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MORFOLOGIA DA

Morfologia da Língua Inglesa


METODOLOGIA DE
LÍNGUA INGLESA ENSINO DE HISTÓRIA E
Organizadora Diana de Castro Atagiba GEOGRAFIA
Aline Lúcia Nogueira Medeiros e Ivo Venerotti

CM

MY

CY

CMY

GRUPO SER EDUCACIONAL

gente criando o futuro


Metodologia de Ensino
de História e Geografia

Créditos Institucionais
Presidente do Conselho de Administração:
Janguiê Diniz
Diretor-presidente:
Jânio Diniz
Diretoria Executiva de Ensino:
Adriano Azevedo
Diretoria Executiva de Serviços Corporativos:
Joaldo Diniz
Diretoria de Ensino a Distância:
Enzo Moreira

2019 by Telesapiens
Todos os direitos reservados
A AUTORA
ALINE LÚCIA NOGUEIRA MEDEIROS
Olá. Meu nome é Aline Lúcia Nogueira Medeiros. Sou
mestra (2017) e bacharela (2014) em Geografia pela Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG). Sou pesquisadora do
Núcleo de Pesquisa em Geografia Humanista (NPGEOH) da
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), desde 2014,
através do qual atuo academicamente nas áreas de história
do pensamento geográfico; geografia cultural e humanista; e
ensino de geografia. Atuo profissionalmente como geógrafa,
elaborando e executando projetos de assessoria técnica na área
em Organização não-governamental. Possuo experiência em
elaboração de conteúdo para Educação à Distância e já atuei
como professora do magistério superior na Universidade Federal
dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) em Diamantina
– MG, em 2018. Sou apaixonada pelo que faço e adoro transmitir
minha experiência de vida àqueles que estão iniciando em suas
profissões. Por isso fui convidada pela Editora Telesapiens a
integrar seu elenco de autores independentes. Estou muito feliz
em poder ajudar você nesta fase de muito estudo e trabalho.
Conte comigo!
O AUTOR
IVO VENEROTTI
Olá. Meu nome é Ivo Venerotti. Sou professor e doutor em
geografia, com mais de 10 anos de experiência em projetos de
ensino, dedicado à relação das pessoas com o espaço geográfico.
Atuei em universidades, escolas públicas e em pré-vestibular
comunitário. Sou apaixonado pelo que faço e adoro transmitir
minha experiência de vida àqueles que estão iniciando em suas
profissões. Por isso fui convidado pela Editora Telesapiens a
integrar seu elenco de autores independentes. Estou muito feliz
em poder ajudar você nesta fase de muito estudo e trabalho.
Conte comigo!
ICONOGRÁFICOS
Esses ícones que irão aparecer em sua trilha de aprendizagem
significam:
OBJETIVO OBSERVAÇÃO
Breve descrição Uma nota explicativa
do objetivo de + sobre o que acaba de
aprendizagem; ser dito;
CITAÇÃO RESUMINDO
Parte retirada de um Uma síntese das
texto; últimas abordagens;

TESTANDO DEFINIÇÃO
Sugestão de práticas ou Definição de um
exercícios para fixação conceito;
do conteúdo;
IMPORTANTE ACESSE
O conteúdo em destaque Links úteis para
precisa ser priorizado; fixação do conteúdo;

DICA SAIBA MAIS


Um atalho para resolver Informações adicionais
algo que foi introduzido sobre o conteúdo e
no conteúdo; temas afins;
EXPLICANDO
++
SOLUÇÃO
+ DIFERENTE Resolução passo a
Um jeito diferente e mais passo de um problema
simples de explicar o que ou exercício;
acaba de ser explicado;
EXEMPLO CURIOSIDADE
Explicação do conteúdo Indicação de curiosidades
ou conceito partindo de e fatos para reflexão sobre
um caso prático; o tema em estudo;

PALAVRA DO
REFLITA
AUTOR
Uma opinião pessoal e O texto destacado
particular do autor da deve ser alvo de
obra; reflexão.
SUMÁRIO
UNIDADE 1
O Que é Geografia.................................................................10
A Geografia é nosso dia a dia .................................................10
A Geografia é uma ciência .....................................................16
Como surgiu a ciência geográfica ..........................................17
As diferentes concepções de ciência geográfica ....................20
Geografia tradicional.....................................................21
Geografia quantitativa ..................................................23
Geografia crítica ...........................................................25
Geografia humanista......................................................27
Ciência Geográfica e Ensino de Geografia..........................30
A ciência geográfica no Brasil................................................30
A ciência geográfica e a geografia escolar..............................34
Práticas didático-pedagógicas ................................................38
Cultura escolar ......................................................................40
O Objeto de Estudo da Geografia.......................................43
O espaço geográfico................................................................44
Diferentes escalas .................................................................50
A paisagem..............................................................................52
O lugar....................................................................................56
A região...................................................................................59
Metodologia de Ensino de Geografia 7

01
UNIDADE

ANOS INICIAIS
8 Metodologia de Ensino de Geografia

INTRODUÇÃO
Você sabia que a Geografia que aprendemos nas escolas não
é igual a Geografia científica? Que o nosso dia a dia é recheado
de experiências geográficas, que podem e devem ser utilizadas
nas salas de aulas? Isso mesmo! Chamamos de geografia
do nosso dia a dia, pois todas as nossas vivências acontecem
no espaço e se relacionam com ele. Essa geografia pode ser
mobilizada no aprendizado de forma a desenvolver a capacidade
de leitura do mundo e a orientação espacial dos alunos. Para isso,
precisamos utilizar alguns conceitos geográfico, como espaço,
lugar, paisagem, território, escala, que nos permitem entender os
fenômenos e as relações entre eles que transformam e criam o
mundo que nós conhecemos. Tanto a Geografia científica quanto
a Geografia escolar são áreas que produzem conhecimentos e
leituras de mundo específicas, que nos ajuda a compreender
melhor o mundo. Mas elas são diferentes! Cada uma possui sua
origem, sua história e seus autores principais. Entendeu? Ao
longo desta unidade letiva você vai mergulhar neste universo!
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OBJETIVOS
Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 1. Nosso objetivo
é auxiliar você no desenvolvimento das seguintes competências
profissionais até o término desta etapa de estudos:

1 Compreender a constituição da Geografia cientifica


e suas diversas concepções;

2 Entender as relações entre a Geografia escolar e a


ciência geográfica;

3 Identificar o objeto de estudo da Geografia e as


categorias espaciais principais;

4 Atuar com ética e compromisso com vistas à


construção de uma sociedade justa, equânime,
igualitária.

Então? Está preparado para uma viagem sem volta rumo ao


conhecimento? Ao trabalho!
10 Metodologia de Ensino de Geografia

O Que é Geografia

OBJETIVO

Ao término deste capítulo você será capaz de entender os elementos


fundamentais que caracterizem a Geografia vivida e científica, como
surgiu a ciência geográfica na Europa e no Brasil e as diferentes
concepções dessa ciência. Será capaz de entender como a disciplina
cientifica se relaciona com a geografia escolar, e as principais
categorias espaciais. Isto será fundamental para o exercício de sua
profissão. E então? Motivado para desenvolver estas competências?
Então vamos lá. Avante!

A Geografia é nosso dia a dia


A geografia existe desde sempre e nós a vivemos no nosso
dia a dia. Antes do(a) geógrafo(a) e sua preocupação com uma
ciência, a vida nos mostra uma geografia em ato, marcada pelos
sentimentos em relação ao lar e o cuidado com a casa, pela
exploração das ruas e da cidade, nos caminhos percorridos nos
transportes públicos, no revezamento entre o sol e a chuva no
céu, nos rios e nas pessoas que o vivem quando pescam. O que
somos, pensamos e experimentamos é inseparável dos espaços
onde vivemos (casa, escola, rua, bairro, parque, cidade, região,
país). Nossas vidas estão entrelaçadas pelos espaços, pelos
quais nos movemos e nos quais nossas ações estão localizadas
e a respeito do qual estamos orientados e nos localizamos. O
lugar onde moramos, nossas relações de vizinhança, os lugares
que frequentamos e desejamos, nossos movimentos físicos e
imaginados, tudo isso envolve a geografia.
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A geografia em ato é o dinamismo do mundo vivido, que


envolve tanto nossa vida individual e familiar quanto coletiva.
Coletividades são definidas por classe social (rico, pobre),
raça (indígena, negro, branco), gênero (feminino, masculino,
não-binário) etc. comuns a um grupo de indivíduos que vivem
experiências semelhantes no cotidiano. Essas experiências,
individuais, familiares e coletivas, são o fundamento do
entrelaçamento das vidas com o espaço e caracterizam a
geografia.

Figura 1: Crianças brincando juntas ao ar livre

Fonte: Pixabay

O espaço vivido por nós tem forma, aspecto, som, cheiro,


cor, textura etc. Ele é definido materialmente e preenchido
de características que interagem com o corpo, através dos
sentidos (visão, olfato, tato, audição e paladar) e das sensações
proporcionadas. O espaço perceptivo é prático e vivenciado,
especialmente de uma forma sensório-motora, que é ligada à
locomoção e à intuição. Percebemos o espaço em suas condições
físicas, sociais e culturais.
12 Metodologia de Ensino de Geografia

Para entender melhor, confira esse sensível relato de uma


migrante apalachiana, povo tradicional que vivia na cordilheira
Apalachiana, nos Estados Unidos, marcada pelas sensações em
relação aos diferentes espaços vividos.
Todavia, temos que tornar a lembrar; gosto de
lembrar os dias em que vivemos no vale e nem
Jack e nem eu nos importávamos em saber as
horas. Sabíamos o que tínhamos que fazer e íamos
e o fazíamos. Havia o sol, naturalmente; a hora
do sol era suficiente para nós. Aqui, nunca vemos
o sol. Pergunto a mim mesma: o que aconteceu
com o sol e a lua? Posso caminhar durante
semanas e jamais ver qualquer sinal de lua, e as
estrelas estão sempre atrás de uma nuvem. E o sol
não brilha dentro de nossas janelas; parece que
estamos no ângulo errado. Minha garotinha ouve-
me queixar, porém ela realmente não sabe do que
estou falando. Tinha dois anos quando saímos
de casa, e ela não se lembra daquelas noites com
estrelas tão baixas que você podia estender uma
xícara e enchê-la com elas, diria minha mãe, e a
lua empoleirava-se sobe uma árvore, sorrindo pra
você. E pela manhã, você repentinamente ouvia
os pássaros começarem a cantar e você sabia que
estava gritando o seu alô ao sol, que estavam
tentando chegar ao seu território - da China, não
é? Isso é o que o nosso professor dizia, que à
noite o sol estava na China. Algumas vezes o sol
demorava a vir até nós, de modo que os pássaros
pareciam gritar cada vez mais alto, porque ficavam
impacientes depois de certo tempo, esperando
e esperando. Porém, então, vinha e toda cabana
seria um lugar diferente. Se tivesse de dizer uma
coisa do que mais acho falta, seria o nascer do sol.
E a segunda, seria o pôr do sol. Eu vejo porque
Metodologia de Ensino de Geografia 13

todo mundo aqui tem de ter relógio por perto. De


outra forma, eles jamais saberiam se está claro ou
escuro nas ruas. (BUTTIMER, 1985, p. 187)
O relato dessa migrante demonstra como se deu a relação
dela com o espaço antes, quando ainda morava na aldeia, e
depois, vivendo na cidade. As percepções sobre o céu, o sol e as
horas aconteciam de forma diferente. Para ela, não é surpresa que
as pessoas dependam do relógio para saber as horas na cidade,
pois não possuem visão do céu. Já a filha dela, que cresceu na
cidade, não compreende como era diferente a vivência na aldeia.
Fica claro, a partir desse relato, que existem diversas formas de
se relacionar com o espaço e de percebê-lo.
O desenvolvimento da noção de espaço ocorre ao logo
da vida, variando desde crianças, adolescentes, adultos, até
os mais velhos. Varia também em função da cultura, do nível
de industrialização das cidades, da classe social. Essa noção
de espaço é uma construção, um processo, que envolve vários
planos: perceptivo, cognitivo e representativo. Mas sempre em
relação ao desenvolvimento: mental, sensório-motor, afetivo,
social e cultural do indivíduo.
O que são os planos perceptivo, cognitivo e representativo?
E o desenvolvimento mental, sensório-motor, afetivo, social e
cultural? Esses conceitos estão associados ao desenvolvimento
da criança nos primeiros anos de vida e fundamentados na teoria
de Piaget. O plano representativo corresponde a reconstrução
do mundo a partir da criança, na fase dos 2 aos 5 anos, quando
o egocentrismo intelectual está no auge no decurso dessa etapa.
A dominação do pensamento por imagens encerra a criança em
si mesma. Já o desenvolvimento metal refere-se ao processo do
conhecer, que pode ser entendido como “organizar, estruturar
e explicar o mundo em que vivemos — incluindo o meio
físico, as ideias, os valores, as relações humanas, a cultura de
um modo mais amplo — a partir do vivido ou experienciado”.
Portanto, o principal elemento desenvolvedor da criança, para
14 Metodologia de Ensino de Geografia

Piaget, é a interação, com objetos e pessoas, que vai responder


aos desenvolvimentos mental, sensório-motor, afetivo, social e
cultural.

ACESSE

Para entender melhor o que é a teoria do desenvolvimento da


criança elaborada por Piaget, acesse: http://bit.ly/2RiLa8j. (Acesso
em 21/12/19).

O conhecimento do espaço por meio das experiências e


percepções de vida dos indivíduos ou coletividades, a partir
do desenvolvimento mental, sensório-motor, afetivo, social
e cultural, pode ser espontâneo ou intencionalizado por meio
do ensino e da escolarização. O conhecimento do espaço,
geográfico, espontâneo surge em atendimento a necessidades
básicas, como orientação para localização, para movimentação
e levantamento de recursos, como alimentação, ou então para
orientação em relação aos ventos, chuvas, rios e condições
ambientais, em geral.
Diferentes coletividades criam saberes geográficos
diferentes a partir das suas experiências e da percepção que
possuem do espaço. Alguns, como a migrante apalachiana,
valorizam o contato com o sol e o céu. Outras se orientam pelo
relógio, transitando pelo espaço em função do trabalho e da
escola. Existe uma diversidade de conhecimentos geográficos,
dentre eles está o conhecimento científico e escolar.
Hoje em dia, valorizamos os saberes tradicionais das
comunidades mais diversas. Reconhecemos e respeitamos as
identidades, que ligam determinadas pessoas a um grupo ou
Metodologia de Ensino de Geografia 15

comunidade com sentimentos de pertencimentos. A identidade


não é um dado adquirido, não é uma propriedade, não é um
produto. A identidade é um lugar de lutas e conflitos, é um espaço
de construção de maneiras de ser e se estar no mundo. Por isso, é
mais adequado falar em processo identitário, realçando a mescla
dinâmica que caracteriza a maneira como cada um se sente e se
reconhece. A identidade como processo nos fazer ver que ela é
pensar e ser. É uma metamorfose, que se expressa através das
pessoas no mundo e para o mundo.
Não basta, porém, apenas reconhecer que existem as
diferenças, as diversas identidades e saberes. É preciso avançar
para um reconhecer-se nos outros ao observar o diferente e, a partir
daí, “identificar criticamente as relações desiguais tratadas entre
os diversos grupos – e até no interior desses” (GONÇALVES,
2011, p. 21). As diferentes experiências e saberes geográficos
precisam ser valorizadas e trabalhadas na escola, destacando a
necessidade de respeito mútuo. Nesse sentido, a geografia é uma
disciplina que permite aos estudantes tomar conhecimento da
diversidade que compõe o mundo.
É possível fazer um estudo geográfico tanto da nossa casa,
como de todo o mundo. O que importa, depois que constatamos
que cada lugar geográfico é diferente dos demais, é ter sempre
em conta que nosso planeta não é uma realidade homogênea,
mas sim a combinação de diferenças de todos os tipos, que se
expressam em todas as escalas. Estudar a geografia de uma
pequena localidade significa entendê-la em suas particularidades,
mas também na sua inserção na realidade do mundo como um
todo. Estudar a geografia do mundo é procurar constantemente
as maneiras como os diferentes lugares se combinam.
Existe, então, uma abertura para conhecer diversos saberes,
experiências e identidades ao estudar a geografia do mundo.
Entretanto, isso é feito seguindo a orientação do conhecimento
científico geográfico e escolar, que é muito importante também.
O conhecimento da disciplina geográfica é fundamental para
16 Metodologia de Ensino de Geografia

o desenvolvimento enquanto pessoa, social e cultural, e das


competências; para exercer a inclusão e evitar a intolerância
com o diferente. Essencial para viver em sociedade de forma
ética e harmônica.
Vale ressaltar que a transformação da escola em um lugar
de tolerância, igualdade e oportunidade, de respeito às diferenças,
cooperação solidariedade e forte disposição no enfrentamento
a todo tipo de violência, preconceito e discriminação é um dos
desafios trazidos à educação brasileira, pela Política Nacional de
Direitos Humanos.
A geografia é nosso dia a dia. Existe um processo de
conhecimento do mundo e do espaço que ocorre de maneira
espontânea, a partir do desenvolvimento da pessoa e da sua
percepção do mundo, que é fundada nas relações pessoais,
familiares e coletivas. Esse processo gera uma diversidade de
identidades e saberes acerca do mundo, que deve ser respeitada.
A disciplina geográfica é orientada pelo conhecimento científico
e escolar, mas deve sempre valorizar a diferença e problematizar
a desigualdade e o desrespeito.

A Geografia é uma ciência


A Geografia é também um campo de estudo e pesquisa
científica. Envolve a produção sistemática de conhecimento
acerca do seu objeto, o espaço geográfico. Nesse sentido, a
Geografia científica analisa a realidade de maneira integrada,
de conjunto, envolvendo diversos conhecimentos e produzindo
um conhecimento que não é apenas descritivo ou classificatório,
mas muito mais explicativo e analítico (OLIVEIRA, 1999).
As formas ou os caminhos definidos para se produzir
conhecimentos geográficos são estudados e debatidos. Os
princípios, as referências e as experiências que embasam o
conhecimento geográfico científico podem ser questionados e
revistos.
Metodologia de Ensino de Geografia 17

Como a ciência geográfica se relaciona com essa geografia


vivida no nosso dia a dia? Sabemos que as pessoas precisam
de conhecimentos geográficos diversos na vida cotidiana. Elas
tiram elementos essenciais para dar sentido a sua existência,
enquanto pessoa e coletivo, e para construir identidades. As
pessoas crescem e vivem experiências que envolvem morar,
viajar e até sonhar. Quando falamos de geografia, a gente fala da
geografia quer como de um conjunto de experiências, práticas
e saberes comuns a todos os seres humanos, quer da geografia
como ciência. Existe uma ligação fundamental entre esses dois
aspectos da geografia: a científica raciocina sobre as práticas e
os saberes empíricos, a geografia do nosso dia a dia, de cada
um e os sistematiza. O campo geográfico como prática vivida
é muito largo, quiçá infinito. E, até recentemente, a disciplina
científica só foi capaz de sistematizar uma parte dos saberes e da
experiência espaciais das pessoas.
Existem diversas maneiras de sistematizar e raciocinar
sobre a geografia do nosso dia a dia, definidas de forma mais ou
menos formal em função das diferentes concepções de ciência
geográfica. Mas antes de entender melhor essas concepções,
vamos ver como surgiu a ciência geográfica na Europa e como
ela chegou e começou a ser produzida no Brasil.

Como surgiu a ciência geográfica


Foram os gregos, na Antiguidade, que inventaram a
filosofia, a democracia e a política a partir da criação de um
espaço público, dessacralizado, que permitia o debate entre as
pessoas, inclusive e principalmente quando envolviam ideias
contrárias. Esses filósofos antigos, ao refletirem sobre as
coisas do mundo, despontaram um conhecimento geográfico
(OLIVEIRA, 1999). Alguns debates enunciados, então, foram:
a concepção da forma da Terra como esfera; a concepção do
Homem como ser racional, humano, inteligente e histórico; a
concepção do Universo. Surge, assim, as preocupações com a
18 Metodologia de Ensino de Geografia

mensuração do mundo e a geometria, as formas e tamanhos dos


planetas e do sistema solar, a posição ou localização dos fatos
geográficos no mundo (latitude e longitude) e as representações
gráficas desses fatos (mapas) (OLIVEIRA, 1999).
Os gregos realizaram ainda viagens de exploração por toda
a bacia mediterrânea até os confins da Ásia, contataram novos
povos, línguas e costumes, aprenderam novas técnicas e novos
costumes. Com referência a autores que contribuíram de forma
efetiva nesse período para a concepção da ciência geográfica,
destacamos Estrabão (63 a.C. – 24 d.C.), autor de “Geographia”,
um tratado de dezessete livros contando a história e a descrição
dos povos e locais conhecidos pelos gregos (e pelos outros povos
com os quais teve contato) à época.

SAIBA MAIS

O pensamento geográfico desenvolvido pelos gregos e a sua relação


com a cartografia estão destrinchados na obra “Uma história do
mundo em 12 mapas” de Jerry Brotton, disponível em

http://bit.ly/2FPvIeE (Acesso em 17/12/19).

Até o desenvolvimento da ciência moderna, a filosofia


natural foi a expressão usada para designar esse conjunto de
reflexões acerca da natureza e do universo físico de maneira
racional, isto é, estimulando o questionamento e a dúvida,
desenvolvido na Idade Antiga.
Durante a Idade Média, os conhecimentos gregos foram
aprofundados e compilados pelos árabes, que evitaram a
total destruição dos papiros greco-romanos pelas forças que
Metodologia de Ensino de Geografia 19

então dominavam a Europa, aliadas à Igreja Católica e ao


Tribunal da Inquisição. Os árabes, muitas vezes nômades, não
estavam submetidos aos desígnios da doutrina cristã. Por isso,
foram responsáveis por copiar, traduzir e guardar muito do
conhecimento produzido pelos gregos, que eram eliminados
pelos desígnios cristãos. Eles possuíram importantes bibliotecas
e centros de discussão de ideias e produção de conhecimento
nesse período.
No Período da Renascença e ao longo dos séculos XVI e
XVII, as viagens de exploração empreendidas pelos europeus
rumo ao continente asiático e americano reavivaram a busca
por conhecimentos, teorias mais solidas e informações mais
detalhadas. Os naturalistas são muito importantes para a
catalogação de informações sobre o mundo, seus aspectos
físicos e biológicos. Eles eram viajantes, que iam em excursões
de reconhecimento e exploração dos “novos mundos”, isto é,
os territórios conquistados pelos europeus na América, África
e Ásia.
Um importante precursor da ciência geográfica é
Alexander von Humboldt, um alemão que nasceu em 1779 e
morreu em 1859. Ele estudou na Universidade de Frankfurt,
porém não se denominava geógrafo, já que ainda não existia
esse curso na universidade. Porém, ele é considerado o primeiro
geógrafo, e faz seus estudos na América do Sul, onde atuou como
pesquisador-naturalista. Isso significa que ele viajou a América
buscando catalogar as espécies da fauna e flora, identificar
como elas se distribuíam e qual as causas para isso. Suas obras
mais importantes são: “Quadros da Natureza” e “Cosmos”.
Ele estudou os fenômenos naturais, como magnetismo
terrestre, vegetação, relevo. Produziu relatos dessas viagens,
disseminando um fascínio por livros de viagem na Europa,
que são fontes interessantes de pesquisa sobre a América dessa
época. Usava instrumentos como barômetro para descrição e
estudos geográficos, e buscava sempre a relação/conexão entre
os fenômenos.
20 Metodologia de Ensino de Geografia

SAIBA MAIS

Conheça a biografia de Alexander von Humboldt, suas principais


obras e expedições na América do Sul. Disponível em:

http://bit.ly/2Rfbtwr. (Acesso em 17/12/19).

Foi só a partir do final do século XVIII que a Geografia foi


reconhecida como disciplina cientifica na Europa, primeiramente
na Alemanha e na França, quando adentrou as universidades na
forma de cursos de graduação.

As diferentes concepções de ciência


geográfica
A ciência geográfica é demarcada por diferentes
concepções ou leituras de mundo, que se embasam em conceitos
e paradigmas filosóficos diferentes. Essas diferentes concepções
envolvem diferentes formas de relação com a geografia do
nosso dia a dia. É como se, dentro de um mesmo campo de
conhecimento, diversas lentes pudessem ser acessadas para
elaborar leituras diferentes de um mesmo objeto, o espaço. Essas
concepções surgem em diferentes momentos da história do
pensamento geográfico, em diferentes países, a partir de obras
específicas, e se relacionam com formas distintas de ensino da
disciplina geográfica.
Os paradigmas filosóficos que orientam a ciência podem
ser chamados de “métodos científicos”. Para a ciência geográfica,
reconhecemos o uso de quatro métodos principais: o hipotético-
Metodologia de Ensino de Geografia 21

dedutivo, ou positivista, em que se descreve o real através de


hipóteses e deduções; o dialético, cujas relações contraditórias
não precisam ser soberanas e as construções e as transformações
sujeito/objeto são recíprocas; e o fenomenológico-hermenêutico,
em que a sobreposição do sujeito ao objeto geram descrições do
objeto a partir do ponto de vista do sujeito.
Vamos conferir a seguir as principais concepções da
ciência geográfica, como elas surgiram e seus principais autores.
Veremos ainda como elas se manifestam na escola.

Geografia tradicional
A geografia tradicional é a denominação da forma de
fazer ciência geográfica que surge, no século XVIII, com a
criação dos cursos de geografia nas universidades europeias.
É, por isso, nomeada assim. Ela se relaciona com um método
científico positivista, que valoriza a materialidade da existência
humana e análise dessa realidade a partir da segmentação em
temas. Ela se relaciona com a geografia do nosso dia a dia a
partir da observação, da descrição e da classificação dos fatos
encontrados. Embora essa forma de se fazer ciência geográfica
tenha surgido no século XVIII, ela existe até hoje, mesmo não
sendo predominante nas universidades.
Os principais autores dessa concepção são: Paul Vidal de
la Blache, na França, e Friedrich Ratzel, na Alemanha.
Vidal de La Blache foi um francês, que viveu de 1845
até 1918. Ele era considerado um historiador, com um discurso
cultural (focado na materialidade das diferentes culturas). Ele
compreendia a natureza como um espaço aberto às possibilidades.
Compreendia a Geografia como a relação do homem com o
meio. Valorizava os mapas e trabalhava principalmente com o
conceito de região. Suas obras se estabelecem em duas linhas: a
Geografia Regional, formatada a partir da criação de um método
regional, sistematizado em seu livro Quadro da geografia da
22 Metodologia de Ensino de Geografia

França (Tableau de la géographie de France); e a Geografia da


Civilização, trabalhado no livro Princípios da geografia humana
(Principes de géographie humaine).
Ratzel foi um alemão, nascido em 1844 e falecido em 1904.
Estudou Biologia, Química, Geologia e se tornou Jornalista,
podendo assim viajar por várias partes do mundo e teve contato
com vários povos (início pelo interesse por Geografia). Foi
professor da Universidade de Munique. Possui uma concepção
positivista de ciência, focado no espaço como superfície terrestre
e território, valorizando a demarcação de fronteiras. Realizava
uma Geografia comparada (regionalista, ciência natural,
estabelecimento de leis). Criou a teoria do espaço vital, que
entendia o Estado como um organismo vivo com necessidade
e direito de se expandir para sobreviver. Ofereceu, com suas
obras, suporte intelectual para o imperialismo alemão.
Essa forma de fazer ciência contribuiu para uma visão
compartimentada do espaço geográfico, separando em quadros
naturais ou humanos sem observar as relações entre eles. Seus
pressupostos teórico-metodológicos são, basicamente, baseados
em “dividir para conhecer”. Imaginava-se, ainda, que esse
conhecimento produzido era neutro, embora carregasse em si,
como qualquer outro, suas particularidades na leitura do mundo.
No Brasil, a Geografia, institucionalizada na década de
1930, pelas Universidades e pelo IBGE, foi baseada na escola
francesa. Esta Geografia que vai ocorrer no país até a década
de 1960 teve uma forma de trabalhar Geografia essencialmente
descritiva, com o intuito de conhecer as características físico-
naturais, por um lado, e da população, por outro, do território
nacional.
No ensino da geografia, essa tendência se consolidou
no estudo meramente descritivo das paisagens naturais
e humanizadas, sem estabelecer relações entre elas. Os
procedimentos didáticos baseavam-se na memorização e na
descrição dos elementos e conceitos que compõem a disciplina.
Metodologia de Ensino de Geografia 23

Muitas obras didáticas adotam o estudo fragmentado do espaço


geográfico, explorando os quadros naturais, econômicos e da
população, sem relacioná-los.

