante ou popularizar o
conceito de OCNI, os “objetos conge-
lados não identificados”. São as sobras
que congelamos e esquecemos. Selina
sugere que, de dois em dois meses, fa-
çamos uma “semana dos OCNIs” para
comer tudo o que estiver guardado.
Números recentes mostram que
os países da União Europeia des-
perdiçam 88 milhões de toneladas
de alimentos todo ano, e, na última
década, tanto indivíduos quanto go-
vernos tentaram resolver a questão.
Na Alemanha, uma campanha tentou
descriminalizar o chamado “mergu-
lho na caçamba”, em que pessoas “se
apropriam” da comida descartada pe-
los supermercados. Na França, hoje, a
lei obriga os supermercados a doar os
alimentos excedentes a instituições de
caridade e entidades que distribuam
comida. Na teoria parece bom, mas
o resultado, segundo Selina, pode ser
que as instituições fiquem inundadas
de alimentos indesejados.
Em casa, Selina pratica o que prega.
Ela mora com Jakob (já estão juntos
há mais de 18 anos) e ambos são pis-
citarianos, isto é, consomem peixes e
PAÍSES DA UNIÃO EUROPEIA DESPERDIÇAM 88
MILHÕES DE TONELADAS DE COMIDA POR ANO.
frutos do mar, mas não outras carnes.
Guardam tudo o que sobra da prepa-
ração de legumes e verduras numa
vasilha na geladeira e, uma vez por
semana, transformam tudo em caldo,
que congelam em pequenas porções
e usam em novos pratos.
A
pesar da fama, Selina man-
tém sua vida particular o
mais privada possível. Ela
recusou a oportunidade
de aparecer na versão di-
namarquesa da Dança dos famosos.
“Para ser respeitada como líder de um
movimento, é preciso ter seriedade”,
observa ela, que insiste em que não
é uma pessoa extrovertida, apesar
do comportamento aparentemente
gregário. Usa óculos escuros na rua
para não ser reconhecida e se sente
mais feliz em casa, escrevendo e de-
senhando. “O que faço exige que eu
saia e fale com milhares de pessoas. É
difícil”, diz ela com um suspiro. “Pre-
ciso passar algum tempo sozinha. Não
consigo ver gente o tempo todo.”
E fazer campanha contra o des-
perdício de alimentos com certeza
não a enriqueceu. Nos oito primei-
ros anos, ela equilibrava o trabalho
e as campanhas, geralmente ficando
acordada até tarde da noite. Mais re-
centemente, recebeu financiamento
suficiente para se concentrar na cam-
panha, mas o que ganha mal dá para
cobrir as despesas, segundo ela. Se-
lina trabalha com as Nações Unidas,
a União Europeia e o governo dina-
marquês, dá palestras e entrevistas e
assessora empresas – em geral, tudo
de graça. “Sim, sou uma celebridade
nacional. Sim, todo mundo me quer
na TV, todo mundo me quer em toda
parte, mas na hora do dinheiro...” Ela
dá de ombros.
Selina foi escolhida para receber o
prêmio Europeu do Ano, do Reader’s
Digest, de 2020. “Eu me sinto incrivel-
mente honrada”, diz ela. “Os cientistas
e ativistas que já ganharam esse prêmio
são incríveis. Espero que eu possa ser
uma inspiração para os outros.”
Anders Jensen acredita que o prêmio
é merecido. “Ela é uma pessoa muito
positiva, muito viva, muito inspira-
dora”, diz ele. “Ninguém falava sobre
desperdício de alimentos até Selina
aparecer. Ela brigou muito, e agora as
pessoas começaram a escutar. Deve-
mos tudo isso a ela.”
02.2020 seleções 51
 “Nunca me
esqueci
de você”
FOTOS NO medalhãO: CORTeSIa da aUTORa.medalhãO:©ShUTTeRSTOCK
Depois de mais de seis décadas, um romance
adolescente frustrado tem uma segunda chance

por Marina Lopes

de The WaShINgTON POST magazINe

E
m abril de 2017, num sábado de sol, o tele-
fone tocou na casa da minha avó em São Car-
los, SP. “Estou procurando você há décadas”,
sussurrou em italiano o homem do outro
lado da linha. “Você foi o meu primeiro amor.”
Fazia mais de seis décadas que minha avó não ou-
via a voz de Aldo Sportelli, hoje com 83 anos.

52 seleções 02.2020
02.2020 seleções 53
 Ela imaginou seu rosto juvenil e se
perguntou como ele estaria agora. A
voz de Aldo tremeu quando ele re-
cordou a última vez que a viu, no
sul da Itália. Passara anos tentando
encontrá-la.
Durante dez minutos, eles con-
taram resumidamente um ao outro
como a vida se desenrolara – ambos
casados por meio século, minha avó
viúva, a mulher de Aldo nos últimos
estágios da doença de Alzheimer, fi-
lhos, netos, carreiras. “A gente nunca
acha que essas coisas vão acontecer”,
disse minha avó.
ALDO OBSERVOU O
TREM DE MARILENA SE
AFASTAR. FOI UM DOS
MOMENTOS MAIS
TRISTES DE SUA VIDA.
E
m 1951, quando tinha 14 anos,
minha avó Marilena passou um
ano na Itália com seus avós. An-
tonio Lerario, o avô dela, era filho de
um pescador analfabeto e, em 1885,
aos 14 anos, partiu da Itália para o
Brasil como clandestino num navio.
Em São Paulo, uniu-se a milhares de
imigrantes italianos e foi vender sa-
cos de arroz nas ruas. Ele conseguiu
economizar o suficiente para abrir o
próprio armazém e criou um império
multimilionário de grãos e cereais.
Depois da Segunda Guerra Mundial,
54 seleções 02.2020
Antonio decidiu voltar à Itália e convi-
dou Marilena, a neta mais velha, para
ir junto. Em abril de 1951, o transatlân-
tico italiano SS Conte Biancamano zar-
pou do porto de Santos. Minha avó era
a passageira mais jovem da primeira
classe, que incluía condes, integrantes
da aristocracia brasileira e o arcebispo
do Rio de Janeiro.
Quando o navio atracou em Gênova,
Marilena e os avós pegaram o trem
para Puglia, o calcanhar da bota. A
guerra terminara havia seis anos, mas
a destruição ainda estava lá. No en-
tanto, os escombros não conseguiam
reduzir a beleza caiada de Polignano
a Mare, a cidade natal do avô. A al-
deia fica empoleirada em penhascos
de pedra calcária à beira-mar. Como
magnata do arroz que voltava à pátria,
Antonio hospedou-se com a família no
Hotel Sportelli.
O hotel tinha três andares, com um
terraço que dava para o mar. Lá em-
baixo, cavada na face do penhasco,
havia uma vasta caverna que abrigava
o restaurante de luxo Grotta Palaz-
zese. Visitantes do mundo inteiro iam
jantar lá.
Marilena, que passava os dias ob-
servando as pessoas no terraço do
hotel, nunca tinha permissão de ir à
caverna. Depois de perceber alguns
empresários fitando a mocinha no
restaurante, a avó passou a enxotá-la
para a cozinha assim que a correria
do almoço começava. Esbelta, de cin-
tura delgada, ela transmitia o tipo de
glamour altivo e sem esforço de uma

estrela de cinema de Hollywood. Ca-
chos escuros emolduravam seu rosto.
Marilena tinha lábios em forma de
coração, um nariz bonito e um sor-
riso curioso.
Oferecendo-se para ajudar na co-
zinha, Marilena aprendeu italiano
e conheceu a família Sportelli. Aldo
Sportelli, um ano mais velho do que
ela, se apaixonou. Magro, de sorriso
tímido, ele ficava na cozinha quando
voltava da escola. “Ela foi minha
primeira paixão”, disse-me ele. Eles
conversavam sobre os planos para o
futuro. Ele queria ser engenheiro. Ela
não sabia o que a aguardava quando
voltasse ao Brasil.
Depois da escola, Aldo servia os fre-
gueses glamourosos do restaurante;
CORTeSIa da aUTORa
minha avó passava as noites ouvindo
a música que vinha da caverna lá em-
baixo. De vez em quando, Aldo a en-
contrava no terraço, sempre sob os
olhos vigilantes de alguém da família.
Marilena Lerario e Aldo Sportelli se
conheceram em Polignano a Mare,
cidade natal do avô dela, em 1951,
quando a jovem passou um ano na Itália.
Certo dia, quando Marilena des-
cia a escada da cozinha, Aldo tentou
abraçá-la. Sem saber o que fazer, ela
fugiu correndo.
A família de minha avó não estava
contente com o início do romance. O
filho de um hoteleiro não era o que
imaginavam para a herdeira da famí-
lia. A mãe de Aldo explicou ao filho
que a distância social entre ele e Ma-
rilena era grande demais. “Na época,
achei que tinham razão”, recorda Aldo.
Os dois mantiveram uma relação
desajeitada mas amistosa nas últi-
mas semanas que ela passou no ho-
tel. Antes de partir, ela lhe pediu que
assinasse seu livro de lembranças.
“Marilena, se você permitir, a ami-
zade pode ser um laço duradouro”,
escreveu ele.
Quando ela partiu, ele foi à estação
e observou o trem se afastar. Foi um
dos momentos mais tristes de sua
vida, conta Aldo.
02.2020 seleções 55
M
inha avó conheceu meu
avô na faculdade e, em 1969,
estava casada e tinha quatro
filhos. O casamento foi feliz, mas o
ciúme de meu avô conteve a curio-
sidade que ela sentia pelo mundo.
Quando iam a restaurantes, ela se
sentava voltada para os fundos, para
evitar os olhares dos outros fregueses.
Pouco depois do casamento, eles
se mudaram para uma cidadezinha
mais ao sul, a três horas de São Paulo.
Meu avô gostava da vida da cidade
pequena, mas minha avó teve dificul-
dade para se ajustar. Quando ele mor-
reu, ela começou a passar metade do
ano com minha mãe em Miami.
Enquanto isso, Aldo estudou enge-
nharia. Durante quase toda a carreira,
trabalhou no planejamento urbano
de pequenas comunidades. Em 1959,
conheceu Beatrice numa festa. Eles se
casaram e tiveram dois filhos.
Beatrice sofria de depressão, e o
casamento foi difícil para Aldo. Seu
círculo de amigos era pequeno, e eles
raramente viajavam. Depois que sua
mãe morreu, em 1995, Aldo achou
uma foto do casamento de sua amada
Marilena entre as cartas dela. A avó de
Marilena devia ter enviado.
“Pensei, onde ela estará? Como será
sua vida?”, recorda ele. “A ideia de que
nunca mais teria notícias da mocinha
que ocupara meu coração juvenil me
atormentava.” E foi assim que come-
çou sua busca.
Aldo tentou entrar em contato com
o fotógrafo do casamento, mas ele
56 seleções 02.2020
morrera havia muito tempo. Mandou
e-mail para a prefeitura de São Paulo
pedindo informações sobre Marilena
Lerario. “Somos uma cidade de 12
milhões de habitantes”, responderam
a Aldo. “Não podemos ajudá-lo.”
Em 2012, Beatrice recebeu o diag-
nóstico de doença de Alzheimer e
doença de Parkinson. Por fim, parou
de falar e mal reconhecia os filhos. Re-
cusou o atendimento doméstico com
enfermeiras e recorria a Aldo para to-
das as suas necessidades.
Duas décadas depois de começar
sua busca, Aldo conseguiu entrar em
contato com a filha de um amigo da
família que trabalhava na Receita
Federal brasileira. Ela encontrou
Marilena e lhe passou o número do
telefone.
Naquela tarde, quando telefonou,
Aldo disse a Marilena: “Nunca me es-
queci de você.” Minha avó não soube
o que dizer.
N
o dia seguinte, Aldo ligou ou-
tra vez. O que os filhos dela fa-
ziam?, perguntou. Como eram
seus dias?
– Não sei nem com que cara ele
está, e conversamos todo dia – disse
minha avó.
– Vamos procurar no Facebook
– sugeri.
Achei a foto de Aldo. Tinha o cabelo
branco, mas os mesmos olhos tristes e
o sorriso tímido dos 17 anos.
– Ele é bonito. – Minha avó sorriu.
Sugeri que se comunicassem por
videochat. No fim de semana seguinte,
fui à casa dela para uma reunião de
família e mandei uma mensagem a
Aldo para marcar a chamada. Minha
família estava ansiosa para ver o ho-
mem sobre quem minha avó não pa-
rava de falar.
Lá estava Aldo na tela do compu-
tador, sorrindo. “Você não era loura!”,
disse ele. Minha avó deu risada.
“TÃO LINDA”,
DISSE ALDO,
TREMENDO AO
ABRAÇAR
MINHA AVÓ.
Semana após semana, Aldo conti-
nuou ligando. “É bom ter alguém que
se preocupa comigo outra vez”, me
disse vovó.
As mensagens logo ficaram mais
fofas: emojis de coração, fotos de flo-
res. “Para quando você acordar: bom
dia”, mandou ele certa vez. Era dia na
Itália mas ainda madrugada no Brasil.
Minha avó, que se isolara do
mundo, voltou à vida. Começou a se
arrumar para os encontros virtuais:
passava batom, ajeitava o cabelo.
“Temos de levar você de volta a Po-
lignano!”, disse minha mãe certo dia.
Minha avó rejeitou a ideia e protestou:
“Ele é casado!”
Minha mãe foi persistente, e logo
Marilena ligou para Aldo para dar a
notícia. “Passaremos quinze dias aí
em setembro”, comunicou ela. Ele
concordou que ela devia ir.
A
companhada por minha mãe,
meu pai, minha tia, dois primos
e eu, minha avó desembarcou
em Bari, nervosa, mas sorridente.
Quando chegamos ao hotel de Polig-
nano, um buquê de rosas cor-de-rosa
a esperava. “Bem-vinda à sua cidade
natal”, escreveu Aldo no cartão. “To-
mara que você não espere mais 68
anos para voltar.”
Na manhã seguinte, passamos de
carro por quilômetros de olivais con-
torcidos. Minha avó suspirou e disse:
“Que interessante, não é? Uma velha
procurando um velho.”
Aldo tinha pedido para nos encon-
trar na igreja de São Vito, pouco antes
da missa. Quando paramos à entrada,
ele estava esperando. Com os olhos
azul-celeste escondidos atrás dos ócu-
los ray-ban prateados, cabelo alisado
para trás e jaqueta marrom, era o oc-
togenário mais elegante que eu já vira.
Minha avó desceu do carro e andou
até ele, os braços abertos.
“Tão linda”, disse ele, tremendo ao
abraçá-la. Ela corou e o apresentou à
família. “É um momento histórico, um
milagre”, anunciou ele.
Mais tarde, minha avó deu dois
presentes a Aldo. Um foi um iPhone
novo: o dele estava velho e a bateria
sempre morria durante as conver-
sas. “E este é para Beatrice”, disse ela,
apontando o segundo presente. Ele o
02.2020 seleções 57

