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SERVIÇO DE CENSURA DE DIVERSÕES PÚBLICAS / RJ

SÉRIE: SERVIÇO DE CENSURA (CENSURA

PRÉVIA)-

•A" SUB SÉRIE: PEÇAS TEATRAIS

NOiAÇÃO: PA. fto íAo ■ Tn r pk

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TITULO: R D f r: o -tpe n \ fi

CERT. N°: WS*

ANO:

FOLHAS N°: ^0
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BRAN.RIOTN.CPR.PTE <■

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Co arte, sediada ae . cidade do Bi o da Janeiro, â


Bua barata Bibeiro, 391/501 - registrada sob o a2 037 - regresentaado a
fir . s 33HAIS díIII i 2 A«» - i j citar
a V.Sa., _ue se digne irand r Censurar a geya: A D3SDIÍC4 13 DSUSrANI^, au
a
toria de; YICâl.vAJ ?3iiI2IBA, cou estreia grevista gara o dia: 2 çvuinzena
de iullio de 1977» no leatro lereza CÀCILAA BECÍ33B.

».o jjs dermos,


P. b e a r iu e n t o,
Ei o de J- neiro, 14 de juniio de 1977

Wilson Barro&o Pilbo


CP?.: 020.986.097
IP?.: 2.579.810
BR AN,RIO TN.CPR.PTE_ QMO

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Fundada em 27 de Setembro de 1917 — Reconhecida como de Utilidade Pública Federal pelo Dec. 4.092. de 4-8-1920
Filiada á Confederação Internacional daso Sociedades de Autores e Compositores
Sêde: Av. Almirante Barroso. 97 • 3 andar — End. Teleg. SBA T ■ RIO
Rio de Janeiro — Brasil.

Rio , 2 de Junho de 19 77

limo. Sr.
Diretor do Departamento de Censura Federal
(Departamento de Polícia Federal)
Brasilia D F

Saudações atenciosas:

Com a presente, temos a satisfação de encaminhar a V. Sa.


para fins de CENSURA, tres copias da peça

1JÍSIIÍ..1.IIMIA
Original de Vicente Pereira
Tradução de
Próxima apresentação de. ...Th&is Portinho PrpdUÇOes Ltda*-
Teat ro GÂQJMA.MM& Cidade BI O DE JANEIRO
Estado
A estréia está prevista para... 2^ . quinzena . de Jl^Lho de 1977

Sem outro assunto, subscrevemo—nos com a devida con-


sideração ,

2.000x2 em bis. 50/50


Janeiro 75
BR AN, RIO TN.CPR.PTE l<240
4 1

!l
A DESDITA DE DEUSDBNIA»

VICENTE PEREIRA
# i".
: *
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ESCADA AO FUNDO. A CENA SE ILUMINA. UMA MULHER DOS SEUS QUARENTA E

X iAx-íTOS ANOS, TRAJANDO, UM CONHUNTO DE PANTALONAS, TÜNICA E JÓIAS AUS


*
TimiAS-MEDALHOES, BRINCOS, BRACELETik. &ESO& A . ESCADA í . Ê DE MANHA.

DEUSDETE L (ABRINDO A PORTA DA FRENTE) Que domingo estranho. Não

trouxeram os jornais. (COMEÇA A ARRUMAR A MESA PARA O CA

PE. DE REPENTE, COMEÇA Á FAREJAR ALGUMA COISA NO AS) Esta semana ter

minou num cheiro...(FAREJA) Há dias que estou sentindo um

cheiro estranho no ar. Há dias que sinto esta fragrância,

no como$o bem sutil; agora há uns dois dias tão forte...

Será que são essas azaleas? (CHEIRA ÂS A2ALÉAS) Não, não,

nuo são as azaleas, muito menos os guardanapos. (CHEIRA

OS GUARDANAPOS. PROSSEGUE ARRUMANDO A MESA) Vou por os -

ovos bem no centro, assim... bem colorido, as coros da :

legria. (EUFÓRICA) Viva a PáscoaJ (SENTE DE NOVO 0 ESTRA

NHO CHEIRO)... 6 um perfume, uma fragrância... será que


* %'•
é meu estado de graça que me sintoniza neste cheiro? (AS

♦ ?IRA PR0P
°NDAMENTE) ... que nome teria aquela lavanda que
Dousdenia usava?... Lo lac do Como? Não, não, não, isto

era a música que ela tocava. Minha filha, Dousdenia, tão


i
% talentosa, tudo que ola tocava so impregnava do perfume,
* i
a casa, as roupas tinham o choiro do seu perfume prodile
«
d to. (PüNSATIVA) Qual era mesmo?
*h

(SURGE DEUSDENIA NA PORTA DA FRENTE, COM MALAS,USANDO UM MODELO ES-

CÂNDALOS AMENTE JOVEM)

i DEüSD^JIA- ... Stravaganzaí Lavanda do almiscar selvagem. (SOLTA AS

MALAS)

BSyãiSffi . (AgsmSAm.se)... smmut Que sustei Su- üêUva j>ens«a

do em você. Achei mesmo que você viesse passar a semana


AN,RIO TN.CPR.PTE. iâMO ç 2

DEUSDETE Santa conosco. (QUESTIONAM-SE COM OS OLHOS) Mas depois,

TA) Era uma poça?

DEUSDENIA - (SECA) Nem um nom outro. Não passei nos testes. (PAUSA GRAVE)
JT
yr+
. DEUSDETE - (RESIGNADA) Outra vêz, minha filha. Está bom. Entre, Deus-

dênia. Feliz Páscoa

(DEUSDENIA PEGA AS MALAS E ENTRA; BEIJAM-SE)

DEUSDETn - Scinte-se pro café. Deve estar com fome.

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* DEUSDETE - Veiu de trem? Po gou o Vera Cruz?
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DEUSDETE - Leito?

DEUSDENIA - Poltrona.

DEUSDETE - Cheio?

DEUSDENIA - Vazio.

DEUSDETE _ ... Vazio? (OLHA PARA 0 VAZIO)


•*

DEUSDENIA - Mamãe, que cara 6 essa?

DEUSDETE - Pressentimento, Deusdenia. Não botaram o jornal na porta. Um

trem vazio... Deusdenia, por que o que você não abandona o

cinema? (DEUSDENIA VIRA 0 ROSTO) Você tentou tolovi3ão, pelo

fôêüos? £u uáe bqí q ^ue lliõ aíEQp* Já reisôâ. fcâfifcê pps yag»

nas tela3... Quantas fotonovelas eu já abri para to ver e nao


u0
encontrei. Não ó falta do torcida, não. Eu vivo rezando.
mo c;
dRAN.RIOTN.CPR.PTE P-
i
DEÜSDETE - ...Já to doi "Construir/Jo Homem o o Mundo", Gotas de Oti-

mismo, "0 Poder do Pensamento Positivo", "0 Despertar dos

Mágicos" e não adiantou nada, Deusdenia. Você nem leu. 0 que

se passa?

DEUSDENIA - Não sei, mãozinha. Algo se passa. Sempre que acho que estou

alcançando,(PAZ UM GESTO DE PEGAR ALGO NO AR) foge-mo das

mãos. (OLHA PARA 0 INFINITO) A Felicidade ó como a água.

DEÜSDETE - Mas voce quer é a felicidade da ribalta. Ali, poucas pessoas

foram felizes.

DEUSDENIA - Mamãe, eu e Chaplin.

- Teu mal, Deusdenia, ê ser pretensiosa.

não vai s er locutora? isso dá dinheiro. Não ve a Márcia Men

des, que beleza? (OLHA SECAMENTE PARA DEUSDENIA) Você não

tem vontade de ser a Márcia Mendes?

DEUSDENIA - (LEVANTANDO-SE OFENDIDA) Não»

DEÜSDETE - (INSISTINDO) E a Bety? A Bety Mondes?

DEUSDENIA - Não. Claro que não.

DEÜSDETE - (QUASE GRITANDO) Ent ão quer ser o que? Roné do Viellmond?

DEUSDENIA - Mamãe, eu sou ouj (SENTA-SE, QUASE CHORANDO)

DEÜSDETE - (COM REMORSO, ACARICIANDO A FILHA) Deusdenia, minha filha...

Por que 6 que você não volta pro supletivo?

DEUSDENIA - (LEVANTANDO-SE, FURIOSA) Que supletivo? Eu estou em pleno

mar, entendeu? E tenho estilo próprio. Não há como voltar.

DEÜSDETE - (LEVANTANDO OS BRAÇOS PARA 0 CEU) Será que eu vou ter ouo

bandonar a Messiânica do Japão e voltar para a Umbando? Só

pra acelerar o seu processo? Será que você ainda não enten«.

deu que isto são nuvens? Purificações?

DEUSDENIA - A cartomante me disso que eu,teria sucesso na carreira


N.GPK.PÍfc :

DEUSDETE* .0 carreira, minha filha'- ndo? Tomara que eu esteja vi;u

Não vai me dizer que essa realização vem so com a Era de Aquá

rio? Qual é mesmo o seu signo?

DEUSDENIA Hão so lembra mais do meu aniversário? Capricó

DEUSDETE (ASSUSTADA) Capricórnio? 0 mesmo da Ava C-ardne

DEUSDENIA 0 mesmo, mamão. (SILENCIO)

DEUSDETE 0 triste 6 que você não é nenhuma condessa descalça. (MUDA

DE TOM) Está bom, minha filha. Podo subir. Vá descansar. Vo

ce deve estar cansada. Alguma roupa pra lavar?

DEUSDEUIA TôDas. 0 calor no Rio foi a quarenta graus.

DEUSDETE Tirarei a sujeira de sua roupa. Depois tentarei remover as

impurezas de sou espirito. Vou lhe dar um passe magnético.

DEUSDENIA Como?

DEUSDETE - Passes espirituais. Johroi. Uma religião japonesa. 0 Candom

blé não me fascina mais.

DEUSDEKIA - Mamão, a senhora troca de religião como quem troca de roupa.

DEUSDETE - Ai de tá, se não fosso eu e minhas preces. Não deboche, Deus_

denia. (DEUSDENIA SOBE ALGUNS DEGSAUS) Não faça barulho, fi-

lhinha. Sua irmã está no oitavo mês de gravidez, hoje e do-

mingo e ela descansa com Claudionor. (DEUSDENiA sOBii MAIS AL

GUNS DEGRAUS) Conseguiram una promoção pana a Nigéria, na A-

frlca. Ontem mesmo a mãe de Claudionor ligou de Fernando de

Noronha. Outra coisa, Deusdenia, não liga a vitrola naquele

volume. 0 bebê de Eugênia está atravessado. Vai ter de fazer

cesariana. Ela está muito nervosa com a gravidez e a promoção

DEUSDENIA- Subirei pá ante pé. (SOBE)

DSUSDETE - (SOZINHA, DEPOIS DE UM LONGO SILÊNCIO) Agora vamos à minha

saucLação ao Sol» Rezarei a Matsonorito, Estou louoa pra re-

zar fluentemente. Japonês é tão complicado... (COMEÇA A RE-

ZAR BAIXO, OLHOS FECHADOS)



BR AN.RIOTN.CPR.PTE. iW0_p.8

(SOZINHA NO QUARTO DESARRUMANDO AS MALAS) (C AN TARO j ® v,


DEUSDENIA -

"Eu voltoi pras coisas que eu deixei..*


t (I
Pois "saauei" que aqui e o meu lugar...

(ATIRA LONGE A ROUPA QUE DOBRAVA. FALA CONSIGO M-àSMA) —

TOANDO AS ROUPAS PARA LAVAR. PÁRA, PENSATIVA)

Tenho certeza que cadaum tem o seu lugar,a sua hora... Onde

será meu lugar, já que o palco e as telas me recusaram?

(PROSSEGUE ARRUMANDO) Quanta desilusão a gente encontra pe_

la vida... Quando eu era criai ça, achava que seria uma gran

de artista. Botava um pano de prato na cabeça, sapatos.da

çiamão, um vestido da Eugenia e ficava representandocantan

do. Tardes inteiras... (PAUSA) Os aplausos jamais sucederam

minhas falas. Sempre, admito, constrangi o público. (FURIO

SA) Malditos! Isso é porque eu ainda não encontrei o meu

público. (QUASE CHORA, MAS NAQ) Não há lugar para as lag~m

mas. (ALTO) Não pensem que eu não me vingarei, não! Eu me

vingarei! (CONTINUA ARRUMANDO AS COISAS, FURIOSA) Um dia, \

les vão ter que me aturar. Ou melhor, vão me adorar. Não pen

sem que eu sou "mais uma", não! Não sou mesmo! (PAUSA) (POU-

CO MAIS CLAMA) 0 público brasileiro não esta acostumado com

verdadeiros artistas. Pois já é hora dossa gentinha me conne

cer. Alguém fora de sério. (ESTUFA 0 PEITO) Não é sempre que

nasce uma Deusdênia! (VOLTA A ARRUMAÇAO. INDIGNADA) Não po

dem entender meu estilo! Não podem! Elos nunca for -u-

ropa. Como eu fui. Claro que não podem entender. (PAUSA)

Estilo próprio... (SUSPIRA) Que sina! Eu podia ter imitado

alguém no começo quo logo tinha colado. Bancado a Marilyn

ou então a Suzanne Pleshette. Mas não. Preferi quo o cora-

ção me ditasse como me expressar. E aí... Ca estou eu. Fa-

minta, maltrapilha, desempregada. Obrigada a voltar ao ->ar.

(SUSPIRA AMARGAMENTE) Que lar... 0 Brasil não comporta ar-

tistas inquietos e curiosos como eu. (VAI ATE A JANüLA)

Tardes inteiras representando no fundo do quintal... Mamao

.m@ aíss© que *ss9 ê kmm, Sina, jaeera©» rir... Uao

posso acreditar. (NERVOSA, FALANDO AL'TO)No que , quo a Bety

Faria 6 melhor do quo eu? (PAUSA) Carreira... Ê. .. Cadaum


BRAN.RIOTN.CPR.PTE àC1
DEU3DENIA - . .. TSm a sua carreira. Vide a Clementina do Jesiis que só

fez sucesso aos sessenta. Já a Judy Garland estrelou no su-

cesso. Também, nasceu nos estúdios, né? Melhor ainda a Liza

que ó filha da Judy. Com todos aqueles amigos... Aqui, pra

gente conseguir entrar no meio artístico, só dando. (AMARGA)

S eu dei. Dei feito uma cachorra. E nada. Hão adiantou nada.

Hao consegui nada. Quando será a minha vez? Terei essa vêzE

E o que eu me pergunto. Chegará este dia? (PAUSA) Acho que

não. Devo achar que não, já que estou de volta pra onde tudo

começou. (DE5E3PERA-3E) Hão posso. (AMDA EM CÍRCULO) Hão vou

no deixar vencer. Que terror$ Preciso me expressar. (GRITA)

GentinhaJ Gentinha.' Hão me vencerão.1 Eu ainda vou estourarí

Eu vou estourar na praça. Custe o que custari

(SURGE CLAUDIONOR DE PIJAMA EE LISTRAS, CARA AMARROTADA, . DSÜSDI

HIA SOBRESSALTA-SE)

DEUSDEHIA - Claudlonor... Como você engordou.

CLAUDIONOR- (OLHANDO- INTENSAMENTE) Eu acredito.

DEUSDEHIA - (SEM JEITO, TEHTAHDO SE RECOMPOR) Acredita em que, Claudlonor?

CLAUDIONOR- Que você vá estourar um dia. Você vai estourar um dia.

DEUSDEHIA - (SEM JEITO) Bondade sua...

CLAUDIONOR- (MAIS INTENSO$ VOCê merece o sucesso. Ninguém mais do que vo

cê. Você tem muito mais talento do que todas estas artistas

por aí.

DEUSDEHIA - Também não ó assim... Ê uma questão de estilo, Claudlonor.

0 meu é muito raro. Muito especial1

CLAUDIONOR- (PITANDO-A NOS OLHOS COM ARDOR) Adorei que você tenha voltado.

DEUSDENIA - (CONSTRANGIDA) Hi, olhe aqui, Claudlonor... Hão me constran-

ja. Acabo do chegar, Não vá mo criar encrencas. Nao me indis,

pàiúiã âôrii Eugênia* ViMôa jOgai* cal híêUO, tá? Aiôtl âú rMiai#

eu nem sei se voltei. Talvez esteja só de passagem.


BR AN,RIO TN.CPR.PTE. _LBa_r,i ■
CLAUDIONOR- (NUM SUSSURRO) Pique... Si nâ esta dormindo.

DEUSDENIA - (AFLITA, FALANDO BAIXO PARA NSO ACORDAR EUGENIA) Por favor,

NAOí Glaudionor... Eugênia está grávida. Além do mais, o que

passou, passou. Voltei muito mudada» Nao da mais pra gente

transar. Vamos esquecer o que houve entre nos. Nao vai que-

rer que eu engrosso logo no dia da minha cnegada. (3AIXIN.nO,

ENTREDENTES') Saia já do meu quarto antes que eu/íe^hcl^.sua


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IV
mulher aos gritos. le(c£m!r

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CLAUDIONOR- (TENTANDO TOCA-LA) Deusdonia, voco me enlouquecí

DEUSDENIA - Isso é delírio, Claudionor. Delírio. Você nem ao menos- me

cumprimentou o já vem nessa? Você não mudou nada. Você so

pensa nisso e em bebida, é? Saia daqui. (PAUSA) Ja souoe que

vocês vão para a África...

CLAUDIONOR- (CAINDO EM SI) Deusdonia... Eugenia não pode saber,o que a-

conteceu entre a gente.

DEUSDENIA - Nunca soube. Nem saberá, se depender do mim...

CLAUDIONOR- (SEGURANDO-A E SACUDINDO-A) Por que você me despreza tanto?

DEUSDENIA - (VIRANDO 0 ROSTO) Não sei. (MUDANDO 0 TOM) Volte para sua ca

ma, Claudionor. Ainda nao 6 meio-dia.

CLAUDIONOR- ( VAI SAINDO, MAS PÁRA) Lembro-se ca o Eugenia está grávida.

Nada de contrariá-la.

DEUSDENIA - Basta que fique na dela.

CLAUDIONOR- Sabia que você vinha passar a Páscoa conosco.

DEUSDENIA - Que remédio, não é?

(GLAUDIONOR SORRI AMARELO E SAI)

(A CENA VOLTA PARA A SALA, ONDE DEUSDETE CONTINUA REZANDO.)

mmlk » (DBêÒBUSO a ESCADA) MonaS, diflíWMi de ôade Wâ foi*® &úlro'

Será o que estou pensando?


BR AN,RIO TN.CPR.PTE 1240
.11 f
DEUSDETE - (SEM INTERROMPER A ORAÇÃO) E Lavanda Stravaganza.

EUGÊNIA - (ESTREMECE) Então, ela está de volta.

DEUSDETE - Nao sei. (CONTINUA A REZAR)

'EUGENIA - Aqui não serve pra ela. Ê uma cidade exclusivamente burocrá

tica.

DEUSDETE Estou rezando pra que ela arrume álgo pra fazer por aqui.

Quando vocês forem pra África, não cu ero f ^nha nos-

ta casa.

EUGENIA - Estou quase vomitando com este cheiro.

DEUSDETE - Sei o que você quer dizer, Eugenia, mas, fique na tua o não

vomite. Já basta a rejeição que você teve no princípio da

ggavidoz. Isto são nuvens. Pufificaçães.

EUGENIA - Abyio que era por isto que você esperava. Não ê? Que eu me fo

see para poder ficar com a Deusdenia nesta casa. Nunca escon

dou sua preferência.

DEUSDETE - Você quem o diz. Eu amo minhas duas filhas igualmente.

EUGENIA - (ENFURECIDA) Meu bebê vai nascer na ÁfricaJ

DEUSDETE - Você tem que compreender. Ela ê mais moça que você e ó artis

ta. Está tão desprotegida...

EUGENIA - Não interessa. Acho qud você mo odeia só porque fiz adminis_

tração. Nunca me perdoou eu não ter me formado em Bolas Artes

E isso já faz tanto tempo... Ainda fazíamos piqueniques, chi

dançantes. Foi na época que lançaram a alta- fidelidade. Ê-

ramos jovens.

DEUSDETE - Você pintava cada incêndio na mata...(NOSTÁLGICA) Lindosl

EUGENIA - (SÊCA) Ja faz muito tmmpo. (MUDA DE TOM) E essa biscate? Vai

fazer o que da vida? Montar nas suas costas?

DEUSDETE • Não fale assim. Ela é sua imã.


BR AN.RIOTN.CPR.PTE p. j ^

EUGENIA - (FURIOSA) Quer saber de uma coisa? Não vou deixar mais ele-

trodoméstico nenhum com a senhora. Levo tudo comigo. Bate-

deira, liquidificador, tudoj Ia deixar, mas mudei de idéia.

Vou levar até o gazozon.

DEUSDETE - Não, Eugenia. 0 gazozon não. Como é que vamos ficar sem o-

zônio? Olhe aqui, Eugenia... Não vai quebrar a paz tão ar-

duamente conseguida nesta casa. Não espan

bre-se de seu bebe. *

EUGENIA - Como é que ou posso esquecer? Acha que eu

tapes que me dá na barriga o dia inteiro?

DEUSDETE - Pois e. Voce devia estar pensando na cesariana em voz de d?

famar a sua irmãiJpoixe isso pros .vizinhos,


•t ■

EUGENIA - S. Ela já e mesmo bem conhecida por aqui. Ca. uo veiu t

traz de escândalos novamente. Será que falta algum rapaz que

Dousdenia não tenha...

DEUSDETE - ( Jâ NmRVOSA) Hí, chega, Eugenia. Não me interrompa as ora-

ções. ü tao dficll rezar em japonês. Não vá estragar o meu

dia de culto.

EUGENIA - (OLHANDO 0 RELOGIO) Está na hora de acordar o Claudionor.

(VAI SUBINDO A ESCADA)

DEUSDETE - E, vai sim. Vai que a Sociedade de Recuperação d03 Alcoóla-

tras ligou pra êlo.

EUGENIA - Domingo? A Associação nunca ligoti domingo.

DEUSDETE - Pois é. Quem 3abe o caso 6 irrecuperável.

EUGENIA - (POSSESSA) Vire essa boca pra lá. Há dias que o Claudionor

nã.o bebe uma gota de álcool.

DEUSDETE - Falando de sua pobre irmã quando você escolheu logo um dos^

pôUGós qm fovm a tiòúto Castelo. Ágopu, ura a. 0 hobS Im

mais é que sair atravessado.