Geografia quantitativa
A geografia quantitativa surgiu a partir da busca por novos
conceitos e metodologias para ciência geográfica, novas formas
de se realizar a leitura do mundo, mas a partir de um mesmo
método positivista (ou hipotético-dedutivo). Ela rompe com a
visão tradicional da geografia, que enfatizava o empirismo, a
descrição e a análise posterior. A geografia quantitativa surge,
especialmente, nos Estados Unidos e na Inglaterra, no final do
século XIX. A partir dela, são incorporados à ciência geográfica
(ou criados) métodos estatísticos de análise dos mercados
como fator de localização de indústrias e para correlação de
vários índices de fenômenos urbanos; processos cartográfico-
estatísticos combinados, que buscam estabelecer a vinculação
entre fenômenos presumivelmente relacionados entre si. De
maneira que há uma aproximação com a estatística, a cartografia,
buscando rapidez e exatidão nas correlações espaciais. Essa
concepção geográfica gerou linhas próprias de desenvolvimento
do pensamento, como a cartografia moderna e, posteriormente,
o geoprocessamento.
Seu principal autor foi Richard Hartshorne, um geógrafo
estadounidense nascido em 1899 e falecido em 1992. É o autor
de “A natureza da Geografia” (The Nature of Geography) (1939)
e “Perspectivas da natureza da geografia” (Perspective on the
Nature of Geography) (1959). Hartshorne desenvolveu um
novo conceito de espaço, como sendo apenas um receptáculo
que contém as coisas. Ele incentiva também a apropriação pelos
geógrafos de diferentes métodos estatístico e matemáticos.
No Brasil, foi no final da década de 60 e na década de
70, que ocorreram as primeiras tentativas de rompimento com
a Geografia feita e ensinada até então, isso principalmente
24 Metodologia de Ensino de Geografia

pela necessidade de estudos para embasar o planejamento e a


realização de grandes empreendimentos da época. Essa tendência
que teve duração não muito longa, mas com adeptos até hoje,
ficou conhecida como Geografia Teorética ou Quantitativa
(CALLAI, 1995).
No posicionamento teórico desta “nova geografia”, o
conceito de natureza passa a ser entendido como parte de um
espaço geométrico, hierarquizado e a separação entre as pessoas
e o espaço em que vivem é ainda mais aprofundada. A natureza
e o espaço passam a ser visto sob uma lógica produtiva, como
“recurso natural”, e as pessoas são entendidas a partir de números
e estatísticas. Em se tratando do contexto escolar, não se alterou
de forma expressiva os objetivos, que continuava sendo o
enaltecimento das riquezas naturais. Durante esse período, a
escola e o ensino resumiam-se a apresentar através de gráficos,
tabelas e dados numéricos o desenvolvimento econômico do
país.
É nessa concepção da ciência geográfica que ocorre
também a aproximação com a abordagem sistêmica. Essa
abordagem compreende a realidade geográfica a partir da noção
de sistema, que é um composto de matéria, energia e estrutura.
A matéria se caracteriza pelo material que será mobilizado
através do sistema, é aquilo que vai se movimentar. A energia se
caracteriza pelas forças que fazem o sistema funcionar, “gerando
a capacidade de realizar trabalho”. Já a estrutura é constituída
pelos “elementos e suas relações, expressando-se através do
arranjo de seus componentes (CHRISTOFOLETTI, 1979, p 8).
A ciência geográfica é pautada, então, na análise espacial
de todos os elementos e processos físicos que compõem o
sistema ambiental, interpretado como entidades organizadas na
superfície terrestre, fruto das relações entre os Sistemas Naturais
(compostos pelo substrato mineral, o relevo, o solo, o clima, a
fauna, a flora, as águas continentais e as águas oceânicas) e os
Sistemas Antrópicos (junção entre os sistemas de uso e ocupação
Metodologia de Ensino de Geografia 25

existentes, somados as demais características socioeconômicas


do espaço, tais como a localização de indústrias e matrizes de
atividade econômica) (CHRISTOFOLLETI, 1998).
A concepção sistêmica está presente no ensino de geografia,
especialmente nas temáticas consideradas da geografia física.
Entendemos como sistemas: o sistema solar, o ciclo da água, os
relevos, o solo, o clima, entre outros.

SAIBA MAIS

Para conhecer melhor os geossistemas e como eles são entendidos


a partir da leitura da paisagem na geografia consulte “A paisagem e
o geossistema como possibilidade de leitura da expressão do espaço
sócio-ambiental rural” dos autores Janise Dias e Leonardo Santos,
disponível em: http://bit.ly/30jWipL (Acesso em 18/12/19).

Geografia crítica
A geografia crítica surge a partir da necessidade
dos(as) geógrafos(as) realizarem uma leitura de mundo que
compreendesse os diversos conflitos e lutas por direitos que
começaram a tomar partes do mundo nas décadas de 1960 e 1970.
Com base fundamentada no materialismo-histórico e dialético
marxista, a Geografia Crítica buscou interpretar o espaço
geográfico, considerando as relações entre espaço e sociedade
como eixo de embasamento epistemológico. O diálogo entre
processos sociais, espaciais e naturais são entendidos numa
relação dialética e considerados constituintes para produção e
reprodução da sociedade, portanto, são vistos nesta corrente,
como plano de análise da geografia.
26 Metodologia de Ensino de Geografia

Um dos principais autores dessa concepção, conhecido


internacionalmente, é o brasileiro Milton Santos. Nascido em
1926 e falecido em 2001, estudou na França e exilado em 1964.
Formado em Direito, considerava-se um “militante de ideias”,
que corresponde com um rompimento com a suposta neutralidade
acadêmica. Sua obra apresenta enorme complexidade teórica,
com elementos de diversas concepções e uma amplidão de autores
que respondem pela riqueza de sua abordagem. Compreende
a Geografia como instrumento de mudança. Aborda, em suas
obras, o subdesenvolvimento, pobreza, Globalização econômica
e a desigualdade social.

SAIBA MAIS

Assista essa entrevista com o professor Milton Santos, realizada em


31 de março de 1997, que está disponível em: http://bit.ly/30lTtnW
(Acesso em 18/12/19).

Esse movimento consolidou-se no Brasil na década de


1980, com um amplo espaço de discussões e debates em torno
do papel do ensino da geografia. Straforini (2008, p.56) sobre
o assunto escreve que: “O papel da educação e, dentro dessa, o
do ensino de geografia e trazer à tona as condições necessárias
para a evidenciação das contradições da sociedade a partir do
espaço, para que no seu entendimento e esclarecimento possa
surgir um inconformismo e, a partir daí, uma outra possibilidade
para a condição da existência humana”. A Geografia centra-se
no estudo das relações de trabalho e de produção e no ensino
insere-se no estudo de conceitos como: divisão internacional
do trabalho, globalização, problema ambientais, relações de
produção, entre outros.
Metodologia de Ensino de Geografia 27

Geografia humanista
A geografia humanista é uma concepção da ciência
geográfica que surge em paralelo às primeiras reflexões da
geografia crítica. Objetivava uma nova leitura do mundo, que
fornecesse alguma atenção para os aspectos subjetivos. É
desenvolvida nos Estados Unidos e na Inglaterra na década de
1960. Um dos seus principais questionamentos é: “Pode a ciência
continuar a servir a uma função útil medindo e explicando a
face objetiva e esboçando mecanismos da realidade social, ou
deve também penetrar e incorporar suas dimensões subjetivas?”
(Anne Buttimer, 1969:419).
Uma de suas autoras principais é a geógrafa estadunidense
Anne Buttimer, que se doutorou em Geografia em 1965 na
Universidade de Washington (Seattle), falecida em 2017. Em uma
de suas obras enfatizou a questão do estoque de conhecimento
geográfico das pessoas não confinadas à educação formal, a
geografia do nosso dia a dia. A geógrafa questiona se o mundo
vivido não seria constituído com base na tensão entre os níveis
de ideias e valores (noosfera), da ação e das rotinas temporo-
espaciais de interação (sócio-tecnosfera) e dos ritmos do corpo
no meio (biosfera). De forma que, para ela, seja por essa ou
por outras vias, o(a) geógrafo(a) que busca estudar os tipos de
experiência de vida no mundo deve começar a investigação pela
própria biografia.
A geografia humanista aproxima-se de uma concepção
filosófica chamada de fenomenologia, que considera a
experiência das pessoas e coletivos como a base para a produção
de conhecimento, assim como a arte (literatura, música, pinturas,
entre outras) e as produções populares.
No Brasil, a geografia humanista se inicia a partir da
década de 1990 e alcança hoje um intenso desenvolvimento,
especialmente ao explorar as relações entre a geografia e a
fenomenologia. No contexto escolar, tornou-se expressivo o
interesse por esta corrente, que acabou chamando a atenção de
28 Metodologia de Ensino de Geografia

vários especialistas do ensino de geografia pela valorização que


propunha à dimensão afetiva.

SAIBA MAIS

Sobre as relações entre a geografia humanista e geografia escolar,


leia a dissertação de mestrado intitulada “Geografia Humanista e
Ensino-Aprendizagem: Perspectivas em Formosa-GO” do geógrafo
Rodrigo Capelle Suess, disponível em: http://bit.ly/2NrxpmV
(Acesso em: 18/12/19)

Todas essas concepções coexistem ainda hoje na produção


acadêmica e escolar. É importante entender que elas se articulam
na leitura do mundo, apresentam desenvolvimentos próprios
e diversos(as) geógrafos(as) transitam entre elas na leitura de
mundo que realizam.
E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo
tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente
entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos resumir tudo o
que vimos. Você deve ter aprendido que existem duas geografias:
a geografia do nosso dia a dia e a geografia científica. A geografia
científica surgiu, em seus primórdios, na Grécia antiga, mas
apenas se iniciou de fato com a criação de cursos de geografia
nas universidades europeias no século XVIII. Vimos também
que a geografia cientifica se divide em várias concepções, sendo
ela: tradicional, quantitativa, crítica e humanista. Embora elas
apresentem lentes distintas para a observações e leitura do
mundo, podem ser relacionadas.
Metodologia de Ensino de Geografia 29

Figura 3: As diferentes concepções da Ciência Geográfica

Fonte: adaptado de REIS JUNIOR, 2011


30 Metodologia de Ensino de Geografia

Ciência Geográfica e Ensino de Geografia

OBJETIVO

Ao término deste capítulo você será capaz de entender como a


geografia escolar se relaciona com disciplina cientifica, e como se
configura a geografia escolar na escola. Você também verá como
a Geografia científica chega ao Brasil. Isto será fundamental para
o exercício de sua profissão. E então? Motivado para desenvolver
estas competências? Então vamos lá. Avante!

A geografia se divide, de forma ampla, entre a geografia do


nosso dia a dia e a geografia científica e escolar. Agora, vamos
refletir sobre a geografia escolar. É a mesma nas universidades
e nas escolas? É uma simplificação? Como elas se relacionam?
Como a geografia do nosso dia a dia se relaciona com a ensinada
na escola?

A ciência geográfica no Brasil


A história da geografia no Brasil surge de maneira diferente
da Europa, recebendo, porém, suas influências e conhecimentos.
Ela aparece primeiramente nas escolas e, quase um século
depois, é institucionalizada a partir da criação de universidades,
quando a ciência geográfica começa a ser produzida.
No período colonial, basicamente, eram os jesuítas e outros
grupos (ordens religiosas, bispados, o governo real, confrarias
e sociedades literárias) que eram encarregados da educação
no Brasil. A geografia não se configurava como disciplina
acadêmica, ela era um saber produzido em função do governo
real e da ocupação do território, muitas vezes pelos próprios
Metodologia de Ensino de Geografia 31

jesuítas (VEIGA, 2007). Os conteúdos trabalhados, então, nas


aulas de Geografia, ministradas pelos jesuítas, eram diversos,
como relatos de viagem, curiosidades, relatórios estatísticos
sobre países, astronomia, porém sempre eram ensinados sob a
forma didática de memorização, disposto em extensas listas de
nomenclatura (NAIEMER, 2015). Vale ressaltar que a instrução
era reservada apenas para os filhos da elite colonial.
No Brasil, a Geografia pensada enquanto disciplina escolar
teve início no século XIX, ligada inicialmente ao Colégio Pedro
II, criado em 1837 na cidade do Rio de Janeiro, e foi sendo
posteriormente incorporada ao currículo oficial das demais
escolas do país. Cavalcanti (1998, p. 18) afirma que a Geografia
foi caracterizada como uma disciplina voltada para a “transmissão
de dados e informações gerais sobre os territórios do mundo
em geral e dos países em particular”, de maneira a difundir a
concepção de nação e território brasileiros, padronizando a
língua, os costumes e constituindo uma identidade nacional
específica.
Depois da independência, a institucionalização
da escola pública, gratuita e obrigatória passou
a representar um elemento de afirmação do novo
governo do Brasil – ou seja, era um ato político
com o objetivo de organizar e dar coesão à nova
sociedade nacional. As elites política e intelectual
do país se investiram da missão de civilizar o povo,
representado por elas como indolente, descuidado
e atrasado. Acima de tudo, no entanto, caberia
à educação desfazer os valores miscigenados
e a diversidade de comportamentos de uma
população, ela própria miscigenada e diversa,
homogeneizando-os em novos parâmetros e
atitudes. (VEIGA, 2007, p. 131)
32 Metodologia de Ensino de Geografia

A criação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro


(IHGB) em 1838 representou um primeiro esforço no sentido
da acumulação e sistematização de dados e informações sobre o
território brasileiro. Com a Proclamação da República, em 1889,
foi inaugurado um período de transformações significativas no
país, sendo que, na educação, foi instituído o ensino laico, a
manutenção de uma organização curricular enciclopédica e a
sua função como o principal vetor da ideologia e dos discursos
nacionalistas. Já na transição para o século XX, percebemos que
o objetivo da educação no país era a formação dos “brasileiros”,
isto é, a criação de um sentimento nacional e legitimação da
cidadania republicana (CARVALHO, 2015).
A geografia no Brasil começa a ser pensada e produzida
no contexto científico e acadêmico apenas na década de
1930. A criação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras
da Universidade de São Paulo (USP), em 1934, e a criação
da Universidade do Distrito Federal (1935), atualmente
Universidade Federal do Rio e Janeiro, demarcam o início
dos cursos de graduação em geografia, com a contratação de
professores geógrafos principalmente franceses (trouxeram para
o país um modelo baseado na importante Escola Francesa de
Paul Vidal de La Blache) e alemães, diretamente da Europa, que
lançam as bases da ciência geográfica com intensa influência das
concepções desenvolvidas nesses países.
Outras instituições que contribuíram para a formação
da ciência geográfica brasileiras são: o Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), criado em 1930 no Rio
de Janeiro, que tinha como objetivo primeiro desenvolver o
conhecimento do território nacional através da racionalização de
uma política de coleta de dados estatísticos que dariam suporte à
administração pública; e a Associação dos Geógrafos do Brasil
(AGB), criada em 1934 pelo francês Pierre Deffontaines, em
São Paulo.
Metodologia de Ensino de Geografia 33

SAIBA MAIS

A história do pensamento geográfico brasileiro tem sido cada


mais estudado, evidenciando-se suas origens, transformações
e influências. A obra “História da ciência geográfica: espectro
temático e uma versão descritiva” de Dante Flávio da Costa Reis
Júnior aprofunda na trajetória dessa ciência e está disponível em:
http://bit.ly/30j9ZFq (Acesso em 17/12/19)

Mesmo com a criação das universidades e cursos de geografia,


a sistematização desse conhecimento, no Brasil, dependeu,
em grande parte, da disciplina escolar. A institucionalização
acadêmica da geografia ocorreu, principalmente, em função da
necessidade de ser formar professores de geografia. Até então
os professores eram graduados em outras áreas e tomavam
conhecimento da geografia a partir dos livros didáticos, que
também eram escritos por profissionais que não tinham formação
na área de geografia.
Os livros didáticos, portanto, foram de extrema importância
para a consolidação e sistematização do conhecimento
geográfico no Brasil. Por não haver uma formação específica na
área, os livros didáticos eram adaptados de versões europeias,
influenciados pelas suas teorias e reinventados para o contexto
brasileiro, com o objetivo de formação cívico patriótica.
A ciência geográfica chega ao Brasil a partir dos
ensinamentos jesuítas (e de outros grupos) na forma de
curiosidades sobre diferentes territórios do mundo, enumerados
em listas para facilitar a memorização, em um formato
enciclopédico. Inicialmente, é apenas nas escolas que se vê a
34 Metodologia de Ensino de Geografia

disciplina geográfica, que é difundida entre os seus professores


através dos livros didáticos adaptados da Europa. A disciplina
geográfica passa, então, a ter um objetivo claro: homogeneizar as
noções acerca do território brasileiro e criar uma ideia de nação.
É só na década de 1930 que os cursos superiores de geografia
são criados, professores estrangeiros contratados e há o início de
uma produção científica geográfica brasileira.

A ciência geográfica e a geografia escolar


É importante entender que tanto a ciência geográfica quanto
a Geografia escolar possuem autonomia uma sobre a outra, mas ao
mesmo tempo se entrelaçam numa relação de interdependência
na produção de conhecimentos, sejam eles acadêmico, escolar
ou cotidiano, os quais também se inter-relacionam e produzem
saberes. Já sabemos que o surgimento da geografia nas escolas
aconteceu antes mesmo das universidades no Brasil. A história
da geografia cientifica e escolar se entrelaça, mas mobiliza
arcabouços, concepções e autores distintos. De forma que a
Geografia ciência tem referenciais próprios, que expressam os
limites de sua investigação, assim como a Geografia escolar.
Durante décadas, a relação entre conteúdo científico
e escolar foi concebida a partir do conceito de transposição
didática, desenvolvido pelo autor francês Yves Chevallard
(1991). Transpor didaticamente um saber científico é “fabricar
artesanalmente os saberes tornando-os ensináveis, exercitáveis
e passíveis de avaliação no quadro de uma turma, de um ano,
de um horário, de um sistema de comunicação e trabalho”
(PERRENOUD, 1997, p. 25). Isso significa dizer que o conteúdo
científico passa por transformações até se transformar em
conteúdo escolar. Não se trata, necessariamente, de um processo
de simplificação, mas de transformação qualitativa, de natureza
pedagógico-metodológica, na qual o conteúdo científico se
transforma em conhecimento a ser ensinado, para que chegue
aos alunos do ensino básico.
Metodologia de Ensino de Geografia 35

A ideia de transposição didática parte do pressuposto de


que o saber escolar é subordinado ao acadêmico, encontrando
nele seu principal critério de validade e legitimidade. Indicando
que os pesquisadores que se dedicam ao entendimento dos
saberes escolares, as concepções e práticas que os norteiam,
precisam fazer um movimento investigativo que, partindo da
sala de aula da escola, vai em direção a universidade, entendendo
neste percurso as transformações pelas quais o conhecimento
geográfico passou.
“A relação entre uma ciência e a matéria de ensino
é complexa; ambas formam uma unidade, mas
não são idênticas. A ciência geográfica constitui-
se de teorias, conceitos e métodos referentes
à problemática de seu objeto de investigação.
A matéria de ensino Geografia corresponde ao
conjunto de saberes dessa ciência (...) convertidos
em conteúdos escolares a partir de uma seleção
e de uma organização daqueles conhecimentos e
procedimentos tidos como necessários à educação
geral” (CAVALCANTI, 1998, p. 9).
A teoria da transposição didática gera algumas
consequências políticas e formativas no ensino e na formação
docente em Geografia. Em primeiro lugar, ao considerar o
saber acadêmico como origem do saber escolar, contribui para
reforçar a ideia de que professor da escola é um mero reprodutor
de conteúdos e conhecimentos produzidos por outras pessoas.
Nesse sentido, não é incomum que disciplina geográfica seja
trabalhada numa aula com características enciclopédicas, com
ênfase em estudos descritivos, onde o professor é visto como
transmissor e o aluno receptador desse conhecimento.
O ensino de geografia na escola, sob essa visão, deve ensinar
um sistema ou uma combinação de conceitos mais ou menos
encadeados entre si, de uma forma simplificada ou transformada
para que o aluno consiga compreender. Contrários a esta
36 Metodologia de Ensino de Geografia

posição, alguns pesquisadores apontam para uma necessidade


de reconhecimento das características específicas dos currículos
escolares, repensando a relação entre os conhecimentos escolares
e científicos. Um dos pontos convergentes destas pesquisas é o
conceito de cultura escolar, construído no interior das pesquisas
sobre história das disciplinas escolares e saberes docentes.
A geografia que se ensina não é, portanto, uma reprodução
simplificada da geografia científica, mas um arranjo de diversos
fatores como: o ambiente escolar, a cultura dos agentes da escola
e as práticas didático-pedagógicas do professor (CAVALCANTI,
2012). Entendemos, então, que são espaços distintos que
produzem conhecimento ao lidar com o pensar geográfico, um
científico e outro escolar, cada um com compreensão própria e
grau de intensidade e dificuldade diferentes.
Já a relação da geografia escolar e da geografia do nosso
dia a dia traz outros elementos. Cavalcanti (1998, p. 11) afirma
que a espacialidade em que os alunos vivem na sociedade
atual, como cidadãos, é bastante complexa. Seu espaço, diante
do processo de mundialização da sociedade, extrapola o lugar
de convívio imediato. Em razão dessa complexidade, que
é crescente, dificilmente as pessoas conseguem sozinhas e
espontaneamente compreender seu espaço de um modo mais
articulado e crítico, considerando as diversas escalas (do local
ao global). O conhecimento mais integrado da espacialidade
requer uma instrumentalização conceitual que torne possível aos
alunos a apreensão articulada desse espaço, e aí temos um dos
objetivos da geografia escolar.
Metodologia de Ensino de Geografia 37

REFLITA

Sabemos que, em se tratando da produção de saberes geográficos,


sejam eles acadêmicos ou escolares, é preciso considerar que estes
fazem parte da formação (inicial e continuada ou em processo),
e que nunca são conclusivos, estão sempre em construção e
ressignificação, inclusive a partir da geografia do nosso dia a dia,
não é mesmo?

Portanto, mais do que pensar em uma simplificação


ou transposição do conhecimento científico para escola, é
importante considerar que a escola tem uma cultura particular,
que os estudos da geografia apresentam particularidades quando
produzidos nas escolas.
A geografia escolar tem uma história particular, que
toma configurações particulares, porque é delimitada tanto
pelas amarras institucionais e disciplinares, quanto pelas
contingências cotidianas particulares de cada escola, de cada
espaço onde se situa e de cada interlocução entre as pessoas que
envolve professores, funcionários e alunos, e destes com as suas
geografias do dia a dia.
A geografia não se divide apenas em científica e do nosso
dia a dia. A geografia escolar é igualmente importante. O que
ensinamos nas escolas não é resultado de uma simplificação
dos conhecimentos científicos, nem de uma transposição.
38 Metodologia de Ensino de Geografia

A geografia escolar é um espaço autônomo de produção de


conhecimento, com cultura, história, pesquisadores e teorias
próprias. Precisamos estimular, cada vez mais, as trocas entre a
geografia escolar e a científica, o entrelaçamento e a cooperação,
sempre respeitando a autonomia e relevância própria de cada
uma.

Práticas didático-pedagógicas
As práticas didático-pedagógicas são uma particularidade
da geografia escolar, constituindo um dos elementos que a
diferenciam da geografia científica. De um lado, o objetivo
educativo das práticas docentes indica uma necessidade de
viabilizar a aprendizagem, de outro uma particularidade na
produção de saberes do docente.
Ao mesmo tempo em que compreende a geografia científica,
no plano pedagógico, o professor mobiliza conhecimentos
construídos no processo de reflexão sobre a prática social dos
profissionais da educação, tendo como base saberes relacionados
à pedagogia e à didática, ou seja, ao saber ensinar.
O processo pedagógico deve possibilitar aos alunos,
através do processo de abstração, a compreensão da essência dos
conteúdos a serem estudados, de modo que sejam estabelecidas
conexões internas específicas desses conteúdos com a realidade
global, ou seja, com a totalidade da prática social e histórica.
Esse é o caminho por meio do qual “os educandos passam do
conhecimento empírico ao conhecimento teórico científico,
desvelando os elementos essenciais da prática imediata do
conteúdo e situando-o no contexto da totalidade social”
(GASPARIN, 2005, p.7).
Percebemos, assim, a importância do papel desempenhado
pelo professor nesse processo pedagógico. Ele é a peça chave
dessa articulação, embora o contexto escolar esteja permeado
Metodologia de Ensino de Geografia 39

por outros tipos de mediações. É através da prática docente, do


dia-a-dia da sala de aula, que esse conhecimento ganha sentido e
relevância social para os alunos.
Nesse sentido, o professor, em seu processo contínuo
de formação constrói, adquire e desenvolve múltiplos saberes
na sua prática, os quais contribuem para sua competência
profissional e para estimular a aprendizagem dos alunos. São
saberes adquiridos com a prática docente, as experiências e
dificuldades cotidianas, que diferem de qualquer conhecimento
científico acerca da disciplina geográfica.
Quando consideramos, ainda, que o ensino e a
aprendizagem são dois processos diferentes, com protagonistas
diferentes, a reflexão sobre as diferentes maneiras de
ensinar Geografia e sobre como os alunos aprendem se torna
fundamental. São diversos os caminhos possíveis e existe uma
necessidade de compreendermos esses processos. É importante
considerarmos também que as políticas públicas educacionais
impactam diretamente o cotidiano e a institucionalidade escolar,
interferindo nas formas de ensinar e, portanto, no conhecimento
geográfico escolar.
Tardif (2002) caracteriza o saber docente como plural. Ele
é composto por vários saberes, que são provenientes de contextos
diferentes, originados das propostas curriculares, das disciplinas,
do trabalho profissional e das experienciais pessoais. Pois, “os
professores de profissão possuem saberes específicos que são
mobilizados, utilizados e produzidos por eles no âmbito de
suas tarefas cotidianas [...]” (TARDIF, 2002, p.228). Esse saber
docente é mais um elemento na configuração da diferença entre a
geografia escolar e científica. O saber docente é constantemente
criado, trabalhado, experimentado, discutido e estudado pelos
professores de geografia, alimentando daí a própria geografia
escolar. De forma que os professores são, em suas atividades
docentes cotidianas, mais criadores do que reprodutores.
40 Metodologia de Ensino de Geografia

Como você, professor, pode se envolver mais


profundamente com as questões específicas de sua disciplina e
ter reconhecido seu potencial como produtor de conhecimentos
e de subjetividades?
Esse conjunto de saberes docentes, advindos da prática,
já está sendo sistematizado e pesquisado através dos canais
acadêmicos, enriquecendo as discussões científicas acerca da
geografia, e contribuindo para evidenciar as particularidades da
geografia escolar e as trocas entre docentes.

Cultura escolar
Quando estudamos a história da disciplina geográfica
escolar, especialmente no Brasil, percebemos que ela é diferente
da história da ciência geográfica. Existe, inclusive, uma origem
própria da geografia enquanto disciplina escolar anterior ao
processo de institucionalização da geografia como ciência
moderna. Definitivamente, a geografia foi uma matéria própria
do ensino primário e secundário antes de merecer categoria
universitária, quando foi considerada que era “um conhecimento
que era preciso ensinar aos futuros professores a fim de que eles
o ensinassem, por sua vez, a seus alunos” (LESTEGAS, 2012,
p. 20).
A geografia escolar acontece em espaços diferentes e é
protagonizada por autores e autoras diferentes. A geografia escolar
possui uma construção própria, que se desenvolve numa cultura
particular. Chervel (1990) denomina de “Cultura Escolar” esse
conjunto de conhecimentos, competências, atitudes e valores que
a escola se encarrega de transmitir explicita ou implicitamente
aos estudantes como bagagem cultural e patrimônio comum de
todos os cidadãos.
Isso significa entender a escola como uma comunidade
de sujeitos escolares, em competição e colaboração entre si,
buscando suas fronteiras e identidades, gerando uma produção
Metodologia de Ensino de Geografia 41

própria, dos próprios sujeitos envolvidos no processo de


construção de conhecimento, relativamente autônoma, mas
imbricada no movimento da totalidade social.
De forma que o conhecimento escolar deixa de ser apenas
tributário do conhecimento acadêmico e passa a ser interpretado
como resultado de uma história própria que diz respeito ao
processo de escolarização da sociedade moderna com foco na
instituição escolar. Partir do entendimento da cultura escolar
como resultado, meio e condição da ação educativa implica
muitos processos, ações e saberes próprios, que vão além da
ideia da transposição didática. O conhecimento acadêmico, seus
atores e espaços de produção deixam de ser o centro do processo
formativo e se tornam mais uma possibilidade de entrada,
necessária, mas não suficiente, no processo de formação docente.
Os outros processos desta formação se constroem no
diálogo constante com a cultura escolar em suas diferentes
dimensões, como profissional, curricular, afetiva e das
experiências. A cultura escolar só pode ser acessada a partir da
imersão, da vivência cotidiana dos desafios e práticas escolares.
Como toda ação educativa é localizada, situada, contextualizada,
cada escola produz uma cultura escolar própria, que é um ponto
em uma rede complexa e dinâmica na qual a relação entre
educação e sociedade se dá no mundo contemporâneo.
Ao mesmo tempo em que sofre a influência de processos
e concepções das mais diferentes dimensões e aspectos
da sociedade, as pessoas envolvidas com a escola, sejam
professores ou não, apresentam também outros conhecimentos,
ações e visões de mundo, próprias da geografia do dia a dia, e
recriam as condições de suas relações a partir do cotidiano da
ação educativa. Por isso mesmo, percebemos a necessidade de
pensar a relação da escola com a sociedade, com outros espaços
de socialização, coletivos e vivências dos alunos, da infância e
da juventude, principalmente nas suas relações com a família,
Igreja e com o mundo do trabalho.
42 Metodologia de Ensino de Geografia

SAIBA MAIS

Entenda melhor o que significa “cultura escolar” e aprofunde na


história da geografia escolar brasileira lendo a dissertação de
mestrado do Thiago Tavares de Souza, intitulada “História da
Geografia escolar: uma possibilidade de estudo da cultura escolar
através da história oral temática híbrida”, que está disponível em:
http://bit.ly/3a8euXL (Acesso em 19/12/19)

Neste sentido, constituem fontes privilegiadas para


compreensão da cultura escolar: livros, cadernos escolares,
objetos, atividades de alunos, provas, fotos, boletins, atas,
planos de ensino, diários de aula, diplomas, espaços escolares,
relatórios, depoimentos, observação, entrevistas; que se juntam
ou precedem os documentos de ordem oficial, como legislações
e currículos.
O currículo é uma produção cultural por estar inserido nessa
luta pelos diferentes significados que conferimos ao mundo.
O currículo não é um produto de uma luta fora da escola para
significar o conhecimento legítimo, não é uma parte legítima da
cultura que é transposta para a escola, mas é a própria luta pela
produção do significado. (Lopes; Macedo, 2011, p.93)
E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu
mesmo tudinho? Agora, só para termos certeza de que você
realmente entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos
resumir tudo o que vimos. Nesse capítulo, você viu que existem
muitas diferenças entre a geografia escolar e a científica. A
geografia escolar é marcada por história e origem próprias,
anteriores a geografia científica. Ela não é uma simplificação ou
Metodologia de Ensino de Geografia 43

transformações dos conteúdos científicos a partir das práticas


pedagógicas. A geografia escolar é marcada pela criação de
conhecimentos específicos, baseados no processo de ensino e
aprendizagem. Os professores criam conhecimentos e maneiras
próprias de ensiná-los no cotidiano da vida docente. Além
disso, existe toda uma cultura escolar que envolve as pessoas
(professores, funcionários, alunos) e a sociedade, como um
todo. Compreender essa cultura escolar é um processo de
vivência cotidiana da escola, seus conflitos e suas conquistas.
Entendemos, então, que a escola é um lugar de produção de
conhecimento geográfico, não de reprodução!