abriu e encontrou um xale cinzento.
Aldo fitou minha avó, com lágrimas
nos olhos, e balbuciou: “Obrigado.”
Nós o convidamos para almoçar,
mas ele disse que tinha de voltar para
casa e liberar a faxineira que cuidava
da mulher.
Naquela noite, Aldo mandou uma
mensagem à minha avó. “Lá estáva-
mos, você e eu, como se fôssemos bons
amigos há 68 anos, ajudando um ao
outro na tristeza e festejando juntos as
alegrias”, escreveu ele. “Agradeço a Deus
a oportunidade de estar com você.”
E
les se encontraram todos os
dias para um café nas poucas
horas em que ele podia sair de
casa. Minha avó se recusava a ficar so-
zinha com ele. “O que os outros vão
pensar se nos virem juntos?”, pergun-
tava. “Vai pegar mal.”
A princípio, ri disso como uma
58 seleções 02.2020
Marilena e Aldo em
Polignano a Mare.
“Agradeço a Deus a
oportunidade de estar com
você”, escreveu ele.
noção antiquada de recato.
Mas, aonde quer que fôs-
semos, Aldo encontrava co-
nhecidos. “Aldo Sportelli!”,
gritava algum amigo do ou-
tro lado da rua, fazendo mi-
nha avó se encolher.
A um encontro, ele levou
a filha e o neto. Fiquei com
medo do que pensariam de
minha avó, mas toda a ansiedade su-
miu quando os conhecemos. Sabrina,
a filha de Aldo, abraçou minha avó
com força. Minha avó lhe levara um
colar, que ela pôs na mesma hora. “Dê
um abraço na avó Marilena”, disse Sa-
brina a Giorgio, seu filho de 12 anos.
“Tem sido uma dádiva para papai”,
contou Sabrina mais tarde quando lhe
perguntei como via a relação dos dois.
“Ele é vítima da doença de mamãe.”
Quando não estávamos com Aldo e
sua família, minha avó queria explo-
rar Polignano. Ainda era uma aldeia
encantadora, com ruas estreitas de
pedra calcária que levavam a pontos
belíssimos que davam para o mar.
Mas muitas coisas mudaram desde
CORTeSIa da aUTORa
a última visita. A Red Bull escolhera
Polignano como sede de sua compe-
tição anual de mergulho em penhas-
cos, e agora a cidade estava lotada de
turistas.
 O restaurante na caverna ainda
funcionava, e minha avó, que só pôde
olhar de longe os fregueses que janta-
vam lá quando tinha 15 anos, quis vê-
N
-lo de perto. Numa de nossas últimas
noites em Polignano, descemos os
60 degraus para jantar na caverna.
Quando saímos no deque de ma-
deira, a vista me tirou o fôlego. Está-
vamos suspensos a uns 10 metros do
mar. O reflexo esmeraldino da água
dançava contra a cúpula de pedra
calcária da caverna.
Aldo recusou o convite para ir por-
que as lembranças de perder o vizinho
Hotel Sportelli numa disputa financeira
20 anos antes eram dolorosas demais.
Minha avó respeitou a decisão dele.
“Não é incrível?”, perguntou ela, fi-
tando o mar. “Só a natureza sabe há
quantos milhões de anos isso está aqui.”
No dia seguinte, em outro café, Aldo
mostrou uma foto da família em 1934,
e minha avó a estudou. “Conheci to-
dos eles”, disse. “Tivemos essa vida em
comum. Não é uma loucura?”
Aldo lhe contou o que tinha aconte-
cido com cada pessoa da foto.
– Quando você vai embora? – per-
guntou ele.
– Amanhã – respondeu ela.
Os dois ainda tinham 40 minutos
antes de Aldo voltar para casa. De-
pois de servir de vela em todos os
Abra-se
Guarde um espaço no seu coração para o inimaginável.
M A RY O L I V E R, P O E TA
momentos que os dois passaram jun-
tos, deixei minha avó a sós para apro-
veitar o seu último encontro.
a manhã seguinte, Aldo, Sa-
brina e Giorgio foram nos bus-
car no hotel. Agradecemos a
hospitalidade e a felicidade que de-
ram à minha avó. “Nossa família será
uma extensão da sua”, disse meu pai.
Fiquei surpresa ao ver lágrimas cor-
rerem pelo rosto de Sabrina. “Tome
conta dele”, pediu minha avó, abra-
çando-a. Ela fez que sim, chorando.
Aldo pegou a mão de minha avó.
“Agora farei o mais difícil: dar meia-
-volta e ir embora”, disse ele.
Minha avó não se deixou dominar
pela finitude do momento. Deu um
último abraço em Aldo e, quando nos
afastamos, ergueu o celular e falou:
“Vejo você amanhã.”
Aldo e Marilena continuam a conversar
diariamente. Marilena diz que talvez
visite a Itália ainda este ano, se estiver
com saúde. A mulher de Aldo ainda
está viva, mas sua saúde continua a
piorar. Aldo disse a Marilena que acre-
ditou que ela era o amor de sua vida
quando se conheceram e que seu reen-
contro foi “uma bênção de Deus”.
The WaShINgTON POST (6 de FeveReIRO de 2019), © 2019
de maRINa lOPeS, WaShINgTONPOST.COm
02.2020 seleções 59
 ENTRE ASPAS
Acredito que, quando morrem, as pessoas
permanecem em quem as ama. Essa ideia de que tudo
acaba e não se fala mais delas... está errada.
—Martin Short, ator

O superávit de esforço pode vencer o déficit de confiança.

—Sonia Sotomayor, juíza da suprema corte americana

Sabemos o que as pessoas querem ouvir porque, quando

tocamos uma música dos Beatles, as luzes dos celulares

a partir da esQuerda: cHelsea lauren/VarietY. elaine tHompson/ap.antHonY

são acesas e parece uma galáxia de estrelas e, quando
tocamos uma música nova, parece um buraco negro.
—Paul McCartney, músico

Se as pessoas se concentrassem nas coisas realmente

HarVeY.eVan aGostini/inVision/ap (tudo sHutterstocK)

importantes da vida, haveria escassez de varas de pescar.
— Doug Larson, jornalista

Aos 50 anos, nada fica melhor do que filtro solar aos 20.
— Jennifer Garner, atriz

SHort SotoMayor Mccartney Garner

 “A vida é breve” na verdade significa “Faça alguma coisa”.
— Chimamanda Ngozi Adichie, escritora

Se passar pela vida sem se ligar aos outros, até

que ponto você poderia chamar isso de vida?
— Tom Hiddleston, ator
a partir da esQuerda: daVid FisHer.ricHard sHotWell/inVision/ap.tom nicHolson (tudo sHutterstocK)

Se o amor é fantasia, eu me encontro

ultimamente em pleno carnaval.
— Vinicius de Moraes, escritor e compositor

PARA PENSAR
Quando der o melhor de si, você vencerá
todas as vezes. Talvez não seja hoje, talvez não
seja amanhã, mas a retribuição virá quando for
preciso. Vivemos numa época de gratificação instantânea,
de curtidas imediatas, e é incômodo esperar para
ver os dividendos da bondade. Mas juro: eles vão
aparecer exatamente quando você precisar.
—Kristen Bell, atriz

adicHie Bell HiddleSton

62 seleções 02.2020
 Os vilarejos da Europa estão em rápido
declínio, mas o exemplo de um homem mostra
que há como deter a decadência rural.

O VILAREJO
QUE DEU
A VOLTA
POR CIMA
por Tim Hulse
fotografado por antoine doyen

A
primeira coisa que se nota é o zumbido. Quem
anda pelas ruas de Saint-Pierre-de-Frugie ouve ao
fundo um zumbido constante enquanto as abe-
lhas se banqueteiam com o néctar dos muitos pés
de lavanda e outras plantas perenes nos canteiros
bem-cuidados nas calçadas. Mas não são apenas as abelhas
que se sentem atraídas por esse minúsculo vilarejo aninhado
nos morros ondulantes da região da Dordonha, no centro da
França. Os turistas vêm caminhar pelas trilhas próximas. E,
como atestam as obras atualmente em andamento em algu-
mas propriedades, cada vez mais gente vem lançar raízes.
Esse aparente idílio rural é obra de Gilbert Chabaud, um

Renovação do povoado (a partir do alto): Louise e Joppe

conversam com um visitante; Frédérik cultiva 50 espécies em sua
horta; Marie foi atraída ao vilarejo pela abordagem sustentável.

02.2020 seleções 63
vendedor de carros aposentado que, ao
que parece, achou a solução para o fla-
gelo do despovoamento que continua
a afligir as regiões rurais da Europa.
Muito animado em seus 75 anos, Cha-
baud nasceu na aldeia vizinha e assis-
tiu em primeira mão ao êxodo lento.
Em 2008, foi eleito prefeito da região.
“Eu não queria ser prefeito”, diz ele
enquanto aprecia uma quiche de ce-
noura no Saveurs et Valeurs, o prós-
pero restaurante do vilarejo. “Nunca
pensei nisso, mas amigos me conven-
ceram a me candidatar.”
Para sua surpresa, foi eleito, e agora
recebe o salário nada principesco de
600 euros por mês. Mas o dinheiro
não é importante para Chabaud. Ele é
um homem com uma missão: dar vida
nova ao lugar que ama. Gilbert Chabaud, vendedor de carros
“Quando fui eleito, não havia em- aposentado e hoje prefeito de Saint-
presas, restaurantes nem escolas”, diz, -Pierre-de-Frugie.
dando de ombros do típico jeito gaulês.
“A questão era: o que fazer para impe- grandes. Enquanto isso, a população
dir que o vilarejo morresse e para que rural da Europa se reduzirá ainda mais
as pessoas viessem para cá e ficassem?” em 7,9 milhões de habitantes.
O relatório pinta um quadro nítido

O
problema que Chabaud
enfrentou é comum em
toda a Europa. De acordo
com uma recente sinopse
política da rede de ob-
servação europeia para a coesão e o
desenvolvimento territorial (ESPON),
espera-se que a população das regiões
urbanas da Europa aumente em 24,1
milhões de pessoas até 2050, ou seja,
cerca de metade de todos os euro-
peus morará em cidades pequenas ou
de uma espiral descendente, na qual
a redução populacional resulta num
desnível crescente entre a oferta e a de-
manda de serviços. Em consequência
da economia local fraca, os serviços se
tornam subutilizados, malconservados,
muitas vezes inviáveis e são suspensos.
As condições e a qualidade de vida se
deterioram, o desemprego cresce e a
mão de obra especializada fica escassa.
Várias soluções foram sugeridas
para deter esse declínio. Por exemplo,

64 seleções 02.2020
350 km a nordeste daqui, a pequena
cidade de Lormes, na Borgonha, é um
campo de ensaio de um novo futuro
digital para pequenos povoados da
Europa que buscam atrair empresas
“QUANDO FUI ELEITO, A QUESTÃO ERA: O QUE
FAZER PARA IMPEDIR A MORTE DO VILAREJO?”
eletrônicas e oferecer aos moradores
serviços baseados na internet.
Na Itália, vilarejos inteiros estão se
transformando em hotéis coletivos,
num conceito chamado de albergo dif-
fuso. Na Espanha, o projeto Aldea Viva
dá apoio a quem planeja se mudar para
o campo e ajuda a encontrar proprie-
dades, trabalho e contato social. Tanto
na Espanha quanto na Itália, a chegada
de migrantes também ajuda a aumen-
tar a população rural em declínio.
E
m Saint-Pierre-de-Frugie,
Chabaud encontrou uma
resposta só sua. Desde que
foi eleito, a população local
aumentou de 360 habitantes
para mais de 460. Além disso, agora há
uma nova mercearia, um restaurante
e uma escola, quando antes não havia
nada disso. E como ele conseguiu?
Enquanto passa para o prato prin-
cipal de macarrão com presunto,
Chabaud descreve seu início como
prefeito. A primeira coisa que fez, disse
ele, foi reformular seu quartel-general.
Na época, a prefeitura era apenas uma
salinha de 15 m². Hoje, é um prédio im-
pressionante, com uma grande área de
recepção. Em seguida, vieram algumas
melhorias. Os moradores contribuíram
com dinheiro para restaurar a igreja e
a capela locais e ajudar em outros pro-
jetos comunitários.
“Não houve nenhum grande plano”,
diz ele. “Eu tinha uma ideia do que
queria fazer, mas no geral as coisas
aconteceram passo a passo.”
Uma decisão inicial foi proibir o uso
de agrotóxicos. Essa notícia não foi boa
apenas para a população local de inse-
tos, mas também para os amantes da
produção orgânica.
“Nem sempre me interessei por
ecologia; não é coisa muito fácil para
um vendedor de carros!”, diz ele, rindo.
“Mas, por morar no campo, sempre tive
certa sensibilidade ecológica. Eu só
queria aumentar a qualidade de vida
dos moradores.”
Em seguida, veio uma horta orgânica
compartilhada, baseada em princípios
orgânicos e aberta a todos. Fica numa
pequena elevação nos arredores do
vilarejo, e, além de ser fonte de frutas,
legumes e verduras, também ajuda a
criar a noção de comunidade. E tem
um propósito educativo: grupos esco-
lares vêm toda sexta-feira aprender os
princípios do cultivo orgânico.
02.2020 seleções 65
 Chabaud também reabriu as trilhas
para caminhada que serpenteiam em
torno da aldeia e, devagar mas com
constância, os turistas começaram a
chegar. Mas não tinham onde beber
“QUERÍAMOS NOS CONECTAR MAIS À NATUREZA.
A VIDA AQUI É TOTALMENTE NOVA PARA NÓS.”
nem comer. Assim, Chabaud e sua
equipe reformaram um prédio para
abrigar o novo restaurante, onde ele
está almoçando hoje.
O restaurante é administrado por
Yann Ducatteuw e Delphine Gazi, um
casal belga que se mudou para Saint-
-Pierre-de-Frugie um ano atrás. Na
Bélgica, Yann tinha um emprego bem
remunerado como assessor ambien-
tal de pequenas e médias empresas,
enquanto Delphine era dona de uma
próspera clínica de osteopatia.
Mas eles queriam algo mais em sua
vida e, quando um amigo falou do vila-
rejo, o casal fez uma visita e decidiu que
era onde gostariam de lançar raízes.
“Queríamos nos conectar mais à
natureza”, diz Yann. “Na Bélgica, há
muita gente e engarrafamentos. Aqui é
tranquilo, há muito verde. É uma vida
totalmente nova para nós, e o prefeito
faz parte dessa nova vida. É ele quem
cria a dinâmica do vilarejo.”
O restaurante serve saborosos pratos
preparados com produtos orgânicos
locais. A mercearia do vilarejo é outra
iniciativa de Gilbert. Os produtores
66 seleções 02.2020
locais disseram que sairia caro demais
abrir uma loja, e Chabaud lhes arren-
dou um prédio. Agora, vem gente de
toda a região fazer compras. Todos os
produtos da mercearia são orgânicos, a
maior parte produzida na vizinhança,
como carne, legumes e verduras da es-
tação, e até sabão.
Conforme sua história foi aos pou-
cos se espalhando, primeiro na região
circundante, depois na imprensa e na
TV de toda a França, o vilarejo come-
çou a atrair gente de fora, como Yann e
Delphine, em busca de uma vida mais
próxima da natureza.
Chabaud explica que quem se
muda para o povoado tem por volta
de 40 anos e, geralmente, trabalha em
casa. Ele cita como exemplos um fotó-
grafo, uma designer de roupas e uma
tapeceira.
N
um passeio pela rua en-
contramos Louise Stod-
dard e Joppe Louwrier, um
casal anglo-holandês que
se mudou recentemente
de Nova York para cá com os filhos.
Louise trabalhava nas Nações Unidas,
mas hoje é assessora autônoma de ins-
tituições de caridade.
“Na verdade, a cidade grande nunca
foi para nós, e sonhávamos em voltar à
Em sentido horário, a partir de cima:
os bem cuidados canteiros de Saint-
-Pierre são um ímã para as abelhas
quando florescem; a casa em
construção de uma família; a loja
orgânica é um ponto de encontro local.