10
BR AN,RIO TN.CPR.PTE O
« li
EUGENIA ~ -^scüto aqui, dona Xêpa. Meu marido 6 herói do guerraí Jamais

levante essa voz para difamá-lo, ouviu? E além do mais sou

ou quem o sustento, esta entendendo? Eu não dependo dessa

pensãozinha que papai deixou.

DEUSDETE - ÍTao martirizo a memória de seu pail ele deixou vocês dua3 l»W
tao
amparadas

EUGENIA - Ahhh, chega, sabe? Hoje vou pro Tenis Club. Aqui, o ambiente

saturou. E, outra coisa: pergunte a Deusdonia se ela é mesmo

amiga da Eva Wilma. Encare-a nos olhos e pergunte, (SAI)

DEUSDETE “ (SOZINHA) Não posso mais ter fé. Assim, não 6 possivel. Um

de cada vêz. Assim, não posso salvar o mundo. Euq uero cue

que tuao corra bem, que tudo saia bem, mas, assim, não está

dando. (GRITA) DousdSnia.' J

(DEUSDEÍÍIA DESCE. A MAE A ENCARA E PERGUNTA)

DEUSDETE . • DEusdenia... Olhe-mo nos olhos. Não minta p

Dousdenia, você conlioce mesmo a Eva Wilma? ( DEUSDEííIA NAO

RaSPONDE) Vamos, responda. Toriam sido muas cartas verdadei

ras ou sob o efeito do alguma droga?

DEUSDEÍÍIA - Eu monfci. Nao conheço a Eva Wilma. Eu mohii para a senhora.

üu não tenho amigos. No começo eu fiquei amigo do Carlos Im

perial...

DEUSDETE - (NAO QUERENDO OUVIR DE JEITO NENHUM) Chega.' Eu só tinha te

perguntado se você conhecia mesmo a Eva Wilma. Não precisa

dizer mais nada. Eu compreendo. Eu só qaero ajudar. (ABRA-

ÇA A PILHA) Vou lhe dar uns passes e você vai ficar como no

va. (PUXA UMA CADEIRA) Sento-se aqui. (ELA SENTA. DEUSDETE

LEVANTA A MAO E COMEÇA A DAR 0 JOHREI. DEPOIS DE UMA PEQUE-

NA PAUSA, PREOCUPADA) Dousdenia... Vou te fazer uma pergun-

tinha só. Não a tome por ofensa, caso soja uma mentira. Te-

2Í& àíáò Vôel Uffiâ... ôhaôhoto?

DEUSDEÍÍIA Fui.
üRAN.RIOTN.CPR.Hl t. p. //

jsijsdetL - (RECEOSA) Teria sido voc daquelas coristas ac Jrlon

Chaves quando da apresentação de "Quero Mocotó"?

DEÜSDENIA - Sim, mamão. Cantei com o Maestro Erlon. Fiz parte da Banda

Veneno.

0S2SDETE - (DESESPERADA) Dousdeniai 0 que

Ihinha?

DEÜSDENIA - Nada, mamãe. Não sobrou nada.

DEUSDETE - Sabe, pelo menos ainda tocar "Lé Lac de Come" como antiga-

mente?

DEÜSDENIA - Não, mamãe. Não canto mais ao piano. Minha voz mudou. Bebi

demais.

DEUSDETE - Bebeu demais, Doudenia. Falou demais. Se:, entregou demais.

E agora... Volta pra Deus.

DEÜSDENIA - Mamãe, eu não estou voltando pra lugar nenhpm.

DEUSDETE - Mas hei de te curar. Minha fé 6 inabalável.


*

(TERMINA 0 PASSE. AJEITAM-SE, MUDANDO DEPOSIÇÃO E TOM)

DEUSDETE , Não há de ser nada, Deusdenia, o doutor Paim vai conseguir

pra voc8 uma colocação na Globo. Escute as instruçSes: voce

tem de procurar um certo senhor Viriato no setor do prograu

mação. Ele 6 amigo do dr. Paim e manda lá dentro. Pra maior

referencia sua, o dr. Viriato é irmão da D. Inezita, não soi

so vocó .se lembra? Aquela que morava perto da gente em Cam-

pinas. Aquela que caiu do segundo andar e anda do cadeira de

rodas. Lembra? Vocé chega lá o diz que 6 filha de dona Deus-

deto Moreira, amigo de dona Inezita...

DEÜSDENIA (INfERRQMPENO-A) Não seja cretina, Mamãe. A senhora está

completamente xarope.

pEUSUETE '*« Mas a dona Ihozita,.,

DEÜSDENIA A senhora o a dona Inezita, mamãe, são duas loucas, uomo o


v:
\hN,RIO TN.CPR.PTE . p IjEla

DEUáDENI, - ... quo eu vou chegar na televisão dizendo que eu sou amiga

de dona Inezita, mamãe? Vão me dar um chute e ne jogar na \*

rua. Quem, além da senhora, conhece a d. Inezita?

DEUSDETE Oh, Dousdonia, não fale assim. D. Inezita é uma senhora tão

boa. Ela fez tantos favores pra gente... Avaliou tantos tx

tulos de seu pai. E tem mais. Te pegou no' coibo. Lembra quan

você teve catapora? Ela que furou uma por uma com aquele es

pinho de laranjeira. Te curou.

DEUSDENIA Mãezinha, por favor...Sorá que a senhora não entende? Como

6 que eu vou chegar na Globo dizendo que foi a d. Inezita

cue me mandou lá, aquela ai c furou as rainhas cataporas com

espinho do laranjeira. Tenhurpuciencia...

DEUSDETE - Você 6 muito orgulhosa, Dousdonia. Por isso que não se apru

ma. Ê preciso ser humilde.

DEUSDENIA - Ah, mamãe. Te manca. Eles que venham atráz det mim. Eles,

um dia, vão vir atraz de mim.

DEUSDETE - Ê, minha filha... Deus te muito

chateado., Ele se empenhou

DEUSDENIA - Se fôda o doutor Paim.

DEUSDETE - Quo 6 isso, Deusdenia? Não fale assim do dr. Paim. Já so es

quoceu? Do apoio que ele te deu quando você estava ccm acue

las angústias de adolescente? Ele que te apoiou na sua ado-

lecência.

DEUSDEííIA - Quem sabe não foi aquele tratamento qüo me desorientou? Cf a#

ranto que foi aquele tratamento que me deinou desorientada

pro resto da vida.

DEUSDETE - Não so engane, Deusdenia. Você devia ter lido os livros c-m

tos. Seu pai confiava muito no dr. Paim.

DmDmA * QUÔ â âêriíiôiM túkü su ôátoü iQfáú §úíâ liô, iieih, Hà(MÚ&¥

PiQa aí de viuva, se entupindo de ensinamento religiosos.

Mamãe, a religião ó o ópio do povoj


~^R AN,RIO TN.CPR.PTE ^P. ,

DEUSDETE - (PITANDO-A SERIAMENTE) DeusdeniaJ So você tiv


tivesse a metade

áos meus conhecimentos teosóficos, você não diría uma boba-

gem dessas. Eu podia te ensinar uma série de coisaasaôbre a

origem da Humanidade e do Universo. Eu li muito, Deusdenia.

Enquanto você ficava lá no quintal, amarrando pano de prato

na cabeça brincando com seus amigos, ou lia, Deusdenia. Se

você sentasse uma hora por dia comigo para mo ouvir, eu po

deria te explicar tudo. De onde a gente veiu, pra onde a gon

te vai, quem somos... Sei dar várias intor * ~ jue vá-

rias religiões dão sobre a Vida.

DEUSDENIA - (SECAMENTE) Nenhuma dolas me interessa

DaiüeDETs - (CONTINUANDO) A Teoria do Céu e do Inferno, tudo sobre a

"Planície Racional". Você alguma vez ouviu falar da Pla-

nície Raciona, Deusdenia? So tivesse ouvido, vouê já nsta

ria com a metade dos seus problemas solucionados. Já esta

Mais ligada ao espírito, Não estaria vivendo essa aberra-

çao, essa deformação. Você sabe o que quer dizer "Racional

Superior"?

nasceu do uma bicheira. Somos todos micróbio, e só. (SAI

PARA ATENDER 0 TELEFONE QUE TOCA)

DEUSDENIA - Faz-me rir..

0lt DôUêQmNíVõúÚ õüsuõü,


BRAN.RIOTN.CPR.PTE

CLAUDIONOR- Oi, Dousdenia. (AO TELEFONE) Não. Não.Eu não t -h.o qusteesa:

do de casa... Tenho casa.

DEUSDETE - (TENTANDO POR PANOS QUENTES)... Deusdenia, Eugenia vai pra

África.

DEUSDENIA (FINJINDO INTERESSE) Vão pra África?

CLAUDIONOR- (AO TELEFONE) Eu não roubei ninguém.

EUGENIA - Claro. Sabe, Deusdenia, ou sempre tivetendência à prosoeri-

dade. Nada como um país novo como a Nigéria pra gente ir se

acostumando. Depois quero ir para oCanadá, Austrália, Áfric

do Sul... Lugares ainda começando a sua história. Há sempre

possibilidade do mais dinheiro. Lombra-se quando viemos pra.

Brasilia?

mONOR- ^AOS GRITOS) Não roubei essa merda de Associação’ So não me

acreditam, chamem a Polícia.1 (BATE 0 FONE)

DEUSDETE - A Policia,não, Claudionor.

EUGENIA - (LEVANTANDO-SE AUTORITÁRIA) A Policia, sim. (BATE COM A MO

NA MESA)

DEUSDENIA - Não. A Policia não.

EuGENIA _ Por quo, cordeirinha? Alguma culpa no cartório?

DüUíjDENIA - E que eu nao gosto do modelo cios uniformes.

EUGo^IA - òempre tão sensível... este teu pânico ó de quem tem coisa

escondida.

D-üUSDETe - Deusdenia, você está escondendo alguma coisa de sua família?

DüEh.JA - Claro que não. 0 que está acontecendo com vocês?

EUGENIA - Conosco? (MUDA DE TOM) Você anda envolvida com tóxicos, não

ó, Deusdenia?

* uxü&á OUO nao. Bpai Qüo so passai Mamãe, que interrogatório

ó êsse? Quem ela pensa que ó? Corta iáj


,.w'OTN.cpr.pTe 11

D.1ÜSDETE - (CORTANDO) Claudionor.1 Na o ora hora cie abrir osovos Da Pás.

coaj

&
(CLAUDIONOR PICA MEIO ABES TALHADO COM OS OVOS NA MSQ)

DEUSDE2E . (ComUTOANDO) líão ó porque vocS sonha todas noite m boa-

bardeio quo eu vou te dar* este direito*

CL^üD^CJO-l- ... üou precisando de glicose. Tenho no desgastadomuito.

DndcDETm - (PARA DEU3DENIA) 0 Claudionor pensa que a guorra foi ontem.

Nunca pegou numa enxada. Apertar gatilho é fácil. Quero ver

é se ele passa no concurso o se apruma na Vida. (VIRA-SE PA

RA CLAUDIONOR) Soja firme, Claudionor; esquece a Guerra. Vo

ce já está pronto pra outra.

Oaruü _ Mamãe... Não 6 porque Claudionor tem a sua idade que voce

vai ter este direito dh. falar de igual pra igual. Respeite

as honrarias do meu marido.

(0 'TELEFONE TOCA. NINGUÉM ATNDE. TODOS FICAM EM SILÊNCIO


)

EUC-ENIi Aj.mal, Claudionor. Voce roubou ou .não roubou o tal dinheiro?

(CLAUDIONOR FAZ UMA CARA DE CULPADO)

EUGENIA Ja quG
^e^bou, está roubado. Não precisa se justificar. Afi
nal do contas, éles não conseguiram te recuperar mesmo...

DÊUSDETE - (PArA DEUSDENIA) Claudionor também vai empregado pra Nigéria

so passar no concurso.

(OLHAM TODAS PARA CLAUDIONOR QUE ESTÃ COM A SUA PIOR APARÊNCIA)

DEUoDENIA - Voce tem estudado pro concurso, Claudionor?

CLAUDIONOR- (BALBUCIANDO)... Não soi falar inglês.

Estou
recebendo chutes do nenén. Esto meu filho deve
ser jogador do futebol. (DA UMA RISADA)

DEuSDETE - (SORRINDO) Inda bem quoeu estou aqui. So não fosse eu e meus

fluidos, ola já teria abortado. Voc6 precisava ver como vomi


• AN,Rio TN.CPR.pte -y ^0 ló

-P-H.
DEUSDETE - ... sou nos dois primeiros meses. Ela só vomitou. Eu rezei,

rozoi. Falei: "Meu Deus] Fazei con que elanão ponha óste

feto pela garganta.”

EUGENIA Miss wakaaoto, o assunto ó sério. (VIRA-SE PARA A IRMA)

Deusdonia, vocS veiu pra ficar? Veiu esperar a voltadâo

Messias ?

DEUSDENIA - Nao sei.

2UGENIA - Não sabe? Não me leve a na]

p
ouco falou. Tem un olhar distante distraido... Está lacôni

ca. Perplexa, eu diria.

DEUSDENIA - Nã
amo adianta ne perguntar. Não há como responder. Nã
• ao sex naj
de nada. Não ne perguntem. Acho que as pessoas estso todas

loucas.

EUGENIA - Como? Eu e sua mãe, loucas?

DnuoDSNIA - Não' S'vocês duas, não. Todosl TodosJ

(DEBOCHANDO) Vôce quer me dizer que deu a louca no mundo,

nao 6? Essa história ó muito velha. Não queira esconder com

ela, essa tua inabilidade. Você tinha é que ter ido aáó o

fim do curso. Bem fiz eu que me formei em datilografia. Me

lembro bem de você, com aquelas unhas pintadas sem poder ba

ter letra nenhuma. Agora precisa de um emprego, e fica aí

bancando a artista.

““1A - (00M tol0


> ••• Bancando? Escuta aqui, Eugenia... Eu não me
orgulharia Jwai» «a ter un curso de datilografia, entendeu?

Nem do ser funcionária pública. Não estou preocupada em so-

brevivor, ou viver, ou nada*

DE VEDETE - Não briguem.» Mantenham


n a
Pa2 acima de seus ódios. Isto são
nuvens

mrtTrvTt
ora, uousdonia... VocS mal tom dinheiro pra se vestir. Ainda

parece uma hirmio


Dl . , , ,
* ‘lca f ingmao as exótica.Sera por isso
,R AN.RIO TN.CPR.PTE AiBO_p.o?o

EUGENIA ... que se despe tanto nas revistas? (SUSPENSE) Quer quo eu

mostre pra mamãe?

DEUSDENIA • (DESAFIADORA) A partir de agora, não vou esconder mais nadai

EUGENIA Não, sua metida? Vai lá então , Claudionor. Pegue aquelas re_

vistas quo tem a sua cunhada. (CLAUDIONOR TEM A DÚVIDA E 0. PÂ-

NICO TPQ
ÜítJ T» A Ti/5 PADO NO ROSTO)

DEU3DETE . (SEGURANDO DEUSDENIA PELO BRAÇO) Será verdade, Dousdenia, o

que sugere Eugenia com os olhos?

DEUSDENIA . Vai, Claudionor. Busca raosmo. Já é hora da cuíca roncar. Vou

entregar tudo.

CLAUDIONOR - (ATERRADO)Tudo?

EUGENIA (DESCONFIADA) Tudo o que?

DEUSDENIA . (OLHANDO CLAUDIONORj' ACUADO) NADA.

EUGENIA Ah, essa nãoi Agora vqi ter que explicar direitinho esta in

sinuaçao maldosa.*

DEUSDETE . • Será que vou aguentar este baque?(SENTA-SE)

(DEUSDENIA OLHA A MÂE ARRASADA E ENCARA EUGENIA SEM DIZER DMA rAL.v A)

EUGENIA Ah, ó? Mamãe, lembra-se de quando ela foi pra Londres? (OLHA

PARA DEUSDENIA, DESAFIANDO-A) Cicerono... Cicerone coisa ne

nhumaj Ela posou para revistas de pornografia. Está ouvindo,

mamãe? Pornografia!

DEUSDETE . Nãoi

DEUSDENIA . (COMPRANDO A BARRA) Olha aqui, todos vocesi Eu posei, sim.

Mais que posei, Deitei e rolei. Já experimentei de quase tu

do. (DE PEITO ERQUIDO) Eu sou a única atriz underground bra

siloira, entenderam? (PAUSA GRAVE)

DEUSDETE . Atriz o que, Deusdenia?

DEUSDENIA Pop, mamãoj Sou uma atriz po£J


BR AN,RIQ TN.CPR.PTE ^^ p iLl

SSQ3QSTB (PONDO AS MSOS NA CABEÇA) NãoJ Não.1 Não 1 Você ainda o hippie?

DEUSDENIA (COE ÓDIO) Eufui hippie. Agora sou da vanguarda.’ E, on nome

da vanguarda, ou vos ded aro HORTOSJ

EUGENIA - (DEBOCHANDO) Ai, ai í’2

DEUSDENIA -(EXALTADA, GRITANDO) Esãao mortos, sim. Você, Ciaudionor, ma

mãe, são todos defuntos. Este filho que vai nascer é um mons

troj

DEUSDETE .. Não blasfemo, Dousdenna!

(DEUSDENIA LEVANTA A MAO PARA BATER EM EUGENIA)

DEUSDETE - Deusdenia k' 'Bãt-á; numa. - mulher.:; gr avid a l--i‘ PAUSA);.."

DEUSDENIA- (RECUPERANDO-SE) ... Está bem. Afinal, não quero sujar u

minhas mãos. (VAI SAINDO)

EUGENIA (COM ÓDIO) Deusdenia... (A IRMX PARA. ENTREDENTES) 0 único

jeito de lavar as mãos é decepá-las.

(DEUSDENIA DA DE OMBROS E SOBE A ESCADA)

(EUGENIA PICA NERVOSÍSSIMA ANDANDO DE UM LADO PARA 0 OUTRO E

PANHA-A. CLAUDIONOR LIGA 0 RÁDIO E PICA OUVINDO NUM CANTO)

DEUSDETE Calma, Eugênia.’ Calma.’ Isso são nuvens.

EUGENIA - (ANDANDO DE UM LADO PARA 0 OUTRO) Você ouviu bem, mamãe. Ela

ê um câncer na família. Ela quer matar o meu bebê.’

DEUSDETE - Calma, Eugenia. Ela não sabe o que diz.

EUGENIA - E vamos deixar que uma pessoa drogada partilho da nossa mesa

DEUSDETE - Há uma saída. Deve haver uma solução.

EUGENIA - Como solução? Ela tem que se tratar antes que se torne uma

louca furiosa,

DEUSDETE - Calmai Deixe-me pensar. Minha filha Deusdenia, por que voco

não so casa e vai vor televisão bom acompanhada?


BR AN,RIO TN.CPR.PTE,

eugenia -'jü Também ela so anda cora homossexuais.. .

DEU3D2TE - Nao calunio os amigos de Deusdenia. São sensíveis corão ela.

EUGENIA - Sao 6 da mesma laia. Se eu não soubesse que se deita com cua

quer um, eu diria que 6 lésbica.’

DEUSDSTE - Chega, Eugenia. Ela ó sua irmã.

EUGENIA

NU1; CANTO) Pegue seu calção e vamos pro Tênis Clube. (SAEM

EM DIREÇÃO A ESCADA)

DEUSDETE - Não vao comer os ovos? (MORDE UM PEDACINHO DO CHOCOLATE. DÁ

SORRISO AMARELO) ... E Domingo de Páscoa.

EUGENIA - (PARADA AO PE DA ESCADA. COM DESDÉM) Páscoa? Coelho não bo-

ta ovo.' (SAI PISANDO QUENTE)

DEUSDETE ■ (SOZINHA) Cruzes.' As pessoas estão descrentes. Daí, a deca-

dência das. religiões. (LEVANTA OS BRAÇOS PARA 0 CEU) Será

que sou a última crente, poderoso Criador? (EXIBE AS MÃOS)

^u curei minha artrite só com passes.7 Minhas mãos nem se me

xiam o estavam tortas.' Hoje, posso ato tocar.' (VAI ATE A E-

LETROLA) A música apazigua até as feras. (POE Dl! DISCO. 3RA

SILEIRÍSSIMO. COMEÇA A DANÇAR, FINGINDO ALEGRIA; CLAUDIONOR

DESCE DE CALÇÃO DANÇANDO IGUAL A UM ABILOLADO. ATRÁS, VEM

EUGÊNIA SEMPRE SÉRIA, DE ÓCULOS ESCUROS, ESTEIRA, BOLSA DE

PALHA, UMA SAIDA DE BANHO DE TOALHA AMARELA. SAEM PELA PORTA

DA FRENTE. MAL 0 DISCO ACABA, VOLTAM CORRENDO.)

EUGENIA (AFLITÍSSIMA) A Polícia.'

DEUSDETE _ Esconda-se, ElaudionorJ

CLAUDIONOR- Onde?

EUGENIA Onde vamos botar um homenzarrão déstè ?

amem . (MMi õâlmj BêPÍ qm & oom võcoa mesmo?

EUGENIA - Claro.' CLAUDIOnor roubou


rt 1
BR AN,RI0TN.CPR.PTE_i_^__i2__p. ^

DEUSDETE - (OLHANDO- O COM REPROVAÇÃO) Meu genro... ALCóolatra e ladrábS

EUGENIA - Que escândaloJ Vai nos impedir o visto de salda do Brasil;

DEUSDETE - (LEVANTANDO A TOALHA DA MESA) Vai, Claudionor. Entra debaixo

da mesa. (CLAUDIONOR HESITA. MAE PROSSEGUE FALANDO) Vai, en-

tra, Barrabás. (ELE ENTRA. EUGENIA CHORAMINGA SENTADA NA ME-

SA)

DEUSDETE - (INDO ATE A JANELA) Tem certeza que ora a Policia?

EUGENIA (NUM PRANTO SÊCO) Eu não tive sorte na Vida.

DEUSDETE (AINDA NA JANELA) Era o camburão?

0 EUGENIA -Eu devia ter morrido na infância.

DEUSDETE Acho que não era a Policia não, filhihha.

EUGENIA - Só me falta um desastro.

DEUSDETE - Chega de se queixar, Eugenia. Isso ó paranóia.' Precisa pri-

meiro ter certeza de que era. mesmo a Polícia.