O Objeto de Estudo da Geografia

OBJETIVO

Ao término deste capítulo você será capaz de entender como os


conceitos básicos de geografia são utilizados na leitura do mundo
e trabalhados nas escolas. Isto será fundamental para o exercício
de sua profissão. E então? Motivado para desenvolver estas
competências? Então vamos lá. Avante!

O objeto de estudo da geografia é, de modo geral, o


espaço geográfico. Ele difere do espaço geométrico, que é uma
abstração, ou seja, não é dotado de materialidade, forma, cores,
pessoas. O espaço geográfico é o chão em que nós vivemos,
pode ser entendido por meio dos processos que produzem esse
chão, sejam eles locais, globais ou misturados.
44 Metodologia de Ensino de Geografia

O espaço geográfico pode ser definido a partir de diferentes


conceitos, que são fundamentais no entendimento da geografia.
Esses diferentes conceitos espaciais articulam análises e
pensadores(as), tendo cada um seu contexto. De modo que o
espaço geográfico se desdobra, a partir da análise a ser feita, em
paisagem, lugar, território e região.
Cavalcanti (2012, p. 136) questiona: “o que se ensina,
quando se ensina Geografia?”. Ensinamos a “observar a
realidade e a compreendê-la com a contribuição dos conteúdos
geográficos”, ou seja, um “modo de pensar a respeito de algo”.
Ensinamos, por meio dos conteúdos “a perceber a espacialidade
da realidade”. Ensinamos a perceber o mundo, a geografia
do nosso dia a dia, mobilizando os conteúdos da disciplina
geográfica.
Não podemos ignorar como as dinâmicas espaciais são
relevantes no atual estágio de globalização, em que o mundo se
conecta de formas tão intensas e diversas, nos sentidos técnico,
científico e informacional. Claval (2010, p. 30) afirma que as
“práticas, as habilidades e os conhecimentos indispensáveis a
qualquer vida social têm componentes geográficos”. No mundo
globalizado, não há como evitar falar dos conceitos básicos da
geografia – lugar, região, paisagem, território, territorialidade
– para entender as diferentes concepções de mundo e as
transformações das sociedades.
Veremos como se articulam esses componentes através
das categorias espaciais, ou geográficas.

O espaço geográfico
O espaço geográfico é “manifestadamente físico”, mas o
físico não tem aí o sentido de “geografia física” ou de natureza.
O físico é a materialidade, é uma construção social, nas mais
diferentes escalas, desde um processo de construção espacial
direta até o ato de se apropriar de todo planeta pelas mais diversas
sociedades. O espaço geográfico é um elemento componente da
Metodologia de Ensino de Geografia 45

sociedade, ou ainda, “o espaço não é um reflexo da sociedade,


ele é a sociedade”. Pois “diferentes práticas humanas criam
e usam diferentes concepções de espaço”, como nos ensina
Harvey (2015).
Para Cavalcanti (2012, p.136), é pela elucidação das
práticas espaciais reveladas pelo conhecimento geográfico que se
projeta um cidadão crítico e reflexivo, capaz de ler e compreender
o seu próprio meio em relação com múltiplas escalas. A autora
acredita, ainda, que essa compreensão possibilita que as pessoas
realizem outras práticas espaciais, mais solidárias.
Para compreender melhor a noção de espaço geográfico,
utilizaremos como texto-base a obra “Por uma nova geografia”,
de Milton Santos (1978).
“O espaço é um verdadeiro campo de forças cuja
formação é desigual. Eis a razão pela qual a evolução espacial
não se apresenta de igual forma em todos os lugares” (SANTOS,
1978, p. 122). O espaço geográfico pode ser entendido com um
campo de forças, em que diferentes atores tencionam de modos
conflituosos, cada um com interesses e ideias próprias acerca de
como produzir aquele espaço; alguns possuem mais poder (ou
capital) para implementar suas ideias e predominam. Por isso,
ele é um campo de forças desigual.
Os atores globais que podem e alteram o espaço, em
função de seus interesses, como atividades de extração minerária
e grandes redes hoteleiras, muitas vezes enfrentam resistências
dos habitantes dos locais onde se instalam. A atividade minerária,
de extração, é incompatível com a conservação ambiental
local, comprometendo ecossistemas e formas tradicionais de
habitar. Essas populações locais são, geralmente, afastadas ou
expulsas, seja pela concessão de exploração no local, seja pelas
péssimas condições ambientais consequentes. Já as cadeias
hoteleiras privatizam o uso dos espaços turísticos, que eram
antes frequentados ou habitados pela população local. Os resorts
nordestinos são um bom exemplo.
46 Metodologia de Ensino de Geografia

ACESSE

Para aprofundar nesse assunto, acesse a reportagem “Com 25 praias


privadas, Angra dos Reis ensina como os ricos limitam o acesso
dos pobres ao mar”, da Revista eletrônica EcoDebate, que está
disponível em: http://bit.ly/30krzZx (Acesso em 19/12/19)

Milton Santos (1978, p. 171) diz que o espaço, seja por


suas características e por seu funcionamento ou “pelo que ele
oferece a alguns e recusa a outros, pela seleção de localização
feita entre as atividades e entre os homens, é o resultado de
uma práxis coletiva que reproduz as relações sociais”, de forma
que “o espaço evolui pelo movimento da sociedade total”.
Compreender como ele se modifica e transforma significa
analisar de maneira multiescalar seus fenômenos, que podem
ter origens internacionais (em um acordo, ou na instalação de
uma empresa multinacional no local) e consequências locais (no
bairro, cidade ou região em que se instala).
O conceito de espaço é, portanto, considerado um fator
social e não somente como um reflexo social. Ele apresenta
características que são próprias daquela localidade, como as
características ambientais e as populações locais, influenciando
na forma como os processos, de fato, ocorrem.
Exemplo: Na instalação de uma grande rede
hoteleira nas proximidades de uma comunidade
tradicional, que utiliza o espaço para as atividades
diárias, a população local pode se manifestar de
forma contrária a instalação, levando a um processo
de acordo entre as partes quando da aquisição da
Metodologia de Ensino de Geografia 47

permissão governamental para a instalação (pelo


licenciamento ambiental, por exemplo).
O espaço, assim, precisa ser considerado como totalidade:
conjunto de relações realizadas através de funções e formas
apresentadas historicamente por processos tanto do passado
como do presente. O espaço social corresponde ao espaço
humano, lugar de vida e trabalho: morada das populações. O
espaço geográfico é organizado pelas populações vivendo em
sociedade e, cada sociedade, historicamente, produz seu espaço
como lugar de sua própria reprodução.
Milton Santos (1978) elege as seguintes categorias como
fundamentais na compreensão do espaço: forma, função,
estrutura, processo e totalidade.
A forma é o aspecto visível, exterior, de um conjunto de
objetos. A função é a atividade desempenhada pelos objetos
criados. Já a estrutura, que é social-natural, é a conjugação da
forma e da função que é criada historicamente em determinado
local; é a maneira como a materialidade é criada/alterada naquele
local, considerando sua história. As formas e as funções variam
no tempo e assumem as características de cada grupo social.
O processo significa a ação realizada de modo contínuo
que objetiva um resultado, ou seja, implica tempo e mudança.
Os processos ocorrem no âmbito de uma estrutura, que é social,
ambiental e econômica, resultando de suas ações e contradições
internas. Assim, ao considerarmos esses processos em conjunto,
podemos analisar os fenômenos espaciais na sua totalidade.
“O espaço deve ser considerado como uma
totalidade, a exemplo da própria sociedade que lhe
dá vida (...) o espaço deve ser considerado como um
conjunto de funções e formas que se apresentam
por processos do passado e do presente (...) o
espaço se define como um conjunto de formas
representativas de relações sociais do passado e
48 Metodologia de Ensino de Geografia

do presente e por uma estrutura representada por


relações sociais que se manifestam através de
processos e funções” (SANTOS, 1978, p. 122).
Portanto, entendemos que o espaço geográfico é o resultado
de múltiplas determinações, que são naturais e histórico-sociais.
Em se tratando do ensino, a compreensão da organização
espacial da sociedade vai ocorrer de forma mais concreta se o
professor iniciar os estudos desta organização a partir da análise
dos elementos presentes na realidade espacial vivida pelo aluno,
já que isso estimula o envolvimento do aluno nos estudos e
demonstra como ele se insere ativamente no próprio espaço
geográfico.
Caso isso não ocorra, cairemos num tipo de ensino em que
elementos físicos e elementos sociais do espaço serão estudados
de forma apartada e estagnada e a cartografia, que pode ser
usada metodologicamente para discutir os diversos elementos do
espaço geográfico e suas transformações, se tornará um tópico à
parte e sem sentido.
Confira abaixo uma atividade sobre o espaço geográfico
elaborada pela professora Noemia Ramos Viera, em 2001, para
seus alunos do Ensino Básico (5º ano).
Inicialmente fizemos uma pesquisa entre todos os alunos da
escola para identificar qual era a marca de borracha mais
utilizada na escola. O resultado foi a marca “Faber Castell”.
Para representar os resultados obtidos com a eleição do
objeto, e com a pesquisa sobre a marca mais utilizada de
borracha-apagador, construímos gráficos de barra e de setor.
Posteriormente construímos textos que explicassem o significado
dos gráficos. Essa atividade de modo específico, contribuiu para
que o aluno se apropriasse de alguns conteúdos procedimentais
utilizados pela ciência geográfica na análise e compreensão
da realidade. Em seguida os alunos, em grupo, passaram a
observar com mais atenção o objeto escolhido e a elaborar
Metodologia de Ensino de Geografia 49

questionamentos sobre ele. O resultado destes questionamentos


foi uma lista de 50 questões a serem respondidas e esclarecidas
sobre a natureza da borracha-apagador. Assim, diante da
impossibilidade de esclarecimentos dessas questões, pois, nos
deparamos com muitas dúvidas sobre a borracha apagador,
passamos a buscar estratégias para o esclarecimento de tais
dúvidas. Nesse sentido abrimos duas frentes de pesquisa sobre
a borracha apagador, uma delas, com a participação direta dos
alunos, teve prosseguimento com os conhecimentos prévios dos
alunos e com pesquisa em enciclopédias, revistas, jornais, livros
didáticos, internet, entrevistas, etc. e a outra se encaminhou
através do envio de uma carta à Faber Castell contendo as
dúvidas a serem esclarecidas. Assim, enquanto aguardávamos a
resposta da Faber Castell, demos prosseguimento a outra frente
da pesquisa. A partir dos conhecimentos prévios dos alunos
e daqueles obtidos através da pesquisa conseguimos obter
esclarecimentos sobre todo o processo-histórico de produção da
borracha-apagador (descoberta do látex, invenção da borracha,
produção, distribuição, circulação, comercialização e consumo
da borracha apagador). Em seguida, os alunos construíram
esquemas representativos do trajeto realizado pela borracha
apagador desde a fonte da matéria-prima até a sua chegada ao
consumidor e vice e versa. Essa atividade foi importante para
que visualizássemos a totalidade e a integração do espaço que
a sociedade estabelece na produção dos objetos (mercadorias).
Ao chegar as informações da Faber Castell, juntamente com
as já obtidas pelos alunos, passamos a um aprofundamento
do assunto, principalmente das noções de cartografia. Nesse
contexto, todas as informações coletadas sobre a borracha-
apagador foram representadas nos mapas de São Paulo, Brasil
e do Mundo. Com os esclarecimentos da Faber Castel, além
de uma sistematização cartográfica do espaço geográfico da
borracha-apagador nas suas diversas escalas (local, regional,
50 Metodologia de Ensino de Geografia

estadual, nacional e mundial), foi possível estudar diversas


temáticas. Terminamos o ano letivo estudando de forma mais
aprofundada o processo histórico de produção da borracha, o
qual serviu como introdução aos estudos sobre o processo de
regionalização e organização do espaço brasileiro, tema a ser
trabalhado na série seguinte.
Disponível em: http://bit.ly/2QRk9Ka (Acesso em
19/12/19).

Diferentes escalas
A escala focaliza um recorte ou uma extensão espacial,
e envolve elementos e fenômenos vislumbráveis no contexto
recortado. Ou seja, diferentes elementos e fenômenos são
observados a partir de diferentes escalas geográficas, sendo
elas: local, municipal, regional, estadual, nacional, continental
e global. Alguns fenômenos são determinados em uma escala
global, mas se inserem no espaço geográfico numa perspectiva
local, como é o caso das empresas multinacionais. Outros
fenômenos são típicos de sistemas ambientais, como o clima, e
possuem características globais (efeito estufa), mas perpassam e
atuam em todas as escalas climáticas.
É comum conceber que fenômenos globais afetam todas
as outras escalas. Já os fenômenos locais só afetam, de forma
geral, na escala local, mas vão sendo influenciados pelas escalas
subsequentes. Entretanto, as maneiras como os fenômenos são
afetados não é igual. Ou seja, um fenômeno global pode afetar
todos os locais, mas de formas desiguais, correspondentes,
complementares ou envolvendo uma subordinação entre eles.
Ao analisar o espaço geográfico podemos articular as reflexões
em função das escalas, lembrando que elas são conectadas.
As análises que levam em consideração mais de uma escala
são chamadas de multiescalares. A escala, portanto, confere
Metodologia de Ensino de Geografia 51

visibilidade a um fenômeno, seja qual for sua característica


(econômica, social, cultural, política etc.).
A perspectiva multiescalar permite levar em conta as
naturezas diferentes das escalas, possibilitando conciliar tanto a
escala topográfica (distâncias que são espacialmente medíveis,
isto é, demarcadas por quilometragem) como a escala topológica
(em função da proximidade e distanciamento vivenciados, que
não está necessariamente ligados a distância física), articulando
a distância e a proximidade em termos de extensão territorial e
em termos virtuais. Uma escala material, outra imaterial, mas
ambas reais e concretas porque se constituem como sínteses de
múltiplos fenômenos.
Exemplo: A escala, então, ao conferir
visibilidade aos fenômenos permite a observação
de como eles se articulam em diferentes níveis.
Veja um exemplo na figura abaixo.

Figura 3: Articulação entre fenômenos em uma perspectiva multiescalar segundo Neil Smith

Fonte: Adaptado de SMITH (2000)


52 Metodologia de Ensino de Geografia

A escala não é uma forma de representar o espaço ou


indicadora de abrangência (como a escala cartográfica), nem
é um dado prévio da realidade, mas sim uma construção, uma
forma de análise geográfica, que articula ou isola. A escala
permite a compreensão dos fenômenos que interajam no/com o
espaço: os mais diversos grupos e coletivos, com seus diferentes
pressupostos ideológicos (econômico, o político, o partidário,
ou o utópico), e as mais variadas filiações culturais, sejam de
gênero, classe, religião, etnia ou idade. A escala não deve ser
entendida como algo inerente ao objeto, mas como uma forma
de se conceber o mundo, de se relacionar com, e compreender,
o meio geográfico.
Nesse sentido, não existe uma escala mais ou menos válida,
a realidade está contida em todas elas. Entendemos, porém, que
a escala da percepção é sempre ao nível do fenômeno percebido
e concebido, ou seja, no nível de vida da pessoa. A escala não
fragmenta o real, apenas permite a sua apreensão.
A noção de escala, então, define a articulação de
diferentes fenômenos espaciais, possibilitando que os alunos
compreendam as relações existentes entre fatos nos níveis local e
global. Portanto, no decorrer do Ensino Fundamental, os alunos
precisam compreender as interações multiescalares existentes
entre sua vida familiar, seus grupos e espaços de convivência e
as interações espaciais mais complexas.
Para compreender a totalidade do espaço geográfico,
precisamos mobilizar várias escalas, as quais podem ser
municipais, regionais, estaduais, nacionais, globais, e/ou
construídas socialmente, como distintos níveis de interação.

A paisagem
A paisagem é, muitas vezes, associada ao olhar em
perspectiva de retrato ou pintura, à fisionomia de uma certa área.
Ou, em outras palavras, a expressão visível da natureza. Essa
Metodologia de Ensino de Geografia 53

associação se conecta com às origens da ciência geográfica,


durante as viagens naturalistas e a grande divulgação dada aos
relatos no século XIX, que favoreceram a ideia da paisagem
como características físicas de uma dada área. Alexander von
Humboldt se destaca nessa fase por suas famosas e pioneiras
descrições de paisagens, enfatizando a necessidade de praticar
observações e descrições cuidadosas e precisas das formas
visíveis em campo, inclusive com a utilização de desenhos e
pinturas para ilustrar.
Entretanto, a dinamicidade da paisagem, que engloba
as relações e conjunções de elementos naturais e tecnificados,
socioeconômicos e culturais, rompeu com a ideia de paisagem
como fisionomia estanque.
A paisagem traz as marcas das atividades produtivas das
populações, os seus esforços para habitar o mundo adaptando-o
às suas realidades. Ela é marcada pelas técnicas materiais que a
sociedade domina, e responde às convicções religiosas, às paixões
ideológicas ou aos gostos estéticos dos grupos. Constitui desta
maneira um documento-chave para compreender as culturas
e o único que subsiste frequentemente para as sociedades do
passado (CLAVAL, 2001).
“a paisagem é uma fusão de diferentes perspectivas, é
natureza e cultura, ambiente e percepção, objetiva e subjetiva,
funcional e estética. É o esforço da imaginação que deve agregar
essas possibilidades em só sentido” (PÁDUA, 2013, p. 76).
A paisagem é revelada na relação com as pessoas. Ela
não existe sem alguém que a sinta. A paisagem é o encontro,
o acontecer simultâneo de um local, um olhar e uma imagem.
A paisagem chega a nós originariamente como sentir. Por isso,
podemos explorar os sentidos para caracterizar as paisagens;
não apenas a visão, mas o olfato, o paladar, o tato e a audição.
54 Metodologia de Ensino de Geografia

Falamos, nesse sentido, de paisagens com características


sonoras, olfativas, de sabor e textura. Não apenas acessamos a
paisagem pela visão, mas como todo o corpo sensível.
Cavalcanti (2008, p. 51) afirma que “[...] a paisagem
o domínio do visível – a expressão visível de um espaço –,
o domínio do aparente, de tudo o que nossa visão alcança; o
domínio do que é vivido diretamente com nosso corpo, com
nossos sentidos – visão, audição, tato, olfato, paladar; ou seja,
trata-se da dimensão das formas que expressam o movimento da
sociedade. A observação e a compreensão dessas formas servem
para dar caminhos de análises do espaço.”
A paisagem envolve características ambientais e culturais,
em uma mistura característica da dinâmica do espaço geográfico.
Podemos sentir e analisar a paisagem em qualquer local, basta
para isso se dispor a realizar essa atividade.
Testando: Feche os olhos e respire fundo
algumas vezes. Abra os olhos. Repare no seu
entorno, nos cheiros e sons que chegam até você.
Anote todos eles. Ande um pouco e repare mais.
O que você escuta? O que você pode provar? O
que você sente? Desenhe ou escreva um texto
descritivo. Na sequência, analise sua produção. O
que é possível descobrir ou perceber sobre o espaço
geográfico que você está vivendo agora? Quais
relações multiescalares é possível estabelecer?
O conceito de paisagem deve ser trabalhado na
caracterização do seu aspecto dinâmico e relacional, possibilitando
a compreensão, em partes, do complexo espaço geográfico em
que vivemos. Para tanto, os estudos devem considerar o maior
número possível de elementos que caracterizam e formam a
paisagem, que são responsáveis por sua dinâmica, considerando
suas dimensões objetivas e subjetivas, culturais e naturais.
Metodologia de Ensino de Geografia 55

Através do trabalho com o conceito de paisagem,


podemos estimular o aluno a interpretar e expressar sentimentos,
crenças e dúvidas com relação a si mesmo, aos outros e às
diferentes culturas. Podemos, assim, promover o acolhimento
e a valorização da diversidade das pessoas e coletivos, dos
seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem
preconceitos de qualquer natureza, considerando também a
geografia do nosso dia a dia.
Cavalcante (1998) realizou uma atividade sobre o conceito
de paisagem, através de registros de observações em sala de
aula, questionários, atividades em grupo e conversas com os
alunos, considerando as relações possíveis entre o conhecimento
científico da ciência geográfica e os saberes construídos pelos
alunos em situações escolares. A “paisagem” foi um dos
conceitos captados nas representações destes alunos, das quais
há depoimentos como “campo cheio de rosas, árvores dando
fruto, tudo colorido. Muita coisa boa”. A autora observou que a
ideia de paisagem que está sendo construída por essas crianças
é estereotipada, é uma imagem estática, que não apresenta
dinâmica. Além disso, é inteiramente focada na visão e não
conversa com a necessária leitura do espaço geográfico. Por
isso, ao se trabalhar a paisagem é preciso explorar os sentidos e
as sensações do corpo, sua relação com espaço vivido e com a
multiescalaridade dos fenômenos que se expressam ali.
O desenvolvimento da capacidade de observação e de
compreensão dos componentes da paisagem contribui para a
articulação do espaço vivido com o tempo vivido, ao indicar as
transformações ocorridas na paisagem - o que é possível ainda
ser sentido e o que não existe mais, sempre em relação com o
corpo e a pessoa que sente a paisagem.
56 Metodologia de Ensino de Geografia

SAIBA MAIS

Para compreender melhor o significado de paisagem, leia mais


sobre a experiência de ensino de Luciana Maria Santos de Arruda,
intitulado “GEOGRAFIA NA INF NCIA PARA ALUNOS
COM DEFICIÊNCIA VISUAL: a utilização de uma maquete
multissensorial para a aprendizagem do conceito de paisagem”,
disponível em: http://bit.ly/2FNJdvl. (Acesso em 20/12/19).

O lugar
O lugar é categoria espacial que mais se aproxima das
nossas vivências, experiências e sentimentos pelo espaço.
Quando possuímos afeição ao lar, o espaço da casa, estamos
trabalhando com essa categoria, o lugar. O lar é um lugar, a pátria
(sentimento de afeição por uma nacionalidade), uma poltrona
ou nosso espaço preferido da casa ou da escola, tudo isso são
lugares. Lugares marcam nossa história de vida, podem ser a
casa dos avós ou uma praia que conhecemos pela primeira vez.
São constituintes da nossa identidade, do nosso dia a dia.
A experiência expressa a capacidade de aprender a partir
da própria vivência; significa aprender, atuar sobre o que foi
vivido e criar a partir dele. São as experiências que transformam
espaços em lugares: assim, lugares podem ser entendidos como
espaços cheios de significados adquiridos pelas experiências
e vivências. Por isso, “o que somos como seres que vivem,
pensam, experimentam é inseparável dos lugares onde vivemos
– nossas vidas estão saturadas pelos lugares e pelas coisas e
outras pessoas entrelaçadas a estes lugares” (MALPAS, 2001,
p. 231).
Metodologia de Ensino de Geografia 57

O lugar se refere, então, a uma pessoa ou coletivo. Pessoas


diferentes estabelecem relações e sentimentos pelos espaços de
forma diferentes, portanto o lugar não é sempre o mesmo para
todo mundo. Cada um tem suas referências de lugar. Cavalcanti
(2003, p. 12) afirma que: “A identidade do lugar permite que
as pessoas tenham uma identificação com o mesmo, mas acima
de tudo é necessário que cada sujeito construa a sua identidade
singular”. Assim, mesmo que o lugar seja um espaço significativo
para um grupo familiar ou uma coletividade, é preciso que cada
pessoa tenha suas experiências próprias e crie sua identidade
singular.
Yi-Fu Tuan (2013), geógrafo sino-estadunidense, afirma
que o lugar é pausa no movimento. Isso não significa dizer que o
lugar é estanque, mas que, para nos conectarmos com o espaço,
significar o espaço, precisamos parar por um tempo e viver o
espaço, tornando-o um lugar para nós.
Exemplo: Assim, no processo de sentir e
compreender uma paisagem, por exemplo, pode
ser que façamos uma parada. Nós nos sentamos
em um banco na rua. Ali, comemos um lanche
e conversamos. Observamos as pessoas se
movimentarem e, ao fim de uma tarde agradável,
aquele banco tem um significado diferente para
nós: ele se tornou, então, um lugar. Quando
passamos de novo por aquela rua, olhamos para
o banco e lembramos da tarde agradável que
vivemos ali.
O lugar é um núcleo de significados fundamental para
a configuração da identidade individual de cada pessoa. Ele
envolve o entrelaçamento das pessoas e coletivos com o espaço,
e seu estudo revela essa história. O estudo do lugar revela como
as pessoas e coletivo se relacionam com o espaço que vivem,
quais locais possuem mais ou menos significado. Assim, essa
categoria geográfica focaliza, numa escala mais local, a relação
58 Metodologia de Ensino de Geografia

das pessoas e coletivos com o espaço geográfico em suas


dimensões subjetivas e emocionais, das memórias e histórias de
vida, das identidades.

SAIBA MAIS

Para compreender melhor o significado de lugar, leia o belíssimo


relato de Marisa Terezinha Rosa Valladares e Regina Célia Frigério,
intitulado “GRAÚNA: ...voos e cantos de crianças no currículo
quilombola de uma comunidadescola...”, disponível em:

http://bit.ly/3a9Sg7Y. (Acesso em 20/12/19)

Figura 4: Diferentes referenciais de território a partir de suas dimensões principais.

Fonte: adapado de SANTOS et. al., 2015

O território pode ser considerado como delimitado,


construído e desconstruído por relações de poder, sendo que
nem sempre ele é fixo. Alguns territórios, como de algumas
relações de trabalho ou grupos culturais, aparecem apenas em
determinados turnos do dia, ou épocas do ano. Essa categoria
Metodologia de Ensino de Geografia 59

espacial envolve o espaço ocupado por diferentes atores sociais


que se territorializam a partir de uma intencionalidade. Assim
sendo, a delimitação do território pode não ocorrer de maneira
precisa, e ser irregular e periódica.

A região
A região é um conjunto de áreas ou paisagens que possuem
características semelhantes ou homogêneas, ou funcionalidades
especificas. Podem ser delimitadas por vários métodos, da
experiência vivida aos meios estatísticos. A região agrupa, por
semelhança, conexão ou influência, áreas do espaço geográfico
que se relacionam. Assim, é possível que características
ambientais definam regiões por semelhança, assim como
características econômicas, sociais, culturais.
A funcionalidade de um conjunto de áreas, que define
uma região, pode ser compreendida pelo movimento de pessoas,
mercadorias, informações, decisões e ideias, de modo que
podemos entender a área de influência de um local sobre o outro,
estabelecida através do nível de relacionamento existente.
A região pode ser definida, ainda, a partir de um conjunto
de lugares ou paisagens que guardam alguma relação ou
semelhança entre si. A região é multiescalar, podendo variar de
tamanho em função do que engloba ou conjuga. Existem regiões
à nível de cidade, mas também do mundo.
Tabela 2: As principais categorias geográficas
60 Metodologia de Ensino de Geografia

Fonte: HAESBAERT, 2014 (adaptado)


Metodologia de Ensino de Geografia 61

E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo


tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente
entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos resumir tudo
o que vimos. Você deve ter aprendido que existem diferentes
formas de compreender o espaço através da Geografia: são as
categoriais espaciais ou geográficas. Todas elas são importantes
para a Geografia, e evidenciam fenômenos ou relações
diferentes. Elas também apresentam escalas diferentes. Mas o
que é escala? Escala é um elemento de análise geográfica que
permite focalizar os fenômenos e relações em um nível de
complexidade específico. É como utilizar a ferramenta “zoom”
quando vamos tirar uma foto ou utilizar o Google Earth / Maps.
Escala pode ser local, municipal, regional, estadual, nacional,
continental e global. No contexto local, nos aproximas das
pessoas, seus espaços e histórias de vida. Já no contexto global,
vemos sistemas ambientais, com o sistema climático, e a
atuação das grandes corporações e empresas multinacionais. As
categorias geográficas podem ser analisadas em uma perspectiva
multiescalar. Mas quais são as categorias geográficas? Vamos
lá! Temos o espaço geográfico, que envolve a totalidade
dos fenômenos e processos, do chão que pisamos ao céu que
vemos quando olhamos para cima. Todas as outras categorias
fazem referência a ele, como recortes específicos. A paisagem,
que é ligada ao sensível e envolve o espaço, natural, cultural
e técnico, no presente e no passado: é ideal para compreender
as transformações que o espaço sofreu com o passar dos anos.
Já a região envolve um conjunto de áreas com características
semelhantes, sejam elas ambientais, culturais, econômicas ou
políticas. Por fim, o território sempre se relaciona com relações de
poder, dominação e ocupação por grupos culturais, econômicos
ou políticos. No seu sentido tradicional, o território nos revela
os espaços delimitados dos Estados-nações, ou seja, dos países.
Todas as categorias são importantes no estudo da Geografia e
devem ser trabalhadas a partir de suas lógicas próprias!
62 Metodologia de Ensino de Geografia

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SUMÁRIO
UNIDADE 2
Temas em Geografia no Ensino
Fundamental:Anos Iniciais...................................................10
Ciclos naturais e a vida cotidiana.............................................10
Os usos dos recursos naturais: solo e água
no campo e na cidade..............................................................14
Matéria-prima e indústria........................................................16
Território e diversidade cultural...............................................17
Diferentes tipos de poluição.....................................................20
Elementos Para O Ensino De Geografia
(Orientação E Expressão cartográfica)................................21
A noção de espaço pela criança...............................................21
As relações topológicas, projetivas e euclidianas....................26
A criança e as expressões do espaço geográfico
através da cartografia...............................................................27
Mapas mentais.........................................................................32
Interdisciplinaridade no Ensino de
Geografia nos Anos Iniciais...................................................35
A interdisciplinaridade.............................................................36
Interdisciplinaridade e linguagens...........................................38
Geografia e História.................................................................42
Geografia e Educação Ambiental.........................................46
Metodologia do Ensino de Geografia 7

UNIDADE

02
8 Metodologia do Ensino de Geografia

INTRODUÇÃO
Ok, Geografia nos anos iniciais é importante, mas o que
posso trabalhar?”. Opa! Então aqui estamos. Certos temas são
incontornáveis, como orientação e cartografia, e mesmo a relação
com o meio ambiente. Outros temas seriam muito estranhos caso
não fossem trabalhados, como os usos dos recursos naturais, a
indústria e a diversidade cultural. E como não poderia deixar
de ser, tudo isso demanda uma perspectiva interdisciplinar, de
forma que a Geografia atravesse as outras disciplinas e outros
campos também façam uso dela. Certamente você estará muito
mais antenando aos debates atuais e mais capacitado para agir
em prol de um ensino de qualidade. Entendeu? Ao longo desta
unidade letiva você vai mergulhar neste universo!
Metodologia do Ensino de Geografia 9

OBJETIVOS
Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 2 - Temas no
ensino de geografia. Nosso objetivo é auxiliar você no
desenvolvimento das seguintes competências profissionais até

1
o término desta etapa de estudos:

Estudar as relações entre educação e trabalho,


diversidade cultural, cidadania, sustentabilidade,
entre outras problemáticas centrais da sociedade
contemporânea.