02.2020 seleções 67
Europa e lançar raízes num lugar que
se encaixasse em nossa filosofia”, diz
ela. “Durante muito tempo, ambos fo-
mos ativistas dedicados do movimento
ambiental.”
“Estamos felizes por nós, mas prin-
cipalmente pelas crianças”, acrescenta
Joppe. “Dá para ver que estão radian-
tes, florescendo. Hoje, são crianças
completamente diferentes.”
“Tenho trabalhado muito com ques-
tões da mudança climática, e ver as
coisas em ação é muito bom”, retoma
Louise. “As pessoas não são só ati-
vistas de poltrona e estão realmente
mudando de vida para mostrar que é
possível. Isso é muito inspirador, e qui-
semos participar.”
Louise e Joppe só falam um francês
rudimentar e pedalam até a aula.
“Um senhor do vilarejo nos dá aula
de graça”, diz Joppe. “Aqui há uma no-
ção verdadeira de comunidade.”
Dobrando a esquina, Marie Meu-
nier também se instala em seu novo
lar, tendo se mudado recentemente
da Bélgica para cá, embora ainda haja
muito trabalho a fazer na casa antiga
que restaura com o marido.
Durante muito tempo, o casal plane-
jou levar uma vida autossustentável, e
eles viajaram por toda a França atrás
de um lugar para se instalar até que
descobriram Saint-Pierre-de-Frugie.
“Gostamos do prefeito por sua ati-
tude favorável à ecologia e ao meio
ambiente”, diz Marie. “Conversamos
com ele sobre nosso projeto, e ele nos
arranjou uma casa.”
68 seleções 02.2020
Agora, eles tiram água de uma fonte
próxima, e os painéis solares no jardim
da frente garantem a energia.
Uma grande horta no quintal logo
fornecerá comida para levarem a vida
autossuficiente que tanto desejam.
N
o entanto, se precisar
de legumes e verduras,
Marie pode recorrer a Fré-
dérik Anciot, que cultiva
um terreno de 1.400 m²
arrendado do município. Ele produz
cerca de 50 variedades de legumes e
verduras seguindo princípios orgâni-
cos e vende o fruto de seu trabalho aos
moradores e nas feiras locais.
Ele se mudou para cá em junho pas-
sado, vindo da Bretanha, no noroeste
da França, onde, afirma, a terra foi “de-
vastada” pela agricultura intensiva e os
bosques estão sumindo. “Aqui, posso
me sentar com meu café pela manhã e
ver árvores”, diz, sorrindo. “E além de-
las vejo ainda mais árvores.”
Frédérik e sua parceira têm um filho
de 9 anos, e uma das principais razões
para escolherem Saint-Pierre-de-Fru-
gie, como muitos recém-chegados
com filhos pequenos, foi a escola
montessoriana.
Esse é outro projeto de Gilbert. De-
pois de perceber que o governo não
reabriria a escola do vilarejo, ele pro-
curou uma alternativa e a encontrou
quando conheceu Céline Plancher.
Ex-professora de escolas tradicionais
no Sul da França, ela estudou o método
Montessori e procurava um lugar para

Céline Plancher, diretora da nova escola
montessoriana da aldeia.
pôr a teoria em prática. Então soube de
Chabaud e foi ao seu encontro.
“Foi uma boa reunião”, diz ela, sor-
rindo, sentada com certo desconforto
numa das cadeiras tamanho infantil
da escola, que fica na frente do restau-
rante. A escola abriu com seis alunos
em 2016 e agora tem 22, de 3 a 11 anos,
e Céline tem três funcionários.
“O vilarejo é lindo, e há uma ideologia
Curiosamente engraçado
Quanto mais você aprende sobre o mundo, mais
oportunidades encontra para rir dele.
B I L L N Y E, A P R E S E N TA D O R D E T V
de que a natureza é muito importante e
que é preciso cuidar de tudo à nossa
volta”, conta ela. “Os pais do vilarejo
são recém-chegados e vieram para cá
por causa do que o prefeito está fa-
zendo. Recebo telefonemas de pessoas
que dizem que planejam se mudar
para o povoado em razão do respeito
à natureza e também porque querem
matricular seus filhos na escola. Tudo
está interligado. O que o prefeito co-
meçou a plantar há dez anos está
dando frutos agora.”
Realmente, Chabaud ainda pensa
no futuro. Uma nova escola secundá-
ria abriu no outono passado, também
numa linha alternativa, para atender as
crianças com mais de 11 anos. O pró-
ximo passo, diz ele, é tornar o vilarejo
autossuficiente em comida e energia,
com a instalação de painéis solares em
todos os prédios públicos.
E o que ele acha que o resto da
França e, talvez, o resto da Europa po-
dem aprender com o que ele faz?
“Minha meta não é ser exemplo para
ninguém”, diz com modéstia, dando de
ombros. “Só penso em meu vilarejo.
Não é só um projeto ecológico, é a cria-
ção de novos empregos, o consumo de
alimentos melhores, a criação de um
sistema de vida melhor. E os fatos estão
provando que acertei.”
02.2020 seleções 69
Nesta festa visual de detalhes e
cores, o mundo intrigante dos
“minibichos” vem à luz

VIDA
DE INSETO
fotos de Alan Henderson
do livro minibeasts

70 seleções 02.2020
Este besouro da espécie
Callirhipis tem antenas
impressionantes que
podem ser dobradas e
guardadas quando não
estão em uso. As antenas
são receptores químicos
que permitem que os
insetos encontrem comida
e, no caso dos machos,
detectem os feromônios
de uma fêmea.

02.2020 seleções 71
1

72 seleções 02.2020
 1 Um miriápode da floresta tropiCal se protege
enrolando-se em forma de disco, com suas centenas
de pernas ordenadamente dobradas e a cabeça no
meio, em segurança.
2 Cravejada de espinhos perfurantes que causam
uma ferroada venenosa, esta lagarta da espéCie
CalCarifera ordinata é muito bem armada.
3 Acredita-se que os "olhos" gigantescos nas asas das
borboletas-Corujas intimidem os predadores, que
pensam estar vendo o rosto de um animal bem maior.
4 A cor impressionante desta tarântula-babuíno-
-laranja é um aviso para seus predadores. Se
importunado, este aracnídeo imediatamente

2 mostra suas presas e defende-se com fúria.

5 O diminuto tamanho da aranha-pavão macho
(cerca de 5 milímetros) é compensado pela sua
cor e exibição.

3
4

02.2020 seleções 73
 6 7

6 A fêmea da aranha-

8
-teCedeira-de-seda-
-dourada deixa ainda
menor sua minúscula
contraparte masculina.
Os machos precisam
ter cuidado para não
serem devorados.
7 O amarelo-vivo da
lagarta da mariposa
da espéCie dysphania
fenestrata é um sinal
de aviso, significando
repugnância para os
predadores.
8 A minúscula larva
dos Crisopídeos, em
forma de disco, tem
mandíbulas enormes e
vagueia pela superfície
das folhas.

este é um fragmento
editado de minibeasts ,
de alan Henderson,
© 2018. Publicado Pela
exisle PublisHing,
www.exislePublisHing.com

74 seleções 02.2020
9 O louva-a-deus possui
grandes olhos com-
postos com pupilas falsas,
chamadas pseudopupilas,
criando a ilusão de óptica
de que ele está sempre
olhando para você.

02.2020 seleções 75
 O QUE FAZ
VOCÊ PENSAR QUE
CONSEGUE RESOLVER CLÍNICA DE
PSICOLOG
TODOS OS SEUS
PROBLEMAS VOANDO
PARA O SUL?
OSSOS
do Ofício
O setor de restaurantes
pode atordoar novatos
e profissionais expe-
rientes. Veja só:
✦ Uma mesa pediu
uma Pepsi e uma Coca-
-Cola. O garçom trouxe
os refrigerantes e então,
na frente dos fregueses,
deu um golinho em
76 seleções 02.2020
IA
ambos os copos para
saber qual era qual.
—thechive.com
✦ Um freguês já me
pediu que o carneiro
não tivesse gosto de
carneiro.
—reddit.com
✦ O gerente vive nos
lembrando que, como
garçonetes, devemos in-
centivar os fregueses a
pedir sobremesa. No fim
de um dia muito cansa-
tivo, fui até um casal que
acabara de se sentar, dei
ilustrado por Harley scHwadron
o cardápio e um copo
d’água a cada um e per-
guntei: “Vocês desejam
mais alguma coisa?”
—June Warburton
Meu trabalho como me-
cânico de manutenção
exigia uma grande varie-
dade de talentos. Num
dia eu tinha de conser-
tar a calefação, no outro
podia estar pintando o
escritório do presidente.
Quando descrevi meu
serviço a uma colega
 Passo três minutos por dia escolhendo um
canal de TV para deixar ligado para meu
cachorro, depois vou trabalhar e as pessoas
me levam a sério como adulto.
— @damienfahey PREZADO SINHÔ
como “pau para toda no chão também! Mas
OU SINHORA
obra”, achei graça, em- vou limpar! Ih, pisei A primeira página do cur-
bora tenha ficado um no cocô! rículo é sua apresentação
pouco ofendido, quando Houve um silêncio a um possível gerente
ela fez uma interpreta- desagradável e percebi contratante. Não estrague
ção um pouco menos que o médico tinha ou- tudo como estes aqui:
elogiosa da expressão vido cada palavra. ✦ “Sou uma pessoa moti-
em seu cantonês nativo: – Ha-ha – ri de ner- vada e autoinflamável.”
“Equipado com todas voso. – O senhor tem ✦ “Gostaria de fazer uma
as facas, mas nenhuma filhos? visita e lhe mostrar meu
muito afiada”. – Não – respondeu trabalho na esperança de
—Charles Goetzinger ele. – E nunca terei. fazer alguma coisa na vida
—Charlotte Andersen e me mudar do porão da
Com quatro semanas no casa dos meus pais.”
emprego, você já viu as Um homem chega para ✦ “Procuro trabalho por-
camisas de todo mundo. uma consulta com o que, embora minha em-
—Anna Drezen urologista e diz: presa fosse lucrativa no
– Doutor, quero fazer ano passado, este ano
Eu trabalhava em casa uma vasectomia. estão esperando uma
e entrevistava por – Você já conversou grande defecação.”
telefone um neurolo- com a sua mulher e ✦ “Não estou intimado
gista renomado para seus filhos? com o estágio; quero
© stefano spicca/sHutterstock

uma reportagem – Sim, conversei. Ela fazer parte de seu clima

quando minha filha e os dezenove votaram divertido.”
de 3 anos anunciou a favor. ✦ “Talento para escrever.
que precisava ir ao —Leonardo pereira, Bom para analizar dados
banheiro. Depois de São João Montenegro (RS) e resolver pobremas.”
alguns gemidos
altos, ela gritou:
– Consegui, mãe! Fiz sua história pode valer até R$ 400. Visite
cocô no vaso! Fiz cocô selecoes.com.br ou veja os detalhes na página 5.

02.2020 seleções 77
78 seleções 02.2020
RESPIRE
FUNDO
Essa doença pulmonar
de evolução lenta afeta
milhões no mundo todo.
Caso esteja preocupado,
o melhor é conversar
agora mesmo
com seu médico.

por Lisa Fitterman

02.2020 seleções 79
M
ichael McGloin levava o acordeão aonde quer que fosse,
tanto para sua sala na concessionária de automóveis de
Sligo, na Irlanda, quanto para os bares fumacentos da
região, onde se apresentava como banda de um homem
só, divertindo o público geralmente ruidoso com a animada música
irlandesa folclórica. Era um passatempo que ele amava: a camara-
dagem, a cerveja ocasional e muitos cigarros sem filtro – hábito
que adotou quando era um rapazinho de 12 anos.
Em outubro de 1999, McGloin re- De acordo com a Organização
cebeu o diagnóstico de doença pul- Mundial da Saúde (OMS), entre as
monar obstrutiva crônica (DPOC). A doenças sem notificação obrigatória,
notícia veio depois de anos de proble- a DPOC – nome abrangente para um
mas de saúde, como colapso recor- grupo de doenças pulmonares como
rente do pulmão direito, insuficiência bronquite crônica, enfisema e alguns
respiratória e numerosas infecções tipos de asma – será uma das três

FOTO DA PÁGINA DUPLA ANTERIOR E DESENHO DO PULMÃO: © SHUTTERSTOCK

pulmonares. McGloin, de 69 anos, pa-
rou de fumar e hoje toma esteroides
e antibióticos diariamente, num re-
gime preventivo para evitar infecções.
“O mais assustador foi o especialista
declarar que eu tinha DPOC”, re-
corda ele com a voz rouca. “Eu nunca
tinha ouvido falar, e achei que
devia ser a única pessoa do
mundo com isso.”
Mas McGloin está longe de
ser o único.
que mais matam no mundo em 2030,
ao lado da doença cardiovascular e
do câncer.
É difícil encontrar números exatos.
Um relatório de 2013 da Fundação
Europeia do Pulmão (ELF, na sigla
em inglês) estima que 40% a 50% dos
fumantes vitalícios dos estados-
-membros da União Europeia
têm a DPOC, e que outros
15% a 20% dos casos se de-
vem a poluentes no local de

TANTO PARA O INDIVÍDUO QUANTO PARA O

PROFISSIONAL DE SAÚDE, É FÁCIL DESDENHAR
OS PRIMEIROS SINTOMAS DA DPOC.

80 seleções 02.2020
 trabalho e outros na atmosfera. No
total, de acordo com o European
Lung White Book de 2013 (relatório
oficial europeu sobre o pulmão, pu-
blicado pela Sociedade Respiratória
Europeia), acredita-se que cerca de
40 milhões de pessoas tenham DPOC
na UE. O número anual de mortes por
DPOC nos estados-membros fica em
torno de 300 mil, e está crescendo. No
Brasil, que está entre os países com o
maior número de casos, são cerca de
6 milhões de portadores da doença.
O relatório da ELF pedia mais pes-
quisas, melhor notificação, novas te- Michael McGloin, que fumou desde
rapias e aumento da consciência do os 12 anos, recebeu o diagnóstico
público sobre a doença. O Dr. Jørgen de DPOC aos 49. “Achei que fosse
Vestbo, presidente da Sociedade Res- o único no mundo com a doença.”
piratória Europeia (que fundou a ELF
em 2000 na tentativa de unir pacien- A Dra. Daiana Stolz, especialista
tes e profissionais de saúde), diz de respiratória da Universidade de Ba-
maneira direta: “Basicamente, temos sileia, explica que o modo mais sim-
de fazer melhor muitas coisas.” ples de descrever a DPOC é como
uma inflamação dos brônquios que
Numerosos relatórios informam dificulta a expulsão do ar e destrói o
que fumar é a principal causa da tecido pulmonar – mas isso não sig-
DPOC, e a poluição do ar e riscos ocu- nifica que seja uma doença simples,
pacionais como vapores tóxicos vêm de jeito nenhum. A Dra. Stolz é um
logo atrás. Mas, em alguns casos, pode dos três especialistas em DPOC na
ser que você tenha nascido prematuro revista Lancet que, em maio de 2019,
e seu pulmão não tenha se desenvol- assinaram um editorial reivindicando
vido direito, ou se expôs à fumaça pas- um esforço concentrado para erradi-
siva ainda no útero. Acredita-se que a car a doença. Ela afirma que, por ser
genética tenha seu papel, assim como tão heterogênea, como um atirador
o simples acaso inexplicável. A DPOC de elite que ataca de vários pontos, a
©INDEPENDENT.IE

tem formas variadas e segue diversos doença é difícil de identificar.

caminhos, todos discretos, inexoráveis Principal autora de um estudo de re-
e, por fim, fatais, pois muda a estrutura ferência publicado na revista The Lan-
molecular do pulmão. cet Respiratory Medicine em julho de

02.2020 seleções 81
2018, a Dra. Tillie-Louise Hackett, da
Universidade da Colúmbia Britânica,
em Vancouver, no Canadá, é diretora
associada do Centro de Inovação Car-
diopulmonar da universidade. Ela ob-
serva que os indivíduos diagnosticados
no estágio mais leve da doença já per-
deram 41% das vias respiratórias me-
nores, ou bronquíolos, e mais de um
terço dos alvéolos, as menores unida-
des do pulmão, fundamentais na troca
de moléculas de oxigênio e gás carbô-
nico. E, como o pulmão tem vias res-
piratórias para dar e vender, quando
uma é estreitada ou bloqueada du- Tilly Tartaglia recebeu o diagnóstico de
rante muito tempo haverá outra para DPOC em 2010. Ela se obriga a se
ocupar seu lugar. manter ativa. “A alternativa é não
É fácil, tanto para o indivíduo respirar. E isso não é uma opção.”
quanto para o profissional de saúde,
ignorar ou desdenhar dos primeiros envelhecimento dos indivíduos, é
sintomas da DPOC. Eles podem ser natural achar que todos vamos ficar
inócuos e envolver tosse ou falta de ar ofegantes por causa da idade, e assim
ao subir escadas ou um muco espesso o diagnóstico de DPOC acaba esque-
que se acumula à noite e se reduz du- cido. Mas hoje a comunidade médica
rante o dia. Pode parecer um resfriado sabe que, embora a doença se revele
ou gripe e pode surgir, sumir e voltar. em pessoas com mais de 40 ou 50
A falta de ar, principalmente, é de anos, isso acontece depois de anos de
interpretação difícil para mé- destruição silenciosa. E, quando
dicos e pacientes, diz a Dra. fala de destruição, a Dra. Stolz
Stolz. Como a DPOC tem sido não se refere a um pedaci-
historicamente diagnosticada nho do pulmão, nem mesmo
depois dos 40 anos e com o a meio pulmão. “Quando
CORTESIA DE TILLy TARTAGLIA

OS MÉDICOS DEVERIAM PEDIR

ROTINEIRAMENTE AOS PACIENTES
EM RISCO UM TESTE SIMPLES.