EUGENIA - ELE era. tão bom. Tão ajuizado. Nossos seis anos de noivado

foram exemplares. Agora... (CHORA)

# DEUSDETE - (APROXIMANDO - SE DELA) Minha filha, quer parar de lamúrias e

me escutar?

EUGENIA - (SEM OUVIR) Agora virou uma placonta. E eu casei-me perante

Deus... (CHORA)

DEUSDETE - (CONSOLANDO-A) Calma, filhinha, Quem sabe na Nigéria tem di

vórcio?

EUGENIA - o que? Divorciar-me do Claudionor? NUNCA] A senhora o odeia]

Já havia notado. (LEVANTA 0 PANO DA MESA E ABRAÇA CLAUDIONOR)

Eu te amo, Claudionor] Por mais idiota quevoce sejaí

(M'II A mU, EUGENIA SS Esc ONDE DEBAIXO DA IfiSA COM CLAUDIONOR. DEUS-

DETE VAI ABRIR A PORTA)

DEUSDETE - Quo domingo... que domingo... (ABRE A PORTA) Não se assusto,


BRAN.RlOTN.CPR.Pit
DEuoDjb * ... Eugenia. E o jornalo. ’

(EUGENIA SAI DE DEBAIXO DA MESA, AJEITANDO-SE)

DEÜSDENIA -(DESCENDO A ESCADA) O cue está acontecendo? 0 que houve? Pa-

recia una confusão...

CLAUDIONOR- (LlVIDO) A Polxcà a.T

DEüSDENIA - (APAVORADA) Como? Atraz de mim?

DEUSDETE - Não, nada disso, Dousdenia. Calma, foi um engano; Eugenia e_

quivocou-se, mas já está tudo resolvido. Vamos todos voltar

á normalidade. Isto são nuvens, purificações, aprimoramento,

DEÜSDENIA - (SENTADO-SE, AL I VE ADA EPENSATIVA) Ufa, vocês adoram uma. eno_

ção para abrir o apetite.

DEUSDETE - Já que estão todos reunidos, vou servir, então, um licor pa

ra confraternização. Vamos brindar a PáscoaJ

CLAUDIONOR- (ANIMADÍSSIMO) Isso, D. Deusdete. Deixa que eu pego. 0 de

gonipapo ou o de piqui?

DEUSDETE - Piqufli. Vamos brindar com piqui.

EUGENIA - E, tomara que sejam mesmo nuvens passageiras. Estou cansada

de tanta tensão.

DEÜSDENIA - E, também acho. Chega de bode. Vamos dar um tempo.

DEUSDETE - (CONTENTE E ORGULHOSA DE SUAS DUAS PILHAS) Assim é que eu

gosto. Como no começo. Como quando sou pai ora vivo,

CLAUDIONOR- (TRAZENDO 0 LICOR) Cá. estão os copinhos. Nada como um apori

tivo. (SERVE 0 LICOR)

DEUSDETE - Vamos celebrar, meninas. 0 REnascimento. A Ressurreição]

EUGENIA - A senhora não perde a mania, não é?

CLAUDIONOR- Tchin, tchin, meninas. (BRINDAM E BEBEMj

I
DEUSDETE - (PUXANDO ASSUNTO) Deusdenia, Eugenia conseguiu uma colocaçã.o

tão boa na Nigéria. Conta pra ela, Eugênia. Qual vai ser seu
BR AN.RIOTN.CPR.PTE. '

DEÜSDETE - ... serviço na Nigéria?

EUGENIA - Ora, eia já sabe, mamãe. Vou fazer lá a no sina coisa que xaço

aqui.

DEUSDENIA- Voce continua na seção de Arquivo?

EUGENIA - Arquivo.

CLÁUDIONOR- Meu único medo é ossa travessia. Detesto avião, favor de vo_

ar.

EUGENIA _ Larga de ser bobo, Claudionor. Todo o mundo sabe que carro

é muito mais perigoso do que avião. Pergunte a Deusdenia

corno 6 o transito no Rio.

(TODOS OLHAM PARA DEUSDENIA, ESPERANDO 0 RELATO)

DEUSDENIA - (CATEGÓRICA) Um horror.1 0; transito no Rio é um norrorí

EUGENIA - E voce, Deusdenia, o que é que está pensando fazer.'

DEUSDENIA - Estou com algumas idéias. Mamão, quem esta na diretoria So-

cial do Tênis?

DEÜSDETE - (TROCANDO UM OLHAR DESCONFIADO COM EUGENIA) Do auditório?

DEUSDENIA - E.

EUGENIA - (APREENSIVA) Por que?

DEUSDENIA - Estive pensando...

DEÜSDETE - (PREOCUPADA) Quer fazer um show lá?

DEUSDENIA - AdvihhouJ

EUGENIA - (ARREGALA OS OLHOS) Como?

DEÜSDETE - Deusdenia, por favor não vá agredir as pessoas 1 Voce prccn-

3a aprender a viver em sociedadeJ

tiíUffiSNZA « {imièm) Mo tâpapAlhâ & qMI

DEUSDENIA - Ué: Mas ou só quero montar um espetáculo no TenisJ


BKmIM.KIÜ 1 N.Ú-K.r 11 __

23 • /
EUGÊNIA (PREOCUPADA E UM POUCO AI/IEAÇADORA) Que tipo de espetáculo,

Deu3dênia?

DEUSDENIA - Não sei. (SÉRIA) Algo bem realista.

DEUSDETE (DISFARÇANDO E CAMINHANDO PARA A ESTANTE DE LIVROS) Seu pal

tinha ótimos textos de Teatro Antigo. Tragédias gregas mara

vilhosasi >

DEUSDEN IA - Não. Vou motfíiar um texto que eu mesma vou escrever. (CLIMA)

EUGENIA (AMEAÇADORA) Deusdenia, o que é que você vai escrever?

DEUSDENIA - (IMPACIENTE) Não sou nenirgsma idiotaí Parem de me tratar co-

mo se eu fosse uma ameaçai

DEUSDETE _ Desculpe-nos, íilhinhaj Você sabe que te adoro. E adoro sua

arte. Mas os outros são tão provincianos, conhece,

sabe como 6 a moi tal idade dessa gente.

DEUSDENIA - (CATEGÓRICA) Êles não conhecem a verdadeira arte. Só sabem

das coisas que veem através desta gorringonça. (OLHA COM

RAIVA PARA A TV)

EUGENIA Foi bom você ter falado. Ja ia me esquecendo do programa do


»
Silvio.

DEUSDEN IA - Você, quo se diz tão sábia, já é ma vítima deste monstroi

EUGÊNIA Não fale bobagem, Dousdenia. Televisão tambémé Cultura.

DEUSDENIA - Eu 6 quenão mo instruirei com esta joça] Vocês não deviam se

influenciar tanto por este objeto. Nada de ligar a televisão]

Vamos ter um pouco de paz hoje.

DEUSDETE - Que é isso, Deusdênia? Que modos são esses? Eu quero ver a

inauguração do canal do Silvio.

DEUSDENIA - Ah., é? PREDere o Silvio a mim? Está bom. (SAI DETERMINADA)

IUGMÍA * Eu já fcifihfl fcVlSüdõ, á mihôhd íTaé qüís Mdm&i A£m

ta
BRAN.RIOTN.CPR.PTE. p.

2k

DEuSDETE - Calma, Eugenia* Isto são nuvens. Purificaçãoes. Todo o mun-

do passa por estas fases. Ela está apenas confusa. Minha fi

lha Deusdenia foi sempre tão sensível.

EUGENIA - (ESPUMANDO) Sensível?] Ela não passa de uma...

DEuSDETE - (INTERROMPENDO) Eugenia, minha filha. A única

que não tem Deus no nome]

EUGENIA - (ESPUMA DE ÓDIO) ... (CONTÉM-SE)

DEUSDETE . (TEUÍANDO DESFAZER OS CLIMAS) Bom, cl»g« do suopenoe, chega

de sustos, chega de surpresas. Vamos ligar a televisão.

GuVll ss
'' - GRITO. AS DUAS SE ABRAÇAM, ENTREOLHAM-SE E MURMURAM)

AS DUAS - (EM CuHO) Deusdenia.1

DüuòDENIA DESCE A ESCADA COM UMA LATA DE QUEROSENE E UM FÔSFORQ NA MSG

DEUSDETE - (APREENSIVA) ... Que é, filhinha?

aíiÜGjsNIA _ Ih... Que olhar estranho. Pároco maconhada...

(CLüUDIüNOa POE A CABEÇA PARA FORA DE DEBAIXO DA MESA)

(PARADA EM FRENTE A TV) Se alguém ligar o botão deste apare"

Iho, ou ateio fogo às vestes.» Me queimo vivai Na flor da id

dado i

EUGENIA Deusdenia, larga de bancar a bonza do yê-ye-ySi

DEUSDENIA Não estou brincano. Eu boto fogo. Mesmo]

EUGENIA Quo e isso, Deusdenia? Isso tudo é recalque? Mamãe quer asa

sistir ao programa dela.

DEUSDENIA - (TAXATIVA) Não]

DEUSDETE Que situação que voco nos coloca. Logo hoje que inaugura o

*ttYí9, §l\9 vinte q qvafoç hepãs ámnUwêt 5

o tudo o quo lho falta, Dousdenia. Cultura] Voco precisa a-

pronder.
BR AN.RIOTN.CPR.P í t. .mil. p- m
25

DEUSDENIA - Não 1 Eu já sol d onais.

EUGENIA - Ih. . .

DEUSDETE - Está bem, filhinha. Eu não ligo não. lá? Nas doxxe da lado

Ssto auorosenG. (0 TELEFONE TOCA. 0JSinNS^j)

DEUSDETE - (ATENDENDO, SEMPRE DE OLHE EM • DEUSDENIA) Alô? (OuL. CDlxui

NA SALA) Ê 3ua não, Claudionor. De Fernando do Noronha.

CLAUDIONOR- (SAINDO DE DEBAIXO DA IvIESA E ATENDENDO) Mamãe l Ivlo l,ou

sendo procurado pela Policiai

DEUSDETE - Deusdênia, você está sujando o solo sagrado.

DEUSDENIA - Se alguém encostar a não neste aparelho... (AMEAÇA COn OS

FOROS)

DEUSDETE - Quer se natar por causa de una Telefunkon? isso ja e anonalj.a.

EUGENIA - Agora que a senhora nota? Ela sempre foi insana.

CLAUDIONOR-(AO TELEFONE) Coragem? Como posso ter coragem? Eu não çu ero

ser proso. Tenho pavor das prisões. Eu tenho paura de presi

dios. E, além do mais, já fui soldado.A senhora não sabo me

tado dos horrores da guerra.

EUGENIA - (ARRANCANDO-LHE FURIOSAMENTE 0 TELEFONE DAS M&OS) Dona NoS-

nia.. • Não ó nada, não. Claudionor se enoci ona muiuo na Pas_

coa. Quando chogarnos á Nigéria, elo vai ter que parar do

beber. (MUDA DE TOM) Aqui, tudo bem. (OLHA PARA DEUSDENIA)

Tudo bom. Neste exato momento, estamos todos reunidos aqui

na sala, esperando a inauguração do canal do Silvio. (OUVE)

Vocos também? Fernando de Noronha inteira? Pois e... (OLEL»

PARA DEUSDENIA, PROVOCANDO) Isto é roncer na Vida, do

na Noemi a J Feliz P ás c o a& (C LÂUDI ONO R QUER FALAR; EUGENIA NXQ

DEIXA) Claudionor manda um abraço. Até logo. (DEL3LIGA) _3em,

vamos assistir ao Silvio Santos? (DEUSDENIA N&0 SE í.kiXEjSx^

FfS 2RQMTA A ATSAR FüõO Âã WW LÁ 9£ <3290 Peus»

dônia, decida—sc. O Brasil inteiro esta esperando.


BRAN.RIOTN.CPR.PTE - ü2!ío* n
QEU3QSNIA - Não. Não. Eu não quero.

EUGENIA - Cono não quer-? Você não quer? Mas são cento e vinte

querendo.

DEUSDENIA - Se ligarem o receptor, eu me mato.

EUGENIA - Ta, Deusdonia. Mate-se. Mas, no quintal. Vá brincar do guer

rilheira no quintal. (LIGA 0 APARELHO)

DEUSDENIA TENTA RISCAR 0 FÓSFORO, MAS ABRE-SE EM PRANTOS. A MAE ABRAÇA-

A. EUGENIA E 0 MARIDO COM AR TRIUNFANTE SENTAM-SE PARA VER TELEVISÃO;

DEUSDETE - Vem, filhihha. Você está nervosa. Vou lhe dar um cono de ág

gua com açúcar e uns passes magnéticos.

(DEUSDETE E DEUSDENIA SOBEM Â ESCADA S DESAPARECEM. FICAM OS DOIS, EÜGE

NIA E CLAUDIONOR ASSISTINDO A TELEVISÃO; DEUSDETE VOLTA EM SEGUIDA)

DüUSDETE - Tudo bem. Foi só lhe dar um passe que adormeceu.(SENTA-SE

NA CADEIRA DO PAPAI. EUGENIA E CLAUDIONOR NÃO DESVIAM OS 0-

LHOS DA TV) As pessoas precisam ter fé. Eu também era assim,

no 3entia sozinha, desamparada. Um dia me levaram a um cen-

tro espirita e do lá pra cá, foi una escalada. Era uma res-

mungona. So vendo. Agora, quero mais é evoluir na conscione

cia cósmica. Qualquer religião serve. A crença está em no.

Vocês já leram "Universo em Desencanto"? (NINGUÉM RESPONDE)

Não??? Pois o Procépio Ferreira é adepto fervoroso. Já a Dar

Iene proferiu ser presbiteriana. Para tudo se tom uma respo£

ta. A gente nunca deve desanimar.

EUGENIA - Chega, mamãe. Não fomos & missa sé para nãooauvir o sermão.

DEUSDETE - (LEVANTANDO-SE DE SOPETÃO) Nossa.' Que gonte esquentada.' Bom

já é hora mesmo de arrumar o jantar. Daqui há pouco, vou a

cordar Deusdonia. Há quatro horas, quo e3se programa começou.

Hoje tenho surpresas para vocês. Surpresas esotéricas, é cia

ro. Sempre novidades espirituais, (SAI SQISNEMENIE)

EUGENIA - (LEVANTA-SE E VAI AO TELEFONE) Alo? Dr. Paim? Como vai? Ê Eu

Gênia Badia. Dr. Paim, estamos precisando dos seus serviços


-ía/-MM.rtiO TN.CPR.PTE A3.UO
). 3o

.JGENIA „ ... com urgência. Ac.xO que Dousdonia, minha irma, enlouque-

ceu. Como o senhor sempre nos assessorou emocionalçiente, re_

solvi tolofonar desejando Polis Páscoa o convidá-lo a comer

uns ovos conosco. Assim, aproveita, o examina Dousdonia;, Não

quero quo o meu bebe corra risco. Muito obrigada, Dr. Paim,

Eu o minha mãe, em nome do ráeu uai, estamos agradecidas.

DEUSDETS - (ENTRANDO 'COM UM PRATO FRIO: UMA GRANDE MAIONESE SM FORMA DE

PEIXE) Maionese de peixeJ Tudo nesta casa tem significado.

(COLOCA 0 PRATO EM CEM DA MESA)

EUGENIA - (APROXIMANDO-SE) Convidei o Dr. Paim pra dar uma passada a-

qui.

/
DEUSDETS - Como? Não temos ninguém doente.

EUGENIA

da casa.

DSUSDETD - (COM RAIVA) Deusdenia está só nervosa. Ela veiu de uma me_

trópolo, entendeu? Uma metrópole. Olho aqui, Eugenia, eu

vou curar sua irmã com passes magnéticos. Eu vou cura-la

com fó. Não precisamos do módico. Telefona já pro Dr. Paim

o desmarca.

EUGENIA - Você devia ficar do meu lado. Eu vou lhe dar um neto. Deus-

denia só lhe dá dissaboros.

DEUSDETE - Chega, Eugênia. Hoje ó dia de reza. Vai comer chocolate.

EUGENIA - Mamãe, a senhora os tá pondo o meu bebo em perigo. Quando eu

for pra Nigéria, não vou escrever uma única carta. Não sabe_

rá notícias minhas. Vou sumir do mapa. Nunca verá o seu ne-

to. NuncaJ

DEUSDETE - Assim, nãio dá. Sai, Eugenia. Vá chamar sua irmã para jantar.

EUGENIA - Eu, heim? Não quero mais olhar-lhe as fuças.

DjbÜàDlÜTÈ - (ÁO ) Dr. Píiím? á Dousdôto. Como vai? Eli çüdpíL,

no boa cristã cue sou, antes de qualquer outra, crença, dese_

jar-lhe Feliz Páscoa. (OUVE) Dr. Paim? Gostaria, de ao.i^.r o


ERÁN.RIO TN.CPR.PTE 1 I P-

DEUSDETE - ... nosso encontro pr amahláã, e pedir, de antemão, mais

duas receitas do Gardenal 0,50 pro meu genro, por . » .

Claudionor Aristides Penha. Obrigado, doutor.Até amanhã.

EUGENIA - (FURIOSA) 0 Claudionor ainda tem uma caixa inteira de Gar-

denal, dona Diabete.

DEUSDETE - Não faz mal. (OLHA CD M IRONIA) Atriz de uma, vem outra. A-

final de contas, é um medicamento que ele vai tomar pra sem

pre.

EUGENIA - Meu marido é herói de guerra e não um neurótico qualquer.

DEUSDETE - Ah... Eugenia, já enchi. Não no tire a tranquilidade. (SOBE

A ESCADA. jBÁRA NO MEIO) 0 jantar será servido dentro de meie

hora. Vou me vestir. Tenho surpresas. Sempre novidades espi_

rituais. Sempre um degrau a mais na escalada cósmica.

EUGENIA - (DESLIGANDO A TV, ACORDA CLAUDI0N0R QUE RONCA) Ljj i, Clau

dionor. A gueroba tá pronta.

CLAUDIONOR- To cuma fome do jegue. Que horas são?

EUGÊNIA - Não sei. 0 único relógio quetenos parou no meio-dia, há dias,

(iSBáTA-SE NA MESA) Por que será que parou na hora do almoço?

CLAUDIONOR- CbaJ Maioneseí (E M*ETE A MRO NO PRATO)

EUGENIA - Tira a mão, Claudionor. Não fique imitando anúncios de pro-

paganda.’

(DEUSDENIA DESCE A ESCADA, LENTA E APÁTICA. SENTA-SE A MESA SEM »OLHAR

EUGENIA E CLAUDIONOR)

EUGENIA - (FALANDO COM CLAUDIONOR COMO SE DEUSDENIA NÃO ESTIVESSE ALI)

Eu vou adorar a Nigéria, Claudionor. Vocô viu no folheto,

qual é a maior riauesa da Nigéria? Nascemos eom boa estrela.,

não é, Claudionor? Agora, se voce tem preconceito, quo fique

84UÍf lá só Ura

CLAUDIONOR- Eu li os folhetos
JR AN.RIO TN.CPR.PTE Í2UO p.3JL

EUGENIA - Pois o. Era. compensação, voco vai poder comprai w.i auto novel

estranjeiro sea taxas do importação. (AI) .astou louca pra

vor com o seu calção, nadando no Rio Rigor. Quero tirar una
i .
í“oto sua junto cora os hipopotamos •

CurL
( DESCE DEUS DE NUM MODÊLO DE GOLA MEIO AC HINESADA- ESPACIAL, —

SÓBRIA. TODOS PASMAM; ,ELA VEM ATÊ A CABECEIRA DA MESA E SENTA-SE COM AR

SOLENE)

DEUSDETE - Crianças... Hoje não é ura dia qualquer. 2 um domingo muito

especial. Eugenia, Deusdenia, Claudionor, ou vou lhes falar

sobre os Atlantes. (PAUSA GRAVE)

EUGENIA - Mais uma, mamão?

èsde quo eles so


DEUSDETE - 0 mundo passou uma fase de ignoranci
/
//<> \;
foram.

EUGENIA - ÊLEs quem, mamãe?

DEUSDETE - Os: áúlcurtes? Eugenia.

EUGENIA — Quem sao? Alguma família ii^inha*

DEUSDETE - Não deboche, Eugenia. Pra conversar comigo, ©ocS tinha que

ter lido, pelo menos, "Eram os Deuses Astronautas" de (BAI-

XINHO) Eric von Dunken.. . (PALA BAIXINHO PORQUE PRONUNCIA

MAL OU MO SABE BEM 0 NOME DO AUTOR)

EUGENIA - Mamãe, siuva o jantar. Claudionor já está com una cara de oo

bo, de tanta fome.

(DEUSDENIA CONTINUA CALADA, DE OLHOS BAIXOS, AUSENTE)

DEUSDETE - (LEVANTANDO-SE AFLITA, PAZ SINAL COM AS MÍÍOS COMO o* ESTIVE^

SE OUVINDO ALGUMA COISA) Calem-se 1 Calem-so. Um objeto nao-

idontifiçado acaba de passar em cima do teto quo nos abr-i.*;

ga. (RESPIRA FUNDO COMO ‘SE ESTIVESSE MEIO EM TRHN3E) Sen-

tí 2 üfâ? SúiltÍPíM tt pâüuNNeiíi áft /

EUGENIA (COM AS MOS NA CABEÇA) Com tantas mãos no mundo, eu tinha

sor filha de Deusdete Petrovna Blavatsky.


:''í,RIO TN.CPR.PTE i^AO_p. 33
« 50

DEUSDETE - (MAIS UMA VEZ, CORTADA, CÉDE) Bem, já que não estou agradan

do corão oradora, não insistirei. Pior cego é aquele que não

quer ver. Foliz Pascoa 197o» Podem se servir. Deusdenia, dç_

me seu prato que vou to servir de maionese. (COMEM EM 3ILÊN

CIO. DEUSDETE PUXANDO ASSUNTO) Hoje, vou administrar-lhes •

uns passes magnéticos para que tenham sucesso nas suas empre"

tadas.

EUGENIA - Eu não dependo do sucesso nas minhas empreitadas. Não é,

Claudionor?

CLAUDIQNOR- Só penso no Rio Niger, Eugenia. Estou louco para mergulhar

no Rio Niger.

EUGENIA - E vocô vai. Vai mergulhar no Rio Niger, na África. Longe de

qualquer aborrecimento. Eu, voce o meu filho não precisamos

de tantas orações.