2 Compreender as representações e linguagens no


ensino de Geografia.

3 Construir referenciais que possibilitem uma


participação propositiva e reativa nas questões
socioambientais.

4
Fortalecer o desenvolvimento e as aprendizagens
de crianças do Ensino Fundamental, assim como
daqueles que não tiveram oportunidade de
escolarização na idade própria.

Convido a vocês a iniciar essa caminhada na direção de um


ensino de Geografia de qualidade! Vamos?
10 Metodologia do Ensino de Geografia

Temas em Geografia no Ensino


Fundamental – Anos Iniciais

OBJETIVO

Ao término deste capítulo você será capaz de compreender


possibilidades de ensino de temas específicos da Geografia –
Anos Iniciais, com atenção à elaboração de planos de aulas com
metodologias ativas e atividades lúdicas, seguindo as orientações
da Base Nacional Comum Curricular para o Ensino Fundamental.
Isto será fundamental para o exercício de sua profissão. E então?
Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá.
Avante!

Para compreender como trabalhar os conteúdos e


temas que compõem as orientações de ensino para o Ensino
Fundamental – Anos iniciais, selecionamos ao acaso quatro
temas, em diferentes anos do ensino, para detalhar possibilidades
e caminhos metodológicos possíveis. Você pode se guiar por
essas possibilidades, mas deve inovar com suas criações, ideias
e formas próprias de exercer o trabalho docente.

Ciclos naturais e a vida cotidiana


“Os ciclos naturais e a vida cotidiana” é uma temática
de ensino do primeiro ano do Ensino Fundamental, um objeto
do conhecimento. Deseja-se desenvolver com esse objeto a
habilidade de o aluno observar e discutir ritmos naturais (dia
e noite, variação de temperatura e umidade etc.) em diferentes
Metodologia do Ensino de Geografia 11

escalas espaciais e temporais, comparando a sua realidade com


outras. A BNCC estipula o objeto do conhecimento e a habilidade
a ser trabalhada, porém o resto é com o professor! Como ensinar?
Como elaborar um plano de aula? Como escolher as estratégias
metodológicas mais adequadas?

IMPORTANTE

Cabe aos professores considerarem a realidade dos alunos, da


cultura escolar na qual se inserem e seus conhecimentos docentes
e estratégias metodológicas, criando, assim, a geografia escolar
no cotidiano e se norteando pelos documentos regulamentadores,
como a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e o Projeto
Político Pedagógico da escola.

Antes de escolher alguma atividade ou modelo de aula, é


preciso considerar a realidade e o contexto dos alunos; o projeto
político pedagógico da escola; as afinidades do professor.
Portanto, é importante considerar que detalhar como trabalhar
com essa temática é uma sugestão de caminho que precisa ser
criado pelo docente em sua sala de aula.
Os ciclos naturais são formas como o planeta terra se
renova. As coisas vivas dentro de um ecossistema interagem
umas com as outras e com o seu ambiente não vivo, para formar
uma unidade ecológica, que é em grande parte autossuficiente
(mas passível de desequilíbrio pela ação humana). Às vezes,
esse processo de renovação é gradual e suave. Às vezes é
violento e destrutivo. No entanto, os ecossistemas contêm
12 Metodologia do Ensino de Geografia

dentro de si os recursos para regenerar-se. A vida na Terra se


desenvolve através de uma reciclagem constante. Os elementos
são continuamente recriados a partir dos átomos que circulam
em cadeias biogeoquímicas. Morte, destruição e decomposição
são partes de um ciclo que possibilita novas estruturações. Entre
os mais importantes ciclos da natureza estão: o da Água, do
Carbono e do Nitrogênio, sendo que a Cadeia Alimentar pode
ser entendida como um Ciclo de Energia.
A compreensão dos ciclos naturais alinha-se a concepção
sistêmica em Geografia, que define o sistema como um conjunto
de partes interagentes e interdependentes coordenadas e não
relacionadas, formando um todo complexo ou unitário, mantendo
um contínuo intercâmbio de matéria/energia/informação com o
ambiente. Permite considerar os fenômenos em uma abordagem
global, com a inter-relação e integração de assuntos que são, na
maioria das vezes, de natureza completamente diferentes.

SAIBA MAIS

Entenda melhor os ciclos naturais e seu comportamento sistêmica


estudando o artigo de Celso Carneiro, Pedro Gonçalves e Osvaldo
Lopes, intitulado “O ciclo das rochas na natureza”, disponível em:
http://bit.ly/2tXDznY (Acesso em 01/01/20).

Instigar os alunos a perceber, em seu cotidiano, os


primeiros elementos que integram esses sistemas, os ciclos
naturais, permite a introdução de habilidades de observação e
análise do espaço geográfico. Vale lembrar que os ciclos naturais
Metodologia do Ensino de Geografia 13

consideram a integração de elementos antrópicos, não sendo


apenas uma noção da geografia física. Observar e discutir ritmos
naturais (dia e noite, variação de temperatura e umidade etc.)
em diferentes escalas espaciais e temporais, comparando a sua
realidade com outras, habilidade a ser trabalhada, envolve uma
primeira percepção das características ambientais dos lugares de
vivência dos alunos, como casa, escola e outros. É importante
trabalhar outras experiências, de viagens e aulas de campo, que
ocorreram em ambientes distintos, considerando os percursos
realizados pela criança em outras esferas, os seus passeios
com a família, as viagens realizadas e o acesso à televisão que
descortina uma série de outros lugares e culturas para o universo
infantil, mesmo que inadvertidamente.
É possível trabalhar a temática a partir de diferentes
atividades e abordagens, todas elas planejadas durante a
elaboração do plano de aula. É interessante estimular as
crianças fazendo perguntas, como: Existem elementos que só
podemos observar durante um determinado período? Como
podemos diferenciar quando está dia e quando está noite? Existe
comportamentos, que na maioria das vezes, só fazemos durante
a noite? O que é comum fazermos durante o dia? E durante a
noite? O que podemos ver no céu durante o dia? E durante a
noite? Sentimos mais calor de dia ou de noite? Como está a
sensação agora, quente ou frio?
As formas de trabalhar essas questões podem envolver
painéis, diários, desenhos, entre outras. Outras atividades podem
envolver a observação direta do ambiente, procurando plantas e
animais e pesquisando depois sobre seus hábitos.
Atividade “Observando o céu”: o objetivo da atividade
é que os alunos sejam capazes de identificar e diferenciar
elementos que caracterizam o dia e a noite, apoiando-se por meio
de fenômenos naturais e a comportamentos dos seres vivos.
14 Metodologia do Ensino de Geografia

Os usos dos recursos naturais: solo e água


no campo e na cidade
“Os usos dos recursos naturais” é uma temática de ensino
do segundo ano do Ensino Fundamental. Deseja-se desenvolver
com esse objeto a habilidade de reconhecer a importância do
solo e da água para a vida, identificando seus diferentes usos
(plantação e extração de materiais, entre outras possibilidades)
e os impactos desses usos no cotidiano da cidade e do campo.
São considerados recursos naturais tudo aquilo que
é necessário às pessoas e à sociedade, e que se encontra na
natureza, dentre os quais podemos citar: o solo, a água, o
oxigênio, energia oriunda do Sol, as florestas, os animais, dentre
outros. Os recursos naturais são classificados em dois grupos
distintos: os recursos naturais não renováveis e os recursos
naturais renováveis. Os recursos naturais não renováveis
abrangem todos os elementos que são usados nas atividades
antrópicas, e que não têm capacidade de renovação. Com esse
aspecto temos: o alumínio, o ferro, o petróleo, o ouro, o estanho,
o níquel e muitos outros. Isso quer dizer que quanto mais se
extrai, mais as reservas diminuem, diante desse fato é importante
adotar medidas de consumo comedido, poupando recursos para
o futuro. Já os recursos naturais renováveis detêm a capacidade
de renovação após serem utilizados nas atividades produtivas.
Os recursos com tais características são: florestas, água e solo.
Entretanto, o mau uso desses recursos pode acarretar a sua
extinção, ou poluição de forma irreversível.

Quando falamos na poluição e degradação dos recursos naturais,


lembramos sempre da sustentabilidade. Esta é uma temática
amplamente difundida e precisa ser analisada com olhos críticos
para compreender como ela se relaciona com a produção do
espaço geográfico e com as nossas vivências cotidianas. Para saber
Metodologia do Ensino de Geografia 15

mais, leia o artigo de Daniela Venceslau Bitencourt, denominado


“Sustentabilidade: a construção do discurso”, disponível em:
http://bit.ly/2tlFUsD (Acesso em: 01/01/20).

Esse objeto busca o reconhecimento dos recursos utilizados,


especialmente água e solo, e de como eles são utilizados tanto no
campo como na cidade, identificando suas diferenças, já que no
campo a água e o solo são destinados à produção agropecuária
e à extração de minerais, enquanto na cidade ao abastecimento
da população e outras atividades industriais. Vale ressaltar que
a poluição das águas e a degradação, contaminação e perda do
solo podem ser trabalhados, pois constituem parte da temática.

Figura 1: Uso de água no Brasil por setor

Fonte: Adaptado editorial Telesapiens

Algumas possibilidades de ensino da temática envolvem


pensar os usos cotidianos desses recursos, especialmente a partir
da vivência dos alunos, e se seria possível a vida sem eles; além
disso, os usos que envolvem as atividades agrícolas (produção
16 Metodologia do Ensino de Geografia

de alimentos), industriais e extrativas (como a mineração).


É possível utilizar, como estratégia metodológica, jogos e
brincadeiras que envolvam perguntas, descobertas e desafios
sobre os usos desses recursos.

ACESSE

Veja modelos de plano de aula sobre a temática, disponíveis em:


http://bit.ly/3a5mlW6 (Acesso 01/01/20).

Matéria-prima e indústria
“Matéria-prima e indústria” é uma temática de ensino do
terceiro ano do Ensino Fundamental. Deseja-se desenvolver
com esse objeto a habilidade de identificar alimentos, minerais e
outros produtos cultivados e extraídos da natureza, comparando
as atividades de trabalho em diferentes lugares.
Matéria-prima é um produto natural ou
transformado(semimanufaturado), que as empresas utilizam
como base em um processo produtivo para a obtenção de um
produto acabado. O produto acabado é a mercadoria que as
empresas vendem. Existem também casos de matérias-primas
que não precisam passar por transformações, como por exemplo
os vegetais e as frutas, que são comercializados da forma que
são extraídos da natureza. Os tipos de matérias-primas existentes
podem ser determinados conforme suas origens, como vegetal
(látex, borracha), animal (carne, leite, couro) ou mineral
(petróleo, minério de ferro).
Metodologia do Ensino de Geografia 17

Para compreensão dessa temática, é possível realizar


investigação da cadeia produtiva de qualquer objeto, utilizado
na escola ou em casa. Pensar onde ele é fabricado, como e qual
seu percurso até a escola ou a casa. Pensar como ele é fabricado,
quais os tipos de indústria e cultivo. Podem ser utilizados,
como estratégia metodológica, jogos e brincadeiras, produção
de maquetes, aulas de campo, músicas e filmes/documentários.
Lembrando que os recursos usados pelo professor não
devem ser utilizados de forma exclusiva, ou seja, devem ser
complementados com alguma atividade, discussão, debate ou
reflexão.

ACESSE

Veja um simulador que apresenta as etapas de extração da matéria-


prima, transporte e a produção industrial de móveis, do carvão e
de cadernos e livros, auxiliando na compreensão das etapas de
produção das indústrias: madeireira, de carvão e de celulose,
elaborado para alunos do Ensino Fundamental. Disponível em:
http://bit.ly/2FVoBBi (Acesso 01/01/20). (Funciona apenas no
navegador Internet Explorer).

Território e diversidade cultural


“Território e diversidade cultural” é uma temática de ensino
do quarto ano do Ensino Fundamental. Deseja-se desenvolver
com esse objeto a habilidade de valorização do que é próprio
em cada cultura e sua contribuição para a formação da cultura
local, regional e brasileira a partir da seleção, em seus lugares
18 Metodologia do Ensino de Geografia

de vivência e em suas histórias familiares e/ou da comunidade,


de elementos de distintas culturas (indígenas, afro-brasileiras,
de outras regiões do país, latino-americanas, europeias, asiáticas
etc.).
O geógrafo francês Paul Claval define cultura da seguinte
maneira:
“A cultura é a soma dos comportamentos, dos
saberes, das técnicas, dos conhecimentos e dos
valores acumulados pelos indivíduos […] Ela tem
um passado longínquo, que mergulha no território
onde seus mortos são enterrados e onde seus deuses
se manifestaram. Não é, portanto, um conjunto
imutável de técnicas e de comportamentos. Os
contatos entre os povos de diferentes culturas
são algumas vezes conflitantes, mas constituem
uma fonte de enriquecimento mútuo. A cultura
transforma-se, também, sob o efeito das iniciativas
ou das inovações que florescem em seu seio”.
(CLAVAL, 2007, p. 63).
A cultura, portanto, enquanto soma dos comportamentos,
das técnicas, valores, conhecimentos, manifestações artísticas
de um povo ou coletivo, está em constante transformação,
envolvendo um diálogo entre a tradição e as novas práticas. Ao
se falar de povos e coletivos culturalmente diversos, é preciso
compreender qual as suas histórias e tradições, e quais as
concepções e formas de vida existem ainda hoje. A identificação
de territórios envolve a espacialização desses distintos grupos
e coletivos culturais, a descoberta da forma como eles habitam
e constroem seus espaços e, ainda, como esses espaços foram
delimitados.
É preciso ainda inibir o sentimento de que nossas práticas
e crenças particulares são “normais”, em contraposição àquelas
vivenciadas por grupos e coletivos culturalmente distintos.
Existe um nome para essa sensação: etnocentrismo. Conforme
Metodologia do Ensino de Geografia 19

Henriques (2003, p. 51), é o etnocentrismo que perturba “nossa


percepção do Mundo, levando-nos a tomar como universais
tendências que nos são particulares”.
A habilidade de valorização do que é próprio em cada
cultura envolve um dos papeis do ensino, qual seja, “mostrar
aos alunos que existem outras culturas além da sua. Por isso,
a escola tem que ser local, como ponto de partida, mas tem
que ser internacional e intercultural, como ponto de chegada”
(GADOTTI, 1992). O autor afirma que, para isso, o ensino
precisa fomentar a curiosidade e ousadia, buscando um diálogo
com diferentes culturas e concepções de mundo.
Compreenda mais sobre a noção de cultura e suas relações
com a educação lendo o trabalho de Moacir Gadotti intitulado
“Diversidade cultural e educação para todos”, disponível em:
http://bit.ly/3acfvOJ (Acesso em 01/01/20).
Uma possibilidade muito interessante de trabalho com
a temática envolve o mapeamento das distintas comunidades
étnico-culturais existentes na região da escola e o envolvimento
dos alunos com elas através de abordagens distintas, como aula
de campo, troca de cartas, fotografias, elaboração de mapas
coletivos, painéis etc.
Outra possibilidade metodológica é o trabalho com
músicas, ritmos e melodias, e danças (ou jogos e brincadeiras)
praticadas por grupos e comunidades nacionais e internacionais
culturalmente diversas.
É importante que a postura de respeito, curiosidade
e a abertura para dialogar com a diversidade seja realizada e
estimulada pelo próprio professor. Propagar a necessidade de
respeitar a diversidade e não exercer essa postura dificulta o
aprendizado e o desenvolvimento dos alunos, podendo interferir
negativamente nessa construção, inclusive.
20 Metodologia do Ensino de Geografia

Diferentes tipos de poluição


“Diferentes tipos de poluição” é uma temática de ensino do
quinto ano do Ensino Fundamental. Deseja-se desenvolver com
esse objeto a habilidade de identificar e descrever os problemas
ambientais que ocorrem no entorno da escala e da residência
(lixões, indústrias poluentes, destruição do patrimônio histórico
etc., propondo soluções (inclusive tecnológicas) para esses
problemas.
Poluição é degradação do ambiente por um ou mais fatores
prejudiciais, podendo ser causada pela liberação ou retirada
de matéria ou energia (luz, calor, som) de forma prejudicial
ao ambiente ou às pessoas. Podem ser definidas a partir dos
elementos alterados pelos poluentes, como poluição do ar, da
água, do solo etc.
Podem ser trabalhados a partir do uso de notícias de
jornais e revistas, aula de campo, registro de percurso em diário
ou desenhos, registros de conversas com os pais ou responsáveis
sobre as mudanças na paisagem em diferentes tempos, entre
outras formas.

ACESSE

Leia um relato de uma aula de campo do Ensino


Fundamental sobre essa temática e se inspire! Elaborado
por Aline Santo e Kleber Costa, intitulado “Percepção
Ambiental e Ensino de Geografia: Trilhando o Caminho de
um Riacho Urbano em Delmiro Gouveia-AL”. Disponível em:
http://bit.ly/2Ts0iDo (acesso em 01/01/20)
Metodologia do Ensino de Geografia 21

E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo


tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente
entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos resumir tudo
o que vimos. Você deve ter aprendido que a elaboração de aulas
demanda a criação, por parte do professor, de planos de aula que
envolvem a definição de uma ou mais atividades e conteúdos
a serem trabalhados como os alunos, podendo ser expositiva,
lúdica, dialogada, de campo etc. Para tanto, você deve ter visto
sugestões de leituras e caminhos a serem traçados na hora de
trabalhar diferentes temáticas de diferentes anos do Ensino
Fundamental. Você deve ter visto, ainda, que é importante que a
postura de respeito, curiosidade e a abertura para dialogar com
a diversidade seja realizada e estimulada pelo próprio professor.

Elementos Para O Ensino De Geografia


(Orientação E Expressão cartográfica)
Ao fim deste capítulo você será capaz de compreender as
representações e linguagens no ensino de Geografia. Claro que
não se pretende dar conta de todas as possibilidades de expressão
referentes à Geografia referentes ao ensino da disciplina. Mas
você vai entender as etapas de desenvolvimento da orientação
de uma criança e como a cartografia é um instrumento essencial
e poderoso na construção de saberes nos anos iniciais. Convido
vocês para me acompanhar por essas linhas!

A noção de espaço pela criança


Falar da construção da noção de espaço pela criança é
falar também em uma psicogênese que atravessa as etapas
características do desenvolvimento geral da criança com relação
ao conhecimento. Especificamente em nosso caso, estamos
falando do espaço vivido aopercebido, do espaço percebido ao
concebido.
22 Metodologia do Ensino de Geografia

Psicogênese é a origem e desenvolvimento dos processos


mentais, muito ligada formação da personalidade e ao
comportamento.
De acordo com esse entendimento, o espaço vivido
concerne àquele experienciado presencialmente, através do
movimento e do deslocamento. A criança o interioriza através de
brincadeiras e por outras maneiras – percorrendo, delimitando,
enfim, organizando o espaço vivido conforme suas vontades.

Figura 2: O espaço vivido da criança envolve sua área de convívio


imediata como, por exemplo, seu quarto.

Fonte: Pixabay

Nesse sentido, é muito importante que a criança explore


com o seu próprio corpo as dimensões e relações do espaço, por
isso que deve ser enfocados exercícios rítmicos e psicomotores.
Metodologia do Ensino de Geografia 23

O “jogo da amarelinha” é um bom exemplo de um


exercício rítmico

O espaço percebido, por outro lado, não precisa ser


experenciado em presença. Assim, é possível que o aluno dos
anos iniciais lembre do trajeto casa – escola. Isso não acontecia
antes, pois havia a necessidade de percorrer esse trajeto para
identificar casa, prédios, ruas, praças, e demais marcas do
percurso.
Nessa etapa da formação mental em que se encontram
os alunos dos anos iniciais, as crianças são capazes se dar
conta da distância e da localização dos objetos ao observar
uma foto, por exemplo. Antes, percebia o “aqui”, em seguida,
“ali”. Pode parecer simples demais, mas nessa sutil passagem
está a ampliação do campo experiencial da criança, somada
pela observação. Podemos até dizer que a disciplina Geografia
começa para ela nesse momento. É nesse contexto que os
professores precisam estar mais preocupados em atividades que
trabalhem na formação de conceitos e noções espaciais, do que
no conteúdo de maneira sistemática.
Falamos de um espaço vivido e de um espaço percebido,
mas precisamos falar também de um espaço concebido. Esse
começa a ser compreendido em outro estágio de aprendizagem,
ao longo dos anos finais do Ensino Fundamental. Por volta dos
11-12 anos, a criança já consegue fazer relações entre elementos
sem experiência direta com eles, ou seja, por sua expressão. Em
outras palavras, o aluno consegue refletir acerca de uma área
expressa em um mapa, por exemplo, ser ter estado lá ou sem ter
visto antes.
Como pode ser visto, é um trabalho de formação das
noções espaciais, para o qual o professor deve desenvolver um
24 Metodologia do Ensino de Geografia

trabalho que leve em conta o tipo de observação de mundo da


criança. E que tipo seria esse? É uma percepção fundada em uma
percepção de conjunto, indiferenciada, do mundo. Isto é, para
ela, as coisas não são separadas de seus lugares, as posições são
dadas na relação com o todo em que está inserido. Então o todo
pode ser percebido com facilidade, o que não ocorre com suas
partes. Isso é mais acentuado nas crianças até por volta dos seis
anos, em que localização e deslocamento das coisas estão em
referência a si mesmo.
Então será possível notar uma certa dificuldade inicial em
algumas noções, coo perto de, abaixo, no limite etc., com relação
a si e as outras coisas. O professor precisa mediar essa percepção
do espaço infantil de forma a desenvolver a noção espacial. Esse
passo a passo envolve dar-se conta do espaço ocupado pelo seu
próprio corpo, da disposição e da posição das coisas e, com
deslocamento e orientação, das distâncias e das medidas. A
criança e a descoberta do espaço ocupado pelo corpo.
A noção espacial infantil é antes corporal que uma
elaboração da mente. Ou seja, uma experiência que ativa
sensações e sentimentos, sem haver um raciocínio sobre isso.
Na amamentação, ao ser segurada no colo e acarinhada, tem
início a aprendizagem do espaço. No corpo, vão sendo gravadas
as referências das partes e dos lados do corpo, base para o
desenvolvimento de referenciais espaciais.
Jean Piaget, psicólogo suíço e um dos mais importantes
pensadores da Educação, diz que o desenvolvimento da noção
espacial é coerente com o desenvolvimento da mente e da criança
como um todo.
Metodologia do Ensino de Geografia 25

Figura 4: Períodos de desenvolvimento infantil e o desenvolvimento de elementos espaciais

Fonte: Adaptado editorial Telesapiens

O período sensório-motor se estende do nascimento até


o desenvolvimento da linguagem, uma ação prática da pessoa
em sua experiência. O período pré-operatório começa quando
se identifica a função simbólica nas crianças e vai até quando
se organiza o raciocínio em operações concretas. O período
operatório pode ser notado entre seis e sete anos, envolvendo
as noções de peso e volume, avança para quando opera sobre as
26 Metodologia do Ensino de Geografia

coisas e termina quando ocorrem as operações lógicas, ou seja,


sem a necessidade da presença em sua concretude das coisas.
Quanto à espacialidade, inicialmente se liga a um espaço
sensório-motor, relacionado à percepção e à motricidade. O
espaço sensório-motor é constituído na interação entre o corpo
e o ambiente, em uma organização e adaptação contínua em
relação às coisas. Depois, a noção de espaço para a uma fase
em que se coincide a elaboração de imagens e do simbólico,
contíguos ao desenvolvimento da linguagem.

As relações topológicas, projetivas e


euclidianas
Quanto às relações espaciais, podemos diferenciar em
três tipos. A topológica, projetiva e euclidiana. A topológica
limita-se a uma coisa em particular, sem situá-la em relação a
outra, no que concerne a uma perspectiva ou a um ponto de vista
particular. Denomina-se relações topológicas elementares as
primeiras noções espaciais, como dentro, fora, atrás, em frente,
perto, longe, sem levar em consideração medidas, como metros,
quilômetros etc. São relações que se desenvolvem na criança
desde o nascimento, base para as relações mais complexas.
As relações projetivas dizem respeito a noção dos objetos
coordenados entre eles, situando-se aqueles do mesmo grupo,
uns em relação aos outros. Nesse sentido, se desenvolvem as
noções fundamentas das relações projetivas de esquerda e
direita, frente e atrás, em cima e embaixo e ao lado de.
Sempre lembrando que o ponto de partida para a
localização das coisasde uma criança é o seu próprio corpo e é
justo as relações projetivas que vão transformar isso, liberando
a noção espacial do egocentrismo. Assim, começam os passos
para que se estabeleçam as relações de norte, sul, leste e oeste e
mesmo aquelas de ordem tridimensional.
Metodologia do Ensino de Geografia 27

As relações euclidianas, por sua vez, consideram um


sistema fixo de referência. Segundo Castrogiovanni (2002, p.
21),
As primeiras evidências das relações euclidianas
ocorrem nas primeiras conquistas da atividade
perceptiva, como as primeiras constatações
de grandeza e de forma pela criança, e já são
organizadas em nível da inteligência sensório-
motora (permanência do objeto ausente, por
exemplo), mas permanecem intuitivas, sujeitas
às deformações geradas pelo caráter estático e
irreversível das representações imagináveis.

Em resumo, o espaço euclidiano relaciona-se com a


noção de distância, e as coisas se equivalem a depender de uma
igualdade numérica. O espaço projetivo baseia-se na noção
de reta, e as coisas se equivalem a depender da perspectiva. O
espaço topológico, por sua vez, concerne a relações qualitativas
inerentes a uma coisa em particular, como vizinhança, separação,
envolvimento etc.
Finalmente, a noção de espaço da criança parte de seu
próprio corpo como referencial locacional. Aos poucos, percebe
a possibilidade de outros referenciais, situando as coisas em
relação entre elas mesmas, utilizando um sistema de coordenadas.