82 seleções 02.2020
percebemos a doença, um pulmão in-
teiro pode ter se perdido”, conta ela, “o
que representa metade da capacidade
respiratória. Embora saibamos que é
possível viver com um pulmão só, toda
perda depois disso é ruim, porque há
pouco que possamos fazer. Não é pos-
sível ressuscitar tecido morto.”
O padrão do tratamento da DPOC
envolve o uso de broncodilatado-
res para manter as vias respiratórias
abertas, antibióticos para prevenir
infecções e corticosteroides ou es-
teroides por via oral nos casos mais
graves, embora seu emprego a longo
prazo possa causar efeitos colate-
rais graves, como pneumonia, os-
teoporose e catarata, entre outros.
Além disso, os pacientes com DPOC
aprendem a fortalecer o diafragma e a
parte superior do corpo a fim de res-
pirar melhor quando o pulmão trava,
problema provocado por infecções
bacterianas ou virais ou mesmo pelo
velho estresse.
Embora haja pesquisas em anda-
mento sobre novos tratamentos
para a DPOC – vários com cé-
lulas-tronco, por exemplo –,
nada é iminente nem há cura
à vista.
“TEMOS DE DAR OUVIDOS AOS PACIENTES
QUANDO SE QUEIXAM DE FALTA DE AR”, DIZ
O DR. VESTBO, “E DEPOIS EXAMINÁ-LOS.”
Na verdade, a revolução é o co-
nhecimento de que a DPOC começa
a causar danos mais cedo do que se
pensava e que, se os pacientes forem
diagnosticados e tratados mais pre-
cocemente, por volta dos 40 ou 50
anos, terão menos efeitos colaterais
com o uso de esteroides, e o avanço
da doença será retardado.
O Dr. Vestbo insiste que todo
mundo, em qualquer idade, que
apresente um sintoma respiratório
novo ou alterado – tosse, por exem-
plo, ou falta de ar em circunstâncias
que antes não eram problemáticas
– e que dure mais de quatro sema-
nas, deve consultar um médico. “Foi
assim que conseguimos reduzir a in-
cidência de tuberculose – e o mesmo
é necessário para o diagnóstico pre-
coce e oportuno da DPOC. Além de
ser a melhor maneira de desacelerar
o avanço da doença e permitir aos
pacientes uma vida mais longa e com
mais qualidade.”
O Dr. Vestbo diz que os clínicos ge-
rais deveriam fazer rotineiramente
um teste simples de espirome-
tria, ou função pulmonar, em
todos os pacientes em risco.
Sentado, o paciente usa um
clipe que fecha as narinas,
02.2020 seleções 83
inspira profundamente e expira com
força pela boca num tubo ligado a
uma máquina que mede o fluxo de
ar. A máquina avalia quanto ar o
paciente é capaz de expirar num se-
gundo e também quanto tempo leva
para pôr para fora o restante do ar.
“Não leva mais do que cinco minutos
e custa muito pouco, mas, para alguns
médicos e enfermeiros, é um desafio”,
diz o Dr. Vestbo. “Temos de dar ouvi-
dos aos pacientes quando se queixam
de falta de ar. Precisamos ouvir suas
histórias e depois levar os exames à
etapa seguinte.”
A melhor maneira de assegurar
que os médicos de pronto-atendi-
mento realizem o exame, continua o
Dr. Vestbo, é lhes dar algum tipo de
incentivo financeiro. “Estou há déca-
das nesse jogo; tentamos convencer
os profissionais de que o exame é im-
portante, mas, quando não se recebe
nada por ele, é fácil achar que essa
importância não existe.”
Depois de diagnosticar a DPOC, o
Dr. Vestbo diz que a melhor receita
é assegurar que os pacientes,
além das aulas de reabilita-
ção pulmonar, permaneçam
fisicamente ativos, apesar
do medo de perder o fôlego.
“COM CERTEZA, SE TIVESSE RECEBIDO O
DIAGNÓSTICO MAIS CEDO, MEU PULMÃO FUNCIONARIA
MELHOR AGORA”, DIZ MICHAEL MCGLOIN.
84 seleções 02.2020
“Parece anti-intuitivo, mas o truque é
ficar sem fôlego, porque, embora não
possamos fazer o pulmão melhorar,
com exercícios podemos melhorar os
músculos e, assim, dar aos pacientes
mais controle da expiração, principal
problema no caso da DPOC.”
Tilly Tartaglia, de 74 anos, que foi
presidente executiva de um mata-
douro de aves até se aposentar há
12 anos, entende como é grave ficar
sem fôlego todo dia. Moradora de
Genk, na Bélgica, viajante ferrenha e
ex-fumante inveterada, ela foi inter-
nada em março de 2010 porque estava
com pneumonia. No hospital, soube
que tinha DPOC e câncer de pulmão.
Com o câncer devidamente tratado,
mas com apenas 39% da capacidade
pulmonar, hoje ela segue um regime
de corticosteroides receitados para a
doença obstrutiva. Também se força a
se mexer o máximo possível todo dia
e, pelo menos duas vezes por semana,
vai às sessões de terapia pulmonar,
nas quais o especialista adapta o
programa à sua necessidade, seja
com exercícios para fortalecer
o diafragma, seja com cami-
nhadas ou esteira.
“A alternativa”, brinca Tar-
taglia, que adora viajar e não
deixou de fazê-lo, “é não conseguir
respirar. E isso não é uma opção.”
“A maior parte dos casos de DPOC
é leve. Para a maioria, a única inter-
venção necessária é parar de fumar
e, talvez, um broncodilatador de ação
rápida. A vacina anual contra a gripe
é importantíssima, e a vacina contra
pneumonia (os dois tipos disponíveis)
é recomendada”, explica o Dr. Paul
Scanlon, pneumologista da Clínica
Mayo. “A doença não tem cura, mas
pode ser desacelerada. O tratamento
é o bom senso. Não fique com os fu-
mantes na hora do café no trabalho e
não viaje para lugares como Pequim,
onde a poluição pode ser altíssima.”
Hoje, na Irlanda, Michael McGloin
carrega consigo o tanque de oxigênio
em vez do acordeão. Ele quer que as
pessoas saibam que há vida depois do
diagnóstico de DPOC. “Claro que, se
eu tivesse recebido o diagnóstico mais
cedo, meu pulmão funcionaria me-
lhor agora, e eu não seria humano se
às vezes não me perguntasse como te-
ria sido. Mas, na maior parte dos dias,
tento me concentrar no que tenho,
em ajudar os outros que receberam
COMO CUIDAR DA DPOC
EM ESTÁGIO INICIAL
Recebeu o diagnóstico de DPOC?
O pneumologista Paul Scanlon,
da Clínica Mayo, em Rochester,
Minnesota, diz que é possível
administrar melhor a doença
fazendo o seguinte:
F Pare de fumar
F Pratique os exercícios
prescritos pelo especialista
em reabilitação pulmonar
F Tome a vacina da gripe todo
ano
F Evite fumaça e poluição do ar
F Tussa regularmente, beba
um volume moderado de água
e, se necessário, use um
umidificador para manter
os pulmões limpos.
o diagnóstico e em me manter atua-
lizado sobre as pesquisas.”
“O importante”, diz ele, “é que esta-
mos vivos.”

Porque eles também precisam de descanso

Há muitas teorias para explicar por que os
seres humanos precisam dormir. Eu, no entanto, tenho
certeza de que é para carregar o celular.
@ALISPAGNOLA

02.2020 seleções 85
Livros
que falam

As integrantes do
grupo de leitura Lisa,
Sophie, Lesley, Laura e
Helene desfrutam do
lado social de suas
reuniões mensais.

86 seleções 02.2020
 Ler pode ser uma atividade solitária,
mas reunir-se para discutir um livro
é um fenômeno em expansão

por Lucy Ash

“É muito inspirador”, diz Laura, uma mulher na faixa

dos 30 anos, com longos cabelos louros, óculos escuros
de grife e uma saia multicolorida ondulante. “As ruas de
Nápoles, a paisagem arenosa, os cheiros – na verdade,
acho que é realmente um romance sobre cheiros.”
Helene, uma americana com cerca de 50 anos, ser-
ve-se de uma taça de vinho e torce o nariz. “É mais
como um romance sobre secreções, se você me per-
guntar. Suor, sangue e outros fluidos que não quero
mencionar.”
“Eu mal podia esperar para terminar”, geme Lesley,
sentada ao lado dela. “A heroína era uma personagem

fotografado por Barry Marsden 02.2020 seleções 87

muito passiva e escorregadia. Ela me
irritou. Quando meu Kindle avisou
‘dois minutos para o final do capítulo’,
pensei: Graças a Deus!”
Numa noite morna e agradável,
cinco mulheres, todas integrantes de
um grupo de leitura, estão sentadas
num terraço com vista para o Re-
gent’s Canal, que atravessa o bairro
de Islington, no norte de Londres.
Corredores e ciclistas lotam a pista
que margeia o canal enquanto as
barcaças passam deslizando pelos
jardins frondosos e pelos novos pré-
dios residenciais envidraçados.
OS GRUPOS DE
LEITURA APROXIMAM
AS PESSOAS E
PROMOVEM UM SENSO
DE BEM-ESTAR.
Elas estão discutindo o romance de
Elena Ferrante, Um amor incômodo.
Como uma história policial, ela co-
meça com um cadáver. No entanto, o
livro é mais um suspense psicológico
do que um “quem matou?”, cheio de
relacionamentos infelizes e segredos
de família sombrios.
A narrativa é conduzida por Delia,
que voltou à sua cidade natal, Nápo-
les, para descobrir por que sua mãe,
Amalia, afogou-se no mar. Os ônibus
em que ela embarca cheiram a suor, os
apartamentos “fedem a mofo e teias de
88 seleções 02.2020
aranha” e até as flores da cidade têm
cheiro de coisas “já apodrecidas”.
Laura e Helene estão certas: é real-
mente um romance para o nariz, e
poucos cheiros são apetitosos. No en-
tanto, as cinco mulheres aqui nesta
noite desfrutaram de um jantar na-
politano que incluiu risoto de frutos
do mar, nhoque alla sorrentina e pro-
secco – tudo em homenagem à cidade
natal da escritora. O banquete italiano
é incomum porque o grupo em geral
se reúne num pub. “Não queremos
entrar numa competição culinária”,
diz Helene. “Estamos aqui para falar
de livros, não de receitas.”
E
nquanto alguns grupos acres-
centam tempero às suas reu-
niões com refeições que ecoam
os temas retirados do livro escolhido,
outros aderem aos queijos e vinhos
ou a apenas uma xícara de chá. Al-
guns adotam regras e procedimentos
peculiares para escolher e discutir um
livro: um número máximo de páginas,
um sistema de votação complexo ou
apresentações formais.
Outros grupos intelectualizados in-
sistem em resenhas escritas pelos no-
vos integrantes para verificar se estão
suficientemente comprometidos. Qual-
quer que seja o formato, os grupos de
leitura atraem pessoas e promovem
conversas interessantes. E não é só isso:
também podem melhorar o bem-estar.
Pertencer a um clube de leitura pode
até prolongar sua vida. Uma pesquisa
publicada pela BMJ Open, revista

Uma refeição italiana para combinar com o
romance napolitano lido pelo grupo.
médica do Reino Unido, revelou que,
assim como os clubes esportivos ou
as associações religiosas, os grupos de
leitura onde você encontra pessoas e
conversa com frequência reduzem o
risco de morrer nos primeiros seis anos
após a aposentadoria.
A biblioterapeuta Susan Elderkin,
coautora de Farmácia literária, en-
tende o poder de um bom livro. “As
pessoas podem se pegar comparti-
lhando inesperadamente sentimentos
e pensamentos que nunca expressa-
ram antes”, diz Susan. “Um bom ro-
mance vai atingir o tipo de emoções
profundas e percepções sutis sobre o
ser humano que não surge nas con-
versas diárias. Você pode expor muito
ou pouco sobre si mesmo, conforme o
seu desejo. Pode usar esse momento
como uma oportunidade para falar de
questões e experiências pessoais.”
Entretanto, numa era digital e ob-
cecada por aplicativos, passar uma
noite inteira discutindo em detalhe
um único livro pode parecer estranho.
E, na Alemanha, por exemplo, sede
da maior feira de livros do mundo, o
número de pessoas que compraram
livros caiu quase um quinto entre
2013 e 2017. Os editores culpam os vi-
deogames e os serviços de streaming
como a Netflix, que incentivam as
pessoas a assistir compulsivamente a
seriados cômicos e dramáticos de TV.
Ao mesmo tempo, o crescimento dos
grupos de leitura tem sido uma história
de sucesso surpreendente. No Reino
Unido, existem cerca de 50 mil grupos
de leitura que se reúnem em bibliote-
cas, livrarias, pubs, hospitais, centros
comunitários e, acima de tudo, nas
casas das pessoas. No Brasil, embora
não haja dados estatísticos, também é
crescente o número desses grupos.
P
odemos pensar na leitura como
um passatempo solitário, mas
uma química estranha se desen-
volve nos grupos de leitura. “Eu não
diria que sou extrovertida”, diz Lesley,
“mas não sou tímida no grupo de lei-
tura. Situações em romances podem
tocar um determinado ponto e ajudá-
-lo a mencionar coisas que de outro
modo você talvez não mencionasse.”
Lisa concorda. “Eu não me abria
com ninguém”, confessa ela, “mas,
como nos conhecemos há anos, há
02.2020 seleções 89
um elemento de confiança. E algumas
questões eu não discutiria com amigos
muito próximos, porque eles podem
ficar preocupados demais comigo. Fa-
lar sobre coisas difíceis no contexto de
um livro que todas estamos lendo de
alguma forma parece mais fácil.”
Enquanto bebem mais uma taça de
prosecco, o grupo de Islington, inspi-
rado pelo romance de Ferrante, agora
está analisando as relações mãe-filha.
Delia, a narradora do livro, tem cari-
nho pela mãe, mas também a descreve
como “uma responsabilidade irritante”.
Uma mulher revela suas emoções
contraditórias sobre a própria mãe
com uma sinceridade surpreendente.
“Eu entendo a sensação de alívio da
Delia no funeral por não estar mais
carregando aquele peso”, diz ela. “Mi-
nha mãe é uma pessoa frágil que teve
uma criação dura. Ela pode se mostrar
carente e muito difícil.”
Outras se apegam às descrições
vívidas de violência doméstica e se
perguntam por que a mãe da he-
roína, Amalia, suportou tantos anos
de abuso. Então a conversa salta para
controle coercitivo, catolicismo e per-
vertidos no transporte público.
O
grupo começou há 12 anos
como ramificação do Instituto
das Mulheres local. Reúne-se
na segunda terça-feira de cada mês. O
grupo de até oito pessoas é pequeno o
suficiente para caber ao redor de uma
mesa de pub, mas suas integrantes
têm diferentes idades e origens, o que,
90 seleções 02.2020
segundo elas, proporciona um debate
animado e uma variedade de livros.
Helene, a anfitriã da noite, é uma
conservadora de papel forense. Ela
salva papéis, pastas e livros danifi-
cados em incêndios, inundações ou
bombas. O telefone metade derretido
que pende duma mesa em seu hall de
entrada, como um objeto surreal num
quadro de Salvador Dalí, foi resgatado
de um prédio comercial em chamas.
“SE TODAS
CONCORDAMOS QUE
UM ROMANCE É
MARAVILHOSO, MUITAS
VEZES FICAMOS SEM
TER O QUE DIZER.”
Sua acolhedora sala de estar está re-
pleta de livros de arte e brochuras.
“Eu já entrei em muitas bibliotecas
incendiadas, e sempre fico impressio-
nada com a dor que isso causa”, conta
ela. Helene tem um profundo apego
aos livros como objetos. Ela mantém
meticulosos registros escritos à mão
de cada livro que o grupo leu.
Hoje à noite há um teste de brin-
cadeira para descobrir quem fez ape-
nas uma leitura superficial do livro.
“Aonde Delia vai durante o enterro?”,
ela pergunta com um sorriso travesso.
“Quem carrega o quê, num saco de
lixo no elevador?” Algumas gritam
respostas, outras olham para o colo.
Da esquerda para a direita, as integrantes do grupo de leitura Laura, Lisa e Lesley.
“Lesley!”, Helene ri. “Você não está
falando bobagens! Que cor de roupa
Delia usava no fim do livro?”
Ao fim de cada reunião, o grupo atri-
bui a cada livro uma nota até dez. Até
agora, o favorito de Helene foi O clube
da felicidade e da sorte, de Amy Tan.
“Foi como um longo haiku meditativo”,
diz ela. “Fiz uma viagem à China e tinha
estudado o reinado de Mao e o terrível
sofrimento que ele infligiu ao seu país,
então significou muito para mim.”
Lisa, que vai acompanhada de
Betty, uma Jack Russell miniatura mis-
turada com poodle, geralmente não lê
os títulos escolhidos pelo grupo; em
vez disso, escuta os audiobooks. Tra-
balhando em horário integral num
escritório de advocacia especializado
em direito do entretenimento, ela tem
pouco tempo para si mesma além dos
passeios diários com Betty, quando
então usa fones de ouvido.
Sophie, na casa dos 50, de óculos,
blusa de linho sem mangas e cabelo
chanel, trabalha numa empresa de ar-
quitetura naval. Ela escolheu Um amor
incômodo porque adorou os outros ro-
mances napolitanos de Ferrante. Ela
acha que as discussões são mais esti-
mulantes quando parte do grupo não
gosta de um livro. “Se todas concorda-
mos que um romance é maravilhoso, ou
nos sentimos neutras em relação a ele,
em geral ficamos sem ter o que dizer!”
Lesley, a mais velha das participan-
tes, diz que inicialmente entrou no
grupo para fazer amigos na cidade.
“Sou aposentada do laboratório far-
macêutico em que trabalhei por anos,
e achei muito difícil conhecer pessoas
com ideias semelhantes na cidade
02.2020 seleções 91
– moro numa área onde a popula-
ção parece muito transitória. Então o
grupo de leitura realmente me ajudou
a me sentir mais confiante.”
Depois descobriu quanto gosta de
ler livros que nunca teria escolhido
por si mesma. “Gosto da imprevisibi-
lidade. É uma aventura: você nunca
sabe como vai terminar.”
Laura administra propriedades. Diz
que a leitura lhe dá um senso de pro-
pósito e é um grande consolo quando
se sente só. “É uma das poucas coisas
que você pode fazer sozinha sem se
sentir constrangida, ao contrário de Sophie e Helene discutem uma passagem
sair para comer ou ir ao teatro”, ex- do romance.
plica ela. “Mas, depois que termino
um livro, adoro vir ao grupo para fa- seus próprios livros em silêncio, sem
lar sobre ele. Acho que está em nossa títulos atribuídos para discussão, an-
composição humana querer trocar tes de qualquer socialização.
ideias com outras pessoas.” Grupos de prisão são populares.
Na prisão de Bonneville, nos Alpes