DEUSDETE - Mas a África é tão longe...

EUGENIA - E longe, sim. Graças a Deus.

DEUSDETE - Não vão esquecer do levar os medicamentos do Claudionor. Lá

a negrada não toma essas coisas.

ü.UGEnlA - A senhora está me fazendo mal com esse descarado favoritismo,

(OLHA DE SOSLAIO PARA DEUSDENIA) Deixe estar. Quero mais 6

ter minha vida. A vida que eu escolhi»Casada com o „ auo

■&u escolhi. (ENCARA A MAE) Vai mo dizer que não fui eu que es_

colheu o Claudionor? Na Nigéria, quero esquecei'* que existe fa

milia. Não me avisem nunca da morte de um parente. Eu vou fa-

zer a MINHA família. Nos meus moldes. Com os MEUS padrões.

DEUSDETE - n... Isso e a Vida em seus caminhos paralelos.

(DEUSDENIA LEVANTA-SE COM ÓDIO E COSPE NO PRÓPRIO PRATO)

DEUSDETE - Deusdeniaí Cuspindo no prato que comeu?

DMWDÈMIÂ - Gttspõ, sirrí. Cuspo que eu tenho nojo. (OLHA PRA 'IODOS) Nojo

de tudo
\iQ TN.CPR.PTE oL^AO „
p. 3Upi

DEUSDETE - (LEVANTANDO-SE) Tudo, Deusdenia?

EUGENIA (LEVAN TANDO - SE) Tudo? Você, então, tem nojo do comidas e he

bês! Logo, você o pior do quo umà assassinai Mamãe,

Dr. Palm. Dousdenia o uma assassinai

DEUSDENIA - (ENCARANDO EUGENIA COM ÔDIO) Trombolhai Vocô p una

lha, Eugenia.

DEUSDETE - (TENTANO PÔR PANOS QUENTES) Calma, minhas f filhas. Vamos to-

mar os passes, já. Pazer pensamento positivo. Isto são nu-

vens. Purificações.

(DEUSDENIA ENCHE A MAO DE MAIONESE E JOGANA CARA DE CLAUDIONOR. SAI AL

TIVAMENTE)

EUGENIA (DESC A3ELAND0 - SE, GRITA) Chama o PaimI Chama o PaimJ (VIRA-

SS PARA A MAE) Está vendo? Está vendo, sua louca? Ela enlou

quoceu de vêz. Lsmbusou a cara do meu maridoI Patrimônio da

Nação. Claudionor, como é que você deixou ela te fazer isso?.

(CL AÜDIONOR, MORTO DE VERGONHA, TIRA A SALADA DA CARA)

EUGENIA Bolha,1 Voco é um bolha, Claudionor . Vai! Agora, salva a tua

honra. Seja homem só mais uma vez depois que os seus vicios

te inutilizaram! (PEGA UMA FACA DE COZINHA, ENORME E ENTRE—

GA PARA CLAUDIONOR) Sobo. Vai atrá,s dela e acabe com isso de

uma vêz per todas.

DEUSDETE - Não. Nunca! Um assassinato na minha frente? Nunca!Claudionor,

1 argue essa faca! Matar 6 coisa de sub-raça.

EUGENIA (ESTUFANDO OS PEITOS) Se é pra partir pra dogenoração, vamos

com toda! Vai, Claudionor, seja homem! Não dê ouvidos a D.

Deusdoto. Suba o mate Deusdonia.

DEUSDETE - (PONDO-SE NA FRENTE) Nunca! Não o atordoe com seus poderes

negativos, Eugenia! Ele terá de passar em cima do meu cadáver

EUGENIA A sonhora sabo quo está protogondo a própria subVófsuü nó úúa

lar? Devia ser a primeira a denuncia-la, dando exemplo as ou

tras mães.
BR AN,RIO TN.CPR.PTE iaMo_p3ç

DEUSDETE . Nunca denunciaria nem você nem ela.

EUGENIA A senhora oséá expondo om risco a vida de seu neto,meu bobe

DEUSDETE . Ela não vai fazer mal a ninguém. Deusdenia não ó má. Ela só

tem o defeito de iludir-se, às vezes. £ normal na idade dei

EUGENIA . Idade dela... A senhor acha qaeela tem que idade?

DEUSDETE . Chega, Eugenia.’

EUGErí IA Nunca] A vingança não pode deter o meu caminho. Vai, Cláudio

nor] Suba e mato Deusdenia] Lembre-se de que você ê um guer-

reiro]

DEUSDETE . Claudionor, seu idiota] Largue oue voce vai aca-

bar se cortando. Você nem ao menos sabe empunhá-la. E , o-

lhe aqui, Eugenia: Deusden:ia tom, pelo menos, a qualidade

do ser curiosa. Voce devia respeitar]

EUGENIA Respeitar? Ela é uma terrorista] Temos uma terrorista nos

rondando. Ela não tem nenhuma virtude. Se anda com pederas-

ta, drogada, lésbica o comunista] Ao fogo com ela] Vai,Clau

dionor. Sobe. (CLAUDIONOR DESTA A CHORAR)

CLÁUDIO NOR. Não aguento mais] Quero ir-me embora] Deixem-me ir pra Tor-

nando do Noronha. Eu qxoro ir embora] (CHORA)

DEUSDETE . Pronto. Olha sò o trapo que ficou o seu Lancelot.

EUGENIA . Tome seus remédio, Claudionor. Cuide-se que vou chamar o Di

Paim.

DEUSDETE ■ Se você encostar nesse telefone, Eu genia Badia, eu vou

lhe dar uma surra]

EUGENIA Ah, é? Então, venha] Desça, do seu altar, e venha] (PEGA 0

TELEFONE)

(DEUSDETE VAI LA, DESLIGA E DA UNS TAPAS DE MAE NO BRAÇO DE EUGENIA)

EUGENIA Eu própria vou ajustar essa conta. (VAI EM DIREÇÃO Ã ESCADA,

VERMELHA DE FÚRIA. PARA, SENTINDO CÓLICAS) ... Mamão, estou


BRAN.RIOTN.CPR.PTE ' - f. % 53

EUGENIA - . ..sentiddo 0 nene querei sair.

DEUSDETE - Pela guela, filhinha?

EUGENIA - Claro que naoSASodeJ Chama a ambulância.’ Vou ter o filhoí

DEUSDETE _ Oito meses, meu Deusi Mais um retarddádo]

EUGENIA - Chamo a ambulânci.’

DEUSDETE - Vai, Claudionor. Liga pro Pronto-Socorro.’ (DEITA EUGENIA NO

SOPA) Deite-3e aqui, minha filha. Não faça movimento. Calma.

Tudo vai dar certo. Depressa, Claudionor]

CLAUDIONOR- (AO TELEFONE) Maternidade S. Judas Tadeu? Mande uma ambulân

cia pra rua Itajubà 59* Depressa] Depressa.’ Vou ser pai.’

EUGENIA - Larga de frescura] Dê logo o endereço e apresso a ambulância]

CLAUDIONOR- Depressa, ambulânci.’ DEpressa]

(DEUSDENIA PÁSSA POR ELES, INDIFERENTE)

DEUSDETE - Vem, Deusdonia. Ajude aqui. Sua 1: vai dar a lua.

DEUSDENIA - Sinto não partilhar dessa alegria. (VAI EM DIREÇÃO A COZINHA)

EUGENIA - Ela não se comove nem nas horas atrozes.

DEUSDETE - Calma, Eugenia. Tenha pensamentos positivos. Não vã atrapa-

lhar o parto. De a luz ao invés de dar as trovas.

EUGENIA - Pois chega do trovas. Chega] Chega] Claudionor] Arrumo as nos_

sas malas. Vamos direto do hospital para a Nigéria] (SIRENE

DE AMBULÂNCIA. CLAUDIONOR FAZ SINAL DE QUE A AMBULÂNCIA ES TA

CHEGANDO. EUGENIA FAIA PARA A MAE) Você não verá nosso fil

Iho. Ninguém,nessa família, verá.

DEUSDETE - Larga de ser ruim, Eugenia.

(EUGENIA 32 ARRASTA*, AMPARADA POR CLAUDIONOR E DEUSDETE, SM DIREÇÃO A POR

TA)

EUGENIA - Adeus, mamãe. Mando-lhe uma foto nossa, do nosso filho e da

África
SRAN.RI0TN.CPR.PTE WÍS—* 3^
54

DEUSDETE - (ALTIVA) Eugenia... Vocô podo registrar esse menino na Ni-

géria. Mas não adâantará nààa. Deus é bradileiroj

(SAEM TODffiS. A SALA PICA SOZINHA. DEUSDENIA VOLTA E COLOCA UM ROCK ALTÍS

SIMOj DANÇA LOUCAMENTE; DEUSDETE ENTRA E DESLIGA A VITROLA)

DEUSDETE - Respeito, Deusdenia, respeito.’ De uma vês por todas. Haverá

alguma mensagem construtiva por detrás desse teu temperamen

to rebelde? (DEUSDENIA NÃO RESPONDE) Sim, porquojá é hora de

construir. Não pense que a juvnetude 6 eterna. Um dia, você

encontrará numa encruzilhada, vai procurar por LeftfipíaD-não em

contrará porque estará muito longodele.


V>\

DEUSDENIA - Mamãe, pare de ficar me empurrando Deus. Z$r

DEUSDETE - Eu não vou insistir. Quero sósaber de você se haverá algum

rumo na sua vida. Quais são seus planos para o futuro?

DEUSDENIA - Que futuro, mamãe?

DEUSDETE - 0 seu, Deusdenia. Não quero que voce vá dar com os burros

nSágua.

DEUSDENIA - Quero minha herança, mamão. Não terei como sobreviver só com

meu talento. Não dei certo na carreira. De-me minha parto da

herança do pap.ai.

DEUSDETE - Você tentou mesmo, Deusdenia? Acha que lutou o bastante para

ver o seu nome nos cartazes?

DEUSDENIA - Sim. Tenho direito à herança. Me esforcei. Fiz tudo para a-

parecer.

DEUSDETE - Rezo, minha filha. Reze.

DEUSDENIA - NãoJ

DEUSDETE - Não? Você não acredita em nada, Deusdenia?

DEUSDENIA - Sim, mamãe, No dinheiro, Dê-me s herançaI

DEUSDETE - Ora, no dinheiro, todos acreditamos. Você não crê no Invisj.

vel? Você, uma vêz, me falou ouo a gente tinha do voltar pa


(140 h
BRAN.RIOTN.CPR.Plc. p-

DEUSDETE • ...-ra a Natureza, Voce vo^uou, Deusdenia? E aquela comunidade?

DEUSDENIA - Não deu certo.

DEUSDETE Voce ó contra a Cultura. Contra a Eanília. Contra a Helifüiãao

Que ê que voce pensa fazor fora disso?

DEUSDENIA Montar um cine-clube.

DEUSDETE Como?

DEUSDENIA -•Um cinema.

DEUSDETE (ASSUSTADA) Um cinema aqui em casa?

DEUSDENIA Um cinema pequeno. Só para sócios. Quando recebo minha heran

ça? Quero um cinema onde se exibirá os grandes filme quenão

foram sucesso. Os primeiros filmes de Brian de Palma...

DEUSDETE Deusdenia... Não aceite seu fracasso tão cedo.

DEUSDENIA ?ra mim, o mundo acabou. Não quero mais saber de nada. Vou

abrir uçaa cinemateca.

DEUSDETE Nada de desespero. Os Atlantes vão voltar.

DEUSDENIA 2lo3 quep aguem ingresso. Ninguém vai entrar de gr açaí

DEUSDETE As desgraças vão acabar.

DEUSDENIA, Mamãe, estou cansada. Não tente me converter mais,por favor.

DEUSDEEE - Tá, Deusdenia. Acho que ó hora mesmo de cada uma de nós se-

guir o seu destino. Eu já tenho o meu. (CALA-SE SOLENEMENTE)

DEUSDENIA - Eu, não. Sou a famosa "SEM Destino".


*

DEUSDETE - ( REVELADORA) Minha filha, ou vou para AKARTJ

DEUSDENIA - Akart?

DEUSDETE - Ê um planeta que está arrebanhando pessoas evoluídas para u-

m êQiWQíêmíã maí&p, Rqq&'qZ vteas mnsagm§ 4o

Dan-ól diretamente da nave-mãe. Achei que minha missão ainda

não tinha terminddo aqui na Torra. Agora,acho que posso ir.


BR AN,RIO TN.CPR.PTE

DEUSDENIA Vai pra Marte, dona Dousdoto?

DEUSDETE Vou. Mou caminho o a fé, Vou já arrumar as malas. Nífides, to-

lefonaroi para o Hospital. Quero saber .se o bebe do Eugenia

já nasceu.

DEUSDENIA (DEBOCHANDO) Que abnegação... Que sublime renúncia... Mamãe,

a senhora, 'antes de ir, poderia revelar-me o segredo de Fá-

tima? (VAI ANDANDO PARA A ESCADA. PÁRA, VIRA E FALA) Juro

que não espalho. (SOBE A ESCADA)

DEUSDETE (ENGOLE SÊCO. SOZINHA) Ê tão tarde na Vida quando começamos

a nos acostumar com o Inesperado. (SENTA-SE CONCENTRADA) Pr a,

ciso mentalizar a nave-mãe. ( DE OLHOS FECHADOS)... Comandar

tè Dan-él? Comandante Dan-él& Deusdeto Moreira quer entrar

em contacto. Comandante Dan-ál... (0 TELEFONE TOCA. ELA ATu_

DE) Alô? Solsr dos Moreira. Fala a mãe, Deusdeto. Está. sim.

Um minuto. (GRITA) DeusdeniaJ â pra vocei

DEUSDENlA (DESCENDO A ESCADA NUM R03S ESCANDALOSO) AlC? Oi.' Como 6 que

vocô soube que eu estava na cidade? Sentiu meu cheiro? Estra

vaganza. EstravaganzaJ Boite? Claro que adoro.’ Tá. Passo

mosmo. ( DESLIGA) Mamão, a senhora queria sabor deu futuro?

Pois ó. Vou à boite com Ronaldo. Lembra do Ronaldo? Aquele

antigo flirt?

DEUSDETE Deusdonia, não atrapalhe minha concentração. í! um problema

de esferas.

DEUSDENIA Vou mo vestir. (SAI CANTANDO) Ale-luiaJ Ale-luia...

DEUSDETE (PEGANDO 0 TELEFONE) Alô? Maternidade S. Judas Tadeu? Quero

falar para o quarto de Eugenia Badia Ponha. (OUVE COM CARA

DE ESPANTO) Como? Quóntuplos? (COM OS OLHOS ESBUGALHADOS)

CINCO meninas? Não, não, não. Obrigada. Eu chamo depois.

$DESLIGA E FEVHA OS OLHOS) Comandante Dan-él... Comandante

Paa«él? dêUãâ&U Movaiim, aíHüâ, quos» entes* m

DEUSDENIA (DESCENDO DE SAIA CURTA) Como já dizia Caymi: Andei por andar,
BKAN.RI0TN.CPR.PTE
>• Uo
DEUSDENIA - andei e todo o caminho dou no mar...

DEüSDETE - (SAINDO DO TRANSE, ASSUSTADA) Está-falando a propósito do

suas meias arrastão? Onde vocêpensa que vaicom essa raini-

saia escandalosa?

DEUSDENIA - Alto lái Sou uma mulher livro. Não tente privar-me da Libor

d adel Não azucrino minha sede de viveri

DEÜSDETE - Sua irmã acaba de ter quintuplas e voce já vai pro freje?

DEUSDENIA - Cinco meninas?... Minha Irmã Eugênia multiplicou-se mesmoJ

DEÜSDETE - Eu já tracei meu rumo. Não posso voltar atráz só pra cuidar

das filhas deEugonia. Nem se ela mo pedisse do joelhos. Toma

ra que não o faça. Você sabe que eu não resisto a um pedido

de perdão. Deusdonia, ponha uma saia mais recatada. Não que

eu queira te proibir, absolutamente. Ê queeu acho que voce

vai se resfriar com essas coxas do fora. E depois, pra que

ostentar tanto essa liberdade?

DEUSDENIA - Ora, mamãe. Vou a uma festa, numa boite. A senhora sabe o

que e isso? S.

DEÜSDETE Claro aue sei.

DEUSDENIA Imaginei A senhora é de muito antes da luz negra. Que dirá

da estroboscópica. Fico até com medo que conheça o rock and

roll e a luz estrobosóppica.

DEÜSDETE - Deusdonia, veja a nossa diferença. Não me falte com o res-

peito. Nada de choques de gerações a essa altura. Sou uma

mulher instruída e crente. Você sabe disso. Já viu meus di-

plomas ro3a-cruz. Escuto aqui, Deusdonia, eu ainda vou 3er

da Fratornidade-branca. Eu vou passar do Tibet. Porque estou

indo para AkartJ

DEUSDENIA - (PEGANDO A BOLSA E A ESTO LA) Está bom, mamãe. Se a nave-mao

ví®*, pó* íávòi1, d&íxo as oliáVús A6 ôd»tóí*o« VoiLtavfil

madrugada. Tchau. (SAI PORQUE BUZINAM)

I
dkmN.RIO TN.CPR.PTE.
>>0

- Adouo, filhinhaj Puja sompro das forças do MalJ

(DEUSDENIA DÁ UMA RISADA E BATE A PORTA)

DEUSDETE
(S0Zl3HA) B
‘ “>”' *•» »«WP» *»*no os dias são alegres. NSo
porque g um a. orlado quo tudo tem quo correr bem. (VAI ATÊ

A MESA) Os desejos aprisionam. Só a Renúncia resolvo a Via^

(TIRA 0 MEDALHHO DO PESCOÇO, OS BRINCOS E OS BRACELETESE POE

EH CIMA DA MESA) Só a abnegação total nos levará à Iluminação

(TIRA A PERUCA E POE EM CIMA DA MESA) Nada poderá no prender

a um só plano, enquanto eu sei que são mais de mil. (tira

AA CALÇA COMPRIDA) Eu quero a Sabedoria Transcendental. (EN-

TRANDO EM TRANSE. IRROMPE A ALELUIA DE HAENDEL) A ONIPRESENÇA

(LEVANTA OS BRAÇOS PRA CHIA. LUZES PISCAM.) Comandante Dan-

ól, Navo-mãe de AKART, 7. Lua de Juptor, Dousdete Moreira

está entrando em contactoí

(ACORDES FUJAIS. LUZ APOTEÓTICA)

FBI
bran.riotn.cpr.pte ÜM)—p. í\ íl
1

" A DESDITA DE DEUSPENIA»

DEUSDETE £ (ABRINDO A PORTA DA

no cometo bom sutil; agora há uns dois dias tão Torto..

Sorá que são ossa3 azalêas? (CHEIRA AS AZALÊAS) :

não são as azaleas, muito menos os guardanapos. (CHEIRA

OS GUARDANAPOS. PROSSEGUE ARRUMANDO A MESA) Vo.u por os

ovos bem no centro, assim... bom colorido, as coros da a

logria. (EUFÓRICA) Viva a Páscoaí (SENTE DE NOVO 0 ESTRA

NHQ CHEIRO)... 6 um perfume, uma f ragrância... será


sera que
cue
o meu estado de graça que me sintoniza neste cheiro? (AS

PIRA PROFUNDAMENTE) ... que nome teria aquela lavanda quo

Dousdênia usava?... Lo lac de Gomo? Não, não, não, isto

ora a música que ela tocava. Minha filha, Dousdênia, tão

talentosa, tudo que ela tocava so impregnava do perfumo,

a casa, as roupas tinham o cheiro de seu perfumo prodile

to. (PENSATIVA) Qual ora mesmo ?

(SURGE DEUSDENIA NA PORTA DA FRENTE, COM MALAS,USANDO UM MODELO ES-

CANDALOSAMENTE JOVEM)

DEUSDENIA- ... òtravaganzaj Lavanda do almiscar selvagem. (SOLTA AS

MALAS)

do em você. Achei mesmo que você viesse passar a semana


BR AN,RIO TN.CPR.PTE p ’ ; -A

DEUSDETE Santa conosco. (QUESTIONAM-SE COM 03 OLHOS) Mas depois,

DEUSDÊNIA - v,SECAMENTE) Quo filmagens, mamãe?

DEUSDETE - Não sei. Voce me falou de um filmo... Que filmo, meu Deus?

Apele baseado em Machado de Assis. Ou seria uma peça? (APLI

TA) Era uma noca?

DEUSDENIA - (SECA) Nem um nem outro. Não passei nos testes. (PAUSA GRAVE)

DEUSDETE - (RESIGNADA) Outra vez, minha filha. Está bem. Entre, Dous-

donia. Feliz Páscoa.

(DEUSDENIA PEGA AS MALAS E ENTRA; BEIJAM-SE)

t
DEUSDETE . - Sente-se pro café. Deve estar com fome.

DEUSDENIA . . (SENTANDO-SE) Não estou com muita fome. Comi duraite a viagem

DEUSDETE . ■ Veiu de trem? Pe^ou o Vera Cruz?

DEUSDENIA . ■ Foi. Não preguei o olho.

DEUSDETE . ■ Leito?

DEUSDENIA - Poltrona.

DEUSDETE - Cheio?

DEUSDENIA - Vazio.

DEUSDETE - ... Vazio? (OLHA PARA 0 VAZIO)

DEUSDENIA - Mamão, quo cara é essa?

DEUSDETE - Pressentimento, Deusdenia. Nao botaram o jornal na porta. Um

trem vazio... Deusdenia, por que é que vocô não abandona o

cinema? (DEUSDENIA VIRA 0 ROSTO) Voce tentou televisão, pelo

WfiQê? Eu aSo sei g que lhe diser, Já res§4 tefe© pra te ver

nas tolas... Quantas fotonovelas eu já abri para te ver e hao


oo encontrei. Não ô falta de torcida, não. Eu vivo rezando.
BRAN.RIOTN.CPR.PTE _p. HMr,

DEUSDETE - ...Já to doi "Construir/) o Homem e o Mundo", "Gotas do Oti-

mismo, "0 Poder do Pensamento Positivo", "O Despertar dos

Mágicos" e não adiantou nada, Dousdenia. Você nem leu. 0 que

se passa?

DEUSDENIA - Não sei, mãozinha. Algo se passa. Sempre que acho que estou

alcançando, (PAZ UM GESTO DE PEGAR ALGO NO AR) foge-me das

mãos. (OLHA PARA 0 INFINITO) A Felicidade ó como a água.