A criança e as expressões do espaço


geográfico através da cartografia
Ao observar a geografia da humanidade, é possível notar
a necessidade em cartografar desde os mais primórdios tempos,
mapeando as localidades e acontecimentos mais importantes,
por exemplo. Se pesquisarmos as origens da atividade de
28 Metodologia do Ensino de Geografia

cartografar, iremos reparar que sua história se confunde com


a da própria humanidade. Antes de ser inventada a escrita,
foi registrada em cartografias, as rotas percorridas para que
pudessem ser encontradas posteriormente. Em desenhos
envolvendo trajetos das aldeias, por exemplo, foram mobilizados
símbolos, respeitando a proporção e o significado das coisas a
serem expressas.
Sobre isso, Vygotsky nos diz que a utilização de signos
leva a humanidade a um comportamento especificamente
estruturado, para além do desenvolvimento biológico, criando
processos psicológicos profundamente relacionados à cultura.
Em continuação, o conhecimento é um acontecimento que
emerge entre as interações de fatores ambientais, cognitivos
e sociais. A relação com o mundo leva em conta o estoque de
conhecimento de cada um, a depender dos encontros, ou seja, da
interação com os outros e as outras coisas, em meio a um longo
processo de aprendizagem que se inicia ao nascer e termina ao
morrer no seio de determinada cultura.
É praticamente um consenso o quão é essencial é a
cartografia para o estudo da Geografia. No entanto, não são
poucas as dificuldades para desenvolver esse conteúdo nos
anos iniciais. E isso envolve o estímulo à expressão gráfica, ao
desenho. Claro que isso é valorizado, mas enquanto expressão
artística. Isso quer dizer que as primeiras noções de localização
e proporção presentes nessa produção, frequentemente não são
trabalhadas geograficamente.
Durante todo o século XX, principalmente nos anos que
seguiram a Segunda Guerra Mundial (os anos do pós-Guerra,
a partir de 1945) até os anos de 1970, a Geografia esteve
muito centrada em uma perspectiva positivista, assim como
as outras ciências. A cartografia considerada era o mapa, cujo
desenho perseguia a máxima precisão, milímetro a milímetro.
Metodologia do Ensino de Geografia 29

A prioridade era a descrição espacial do espaço geográfico, ao


invés da construção cartográfica a partir da vivência das pessoas
por seus lugares.
A produção cartográfica deve buscar, então, meios de ir
além de uma visão positivista do espaço geográfico, restrita à
matemática, eurocêntrica e frequentemente voltada unicamente
para a exploração capitalista do espaço, aprofundando
desigualdades. Isso pode se realizar se assumirmos uma
preocupação permanente em estabelecer condições, durante o
processo de formação escolar, para que os estudantes tenham
contato com expressões culturais e artísticas, incluindo também
o processo de construção dessas expressões. Importante ter em
mente, como professores, que aprender a construir um mapa é
diferente de pensar com um mapa.
Essa é uma forma de se desenvolver diferentes leituras
do mundo. Importante dizer que aulas com arte e diferentes
expressões precisa ir além de uma ilustração, uma “decoração”,
“tornar mais atraente”, sendo mesmo um objetivo a ser
perseguido na efetivação das práticas pedagógicas, compondo a
formação de saberes escolares. Isso traz uma mudança na forma
de entender a produção de saberes.
Assumindo essa perspectiva, o saber passa a ser entendido
não somente como consequência de um procedimento científico.
A própria qualidade do que é científico deve ser questionado,
encarando outros sentidos do científico que não o positivista.
Bem, é de extrema importância integrar aspectos subjetivos, a
percepção de cada ao criar expressões. É necessário que mobilizar
cada vez mais recursos, promovendo cada vez mais encontros
com outras áreas e disciplinas que não a Geografia. Ampliar o
conhecimento geográfico, indo para fora das paredes da sala
de aula. Os saberes aprendidos em sala de aula precisam estar
em relação com a prática de vida cotidiana, com a experiência
30 Metodologia do Ensino de Geografia

vivida. Ou seja, superar uma visão positivista da cartografia é


superá-la também como postura de vida, não só científica ou
meramente profissional.
Uma visão positivista separa as pessoas (sujeitos) das
coisas (objetos), ou seja, as coisas são em si, e não em relação às
pessoas. Não interessa, portanto, o significado das coisas, mas
a quantificação das coisas. A visão positivista defende métodos
regidos pela lógica e matemática, única maneira de se chegar
ao verdadeiro conhecimento científico, isento de valores, da
política e do contexto. Em nosso caso, o que as pessoas sentem,
seus saberes e imaginações, como se relacionam com o espaço
geográfico para além de resultados numéricos, suas emoções
e sentidos - tudo isso não interessa a uma visão positivista.
Para esta, pessoas e coisas devem são contadas, são números,
estatísticas, mensuráveis em ordem de grandeza.
A cartografia, seja para localização ou mapeamento
daquilo que se observa, não é um fim em si, mas o meio para
um raciocínio geográfico. Ou seja, quando a configuração
cartográfica se reporta ao processo de produção do espaço.
Especificamente quanto ao mapa, ele é uma ferramenta
poderosa na medida que sua compreensão pode trazer uma
mudança de qualidade na capacidade do aluno em pensar o
espaço. Isso porque condensa um conjunto de signos com
imenso potencial de síntese, que mobilizam recursos externos à
memória, que mobilizam o conhecimento.
A formação de noções espaciais pelas crianças é um
processo que inclui dar-se conta do próprio corpo pela pessoa,
em uma espécie de construção de um mapa corporal. A expressão
do mapa corporal pode tornar possível a transposição de outros
lugares e, em consequência, a expressão de outros mapas. O
corpo da criança como referência para a formação de noções
espaciais.
Metodologia do Ensino de Geografia 31

Fazer e interpretar mapas deveria ser considerado tão


importante quanto ler e escrever, e mesmo a execução de
cálculos matemáticos. Essa alfabetização cartográfica precisa
ser, desde cedo, perseguindo a construção de uma postura
crítica. Isso passa por assumir o espaço vivido do aluno como
ponto de partida dos estudos geográficos, para que, pouco a
pouco, entende que aspectos e processos na escala pessoa, local,
regional e global estão relacionados. Dispor de expressões
visuais é indispensável ao ensino da Geografia, assim como
dominar o arcabouço conceitual do campo. Assim, é possível
compreender a Geografia como estudo da Terra como lar das
pessoas, interpretando o ambiente e atestando relações.
O processo de aprendizagem do mapeamento do espaço
geográfico pelos alunos dos anos iniciais não está descolado
do processo mais geral do desenvolvimento mental, e é
contíguo à construção da noção espacial. Nesse contexto, é
necessário investigar sobre o processo de construção de mapas
pelas crianças. Deve ser levado em consideração, portanto, os
mecanismos cognitivos e perceptivos que a criança recorre
mapeando seus lugares, o desenvolvimento intelectual no que
tange ao mapeamento e como as crianças se comportam durante
essa atividade.
É preciso ressaltar que a criança precisa ter postura ativa
sobre os mapas, ao dispor de estruturas cognitivas para tal. É
impossível separar o mapa da ação da pessoa exercida sobre
ele. Assim como a relação de uma criança com as coisas, a
aprendizagem do mapa precisa incluir a experiência. Em outras
palavras, para apreender um objeto, por exemplo, ela manipular,
tocar, ver, ouvir, sacudir, provar... um processo ativo sobre
o objeto. Para o mapa, é necessário o mesmo com o espaço
geográfico, experiência que envolva os sentidos, movimento e
locomoção, em presença ou através da imaginação. Processo
ativo sobre o ambiente.
32 Metodologia do Ensino de Geografia

Estamos falando de um processo que envolve aprendizagem


formal e não formal, ambientes não escolares e escolares,
geografias e Geografia. Na Geografia, disciplina e conteúdo
escolar, processo formal de aprendizagem em ambientes
escolares ou não, pode atuar o professor. O aluno participa do
processo de (re)construção do conhecimento em meio a prática
escolar mediada pelo professor. A noção espacial envolve as
geografias, relação pré-científica das pessoas com a terra, saberes
e conhecimentos obtidos através de hábitos, tradição, cotidiano,
experiência de vida.
As expressões de mundo são criações sociais ou individuais.
Se estamos falando de imagens relacionadas à expressão do
espaço geográfico, se envolve localização, orientação e o
que mais reunir sobre o lugar vivido, são, então, expressões
singulares, os mapas mentais.

Mapas mentais
Estamos nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Período
em que são reforçados (ou mesmo ensinados) certos hábitos
de higiene, exercitada a sociabilidade, assim como se aprende
a ler e a escrever. Ou seja, um conjunto de sabres, práticas e
conhecimentos que esperam dar maior autonomia às pessoas.
O mesmo objetivo é perseguido pela construção e uso do mapa
mental.
Os mapas mentais são uma expressão que veicula o que é
significativo para o aluno, as marcas de seu percurso particular,
os símbolos de seus caminhos, aquilo que ativa seus sentidos
e seus sentimentos. Varia de pessoa para pessoa, de acordo
com sua experiência de vida, atestando a personificação do
lugar. Os mapas mentais expressam sentidos e significados da
espacialidade vivida.
Metodologia do Ensino de Geografia 33

Figura 5:Exemplo de Mapa Mental. Percurso da casa a escola.p

Fonte: Adaptado editorial Telesapiens

Figura 6: Exemplo de Mapas Mentais. Paisagem da caratinga.

Fonte: Adaptado editorial Telesapines

Figura 7: Exemplo de Mapa Mental. Município de Presidente Prudente.

Fonte: Adaptado editorial Telesapines


34 Metodologia do Ensino de Geografia

Mais que uma oportunidade, exercício didático e atividade


pedagógica, o mapa mental consiste em uma necessidade
trabalhar para além de mapas existentes. Assim o aluno expressa
suas observações e leituras sobre os lugares e, para isso, as
atividades escolares e cotidianas precisam desenvolver e integrar
essa forma de expressar seus mundos vividos. Dessa maneira, há
um avanço na capacidade cognitiva da pessoa, na medida em que
ela terá condições de escrever seu mapa, ampliando sua relação
com essa expressão para além da leitura.
Ao refletir sobre o processo de ensino-aprendizagem
interdependente ao desenvolvimento cognitivo humano, devemos
ter no horizonte que as práticas escolares devem se orientar para
além do que a criança já sabe, isto é, para o que ela pode vir a saber
e conhecer. Trata-se de uma postura pedagógica que reordena as
bases da escola, com a intenção de que não seja um lugar apenas
de reprodução de saberes e conhecimento, mas que reserve em
suas ações a possibilidade constante de transformação.
Seguindo o mesmo propósito, o mapa mental pode, também,
ampliar e tornar cada vez mais complexo os níveis cognitivos
do aluno. Ele pode servir como um instrumento indicativo de
saberes e conhecimentos geográficos. Isso pode tornar possível
que se indique caminhos a ser percorridos por cada um com o
objetivo de aprofundar seus conhecimentos referentes a um dado
contexto.
Neste capítulo você viu que a noção de espaço infantil
acompanha suas próprias etapas de desenvolvimento cognitivo.
Muito influenciado pelo psicólogo francês Jean Piaget, envolve
espaço vivido, espaço percebido e espaço concebido. Você pode
aprender também a importância de se explorar as dimensões
e relações do espaço com seu próprio corpo, demandando
exercícios rítmicos e psicomotores, que nada mais é do que o
próprio brincar da criança. Seguindo as teorias da psicologia
infantil, você aprendeu também que existem relações topológicas,
projetivas e euclidianas, cada uma correspondente a uma etapa
Metodologia do Ensino de Geografia 35

da compreensão do espaço pela criança. Na primeira, tudo


está em relação ao corpo da criança, na segunda, é possível
estabelecer distâncias das coisas em relação a elas mesmas, e na
terceira já são pensadas a disposição das coisas de forma mais
abstrata, envolvendo números e proporções. Com este capítulo
você pode aprender também a importânciadacriança expressar
o espaço geográfico através da cartografia. Vimos como as
crianças precisam construir cartografias e mapas, expressando
seu mundo vivido. Nesse sentido que é preciso ultrapassar uma
visão positivista da cartografia e da Geografia como um todo, sem
menosprezar os números, mas valorizando e dando centralidade
às percepções singulares, aos sentidos e aos sentimentos. Uma
jornada e tanto, não é mesmo?

Interdisciplinaridade no Ensino de
Geografia nos Anos Iniciais

OBJETIVO

Ao término deste capítulo você terá informações e meios para atuar


no sentido de fortalecer o desenvolvimento e as aprendizagens de
crianças do Ensino Fundamental. Para isso é muito importante
assumir o potencial e a necessidade de uma abordagem
interdisciplinar para o trabalho com os conteúdos dos anos iniciais.
Sair das caixinhas em que se compartimentam as disciplinas expressa
um imenso desafio, mas que só tem a contribuir no caminho da
construção de uma educação de qualidade. Agora é aprender mais
ainda em busca de um ensino sem fronteiras! Adiante!
36 Metodologia do Ensino de Geografia

A interdisciplinaridade
Interdisciplinaridade é uma demanda da Educação como
um todo. Porém, é mais do que uma recomendação ou algo a ser
cumprido por qualquer tipo de exigência. A interdisciplinaridade
requer uma atitude de busca frente ao conhecimento, um ato de
ousadia. Trabalhar nessa perspectiva é ir além da fragmentação,
agir de maneira integrada com as outras áreas de conhecimento.
Importante ressaltar que a interdisciplinaridade não é a
eliminação dos componentes curriculares. Mas, sim, colocá-los
em encontro, entender cada um deles como produtos geográficos,
históricos, culturais e sociais, tendo no horizonte o processo de
ensino-aprendizagem.
Mas o que é a interdisciplinaridade?
“Mais importante que defini-la, porque o
próprio ato de definir estabelece barreiras, é
refletir sobre as atitudes que se constituem como
interdisciplinares: atitude de humildade diante
dos limites do próprio saber, sem deixar que ela
se torne um limite; a atitude de espera diante
do já estabelecido para que a dúvida apareça e
o novo germine; a atitude de deslumbramento
ante a possiblidade de superar outros desafios; a
atitude de respeito ao olhar o velho como novo,
ao olhar o outro e reconhecê-lo, reconhecendo-se;
a atitude de cooperação que conduz às parecerias,
às trocas, aos encontros, aso das pessoas que das
disciplinas, que propiciam as transformações,
razão de ser da interdisciplinaridade. Mais que
um fazer, é paixão por aprender, compartilhar e ir
além” (TRINDADE, 2008, p. 73).
A interdisciplinaridade pode ser primeiramente observada
na França e na Itália nos anos de 1960, época marcada por uma
imensa turbulência social e política na Europa e em várias partes
Metodologia do Ensino de Geografia 37

do globo. Dentre as várias demandas de diversos segmentos


da sociedade, havia o movimento estudantil reivindicando
um ensino mais conectado com à época, dedicado a pensar e
a agir sobre as questões do tempo, envolvendo as profundas
desigualdades sociais, concentração de renda, emancipação
feminina, liberdade sexual e justiça racial. A vida ferve com a
explosão das minorias sociais e políticas, e tenciona a ciência.
Nesse contexto, entre as várias medidas educacionais criadas
como resposta às demandas estudantis no que se refere à
Educação, é elaborada a abordagem interdisciplinar, como um
contraponto à compartimentação e especialização das ciências.
Os complexos problemas que movimentaram a ruas e os
gabinetes governamentais na década de 1960, e perduram até
hoje, não poderiam ser atacados por apenas um campo de saber.
Aprender e ensinar em uma atmosfera interdisciplinar parte
do ponto de que a compreensão se dá em meio a relação entre
variados fatores, com soluções que só podem ser concebidas
coletivamente.
Também na década de 1960 a interdisciplinaridade se faz
notar no Brasil, impactando a elaboração da Lei de Diretrizes
e Bases de 1971. O tema logo ganhou relevância nos debates
envolvendo a Educação no Brasil, tornando-se uma motivação,
e atravessando os últimos conjuntos legais sobre a Educação,
como a Lei de Diretrizes e Bases de 1996, os Parâmetros
Curriculares Nacionais (1997) e, mais recentemente, permeia a
Base Nacional Comum Curricular (2017).
Defender componentes curriculares integrados é também
conceber como e em que local essa integração é feita. É o
currículo que organiza o trabalho interdisciplinar, e, por isso,
precisa contemplar conteúdos e estratégias no processo de
ensino-aprendizagem, fornecendo condições ao aluno para a
vida-em-sociedade.
38 Metodologia do Ensino de Geografia

Presente na esfera legal e nas propostas curriculares, a


interdisciplinaridade ganhou força nas escolas, e ressoa tanto
no discurso como na prática dos professores da disciplina de
Geografia, nos variados níveis de ensino.
Para muitos a Geografia é uma disciplina “decoreba”, e
“aprender” o conteúdo é memorizar Estados e suas capitais,
dados populacionais, características climáticas etc. Bem, os
debates sobre a Geografia escolar e as práticas escolares já
avançaram bastante para além disso, mas boa parte dos alunos
não consegue enxergar alguma ligação com o que é ensinado
com seu cotidiano e com suas vivências. A interdisciplinaridade
contribui para alterar esse quadro, trabalhando conteúdos de
forma integrada, envolvendo os alunos.
A seguir, vamos abordar alguns encontros entre Geografia
e outras disciplinas que compõem o conteúdo dos anos iniciais
do Ensino Fundamental.

Interdisciplinaridade e linguagens
Desde o momento de nosso nascimento aprendemos
a interpretar movimentos, gestuais, expressões, palavras e
imagens. A escola amplifica essa capacidade, ensinando a
ler e a escrever, permitindo o acesso a boa parte da produção
cultural da humanidade. É algo que envolve várias áreas, uma
vez que não se trata de uma reprodução do som das palavras,
mas de uma compreensão. Alguns termos como paráfrase,
latifúndio, colonialismo e transgênico pode ter a relação com
seus significados a partir do letramento proveniente em aulas
de Geografia atravessando várias disciplinas, como Língua
Portuguesa, História e Ciências, por exemplo.
Atitudes nesse sentido fazem parte da alfabetização
científico – tecnológica. As linguagens precisam compor os
objetivos de instrução além de pré-requisito exclusivo de aulas
de Língua Portuguesa e Matemática, como é o comum ocorrer.
Metodologia do Ensino de Geografia 39

Vale lembrar, a competência de ler e escrever se desenvolve


com a leitura do mundo – para Paulo Freire, algo que antecede a
leitura de textos. A criança aprende antes a ler o mundo do que
ler em seu idioma natal. Então, cada professor precisa ter isso
em mente ao desenvolver os conteúdos, e buscar não trabalhar
sozinho, mas envolvendo os colegas que compõem o ambiente
escolar.
Pensemos em uma aula de Geografia em que o estudante se
debruça sobre um mapa, em um pronto ou em sua construção. A
criança assinala ou retrata os pontos de seu percurso e expressa
as experiências vividas nesse mundo particular, incluindo a sua
verbalização e, a depender da idade, já em escrita. Isso também
pode ser uma atividade coletiva, seja em um desenho de várias
mãos em painel, ou uma maquete com pontos de referência
em uma cidade, como a escola, uma praça, um posto de saúde,
igreja, entre outros.
O aluno está aprendendo mais do que a se situar,
inclusive mobilizando outras competências, mas isso é
também um exercício pessoal da escrita, que encontra seus
passos na narração, na descrição antes mesmo de grafar as
letrinhas. A depender do estágio de desenvolvimento, essas
atividades podem ganhando mais complexidade, retratando, por
exemplo, problemas ambientais, como um córrego poluído, o
desmatamento, a rua que alaga, o despejo e a coleta irregular
de lixo. E mesmo tratar da geografia da cidade, seu surgimento
e evolução urbana, e sua economia, como a título de ilustração.
Essas atividades mobilizam linguagens aprendidas em aulas
com conteúdo de Artes, Ciências, História, Língua Portuguesa
e mesmo Matemática.
É importante ressaltar que para uma mudança efetiva
que possa melhorar os alfabetização e seus dados, a prática
interdisciplinar precisa fazer parte da rotina escolar. “Ah, mas
como vou ensinar conteúdo de várias disciplinas se os alunos
nem sabem ler direito?”, eis uma pergunta/queixa comum,
40 Metodologia do Ensino de Geografia

acompanhada da concepção de que não sabendo ler com


efetividade os estudantes apresentam dificuldades em outros
conteúdos. Na verdade, não se deve esperar uma relação de
um bom preparo da língua para a boa aprendizagem de outras
matérias, mas, sim, que a leitura e a escrita percorram todas
as áreas, e sejam aprimoradas em conjunto. As crianças leem
e escrevem acerca de suas relações pessoais e sociais, em um
ambiente, considerando a natureza, humana e não humana.
Em uma atmosfera interdisciplinar, é de imensa importância
que se acione diversos meios a fim de envolver as crianças,
inclusive fazendo uso de novas tecnologias. Tanto melhor se
tiver disponibilidade de recursos, mas mesmo aplicativos em
celulares, algo bastante acessível a professores, pode exercer
esse papel. É importante um trabalho com tecnologia não
deve ser um subterfúgio para preencher o tempo, ou mesmo
para descanso docente. É algo que demanda bastante atenção,
sensibilidade ao contexto da turma e de cada aluno, para
desde cedo não se criar uma dependência, afetando aspectos
motores e sensibilidade. Trata-se também de uma alfabetização
tecnológica, não só no sentido de saber usar, mas de saber lidar
com, promovendo um uso consciente e saudável. Isso porque
a democratização da Internet e do celular ocorreu em processo
muito mais acelerado do que a democratização de uma educação
de qualidade. Nesse sentido, celulares e Internet, já fazem mais
parte da vida dos alunos do que livros e cadernos. Para as crianças
em alfabetização, é realmente impactante como rapidamente
desenvolvem caminhos para achar seu vídeo preferido na tela de
um celular, e como um pouquinho mais crescidas já conseguem
se comunicar pelas redes sociais, gravando áudios e mesmo
fazendo chamadas por vídeo.
A escola não tem conseguido acompanhar esse ritmo,
e muito deve ser debatido e melhorado para que se consiga
mobilizar o interesse dos alunos para que ingressem no universo
das letras em diferentes níveis. Lembrando que escrever à mão,
por exemplo, aciona muito mais o raciocínio e desenvolve muito
Metodologia do Ensino de Geografia 41

mais a cognição que digitar em um celular ou em um computador.


Frente a um ambiente escolar em geral precário em estrutura
física, é realmente um desafio colocado em nosso tempo.

SAIBA MAIS

“Como usar as Novas Tecnologias na Educação: sala de aula deve


ser ambiente de criação”, esse é o título do vídeo que traz mais
um pouco sobre esse tema, incontornável para quem quer pensar
a relação ensino-aprendizagem atualmente. Clica e confira em
http://bit.ly/2TxcNxv .

Mas como podemos falar em uso de tecnologia em um


cenário de baixos salários de professores, em que muitas salas
de aulas Brasil agora nem sequer possuem uma tomada elétrica?
Como cobrar profissionais qualificados para ligar com esse
quadro? Como não fazer a tecnologia na escola não ser algo
“para inglês ver”? Certamente, somente em uma sociedade
que apresente níveis elevados de letramento em diferentes
disciplinas, cada um guardando sua particularidade. Dessa
maneira, a tecnologia é um desdobramento social, criando em
meio ao tecido social, expressão de relações, e não algo de cima
para baixo, ou de fora para dentro. A tecnologia precisa fazer
parte de um povo como um todo para estar nas escolas, e isso só
pode acontecer com a verdadeira democratização de um ensino
de qualidade. Caso o contrário, vamos continuar entendendo
acesso ao consumo como sinônimo de exercício cidadão, o que
não confere.
42 Metodologia do Ensino de Geografia

Bem, a interdisciplinaridade abrange um imenso conjunto


de meios para que se aprenda a linguagem por todas as disciplinas.
É de fato empolgante e efetivo quando há estrutura para que um
trabalho com esse caráter seja desenvolvido, tanto no aspecto
físico quanto em uma equipe pedagógica comprometida a orientar
a comunidade escolar nesse sentido. Sim, em condições ideais
todos estão preparados para ações conjuntas, mas cada um sabe
as dificuldades, das mais variadas ordens e esferas da Educação.
Sendo assim, já pode ser feita uma enorme diferença o trabalho
levado a frente pelo docente em sala de aula, preparando-se para
articular e desenvolver diferentes linguagens com os alunos.

Geografia e História
Não podemos que a preocupação e apresentar os alunos às
letras e aos números ocupa a centralidade de quem pensa e atua
nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Por isso que Língua
Portuguesa e Matemática ocupa boa tarde do tempo investido
pelos professores dessa fase escolar. Por outro lado, acreditamos
que, se você chegou até aqui em nosso curso, não vai ignorar ou
minimizar a importância das disciplinas Geografia e História.
Quase com certeza se falamos em abordagem interdisciplinar
em Geografia o que vem à cabeça o encontro com a História.
Ambas compõem, inclusive, o percurso das Ciências Humanas
na Base Nacional Comum Curricular.
As duas disciplinas permitem às crianças acessas mais
possibilidades de interpretação do mundo e de se inserir nele
como alguém consciente e atuante. E, se ainda resta alguma
compreensão equivocada dessas duas disciplinas, devemos
reforçar que elas vão muito além de decorar datas, capitais, rios
e heróis.
Muito se diz que para interferir no mundo é preciso
aprender a observá-lo e interpretá-lo. Através do encontro entre
Geografia e História, os estudantes dos anos iniciais do Ensino
Metodologia do Ensino de Geografia 43

Fundamental têm uma imensa possibilidade de aprendizagem


nesse sentido.
De maneira geral, os estudos em Geografia envolvem as
transformações do espaço e suas expressões, suas múltiplas
presenças. Do desenvolvimento do raciocínio geográfico, que
permite à criança compreender que não é o centro do mundo,
incialmente posto de maneira egocêntrica. Descentraliza, então,
a relação com o ambiente. Resumidamente, seguindo as trilhas
abertas ao estudar Geografia, aos poucos vai-se notando que, por
exemplo, a relação com o país de cada um é a relação do trecho
onde se vive, e vice-versa.
Especificamente no caso da História, a centralidade é
em torno do tempo, abordando acontecimentos, agentes e
consequências. Para os anos iniciais, é importante o entendimento
de permanências de elementos que podem ser considerados
históricos, como, por exemplo, edificações, hábitos, tecendo
a relação de passado com seus impactos no presente. É um
percurso e identificação, e mais que isso, de tornar aparente as
causas de conduzir os alunos para que se percebam como agentes
históricos.
Dito isto, mais do que uma necessidade, é mesmo
inevitável cruzar essas disciplinas. As transformações se dão
em determinado ambiente em certo tempo. Vejam o imenso
potencial desse encontro interdisciplinar, para o qual, enquanto
professores, devemos estar preparados: essas aulas montam as
condições para os alunos compararem o passado com o presente,
permitindo compreender melhor o munda que se vive atualmente,
fornecendo todo um instrumental que, se bem utilizado, pode
planejar futuros. E isso com relação à escala de vida de cada um,
ou seja, as fronteiras do bairro e a trajetória pessoa. Em tempos
de um mundo hiper conectado, com muito mais facilidade se
pode interligar a experiência vivida dos alunos com aquilo que
acontece em todo o globo.
44 Metodologia do Ensino de Geografia

ACESSE

Nesse vídeo, do canal Nova Escola, os professores João Ferraz


e Jorge Silva, da Universidade Federal do Estado de São Paulo,
falam um pouco sobre como trabalhar Geografia e História nos
anos iniciais.

http://bit.ly/3aeG7hR

Geografia são circunstâncias que integram de tal maneira


a vida das pessoas e o destino dos grupos que ninguém pode
alegar desconhecê-la. História guarda o potencial de colocar
o conhecimento comum em uso com os conceitos do campo,
como temporalidade e análise de fontes. Diante do que foi dito,
uma boa aula envolvendo o trabalho entre as duas disciplinas
precisa partir da escuta atenta do que os estudantes têm a dizer,
diante de um tema previamente delimitado para ser trabalhado,
seja em sala de aula ou em trabalho de campo.
A partir daí pode ser construído um diagnóstico do que se
sabe. Com isso, o que foi dito é ampliado com imagens, literatura,
artefatos, e mesmo com documentos e entrevistas. A postura do
professor é de manter um clima de questionamento, alimentar o
interesse a partir da dúvida e da vontade de descoberta. Perguntas
como, por exemplo “por que esse lugar é desse jeito?”, “o que
isso pode nos dizer?”, “e agora, como é?”, entre outras que
mantenham esse tom. Está sendo pavimentado o caminho para o
que os alunos entrem em contato com memória, motivados por
uma proposta que tensiona o significado pessoa e social, algo
desafiante para eles. Algo importantíssimo de ter em mente é a
Metodologia do Ensino de Geografia 45

desconstrução de que estamos em progressos, sempre avançando,


de que há culturas inferiores, o passado, e superiores o presente.
Ou seja, a relação precisa se liberar do juízo de que aqueles do
passado eram atrasados e que hoje a humanidade é evoluída. Cada
acontecimento precisa ser entendido em seu contexto, os fatos
são decorrentes de momentos diferentes, expressando outros
modos de vida estruturados sobre outras bases. Essas noções
são desenvolvidas com a turma, movimentando ferramentas
diversas, durante as atividades propostas. Da mesma maneira é
essencial que as crianças notem as mudanças em certos lugares
e em determinadas paisagens, e como elas afetam as pessoas,
pensando maneiras de atuação.
Na confluência entre Geografia e História, a escola
encaminha os alunos a observar o que ocorre na sociedade e no
ambiente, trabalhando as perguntas, ensinando como pesquisar
e a técnica de comparação.
E aí? O que achou do que vimos até aqui? Sentiu que
aprendeu bastante? Agora, só para termos certeza de que você
realmente entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos
resumir tudo o que vimos. Você deve ter aprendido o quão
é importante a interdisciplinaridade não só para aprender
Geografia, mas para como deve ser uma postura a nortear o
exercício docente nos anos iniciais do Ensino Fundamental.
Para isso, vimos o quão importante é refletir sobre atitudes
interdisciplinares, ciente que cada campo do saber apresenta
um limite, que só pode ser ultrapassado no encontro entre
as mais diversas disciplinas. Falamos da relação entre a
interdisciplinaridade e linguagens, algo que que o professor
desse estágio do ensino já lida em sala de aula, às vezes só não
se dava conta. Você notou que o processo de alfabetização vai
além do ensino da Língua Portuguesa e que a instrução é mais
que isso e o ensino de Matemática. Você viu como a Geografia
tem um imenso potencial em acionar diversos outros conteúdos,
e como as questões geográficas estão presentes em temas de
46 Metodologia do Ensino de Geografia

outras disciplinas. Não poderíamos deixar de abordar a relação


entre Geografia e História, que de tão próximas, mas como
focos diferentes - o espaço e o tempo - deveriam com bastante
frequência serem trabalhadas em conjunto. Agora é arregaçar as
mangas e se preparar para um ensino interdisciplinar.

Geografia e Educação Ambiental

OBJETIVO

Ao término deste capítulo você será capaz de construir referenciais


que possibilitem uma participação propositiva e reativa nas questões
socioambientais. Isto será fundamental para o exercício docente
frente a gravíssima crise em que nos encontramos atualmente.
Geografia e Meio ambiente significa estudar educação ambiental,
pensando os problemas e dando condições para o plano de ação. E
então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos
lá. Avante!