D
e certa forma, o grupo de Is-
lington é típico. A maioria dos
grupos de leitura é composta
por mulheres com mais de 30 anos
que moram no mesmo bairro e que
se alternam na escolha dos livros. Mas
existem muitos grupos somente de
homens, mistos e de casais – e alguns
exemplos altamente idiossincráticos.
O Silent Book Club, fundado em
São Francisco, possui 30 mil membros
em todo o mundo, com filiais na Ale-
manha, Itália, Luxemburgo, Holanda,
Suécia e Reino Unido. Cada grupo se
Franceses, um grupo de uma dúzia
de presos entre 18 e 55 anos se reúne
todos os meses para discutir o Polar
Noir, um gênero realista, de atmosfera
misteriosa da ficção policial francesa.
Munique tem o clube do livro Ro-
mances Clássicos que Você Já Devia
Ter Lido, voltado para os clássicos de
Dostoiévski, Joyce, Austen e outros.
Um grupo alemão, chamado Uma
Noite Escura e Tempestuosa, é para
os viciados em suspense, mistério e
histórias sobre espiões.

A
reúne mensalmente em um café ou lguns grupos de leitura con-
bar onde os membros passam uma vidam os autores para falar so-
hora ou mais tranquilamente lendo bre seus livros. O romancista

92 seleções 02.2020
britânico Patrick Gale costuma se en-
contrar com leitores em grupos organi-
zados por bibliotecários. Ele diz que é
“bastante salutar” para um escritor que
costuma ser festejado pelos fãs ouvir
críticas diretas. “Uma coisa é ler uma
crítica ruim na Amazon, outra bem di-
ferente é quando alguém olha nos seus
olhos e diz que não gosta do seu livro.
Minha resposta padrão é: “Sinto muito,
vou me esforçar mais da próxima vez!”
Gale diz que seu romance Notes
from an exhibition provocou discus-
sões furiosas sobre a heroína Rachel
Kelly: se era uma esposa e mãe amo-
rosa ou uma artista egoísta que des-
truiu sua família. “Adoro a maneira
como os clubes de leitura provocam
discussões, mas eles podem se sentir
um pouco como um grupo de terapia
e, na maioria das vezes, as pessoas não
gostam que os escritores estejam pre-
sentes porque eles atrapalham”, diz ele.
U
m mês depois, o grupo de lei-
tura de Islington está reunido
num pub. Dessa vez, Lou, outra
integrante de longa data, apareceu.
Ela é enfermeira de um movimentado
hospital oftalmológico de Londres e
diz que ler ficção é “uma ótima ma-
neira de aliviar o estresse” depois de
horas no centro cirúrgico. Elas estão
discutindo Death comes for the arch-
bishop, de Willa Cather.
Mais uma vez, a escolha coube à
Sophie. “É curto”, diz ela. “Tem muitas
descrições de plantas e refeições deli-
ciosas, e como eu amo jardinagem e
amo gastronomia, achei que seria uma
boa combinação.”
É a história de um padre missioná-
rio jesuíta francês que foi para o Novo
México em meados do século 19, após
a anexação aos Estados Unidos. Ele
construiu a Catedral de São Francisco
em Santa Fé e confrontou padres que
tinham amantes, filhos ou maltratavam
os povos indígenas. No começo, Les-
ley pensou que nunca iria terminar o
romance, publicado pela primeira vez
em 1927. “Fiquei imaginando por que
deveria me importar com um monte
de padres atravessando desertos mon-
tados em mulas, mas achei estranha-
mente encantador e não consegui
parar de ler”, admite ela alegremente.
Lesley revela que continua a história
em sua cabeça muito tempo depois de
ler a última página. Ela ri: “Eu invento
todas essas situações e às vezes acho
que estou ficando louca.”
“Isso é normal”, assegura Laura.
“Não quero abandonar alguns perso-
nagens porque fiquei muito apegada a
eles. Para mim, isso é sinal de um livro
muito bom.”
Laura e as outras mulheres me di-
zem que apreciam a amizade cons-
truída ao longo dos anos lendo juntas.
“No Natal passado, Lesley nos prepa-
rou uma refeição deliciosa e cada uma
de nós havia lido um livro diferente do
mesmo autor. Ficamos conversando
sentadas à mesa por horas. Eu amo a
variedade em nosso clube do livro. Isso
torna nossa vida e nossas discussões
muito mais ricas.”
02.2020 seleções 93
94 seleções 02.2020
 DRAMA DA VIDA REAL

A
VINGANÇA
DA SE RPE NTE
Quando decapitou a cascavel
que ameaçava sua mulher,
Jeremy Sutcliffe supôs que era o
fim da cobra. Enganou-se.

por Nicholas Hune-Brown

02.2020 seleções 95
A
ntes do incidente
– quando que seu
corpo se tornou um
campo de batalha
de venenos concor-
rentes e sua história,
tema de curiosidade zoológica –, Je-
remy Sutcliffe realmente gostava de
cobras. Até as achava bonitas.
Além disso, aquele homem tatuado
de 40 anos não era de fugir de cria-
turas selvagens. Adorava o ar livre e
aproveitava todas as oportunidades
que tinha de pescar e acampar. Esse
amor à natureza era parte do motivo
de Jeremy e sua mulher, Jennifer, de
43 anos, terem se mudado recente-
mente do Kansas para o sul do Texas.
A propriedade que compraram junto
ao lago Corpus Christi, a pequena dis-
tância de carro do Golfo do México,
era o lar dos seus sonhos. Ou deveria
ser. Por enquanto, eles estavam mo-
rando num trailer no terreno de meio
hectare, pois a casa ainda precisava de
reformas. Uma “reconstrução total”,
como disse Jeremy, com o orgulho de
alguém que planeja ele mesmo pôr a
casa abaixo e refazer tudo.
Numa manhã escaldante de do-
mingo, em maio de 2018, o casal ar-
rumava o quintal para o churrasco
marcado à noite com a filha e os ne-
tos pequenos. Por volta das 10h30 da
manhã, Jeremy foi cortar a grama en-
quanto Jennifer trabalhava no jardim.
Ela se abaixou para arrancar uma erva
daninha quando viu uma cascavel-
-do-texas perto de sua mão.
96 seleções 02.2020
Jennifer pulou quando a cobra, com
um metro de comprimento, se ergueu
na posição de ataque, com a empoei-
rada cabeça triangular tensionada e a
cauda chocalhando. “Cobra!”, gritou
ela ao recuar. “Cobra!”
Quando ouviu o grito da mulher,
Jeremy imaginou que ela tivesse en-
contrado uma das inofensivas co-
bras-rato-do-texas que, às vezes,
apareciam na propriedade. Pegou
uma pá para enxotar a criatura e
contornou a casa correndo até o jar-
dim. Foi aí que ouviu o chocalho. Sua
mulher estava encurralada entre uns
arbustos e a parede da casa, a cobra
bem no meio do caminho.
Primeiro, ele tentou pegar a casca-
vel usando a pá, mas não conseguiu.
Então, fez o que era necessário: levan-
tou a ferramenta e baixou com força a
borda no corpo da cobra, logo abaixo
da cabeça, decapitando-a.
Jennifer entrou em casa, o cora-
ção batendo forte, enquanto Jeremy
voltava ao jardim. Uns dez minutos
depois, quando Jennifer disse que ia
pôr os dois cachorrinhos para fora, ele
decidiu remover o réptil morto. Olhou
a criatura caída no chão. A cabeça,
presa a um pedaço do corpo, estava
sobre uma pedra do caminho.
Ele se abaixou para pegar um gra-
veto próximo à cabeça da serpente e
tirá-la dali. Mas, antes que sua mão
tocasse o chão, a cobra atacou – um
movimento em borrão quando o pe-
daço da criatura se lançou à frente,
enterrando as presas na mão direita de
ilustração das páginas por steven p. HugHes
Jeremy e injetando veneno, que ime-
diatamente fez a mão parecer ter sido
esmagada por um peso enorme. “Ela
me picou!”, berrou ele, horrorizado.
Para Jeremy, foi como um filme de
zumbis: o último ato de vingança
de uma criatura morta-viva. Mas a
verdade é que picadas de cobras de-
capitadas não são raras. É como uma
galinha com a cabeça cortada, só que
com um período de sobrevivência
muito maior porque o réptil tem san-
gue frio e metabolismo lento.
No entanto, naquele momento
UMA CERTEZA VEIO À MENTE DE
JENNIFER: O MARIDO PRECISAVA
DE ASSISTÊNCIA MÉDICA IMEDIATA.
Jeremy só pensou que a cobra que
matara agora tentava matá-lo. Os ma-
xilares da criatura estavam presos em
sua mão. Desesperado para se liber-
tar, Jeremy inseriu os dedos da mão
esquerda sob o maxilar superior da
cobra e tentou soltar as presas. Conse-
guiu remover uma das presas do dedo
médio, mas, enquanto tentava soltar a
cabeça, os maxilares da víbora se fe-
charam de novo, dessa vez enterrando
a presa no dedo anular.
Com o som de seu grito, Jennifer,
enfermeira formada, veio correndo.
Quando viu o marido lutando com a
cabeça da cascavel, uma certeza lhe
veio à cabeça: ele precisava de aten-
dimento médico imediato. Ela correu
para buscar as chaves do carro no
trailer enquanto Jeremy continuava
puxando a cabeça da cobra, até que
as presas se soltaram e ele conseguiu
jogar a víbora longe.
Jennifer disse ao marido que en-
trasse no carro e saiu pelo escaldante
asfalto texano, já no telefone com os
atendentes do serviço de emergência.
Estavam a meia hora de distância do
hospital mais próximo, e ela não fazia
ideia de qual dos centros médicos da
área teria o antídoto. Só sabia que não
tinham muito tempo.
Jennifer Sutcliffe sempre foi rá-
pida ao agir sob pressão. No Texas,
era consultora de enfermagem, mas,
quando trabalhava em hospitais, era
sempre ela quem fazia a ressuscitação
cardiopulmonar – alguém a quem os
colegas recorriam quando competên-
cia e pensamento rápido podiam ser a
diferença entre vida e morte.
Ela e o marido se conheceram no
início da vida adulta, no verão de
1993, quando ambos eram estudantes
e trabalhavam numa casa de repouso.
Ela gostara dos olhos azuis cintilantes
dele e do fato de ser gentil. Os dois fi-
caram amigos, depois namoraram.
Casaram-se uns anos mais tarde e
tiveram um casal de filhos. Jeremy era
02.2020 seleções 97
habilidoso, sabia construir e consertar
coisas e trabalhava instalando apare-
lhos de calefação e de ar condicio-
nado. Sempre parecia estar ajudando
um ou outro vizinho.
Em 2011, com 34 anos, recebeu o
diagnóstico de síndrome de Guillain-
-Barré, doença rara e misteriosa que
faz o sistema imunológico atacar célu-
las nervosas saudáveis. A doença dei-
xou Jeremy fraco e exausto, incapaz de
trabalhar mais do que poucas horas
por dia, mas o casal enfrentou tudo
unido. Quando compraram a casa
em Corpus Christi, parecia a situação
ideal. Enquanto ela trabalhava, ele
criaria aos poucos o lar dos sonhos.
A COBRA DECAPITADA NÃO TEM NADA A
PERDER. ASSIM, A CASCAVEL ESVAZIOU
EM JEREMY SUAS GLÂNDULAS DE VENENO.
Agora, enquanto disparava pela
estrada, Jennifer sentia essa fantasia
se esvair. No celular, o atendente de
emergência a orientava até um ponto
da estrada onde uma ambulância os
encontraria para levar o marido ao
hospital mais próximo. Mas, poucos
minutos depois de picado, Jeremy já
sentia o efeito do veneno que percor-
ria seu corpo. Quando piscou, só viu
escuridão. “Não estou enxergando”, fa-
lou, tomado pelo pânico, antes de des-
maiar. Jennifer sacudiu o marido com
uma das mãos enquanto mantinha a
outra no volante. Jeremy acordou, mas
98 seleções 02.2020
desmaiou de novo. Então começou a
ter uma convulsão. O atendente da
emergência disse a Jennifer que pa-
rasse e esperasse os paramédicos na
frente de uma igreja.
Finalmente, depois dos 15 minutos
mais longos de sua vida, nos quais
Jeremy alternou balbucios incoeren-
tes com desmaios, os paramédicos
chegaram. Transferiram Jeremy para
a ambulância e partiram a toda pela
estrada, com Jennifer atrás. No en-
tanto, dali a apenas dez minutos, a
ambulância parou no estacionamento
de um prédio abandonado. Quando
Jennifer parou ao lado, disseram que
o estado do marido não era nada bom.
A pressão despencara e eles temiam
que não chegasse vivo ao hospital.
“Mandamos vir o HALO”, disse um
dos paramédicos. Em vez de dirigir
meia hora até o hospital, tinham cha-
mado o helicóptero que o levaria para
outro pronto-socorro em dez minutos.
Momentos depois, o helicóptero pou-
sou e decolou com Jeremy.
O veneno de cascavel é um milagre
da evolução: um coquetel complexo de
enzimas e proteínas que, quando inje-
tado na corrente sanguínea da vítima,
age como um anticoagulante poderoso,
 Abaixo: a cabeça da cobra. À direita: Jeremy
durante a diálise em meados de junho, depois
que dois dedos foram amputados.
destrói tecidos e glóbulos vermelhos e
provoca hemorragia interna. As presas
da cascavel são ligadas a glândulas de
veneno na parte posterior da cabeça.
As cobras conseguem controlar quanto
veneno injetam; como produzir ve-
neno gasta energia, em geral elas não
o desperdiçam. Quando encurralada,
cortesia de jennifer sutcliffe
uma cascavel adulta geralmente dará
uma leve picada defensiva para afastar
a ameaça.
Mas uma cobra decapitada não tem
nada a perder, e a que picou Jeremy
esvaziou em sua mão as glândulas de
veneno. Quando chegou ao pronto-
-socorro do Christus Spohn Hospital
Corpus Christi–Shoreline, cerca
de uma hora e 15 minutos depois
do marido, Jennifer encontrou uma
cena caótica. Havia seis ou sete mé-
dicos trabalhando em Jeremy, ten-
tando em desespero fazer sua pressão
subir. Duas horas depois de picada, a
mão direita de Jeremy estava inchada,
enorme, e um tom vermelho furioso
se esgueirava pelo antebraço acima.
Ela observou com seus olhos de en-
fermeira os médicos lhe darem uma
série de tratamentos: crioprecipitado
e vitamina K para coagular o sangue e
doses e mais doses de antídoto. Em
média, uma vítima de picada de cobra
recebe duas a quatro doses. No total,
Jeremy recebeu 26.
02.2020 seleções 99
 Jennifer sabia como o soro funcio-
nava: quando o paciente precisa de
fluido depressa, basta aumentar o
fluxo, transformando o pinga-pinga
lento numa série de pingos mais rápi-
dos. Mas ali os médicos tinham posto
a bolsa de soro numa manga inflável
que bombeavam como um aparelho
de medir pressão, literalmente inje-
tando líquido no corpo do marido o
mais depressa que podiam. Ela nunca
tinha visto nada assim. O quadro a
apavorou.
Às cinco da tarde, depois de tra-
balharem em Jeremy durante cinco
horas, os médicos tomaram uma de-
“ACHE ESSE VENENO E PONHA-O PARA
FORA DO CORPO”, ORDENOU JENNIFER.
“VOCÊ NÃO PODE MORRER.”
cisão. Os órgãos de Sutcliffe estavam
parando de funcionar; eles precisa-
vam induzir o coma e colocá-lo no
respirador mecânico. Atordoada, Jen-
nifer concordou.
Por volta das três da madrugada,
um dos médicos conversou com ela.
O marido não estava bem. A pressão
ainda estava baixíssima. A pressão
arterial média (ou PAM) que os mé-
dicos buscavam era 65; com menos
do que isso, o coração não consegue
fazer o sangue correr pelo corpo. Je-
remy estava com a dosagem máxima
de quatro medicamentos para aumen-
tar a pressão, mas a PAM se recusava a
100 seleções 02.2020
subir além de 60. “Estamos no ponto
em que não há mais nada a fazer”,
disse o médico. Havia uma boa pro-
babilidade de que Sutcliffe não sobre-
vivesse àquela noite.
Jennifer sentiu um peso no coração.
Era como se não tivesse entendido a
gravidade da situação. Foi até o leito
do marido e segurou sua mão. “Ache
esse veneno e ponha-o para fora do
corpo”, ordenou. “Você não pode
morrer.”
Na meia hora seguinte, ela ficou
ao lado do marido na UTI, os olhos
grudados no monitor junto ao leito.
Lenta e milagrosamente, ela obser-
vou a pressão arterial de Jeremy ir
subindo aos poucos. Chegou a 65,
depois a 70. Os médicos começaram
a tirá-lo da medicação e a pressão
permaneceu estável. Quando o sol
nasceu no dia seguinte, o pior já ti-
nha passado.
Em 31 de maio, cinco dias depois
que a cascavel que ele matou quase o
matou também, Jeremy saiu do coma
e se viu num quarto de hospital des-
conhecido. A mente estava confusa.
O corpo inteiro estava inchado com
mais de 20 quilos de água. A dor se
irradiava pelas pernas, pelos braços,
pela barriga, por toda parte. Mas, ao
olhar em volta, viu que estava cer-
cado pela família: a filha com os ne-
tos, o filho, Jennifer.
As semanas seguintes foram difíceis.
A mistura de veneno e antídoto causou
grave lesão nos rins, e Jeremy precisou
de diálise. As toxinas o deixaram com
cálculos biliares e renais e forte dor
abdominal. Ele ficou tão fraco que não
conseguia se levantar. A despesa mé-
dica só aumentava e, quando chegou
perto dos 60 mil dólares, o casal come-
çou uma vaquinha virtual para pagar
a bateria de tratamentos. Os dedos da
mão direita de Jeremy estavam muito
feridos; os médicos tentaram enxertos
de pele que não deram certo. No fim,
foram forçados a amputar o anular e o
dedo médio.
Para qualquer pessoa, a perda de
dois dedos seria devastadora. Mas Je-
remy não pensa assim. Ele tinha vis-
lumbrado o pior e se sentia positivo.
Cerca de um mês depois da picada,
os rins já funcionavam bem a ponto
de os médicos o tirarem da diálise.
“Eu trocaria um par de dedos para ter
meus rins de volta”, contou ele.
Deitado no leito do hospital,
recuperando-se lentamente, ele teve
tempo de pensar. “Quando voltei a
mim e vi que estava tudo bem, cho-
rei muito e pensei em todas as coisas
burras que fiz, as pessoas que feri”, diz
Jeremy. Ele lembrou que faltara aos
eventos dos filhos ou ignorara Jennifer
enquanto trabalhava na casa de um
vizinho. Não que tivesse feito algo ter-
rível, mas, de repente, seu novo ponto
de vista fez cada passo em falso pa-
recer um desperdício imperdoável. A
experiência o modificou. “Parece que
as coisas que eu valorizava antes não
têm mais tanta importância”, reflete
ele. “Minha mulher e minha família
são muito mais importantes agora.”
Em junho passado, ele recebeu
alta do hospital, e o casal voltou para
a casa dos sonhos em andamento. E,
numa noite de julho, finalmente deram
o churrasco que tinham planejado. A
filha e os netos vieram, assim como um
vizinho. Todos se sentaram no jardim
e comeram hambúrgueres, milho gre-
lhado e batatas assadas, aproveitando
o ar quente do Texas. Os Sutcliffes
pararam para absorver aquilo tudo.
Aquele era seu paraíso, e nenhuma
cobra conseguiria mudar.