DEUSDETE - Mas você quer ó a felicidade da ribalta. Ali, poucas pessoas

foram felizes. • NLL

DEUSDENIA - Mamão, ou o Chaplin.

DEUSDETE ,- Teu mal, Dousdenia, ó ser pretensiosa. Por que é qoe você

não vai ser locutora? Isso dá dinheiro. Não vê a Márcia -

des, que beleza? (OLHA SECAMENTE PARA DEUSDEiíIA) Você não

tom vontade de ser a Márcia Mendes?

DEUSDEIÍIA ■ (LEVANTANDO-SE OFENDIDA) Não.»

DEUSDETE . (INSISTINDO) E a Bety? A Bety Mendes?

DEUSDEiíIA - Não. Claro que não.

DEUSDETE - (QUASE GRITANDO) Então quer ser o que? Roné de liellmond?

DEUSDEiíIA - Mamãe, eu sou euj (SENTA-SE, QUASE CHORANDO)

DEUSDETE - (COM REMORSO, ACARICIANDO A FILHA) Dousdenia, minha filha...

Por que ó quo você não volta pro supletivo?

DEUSDEiíIA - (LEVANTANDO-SE, FURIOSA) Que supletivo? Eu estou em pleno

mar, entendeu? E tenho estilo próprio. Não há como voltar.

DEUSDETE - (LEVANTANDO OS BRAÇOS PARA 0 CEU) Será que eu vou ter quo a

bandonar a Messiânica do Japão e voltar para a Umbando? Só

pra acelerar o seu processo? Será quo você ainda não entend

dou quo isto são nuvens? Purificações?

üLüÍdENJá * Á õüi^bõiüaAtó m disso que eu, tería sucesso na carreira


BRAN,RIOTN.CPR.PTÊ_^ÚiÍ_„p.US H

DEUSDETE Que carreira, rainha filha? Quando? Tomara que eu esteja viva.

Não vai me dizer que essa realização vem so com a Era de Acua

rio? Qual é mesmo o seu signo?

DEÜSDENIA Hão se lembra mais do meu aniversário? Capricórnip^>-:-^N . \


cewsj^ V
B 3*1
DEUSDETE (ASSUSTADA) Canricornio? 0 mesmo da Ava GardnerJ
'

DEÜSDENIA 0 mesmo, mamão, (SILENCIO)

DEUSDETE - 0 triste é que vocô não é nenhuima condessa descalça, (MUDA

DE TOM) Está bem, minha filha. Pode subir. Vá descansar. Vo

cS deve estar cansada. Alguma roupa pra lavar?

DEÜSDENIA - ToDas. 0 calor no Rio foi a quarenta graus.

DEUSDETE - Tirarei a sujeira de sua roupa. Depois tentarei remover as

impurezas de 3eu espírito. Vou lhe dar um passe magnético.

DEÜSDENIA - Como?

DEUSDETE - Passes espirituais. Johrei. Uma religião japonesa. 0 Candom

blé não no fascina mais.

DEUSDEKIA - Mamão, a senhora troca de religião como quem troca de roupa.

DEUSDETE - Ai de tá, se não fosse eu e minhas preces. Não deboche, Deus_

denia. (DEÜSDENIA SOBE ALGUNS DEC-EAUS) Não faça barulho, fi-

Ihinha. Sua irmã está no oitavo mês de gravidez. Hoje o do-

mingo e ela descansa com Claudionor. (DEÜSDENIA SOBE MAIS AL

GUNS DEGRAUS) Conseguiram uma promoção para a Nigéria, na Á-

frica. Ontem mesmo a mãe de Claudionor ligou de Fernando de

Noronha. Outra coisa, Deusdenia, não liga a vitrola naquele

volume. 0 bebe de Eugênia está atravessado. Vai ter de fazer

cesariana. Ela está muito nervosa com a gravidez e a promoçho

DEUSDENIA- Subirei pá ante pé. (SOBE)

DSÜSDETE - (SOZINHA, DEPOIS DE UM LONGO SILÊNCIO) Agora vamos à minha

§ftudação ao Sol, Hozarsi a Mafcsonpr&fco. Sstow louca pra re-

zar fluentemonte. Japonês é tão complicado... (CüMEQA A Ajz-

ZAR BAIXO, OLHOS FECHADOS)


BRAN.RIOTN.CPR.PTE p. h

DEUSDENIA - oOZINHA i'TO QUARTO DESARRU- AS MALAS) (CANTAROLAJ^^T '<\>


i ${ C£H6lfP> \
F2ü
“Eu voltei pras coisas que ou deixei... ^';x
, ii
Pois "saquoi" que aqui e o meu lugar...

(ATIRA LONGE A ROUPA QUE DOBRAVA. PALA CONSIGO MESMA) AMON

TOANDO AS ROUPAS PARA LAVAR. PÁRA, PENSATIVA)

Tenho certeza que cadaum tem o sou lugar,a sua hora... Onde

/ será meu lugar, já que o palco o as telas me recusaram?

(PROSSEGUE ARRUMANDO) Quanta desilusão a gente encontra pe

ria una
la vida... Quando eu era crina ça, achava >

de artista. Botava um pano de prato na cabeça, sapatos, da

çiamãe, um vestido da Eugenia e ficava representandç,cantan

do. Tardos inteiras... (PAUSA) Os aplausos jamais sucederam

minhas falas. Sempre, admito, constrangí o público. (FURIO

SA) MalditosJ Isso ê porque eu ainda não encontrei o meu

público. (QUASE CHORA, MAS NAO) Não há lugar para as lágri

mas. (ALTO) Nao pensem que eu não me vingarei, nao; mu me


A
vingareil (CONTINUA ARRUMANDO AS COISAS, FURIOSA) Um dia, e

les vão ter que me aturar. Ou melhor, vão me adorne. .<ao pen

sem aue eu sou "mais uma", nao* Não sou mesmoí (PAUSA) (POU-

CO MAIS CLAMA) 0 público brasileiro não está acostumado com

verdadeiros artistas» Pois já 6 hora dessa gentinha me conh^

cer. Alguém fora de série. (ESTUFA 0 PEITO) Não o sempre que

nasce uma DeusdeniaJ (VOLTA A ARRUMAÇAO. iNDIC-a^í/u) _.^.o po,

dem entender meu estilo* Não podemJ Êlos nunca foram à Eu-

ropa. Como eu fui. Claro que não podem entender. ^“^"5

Estilo próprio... (SUSPIRA) Que sina* Eu podia ter imitado

alguém no começo que logo tinha colado. Bancado a Marilyn

ou então a Suzanne Pleshotte. Mas não. Proferi que o cora-

ção me ditasse como me expressar. E aí... Ca estou eu. Fa-

minta, maltrapilha, desempregada. Obrigada a voltar ao ^a^»

(SUSPIRA AMARGAMENTE) Que lar... 0 Brasil não comporta ar-

tistas inquietos e curiosos como eu. (VAI ATE A JANELA)

Tard©3 inteiras representando no fundo do quintal... ^.amae

mó 4is§® quo isso © ‘Uma, Qlm, F&9*m vir,,, Uüq

posso acreditar. (NERVOSA, FALANDO ALIO)No que , que a Bety

Gada
Faria é melhor do que ou? (PAUSA) Carreira... &.••
BRAN.RIOTiM.urK.r, J ^0 p ^
b

DEUSDENIA - ... TBm a sua carreira. Vi a Clementina de Jesus que só

f02 sucesso aos sessenta. Já a Judy Garland estrelou no su-

ccs30. Também, nasceu nos estúdios, nó? Melhor ainda a Liza

que é filha da Judy. Com todos aqueles amigos... Aqui, pra

gente conseguir entrar no meio artístico, só dando. (..

S eu dei. Dei feito ma cachorr Não adiantou nada.

Não consegui nada. Quando será a ninua voz? Terei essa vêzE

2 o que eu me pergunto. Chegará este dia? (PAUSA) Acho que

não. Devo achar que não, já que estou de volta pra onde tudo

começou. (DESESPERA-SE) Não posso. (ANDA EM CÍRCULO) Não vou

rno deixar vencer. Que terrorS Preciso me expressar. (GRITA)

GentinhaJ Gentinha.' Não me vencerão.' Eu ainda vou estour

Eu vou estourar na praça. Custo o que custar.'

(SURGE CLAUDXONOR DE PIJAMA BE LISTRAS. CARA AMARROTADA DE SONO. DEUSDE

NIA SOBRESSALTA-SE)

DEUSDENIA - Claudionor... Como você

CLAUDIONOR- (OLHANDO- INTENSAIvIENTE) Eu acredito.

DEUSDENIA - (SEM JEITO, TENTANDO SE RECOMPOR) Acredita em que, Claudionor

CLAUDIONOR- Que você vá estourar um dia. Você vai estourar um dia.

DEUSDENIA - (SEM JEITO) Bondade sua...

CLAUDIONOR- (MAIS INTENSO$ VOCê merece o sucesso. Ninguém mais do que yo

cê. Você tem muito mais talento do que todas estas artistas

por aí.

DEUSDENIA - Também não ó assim... Ê uma questão de estilo, Claudionor.

0 meu é muito raro. Muito especial.'

CLAUDIONOR- (PITANDO-A NOS OLHOS COM ARDOR) Adorei que você tenha voltado

DEUSDENIA - (CONSTRANGIDA) Hi, olhe aqui, Claudionor... Não me constran-

ja, Acabo do chegar, Não vá me criar encreuo 'ao me indis^

põfíhâ úôiti Etiginia, VmôB jogar ôai nisso, ti&7 Além do mais,

eu nem sei se voltei. Talvez esteja só de passagem.


BRAN.RIOTN.CPR.PTE— P- Ü .
7
CLAUDIONOR- (NUM SUSSURRO) Piquo. . . Sua irmã ostá dormindo.

DEUSDENIA - (AFLITA, FALANDO 3AIX0 PARA N&O ACORDAR EUGENIA) For - avor,

N&G’ Claudionor... Eugenia ostá grávida. Além do mais, o que

passou, passou. Voltei muito mudada. Não dá mais pra gonte

transar. Vamos esquecer o que houve entre nos. Nao vai que-

rer quo eu engrosso logo no dia da minha chegada. (BAIXX-uxiO,

ENTREDENTES) Saia já do meu quarto antes que eu acorde sua

mulher aos gritos. 10-~\U

CLAUDIONOR- (TENTANDO TOCÁ-LA) Deusdenia, você me enlouquece.

DEU3DENIA - Isso é dolírio, Claudionor. Delírio. Você nem ao menos me

cumprimentou o já vem nessa? Voce nao mudou nada. Voce so

pensa nisso e em bebida, 6? Saia. daqui. (PAUSA) <Ja soube que

voces vão para. a ÂTrica...

CLAUDIONOR- (CAINDO EM SI) Dousdenia... Eugenia não podo saber o que a-

contecou entre a gonte.

DEUSDENIA - Nunca soube. Nem saberá, se depender de mim...

CLAUDIONOR- (SEGURANDO-A S SACUDINDO-A) Por que voce me despreza tanto?

DEUSDENIA - (VIRANDO 0 ROSTO) Não sei. (MUDANDO 0 TOM) Volto

ma, Claudionor. Ainda não 6 meio-dia.

CLAUDIONOR- ( VAI SAINDO, MAS PÁRA) Lembro-se que Eugenia está gífávida.

Nada de contrariá-la.

DEUSDENIA - Basta que Tique na dela.

CLAUDIONOR- Sabia quo voce vinha passar a Páscoa conosco.

DEUSDENIA - Que remédio, não é?

(CLAUDIONOR SORRI AMARELO E SAI)

(A CENA VOLTA PARA A SALA, ONDE DEÜSDETE CONTINUA REZANDO.)

mmm k ÍMOÁDA) taaS, digta-ii»i cl& ônâê vm küe eto-vo*

Será o que estou pensando?


BRAN.RIOTN.CPR.PTE .> p.

DEUSDETE - (SEM INTERROMPER A ORAÇÃO) Ê Lavanda Stravaganza.

EUGÊNIA - (ESTREMECE) Então, ela está de volta.

DEUSDETE - Não soi. (CONTINUA A REZAR)

'EUGENIA - Aqui não sorve pra ela. Ê uma cidade exclusivamente burocrá

tica.

DEUSDETE - Estou rezando pra que ela arrume dügo pra fazer por aqui*

Quando vocês forem pra África, não çu ero ficar sozinha nes-

ta casa.

EUGENIA - Estou quase vomitando com esto cheiro.

DEUSDETE - Soi o que você quer dizer, Eugenia., mas, fique na tua o não

vomite. Já basta a rejeição que você teve no princípio da

ggavidoz. Isto são nuvens. Pufificaçaes.

EUGENIA - Adjjo que ora por isto que você esperava. Não é? Que eu me fo

seo para poder ficar com a Deusdonia nesta casa. Nunca escon

Seu sua preferência.

DEUSDETE - Você quem o diz. Eu amo minhas duas filhas igualmente.

EUGENIA - (ENFURECIDA) Meu bebe vai nascer na África.’

DEUSDETE - Você tem que compreender. Ela 6 mais moça que você e ó artis

ta. Está tão desprotegida...

EUGENIA - Não interessa. Acho qun você me odeia só porque fiz adminis

E isso já faz tanto tempo... Ainda fazíamos pique

dançantes. Foi na ópoca que lançaram a alta- fidelidade, fi-

ramos jovens.

DEUSDETE Você pintava cada incêndio na mata... (NOSTÁLGICA) Lindos.'

EUGENIA (SfiCA) Ja faz muito tmmpo. (MUDA DE TOM) E ossa biscate? Vai

fazer o quo da vida? Montar nas suas costa»?

DEUSDETE Não fale assim. Ela ê sua irmã.


dKAN.RIOTN.CPR.PTE _ P-
9

EUGENIA (FURIOSA) Quer saber do ma coisa? Não vou deixar mais ele-

trodornestico nenhum com a se nhora. Levo tudo comigo. Bato-

deira, liquidificador, tudoi la deixar, mas

Vou levar até o gazozon.

DEUSDETE Não, Eugenia. 0 gazozon não. Como ó que vamos

zônio? Olhe aqui, Eugenia... Não vai quebrar a paz

duamente conseguida nesta casa. Não espante Deus daqui. Lem

bre-so de seu bebo.

EUGENIA Corno é que ou posso esquecer? Acha que eu não sinto os pon-

tapés aue mo dá na barriga o dia inteiro?

DEUSDETE Pois ó. Você devia, estar pensando na cesariana em voz de di_

famar a sua irmã;$oixe isso pros vizinhos.

EUGENIA E. Ela já é mesmo bem conhecida poraqui. Garanto que veiu st

traz de escândalos novamente. Será que falta algum rapaz que

Deusdenia não tenha...

DEUSDETE (JÁ NERVOSA) Hí, chega, Eugênia. Não me interrompa as ora-

ções. Ê tão dficll rezar em japonês. Não vá estragar o meu

dia do culto.

EUGENIA (OLHANDO 0 RELÕGIü) Está na hora de acordar o Claudionor.

(VAI SUBINDO A ESCADA)

DEUSDETE E, vai sim. Vai que a Sociedade de Recuperação d03 Alcoóla-

tras ligou pra êle.

EUGENIA Domingo? A Associação nunca ligou domingo.

DEUSDETE Pois o. Quem sabe o caso é irrecuperável.

EUGENIA (POSSESSA) Vire essa boca pra lá. Há dias que o Claudionor

não bebe uma gota de álcool.

DEUSDETE Falando de sua pobre irmã quando você escolheu logo um dos-

pôüôõs qtlô Í0PM a Mòfttâ Castelo. Agoiht, aro d* 0 uühü í)m

mais é que 3air atravessado.


SR AN.RIQTN.CPR.PTE p
1C

EUGENIA Escuto aqüi, dona Xepa. Mou marido 6 herói do guerraJ Jamais

iovanto essa voa para difamá-lo,, ouviu? S além do mais sou

ou quem o sustento, está entendendo? Eu não dependo dessa

ponsaozinha que papai deixou.

DEUSDETE Não martirize a memória de sou pais êle deixou vocês duas tao

amparadas

EUGENIA - Ahhh, chega, sabe? Hoje vou pro Tenis Club. Aqui, o ambiente

saturou. E, outra coisa: pergunte a Deusdenia se ela é mesmo

amiga da Eva Wilma. Encare-a nos olhos e pergunte. (SAI)

DEUSDETE .■ (SOZINHA) Não posso mais ter Té. Assim, não é possivel. Um

de cada vêz. Assim, não posso salvar o mundo. Euq uero que

que tudo corra bem, que tudo saia bem, mas, assim, não está

dando. (GRITA) Deusdenia.’ í J

(DEUSDENIA DESCE. A MAE A ENCARA E PERGUNTA)

DEUSDETE . Deusdenia... Olhe-me nos olhos. Não minta para a sua mãe.

Deusdenia, você conhece mesmo a Eva Wilma? ( DEUSDENIA NAO


i
RESPONDE) Vamos, responda. Teriam sido suas cartas verdadei_

ras ou sob o efeito do alguma droga?

DEUSDENIA - Eu menti. Não conheço a Eva Wilma. Eu moiiii para a senhora.

Eu não tenho amigos. No começo eu fiquei amigo do Carlos In

perial...

DEUSDETE - (NfiO QUERENDO OUVIR DE JEITO NENHUM) Chega.» Eu só tinha te

perguntado se você conhecia mesmo a Eva Wilma. Não precisa

dizer mais nada. Eu compreendo. Eu só quero ajudar. (ABRA-

ÇA A PILHA) Vou lhe dar uns passes e você vai ficar como no

va. (PUXA UMA CADEIRA) Sente-se aqui. (ELA SENTA. DEUSDETE

LEVANTA A MAO E COMEÇA A DAR 0 JOHREI. DEPOIS DE UMA PEQUE-

NA PAUSA, PREOCUPADA) Deusdenia... Vou te fazer uma pergun-

tinha só, Não a tomo por ofensa, caso seja uma mentira. Te-

2*iâ sido Võõê Üfilâ... châoroto?

DEUSDENIA - Fui,
BRAN.RIOTN.CPR.PTE th
41

DEUSDETE - (RECEOSA) Teria 3Ído voco -uma daquolas coristas do Erlon

Shaves quando da apresentação do "Quero Mocotó"?

DEUSDENIA - Sim, mamão. Cantei.com o Maestro Erlon. Fiz parte da Banda

Veneno.

DEUSDETE - (DESESPERADA) Dousdenia.' 0 que foi que sobrou d

Ihinha?

DEUSDENIA - liada, mamãe. Não sobrou nada.

DEUSDETE - Sabe, pelo menos ainda tocar "Le Lac de Come" como sntiga-

monto?

DEUSDENIA - Nao, mamão. Não canto mais ao piano. Minha voz mudou. Bebi

demais.

DEUSDETE - Bebeu demais, Doudenia. Falou demais. Se;. entregou demais.

E agora... Volta pra Deus.

DEUSDENIA - Mamãe, eu não estou voltando pra lugar nenhpcm.

DEUSDETE - Mas hei de te curar. Minha fó ó inabalável.

(TERMINA 0 PASSE. ACEITAM-SE, MUDANDO DEPOSIÇÃO E TOM)

DEUSDETE - Não há de ser nada, Dousdenia, o doutor Paim vai conseguir

pra voce uma colocação na Globo. Escute as instruções: voce

tem de procurar um certo senhor Viriato no setor do prograu

maçao. Ele ó amigo do dr. Paim e manda lá dentro. Pra maior

referencia sua, o dr. Viriato e irmão da D, Inesita, nao sei

se você sc lembra? Aquela que morava perto da gente om Cam-

pinas. Aquela que caiu do segundo andar e anda de cadeira do

rodas. Lembra? Voce chega lá e diz que e filha de dona Deus-

deto Moreira, amigo do dona Inozita. ..

DEUSDENIA - (INTERROMPENO- A) Não seja cretina, Mamãe. A senhora está

c omp 1 e t ament e xar op e.

pgysPETg - ,Mas a toi J*MgifcA*..

*
DEUSDENIA - A senhora e a dona Inesita, mãnão, são duas loucas. Gomo e
BRAN.RIOTN.CPR.hi - mo d ,çó

DEUSDENIA - ... auo ou vou chegar na '.são dizondo quo eu sou amiga

de dona Inezita, mamãe? Vão me dar um chute o me jogar na r

rua. Quem, além da senhora, conhece a d. Inezita?

DEüSDETE - Oh, Dousdonia, não fale assim. D. Inezita é uma senhora tão

boa. Ela fez tantos favores: ura nçentí Avsliou tantos

tulos de suu pai. E tem mais. Te pegou no'colo. Lembra quan

você teve catapora? Ela que furou uma por uma com aquele es

pinho de laranjeira. Te curou.

DEUSDENIA Mãozinha, por favor...Será quo a senhora não entende? Como

6 que eu vou chegar na Globo dizendo que foi a d. Inezita

quo me mandou lá, aquela qi o furou as minhas

espinho de laranjeira. Tenburpuçiencia...

DEÜSDETE Você ó muito orgulhosa, Dousdonia. Por isso que apru

ma. £ preciso ser humilde.

DEUSDEÍIIA Ah, mamãe. To manca. Eles que venham atráz deq mim. Eles,

um dia, vão vir atraz do mim.

D$USDETE £, minha filha... Deus te ouça. Dr. Palm vii ficar muito

chateado. Ele se empenhou tanto...

DEUSDEíIIA Se fôda o doutor Paim.

DEÜSDETE Quo ó isso, Deusdenia? Nao fale assim do dr. Paim. Já se es

queceu? Do apoio que ele te deu quando você estava c cm aque

las angústias de adolescente? Ele que te apoiou na sua ado-

lecência.

DEUSDEíIIA Quem sabe não foi aquele tratamento qüe me desorientou? Ga»

ranto que foi aquele tratamento quo me dei suou desorientada

pro resto da vida.

DEÜSDETE - Não se engane, Deusdenia. Você devia ter lido os livros cer

tos. Seu pai confiava muito no dr. Paim.

DMlUBDlHiil ta FúP Qtié â hão ti u (i as ou logo ÔÔní oio, ÍUZilàQ V

Fiaa aí de viuva, se entupindo de ensinamento religiosos.