Quando falamos em Geografia e Meio Ambiente,


estamos falando de educação ambiental. Ela tem como
objetivo a formação de pessoas preocupadas com os problemas
ambientais, como poluição – de cursos d’águas, do ar, mas
também sonora e visual, desmatamento, aquecimento global,
desequilíbrio ecológico, entre outros. A crescente necessidade
de se abordar esse assunto ocorre frente a uma compreensão
humana bastante equivocada que levou as pessoas a deixarem
de se entender como parte da Natureza. Vale ressaltar, os
preceitos de conservação e preservação dos recursos naturais,
para não falar de sustentabilidade, só fazem sentido em uma
Metodologia do Ensino de Geografia 47

sociedade ocidental, que ignora e mesmo combate os saberes


de povos tradicionais, como a de indígenas e aqueles nativos do
continente africano. Dizemos isso porque, para esses grupos, a
educação ambiental não faria sentido. Explicamos: Guardando
suas diferenças, se entendem como mais um modo da Natureza,
não havendo, portanto, separação.
Figura 8: Uma retratação de Pachamama, divindade máxima dos povos indígenas dos Andes Centrais. Em
quéchua, mama é mãe, ou, mais especificamente, mãe terra. Pacha é universo, mundo, tempo e lugar.

Fonte: Pixabay

“Há mais de uma forma de viver, sentir e pensar.


A origem da separação Homem x Natureza não
é nem tão antiga, e nem tão universal assim. A
natureza é importante para a educação, seja na
escola ou na universidade, e interliga diversas
soluções para os problemas atuais”. Assista à
48 Metodologia do Ensino de Geografia

palestra da educadora Léa Triba no “I Seminário


Criança e Natureza”.
Leia o texto “Separação entre natureza e cultura — a
base do pensamento moderno”, de Juliana Diniz na plataforma
Medium http://bit.ly/376T1gh
Dito isto, a educação ambiental busca a conservação
e a preservação dos recursos naturais, buscando cumprir esse
objetivo em uma perspectiva holística. Isso significa abordar
aspectos políticos, econômicos, sociais, ecológicos e éticos,
em uma ótica contextualizada e de caráter interdisciplinar.
É justamente por isso que a educação ambiental encontra na
Geografia a disciplina ideal para que aconteça. Isso porque é
necessário articular diferentes escalas entre o local e global,
junto à necessidade de problematizar como o meio ambiente
se expressa com suas diferenças e seus significados. Isso
permite que aos alunos ter contato com outros modos de viver a
natureza, de forma que se tornem pessoas capazes de interferir
em sociedade.

Figura9: Atividade de educação ambiental em reserva da mata atlântica em Santa Catarina

Fonte: Wikimedia
Metodologia do Ensino de Geografia 49

Com isso tudo que falamos, fica difícil admitir um


modelo centrado na mudança de comportamento individual,
sem tecer críticas em modelos de sociedade que provocam
esses comportamentos. Precisamos superar essa ideia de
que a degradação ambiental ocorre por causa do modo de ser
da humanidade, entendendo-a fora do contexto, espacial e
temporal. Não se trata de algo do tipo “se cada um fizer a sua
parte, tudo vai melhorar”, dado modos de produção predatórios,
indústrias poluentes, atividades mineradoras, desigualdade
social, incentivo ao consumo desenfreado etc. É por isso que a
precisamos falar de uma temática socioambiental em Geografia.
A perspectiva holística busca o entendimento integral dos
fenômenos, ou seja, buscando entendê-los em sua totalidade. A
palavra holística foi criada a partir do grego holos, que significa
“todo” ou “inteiro”.
A Geografia apresenta diversos conteúdos e temas de
ordem socioambiental, de maneira a fornecer mais condições
para a formação crítica dos alunos, preparando o caminho para
serem atuantes. Pessoas que serão capazes de interpretar e agir
em seus mundos vividos. Atividade de educação ambiental. Em
uma realidade cada vez mais urbanizada, trabalhar o contato
com a terra é uma das formas de se reconectar com a natureza.
Não precisa pensar muito para que se chegue à conclusão
de que já passou da hora da humanidade mudar para outra
forma de viver, para além de elos comerciais e econômicos.
Uma educação ambiental comprometida preocupa-se, de forma
conjunta, com laços de solidariedade e com a equidade.
De que maneira podemos trabalhar a criticidade em
relação ao mundo, explorando a educação ambiental em
Geografia? A pergunta deve ser respondida com o empenho em
tornar os alunos atuantes na transformação de suas vidas e de
seus lugares. De partida, o desafio que se coloca é que a relação
com a natureza varia de acordo com a cultura, a sociedade, a
classe social, levando-se em consideração a diferença de lugar e
50 Metodologia do Ensino de Geografia

de tempo. Isso leva a um cenário de tensão e disputa, a depender


do lugar. Geralmente, as posições antagônicas e irreconciliáveis
são as que entendem a natureza como uma mercadoria e outra
como base para a reprodução da vida. Nesse caso, podemos citar
alguns exemplos, como atividades mineradoras e a monocultura,
e, de outro lado, a população que vive do extrativismo e do
artesanato. Vale destacar, essas atividades que enriquecem a
poucos, e prejudicam a muitos, ocorrem sobre ecossistemas
singulares, frequentemente precarizando a disponibilidade de
recursos, principalmente a água e trazendo imenso desequilíbrio
climático.
De forma dominante, as sociedades modernas têm nas
configurações naturais um obstáculo ao progresso ao mesmo
tempo que é vista em sua materialidade econômica, disposta
para ser explorada. Por outro lado, a natureza é a presença de
crenças e espíritos, é fonte para a subsistência de famílias, lugar
de tradições. Como podemos ver, a depender da classe social e
do modo de vida, podemos contrastar condições de exploração
e meios de interação com a natureza, o que pode significar a
permanência ou a aniquilação de certos ecossistemas. Estamos
falando de um campo de disputa.
Estudar Geografia e questões socioambientais é algo
abrangente e demanda atitude questionadora em referência
aos modelos de ocupação, apropriação e uso da natureza pela
sociedade, da relação entre as pessoas e os modelos políticos
e econômicos adotados. Como pode ser imaginado, é algo de
proporções totalizantes, o que dificilmente alcança um consenso.
Entram em conflito pessoas e grupos com suas convicções,
entendimentos, interpretações e intenções. Como dar conta disso
tudo em sala de aula?
Para pensar e planejar o ensino de Geografia e meio
ambiente, é importante que se leve em consideração que não
Metodologia do Ensino de Geografia 51

é um trabalho que guarde uma linearidade ao gosto dos livros


didáticos. Precisamos partir da premissa que não é possível essa
exploração brutal da natureza, dando visibilidade aos grupos que
vivem outra concepção divergente dessa – povos e sociedades
que não consideram a natureza apenas como fonte de matéria-
prima.
Ao lado disso, deve estar como fundo o fato de os fenômenos
da natureza serem conectados e reforçando que o mundo natural
inclui os seres humanos, cujo destino encontra-se indissociável
e conectado. Ou seja, buscar superar a visão antropocêntrica, da
humanidade no centro de tudo, mais importante que a natureza,
como se não fosse dela integrante.
No cotidiano de sala de aula, é preciso, sim incentivar
medidas que visem a conservação ambiental. Para tal, devem
ser promovidas atitudes ao alcance dos alunos, entrelaçando
conhecimento e habilidades de forma transversal e construtivista,
direcionando o desejo de transformação diante da crise
socioambiental.

SAIBA MAIS

Quer ideias para atividades voltadas aos alunos dos anos iniciais
em Educação Ambiental? Selecionamos para você um material
elaborado pela equipe de educação ambiental do município de Foz
de Iguaçu com vários jogos e brincadeiras sobre o tema. Acesse
http://bit.ly/3abGNVf
52 Metodologia do Ensino de Geografia

Por aqui encerramos mais um capítulo de nossa unidade.


Gostou do que viu até aqui? Motivado a trabalhar com educação
ambiental nos anos iniciais? Vamos repassar alguns pontos. Ao
final deste capítulo você deve ter aprendido que a educação
ambiental encontra na geografia um campo privilegiado,
dado o seu caráter interdisciplinar, a necessidade de articular
diferentes escalas, entre o global e local, além de aspectos
políticos, econômicos e sociais. Você deve ter aprendido que
uma educação ambiental verdadeiramente comprometida vê as
pessoas como parte integrante da natureza não humana e se opõe
à sua exploração brutal. Esperamos também que você tenha
entendido que há uma forma predominante de se relacionar
com a natureza na sociedade moderna ocidental, que a enxerga
como obstáculo ao progresso ao mesmo tempo que a tem como
produto disposto à sua exploração. Você deve se lembrar que é
uma relação que depende de classe social e cultura, envolvendo
diversas formas de concepção e interação. E esperamos que
você planeje suas aulas de forma a dar centralidade aos povos
tradicionais e outras sociedades, para os quais a educação
ambiental nem faria sentido, por se entenderem como parte da
natureza. Em outras palavras, cuidar da Natureza é cuidar de
todos e de um destino coletivo.
Metodologia do Ensino de Geografia 53
54 Metodologia do Ensino de Geografia

REFERÊNCIAS
ANJOS, E. K. O.; DIAS, J. R. A. Psicopedagogia: sua
história, origem e campo de atuação. Revela, ano 8, nº 18,
Jul 2015. Disponível em <http://fals.com.br/revela/ed18/elza_
anjos.pdf> Acesso em 25/04/2019.
BORTOLANZA, M. L.; KRAHL, S.; BIASUS, F. Um
olhar Psicopedagógico sobre a velhice. Revista Psicopedagogia,
v. 22, n 68, p. 162 – 170, 2005.
BOSSA, N. A. A Psicopedagogia no Brasil: construção
a partir da prática. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
BOSSA, N. A. A Psicopedagogia no Brasil: contribuições
a partir da prática. RS, Artmed, 2007.
DICIO. Dicionário online. Disponível em <https://www.
dicio.com.br/intervencao/> Acesso em 25/04/2019.
GRAÇA, J. S. D.; SILVA, A. B.; NASCIMENTO, M.
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php/enfope/article/view/1778> Acesso em 25/04/2019.
MORAES, D. N. M. Diagnóstico e avaliação
psicopedagógica. Revista de Educação do IDEAU. V 5, n 10, p.
2 – 15, jan-jun 2010. Disponível em: <https://www.ideau.com.
br/getulio/restrito/upload/revistasartigos/203_1.pdf> Acesso
em: 03/03/2019.
Metodologia do Ensino de Geografia 55

PONTES, I. A. M. Atuação psicopedagógica no contexto


escolar: manipulação, não; contribuição, sim. Revista
Psicopedagogia, n 27, v84, p. 417 – 427, 2010. Disponível
em <http://www.revistapsicopedagogia.com.br/detalhes/196/
atuacao-psicopedagogica-no-contexto-escolar--manipulacao--
nao--contribuicao--sim>Acesso em 03/03/2019
SANTOS, D. M. Como a psicopedagogia pode contribuir
no tratamento das crianças autistas. Monografia, 43 p. Rio de
Janeiro, 2009. Disponível em <http://www.avm.edu.br/docpdf/
monografias_publicadas/T205038.pdf> Acesso em 25/04/2019.
SUMÁRIO
UNIDADE 3
O saber histórico e o saber histórico escolar:
limites e possibilidades na prática pedagógica 10
Dos limites e diferenças entre escola e universidade 10
Das diversidades internas do sistema escolar 11
Das particularidades do educando do
ensino básico 12
Do desafio da autonomia 13
Do desafio da diversidade 14
O ensino de história em discussão: os parâmetros
curriculares nacionais e o ensino de história 17
As categorias históricas no processo de ensino-
aprendizagem: uma abordagem interdisciplinar 26
O que é interdisciplinaridade? 26
As categorias históricas 28
Trabalhando a interdisciplinaridade 29
Amarrando as pontas: refletindo sobre a prática docente
e as exigências 31
Dos objetivos da prática docente 31
Dos limites e desafios da prática docente 32
Das possibilidades na prática docente 33
Metodologia do Ensino de História 7

UNIDADE

03
8 Metodologia do Ensino de História

INTRODUÇÃO
Você sabia que o ensino de História além de obrigatório, é
uma ferramenta fundamental não só para o desenvolvimento do
senso de identidade de uma nação, mas para o desenvolvimento
do senso crítico? Isso mesmo. A área de História faz parte Base
Nacional Curricular Comum e é uma disciplina obrigatória dentre
das áreas de “Ciências Humanas” (Ensino Fundamental) e de
“Ciências Humanas e Sociais Aplicadas” (Ensino Médio). Sua
principal responsabilidade é auxiliar o ser humano a desenvolver
a noção de processo e compreender a multiplicidade do tempo
dos povos. Além, disso a História ajuda a desenvolver a noção
de que todo o ser humano é protagonista da sua vida e da vida do
seu país. Sendo assim, ela pode ser uma ferramenta poderosa para
tanto o desenvolvimento do senso crítico, como para a aceitação
da diversidade. Daí a importância de se ensiná-la que garanta o
pleno desenvolvimento destas habilidades. Entendeu? Ao longo
desta unidade letiva você vai mergulhar neste universo!
Metodologia do Ensino de História 9

OBJETIVOS
Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 3. Nosso
objetivo é auxiliar você no desenvolvimento das seguintes

1
competências pro issionais até o término desta etapa de
estudos:
Compreender a construção do saber histórico
como fundamental para a formação da consciência
crítica dos educandos na sociedade multicultural;

2 Aplicar os parâmetros curriculares nacionais no


ensino de história;

3 Identificar e discutir os usos destes parâmetros


dentro do ensino de História;

4 Executar abordagens interdisciplinares para as


categorias históricas no processo de ensino-
aprendizagem.

Então? Preparado para uma viagem sem volta rumo ao


conhecimento? Ao trabalho! Vamos começar nossa desafiadora
e estimulante jornada sobre o ensino de História
10 Metodologia do Ensino de História

O saber histórico e o saber histórico


escolar: limites e possibilidades na
prática pedagógica

OBJETIVO

Ao término deste capítulo você será capaz de entender como


funciona os limites entre o saber histórico e o saber histórico
escola, e quais os limites e as possibilidades que te abrem
dentro da sua prática pedagógica. Isto será fundamental para o
exercício de sua profissão, pois te auxiliará a buscar um meio
termo entre rigor acadêmico e a clareza necessária ao se explicar
para um público leigo, sem cair no risco de fazer uma exposição
desnecessariamente complexa ou raza. E então? Motivado para
encontrar o difícil caminho do meio? Então vamos lá. Avante!

Dos limites e diferenças entre escola e


universidade
Vamos começar por algo bem óbvio que é estabelecer os
limites entre estes dois espaços de conhecimento: a escola e a
universidade. Por mais que ambos sejam espaços dedicados a
transmissão de conhecimento e de importância para a sociedade, são
espaços absurdamente diferentes entre si e com visíveis diferenças
tanto de público quanto de finalidades. Se no primeiro estamos
falando basicamente de um espaço onde crianças e adolescentes
frequentam de forma compulsória para adquirir conhecimentos
básicos e habilidades de socialização; no segundo temos um espaço
com um público adulto frequentando de forma voluntária, com a
finalidade de se profissionalizar em um ramo do conhecimento e
ofício de alta complexidade e, muitas vezes, voltado para a pesquisa
ou desenvolvimento de novas práticas e tecnologias.
Metodologia do Ensino de História 11

Fora o fato das próprias finalidades das duas instituições,


temos de um lado alunos com menor conhecimento e ainda em
estágio de formação (tanto academicamente como na persona-
lidade). Enquanto no outro, pressupõe-se que estejam lidando
com indivíduos formados e com o mínimo de autonomia no
estudo.
Quando me refiro à autonomia, estou me referindo a
capacidade em que o indivíduo teria de criar estratégias e rotinas
de estudo com o mínimo de auxílio possível, bem como criar as
mesmas lidando com os prazos da vida acadêmica versus suas
responsabilidades cotidianas extracurriculares, ou seja é aquele
que controla o próprio aprendizado. Por ora, ainda não discutirei
aqui a questão de autonomia de pensamento
Sendo assim, há diversos fatores para se levar em conta na
hora de levarmos o conhecimento histórico que aprendemos no
bancos da faculdade para o aluno da escola, seja ele do ensino
fundamental, médio ou da EJA.

Das diversidades internas do sistema escolar


De acordo com a legislação vigente (a lei 9394/96), o
nosso sistema escolar se divide em:

DEFINIÇÃO

Educação infantil (três anos), Ensino Fundamental (oito anos


divididos em dois segmentos - o primeiro com cinco anos e o
segundo com quatro anos) e Ensino Médio (três anos), conforme
consta nos títulos III e IV da referida lei, além da educação de jovens
e adultos que tem uma realidade bem particular, mas também é
garantida no Título V, capítulo IV, seção V da mesma lei.
12 Metodologia do Ensino de História

Em outras palavras, o próprio sistema da educação básica


já tem uma realidade múltipla em sua própria organização que
tem que ser levada em pelo profissional na hora de se planejar
sua aula.

Das particularidades do educando do ensino básico


O perfil do aluno do ensino básico, como já mencionado, é
bem diferente. De acordo com a mesma LDB, o aluno da educação
básica tem de quatro a dezessete anos (no caso específico de nós
professores de História que lidamos com alunos de sexto ano do
ensino fundamental até terceiro ano do ensino médio, são jovens
de onze a dezessete anos em média).
Figura 1 - Organograma resumindo a educação básica de acordo com a Lei 9394/96.

O conhecimento histórico elaborado nas universidades


não foi pensado para este aluno! Salvo aqueles pesquisadores
que se debruçam sobre compreender os processos de ensino
aprendizagem da disciplina ou aqueles que buscam entender ou
desenvolver métodos para ensinar História, esse conhecimento
produzido tem por alvo outro público bem diverso desse que será
(e é a minha) realidade profissional diária. Sendo assim, o nosso
papel como educadores é fazer uma ponte entre um conhecimento
científico altamente complexo (mas absurdamente necessário
Metodologia do Ensino de História 13

para a compreensão do sua realidade e a construção da cidadania


e respeito da diversidade), para um público ainda em formação,
porém em diferentes níveis. Isso vai nos levar a outros desafios:
como criar a autonomia neste aluno e como simplificar sem
tornar raso, e isso lidando com toda a diversidade desse contex

Do desafio da autonomia
Como aponta Vitor Henrique Paro (PARO 2011: 198)
autonomia é uma questão no mínimo espinhosa. Se por um lado,
é algo desejável por tornar o educando independente e senhor do
seu processo de ensino-aprendizagem, por outro pode se chocar
com uma proposta mais tradicional de ensino, pois nesta visão
que o aluno é um mero receptáculo de conhecimento.
Figura 2 - A autonomia é de extrema importância para o educando
conseguir avançar no processo de ensino-aprendizagem.

Fonte: wikimedia commons

Vale lembrar que fatores extra escola tem muito influência


podendo dificultar ou facilitar esta busca. Violência, indisciplina
e problemas familiares podem ser outros complicadores que
podem dificultar e muito o trabalho do educador. Como bem
lembra o já citado o Vitor Henrique Paro (PARO, 2011: 204-
206), no ensino público estes problemas tendem a se agravar
mais ainda (vale muito a pena você ler completo este artigo em
que o Professor Paro estudou a questão da autonomia nas escolas
públicas, caro futuro colega).
14 Metodologia do Ensino de História

Do desafio da diversidade
Mais do que algo desejável ou possível a diversidade é
tanto um desejo quanto um desafio e uma obrigação legal.
Tantos os PCNs quanto À BNCC e a própria Lei de Diretrizes e
Bases da Educação (a nossa famosa 9394/96) citam em alguma
momento o respeito à diversidade com um dos objetivos do
ensino de História. Além disso, o próprio ambiente da sala aula
em si já é diverso. Nele temos alunos com diferentes vivências
e crenças muitas vezes conflitantes (por exemplo, não é segredo
para ninguém que muitas vezes as rivalidades entre facções
criminosas de comunidades são levadas para os ambiente escolar
pelos próprios alunos, além do que preconceitos religiosos dentre
outros afloram no ambiente escolar).
Tabela 1: Objetivos do ensino de História de acordo com a BNCC

Ensino Fundamental II Ensino Médio


Permitir aos estudantes elaborar
Estimular a autonomia de hipóteses, construir argumentos e atuar
pensamento no mundo, recorrendo aos conceitos e
fundamentos dos componentes da área.
Estimular a capacidade de Aprofundar e a ampliar da base
reconhecer que os indivíduos conceitual e dos modos de construção
agem de acordo com a época e o da argumentação e sistematização do
lugar nos quais vivem raciocínio
estimular uma leitura de mundo
Perceber que existe uma grande
sustentada em uma visão crítica e
diversidade de sujeitos e
contextualizada da realidade, no
histórias e que esta percepção
domínio conceitual e na elaboração e
poder ser usada para estimular o
aplicação de interpretações sobre as
pensamento crítico e a formação
relações, os processos e as múltiplas
da cidadania
dimensões da existência humana.
Fonte: Adaptado de: http://bit.ly/34IxlER. Na BNCC, no ensino médio História
faz parte do componente “Ciências Humanas e Ciências Sociais Aplicadas.”
Metodologia do Ensino de História 15

Sendo assim, o trabalho do professor é muito mais do que


um mero transmissor de conhecimento (ok, sei que você já leu
isso antes cara futuro colega, mas nunca é demais relembrar) e tem
que ajudar a desenvolver a autonomia e o respeito à diversidade,
estimulando o pensamento crítico. E no quê isto vai afetar os
limites do saber histórico com o saber histórico escolar? Muita
coisa, já que o seu ensino vai ter que ser toda hora mediado por
estes objetivos e, lembrando mais uma vez, o saber histórico
construído fora dos bancos escolares não teve esse tipo de
preocupação. Se fôssemos deixar esta discussão um pouco mais
técnica poderíamos dizer que o primeiro seria uma “ciência pura”
(aquela voltada ) e outro uma “ciência aplicada” (aquela voltada
para o progresso tecnológico e econômico ou, como prefiro,
focada em soluções para os problemas da sociedade). Não que
o conhecimento gerado pelos pesquisadores universitários gere
benefícios para a sociedade, muito pelo contrário. Mas, em se
tratando do conhecimento histórico produzido pela a academia
há um abismo muito grande entre ele e a sala de aula.
Como professores nós temos a tarefa de pegar esse
conhecimento altamente complexo e voltado para um público
mais adulto e, em tese, já “formado” para essa plateia diversa e
ainda em formação, de uma forma que os estimulem a desenvolver
sua autonomia, sen.so crítico e respeito às diversidades. Para
isso é necessário um misto de criatividade, bom senso e um
conhecimento profundo não só da sua disciplina e da parte legal
que envolve ela, mas principalmente da turma que você está
lidando, e isso só a prática pedagógica que vai lhe dar.
Ao longo da sua experiência no magistério você verá que o
conhecimento dos seus educandos será o grande diferencial para
você ser bem sucedido na profissão. A partir desse conhecimento
é que você poderá quais os limites que você poderá cruzar entre
este dois conhecimentos históricos tendo sempre como meta o que
os parâmetros curriculares trazem, que será o nosso próximo item.
16 Metodologia do Ensino de História

RESUMINDO

Quer se aprofundar neste tema? Recomendamos o acesso à


seguinte fonte de consulta e aprofundamento: Artigo: “Ciência
Pura e Ciência Aplicada-A dicotomia entre pesquisa básica e
pesquisa aplicada no cenário do desenvolvimento científico,
tecnológico e econômico” (SAMPRONHA et ali), acessível pelo
link http://www.rc.unesp.br/biosferas/Esp12-11.html (Acesso
em 25/10/2019).

E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo


tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente
entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos resumir tudo
o que vimos. Você deve ter aprendido que o saber histórico e o
saber histórico escolar são dois conhecimentos diferentes, apesar
das suas semelhança. O primeiro é um conhecimento de “ciência
pura”, voltado para a explicação da sociedade e voltado para
uma audiência já formada. O segundo é um conhecimento mais
próximo de uma “ciência aplicada” que visa, de acordo com
os estabelecido na legislação vigente, ajudar na formação do
pensamento crítico e do respeito à diversidade em uma audiência
ainda em formação. Nesse contexto, o papel do professor é ser
um mediador em entre o primeiro e sua audiência para construir
o segundo e alcançar as finalidades estabelecidas.
Metodologia do Ensino de História 17

O ensino de história em discussão: os


parâmetros curriculares nacionais e o
ensino de história.
Como dito anteriormente, é necessário o conhecimento da
legislação vigente para se realizar um bom trabalho (ainda que seja
assumindo uma postura crítica) e toda a documentação envolvendo
o ofício do magistério. Uns desses documentos são os Padrões
Curriculares Nacionais (PCN). Surgidos como material de apoio
à Lei 9394/96, em seu texto de introdução que eles são “ orientar
e garantir a coerência dos investimentos no sistema educacional,
socializando discussões, pesquisas e recomendações, subsidiando
a participação de técnicos e professores brasileiros, principalmente
daqueles que se encontram mais isolados, com menor contato com
a produção pedagógica atual (PCN, 1997: 13).”
Então, os PCNs servem com uma espécie de guia para o
professor de quais objetivos ele deve trabalhar na sua disciplina,
dentro da realidade do ensino fundamental. Ele vem a reboque
de uma série de mudanças que ocorreram no país e no mundo.
A legislação anterior era de 1971 (Lei Federal n. 5.692, de 11 de
agosto de 1971 - não por acaso, governo do Presidente Emílio
Garrastazu Médici, cujo governo ficou conhecido como “Anos de
Chumbo” da Ditadura Militar) e nove anos antes da promulgação
desta lei, teve a promulgação da Constituição de 1988 (a
“Constituição Cidadã”, primeira depois da redemocratização)
e uma série de conferências internacionais sobre educação.
Ou seja, ela está alinhada com todo um momento histórico de
abertura política e de repensar a cidadania e o papel do cidadão,
e o como a educação se encaixa nisso tudo.
Sempre é bom refletir que, mais do que um direito do
cidadão, a educação é uma política de Estado e representa os
interesses dos governantes, além de refletir o momento histórico.
Governos mais democráticos ou mais autoritários terão diferentes
interesses para a educação. Reflita.
18 Metodologia do Ensino de História

O ensino de História dentro destes PCNs vai se encaixar


da seguinte forma:
“compreender a cidadania como participação
social e política, assim como exercício de direitos
e deveres políticos, civis e sociais, adotando, no
dia-a-dia, atitudes de solidariedade, cooperação
e repúdio às injustiças, respeitando o outro e
exigindo para si o mesmo respeito;posicionar-
se de maneira crítica, responsável e construtiva
nas diferentes situações sociais, utilizando o
diálogo como forma de mediar conflitos e de
tomar decisões coletivas (...)” (PCN - História e
Geografia, 1997: 5)
Ou seja, os PCNs eles se alinham com os objetivos de
autonomia, pensamento crítico e respeito à diversidade que
estão incluídos na Lei 9394/96. Sendo assim, eles serviriam
como um guia para os profissionais de educação alcançarem
estes objetivos.
Mais do que uma determinação do governo e uma lei que o
professor tem que cumprir, os PCN são um documento histórico
do momento da redemocratização do país. Representam uma
época que, depois de o término de um ciclo de autoritarismo
e reestruturação da república. E, como já dito anteriormente, a
educação serve também como reflexo dos interesses do Estado.
A educação, assim como outros setores, é uma política de
Estado e reflete os interesses dos grupos dominantes. Não é por
acaso que objetivos como respeito à diversidade e formação do
pensamento crítico foram incluídos justamente no momento em
que o país estava se redemocratizando.
Metodologia do Ensino de História 19

Tabela 2: Estudo comparativo das LDBs.

Lei 5692/71 Lei 9394/96


Primeiro grau com oito anos de Ensino fundamental com oito anos de
duração duração
Segundo grau com três anos de
Ensino médio com três anos de duração
duração
Propõe uma reforma na formação
Prevalecia o ensino tecnicista profissional, em que o nível de
em que no atualmente chamado formação deve passar à superior
de médio formava profissionais fazendo com que até então chamado de
a nível médio (técnico). médio não servisse mais como requisito
básico no mercado de emprego.
Uso de disciplinas como
Exclusão de OSPB e “moral e cívica”, e
“moral e cívica”, no primeiro
inclusão de disciplinas como sociologia
grau e OSPB (Organização
e filosofia no ensino médio, visando
Social e Política Brasileira), no
(junto com História e geografia) auxiliar
segundo grau com a intenção
na formação do pensamento crítico e
de estimular o patriotismo e o
compreensão da realidade social.
civismo.
Fonte: Adaptado de FERREIRA, Natália de Carvalho. Estudo comparativo das LDBs.
Disponível em: http://pedagogiaaopedaletra.com/estudo-comparativo-das-ldbs/. Acesso em: 25/10/2019.

Apesar de o tempo de escolaridade ter se mantido e,


numa primeira olhada, parecer que a mudança maior foi na
nomenclatura, uma observação mais apurada já demonstra
algumas mudanças. A primeira mudança que podemos notar é
a questão da mudança do foco de uma educação tecnicista para
uma educação com um foco mais crítico, o que se refletiu também
numa sutil mudança no currículo na exclusão das disciplinas
“educação moral e cívica” e “OSPB” (respectivamente, no
primeiro grau e no segundo grau) e a inclusão das disciplinas
sociologia e filosofia, ambas no ensino médio.
Por educação tecnicista, quero dizer uma educação
puramente voltada para a transmissão de conhecimento e a
formação de profissionais para o mercado de trabalho, sem uma
reflexão mais profunda da realidade social e política.
20 Metodologia do Ensino de História

Até aqui, ok, mas você deve estar se perguntando: “E o quê


isto tem a ver com o ensino de história?” Muito, meu caro futuro
colega. Do momento que a própria lei estabelece como objetivo
a formação crítica dos cidadãos e o respeito à diversidade, você
já tem uma poderosa ferramenta em mãos para fugir do lugar
comum de nomes, datas e heróis nacionais e buscar fazer uma
proposta mais questionadora, sem correr o risco de ter problemas
com os pais (acredite, isto pode acontecer).