Acima do limite
A primeira multa de alta velocidade do mundo foi dada em 1896,
no vilarejo inglês de Paddock Wood. O transgressor foi pego
dirigindo a 13 km/h em uma zona cuja velocidade máxima
era de 3 km/h e foi multado em 10 xelins.
guinness book – o livro dos records

02.2020 seleções 101

Joias do
Pacífico Sul

102 seleções 02.2020

Quer você esteja planejando férias com a família,
ou uma romântica fuga a dois, uma dessas
cinco ilhas paradisíacas será perfeita

por Chris Pritchard

As praias de areia branca

são apenas uma das
02.2020 seleções atrações de Tonga.
 Tonga
VISITANTES POR ANO: Cerca de 60 mil
O
rei de Tonga salvou minha
vida. Pelo menos, é assim
que eu gosto de contar a
história. Mas esta história
boa de contar em festas pode ser
verdadeira.
Eram umas dez da manhã quando
desci da calçada com a intenção de
atravessar a rua Taufa’ahau, via im-
portante de Nuku’alofa, capital de
Tonga, e, descuidado, não olhei para
os lados. Momentos antes, notei va-
gamente um grande carro preto vindo
em minha direção; não estava cor-
rendo, nem eu andava muito devagar.
Enquanto eu caminhava pela calçada,
ele simplesmente passeava, acompa-
nhando o ritmo moderadamente in-
tenso do tráfego do meio da manhã.
Passou por mim, e, lá dentro, notei
um homem muito grande espalhado
no banco de trás. Ele sorriu e acenou
para mim. Que povo amistoso, pensei
com meus botões.
Continuei pela rua, seguindo com
passos decididos para o cruzamento.
Foi só eu pisar na rua que o grande
carro preto e lustroso avançou de re-
pente. Gritei. O carro parou, cantando
pneu. Ainda bem que gritei; senão,
poderia ter sido morto ou ferido.
Em vez disso, foi meu dia de sorte.
O homem muito grande se inclinou
para fora da janela, sorriu e acenou,
pela segunda vez em minutos. Então
104 seleções 02.2020
o carro se juntou ao tráfego e sumiu.
Deve ter sido seu dia de ser especial-
mente gentil com estrangeiros. Eu o
reconheci na mesma hora. Era Sua
Majestade, o rei Siaosi Tupou V, mo-
narca de Tonga de 2006 até sua morte
na idade relativamente precoce de 63
anos em 2012.
A ilha é uma das poucas monar-
quias do mundo. O rei Tupou V foi
sucedido pelo irmão mais novo, Tu-
pouto’a Lavaka, atual monarca do país
com o título de rei Tupou VI.
Tonga é uma sociedade cristã muito
piedosa. A maioria das lojas ainda fecha
DEVE TER SIDO
O DIA DE O REI TUPOU
SER GENTIL COM
ESTRANGEIROS.
aos domingos. Só nos últimos anos os
aviões tiveram permissão de pousar e
decolar aos sábados. Mas parece que
isso não incomoda os turistas, que vi-
sitam a ilha para relaxar e se divertir
nos resorts, nas lindas praias de areia
branca, nos mergulhos profundos ou
todas as fotos: ©shutterstock
com snorkel e na observação de baleias.
Outras atrações são o Palácio Real,
uma reluzente estrutura de madeira
branca construída em 1867 a pequena
distância do centro de Nuku’alofa, e
o trilítico de Ha’amonga’a Maui, um
portal megalítico às vezes chamado de
“Stonehenge do Pacífico Sul”.
 No alto: O Palácio Real de
Tonga data de 1867. Embaixo:
acredita-se que o trilítico de
Ha’amonga‘a Maui tenha
entre 800 e 1.500 anos.

02.2020 seleções 105

 Ilhas Cook
VISITANTES POR ANO: Cerca de 120 mil
As Ilhas Cook são uma nação inde-
pendente em “associação livre” com
a ex-autoridade colonial da Nova
Zelândia, ainda responsável pela
defesa e pelas relações exteriores do
território.
O país, com população de cerca de
17.500 habitantes, é formado por 15
ilhas desabitadas colonizadas cerca
de 1.500 anos atrás por pessoas da
atual Polinésia Francesa.
Com muitos resorts, o arquipélago é
um destino popular de férias graças às
lagoas maravilhosas e aos dias quen-
tes e tropicais. O país usa a moeda da
Nova Zelândia, com uma esquisitice:
as notas de 3 dólares das Ilhas Cook,
muito valorizadas como lembrança
pelos turistas.
Há duas rotas de ônibus na ilha
principal de Rarotonga, e ambas pas-
sam pela minúscula capital de Avarua.
Não há necessidade de mapa nem
quadro de horários; os ônibus dão a
volta num sentido ou no outro, avi-
sado em grandes placas presas ao pa-
ra-brisa. Levam menos de uma hora
para circum-navegar a ilha.

O Te Rua Manga (“a agulha”), no

centro de Rarotonga, a principal
das Ilhas Cook, oferece aos
visitantes uma vista incrível.

106 seleções 02.2020

 Passeio de
caiaque numa
lagoa samoana.

Samoa conservada mas extenuante. Hoje, a

VISITANTES POR ANO: Cerca de 128 mil
O morador mais famoso de Samoa
foi o escritor e poeta Robert Louis
Stevenson, mais conhecido pelo clás-
sico infantojuvenil A ilha do tesouro.
Ele morreu em Samoa em 1894 e foi
sepultado no monte Vaea, próximo da
capital, Apia.
O local do túmulo de Stevenson
permite uma vista abrangente da
cidade e pode ser alcançado a pé
por uma trilha morro acima, bem
antiga residência de Stevenson é uma
grande atração que incorpora um
bem cuidado museu.
Samoa, com 196 mil habitantes, tem
vários resorts e é popular entre turis-
tas que passam o tempo nadando, fa-
zendo mergulhos profundos ou com
snorkel, pescando e consumindo nas
feiras locais.
O país é uma democracia pluripar-
tidária, e Tuilaepa Lupesoliai Neioti
Aiono Sailele Malielegaoi é o atual
primeiro-ministro. As principais ilhas
são Upolu e Sava’ai.

02.2020 seleções 107

 Fiji
VISITANTES POR ANO: Cerca de 686 mil
Com quase 920 mil habitantes, Fiji é
uma gigante entre os miúdos do Pací-
fico Sul. A maioria étnica é melanésia,
e os descendentes dos trabalhadores
servis indianos dos antigos canaviais
formam o segundo maior compo-
nente populacional.
A empresa aérea nacional de Fiji
tem voos para a Austrália e para a
Nova Zelândia e faz rotas regionais e
domésticas. O turismo é a principal
atividade econômica do país. Os turis-
tas visitam Fiji para se divertir nos re-
sorts, descansando junto à piscina com
coquetéis coloridos, nadando, mer-
gulhando com snorkel ou com equipa-
mento de profundidade, pescando em
alto-mar ou passeando de barco entre
as ilhas. Também visitam feiras e igre-
jas locais e fazem compras em cidades
como Suva, Nadi e Lautoka.
O arquipélago é formado por 330
ilhas, das quais algumas são rochedos
desabitados.

As cachoeiras do baixo Tavoro

ficam em Taveuni, terceira
maior ilha de Fiji.

108 seleções 02.2020


Yasur, vulcão ativo em Vanuatu.
Vanuatu
VISITANTES POR ANO: Cerca de 95 mil
Vanuatu é um arquipélago de 83 ilhas
tropicais que inclui aglomerados de
rocha minúsculos e desabitados. O
ex-contador Charlot Salwai é o pri-
meiro-ministro eleito do país.
Uma grande atração de Vanuatu é o
Yasur, um dos menores vulcões ativos
do mundo. É uma caminhada fácil e
curta morro acima até a beira da cra-
tera, e quem olha para baixo vê rochas
flamejantes lançadas das entranhas
da Terra.
A Air Vanuatu, empresa aérea local,
Um passeio tranquilo leva à cratera do
tem voos para Austrália, Nova Ze-
lândia e destinos regionais. Entre as
atrações, há mergulhos para explorar
antigos naufrágios, mergulhos com
snorkel, pesca, cruzeiros noturnos e
excursões em cavernas e aldeias re-
motas tradicionais.
Os turistas visitam Port Vila, a capi-
tal, para vasculhar as lojas de suveni-
res e as barraquinhas de artesanato,
além das butiques especializadas em
moda tropical. A maioria dos visitan-
tes experimenta uma bebida lama-
centa chamada kava, feita com a raiz
socada de um parente da pimenta.
Vendida em lojas, a kava é um soní-
fero levemente narcótico.
02.2020 seleções 109
 REPORTAGEM ESPECIAL

PROFESSOR
que mudou a
minha vida
Os bons educadores transmitem conhecimento.
Os ótimos causam uma impressão que fica
para sempre no coração dos alunos.