Mamão, a religião ó o ópio do povoj


BRAN.RIOTN.CPR.PTE A2.MO

DEÜSDETE - m'ITANDO-A SERIAMENTE) Do . iaj Se você tivesse a metade

dos meus conhecimentos teosèfieos, você mão diria uma boba-

gem dessas. Eu podia te ensinar uma sério de coisasAaôbre a

origem da Humanidade e do Universo. Eu ii muito, Deusdenia.

Enquanto você ficava lá no quintal, amarrando pano do prato

na caboça brincando com seus amigos, ou lia, Dcusdonia. Se

voce sentasse uma bora por dia comigo para mo ouvir, eu no

doria to explicar tudo. uo oncio a gonto voiu, pra onde a gon

to vai, quem somos... Soi dar várias interpretações^que vá-

rias roligiõos dão sobro a Vida.

DEUSDENIA - (SECAMENTE) Nenhuma delas me interessa.

DEÜSDETE - (CONTINUANDO) A Toorla do Céu o do Inferno, tudo sobre a

"Planície Racional". Você alguma ves ouviu falar da Pla-

nície Raciona, Deusdenia? 3o tivesso ouvido, você já esta

ria com a metade dos seus problemas solucionados. Já esta

ria om outra problemática, liais 3oria. Mais importante,

Mais ligada ao espírito. Não estaria vivendo essa aberra-

çao, ossa deformação. Você sabe o que quer dizer "Racional

Superior"?

DEUSDENIA - Mae, a senhora está completamente lauca.

DEÜSDETE - Deusdenia, minha filha, há teorias quoprovam que o Mundo

nasceu do uma bicheira. Somos todos micróbio, e só. (SAI

PARA ATENDER 0 TELEFONE QUE TOCA)

DEUSDENIA - Fas-mo rir. . .

Du,JSDETE - (AO TELEFONE) Alo ? Sim? Um momentinho. (GRITA) Claudionor!

Ê pra voco. Associação dos Alcóolatras Anônimos. Estão dison

do quo você dou um desfalque na Caixa da cantina. Vom cá ex

plicar, Claudionor, que a sede desto clube eu não conhooo.

(DESCE CLAUDIONOR DE PIJAMA ARRAZADO. ATRAZ VEM EUGENIA)

MG3MA ■ Oi, umêümí&t Vôaê auríiôu, mas ôhagoü. (ÁàAA(iÁ«A ÍALAAAAAAS)

(DEÜSDETE ENTREGA 0 TELEFONE PARA CLAUDIONOR)


BR AN,RIO TN.CPR.PTE
' >*-<-
CLa uDi0 Gj-j, Dousdenia. (AO T-oLa Nao, Não.Eu não tenho <gius.sesai.

do de casa. . . Tenho casa.

DEUSDETE - (TENTANDO POR PANOS QUENTES}.., Deusdenia, Eugenia vai pra

África.

DEUSDENIA (FINJINDO INTERESSE) Vão pra África?

CLAUDIONOR - (AO TELEFONE) Eu não roubei ninguém.

eugenia . Claro. Sabe, Deusdenia, eu sempre ti ve tendência, â prosperi-

dade. Nada como um país novo como a Nigéria pra gente ir se

acostumando. Depois quero ir para oCanadá, Austrália, África

do Sul... Lugares ainda começando a sua hmstôria. Há sempre

possibilidade de mais dinheiro. Lembra-se quando viemos pra

Brasilia?

CLAUDIONOR. (AOS GRITOS) Não roubei essa merda de Associação] Se não me

acreditam, chamem a Policiai (BATE 0 FONE)

DEUSDETE - A Policia,não, Claudionor,

EUGENIA (LEVANTANDO-SE AUTORITÁRIA) A Policia, sim. (BATE COM A MSO

NA MESA)

DEÜSDENIA - Não. A Policia não,

EUGENIA ror que, cordeirinha? Alguma culpa no cartório?

DEÜSDENIA - E que eu não gosto do modelo cios uniformes'.

EUGENIA oompre tao sensível... esto teu pânico é do quem tom coisa,

escondida.

DEUSDETE - Deusdenia, você está escondendo alguma coisa de sua família?

DEÜSDENIA - Claro que não. 0 que está acontecendo com vocês?

EUGENIA Conosco? (MUDA Dn TOM) Voce anda envolvida com tóxicos, não

é, Deusdenia?

DfítiiSÜSm - üliitfQ QUO llto, Spai Qüô ôe passa?' Mamão, que ihiSefrogatérío

e esse? Quem ela pensa que é? Corta jáj


BR AN.RIOTN.CPR.PTE -1^0 .?.% 15

DEUSDETE - (CORTANDO) ClaudionorJ Nao era hora do abrir osovos Da Pás-

coa.f

(CLAUDIONOR PICA MEIO ABES TALHADO COM 03 OVOS NA M&O )


\

DEUSDETü. _ (CONTINUANDO) Não ó porque você sonha, todas no


Don-

bardeio que eu vou to dar este direito.

CnâUDIQNOR- ... Estou precisando de glicose. Tenho no dosgastadomuito.

DEUSDETE (PARA DEUSDENIA) 0 Claudionor pensa que a guerra foi ontem.

Nunca pegou numa enxada. Apertar gatilho é fácil. Quero ver

é se ôle passa no concurso o se apruma na Vida. (VIRA-SE PA

RA CLAUDIONOR) Seja firme* Claudionor; esquece a Guerra. Vo

cê já ostá pronto pra outra.

.iMJGENIA - Mamão... Não é porque Claudionor tem a sua idade quo voco

vai ter este direito dk falar de igual pra igual. Respeite

as honrarias do meu marido.

(0 TELEFONE TOCA. NINGUÉM ATNDE. TODOS FICAM EM SILÊNCIO)

EUGENIA - Axinal, Claudionor. Voco roubou ou não roubou 0 tal dinheiro

(CLAUDIONOR FAZ UMA CARA DE CULPADO)

muChm,IA - Já que roubou* está roubado. Não precisa se justificar. Afi

UclI ao condas* elo3 nao conseguiram to recuperar mesmo...

DuJSDETE - (PARA DEUSDENIA) Claudionor também vai empregado pra Nigéria

se passar no concurso.

(OLHAM TODAS PARA CLAUDIONOR QUE ESTA COM A SUA PIOR APARÊNCIA)

DEUSDENIA - Você tem estudado pro concurso* Claudionor?

CLAUDIONOR. (BALBUCIANDO)... Não sei falar inglos.

EuuüNIA - AiiiJJJ Estou recebendo chutes do neném. Este meu filho deve

ser jogador do futebol, (Dü UMA RISADA)

DEUSDETE . (SORRINDO) Inda bem queeu estou aqui. Se não fosse eu e meus

fluidos, ela já teria abortado. Você precisava ver como vomi


oK AN.RIOTN.CPR.PTE.
-i?vr
DEUSDETE fcou nos dois pri^e^ros aosos. Ela só vomitou. Eu pezei,

Ealoi: "Meu DeusJ Fazei coa que o1anão ponha oste

foto pela garganta.11

EüGSíia . Miss Hakaaoto, o assunto 6 sério. (VIRA-SE PARA A IRiffl)

Messias?

DEUSDENIA - Nao sei.

aUGENIA - Não sabe? Não me leve


a naj., aas você está tão abatida.

Pouco falou. Ite „ olhar distante distraído... Está laeôni

ca. Perplexa, eu diria.

DEUSDENIA -
*** adlanta n° wemtar. Hão há coco responder. Hão sei mai:
de nada. USo aopergante. Acho que as pessoas estão todas

loucas.

EUGENIA - Gomo? Eu o sua mão, loucas?

DEUSüEHIA - Nãoj S'vocÔs duas, não. 'iodos; iodos'

. (DEBOCHANDO) VôcÓ quor dizer que deu a louea no mundo,

não <T Essa história é muito velha. Não queira esconder com

ela, essa tua inabilidade. Você tinha 5 que tor ido a66 o

fl
“ d° CUrS°- Be“ íi2 «» «P» »» fornet em datilografia. Ke
lembro bom do você, com aquelas unhas pintadas sem poder ba

ter letra neahww. Agora precisa do um emprego, o fica aí

bancando a artista.

EEU <C0K
“ - °M0) ••• *««-* Escuta aqui. Eugenia... Eu não me
orgulharia jamais em ter um curso do datilografia, entendeu?

Hem de ser funcionária pública. Não estou preocupada em se-

brovivor, ou viver, ou nadai

lia
‘ ° briguem!Kantoham a paz acima de seus ódios. Isto são
nuvons J

*VmiA * Ora, Dousdenia... Você mal tem sev-,


iom ainneiro pra so vestir. Ainda
]pQ3-*OCQ una Pi ^■í>*ív, • n >
1; ca x
-'•nginao de exótica.Sera por isso
BR AN.RIO TN.CPR.PTE.

EUGENIA ... que se despe tanto nas revistas? (SUSPENSS) Quer que eu

mostre pra mamãe?

DEUSDENIA . (DESAFIADORA) A partir de agora, não vou esconder mais nadaí

EUGENIA Não, sua metida? Vai lá então, Claudionor. Pegue aquelas re_

vi3tas que tem a sua cunhada. (CLAUDIONOR TEM A DUVIDA E 0>â

NICO ESTAMPADO NO ROSTO)

DEUSDETE (SEGURANDO DEUSDENIA PELO BRAÇO) Será verdade, Deusdenia, o

que sugere Eugenia com os olhos?

DEUSDENIA ■ Vai, Claudionor. Busca mesmo. Já ó hora da cuíca roncar. Vou

entregar tudo. N

GLAUDIONOR - (ATERRADO)Tudo?

EUGENIA (DESCONFIADA) Tudo o que?

DEUSDENIA - (OLHANDO CLAUDIONOR;' ACUADO) NADA.

EUGENIA ■ Ah, essa nao.' Agora vgi ter que explicar direitlnho esta in

sinuação maldosa.1

DEUSDETE - ■ Sorá que vou aguentar esto baque?(SENTA-SE)

(DEUSDENIA OLHA A MlE ARRASADA E ENCARA EUGENIA SEM DIZER UNA PALAVRA)

EUGENIA . Ali, ó? Mamão, lembra-se de quando ela foi pra Londres? (OLHA

PARA DEUSDENIA, DESAFIANDO-A) Cicorone... Cicerone coisa no

nhumaí Ela posou para revistas de pornografia. Está ouvindo,

mamão? Pornografia j

DEUSDETE - Não*

DEUSDENIA - (COMPRANDO A BARRA) Olha aqui, todos voco3Í Eu posei, sim.

Mais que posei, Deitei e rolei. Já experimentei de quase tu

do. (DE PEITO ERQUIDO) Eu sou a única atriz underground bra

siloira, entondoram? (PAUSA GRAVE)

DEUSDETE - Atriz o que, Deusdenia?

DEUSDENIA - Pop, mamão; Sou uma atriz po$í


BR AN,RIO TN.CPR.PTE ' 340 p Ç<=j

BEUSDBTS - (PONDO AS MÃOS NA CABEÇA) Não.' Não.' NãoiVoc6 ainda o hippie?

DEUSDENIA - (COM ODIO) Eufui hippie. Agora sou da vanguarda.' E, em nome

da vanguarda, eu vos decl aro MORTOS.'

EUGENIA - (DEBOCHANDO) Ai, aiiiJ

DEUSDENIA -(EXALTADA, GRITANDO) Estão mortos, sim. Você, Claudionor, ma

mãe, são todos defuntos. Esto filho que vai nascer é um mons

troj

CiZhHüüfíA V
DEUSDETE - Não blasfeme, Deusdenia' FEDE

(DEUSDENIA LEVANTA A MÃO PARA BATER EM EUGENIA)

DEUSDETE - Deusdenia 4‘ N㧠Nfeata Aiuna.-mulher..: : grávidaiAÍ’PAUSA) :

DEUSDENIA- (RECUPERANDO-SE) ... Está bem. Afinal, não quero sujaras

minhas mãos. (VAI SAINDO)

EUGENIA (COM ÕDIO) Deusdenia... (A IRMÃ PÁRA. ENTREDENTES) 0 único

jeito de lavar as mãos é decopá-las.

(DEUSDENIA DÁ DE OMBROS E SOBE A ESCADA)

(EUGENIA FICA NERVOSÍSSIMA ANDANDO DE UM LADO PARA 0 OUTRO E A MÃE ACQM

PANHA-A. VJDIONÜR LIGA 0 RÁDIO ri CA OUVINDO NUM CANTO)

DEUSDETE - Calma, Eugênia.' Calma.' ISso são núvens. Purificações

EUGENIA (ANDANDO DE UM LADO PARA 0 OUTRO) Você ouviu bem, mamãe. Ela

q um câncer na família. Ela quer matar o meu bebê;

DEUSDETE - Calma, Eugenia. Ela não sabe o que diz.

EUGENIA - E vamos deixar que uma pessoa drogada partilhe da nossa mesa?

DEUSDETE - Há uma saída. Deve haver uma solução.

EUGENIA - Como solução? Ela tem que se tratar antes que se torne uma

iQpea furiosa*

DEUSDETE - CalmaJ Deixe-mo pensar. Minha filha Deusdenia, por que você

não se casa e vai ver televisão bem acompanhada?


BRAN.RIOTN.CPR.PTE ' vi:t 0 a kO 19
EUGENIA . ua. iambom ela 30 onda coei homossexuais,

DEUSDETE - Dão calunie os amigos de Dousdonia. São sensíveis como ela.

EUGENIA São e da mesma laia. Se eu não soubesse que se deita com ciunl
/Q.?. -
quep um, eu diria que é lésbica.5

DEUSDETE - Chega, Eugênia. Ela ó sua irmã.

EUGENIA unoga, digo eu. (VIRA-SE PRO MARIDO, QUE AINDA OUVE RÁDIO

NULI CANTO) Pegue seu calção e vamos pro Tênis Clube. (SAEM

EM Dl RE Ç AO A ESCADA)

DEUSDETE Não vão comer os ovos? (MORDE UM PEDACINHO DO CHOCOLATE. DÁ

UM SORRISO AMARELO) ... E Domingo de Páscoa.

EUGENIA - (PARADA AO PE DA ESCADA. COM DESDÉM) Páscoa? Coalho não bo-

ta ovo5 (SAI PISANDO QUENTE)

DEUSDETE - (SOZINHA) Cruzes.5 As pessoas estão descrentes. Daí, a de

doncia das. religiões. (LEVANTA OS BRAÇ OS PARÁ 0 CEU) Será

que 3ou a última crente, poderoso Criador? (EXIBE AS MIOS)

Eu curei minha artrite só com passes5 Minhas mãos nem se me

xiam o estavam tortas.5 Hoje, posso até tocarJ (VAI ATE A E-

DETROLA) A música apazigua até as foras. (POE UM DISCO. BRA

SILEIRISSIMO. COMEÇA A DANÇAR, FINGINDO ALEGRIA; CLAÜDIONOR

DEoCE DE CALÇAO DANÇANDO IGUAL Á UM ABILOLADO. ATRÁS, VEM

EUGENIA SEMPRE SERIA, DE ÓCULOS ESCUROS, ESTEIRA, BOLSA DE

PALHA, UMA SAIDA DE BANHO DE TOALHA AMARELA. SAEM PELA PORTA

DA ? ÍE1 ÍJ
‘’ '' -'E. MAL 0 DISCO ACABA, VOLTAM CORRENDO.)

EUGENIA (APLITlSSIMA) A Polícia.5

DEUSDETE _ Esconda-se, Elaudionori

CLAUDIONOH- Onde?

EUGENIA endo vamos botar um homenzarrão destt ?

wusmffi m OfiltóâJ Qíúm&i &òj?á que è com vóces Mesmo?

EUGENIA - Claro.5 CLAUDIOnor roubou


BR AN,RIO TN.CPR.PTE p. CíL
DEUSDETE - (OLHANDO- 0 COM REPROVAÇÃO) Meu gonro... ALCóolatra o ladrábS

EUGENIA - Que escândalo] Vai, nos impedir o visto de saída do Brasil]

DEUSDETE (LEVANTANDO A TOALHA DA MESA) Vai, Claudionor. Entra debaixo

da mesa. (CLAUDIONOR HESITA. MAE PROSSEGUE FALANDO) Vai, en-

tra, Barrabás. (ELE ENTRA. EUGENIA CHORAMINGA SENTADA NA ME-

SA)

DEUSDETE (INDO ATÊ A JANELA) Tem certeza que ora a Polícia?

EUGENIA (NUM PRANTO SECO) Eu não tive sorte na Vida.

DEUSDETE (AINDA NA JANELA) Era o camburão?

EUGENIA Eu devia ter morrido na infância.

EUSDETE Acho que não era a Policia não, filhinha.

EUGÊNIA - Só me falta um desastro.

DEUSDETE Chega de se queixar, Eugenia. Isso ó paranóia.'Precisa pri-

meiro ter certeza de que era mesmo a Polícia.

EUGENIA ELE era tão bom. Tão ajuizado. Nossos seis anos de noivado

foram exemplares. Agora... (CHORA)

DEUSDETE (APROXIMANDO-SE DELA) Minha filha, quer parar de lamúrias e

me escutar?

EUGENIA (SEM OUVIR) Agora virou uma placenta. E eu casei-me perante

Deu3... (CHORA)

DEUSDETE - (CONSOLANDO-A) Calma, filhinha, Quem sabe na Nigéria tem di

vórcio?

EUGENIA - 0 que? Divorciar-mo do Claudionor? NUNCA] A senhora o odeia.]

Já havia notado. (LEVANTA 0 PANO DA MESA E ABRAÇA CLAUDIONOR)

Eu te amo, Claudionor] Por mais idiota quovoce soja]

(MTEM A PORTA, EUGENIA SE ESCONDE DEBAIXO DA MESA COM OUUDIONOH. DEUS-

DETE VAI ABRIR A PORTA)

DEUSDETE - Quo domingo... que domingo... (ABRE A PORTA) Não se assusto,


bRan.rio tn.cpr.pteJJMO_^

DEUSDüTE ■ - .Eilgenia. E o jornaloiro.

(EUGENIA SAI DE DEBAIXO DA LIES A, AJEITANDO-SE)

D-dJJSDmNIA -(D^SCEu DO A ESCADA) O que está acontecendo? O que houve? Pa-

recia uma confusão...

CLAUDIQNOR- (EIVIDO) A Políci a]

DEUSDENIA - (APAVORADA) Como? Atras de mim?

DEUSDETE _ Não, nada disso, Deusdenia. Calma, foi um engano; Eugenia o

quivocou-se, mas 3^ 03ta tudo resolvido. Vamos todos voltar

a normalidade. Esto sao nuvans, purificações, aprimoramento

DEUSDENIA _ (SENTIDO-SE, ALIVIADA EPENSAHVA) Ufa, vocês adoram uma emo

ção para abrir o apetite.

DnuoDüTE - Já que estão todos reunidos, vou servir, então, um licor pa

ra confraternização. Vamos brindar a PáscoaJ

o-uAJDIQNOR- (ANEüADlSSIMO) Isso, D. Deusdote. Deixa que eu pego. 0 de

gonipapo ou o de piqui?

DEUSDETE - Piqui. Vamos brindar com piqui.

EUGuaJIA - E, tomara que se3‘am mesmo nuvens passageiras. Estou cansada

de tanta tensão.

DEUSDENIA - E, também acho. Chega de bodo. Vamos dar um tempo.

DEUSDETE - (CONTENTE E ORGULHOSA DE SUAS DUAS PILHAS) Assim é que eu

gosto. Como no começo. Como quando seu pai era vivo.

CLAUDIONOR- (TRAZENDO 0 LICOR) Cá estão os copinhos. Nada como um apori

tivo. (SERVE 0 LICOR)

DEUSDETE - Vamos celebrar, meninas. 0 REnascimento. A Ressurreição]

EUGENIA - A sonhora não perdo a mania, não é?

CLAUDIONOR* Tchirx, tchin, meninas. (BRINDAM E BEBEM)

/
DEuoDüTe - (PUXANDO ASSUNTO) Dousdenia, Eugenia conseguiu uma colocação

tao boa na Nigéria. Conta pra ela, Eugenia. Qual vai ser seu
b
Ran,riotn.cpr.
DSUSDETE ■ ... serviço na Nigéria?

EUGENIA Ora, ola já sabo, mamãe. Vou fazer lá a mesma coisa que faço

aqui.

DEÜSDENIA. Você continua na 3eçáo do Arquivo?

EUGENIA Arquivo.

CLÁUDIO NOR.- Meu único medo é essa travessia. Detesto av vor de vo_

ar.

EUGENIA _ Larga de ser bobo, Claudionor. Todo o mundo sabe que carro

é muito mais perigoso do que avião. Pergunte a Deusdonia

como é o transito no Rio.

('IODOS Oíjxí AM PARA DEÜSDENIA, ESPERANDO 0 RELATO)

DEÜSDENIA _ (CATEGÓRICA) Um horror.1 ü: trânsito no Rio ê um horrorJ

EUGENIA - E vocc, Deusdonia, o que 6 que está pensando fazer?

DEÜSDENIA - Estou com algumas idéias. Mamãe, quem está na diretoria So-

cial do Tênis?

DEÜSDETE _ (TROCANDO UM OLHAR DESCONFIADO COM EUGENIA) Do auditório?

DEÜSDENIA

EUGENIA _ (APREENSIVA) Por que?

DEÜSDENIA - Estive pensando...

DEÜSDETE - (PREOCUPADA) Q,uor fazer um Show lá?

DEÜSDENIA - Advinhou!

EUGENIA - (ARREGALA OS OLHOS) Como?

DSUSDETE - Deusdonia, por favor não vá agredir as pessoas! Você preci-

sa aprender a viver em sociedade.1

SUfrSUZA . (íMlèZVA) m® atr&palfea a viâa des eufcyea i

DEÜSDENIA Ué! Mas ou só quero montar um espetáculo no Tênis!


BR AN,RIO TN.CPR.PTE " p (o^

25
EUGÊNIA (PREOCUPADA E UM POUCO AMEAÇADORA) Que tipo de espetáculo,

Deusdonia?

DEUSDENIA - Não sei. (SÉRIA) Algo bem roalista.

DEUSDETE - (DISFARÇANDO E CANINHANDO PARA A ESTANTE DE LIVROS) Seu pai

tinha ótimos textos de Teatro Antigo. Tragédias gregas nara

vilhosasí

DEuoDEN Ia - Não. Vou mo$tar um texto que eu mesma vou escrever. (CLIMA)

EUGENIA (AMEAÇADORA) Deusdonia, o que é que v escrever?