IMPORTANTE

Por mais que possa soar absurdo, mas existem temas na disciplina
de História que podem se tornar espinhosos dependendo da
clientela ou responsáveis. Por exemplo, temáticas voltada
para a cultura afro-brasileira (principalmente, a questão da
religiosidade) podem ter resistência de alunos que venham de
famílias neopentecostais, assim como temas como “O Golpe
de 1964” podem causar atritos com escolas militares ou alunos
com familiares militares. Para se livrar dessas situações, sempre
mostre que a lei está do seu lado.

Daí, a importância dos PCNs e da nova LDB. Mais do


que uma guia para o professor orientar o seu trabalho, essa
documentação pode servir como uma espécie de “apólice de
seguros” que podem lhe salvar de situações desagradáveis com
alunos ou seus responsáveis.
Mas como foram feitos os PCNS e, principalmente, qual a
visão de História que se encaixa nele?
De acordo com Silva et alli (2016: 47), os PCNs foram
desenvolvidos a partir de um estudo preliminar de propostas
curriculares de estados e municípios feito pela fundação Carlos
Metodologia do Ensino de História 21

Chagas, a pedido do MEC. A partir destes estudos, foi feita uma


“versão preliminar” que foi colocada para debate nacional. Para
isso, foram feitas discussões entre professores universitários,
representantes de secretarias municipais e estaduais de educação,
entre outros profissionais do ramo e a partir daí, gerados dois
documentos: os PCNs do ensino fundamental e os PCNs do
ensino médio.
Como um todo os parâmetros buscaram uma abordagem
interdisciplinar, valorizando temas transversais. Dentro da
disciplina de História, a linha que ficou predominante foi da
“História Nova”, mas precisamente a parte ligada à História do
cotidiano, micro e macro-história.

DEFINIÇÃO

Também conhecida como “terceira geração dos Annales”, o


movimento da “História Nova” (também chamado de “Nova
História Cultural” ou “Nouvelle Histoire”), foi um movimento
de historiadores franceses surgido após os protestos de maio de
1968. Este grupos de historiadores tentavam entender o papel
da cultura e das estruturas de mentalidade dentro das mudanças
históricas. Para isso era fundamental também compreender
o papel de grupos marginalizados e minoritários, o que a fez
também ser conhecida como “História dos vencidos”. Para
maiores informações, veja Burke, 1997: 79 -108.

Sendo assim, os PCNs abrem um leque imenso de


possibilidades para se trabalhar diversas possibilidades
históricas. Uma das mais ricas é se utilizar dos conteúdos
de micro-história e História dos vencidos para se trabalhar
propostas de como o aluno pode se reconhecer como agente da
história. Principalmente na rede pública, a presença de grupos
22 Metodologia do Ensino de História

tradicionalmente marginalizados em sala de aula é certa. Numa


perspectiva uma História tradicional (mais cara ao paradigma
da escola metódica) de grandes nomes e fatos, pode causar
pouca identificação aos alunos. Para “ajudar” mais ainda,
tradicionalmente, História é uma disciplina que tem uma carga
horária menor do que outras disciplinas como matemática e
língua portuguesa (para se ter uma ideia, na rede municipal do
Rio de Janeiro, responsável pelo ensino fundamental, História
conta com três tempos de cinquenta minutos por semana e a rede
estadual, responsável pelo ensino médio, conta com dois tempos
por semana). Ou seja, mais um complicador é adicionado a já
nada fácil vida do magistério.
A escola metódica foi um movimento surgido na França,
liderados pelos historiadores Gabriel Monod e Gustave Charles
Faganiez que fundaram a revista Revue Historique, em 1876.
Influenciados pelo historiador alemão Leopold von Ranke,
eles buscavam fazer uma História científica, valorizando a
documentação escrita e focando nos grandes fatos históricos e
nomes, pois era uma História que buscava também servir como
elemento de coesão nacional. Para maiores informações ver
Fontana, 2004: 171-198.
Esse assunto será melhor abordado adiante, mas apontarei
aqui algumas estratégias que podem lhe ajudar nessa tarefa. Uma
saída (inclusive sugerida na própria LDB e no PCN) é trabalhar
com a História local. Vivemos num país com uma riqueza cultural
imensa e que respira História, apesar desconhecida por uma parte
considerável da população. Então, a história local/regional pode
ser uma poderosa ferramenta para criar esse elo. Nos exercícios
e outros materiais detalharei melhor, mas vou colocar aqui um
exemplo baseado na minha realidade para dar um auxílio.
Atualmente, dou aula em Bangu, um bairro da zona
oeste da cidade do Rio de Janeiro. Um bairro não exatamente
“glamuroso” e longe da praia, mas que foi primordial para a
História do futebol do país.
Metodologia do Ensino de História 23

Surgido a partir da fusão de duas fazendas, o bairro foi


fundado em 1890 para receber uma fábrica de tecidos que levou
o nome do bairro: a Fábrica de Tecidos Bangu, que hoje é um
shopping center que lava o nome do bairro.
Figura 3

Fonte: wikimedia commons

O que pouca gente sabe é que este bairro e o canteiro desta


fábrica foram palcos da primeira partida de futebol no Brasil.
Muito antes do paulistano Charles Miller, o escocês Thomas
Donohoe realizou a primeira partida no canteiro dessa fábrica.
Figura 4

Fonte: wikimedia commons

E a partir da pelada de Donahue é que foi formado o Bangu


Atlético Clube, de onde saiu Domingos da Guia, craque da Copa
do Mundo de 1938.
24 Metodologia do Ensino de História

Figura 5

Fonte: wikipedia

Essa História está toda contada pelas ruas do bairro na


forma de estátuas e instalações do clube, além da imponente
presença do prédio da antiga fábrica, que hoje é o shopping
center do bairro. Isso tudo fornece um material riquíssimo
para ser trabalhado que variam desde atividades mais lúdicas
como colorir o brasão do bairro (ideal para turmas de primeiro
segmento ou de sexto ano), até pesquisas mais profundas para
as turmas maiores. Isso tudo perfeitamente alinhado com os
objetivos de valorizar a história local/regional, como também
manda os PCNs e a LDB.

SAIBA MAIS

E aí, ficaram curiosos sobre a importância de Bangu para a História


do futebol brasileiro? Você pode saber mais sobre esse tema no
blog do meu amigo e colega de trabalho, o professor de Educação
Física Rogério Melo (http://blogdorogeriomelo.blogspot.com) ou
na própria página oficial do Bangu Atlético Clube (https://www.
bangu-ac.com.br/). No YouTube também tem um vídeo bem bacana
cahamdo “Bola para o Seu Danau” (https://www.youtube.com/
watch?v=WvswFeQUBOQ) com uma dramatização da primeira
partida e um pouco da História por trás dela. Agora, bola pra frente!
Metodologia do Ensino de História 25

O exemplo é para mostrar como com um pouco de pesquisa


e criatividade você pode se alinhar aos PCNs e tentar despertar
um pouco da paixão que nós sentimos pela História (e quem sabe
talvez até descobrir um futuro colega nosso. Acredite, mesmo
sem querer podemos inspirar). Portanto, estude, pesquise, pense
e use sua criatividade.

RESUMINDO

E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo tudinho?


Agora, só para termos certeza de que você realmente entendeu o
tema de estudo deste capítulo, vamos resumir tudo o que vimos. Você
deve ter aprendido que o saber Parâmetros Curriculares Nacionais
são orientações para o trabalho do professor e estão alinhados com
os objetivos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação 9394/96, de
estimular o pensamento crítico, o respeito à diversidade e o ensino
da História local/regional. Que tanto os PCNs quanto a LDB são
fruto de um momento histórico tanto nacional, que foi o processo
de redemocratização, como internacional, que foram discussões
internacionais como a Conferência Mundial de Educação para
Todos, em Jomtien, em 1990.

Você também deve ter aprendido que mais que um guia, os


PCNs e a LDB podem servir como documentos para o professor
se resguardar em possíveis momentos delicados com alunos e
responsáveis.
E, por último, você deve ter aprendido que a história local/
regional pode ser uma poderosa aliada para despertar o interesse
dos alunos pela matéria, desde que você use de pesquisa e
criatividade.
26 Metodologia do Ensino de História

As categorias históricas no processo de


ensino-aprendizagem: uma abordagem
interdisciplinar
Então, meu caro futuro colega, a medida que nos
aproximamos do final (estamos na nossa penúltima unidade)
vamos olhar detalhadamente para a nossa disciplina e sua prática
de sala da aula, ainda com aquela velha pergunta do início desta
unidade nesta: como adaptar esse conhecimento altamente técnico
e complexo para a realidade da nossa clientela, e respeitando os
objetivos de incentivar a diversidade e o desenvolvimento do
senso crítico, dentre outros que já discutimos?
Para isso pretendo aqui mesclar um pouco de prática e teoria
para nós refletirmos (eu e você meu caro leitor) do que são certos
conhecimentos mais técnicos da nossa área e da própria pedagogia,
e tentar revertê-las em exemplos de como podemos trabalhar em
sala de aula. Para isso vamos discutir individualmente o que são
as categorias históricas, o que é a interdisciplinaridade e depois
pensarmos o como vamos trabalhar em sala.

O que é interdisciplinaridade?
Para quem acompanha as discussões sobre educação há
algum tempo, a palavra interdisciplinaridade com certeza já
apareceu em algum artigo ou outro material sobre o assunto. Para
mim, que comecei a faculdade nos fins do anos 1990 (agosto de
1997, para ser mais preciso), ela começou a aparecer na minha
vida acadêmica nas aulas da disciplina “Metodologia da História
I”, onde comecei a dar meus primeiros passos acerca de refletir
sobre o que é a ciência histórica (e também o que é a ciência, em
si), como fazer resenhas críticas, fichamentos, etc. O primeiro
texto que a nossa professora nos mandou ler foi “Um discurso
sobre as ciências na transição para uma ciência pós-moderna”,
do pensador Boaventura de Sousa Santos.
Metodologia do Ensino de História 27

Professor Catedrático Jubilado da Faculdade de Economia


da Universidade de Coimbra e Distinguished Legal Scholar da
Faculdade de Direito da Universidade de Wisconsin-Madison
e Global Legal Scholar da Universidade de Warwick, tem
vários livros e artigos publicados em temas como metodologia
científica das ciências humanas, globalização, sociologia do
direito, epistemologia, democracia e direitos humanos. Maiores
detalhes sobre sua obra podem ser vistos no site http://www.
boaventuradesousasantos.pt.
Nesste texto, escrito no final dos anos 1990, o Professor
Boaventura nos falas de uma série de mudanças no referencial do
que são as ciências (ou num jargão mais técnico, no “paradigma
científico“). Boaventura não chega ser tácito ao afirmar o que será
esse novo paradigma, pois para ele o mesmo ainda se encontra em
formação (que aqui será chamdo de paradigma pós-moderno), mas
faz algumas afirmativas e comparações com o paradigma vigente
da época (que será chamado aqui de Paradimga Moderno). Eu
sintetitizei esse pontos na tabela abaixo.
Tabela 3: Paradigmas

Paradigma Moderno Paradigma Pós-moderno


Influência do Iluminismo Influência de Hegel e Heidegger
Aceita a diversidade interna, porém
Fim da fronteira entre ciências
com fronteiras bem demarcadas
naturais e sociais
entra as ciências
Visão determinista Visão não-determinsita
Adaptado de Santos, 1998: 50-54,59-71]]

Foi a partir deste texto que tomei com os conceitos de


interdisciplinaridade e de transdisciplinaridade. Explicando
muito rapidamente, interdisciplinaridade será um intercâmbio
entre saberes diferentes mas ainda mantendo a hierarquia entre
as disciplinas. Já a transdiciplinaridade explodiria com isso
tudo, gerando novas disciplinas onde você não veria mas essa
fronteiras. Se no primeiro caso poderíamos falar por exemplo de
28 Metodologia do Ensino de História

uma geografia histórica, ou História geográfica, no segundo caso


disciplinas como Biologia molecular estreitariam esta fronteiras
entre química, física e biologia.
Para entender um pouco melhor sobre essa diferenças,
veja a entrevista filósofo Ivan Domingues para a revista Diversa
em https://www.ufmg.br/diversa/2/entrevista.htm.
É dentro dessa primeira perspectiva que trabalharemos
agora: a de construída uma abordagem histórica, se valendo de
outras disciplinas, mas sem jamais perder a História do horizonte.
Não por caso, trabalharemos categorias históricas.

As categorias históricas
Como toda ciência, a história tem noções específicas
dentros do seu campo que são obrigadas se compreendê-la.
Categorias permanência, mudança, diacronia (eventos que
ocorrem em sucessão), sincronia (eventos que ocorrem ao
mesmo tempo) e anacronismo (um juízo inadequado feito de um
tempo presente feito uma determinada época passada), além do
nome de ideologias políticas, períodos históricos, etc.

ACESSE

O canal do YouTube “Leitura Obrigahistória” tem uma série de


vídeos bem bacanas sobre conceitos históricos. Você pode conferir
o playlist em http://bit.ly/2PFFpSB , acessado em 31/10/2019.

Nem todos esses conceitos são de familiaridade de todos


(para ser sincero, quase nenhum o é), porém são fundamentais
para o correto entendimento dos conteúdos da nossa disciplina,
além de uma forma conseguirmos os objetivos determinados
pelo governo. Sendo assim o uso de outras disciplinas pode se
tornar um facilitador. E sobre isso que será o próximo item.
Metodologia do Ensino de História 29

Trabalhando a interdisciplinaridade
Esta parte agora buscarei ser menos técnico e falar mais de
propostas concretas que consegui construir ao longo da minha
experiência tanto como professor, como aluno.
Sempre é bom começar pela parte mais fácil e, na
maioria das vezes, quando se fala em uma ciência/disciplina
próxima para se trabalhar com História, geografia costuma a
ser a primeira opção. Realmente, mapas costumam a ser uma
mão na roda para se trabalhar, por exemplo, as noções de
permanência e mudança, como vemos no site (https://www.vox.
com/world/2018/6/19/17469176/roman-empire-maps-history-
explained) que disponbiliza quarenta mapas que explicam o
Império Romano. Não só permanência e mudança, mas questões
como diacronia e sincronia podem ser muito bem trabalhadas
ao se mostrar que o avanço do Império Romano foi fruto tanto
de sequências de campanhas militares ocorrendo ao longo de
séculos, quanto de batalhas simultâneas.
Figura 6

Fonte: http://bit.ly/2Q4l0FL. Acesso em: 31/10/2019.

Não só a música como o cinema, a literatura e até as


artes plásticas podem ser importantes ferramentas para você
usar aliadas na construção do conhecimento histórico. No EJA
30 Metodologia do Ensino de História

(Educação de Jovens e Adultos), por exemplo, a partir do ano


que vem começaremos a trabalhar com eixos temáticos que
permeiam todas as matérias que são, trabalho, cultura e meio
ambiente, que perpassarão todas as disciplinas, o que nos levará
a usar e abusar de interdisciplinaridade no nosso dia-a-dia.

ACESSE

Para entender um pouco melhor como funciona a Educação de


Jovens e Adultos aqui no Rio de Janeiro, acesse: http://prefeitura.
rio/web/sme/exibeconteudo?id=9272643.

Portanto, meu caro futuro, use da criatividade e diálogo.


Não se isole! Discuta com seus colegas, elabore os seu projetos
e pense fora da caixa.
E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo
tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente
entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos resumir tudo o
que vimos. Você deve ter aprendido que a interdisciplinaridade é
uma tendência muito em voga desde o final do século XX e que
ela tem a ver com uma mudança no paradigma científico onde
as disciplinas antes isoladas começaram a se aproximar. Você
deve ter aprendido que, ao contrário da transdisciplinaridade,
a interdisciplinaridade incentiva o diálogo e a importação
de conceitos entre as disciplinas, mas sem quebrar com as
fronteiras entre os saberes. Você também deve ter aprendido que
a interdisciplinaridade pode ser uma importante ferramenta para
te ajudar a trabalhar categorias históricas como permanência,
mudança, anacronismo, dentre outras, te obrigando a pensar fora
da caixa e a dialogar com seus colegas de outras disciplinas.
Metodologia do Ensino de História 31

Amarrando as pontas: refletindo sobre a


prática docente e as exigências
Agora, meu caro futuro colega, que já estudamos acerca
de algumas leis que envolvem nosso ofício, dos objetivos que
as mesmas determinam e de possíveis formas de usarmos outras
disciplinas (e o auxílio de outros colegas) para tentarmos alcançar
estes objetivos, cabe agora tentar amarrar isto tudo em uma reflexão
sobre a prática em sala. Para isto é bom retornarmos e pensarmos
sobre os objetivos, os limites e as possibilidades que se abrem.

Dos objetivos da prática docente


Como já falamos algumas vezes, os principais objetivos
do ensino de História, dentre outros, são:
Ensino Fundamental Ensino Médio
compreender a cidadania como compreender a cidadania como
participação social e política, participação social e política,
assim como exercício de direitos e assim como exercício de direitos e
deveres políticos, civis e sociais deveres políticos, civis e sociais
compreender a sociedade,
posicionar-se de maneira crítica, sua gênese e transformação, e
responsável e construtiva nas os múltiplos fatores que nela
diferentes situações sociais, intervêm, como produtos da ação
utilizando o diálogo como forma humana; a si mesmo como agente
de mediar conflitos e de tomar social; e os processos sociais como
decisões coletivas; orientadores da dinâmica dos
diferentes grupos de indivíduos;
compreender a produção e o papel
conhecer características histórico das instituições sociais,
fundamentais do Brasil nas políticas e econômicas, associando-
dimensões sociais, materiais e as às práticas dos diferentes grupos
culturais como meio para construir e atores sociais, aos princípios
progressivamente a noção de que regulam a convivência em
identidade nacional e pessoal e o sociedade, aos direitos e deveres da
sentimento de pertinência ao país; cidadania, à justiça e à distribuição
dos benefícios econômicos;
32 Metodologia do Ensino de História

conhecer e valorizar a pluralidade


traduzir os conhecimentos sobre a
do patrimônio sociocultural
pessoa, a sociedade, a economia,
brasileiro, bem como aspectos
as práticas sociais e culturais em
socioculturais de outros povos e
condutas de indagação, análise,
nações, posicionando-se contra
problematização e protagonismo
qualquer discriminação baseada
diante de situações novas,
em diferenças culturais, de classe
problemas ou questões da vida
social, de crenças, de sexo, de etnia
pessoal, social, política, econômica
ou outras características individuais
e cultural;
e sociais;
Fonte: http://bit.ly/2s5svV5 e http://bit.ly/2ZfZLFq

Se nós fôssemos resumir os objetivos, poderíamos


dizer que, em ambos os segmentos, o ensino de História visa
a formação de um cidadão crítico e consciente da realidade
histórica e cultural do país.
Esses objetivos têm que estar permeando o tempo todo a
nossa prática pedagógica, ou seja, as nossas aulas e atividades
tem que estar sempre direcionadas para estas metas.

Dos limites e desafios da prática docente


Além dos limites óbvios como as diferenças de idade de
cada segmento, limitações individuais dos alunos, limitações
de estrutura física da escola (infelizmente, nem todas escolas
contam recursos multimídias como aparelhos TV, áudio ou de
DVD, projetores, caixas de som, etc.; e às vezes esta estrutura
está precarizada seja por má conservação, seja por quantidade
insuficiente para todos os profissionais), há ainda outros
complicadores como:
 carga horária desigual e má distribuída, que pode limitar
as possibilidades de atividades a serem realizadas em sala de
aula;
 resistência por parte dos alunos ou de seus pais devido às
suas convicções como crenças religiosas, orientações políticas,
etc.
Metodologia do Ensino de História 33

 resistência por parte de direções ou do projeto


pedagógico da escola que muitas vezes pode estar mais focado a
servir como preparatório para provas como ENEM, etc.
 escolas localizadas em zona de conflito ou que tenham
alunos que levem conflitos de fora da escola para dentro do
ambiente escolar
Esses são apenas alguns dos complicadores que se
apresentam dentro da prática docente. Porém, dizem que o
otimista costuma ver oportunidades onde o pessimista vê
complicações e se por um lado, num primeiro momento os
complicadores acima podem limitar nossa ação, por outro
podem servir como um estímulo a nossa criatividade, abrindo
novas possibilidades.

Das possibilidades na prática docente


Lembre-se que os PCNs e a LDB são instrumentos legais.
Logo, tenha sempre eles em mão para caso ocorra alguma
emergência. Se você for questionado, mostre que você só estava
cumprindo a lei.
Sempre use também do seu bom senso e criatividade. Evite
criar aborrecimentos desnecessários e/ou prejudicar sua carreira.
Se você ver que uma atividade não teve o retorno esperado
ou causou uma agitação desnecessária ou desproporcional,
não tenha medo (ou vergonha) de repensar, replanejar ou, até
mesmo, desistir e esperar um momento oportuno. O universo
escolar é extremamente rico, variado e imprevisível. Então,
erros, improvisos e correções de rumo sempre são necessários,
por mais que se tenha planejado à exaustão. Aliás, sobre os
imprevistos, aprenda a lidar com eles. Eles serão uma constância
em sua vida como docente.
Sobre a carência da estrutura, bom, você pode ter duas
opções para trabalhar com isso: ou suprir por conta própria com
recursos que ache relevantes, ou se limitar às possibilidades que
34 Metodologia do Ensino de História

a escola lhe oferece. Particularmente, eu tentei ficar num meio


termo, me municiando de cabos, extensões e fazendo um acervo
próprio de DVDs que eu podia levar para qualquer escola que eu
desse aula ou aproveitar até em casa mesmo. Esse último item,
deixo com você, pois só ninguém conhece melhor seus limites e
possibilidades do que você.
Sobre a resistência de direções autoritárias e/ou projeto
pedagógico, bom tente na medida do possível negociar e
chegar num meio termo, sem colocar seu emprego em risco
(principalmente, se você estiver na rede particular ou ainda
estiver no estado probatório na rede pública). No caso de grandes
redes com projeto políticos pedagógicos amarrados e um foco
para provas como ENEM, realmente pode ser que você não
tenha muito o que fazer. Geralmente, essas grandes redes tem
apostilas já prontas, provas padronizadas e toda uma “receita”
a ser seguida estabelecida pela matriz e definida pelo projeto
político e pedagógico da rede. Porém, o ENEM pode se tornar
o seu maior aliado na hora de tentar fazer uma proposta voltada
para a formação de um cidadão crítico e tolerante. Sendo uma
prova elaborada pelo governo (mais precisamente o Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira -
INEP, autarquia vinculada ao Ministério da Educação do Brasil,
criada em 1998), ela é alinhado aos PCNs e a LDB; isso sem
falar que a prova de redação costuma a tocar em temas polêmicos
como a questão da manipulação de pessoas pela internet.

ACESSE

http://bit.ly/2Sc5Lxu, acesso em 01/11/2019.


Metodologia do Ensino de História 35

E, para finalizar, lembre acima de tudo que “a educação


é um ato de amor, por isso um ato de coragem” (FREIRE,
1974: 46). Quando nós amamos, nossa colocamos vulneráveis
e nossa paciência é colocada sempre à prova e, acredite, nessa
profissão isso acontecerá contigo constantemente. Então, ame
sua profissão, seus alunos e colegas, mas não deixe de se amar
também. Desafie os seu limites, mas lembre que eles existem e
se eles não podem ser expandidos, respeite-os.
36 Metodologia do Ensino de História

BIBLIOGRAFIA
BURKE, Peter. A Escola dos Annales (1929-1989): a revolução
francesa da historiografia. São Paulo: Unesp, 1997.
Domingues, Ivan. Humanidade Inquieta, IN: Diversa Revista
da Universidade Federal de Minas Gerais Ano 1 - nº. 2 - 2003.
Disponível em: http://bit.ly/2SbFeAq. Acesso em: 31/10/2019.
FREIRE, Paulo. Educação e mudança. Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 1974.
FONTANA, Josep. A história dos homens. Bauru: EDUSC,
2004.
Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm. Acesso em
25/10/2019.
PARO, Vitor Henrique. Autonomia do educando na escola
fundamental: um tema negligenciado. Educar em Revista,
Curitiba, Brasil, n. 41, p. 197-213, jul./set. 2011. Editora
UFPR. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/er/n41/13.pdf,
acessado em 25/10/2019
SANTOS, Boaventura de Sousa. Um discurso sobre as
ciências na transição para uma ciência pós-moderna. Estudos
Avançados, São Paulo, v. 2, n. 2, p. 46-71, Ago. 1988 . Disponível
em: http://bit.ly/34zQHw0. Acessado em: 31/10/2019.
SAMPRONHA, STEPHANIE; GIBRAN, Fernando Z.;
SANTOS, Charles M. D. Ciência Pura e Ciência Aplicada-A
dicotomia entre pesquisa básica e pesquisa aplicada no cenário
do desenvolvimento científico, tecnológico e econômico. Jornal
Biosferas ED. ESPECIAL 2012: A Biologia como Ciência e a
Biologia como Profissão. São Paulo: UNESP, 2012. Disponível
em: http://www.rc.unesp.br/biosferas/Esp12-11.html, acessado
em 25/10/2019.
Metodologia do Ensino de História 37

Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental.


Brasília: MEC, 1997.
Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental
vol.5 - História e Geografia. Brasília: MEC, 1997.
Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio.
Brasília: MEC, 2000.
SUMÁRIO
UNIDADE 4
Livros didáticos de história para as séries iniciais do
ensino fundamental: entre propostas estimulantes e
abordagens tradicionais ........................................................12
O papel do PNLD no mercado editorial e no Ensino de História....... 12
Como se processa a seleção e as compras no PNLD .......14
O Guia do Livro Didático..................................................15
Verticalização e pulverização....................................................16
Avaliando o PNLD....................................................................16
Identificando e diferenciando os diversos tipos de material
didático.....................................................................................19
Identificando os materiais didáticos..........................................19
Conceito de Suporte de Informação..................................20
A definição de documento.................................................21
A tradição e a modernidade na sala de aula..............................23
O difícil caminho do meio........................................................23
Aprendendo com a própria experiência.............................25
Achando o caminho e prosseguindo a viagem..........................28
O livro didático entre propostas tradicionais e inovadoras no
século XXI................................................................................30
O papel da pedagogia crítica e da internet ....30
Metodologia do Ensino de História 7

A Internet e os livros didáticos..........................................32


A reação das editoras e o efeito da Internet.......................32
O livro didático nos anos iniciais do ensino fundamental........34
História para crianças................................................................34
A organização do nosso sistema educacional....................36
A importância dos anos iniciais na construção de um
cidadão crítico...................................................................37
Cidadão critico, consciente e tolerante.....................................38
Elaborando seu próprios materiais.......................................41
Por que o professor deve saber desenvolver seus materiais?....41
Delimitando os objetivos...................................................44
Analisando e disponibilizando os recursos.......................45
Administrando o tempo e analisando o perfil da turma.....45
Construindo exemplos..............................................................46
A batalha do passinho...............................................................47
Avaliando os resultados.....................................................48
A Avaliação digital de História e Geografia..............................49
Avaliando os resultados.....................................................50
Metodologia do Ensino de História 9

UNIDADE

04
10 Metodologia do Ensino de História

INTRODUÇÃO
Você sabia que os livros didáticos são um campo de
discussão extremamente profícuo? Isso mesmo. A área de
didática vem discutindo o papel do livro didático desde sempre.
Com a principal responsabilidade de servir tanto de materia de
apoio para o professor como referência para o aluno, ele tem
tido seu papel discutido nos últimos anos. Com as mudanças
feitas pela LDB 9394/96 e pelos PCNs, além da ascenção da
Internet, as editoras tem se esforçado para atender às demandas
da atualidade e manter o livro didático como material relevante,
até porque ele tem enfrentado concorrência de diversos meios
digitais e analógicos. Entendeu? Ao longo desta unidade letiva
você vai mergulhar neste universo dos recursos didáticos!
Metodologia do Ensino de História 11

OBJETIVOS
Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 4. Nosso
objetivo é auxiliar você no desenvolvimento das seguintes
competências profissionais até o término desta etapa de

1
estudos:

Compreender como funciona o PNLD (Programa


Nacional do Livro Didático);

2 Aplicar as técnicas de seleção de materiais e livros


didáticos;

3 Identificar e solucionar problemas relacionados a


materiais desatualizados ou formalmente incorretos;

4 Executar os procedimentos de adequação e crítica


para quando ocorrer a situação acima.

Então? Está preparado para uma viagem sem volta rumo ao


conhecimento? Ao trabalho! Vamos começar nossa desafiadora
e estimulante jornada sobre o ensino de História.
12 Metodologia do Ensino de História

Livros didáticos de história para as séries


iniciais do ensino fundamental: entre propostas
estimulantes e abordagens tradicionais

OBJETIVO

Ao término deste capítulo você será capaz de entender como


funciona Programa Nacional do Livro Didático (PNLD).
Isto será fundamental para o exercício de sua profissão. Este
programa ele distribui livros para escolas públicas e, para isso
define critérios que são utilizados por editoras de todo o país.
Então vamos lá. Avante!