110 seleções 02.2020

© istock

02.2020 seleções 111

 O
AGRADECIMENTO
SURPRESA
por Karin Brulliard
de The WashingTon PosT
R
aramente os professo-
res sabem se causaram
impressão duradoura nos
alunos, e descobrir que
sim pode ser uma das re-
compensas mais profundas. Sei disso
porque aconteceu com minha mãe,
professora aposentada, numa manhã
em que ela sintonizou a NPR.
Em 2003, eu estava de visita na casa
de meus pais, e minha mãe saiu do
quarto com uma cara perplexa. Tinha
ouvido no rádio a entrevista de uma
escritora famosa de romances de fan-
tasia para jovens. Seu nome, Tamora
Pierce, era o mesmo de uma jovem
precoce que foi aluna de minha mãe
quase quatro décadas antes. Mamãe
queria saber se seria a mesma pessoa.
Bem, eu disse (talvez com um
certo sarcasmo), a internet poderia
nos dizer. Encontrei rapidamente o
site da escritora. Era uma celebri-
dade, “imensamente popular”, como
disse uma resenha do New York Ti-
mes, autora de livros com heroínas
poderosas.
Cliquei no link da biografia em
busca de referências ao Burlingame
112 seleções 02.2020
Hoje escritora de sucesso, Tamora Pierce
(à esquerda) referiu-se a Mary Jacobson,
sua professora da sétima série, como o
“primeiro adulto que conheci que se
comportou como um ser humano”.
Junior High, escola onde minha mãe
trabalhou, e meu coração começou a
inflar quando a avistei no pé da pri-
meira seção. Ali estava a confirma-
ção de que minha mãe dera aulas a
coRtesiA de tAMoRA PieRce (detAlhe À esQUeRdA),
coRtesiA de kARiN BRUlliARd (detAlhe À diReitA)
uma escritora hoje famosa! Mas meus
olhos pararam ao ler o parágrafo se-
guinte, no qual Tamora descreve
como escreveu sua primeira obra de
ficção na 6-ª série.
“No ano seguinte, enquanto eu
ainda rabiscava minhas próprias
histórias, minha professora de in-
glês (abençoada seja, Sra. Jacobsen!)
me apresentou à trilogia O senhor
dos anéis, de J. R. R. Tolkien”, dizia
a biografia. “Fiquei viciada em fan-
tasia, depois em ficção científica, e
ambas acabaram entrando em mi-
nhas histórias.”
O nome de minha mãe era Mary
Jacobson.
Não me lembro da reação imediata
da minha mãe a essa descoberta, mas
eu diria que foi discreta e que suas
bochechas naturalmente rosadas co-
raram profundamente. Mamãe, que
morreu em 2011, era bondosa, de uma
inteligência tranquila e muito amiga
de mais gente do que jamais conside-
rei como colegas. Também era extre-
mamente humilde.
Em poucos dias, meu pai confe-
riu todos os livros de Tamora Pierce
na biblioteca local e, num deles, en-
contramos outra pérola: Daja’s Book,
romance de 1998, era dedicado aos
“professores que configuraram minha
vida”. Tamora Pierce listava quatro no-
mes, e um deles era Mary Jacobsen.
(Este erro de grafia no sobrenome da
família não surpreendeu. Acontecia o
tempo todo.)
A dedicatória terminava: “O grande
professor está acima de todos os ou-
tros tesouros.”
Adoro essa história não só porque
é uma demonstração maravilhosa do
impacto que os professores podem
causar sem saber, mas também por-
que me fez ver minha mãe de outro
jeito. Ela tinha apenas 24 anos quando
deu aulas a Tamora... e lhe apresentou
Tolkien?
Fui uma leitora voraz quando
criança, e atribuo isso às horas que
minha mãe e eu passamos lendo
juntas em minha cama: primeiro,
Appley Dapply’s Nursery Rhymes, de
Beatrix Potter, depois Julie of the Wol-
ves, de Jean Craighead George. Mas
não me lembro de ela ter sequer men-
cionado Tolkien. Talvez minha mãe
simplesmente fosse sagaz a ponto de
perceber que fantasia não era minha
praia. E talvez tivesse percepção sufi-
ciente para saber que era de Tolkien
que Tamora precisava.
Num e-mail recente, Pierce se lem-
brou com clareza de que minha mãe
“Minha vida seria muito
diferente sem ela”,
escreveu Tamora. “Ela me
fez acreditar em mim.”
lhe deu o primeiro livro da trilogia
numa sexta-feira e os dois outros na
segunda-feira seguinte. “Ela mudou
minha vida”, escreveu Tamora. Tolkien
a inspirou não só a escrever o que
chama de “alta fantasia”, mas também
a publicar livros com heróis juvenis,
centrados em mulheres.
Tamora contou outras lembranças
específicas. Quando escreveu um
conto longo demais sobre Barba-
-Negra, minha mãe sugeriu que ela
escolhesse temas mais curtos para
as redações, mas que continuasse os
projetos maiores no tempo livre. Mi-
nha mãe também lhe disse que guar-
dasse tudo o que escrevesse, conselho
que Tamora, hoje autora de 31 livros
02.2020 seleções 113
e numerosos contos e ensaios, disse
que ainda segue.
Minha mãe mandou um e-mail a
Tamora depois que encontramos o site
em 2003. As duas afirmaram que pen-
savam uma na outra constantemente.
“Fiquei muito agradecida por ser
finalmente capaz de lhe dizer o que
fez por mim, porque acho que minha
vida seria muito diferente sem os li-
vros a que ela me apresentou, as críti-
cas que fez de minha escrita e o modo
como deixou claro que achava que eu
era especial”, me disse Tamora. “Na-
quele tempo, eu sofria bastante escas-
sez dessas coisas, e, sem nada dizer,
ela me fez acreditar em mim.”
Em junho de 2011, eu morava no
exterior e vim passar algumas sema-
nas em casa. Minha mãe lutava havia
cinco anos contra um câncer de ová-
rio, e nenhum dos muitos coquetéis
de quimioterapia conseguiu deter a
evolução da doença. Enfraquecida e
A LISTA
por Helen P. Mrosla
de ProTeus
E
le era da primeira turma de
3-ª série a que dei aulas na
St. Mary’s School, em Mor-
ris, no estado de Minnesota.
Todos os meus 34 alunos
eram queridos, mas Mark Eklund
era um em um milhão: de aparência
114 seleções 02.2020
praticamente confinada ao leito, ela
recebia com sorrisos um fluxo cons-
tante de amigos. Estava morrendo e
se despedia.
Como parte desse processo dolo-
roso, ela me pediu que mandasse um
e-mail a Tamora, porque estava fraca
demais. Eis um trecho do que escrevi:
“Eu a estava ajudando a limpar e or-
ganizar o armário e a cômoda, e mamãe
disse que aquilo lhe lembrou você, que,
quando estudante, ficava depois das
aulas para arrumar a mesa dela. ‘Ela
era tão fofinha arrumando tudo. Ficava
tão preocupada no fim do dia’, disse
ela sobre você. ‘Diga-lhe que isso foi
muito valioso para mim.’” Minha mãe
era humilde, mas aquele pedido no fim
da vida – que eu agradecesse a Tamora
– também me mostrou que estava or-
gulhosa. Orgulhosa, surpresa e conten-
tíssima por saber que fizera diferença.
WAshiNGtoN Post (11 de MAio de 2018), © 2018 de
WAshiNGtoN Post, WAshiNGtoNPost.coM.
muito asseada, com uma atitude de
quem é feliz por estar vivo. Também
falava sem parar.
Eu tinha de lhe lembrar o tempo
todo que falar sem permissão não era
aceitável. O que mais me impressio-
nava era sua resposta sincera toda
vez que eu o corrigia por mau com-
portamento: “Obrigado por me corri-
gir, irmã!” A princípio, eu não soube
como interpretar, mas não demorou
para me acostumar a ouvir a frase
muitas vezes por dia.

Mark Eklund, soldado de primeira classe
do exército americano na Guerra do
Vietnã, mandou cartas a Helen Mrosla
enquanto servia.
Certa manhã, cometi um erro de
professora novata. Quando Mark falou
demais, eu lhe disse: “Se disser mais
uma palavra, vou fechar sua boca com
fita-crepe!”
coRtesiA de VietNAM VeteRANs MeMoRiAl FUNd (detAlhe À esQUeRdA)
Não levou dez segundos para Chuck
gritar: “Mark está falando de novo!” E,
como eu declarara a punição na frente
da turma, tive de cumprir.
Lembro-me da cena como se ti-
vesse ocorrido hoje de manhã. An-
dei até minha mesa, abri a gaveta de
maneira bem deliberada e peguei um
rolo de fita-crepe. Sem dizer palavra,
fui até a carteira de Mark, rasguei
dois pedaços de fita e fiz um grande
X sobre sua boca. Então, voltei para
a frente da sala. Quando dei uma
olhada para ver como ele estava, Mark
piscou para mim.
Foi o que bastou! Caí na risada. A
classe deu vivas quando
voltei à carteira de Mark,
retirei a fita e dei de ombros.
Suas primeiras palavras fo-
ram: “Obrigado por me cor-
rigir, irmã.”
Os anos voaram e, antes que
eu percebesse, Mark estava de
novo em minha turma de mate-
mática, dessa vez no fundamental
II. Como precisava escutar minhas
instruções com atenção, ele não fa-
lava tanto na 9-ª série quanto na 3-ª .
Numa sexta-feira, depois de passar
a semana inteira trabalhando muito
um conceito novo, percebi que os
alunos sentiam-se frustrados e irri-
tados uns com os outros. Tinha de
acabar com aquele mau humor antes
que fugisse do controle. Assim, pedi
que eles listassem o nome dos cole-
gas de sala em duas folhas de papel,
deixando um espaço entre os nomes.
Depois, pedi que pensassem nas me-
lhores coisas que pudessem dizer so-
bre cada colega e as escrevessem.
Isso durou o restante da aula.
Quando foram embora, os alunos
me entregaram as folhas. Mark disse:
“Obrigado por me ensinar, irmã. Bom
fim de semana.”
Naquele sábado, escrevi o nome
de cada aluno numa folha de pa-
pel separada e listei o que todos
tinham dito sobre aquele indiví-
duo. Na segunda-feira, dei a cada
aluno sua lista. Não demorou para a
turma inteira sorrir. “Não sabia que
eu era importante para alguém!”,
02.2020 seleções 115
ouvi sussurrarem. “Não sabia que
os outros gostavam tanto de mim!”
Ninguém mais voltou a mencionar
aquelas folhas de papel na turma.
Nunca soube se conversaram sobre
elas depois da aula ou com os pais,
mas não importava. Os alunos volta-
ram a ficar contentes consigo mes-
mos e com os colegas.
Anos depois, quando voltava de fé-
rias, meus pais foram me buscar no
aeroporto. No carro, indo para casa,
Nunca soube se meus
alunos voltaram a falar
sobre a lista, mas não
importava. Estavam felizes.
mamãe me fez as perguntas de sem-
pre sobre a viagem: o clima, minhas
experiências em geral. Houve uma
pequena pausa na conversa. Mamãe
lançou um olhar de soslaio para papai
e disse, simplesmente:
– Pai?
Meu pai soltou um pigarro, como
sempre fazia antes de dizer algo
importante.
– Os Eklunds ligaram ontem à noite
– começou.
– É mesmo? – comentei. – Não te-
nho notícias deles há anos. Como está
Mark?
Papai respondeu baixinho:
– Mark morreu no Vietnã. O fune-
ral é amanhã, e os pais dele gostariam
que você fosse.
116 seleções 02.2020
Até hoje, ainda consigo indicar o
ponto exato da estrada I-494 em que
papai me falou de Mark.
Eu nunca tinha visto um soldado
num caixão militar. Mark parecia tão
bonito, tão maduro. Naquele mo-
mento, só pude pensar: Mark, eu da-
ria toda a fita-crepe do mundo para
você falar comigo. A igreja estava lo-
tada de amigos dele. O pastor fez as
orações de sempre e o corneteiro to-
cou. Um a um, os que amavam Mark
deram uma última passada pelo cai-
xão e o borrifaram com água benta.
Fui a última a abençoar o caixão.
Enquanto estava lá, um dos soldados
que tinham carregado o féretro se
aproximou.
– A senhora foi a professora de ma-
temática de Mark?
Fiz que sim, olhando para o caixão.
– Mark falava muito da senhora.
Depois do funeral, a maior parte dos
ex-colegas de escola de Mark foram al-
moçar no sítio de Chuck. A mãe e o pai
de Mark estavam lá à minha espera.
– Queremos lhe mostrar uma coisa
– disse o pai, tirando uma carteira
do bolso. – Acharam isso com Mark
quando ele morreu. Achamos que
você reconheceria.
Ele abriu a carteira e, com cuidado,
retirou duas folhas gastas de papel
de caderno que tinham sido coladas,
dobradas e redobradas muitas vezes.
Soube sem olhar que era o papel em
que eu listara todas as coisas boas que
os colegas tinham dito sobre ele.
– Muito obrigada por ter feito
 isso – agradeceu a mãe de Mark. –
Como pode ver, tinha muito valor
para ele.
Os colegas de Mark começaram a se
agrupar à nossa volta. Charlie sorriu
com timidez e disse:
– Ainda tenho minha lista. Está na
gaveta de cima da escrivaninha, em
casa.
A mulher de Chuck disse:
– Chuck me pediu que pusesse a
dele em nosso álbum de casamento.
SALVADOR
SECRETO
por Harut Sassounian
de The California Courier
E
m 1968, eu estudava no Gi-
násio Armênio Levon & So-
phia Hagopian, em Beirute.
Quando chegou a época
de me matricular na 10-ª
série (equivalente ao primeiro ano do
ensino médio), fui à sala do diretor e
disse aos funcionários que meus pais
coRtesiA do ARQUiVo dA FAMÍliA BAliAN
não conseguiam pagar a mensalidade.
Embora eu fosse o melhor aluno da
turma, me mandaram para casa. Foi
uma experiência de cortar o coração,
porque eu adorava a escola e queria
muito continuar estudando.
Voltei para casa e passei o dia aju-
dando meu pai na borracharia. Ele
mal ganhava o suficiente para pagar a
escola de meus dois irmãos.
– Também tenho a minha – falou
Marilyn. – Está em meu diário.
Vicki enfiou a mão na bolsa, tirou a
carteira e mostrou ao grupo sua lista
gasta e puída.
– Carrego comigo o tempo todo –
disse sem piscar. – Acho que todos
guardamos nossas listas.
Foi quando eu finalmente me sentei
e chorei.
PRoteUs (PRiMAVeRA de 1991), © 1991 de heleN P.
MRoslA, shiP.edU/PRoteUs.
Olivia Balian deu aulas na escola Sophia
Hagopian durante 25 anos.
Um senhor muito velho me viu na
oficina e perguntou por que eu não es-
tava na escola. Eu lhe disse que tinham
me mandado para casa por falta de
recursos. Ele se ofereceu para ajudar
e falou que telefonaria ao diretor de
outra escola solicitando que me desse
uma bolsa. Embora a escola ficasse
02.2020 seleções 117
longe de casa, eu não poderia des-
perdiçar a oportunidade de continuar
minha educação. Peguei um ônibus
até o centro de Beirute e fui à sala do
diretor. Com vergonha de mencionar a
bolsa de estudos, disse-lhe que tinham
combinado que eu estudasse pagando
a mensalidade com desconto. Fiquei
espantado quando o diretor gritou,
dizendo que mensalidade com des-
Finalmente soube quem
era minha benfeitora, sob
a condição de não lhe
agradecer pelo que fizera.
conto não existia. Imediatamente, dei
meia-volta e retornei correndo para a
borracharia de meu pai.
Três dias depois, um de meus co-
legas do Sophia Hagopian apareceu.
O diretor mandava dizer que eu devia
ir à escola no dia seguinte. Quando
cheguei, comuniquei à secretária que
não podia pagar a mensalidade. Ela
me informou que a mensalidade es-
tava paga e que eu devia ir para mi-
nha sala. Perguntei quem pagara, para
agradecer a esse indivíduo maravi-
lhoso. Ela respondeu que o benfeitor
queria permanecer anônimo.
Fui para a sala, mas continuei que-
rendo saber quem me dera aquela
oportunidade de ouro. Voltei à dire-
toria depois da aula e implorei à se-
cretária que me revelasse o nome do
benfeitor. Com minha insistência e na
118 seleções 02.2020
condição de que eu não agradecesse
à pessoa para não deixar a secretária
em risco de demissão por quebrar a
confidencialidade, ela me informou
que a benfeitora era Olivia Balian,
minha professora de inglês.
A secretária explicou que, quando o
ano letivo começou, a Sra. Balian no-
tou que minha carteira estava vazia e
perguntou por que eu não estava na
escola. Disseram-lhe que meus pais
não tinham condições de pagar a
mensalidade. Então ela pediu ao di-
retor que deduzisse a mensalidade de
seu salário.
Naquele ano inteiro, tive aulas com
a Sra. Balian pensando em seu gesto
magnânimo, mas sem poder exprimir
minha gratidão. Um ano depois, me
mudei para os Estados Unidos, onde
fiz dois mestrados: um na Universi-
dade de Colúmbia e outro na Univer-
sidade Pepperdine.
Nunca esqueci a bondade e a gene-
rosidade da Sra. Balian. Quase 40 anos
depois, voltei a Beirute pela primeira
vez para doar 4,5 milhões de dólares
da Fundação Lincy, de Kirk Kerkorian,
para todas as 28 escolas armênias do
Líbano. Entre as escolas que visitei,
estava a minha. Enquanto entregava
ao diretor a doação de várias centenas
de milhares de dólares, aconselhei-o
a nunca expulsar nenhum aluno por
falta de dinheiro, porque nunca se
sabe em que esse aluno ou aluna pode
se transformar no futuro. Pode vir a
ser um médico brilhante, um bom di-
plomata ou alguém que vai trabalhar
 com um milionário benfeitor que faz
uma grande doação à escola.
No Líbano, visitei a Sra. Balian. Ela
se aposentara fazia muito tempo e mo-
rava sozinha num apartamento perto
de Beirute. Ficou tão emocionada ao
me ver quanto eu ao vê-la. Finalmente
pude lhe agradecer a generosidade de
tantos anos atrás, mas ela nem quis
ouvir falar disso e, modestamente,
mudou de assunto. Eu me ofereci para
ajudá-la no que fosse possível, inclu-
sive com auxílio financeiro ou reco-
nhecimento especial por suas muitas
décadas educando jovens armênios.
Ela recusou todas as ofertas.
ENCONTRO
DIÁRIO
por Maxie Jones
coNtAdo Ao ViVo No eVeNto The moTh
C
omecei o segundo se-
mestre da 10-ª série no
dia 1-º de fevereiro de
1978. Em 2 de fevereiro,
quando me levantei para
ir à escola, minha mãe não acordou.
Tinha morrido dormindo durante a
noite. Depois que a sepultamos, voltei
coRtesiA de MAXie JoNes
à escola, mas não fazia a mínima ques-
tão de estar lá.
Como era um semestre novo,
meus professores não me conheciam
muito bem. O Sr. Goldberg, professor
de inglês, fazia perguntas à turma e
Embora esta história seja sobre a
generosa Sra. Olivia Balian, que fa-
leceu em 2017, também é o testemu-
nho de que uma pessoa pode fazer
muita diferença na vida dos outros.
Sem sua ajuda, que me deu a opor-
tunidade sem igual de estudar inglês,
provavelmente eu nunca teria ido
para os Estados Unidos e estudado lá
e não seria editor de um jornal nessa
língua, o California Courier. Prova-
velmente, passaria o resto da vida
consertando pneus na borracharia
do meu pai em Beirute.
cAliFoRNiA coURieR (17 de oUtUBRo de 2017), © 2017
the cAliFoRNiA coURieR, thecAliFoRNiAcoURieR.coM.
“Você avançou muito”,
escreveu Fred Goldberg (centro)
a Maxie Jones (no detalhe) em seu livro de
formatura no ensino médio em 1980.
chamava alunos para responder. Toda
vez que me chamava, ele pratica-
mente me despertava de onde minha
02.2020 seleções 119
mente estivesse. Eu dizia: “Desculpe,
pode repetir?” Ele fazia a pergunta
outra vez e eu dava a resposta certa.
Um dia ele me pediu que o espe-
rasse depois da aula. “Não entendo
o que está acontecendo”, falou. “Você
sempre parece perdido. Sua mente
está sempre fora da sala, mas você
sabe todas as respostas.”
Depois que minha mãe
morreu, não tive mais
vontade de ir à escola.
Eu lhe contei que o motivo de eu
ir à escola todos os dias era porque
minha mãe me obrigava. Agora que
ela não estava mais lá, eu não sentia
necessidade nenhuma de ir às aulas.
Então, ele falou: “Bem, me faça um
favor. Quero que você me procure em
minha sala no sexto tempo.” E fui à
sala dele só para conversar. Depois, ele
disse: “Volte amanhã à mesma hora.”
Isso continuou, dia após dia. Ele me
pedia que o encontrasse quando es-
tava preparando as aulas. Eu o ajudava
a corrigir provas e conversávamos.
Em um evento na escola para a fa-
mília, fui com minha irmã, que aca-
bara de se formar na mesma escola. O
professor de estudos sociais não quis
falar com ela, porque achou que fosse
alguma pegadinha. O Sr. Goldberg, que
por acaso estava por perto, entrou na
sala e disse: “Espere um instante! Fale
com ela. Explico depois.”
120 seleções 02.2020
Na verdade, o Sr. Goldberg foi a to-
das as salas e conversou com todos
os meus professores. Disse: “Se tiver
qualquer problema com Maxie Jones,
me procure.”
No ano seguinte, ele fez a mesma
coisa. Eu me encontrei com ele todos
os dias, e ele conversou com todos os
meus professores sobre o que estava
acontecendo comigo. Mais uma vez,
dizia: “Se tiver qualquer problema
com Maxie, venha conversar comigo.”
Quando terminei o ensino médio,
não tinha faltado a nenhuma aula.
Na formatura, o Sr. Goldberg me
confidenciou:
– É esquisito. Dou aula na décima
série, não na última, e nunca vim às
formaturas.
– Ora, então por que o senhor está
aqui? – perguntei.
Ele respondeu:
– Porque não deixaria de ver você se
formar por nada neste mundo.
Levei anos para perceber o que ele
tinha feito. Terminei o ensino médio
entre os 15% melhores de minha turma.
Ganhei uma bolsa Regents e fui para a
faculdade. A verdade é que sempre fui
academicamente capaz. Mas, com 15
anos, depois de perder minha mãe e
sem entender o valor da educação, eu
estava na fila para virar estatística e
abandonar a escola. Percebi que a razão
de eu ir à aula todos os dias era porque
havia alguém lá que esperava me ver.
Esse alguém era o Sr. Goldberg.
AdAPtAdo de UMA PAlestRA Ao ViVo dA sÉRie the Moth,
eM detRoit (seteMBRo de 2018), © 2018 de the Moth,
theMoth.oRG.
 ENRIQUEÇA
seu vocabulário