DEUSDENIA - (IMPACIENTE) Não sou nerdiptma idiota.’ Parom de me tratar co-

mo se eu fósse uma ameaçai

DEUSDETE - Desculpe-nos, filhinhai Voco sabe que te adoro. E adoro sua

arte. Mas os outros são tão provincianos... Voce conhece,

sabe como 6 a mentalidade dessa gente.

DEUSDENIA - (CATEGÓRICA) Êles não conhecem a verdadeira arto. Só sabem

das coisas que veem através desta gorringonça. (OLHA COM

RAIVA PARA A TV)

EUGENIA Foi bom vocô ter falado. Ja ia me esquecendo do programa do

Silvio.

DEUSDENIA - Voce, que se diz tão sábia, já 6 uma vítima deste monstroi

EUGÊNIA Não falo bobagem, Deusdonia. Televisão tambómé Cultura.

DEUSDENIA - Eu ó quenão me instruirei com esta joçaj Vocos não doviam se

influenciar tanto por este objeto. Nada de ligar a televisão.'

Vamos tor um pouco de paz hoje.

DEUSDETE - Que ó isso, Deusdênia? Que modos são esses? Eu quero vor a

inauguração do canal do Silvio.

DEUSDENIA - Ah, ó? PRESere o Silvio a mim? Está bom. (SAI DETERMINADA)

MUGMU Hü jà tinha âVlsádô'. Á senhora h&ô Ôüis ÍNüsKduf,

ta.
BR AN,RIO TN ■CPR.PTE^^Q p- GÇ

2k

DEUSDETE Calma, eugenia.' Isto sao nuvons. Purificaçãoes. Todo o nun-

do pa3sa por estas fases. Ela está apenas c

iEa Deusdenia foi sempre tão sensível.

EUGENIA - (ESPUMANDO) Sensível?* Ela não passa de uma..

DEUSDETE

que não tom Deus no nome I

EUGENIA - (ESPUMA DE ÓDIO) ... (CONTÊM-SE)

DEUSDETE . (TENTANDO DESFAZER OS CLIMAS) Bon, chega de suspenso, chega

de sustos, chega de surpresas. Vamos ligar a televisão.

v OUVE-SE UM GRITO. AS DUAS SE ABRAÇAM, ENTREOLHAM-SE E MURMURAM)

AS DUnS - (EM CuRO) DousdeniaJ

DEUSDENIA DESCE A ESCADA COM UMA LATA DE QUEROSENE E UM FÓSFORQ NA MAO

DEUSDETE - (APREENSIVA) ... Quo é, fãlhinha?

- Ih... Que olhar estranho. Parece maconhada...

(CLAUDIONOR POE Á CABEÇA PARA FORA DE DEBA 120 DA MESA)

DEUSDENIA - (PARADA EM FRENTE A TV) Se alguém ligar o botão deste apare

lixo, eu ateio fogo às vestes.’ Me queimo viva.' Na flor da id

dado í

EUGENIA - Deusdenia, larga de bancar a bonza do ye-ye-yo’

DEUSDENIA - Não estou brincano. Eu boto fogo. MesmoJ

EUGENIA - QUe é isso, Deusdenia? Isso tudo é recalque? Mamãe quer as*

sistir ao programa dela.

DEUSDENIA - (TAXATIVA) Não*

DEUSDETE - Que situação que voce nos coloca. Logo hoje que inaugura o

a anal do Bilyíg. s&o vinte o quatpo toas 4ôewXtoâ, 3 igtiQ

6 tudo o quo lhe falta, Deusdenia. Cultura.’ Voce precisa a-

pronder.
y5
•'S

BR AN,RIO TN.CPR.PTE
DEUSDEÍÍIA - Nãoi Eu já sei domais J

EUGENIA Ih...

DEÜSDETE - Está bem, filíiinha. Eu não ligo não. Tá? Mas deixe de lado

6ste querosene. (O TELEFONE TOCA. SUSPENSE)

DEUSDETE - (ATENDENDO, SEMPRE DE CLKS EM■ DEUSDEÍÍIA) Alô? (OUVE. CLIMA

NA SALA) E sua mãe, Claudionor. De Fernando de Noronha.

CLAUDIONOR- (SAINDO DE DEBAIXO DA MESA E ATENDENDO) MamãoJ Mamãe i Estou

sendo procurado pela Policiai

DEUSDETE - Deusdônia, você está sujando o solo sagrado.

DEUSDEÍÍIA - Se alguém encostar a mão nôste aparelho... (AMEAÇA COM OS

FOROS)

DEÜSDETE Quer 30 matar por causa de uma Teleíunkon? Isto ja e anomali;

EUGENIA Agora que a senhora nota? Ela sempre foi insana.

CLAUDIONOR (AO TELEFONE) Coragem? Como posso ter coragem? Eu não çu ero

ser preso. Tenho pavor das prisões. Eu tenho paura de pres:í

dios. E, além do mais, já fui soldado.A senhora não sabe me

tado dos horrores da guerra.

EUGENIA (ARRANCANDO-LHE FURIOSAMENTE 0 TELEFONE DAS MÃOS) Dona Noe-

mi a. .. Não 6 nada, não. Claudionor se emociona muito na Pás_

coa. Quando chegarmos â Nigéria, Ôlc vai ter que partir do

beber. (MUDA DE TOM) Aqui, tudo bem. (OLHA PARA DEUSDEÍÍIA)

Tudo bem, NÔ3to exato momento, estamos todos reunidos aqui

na sala, esperando a inauguração do canal do Silvio. (OUVE)

Vocês também? Fernando de Noronha inteira? Pois ó... (OLHA

PARA DEUSDEÍÍIA, PROVOCANDO) Isto 6 que é vencer na Vida, do

na Noômiai Feliz Páscoai(CLAUDIONOR QUER FALAR; EUGENIA NÃO

DEIXA) Claudionor manda um abraço. Até logo. (DELSLIGA) Bem,

vamos assistir ao Silvio Santos? (DEUSDEÍÍIA NÃO SE MEXE,SEM

denia, decida-se. 0 Brasil inteiro está esperando.


BRAN.RIOTN.CPR.PTE V-IO

QEÜSQBNIA - Não. Não. Eu não quero.

EUGENIA - Como não quor? Você não quer? Mas são cento e vinte

querendo.
1
4! CEW5URA
l-1\
DEUSDENIA - Sò ligarem o receptor, ou ne mato.

EUGENIA - Tá, Deusdenia. Mate-se. Mas, no quintal. Vá brincar de gúo?.

rilheira no quintal. (LIGA 0 APARELHO)

DEUSDENIA TENTA RISCAR 0 FÓSFORO, MAS ABRE-SE EM PRANTOS. A MAE ABRAÇA-

A. EUGENIA E 0 MARIDO COM AR 'TRIUNFANTE SENTAM-SE PARA VER TELEVISÃO;

DEUSDETE - Vem, filhihha. Você está nervosa. Vou lhe dar um cooo de ág

gua com açúcar e uns passes magnéticos.

(DEUSDETE E DEUSDENIA SOBEM A ESCADA E DESAPARECEM. PICAM OS DOIS, EUGE

NIA E CLAÜDIONQR ASSISTINDO A TELEVISÃO; DEUSDETE VOLTA EM SEGUIDA)

DEUSDETE - Tudo bem. Foi só lhe dar um passe que adormeceu.(SENTA-SE

NA CADEIRA DO PAPAI. EUGENIA E CLAÜDIONQR NAO DESVIAM OS 0-

LHOS DA TV) As pessoas precisara ter fé. Eu também era assim.

Mo sentia sozinha, desamparada. Um dia me levaram a um cen-

tro espírita e de lá pra cá, foi uma escalada. Era uma res-

mungona. Só vondo. Agora, quero mais ó ovoluir na consciens

cia cósmica. Qualquer religião serve. A crença está em nós.

Vocês já leram "Universo em Desencanto"? (NINGUÉM RESPONDE)

Não??? Pois o Procópio Ferreira ó adepto fervoroso. Já a Dar

Iene proferiu ser presbiteriana. Para tudo se tem uma rospos_

ta. A gente nunca deve desanimar.

EUGENIA - Chega, mamãe. Hão fomos à missa só para nãoouuíãr o semãio.

DEUSDETE - (LEVANTANDO-SE DE SOPETAO) Nossa.1 Que gente esquentada.’ Bom

já ó hora mesmo de arrumar o jantar. Daqui há pouco, vou a

cordar Deusdenia. Há quatro horas, que êsso programa começou.

Hoje tenho 3urpresas para vocês. Surpresas esotéricas, ó cia

ro. Sômpj?© hsvidades espirituais. (SAÍ 30XSNEMSNTB)

EUGENIA _ (LEVANTA-SE E VAI AO TELEFONE) Alo? Dr. Paim? Como vai? Ê Eu

Gênia Badia. Dr. Paim, estamos precisando dos seus serviços


bran.riqtn.cpr.pte h. , $

EUGENIA - ... cora urgência. Acho quo Deusdonia* rainha irraa, enlouqu^E

cou. Corao o senhor serapro nos assessorou emocionalçiente, re_

. solvi telefonar desejando Polis Páscoa o convidá-lo a comer

uns ovos conosco. Assim* aproveita* e examina Deusdonia; -13.o

quoro quo o meu bebe corra risco. Muito obrigada* Dr. Paira,

Eu o rainha mãe* era nome do meu oai* estsmos agradecidas. .

DEUSDETE - (ENTRANDO -COM UM PRATO FRIO: UMA GRANDE MAIONESE EM FORMA DE

PEIXE) Maionese de peixei Tudo nesta casa tem significado.

(COLOCA 0 PRATO EM CIMA DA MESA)

EUGENIA - (APROXIMANDO-SE) Convidei o Dr. Paira p.v

qui.

DEUSDETE - Corao? Não tomos ninguém doente.

EUGENIA - Não tora? Não venha rao dizor que Claudionor 6

da casa.

DEUSDETE _ (COM RAIVA) Deusdenia está só nervosa. Ela veiu do ma rao

trópole* entendeu? Uma metrópole. Olhe aqui, Eugenia.* eu

vou curar sua irmã com passes magnéticos. Eu vou cura-la

com fé. Não precisamos de módico. Telefona já pro Dr. Paim

e desmarca.

EUGENIA - Você devia ficar» do meu lado. Eu vou lhe dar um neto. Deus-

denia só lhe dá dissabores.

DEUSDETE - Chega, Eugênia. Hoje é dia de reza. Vai comer chocolate.

EUGENIA - Mamãe, a senhora ostá pondo o meu bebe em perigo. Quando eu

for pra Nigéria* não vou escrever uma única carta. Não sabe

rá notícias minhas. Vou sumir do mapa. Nunca verá o seu no-

to. Nuncaí

DEUSDETE - Assim* não dá. Sai* Eugenia. Vá chamar sua irmã para jantar.

EUGENIA - Eu, heim? Não quero mais olhar-lhe as fuças.

fiíiuSDETE - (AO TELEFüNE) Dr. Paíti? Ê Doüsdeto. Como vaí? Eu QV&PÍ&/ ôg

mo boa cristã que sou, antes de qualquer outra crença* dese_

jar-lhe Feliz Páscoa. (OUVE) Dr. Paim? Gostaria de adiar o


tiR AN,RIO TN.CPR.PTE. J240__t {fj

DEUSDETE - .. nosso encontro pra anahiáã, , de antenão, raais

duas receitas de Gardenal 0,5® pro meu genro, por favor»

Claudionor Aristides Penha. Obrigado, doutor.Ais6 amanhã.

EUGENIA (FURIOSA) 0 Claudionor ainda tem uma caixa inteira de Gar-

denal, dona Diabete. }

DEUSDETE - Nao faz mal. (OLHA © lí IRONIA) Atráz de una, ven outra. A-

final de contas, e un nedicanento que elo vai toner pra sem

pre.

üUGüNIA - Meu marido ó herói de guerra e não un neurótico qualquer.

DEUSDETE - An... Eugenia, já enchi. Não no tire a tranquilidade. (SOBE

A ESCADA. jSÁRA NO MEIO) 0 jantar será servido dentro de meia

hora. Vou ne vestir. Tenho surpresas. Sempre novidades espi.

rituais. Sempre un degrau a mais na escalada cósmica.

xjvjG^í,- (DESLIGANDO A TV, ACORDA CLAUDIONOR QUE RONCA) Levanta, Clau

dionor. A guoroba tá pronta.

CLAUDIONOR- Tô cuma fone de jógue. Que horas são?

EUGENIA - Não sei. 0 único relógio quetemos parou no meio-dia,'há dias,

(iSEãlA-SE NA MESA) Por que será que parou na hora Inóço?

CLAUDIONOR- ubaj Maionese.’ (3 METE A MJ10 NO PRATO)

EUGENIA - Tira a não, Claudionor. Não fique Imitando anúncios do pro-

pagandaJ

(DEUSDENIA DESCE A ESCADA, LENTA E APÁTICA. SENTA-SE A MESA SEM ■ OLHAR

EUGENIA E CLAUDIONOR)

EUGENIA - (FALANDO COM CLAUDIONOR COMO SE DEUSDENIA NAO ESTIVESSE ALI)

Eu vou adorar a Nigéria, Claudionor. Voco viu no folheto,

qual é a maior riquesa da Nigéria? Nascemos eom boa estrela.,

nãto ó, Claudionor? Agora, 3e voco tem preconceito, quo fique

tftulj popque lí sô ta pptfr,

CLAUDIONOR- Eu li os folhetos
t.PTE«UO_»-^
BRAN,RIOTN.CPR.PTE_Xhh P- 29

EUGENIA - Pois 6. Sm compensação, vocô vai poder comprar um au to move o.

estranjeiro sem taxas de importação. (RI) Estou louca pra te

ver com o seu calção, nadando no Rio Niger. Quero tirar uma

foto sua junto com os hipopotamos.

( DESCE DEUSDE NUM MODÊLO DE GOLA MEIO ACHINESADA- ESPACIAL, NUíxü COR

SÓBRIA. TODOS PASMAM; ,ELA VEM ATS A CABECEIRA DA MESA E SENTA-SE Gola ui

SOLENE)

DEUSDETE - Crianças... Hoje não é um dia qualquer. Ê um domingo muito

especial. Eugenia, Deusdenia, Claudionor, eu vou lhes falar

sobre os Atlantos. (PAUSA GRAVE)

EUGENIA - Mais uma, mamãe?

DEUSDETE _ 0 mundo passou uma fase do ignoranciatotal desde que olos se

foram.

EUGENIA - ELEs quem, mamãe?

DEUSDETE - Os: Atlantas,-Eugenia.

EUGENIA - Quem são? Alguma família vizinha?

DEUSDETE - Não deboche, Eugenia. Pra conversar comigo, sroco tinha que

ter lido, pelo menos, "Eram os Dousos Astronautas” de (BAI-

XINHO) Eric vonDunken... (PALA BAIXINHO PORQUn PRONUNCIA

MAL OU NÃO SABE BEM 0 NOME DO AUTOR)

EUGENIA - Mamãe, sirva o jantar. Claudionor já está com una cara do oo

bo, de tanta fome.

(DEUSDENIA CONTINUA CALADA, DE OLHOS BAIXOS, AUSENiE)

DEUSDETE - (LEVANTANDO-SE AFLITA, PAZ SINAL COM A3 MÃOS COMO m ESIIVE^

SE OUVINDO ALGUMA COISA) Calem-seJCalem-se. Um objeto não-

identifiçado acaba de passar em cima do teto oue nos abr?u;

ga. (RESPIRA FUNDO COMO SE ESTIVESSE MEIO EIví TRANSE) Son-

MPüiã? ãfliltiiiWi â pfiãâfigôIB á&

EUGENIA (COM AS MÃOS NA CABEÇA) Com tantas mães no mundo, ou tinha

do 3or filha do Dousdete Petrovna 31 avabsky.


BR AN,RIO TN.CPR.PTb 4A40 ,
——PjQ
U

DEÜSDETE ü (MAIS UMA VEZ, CORTA, CÊDE) Bem, já que não estou agrach __

do como oradora, não Insistirei. Pior cego é aquele que não

quer ver. Eeliz Pascoa 1976. Podem se servir. Deusdenia, de.

me seu prato que vou to sorvir de maionese. (COMEM EM 3IL2N.

CIO. DEÜSDETE PUXANDO ASSUNTO) Hoje, vou administrar-lhes

uns passes magnéticos para que tenham sucesso nas suas emprei.

tadas.

EUGENIA Eu não depondo de sucesso nas minhas empreitadas. Não 6,

Claudionor?

CLAUDIONOR. Só penso no Rio Niger, Eugenia. Estou louco para mergulhar

no Rio Niger.

EUGENIA E você vai. Vai mergulhar no Rio Niger, na África. Longe de

aualquer aborrecimento. Eu, voee e meu filho não precisamos

de tantas orações.

DEÜSDETE Mas a África é tão longe...

EUGEi'í IA 2 longe, sim. Graças a Deus.

DEÜSDETE . Não vão esquecer do levar os medicamentos de Claudionor. La

a negrada não toma essas coisas.

EUGENIA - A senhora está me fazendo mal com esse descarado favoritismo.

(OLHA DE SOSLAIO PARA DEUSDENIA) Deixe estar. Quero mais é

ter minha vida. A vida que eu escolhi*Casada com o homem que

Eu escolhi. (ENCARA A MAE) Vai me dizer que não fui eu que os

colheu o Claudionor? Na Nigéria, quero esquecer que existe ía

mília. Não me avisem nunca da morto de um parente. Eu vou fa-

zer a MINHA família. Nos meus moldes. Com os MEUS padrões.

DEÜSDETE . -2... Isso ô a Vida em seus caminhos paralelos.

(DEUSDENIA LEVANTA-SE COM ÓDIO E COSPE NO PRÓPRIO PRATO)

DEÜSDETE , . Deusdenia,’ Cuspindo no prato que comeu?

DEUSDENIA . . Cuspo, sim. Cuspo que eu tenho nojo. (OLHA PRA TOPOS) Nojo

do tudo
3r\ AN,RIO TN.CPR.PTE. wo tSb

DEUSDETE _ (LEVANTANDO-SE) Tudo, Deusdenia?

EUGENIA - (LEVANTANDO-SE) Tudo? Voce, então, tora nojo do comidas o ne

bêsJ Logo, voco ó pior do que uma assassinai Mamãe, chamo o

Dr. Paira. Dousdonia 6 uma assassina.’

DEUSDENIA - (ENCARANDO EUGENIA COM ÓDIO) TrombolhaJ Voco p uma trombo-

lha, Eugenia.

DEUSDETE - (TENTANO POR PANOS QUENTES) Calma, minhas filhas. Vamos to-

mar os passos, já. Fazer pensamento positivo. Is

vons. Purificações.

(DEUSDENIA ENCHE A MAO DE MAIONESE E JOGANA CARA DE CLÁUDIO®

TIVAMENTE) ,
I

EUGENIA - (DES C ABELANDO - SE, GRITA) Chama o PaimJ Chama o PainJ (VIRA-

SE PARA A MAE) Está vendo? Está vendo, sua louca.? El

queceu de voz. Lambusou a cara do meu maridoJ Patrimônio da

Nação. Claudionor, como ê que você deixou ela te fazer Isso?

(CLAUDIONOR, MORTO DE VERGONHA, TIRA A SALADA DA CARA)

EUGENIA - Bolha J Voce ó um bolha, Claudionor. VaiJ Agora, salva a tua

honra. Seja homem só mais uma voz depois cue os seus vícios

te inutilizaram.1 (PEGA UMA PAGA DE COZINHA, ENORME E ENTRE-

GA PARA CLAUDIONOR) Sobe. Vai atrás dela e acabe com Isso de

uma vez por todas.

DEUSDETE - Não. NuncaJ Um assassinato na minha frente? Nunca.'Claudionor,

largue essa faca.’ Matar ó coisa de sub-raça.

EUGENIA - (ESTUFANDO OS PEITOS) Se é pra partir pra degenoração, vamos

com tôdaj Vai, Claudionor, soja homem.' Não do ouvidos a D.

Deusdote. Suba e mate Deusdonia.

DEUSDETE - (PONDO-SE NA FRENTE) NuncaJ Não o atordoe com seus poderes

negativos, EugcniaJ Ele terá. de passar em cima do meu cadáver!

EUGENIA - Á sotthOPâ sabe que está protegendo a pnopria subVòhsáo ftô tOU

lar? Devia ser a primeira a denunciá-la, dando exemplo as ou

tras mães.
BR AN.RIO TN.CPR,pTEjaUO__

DEUSDETE - Nunca denunciaria nem você nem ela.

EUGENIA - A senhora está expondo em risco a vida do seu neto.

DEUSDETE - Ela não vai fazer mal a ninguém. Dousdenia não ó má. Ela só

tem o defeito de iludir-se, às vezes. £ normal na idade dela.

EUGENIA - Idade dela... A senhor acha queela tem que Idade?

DEUSDETE - Chega, Eugenia.1

EUGENIA - Nunca] A vingança não pode deter o meu caminho. Vai^Rí .udio

nor] Suba e mato Dousdenia] Lembre-se do que você ó um guer-

reiro]

DEUSDETE Claudionor, seu Idiota] Largue essa faca que você vai aca-

bar se cortando. Você nem ao menos sabe empunhá-la. E , o-

Ihe aqui, Eugenia: Deusdenia tem, pelo menos, a qualidade

de ser curiosa. Você devia respeitar]

EUGENIA Respeitar? Ela é urna terrorista] Tomos uma terrorista nos

rondando. Ela não tem nenhuma virtude. Só anda com pederas-

ta, drogada, lésbica e comunista] Ao fogo com ela] Vai,Clau

dionor. Sobe. (CLAUDIONOR DESTA A CHORAR)

CLAUDIONOR, Não aguento mais] Quero ir-me embora] Deixem-me ir pra Fer-

nando do Noronha. Eu quero ir embora] (CHORA)

DEUSDETE Pronto. Olha só o trapo que ficou o seu Lancolot.

EUGENIA - Tome seus remédio, Claudionor. Cuide-se que vou chamar o Dr,

Paim.

DEUSDETE . Se você encostar nesse telefone, Eu gonia Badia, eu vou

lhe dar uma surra]

EUGENIA Ah, é? Então, venha] Desça de seu alt venha] (PEGA 0

telefone)

(DEUSDETE VAI LA, DESLIGA S DA UNS TAPAS DE MAS HO BRAÇO DE EUGENIA)

EUGENIA Eu própria vou ajustar essa conta. (VAI EM DIREÇÃO A ESCADA*

VERMELHA DE FÚRIA. PÂRA, SENTINDO CÓLICAS) ... Mamãe, estou


bran.riotn.cpr.pte *^0 p 5 4^

EUGENIA ..sentiddo o nonS queres?