Em tempos de judicialização extrema, em parte por conta

de disputas políticas, é bom conhecer certas palavras e
expressões da linguagem jurídica. Determine o significado
das que são listadas abaixo. Respostas no verso.

Por Ricardo Salles

1. ad libitum 9. pactum sceleris
A na dúvida; B livremente; A pacto para delinquir; B acordo judicial;
C compulsoriamente. C decisão judicial sumária.
2. arrimo s.m. 10. protelatório adj.
A exclusão social; B amparo; A que apressa; B que provoca perda
C aprisionamento. de tempo; C emanado de juiz
3. avuncular adj. 2 gên. competente.
A relativo a tio; B relativo a avô; 11. res derelicta
C relativo a cônjuge. A coisa de muito valor;
4. desídia s.f. B coisa abandonada; C coisa de um
A desleixo; B sabotagem; só dono.
C agressão escrita. 12. sectário s.m. e adj.
5. felonia s.f. A partidário obstinado; B o mesmo que
A solidariedade; B pacificação; C traição. venal; C o mesmo que usurário.

6. impúbere adj. e s. 2 gên. 13. sursis s.m.

A adolescente; B criança; C idoso.
7. juiz ad quem
A juiz de paz; B juiz aposentado;
C juiz de instância superior.
8. mens legis
A objetivo do preceito legal; B preceito de
lei estrangeira; C preceito de lei revogada.
A conversão da pena; B extinção da pena;
C suspensão da pena.
14. turpilóquio s.m.
A gritaria; B rodeios ao falar; C palavrão.
15. vindicar vb
A renovar um direito; B reclamar um
direito; C extinguir um direito.

02.2020 seleções 121

RESPOSTAS
1. ad libitum B livremente (locução latina
que literalmente traduz ‘conforme dese-
jado’, formada com o part. pass. de libet,
verbo impessoal que quer dizer ‘aprazer’).
2. arrimo B amparo (regressivo de arri-
mar, propriamente escorar-se em alguma
coisa [ou alguém, daí arrimo de família],
formado de rima, um monte ou uma pilha
de coisas, do árabe rizma, ‘pacote’).
3. avuncular A relativo a tio (derivado de
avúnculo, denominação antiga do tio
materno, do latim avunculus, -i, idem [pro-
priamente, diminutivo de avus, ‘avô’]).
4. desídia A desleixo (do latim desidia,
-ae, ‘indolência’, deverbal de desidere,
‘estar sentado, desocupado’).
5. felonia C traição (de etimologia discu-
tida; aceita-se o étimo francês félonie,
idem, de félon, aquele que viola deveres
para com o senhor feudal; provável origem
remota frâncica [germânica, portanto]).
6. impúbere B criança (antes da adoles-
cência; do latim impubes, -eris, propria-
mente o que [ainda] não tem pelos
[pubes, ‘pelos pubianos’]).
7. juiz ad quem C juiz de instância supe-
rior (locução latina: literalmente o juiz
para o qual [se dirige um recurso]).
8. mens legis A objetivo do preceito legal
(locução latina que quer dizer literal-
mente ‘a intenção da lei’).
122 seleções 02.2020
9. pactum sceleris A pacto para delinquir
(locução latina formada de pactum,
‘pacto’, e scelus, -eris, ‘crime’ [daí,
celerado, sinônimo de criminoso]).
10. protelatório B que provoca perda de
tempo (na raiz remota latina, protelare,
que quer dizer impelir para longe, afastar,
verbo formado de protelum, -i, ação de
puxar continuamente, deverbal de
tendere, ‘estender’).
11. res derelicta B coisa abandonada (lo-
cução latina formada de res, rei, ‘coisa’, e
derelicta, part. pass. feminino de derelin-
quere, ‘abandonar’).
12. sectário A partidário obstinado (do
latim sectarius, -a, -um, propriamente o
que vai à frente e é seguido por outros,
deverbal de sectari [vb depoente], ‘seguir
habitualmente [acompanhar]’).
13. sursis C suspensão da pena (termo
francês aceito na nossa nominata jurí-
dica; part. pass. de surseoir, ‘suspender’).
14. turpilóquio C palavrão (do latim tur-
piloquium, -i, propriamente conversa obs-
cena, formado de turpis, -e, ‘horrendo’, e
loquium, -i, deverbal de loquor, ‘falar’).
15. vindicar B reclamar um direito (do
latim vindicare, propriamente requerer
a um juiz).
Some seus pontos
4–9: Bom; 10–12: Excelente;
13–15: Excepcional.
 “Posso defender esse morro mais uma hora, mas
depois terei mesmo de ir para a academia.”

piadas de Eu: Engano outra vez. Na década de 1950,

Quem ligou: O senhor eu era datilógrafo no
CASERNA tem o número dele? quartel-general de
Houve uma convoca- nossa base em Verdun,
ção e ele precisa vir na França. Éramos um
Fui acordado tarde da trabalhar. grupo durão. Durão
noite por um telefo- Eu: Não, eu... como? Nosso lema
nema do vizinho Forte (Desligam. E...) “Nunca recuamos, só
© Zachary Kanin/cartoonstocK

Meade, em Maryland. Segunda pessoa damos retrocesso.”

Eu: Alô! ligando: O sargento —Bill Robbins
Quem ligou: O sargento Rodrigues está?
Rodrigues está? Eu: Não. Houve uma
Eu: Sinto muito, o convocação e ele foi sua história pode
senhor ligou errado. trabalhar. valer até R$ 400.
(Desligo. R-i-i-ing!) Segunda pessoa: OK. Visite o site selecoes.com.br
Quem ligou: Sargento Obrigado. ou veja os detalhes na
Rodrigues? —Howard Graves página 5.

02.2020 seleções 123

 DESAFIO SELEÇÕES

5 2 1 1 1 1 2 5
3 3 6 4 4 6 6 6 3 3 Figura secreta
6
dificuldade moderada Revele a imagem oculta
2 2
1 2 1 colorindo os grupos de quadrados adjacentes na
1 2 1 vertical ou na horizontal. Os números represen-
8 tam quantos quadrados há nos grupos de cada
10 linha ou coluna correspondente. (Por exemplo,
1 6 1 um “3” perto de uma linha representa três
10 quadrados adjacentes na horizontal naquela
2 2
linha.) Tem de haver pelo menos um quadrado

(Figura secreta) Diane Baher. instruções mais DetalhaDas Disponíveis em learnpicapix.com;

2 2
vazio entre os grupos. Os números estão na
mesma ordem horizontal ou vertical que os grupos que representam. Só há uma
imagem possível. Você consegue descobrir qual é?

Espião-mor
5 1 7 8

(espião-mor) Fraser simpson; (expanDir e conquistar) Darren rigBy

difícil Deduza o número secreto formado
por quatro algarismos de 1 a 9. O gráfico
mostra quatro palpites do número e uma
1 3 9 6
pontuação para cada palpite, representada
por bolinhas. Qualquer algarismo que
9 1 6 4
exista no número secreto na mesma posi- 6 8 2 5
ção do palpite ganha uma bola preta. Qual-
quer algarismo que exista no número secreto em posição diferente do palpite ganha
uma bola branca. Os algarismos que não existem no número secreto não ganham
bola. Qual é o número secreto?

35, 15, 5 Expandir e conquistar

68, 48, 32, 6 dificuldade moderada Cada uma destas
sequências tem a mesma regra. E cada uma
79, 63, 18, 8 continua até chegar a um número menor do
que 10, quando naturalmente termina. Como
87... continuar a sequência começada com 87?

124 seleções 02.2020

 A lavadora que come meias
fácil Você comprou uma nova máquina de lavar e, a primeira vez que a usou,
um pé de meia sumiu misteriosamente. Na vez seguinte, dois pés de meia
sumiram. Em cada lavagem posterior, o número de pés de meia sumidos
dobrou em relação à lavagem anterior. No total, quantos ciclos de lavagem
foram necessários para você perder todos os seus 25 pares de meia?
(A lAvAdorA que come meiAs) sue dohrin; (meiAs) istock.com/Animicsgo; (ArrAnhA-céus) FrAser simpson

Arranha-céus 3 3
difícil Esta grade representa o centro
da cidade visto de cima. Ponha em cada
célula um número de 1 a 5 (represen-
tando a altura do prédio em número de
andares), de modo que não haja dois 3
prédios com a mesma altura em ne-
nhuma linha ou coluna. Os números na
periferia correspondem ao número de
prédios visíveis naquela direção para
4
um observador que esteja fora da grade 4
olhando para dentro. Os prédios mais
altos bloqueiam a visão dos prédios
mais baixos que estão atrás. Você 1 3
consegue determinar a altura de todos
os 25 prédios?

meias: Seis ciclos. 2 2

A lavadora que come 2 2
10
1 6 1
1 2 3 5 4 número seguinte. 10
8
2 5 4 3 1 número para obter o 1 2 1
1 2 1
dois algarismos do 2 2
4 1 5 2 3 30, 0. Multiplique os 6
3 3 6 4 4 6 6 6 3 3
3 4 2 1 5 conquistar: 87, 56, 5 2 1 1 1 1 2 5

5 3 1 4 2
Expandir e Figura secreta

Arranha-céus Espião-mor: 1.385. RESPOSTAS:

02.2020 seleções 125

 – Hoje à noite você

RIR saberá – disse Jim

dissimuladamente.
É o melhor Remédio Naquela noite, Jim
voltou para casa com
um presentinho para a
mulher. Emma rasgou
o papel, abriu a caixa
e pegou o presente: um
UAU, TENHO UM MONTE livro chamado O signi-
DE PARENTES!!! ficado dos sonhos.
—thetrendinsights.com

Após a cirurgia de
catarata, reclamei com
a empregada que a
casa estava muito suja.
Ela, tranquilamente,
respondeu:
– Ela sempre esteve
assim. A diferença é
que agora o senhor está
enxergando melhor.
—Jeferson P. da
Silva, Rio de Janeiro (RJ)

Um viúvo e uma viúva

vão à 70-ª reunião de
colegas do ensino
médio, e a antiga brasa
se reacende.
No fim da noite,
Uma noite Emma me dava um colar de ele pergunta: – Quer se
acordou de repente. O pérolas no Dia dos Na- casar comigo?
marido Jim perguntou morados – respondeu – Quero, sim! –
qual era o problema. ela. – O que isso responde ela com
– Sonhei que você significa? entusiasmo.

126 seleções 02.2020 ilustrado por dan reynolds

 Tenho todos os livros de Marie Kondo. Agora código semafórico, eu já
só preciso dar um jeito de organizá-los. estava dando bandeira.”
—Richard Pulsford
—Enviado por Rob SowbyLehi
bbc.com
Na manhã seguinte, Todo ano, o Festival de
o viúvo acorda incomo- Edimburgo homena- Finalmente consegui li-
dado. Ela aceitou ou geia os quadrinhos gar para todos aqueles
não? Confuso, ele tele- mais engraçados do garotos que escreveram
fona e pergunta: mundo. Eis o que nos no livro de formatura
– Você aceitou ou fez morrer de rir este do ensino médio:
não meu pedido de ano: “Vamos nos encontrar
casamento? ✦ “Sem querer, me nas férias!”
– Aceitei! E, olha, inscrevi num curso de — @Cheeseboy22
ainda bem que você escapologia. Mas estou
ligou, porque eu não com muita dificuldade sua história pode
me lembrava de de sair dele.” valer até R$ 400. Visite
quem tinha pedido —Adele Cliff o site selecoes.com.br
minha mão. ✦ “Depois de passar seis ou veja os detalhes na
—thechattanoogan.com horas aprendendo o página 5.

COISAS QUE UMA CRIANÇA DE 3 ANOS NUNCA DIRIA

✦ “Aposto que me sento na ✦ “Caramba, pai. São três e
cadeirinha do carro antes que meia da manhã. Vai dormir.
você diga as palavras ‘Mi- Amanhã você começa no
nhas costas. Não consigo... emprego novo e é bom
me endireitar...’ ” dormir direito.”
✦ “Não parece um dragão, ✦ “Não precisa esconder
mas não importa, vou comer aquele milímetro quadrado
© Fotosr52/shutterstock

assim mesmo. Comida é de abobrinha atrás do macar-

comida!”
✦ “Sim, é exatamente assim que eu
queria. Você acertou em cheio
outra vez.”
✦ “Não precisa. Já temos três. É melhor
seguir a lista de compras.”
rão. Quero mais verduras! Também
estou a fim de uns brotos agora.”
✦ “Tome o controle remoto. Nem sei
usar isso mesmo.”
✦ “Pegue seu celular de volta.”
—Olivia Appleby em mcsweeneys.net

02.2020 seleções 127

 SORRISO FINAL

128 seleções 02.2020 ilustrado por Miroslav Barták