DEUSDETE - Pela guela, filhinha?

EUGENIA - Claro que nãoíASodel Chama a ambulanciai Vou ter o filho J

(
EUGENIA Chamo a ambulâncii

DEUSDETE - Vai, Claudionor. Liga pro Pronto-SocorroJ (DEITA EUGENIA NO

SOFÁ) Doite-se aqui, minha filha. Não faça movimemto. Calma.

Tudo vai dar certo. Depressa, Claudionori

EUGENIA - Larga do froscurai De logo o endereço e apresso a ambulância;

CLAUDIONOR- Depressa, ambuiâncii DEprossaJ

(DEUSDENIA PASSA POR ELES, INDIFERENTE)

DEUSDETE - Vem, Deusdenia. Ajude aqui. St. aã vai dar a luz.

DEUSDENIA - Sinto não partilhar dessa alegria. (VAI EM DIREÇÃO A COZINHA)

EUGENIA - Ela não se comove nem nas horas atrozes.

DEUSDETE -Calma, Eugenia. Tenha pensamentos positivos. Não vá atrapa-

lhar o parto. Dê a luz ao invés de dar as trevas.

EUGENIA - Pois chega de trovas. Chegal Chegai Claudionor.’ Arrume as noã_

DEUSDETE - Larga de ser ruim, Eugenia.

(EUGENIA SE ARRASTA* AMPARADA POR CLAUDIONOR E DEUSDETE, EM DIREÇÃO A POR

EUGENIA - Adeus, mamãe. Mando-lhe uma foto nossa, do nosso filho e da

África.
BRAN.RIOTN.CPR.PTE 1 £ v 0 ^ ^

DEUSDETE - (ALTIVA) Eugênia... Você registrar esse menino na Ni-

géria. Mas não adiantará nãàa. Deus é bradileiroj

(SAEM TODQS. A SALA PICA SOZINHA. DEUSDENIA VOLTA E COLOCA UM ROCK ALTÍS

SIMO; DANÇA LOUCAMENTE; DEUSDETE ENTRA E DEELIGA A VITROLA)

DEUSDETE Respeito, Deusdenia, respeito; De uma vez por todas. Havera

alguma mensagem construaiva por douras desse cea tempEramen

to rebelde? (DEUSDENIA NÃO RESPONDE) Sim, porquejá é hora de

construir. Não pense que a juvnetude e eterna. Um dia, voce se

encontrará numa encruzilhada, vai procurar por Deju.se nao en

contrará porque estará muito longedele.

DEUSDENIA - Mamãe, pare de fics.r me empurrando Deus.

DEUSDETE - Eu não vou insistir. Quero sósaber de você se haverá algum

rumo na sua vida. Quais sã.o seus planos para o fataro?

DEUSDENIA - Que futuro, mamãe?

DEUSDETE - 0 sou, Deusdenia. Não quero que voce vá dar com os burros

n&água.

DEUSDENIA „ Quero minha herança, mamão. Nao terei como sooreviver so c^..-

meu talento. Não dei certo na carreira. De-me minha parte d^

herança de papai.

DEUSDETE _ Você tentou mesmo, Deusdenia? Acha que lutou o oastante para

ver o seu nome nos cartazos?

DEUSDENIA - Sim. Tenho direito à herança. Me esforcei. Fiz tudo para a-

parecer.

DEUSDETE - Reze, minha filha. Reze.

DEUSDENIA - Não J

DEUSDETE - Não? Você não acredita em nada, Deusdenia?

DSU&OSííJA - ãiffl, No 4infcQS.ro, a herançft]

DEUSDETE - Ora, no dinheiro, todos acreditamos. Você não cre no In vi s 3-

vel? Você, uma vez, me falou que a gente tinha de voltar p„


DEuSDETE -ra a Natureza. Você v . Deusdenia? E aquela comuhld

DEUSDENIA - Não deu certo

DEUSDENIA - Montar um cine-clube

DEUSDETE - Como?

DEUSDENIA --‘Um cinema

DEUS DE TE (ASSUSTADA) Um cinema aqui em casa?

ça? Quero um cinema onde se exibirá 03 grande3 filme quenão

foram sucesso. Os primeiros filmes de Brian de Palma...

DEUSDETE - Deusdenia... Não aceite seu fracasso tão cedo

DmüSDmnIA - ?ra mim, o mundo acabou. Não quero mais saber de nada. Vou

abrir upa cinemateca.

DEUSDETE - Nada do desespero. Os Atlantes vão voltar.

DEUSDETE - As desgraças vão acabar

DeüSDEEE - Ta, Deusdenia. Acho que o hora mesmo de cada uma de nôs se-

guir o seu destino. Eu já tenho o meu. (CALA-SE SOLENEMENTE)

DEUSDENIA - Eu, não. Sou a famosa "SEM Destino".

DjsüSDETE - ^ REVELADORA) Minha filha, eu vou para AKARTJ

DEUSDENIA - Akart?

DEUSDETE - Ê um planeta que está arrebanhando pessoas evoluídas para u-

Gm§9iêmí& míop, Rqq@'qí vápà&fc mn§&§§m &q qemendaste

Dan-el diretamente da navo-mãe. Achei que minha missão ainda

não tinha terminddo aqui na Terra. Agora,acho que posso ir.


BR AN,RIO TN.CPR.PTê _j__

{${ CEMURAY*
FEDE
DEUSDENIA - Vai pra Marte, dona Dousdove

DEÜSDETE Vou. Mou caminho é a fé. Vou já arrumai* as malas. An.te^J te-

lefonarei para o Hospital. Quero saber :-so o oebe do eugenia

já nasceu.

DEUSDENIA - (DEBOCHANDO) Que abnegação... Que sublime renúncia... Mamãe,

a senhora, antes de ir, podoria revelar-me o segredo de

tira a? (VAI ANDANDO PARA A ESCADA. PÁRA, VIRA E PALA) Juro

que não espalho. (SOBE.A ESCADA)

DEÜSDETE - (ENGOLE SÊCO. SOZINHA) Ê tão tarde na Vida quando começamos

a nos acostumar com o Inesperado. (SENTA-SE CÕNCENTrUiDA; rre

ciso mentalizar a nave-mãe. ( DE OLHOS FECHADOS).,. Comandar

tb Dan-él? Comandante Dan-élá Dousdete Moreira quer entrar

em contacto. Comandante Dan-él... (0 TELEFONE TOCA. mLA ATm£[

DE) Alô? Solar dos Moreira. Fala a mãe, Dousdete. Está sim.

Um minuto. (GRITA) Deusdenia.' Ê pra vocôi

DEUSDENIA - (DESCENDO A ESCADA NUM ROBE ESCANDALOSO) AlO? OiJ Como é que

voce soube que eu estava na cidade? Sentiu meu cheiro? Estra

vaganza. EstravaganzaJ Boite? Claro que adoroJ Ta. Passe

mesmo. ( DESLIGA) Mamãe, a senhora queria saber diou futuro?

Pois é. Vou à boito com Ronaldo. Lembra do Ronaldo? Aquele

antigo flirt?

DEÜSDETE - Deusdenia, não atrapalhe minha concentração. Ê um problema

de esferas.

DEUSDENIA - Vou mo vestir. (SAI CANTANDO) Ale-luiaí Ale-luia...

DEÜSDETE - (PEGANDO 0 TELEFONE) Alô? Maternidade S. Judas Tadeu? Quero

falar para o quarto de Eugenia Badia Penha. (OUVE COM CARA

DE ESPANTO) Como? Quóntuplos? (COM OS OLHOS ESBUGALHADOS)

CINCO meninas? Não, não, não. Obrigada. Eu chamo depois.

$DESLIGA E FEVHA OS OLHOS) Comandante Dan-él... Comandante

D@uãâeiâ Mgpôfom, MIM, §nUm? m qq^Uq^o.

DEUSDENIA - (DESCENDO DE SAIA CURTA) Como já dizia Caymi: Andei por andar,
BR AN,RIO TN.CPR.PTE. uno r Aft

jJj-j u oDEN X A - ... andei e todo o caminho no mar...

DEUSDETE - (SAINDO DO TRANSE, ASSUSTADA) Está falando a propós^ü/o do

suas meias arrastão? Onde vocSpemsa que vaicom essa mini-

saia escandalosa?

DEU 3DEÍJIA - Alto lái Sou uma mulher livre. Não tento privar-me da Libo;

dadei Não azucrine minha sede de viveri

DEUSDETE - Sua irmã acaba do ter quíntuplas e vocS já vai pro freje?

DEUSDEHIA - Cinco meninas?... Minha irmã Eugênia multiplicou-se mesmoJ

DEUSDETE - Eu já tracei meu rumo. Não posso voltar atrás só pra cuidar

das filhas deSugenia. Nem se ela no pedisse do joelhos. Toma

ra que não o faça. Você sabe que eu não resisto a um pedido

de perdão. Deusdenia, ponha uma saia mais recatada. Não que

eu queira te proibir, absolutamente. E queeu acho que você

vai se resfriar com essas coxas de fora. S depois, pra que

ostentar tanto essa liberdade?

DEUSDENIA - Ora, mamãe. Vou a uma festa, numa boite. A senhora sabe o

que G isso?

DEUSDETE - Claro que sei.

DEUSDENIA - Imaginei A senhora é de muito antes da luz negra. Que dirá

da estroboscópica. Pico até c.om medo que conheça o rock and

roll e a luz estrobosóppica.

DEUSDETE Deusdenia, veja a nossa diferença. Não me falte com o res-

peito. Nada do choques de gerações a es3a altura. Sou uma

mulher instruída e crente. Você sa.be disso. Já viu meus di-

plomas rosa-cruz. Escute aqui, Deusdenia, eu ainda vou ser

da Fraternidade-branca. Eu vou passar do Tibet. Porque estou

indo para Akartí

DEUSDENIA (PEGANDO A BOBSA E A ESTOLA) Está bem, mamãe. Se a nave-mãe

madrugada. Tchau. (SAI PORQUE BUZINAM)


BRAN,RIOTN.CPR.pTE /]^Q
DEüoDiiTü, - Adeus, filhinhaj Fuja sempre das forças do MalJ

(DüUSDEUIA DÁ UMA RISADA E BATE A PORTA)

DEUSDETE - (SOZINHA) Bom... Noa sempre aesmo os dias são alegres. Não

poxq^e é ua feriado que tudo toa que correr bem.,(VAI ATS

A MESA) 03 desejos aprisionam. Sé a Renúnoia resolvo a Vida’,

CTlRA o medalhão do pescoço, os brincos e os braceletese íoe

CIMA DA MESA) só a abnegado total nos levará à Iluminação.

(TIRA A PERUCA E POS EM CIMA DA*MESA) Nada poderá no prc-..

A um só plano, enquanto eu sei que são mais do mil. (tira '

AA CALÇA COMPRIDA) Eu quero a Sabedoria Transcendental. (EN-

TRANDO EM TRANSE. IRROMPE A ALELUIA DE HAENDEL) A ONIPRESENÇA J

(LEVANTA OS BRAÇOS PRA CIMA. LUZES PISCAM.) Comandante Dan-

51, da Have-mão do AKART, 7s Lua do Juptor, Dousdoto Moreira

esta entrando em contactoJ

(acordes pinais, luz APOTEó


TICA)
BRAN.RIOTN.CPR.pte 4 SUO
P do

SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL


XE?A£2AI1JB5!0 I* iDutiük FSr-ÍTBAL

521 /7 7 -SC DP/SR/DPF-RJ Emló /€ /ig7 ?

Do
Chefe do Serviço de Censura de Diversões Públicas-SR/DPF-RJ
Ao
Sr. Diretor da Divisão de Censura de Diversões Publicas-DPF

Assunto . Encaminhamento (faz)

Ref.: Prot. n2 G1963 /197 7 -SR/DPF-RJ - SCDP

" A SKSSlfA D* J8POZA •


Peça:
0000 0000 oco 0000 o*oo o 0 0 o ooceoooeeo
©•oooocooooooocooooooooeoooooo oooooooooooeco©
Autor: . mmm 000 ooocooooooooc

Tradução: „

Adaptação
0000
1
Requerente: SP* ??* ClMKMtMi â KMI TRAIS
fo eximo pot Vrt VJtba ) ° ° *
o 0000 © 0 o © o o 000000 000 o 0000 00©

Senhor Diretor:

Para cumprimento do que dispõe o sub-item 1.1 da


Portaria n2 42/75-DCDP, de 26.11.75» encaminho a T^psa Senhoria
um exemplar do texto da peça acima referenciads
Renovo-lhe, neste ensejo, os projz'* s de minha con
sideração e distinguido apreço.

y/7!A
TL:»OW DBÇunXEOS OARCIA
Chefe do SCDP/SR/liPP/RJ
BRAN.Riotn.cpr.pte 13qo ^
MINISTÉRIO OA JUSTIÇA
/ DEPARTAMENTO DE POLÍCIA FEDERAL
DIVISÃO DE CENSURA DE DIVERSÕES PÚBLICAS

PARECER N9

TÍTULO :^_Dasdita do Deusdénia


Autor: Vicente Pereira
an0s
CLASSIFICAÇÃO ETÁRIA: ^

Deusdenia, moça de classe média do interior


insiste em ser atriz, e, nesta tentativa emprega
todos os seus esforços. No entanto, fracassa com
pletamente. íotalmente desiludida volta para a casa
onde moram a mãe, a irmã e o cunhado - um neuró-
tico de guerra. A família é extremamente desajus
tada, tal como Deusdenia. A mãe vive num mundo
muito particular, buscando a solução de todos os
problemas na religião, que aliás não importa /
qual seja, e, metida em questões isotéricas e /
metafísicas, procura encaminhar inutilmente a /
família nesta linha. A irmã e o cunhado comple-
tam o quadro de desestruturaçáo desta família
tão especial.
0 objetivo da peça parece ser o de mostrar
a alienação da realidade existente nos persona-
gens e suas dificuldades de comunicação inter-
pessoal.
Considerando nada haver nela que possa fe
rir as normas censórias vigentes, sugiro sua li
beraçao com impropriedade a ser fixada em 14 anos.

Rio, 21 de junho de 1977

ibriela Wagnèr/Gomes
íéc. Cens. Mat 2.416.%91

DPF-742
t—• BR AN,RIO TN.CPR.PTE. Wo n: SL;

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MINISTÉRIO DA JUSTIÇA
CPR PTE
DEPARTAMENTO DE POLICIA FEDERAL -^L0 f,. 83
, DIVISÃO DE CENSURA DE DIVERSÕES PÚBLICAS

PARECER N9 1121 ,j±

TÍTULO: A DESDITA DE DEUS DE NI. A.

CLASSIFICAÇÃO ETÁRIA: Xj çno::

Dcusdonia 6 uma porsonagogi fracassada na vida artͣ


tica,com um alto grau dos àosajustamonto quo volta para ca
sa dapois do dosistir da luta para so transformar numa ar-
tista famosa.
Sua mão,Dousfloto,ó uma alucinada com religião,bus-
cando nolas,qualquer uma sorvo,a solução para os problomas
do mundo.
A irmã o o marido tambom fazom parto do rol do do
sajustados;tondo ocClaudionor sido amanto do Dousdonia o
ainda um apaixonado pela cunhada.
0 autor fazendo uma crítica à classo módia no quo
so roforo à cultura do massa,à roligiesidade como bãlsamo
para os problomas som solução,ã incapacidade do sor humano
para a comunicação o ã própria familia,constrói uma poça
do protosto ã anti cultura o aos valoros comtomporanoos
quo ó a família o a fcoligião.
Som nada do quo so contitua fator do gravidade sugi_
ro a liberação para maiores do 14 anos ,condicionada po oxa
mo do ensaio gorai

Rio do Janeiro 22 do junho do 1977

\\ VCi (Ho <U A


RTES) ISPITALE DE QUEIROZ
DE® NIC A DE CENSURA

DPF-742
| SRAA/SR/RJ - FICHADO
O '

jMü-DPF * SR/RJ j

2BJi 1708 £ 020572

dO‘Nl OIM‘NV«q
[recebí d o í o

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA

DEPARTAMENTO DE POLÍCIA FEDERAL

Brasília, DF.

^
Ofício nfi 886/77-2 . Em 23/06/77

Do : Diretor da Divisão de Censura de Diversões Públicas

Ao
: Sr. Superintendente Regional do DPF no Rio de Janeiro

Assunto Informação - faz -


Ref. Of. n2 s 528-523-521/77/SCDP/SR/RJ

Senhor Superintendente:
■>

De acordo com a Portaria 042/75-D0DP,


de 26.11.75 e em atenção aos ofícios em referência, informo a V.Sa.,
nacla constar nesta Divisão de Censura sobre as peças teatrais intitu-
ladas 'Ri ::_õDIT.a D- P-ASPiriA” de Vicente Pereira, ”0S Á70DDS OU COf
70 DE IPANEMA." de Pedro Gomes de A. ] eto e ""0 ALTO DOS ALTOS S DAI
XOS" de Paulo Afonso de Lima.

2* Em consequência, as peças teatrais supra


citadas, foram registradas para fins ce controle na Seção comoeten
te, sod os n^s 7757, 7756 e 7755» respectivamente.

La oportunidade, renovo a V.Sa. protes-


te.-, de estima e consideração.
f
Tf

SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL BRAN.RIOTN.CPR.PTe p.tt

DEPA5TAKEH2D £~ r -licia rcrmi

Cf. /T7-0'T'?/nr!/^T ^ & de julho de 1977

Càeie do Serviço do Centura dt BiveraÕao Públioao


Sr. Diretor <*n Divisão de Cenoura de Diversões Pdblioae

t Fnowmlnhewento (fnz)

Senhor Diretor*

Sn aditamento ao oficio 521/77 - SCDP/SH/RJ,


para fina do dispo to do sub-item 1.4 da Portaria 42/75 - DClíf* ’
de 26.11.75» encaminho a V.S», cópia dos pareceres da peça tea-
tral intitulada "a DBS Dl TA DE DEUSBMlA*» de autoria de Vlcénte
Pereira, liberada com impropriodade para menoree de 14 (quator-
ze) anos, aa dependência do encaio &eral.
Ao ensejo, apresento a V.S», protestos de es_
tima e consideração.

PÍÍCÍES
Chefe do SCfDP/SH/liJ
- era exercício -

LSL/
I
' 1
rrr- ■«.
SRAA/jjli/liJ - FiCHADol
t,
lj MDPr ■ Ül&^RU

316õ «927í. 23594 7


MINISTÉRIO DA JUSTIÇA

DEPARTAMENTO DE POLÍCIA
\1
l
U
/1

or. No. 1046/77 SCTC/SC/DCDP DP, 27.07.77

£i0 : Diretor da Divisão de Censura de Diversões Publicas DPF

Ao : Sr. Superintendente Regional do DPF

Encaminhamento (FAZ)

Ref. Of. No. 52l/77-SCDP/SR/RJ

Senhor Superintendente:

De acordo com a Portaria No. 042/75-DCDP,

de 26.11.75 e em atençao ao ofício em referência, encaminho a

V/.Sa. as anexas 1§ e 23 vias do certificado de censura da poça

teatral "A DESDITA DE DEUSDENIA" de Vicente Pereira

W
Na oportunidade,renova a .Sa, protestos

de estima e consideração

DPF-SAv. 258
BRAN
MINISTERJP DA JUSTIÇA ’RÍOTN.CPR' pteJJMo
DSWÍRTAf
RTAMENTO DE POLICIA FEDERAL

CENSURA FEDERAL

Certificado N? 7757/77

A DESDITA DE DEUSD3NIA

ORIGINAL DE VICENTE PEREIRA

APROVADO PELA D.C.D.P.


CLASSIFICA ÇÃO
BRan>RI0t
M.J-Ü.P.F n.cpr .pteJSIiq
CERTIFICADO DA D.C.D.P

Certifico constar no arquivo de registro de peças teatrais deste Serviço, o assentamento

da peça intitulada A DESDITA DE DEUSEENIA

Original de VICENTE PEREIRA 0

Tradução de

Adaptação de
Produção de THAIS PORTINHO PROD. ART. LTDA - RJ
„ .. por
Requerida COARTE :

Tendo sido censurada em 27 de JULHO de 1 9 77 e recebido


a seguinte classificação: IMPROERIO PARA MENORES DE 14 (QUATORZE) ANOS, CONDICIO-
NADA AO EXAME DO ENSAIO GERAL. ESTE CERTIFICADO SOMENTE TERA VALIDADE
QUANDO ACOMPANHADO DO SCRIPT DEVIDAMENTE CARIMBADO PELA DCPP.
R. ♦

t i

Brasília, 03 de AGOSTO de 1 9 77
OFB

DPF-150 >
A
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA KRio tn.c^.,px€ 4 2.40 p.
DEPARTAMENTO DE POLICIA FEDERAL

CENSURA FEDERAL

Certificado N? 7757/77

PEÇA. A DESDITA DE DEÜSDSNIA

ORIGINAL DE VICENTE PEREIHA

APROVADO PELA D.C. D. P. VÁLIDO A TÉ 03 de ASOSTO de 19 82


CLASSIFICA ÇÃ O —-
p MtA
Brasili de 19 *77

auffilim o nuhes
>iretor da DCDP
BR
M.J-D.P.F AN.Rjo TN.CPu.f, , q

CERTIFICADO DA D.C.D.P ' ~~ ~r ^J

Certifico constar no arquivo de registro de peças teatrais deste Serviço, o assentamento

da peça intitulada A DESDITA DE DBUSFBNXA ....

Original de VICENTE PEREIRA #

Tradução de_ —— ——

Adaptação de —
Produção de THAIS FOBTIHHO PROD. ART. LTDA - EJ

Requerida por CQAR^ .

Tendo sido censurada em 27 de JULHO de 1 9_77 e recebido


a seguinte ch'<ifíc*c.sn: IMPROFRIO PARA MENORES DE 14 (QUATORZE) ANOS, CONDICIO-

NADA AO EXAME 330 ENSAIO GERAL. ESTE CERTIFICADO SQ^TENTE TEttJt VALIDADE
QUANDO ACOMPANHADO DO SCRIPT DEVIDAMENTE CARIMBADO PELA DCDP.

DPF-150

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