O papel do PNLD no mercado editorial e no


Ensino de História
O livro didático sempre teve um papel ambíguo na sala
de aula. Visto como uma “amarra” para uns e uma ferramenta
indispensável para outros, ele faz parte do cotidiano de
educadores e educando há bastante tempo. Como diversos
outros elementos materiais e imateriais da escola e do processo
de ensino-aprendizagem, ele representa concepções históricas e
ideológicas do período e da instituição onde este processo ocorre.
Sendo assim, é normal que ele sofra diversas alterações ao longo
dos anos. Seja pela natural processo de atualização e evolução
do campo científico, seja pela interferência do Estado atuando
na educação. Como a educação é um setor estratégico alvo de
interesse público, ela é constantemente alvo de políticas públicas
que representam as concepções de governo e sociedade. Tanto se
adequar a tais mudanças, editoras e autores vão constantemente
atualizar e revisar seu materiais como forma de se manterem
relevantes dentro do mercado. Nos últimos anos, o grande
Metodologia do Ensino de História 13

termômetro deste mercado tem sido o Programa Nacional de


Distribuição de Livros Didáticos (PNLD).
Voltado para a educação básica, este programa compreende
um conjunto de ações voltadas para a distribuição de obras
didáticas, pedagógicas e literárias, entre outros materiais de
apoio à prática educativa nas escolas públicas de educação básica
do País. Dado o tamanho da rede pública (ainda insuficiente para
cobrir nossos 8.511.165 km² e nossa população de mais de 20
milhões de crianças e adolescentes em idade escolar) do nosso
país, as editoras tem se esforçado em se adequar aos padrões
exigidos pelo MEC, via LDB 9394/96 e pelos PCNs. Para se ter
uma ideia da importância em números deste programa, de acordo
com o site oficial do programa (fnde.gov.br) em 2019 foram
gastos cerca de R$ 1.102.025.652,17. Destes valores, cerca de
R$ 615.852.107,23 com os anos iniciais do ensino fundamental,
beneficiando 12.189.389 alunos, distribuídos por 92.467 escolas
em todo território nacional.

ACESSE

Só por estes números podemos ver que ele está longe de


ser algo desprezível para um setor que pelo quinto ano
seguido registra queda como podemos ver na matéria no
link: https://bit.ly/39iz0Vh.

Não nos esquecemos que, para além da importância para


o mercado editorial, o PNLD tem uma grande importância em
garantir acesso aos livros a alunos de famílias de baixa renda,
tradicionalmente a principal clientela do ensino público. Com a
obrigatoriedade do ensino a partir dos anos 1980 e as diversas
iniciativas tentando universalizar o acesso ao ensino público,
14 Metodologia do Ensino de História

fornecer o material didático entre outras políticas se tornou uma


questão chave para garantir a permanência dos mais carentes.
Para compreendermos de fato o como funciona o
PNLD e o seu impacto, precisamos entender o como se dá o
processo de compra e distribuição, como as escolas participam
e, principalmente, a escolha dos livros. Entendendo esses
processos você poderá ter uma visão melhor de qual é o impacto
deste programa e, principalmente, pensar melhor suas escolhas
quando chegar o momento de selecionar o livro para sua turma.

Como se processa a seleção e as compras no PNLD


O processo de escolha dos livros para serem comprados
é um processo que obedece a várias etapas. Para as editoras a
primeira etapa é se inscreverem num edital do governo.

SAIBA MAIS

Edital é um ato escrito em que são apresentadas determinações,


avisos, citações e demais comunicados de ordem oficial. No caso
específico do PNLD, dentro do edital são estabelecidas todas
as condições para a editora participar e o conteúdo exigido dos
livros. Você pode acessar estes editais em: https://bit.ly/2SCFtER.

Em outras palavras, a cabe ao governo federal determinar


quais os critérios mínimos para que os livros possam participar
da seleção pública que será encaminhada às escolas. Esses
critérios são usados Guia do Livro Didático os livros aprovados
são reunidos.
Metodologia do Ensino de História 15

O Guia do Livro Didático


Elaborado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação (FNDE), o Guia do Livro Didático é um manual que
consta com os livros aprovados enviado pelas editoras e que os
professores das escolas de educação básica deverão escolher. Lá
constam os livros aprovados na triagem feita pelo MEC, com
a nota dada a cada um na avaliação feita pelos especialistas do
Ministério. O guia faz parte de um processo de onze etapas que
envolve o programa, conforme mostra o diagrama abaixo.

Figura 1: Organograma das estapas do Programa Nacional do Livro Didático

1. Adesão das Escolas 7. Pedido

2. Lançamento de Editais 8. Aquisição

3. Inscrições das Editoras 9. Produção

10. Análise de
4. Triagem/Avaliação Qualidade Física

5. Guia do Livro 11. Distribuição

6. Escolha 12. Recebimento

Fonte: Editorial Telesapiens Adaptado de: https://bit.ly/3643SH0

Como vimos o Guia ele é uma parte central da engrenagem,


pois ele que orienta a escolha dos professores. Uma vez de posse
do guia, professor vai avaliar as suas opções e determinar a escola.
Normalmente, as editoras enviam amostras para as escolas e até
vendedores para explicar, pois cada vez mais os livros estão
virando uma ponta em todo um sistema de ensino mais amplo,
fornecido pela editora (falaremos melhor mais adiante). A escolha
16 Metodologia do Ensino de História

mais votada pela área, será a escolha daquela escola. Se por um


lado, há um ponto positivo que é a parte de ser uma escolha
democrática feita pelos especialistas da escola, há também um
ponto negativo, e será este balanço que será feito no item a seguir

Avaliando o PNLD
Como mostrado, o PNLD é um programa bem amplo e
que está presente em todas as regiões do país. Para além da
questão da importância econômica para o mercado editorial,
ele é um programa que inclui milhões de aluno que não teriam
como ter acesso ao material por razões financeiras e valoriza a
opinião do professor. Porém, nada é perfeito e sempre há um
detalhe a ser analisado.

IMPORTANTE

Não é porque tem pontos negativos que o programa deve ser


extinto. É inegável que ele tenha benefícios palpáveis em tornar
acessível o conhecimento para alunos de baixa renda. Porém,
o preço da liberdade é a eterna vigilância e críticas bem-feitas
sempre são necessárias para melhorar o processo.

Sendo assim, vamos falar de dois principais problemas


que encontro nele que são a verticalização das decisões e a
pulverização do material.

Verticalização e pulverização
Como já dito o PNLD é bem amplo e possui diversas etapas,
onde os professores da educação básica tem um determinado
momento em que participam que é o da escolha. Por mais que
seja extremamente positivo, isto implica em alguns problemas,
que tentei resumir na tabela abaixo.
Metodologia do Ensino de História 17

Tabela 1:Pontos positivos e negativos do PNLD

Positivos Negativos

Democratização no acesso ao Centralidade na elaboração


livro didático do Guia

Ausência de espaço para os


Maior transparência no
professore participarem do
processo de escolha
guia

Pulverização de títulos,
Valorização da opinião do fazendo com que escolas da
professor mesma rede tenham livros
diferentes

Fonte: O Autor

O professor basicamente só participa de um momento. Ele


nem sugere o livro para o Ministério, nem ajuda a determinar
os critérios. Isso fica a carga de uma comissão à parte que numa
reunião técnica decide e posteriormente faz um triagem do
material recebido.
Outro problema é que devido ao fato de cada escola
escolher independentemente qual título vai utilizar, isso acaba
levando a uma pulverização de títulos dentro da mesma rede.
Não que isso seja totalmente ruim, pois cada escola tem o
seu projeto político e pedagógico, daí a necessidade de se ter
a liberdade para escolher o livro mais adequado. Porém, com
esta pulverização as vezes ocorrem problemas para se conseguir
exemplares para todos os alunos. O número de alunos de uma
escola nunca é fixo e ocorrem flutuações diversas ao longo do
ano por diferentes razões (mudanças de endereço, transferência
por indisciplina, etc). Com isso, as vezes ocorrem problemas até
para se conseguir exemplares em outras escolas, por conta de que
muitas vezes adotam outros livros. Mesmo assim, o programa é
de grande validade e merece ser aperfeiçoado e mantido.
18 Metodologia do Ensino de História

SAIBA MAIS

Quer se aprofundar neste tema? Recomendamos o acesso à seguinte


fonte de consulta e aprofundamento: Artigo: “O papel do guia dd
livro didático de história/pnld no processo de escolha dos livros pelos
professores dos anos finais do ensino fundamental” (MORAES &
GARCIA), acessível pelo link: https://bit.ly/360YILW.

E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo


tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente
entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos resumir tudo o
que vimos. Você deve ter aprendido que o Programa Nacional do
Livro Didático e um programa instituído pelo MEC que distribui
livros para todas as escolas públicas de educação básica do país
e que ele tanto funciona como uma importante fonte de renda
para as editoras, como uma forma de democratizar o acesso à
educação para milhões de alunos de baixa renda. Você deve ter
comprendido que o programa se compões de doze etapas indo
desde à inscrição das editoras e à entrega dos livros e que o
professor é uma peça chave deste processo. É ele quem escolhe
os livros a partir do Guia do Livro Didático, que é elaborado
pelo MEC após uma triagem feita a partir do material feito pelas
editoras. Você também deve ter aprendido que se o programa
por um lado democratiza o acesso aos livros e dá uma maior
transparência ao processo de escolha, por outro ele concentra
algumas etapas chaves no MEC (como a elaboração dos critérios
para ser incluído no Guia e a elaboração do próprio Guia) e leva
uma pulverização de títulos diversos dentro de uma mesma rede
(o que leva à dificuldades em caso de transferências de alunos ao
longo do ano letivo).
Metodologia do Ensino de História 19

Identificando e diferenciando os diversos


tipos de material didático

OBJETIVO

Ao término deste capítulo você será capaz de entender os diversos


tipos de material de materiais didáticos, seus usos e limitações. Isso
será fundamental para você conseguir melhor selecionar os materiais
para a atividade ou curso que você planejou. E então? Motivado para
desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante!

Identificando os materiais didáticos


No trabalho docente é preciso a todo o momento realizar
criteriosas seleções. Dado a responsabilidade que temos em
mãos, futuro colega, é preciso termos consciência absoluta
dos objetivos, público e materiais disponíveis. Para isso temos
de ter conhecimento de todas as distinções e definições que
envolvem nosso ofício. E uma delas é a diferença entre material
e suporte didáticos. De acordo com a autora Circe Bittencourt
(BITTENCOURT, 2008: 296-299) é preciso diferenciar o que
no material didático o que é suporte informativo e documento.
Você ter consciência dessas definições permitem identificar
as finalidades, potencialidades e limitações de cada um. Uma
vez tendo consciência disso, ficará mais fácil você planejar
selecionar os materiais para as suas aulas e atividades, pois uma
vez consciente das finalidades, potencialidades e limitações de
cada, você poderá direcionar melhor o que utilizar, de acordo
com o resultado que deseje.
No trabalho docente é preciso fazer criteriosas seleções de
materiais e suporte.
20 Metodologia do Ensino de História

A primeira definição que temos que ter em mente é qual


o papel do material didático e qual sua importância no processo
de ensino aprendizagem. A resposta é que eles são mediadores e
facilitadores neste processo.
Os materiais didáticos eles auxiliam na compreensão dos
conceitos, na proficiência de informações e de um vocabulário
específico da disciplina. Com isso eles facilitam, mas não
substituem o nosso trabalho, pois no final de tudo, é o crivo do
professor que deve determinar o que será utilizado. O material ele
é produzido de forma genérica e voltado para o professor, já que
é ele que vai avaliá-lo. Quem o produziu, não tem conhecimento
da realidade mais específica da sua turma ou da sua escola.
Então, a palavra final sempre é a do professor. Além do mais, um
material mal escolhido, mal utilizado ou mal elaborado, pode
atrapalhar mais do que ajudar.
As editoras e demais envolvidos na produção de conteúdo
para escola pensam e desenvolvem produtos para um mercado
nacional. Nisso particularidades regionais que necessitam serem
levadas em conta no planejamento ficam de fora deste material.
Não bastasse esse detalhe, por mais que haja uma equipe do
MEC selecionando livros e materiais, muitas vezes alguns erros
reproduzindo preconceitos e visões equivocadas passam por
vezes despercebidos. Sendo assim, o professor deve estar sempre
com o olhar atento na hora de selecionar o que será utilizado.
Nos próximo item falarei melhor sobre a diferença entre
suporte e documento. Espero com isso ajuda-lo na sua seleção e
planejamento das suas futuras atividades

Conceito de Suporte de Informação


Podemos definir o termo “suporte de informação” a partir
das pesquisas do Institut Natrional de Recherche Pédagogique
(INRP), da França, da seguinte maneira:
Metodologia do Ensino de História 21

“Suportes de Informação” representam todo discurso


produzido com a finalidade de comunicar elementos relativos ao
conhecimentos das disciplinas escolares.
Em outras palavras, livros, DVDs, CD-ROMs, apostilas,
cadernos, jogos, etc. são exemplos de suportes informativos.
Eles são meios produzidos com a finalidade de transmitir (ou
facilitar a transmissão) dos conteúdos escolares para o aluno.
Neste contexto, canais de YouTube, blogs, sites e plataformas
de ensino à distância (EaD) são também suportes informativos
se foram produzidos com esta intenção descrita acima. Vale dizer
que na Internet há uma profusão de materiais produzidos com
este propósito e muitos por especialistas nas suas áreas, além
das próprias editoras lançarem plataformas próprias que servem
de complemento para seus livros didáticos. Porém, o suporte
de informação não é o único material disponível. Há também o
documento e este é o próximo assunto.

A definição de documento
De acordo com Bittencourt (2008: 296), documento
são “todo o conjunto de signos, visuais ou textuais, que são
produzidos em uma perspectiva diferente dos saberes das
disciplinas escolares e posteriormente passam a ser utilizados
com finalidade didática”. Sendo assim, vemos uma importante
dicotomia entre suporte e documento: os primeiros são
produzidos com a finalidade de serem trabalhados em sala e os
segundos não são, conforme mostra o diagrama abaixo.
22 Metodologia do Ensino de História

Figura 2: Infográfico diferenciando tipos de materiais didáticos

Fonte: O Autor

A partir dessa diferença podemos pensar em duas grandes


definições. Enquanto o suporte informativo pode ser percebido
como uma construção da industrial cultural para facilitar o
processo de aprendizagem, o documento pode ser percebido
como parte de uma construção mais horizontal que pode envolver
desde a comunidade acadêmica, a própria indústria cultural ou
o professor. Como o documento é algo que não foi produzido
com a intenção de ser recurso didático, mas é utilizado como,
ele pode ser muito bem qualquer coisa (imagens, utensílios,
obras artísticas, etc.) que o professor julgue facilitar a apreensão
dos conteúdos da sua disciplina. Sendo assim, o documento
pode muito bem envolver um processo de construção tanto
do professor quanto dos seus próprios alunos para facilitar
o processo de ensino aprendizagem. Porém, tanto o livro (ou
qualquer outro suporte de informação) quanto o documento
podem ser trabalhados de forma tradicional ou de uma forma
estimulante. E como isso pode ser feito? É que veremos a seguir.
Metodologia do Ensino de História 23

A tradição e a modernidade na sala de aula


Seja no ensino de História ou de qualquer outra disciplina,
perspectivas tradicionais e modernas vivem se chocando, às
vezes por imposição dos pais, projeto político e pedagógico da
escola ou postura do docente. Mas afinal de contas, o que seriam
estas duas perspectivas?
Por perspectiva tradicional, temos por definição aquela que
vê o aluno com um mero receptor passivo do conhecimento e o
professor com senhor supremo deste processo. Sendo assim, uma
perspectiva mas “moderna” (e, de certa forma, estimulante) é aquela
que enxerga o aluno como agente desse processo e busca construir
com ele uma ponte para o conhecimento. Nesta perspectiva, o
professor deixa de ser senhor para ser facilitador/orientador.
No próximo item, tentarei demonstrar como tais
perspectivas podem conviver de forma mais ou menos
harmoniosa dentro de sala. Para isso, tentarei demonstrar
limitações e vantagens de cada uma.

O difícil caminho do meio


Para ilustrar melhor as diferenças entre o que seria uma
postura tradicional e uma postura mais “moderna”, elaborei a
tabela abaixo.

Tabela 2: Comparativo tradição x mordernidade

Postura tradicional Postura moderna

Aluno como um indivíduo


Aluno como um receptáculo
que traz uma bagagem de
dos conhecimentos
conhecimentos extra classe

Aluno com postura passiva Aluno com postura ativa


24 Metodologia do Ensino de História

O professor é o dententor O professor é um facilitador


dos conhecimentos, os quais que orientará o aluno na
transmitirá para o aluno aquisição dos conhecimentos

Além dos materiais


Os materiais didáticos são
selecionados pela direção e
selecionados pela direção e o
docente, o professor constrói
docente, e aplicados na sala
com os alunos materiais
de aula
didáticos
Fonte: O Autor

Como está claro na tabela, é essa posição tradicionalista tende


a ser muito comôda para o professor à primeira vista, pois o coloca
numa postura de autoridade inquestionável na sala. Reduzindo o
papel do aluno a um mero receptáculo de conteúdos, as atribuições
do aluno se resumiriam a fazer as atividades e tirar dúvidas.
Tende a ser vista como mais difícil, porém mais estimulante.
Ao enxergar o aluno como um indivíduo que já traz toda uma
bagagem de fora da escola e que o professor é um facilitador que
orienta o seu processo de ensino aprendizagem, este aluno passa
a construir o seu processo junto com o professor. A princípio isto
pode soar demasiadamente utópico e cansativo, já que implica
em o professor reconhecer que ele não é o único detentor de
conhecimento e nem que os conteúdos que ele pretende ensinar
são os únicos relevantes. Porém, esta postura tem um efeito
humanizador na figura do docente, ao reconhecer que ele não
sabe de tudo e que seus alunos também são portadores de
saberes dignos de consideração. Além do mais, permite tanto
ao profissional do magistério quanto ao aluno certo grau de
independência, estimulando-os a construírem seu próprio
material de estudo.
Por outro lado, principalmente se levarmos em conta os
anos iniciais do ensino fundamental, esta proposta deve ser vista
Metodologia do Ensino de História 25

com cautela. Sabemos que neste segmento lidamos com crianças


de cinco a onze anos. Não bastassem todas as dificuldades
normais de se lidar com indivíduos ainda em formação e
desenvolvendo habilidades básicas, temos o fato das crianças
hoje em dia estarem em contato com tecnologias que ajudam
elas a se tornarem mais dispersas.

SAIBA MAIS

Sobre esta questão da dispersão na infância e tecnologias, veja


o artigo “A influência das tecnologias na infância: vantagens e
desvantagens”, de Benizáquia da Silva Pereira e Thales Siqueira
Arrais, disponível em: https://bit.ly/2StEaYu.

Não é exatamente uma novidade que para o processo


de ensino aprendizagem (seja na atividade coletiva da sala de
aula, seja na atividade individual em casa) necessita de um
mínimo de concentração, organização e disciplina. Em turmas
com pouca idade situações de indicisplina e dispersão podem
dificultar que se realizem trabalhos de complexidade maior.
Isso sem falar que muitas atividades podem exigir que já tivesse
algum conhecimento prévio. Logo, mais uma vez, o bom senso
e a ciência da realidade da sua turma é que vão dizer o que é
adequado e o que não é adequado fazer em sala de aula.

Aprendendo com a própria experiência


Caros futuros colegas, sinto lhes informar que não há
manual que vai lhe ensinar isso. Somente sua experiência em
sala de aula é que vai conseguir te dar o devido discernimento.
Porém, posso tentar algumas dicas de como você pode achar
este tal caminho do meio, que a meu ver é o mais adequado para
26 Metodologia do Ensino de História

se trabalhar em sala de aula. Por mais que todas as críticas à


pedagogia tradicional sejam válidas, em minha opinião ela não é
cem por cento descartável. Ao prezar pela disciplina e controle,
ela valoriza um ambiente com tranquilidade e organização,
características imprescindíveis para o aprendizado a meu
ver. Isso sem falar que ao colocar o professor numa posição
de autoridade na sala, ela também o coloca numa posição de
responsabilidade sobre o processo de ensino de aprendizagem, o
que demanda preparo por parte do docente, para que ele tenha a
devida segurança em frente a sua turma. Além do mais, lembre-
se que a escola tem um projeto político pedagógico e que você
deve seguí-lo. Nem todas as escolas tem um projeto (ou recursos
materiais) que possibilitem abordagens mais “fora da caixa”,
para usar um termo mais em voga.
Então, caros futuros colegas, usem do bom senso e da
sua capacidade de observação. Como já diz o velho ditado,
“não vamos jogar a criança com a água da bacia”. Veja o
que pode ser feito e o que não pode ser feito. De uma forma
geral, prefiro utilizar abordagens mais convencionais (leitura
de texto, cópia do quadro, etc.) para introduzir conceitos mais
básicos e a medida que a matéria vai se complexificando (e a
turma vai demonstrando maior maturidade) vou dando maior
independência para os alunos.
Como já disse anteriormente, minha experiência é a partir
do sexto ano do ensino fundamental. Em geral, com alunos mais
novos trabalho toda uma parte de explicar conceitos básicos
desde o que é História, até a divisão cronológica e ciências
correlatas para os alunos de sexto ano, no primeiro bimestre.
Não só com eles, mas também com os alunos de turmas maiores
tendo a nos primeiros meses adotar uma postura mais tradicional
para fazer uma avaliação do perfil da turma. À medida que os
meses vão avançando, costumo a dar mais liberdade e “sair mais
da caixa”.
Metodologia do Ensino de História 27

Como você terá uma experiência com alunos mais


novos, dependendo de que ano você lecione (lembremos que
normalmente o professor de primeiro segmento só trabalha com
uma turma por turno de quatro horas e meia) você talvez possa
trabalhar atividades lúdicas. Lembremos que no já citado artigo
“O ensino de história nos anos iniciais do ensino fundamental: o
lugar das efemeridades”, da professora Maria Aparecida Cabral,
que muitas vezes o ensino de história é visto como lugar que se
“mobilizam constantemente símbolos e valores para a explicação
de fatos históricos às crianças, cujo alicerce se ancora nas
atividades lúdicas como desenhos, cantos, encenações teatrais
e narração de histórias (CABRAL, 2013: 10).” Neste contexto,
datas comemorativas nacionais são usadas como atividades que
mobilizam uma escola inteira ou, pelo menos, todo o segmento
ou as turmas de um determinado ano. Isto pode ser um excelente
momento para se trabalhar na construção de materiais próprios,
incentivando os alunos a refletirem sobre o significado destas
datas. Dia do Índio (29/04), Dia da Abolição (13/05), Dia da
Consciência Negra (20/11) além de outras comemorações como
Independência (07/09) ou Proclamação da República (15/11)
podem se converter em excelentes oportunidades.
Mas nunca realize uma atividade sem antes fazer o devido
diagnóstico da turma e uma criteriosa avaliação de riscos e
possibilidades. Pense sempre nas habilidades da turma, nos
recursos e projeto político e pedagógico da escola, além da
conformidade com os Parâmetros Curriculares Nacionais e as
demais leis vigentes.
Lembre-se que além da LDB 9394/96 e dos Parâmetros
Curriculares Nacionais, a lei 11.645/08 estabelece a obrigatoriedade
dos ensinos de cultura indígena e africana.
Sempre tenha em mente as potencialidades, riscos e
possibilidades para alinhar com suas finalidades.
28 Metodologia do Ensino de História

Achando o caminho e prosseguindo a viagem


Então, podemos concluir que ambas as perspectivas
que ambas têm suas limitações vantagens e desvantagens. Se
a princípio uma proposta mais “moderna” pode se apresentar
de forma mais estimulante, ela exige mais do profissional tanto
no tocante à construção da proposta, domínio dos conteúdos,
estrutura física da escola e diálogo com os alunos. Da mesma
forma a proposta tradicional tende a ser vista como engessada e
enfadonha, tem também a questão de ser o viável no momento,
seja por falta de estrutura física, limitantes de tempo, proposta
da instituição ou limites da turma.
O que eu recomendo? Tenha sempre bom senso e atenção.
Não é porque você vai estar numa turma difícil e numa escola com
uma estrutura física limitada que não haverá espaço para você
“sair da caixa”. Muitas vezes as propostas fora da caixa podem
ter excelentes resultados com alunos mais indisciplinados. Eu
mesmo já tive gratas surpresas nesse contexto. Também não
pense que uma proposta mais tradicional vai facilitar a sua vida.
Lembre-se que ao adotar uma postura mais firme e distante,
você terá muito pouca margem de falha, o que te obrigará a ter
um preparo bem rigoroso quanto aos conteúdos.
Então, minha dica final é tenha conhecimento. Tenha
conhecimento da sua instituição e projeto político e pedagógico,
tenha conhecimento da sua turma e tenha conhecimento de você
mesmo. Conhecimento este tripé, você com certeza evitará
muitos problema e terá maiores chances de bons resultados.
Agora que já estabelecemos o que são posturas tradicionais
e modernas, resta saber como isto afeta os livros. É possível falar
em livros tradicionais e modernos? Como o impacto destas duas
perspectivas estão afetando o mercado editorial? O que isso
está influenciando na produção do material didático? Estes itens
serão discutidos no capítulo a seguir.
Metodologia do Ensino de História 29

SAIBA MAIS

Quer se aprofundar neste tema? Recomendamos o acesso à


seguinte fonte de consulta e aprofundamento: Artigo: “Paradigmas
contemporâneos de educação: escola tradicional e escola
construtivista” (LEÃO), acessível pelo link: https://bit.ly/2t3Apyp.

E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo


tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente
entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos resumir
tudo o que vimos. Você deve ter aprendido que os materiais
didáticos se dividem em dois grandes grupos: o primeiro são os
suportes informativos e o segundo são os documentos, e que o
grande diferencial entre ambos é a questão da intencionalidade
(os primeiros são produzidos com a intenção de serem
materiais didáticos e os segundos não). Você também deve
ter aprendido que basicamente existem duas grandes de se
trabalhar como docente: a primeira seria uma proposta dita
“tradicional” e segunda é dita como “moderna”. A primeira
proposta basicamente enxerga o aluno como repositório de
conteúdos que o professor, visto como autoridade surpema e
inquestionável (salvo em caso de dúvidas), vai depositá-los.
Também já deve ter entendido que ambas as propostas têm suas
vantagens e desvantagens, e cabe a você analisar a realidade da
suas turmas, escola e do seu perfil profissional para entender
como e quando utilizar cada uma delas.
30 Metodologia do Ensino de História

O livro didático entre propostas tradicionais e


inovadoras no século XXI

OBJETIVO

Ao término deste capítulo você será capaz de entender como o


livro didático foi afetado tanto pelos PCNs, quanto pela expansão
. Isto será fundamental para o exercício de sua profissão. Tendo
o conhecimento destes processos você será capaz fazer dos seus
materiais didáticos. E então? Motivado para desenvolver esta
competência? Então vamos lá. Avante!

O papel da pedagogia crítica e da internet


Como já deve ter ficado claro, sendo um setor estratégico
a educação sempre está sofrendo alguma forma de controle do
Estado. Seja em governos autoritários ou democráticos, o poder
central sempre vai estar estabelecendo conteúdos e finalidades,
além de delimitando critérios para se trabalhar com educação.
No nosso caso, os já citados Parâmetros Curriculares Nacionais
e Lei de Diretrizes e Bases da Educação 9394/96 é que vão
representar o papel do Estado em definir critérios e conteúdos
para a educação. Lembremos também da lei 11645/2008 que
obriga o ensino de cultura e história afro-brasileira e indígena.
Estas leis todas vão mexer diretamente com os conteúdos dados
em sala de aula e com os conteúdos dos livros. Conforme já dito
anteriormente, com a crise em nosso mercado editorial, os livros
didáticos se tornaram uma fonte de renda indispensável para
diversas editoras, o que aumenta bastante o interesse e o impacto
destas leis. Lembremos também que com o PNLD, as escolas
públicas também se tornaram alvo de interesse das editoras de
livros didáticos.
Metodologia do Ensino de História 31

Como já explicado aqui, os PCNs e a LDB são frutos de um


momento histórico intimamente ligado com a redemocratização
do país. Conforme discutimos na primeira unidade , tanto
o ensino de História, quanto o ensino de uma forma geral
foi influenciado por este momento no eco de propostas que
defendiam uma preocupação com a formação de um cidadão
questionador e consciente. Vale lembrar que propostas assim, não
são exatamente uma novidade na nossa História. Paulo Freire,
por exemplo, defendia ideias similares desde os anos 1960.
Porém, tais propostas ficaram de fora do nosso meio escolar após
o golpe de 1964 e a Ditadura Militar que se seguiu ao mesmo.
Porém, após a redemocratização tais propostas ganharam novo
fôlego e passaram a integrar a legislação vigente na educação
e fazerem partes de políticas públicas. Com isso uma corrente
pedagógica chamada “Pedagogia crítica dos conteúdos” vai
ganhar espaço e passar a fazer parte dos currículos escolares,
dos materiais didáticos e da realidade acadêmica. A partir disso
gradativamente veremos uma virada de 180 graus no nosso
sistema de ensino.
Muito em voga no país após o período da redemocratização,
a pedagogia crítica dos conteúdos defende que a função da
escola é transmitir conteúdos concretos, vinculados ao cotidiano
do aluno e de sua realidade sociopolítica e cultural, fornecendo-
lhe meios para uma participação organizada e ativa na
democratização da sociedade. Esta corrente tem como principais
nomes no país José Carlos Libâneo, Cipriano Carlos Luckesi,
Demerval Saviani.
Com isso, os livros de História que basicamente tinham
um discurso superficial e patriótico, passaram a esboçar um
visão mais crítica da nossa sociedade. Além do mais, segmentos
tradicionalmente marginalizados passaram a ser assunto na sala
de aula, como indígenas e negros (lembre-se da lei 11645/08).
Mas além da revisão dos conteúdos, a revolução tecnológica
também teve seu impacto nos livros didáticos e sobre este é o
nosso próximo assunto.
32 Metodologia do Ensino de História

A Internet e os livros didáticos


Podemos definir o termo “Internet” no contexto atual da
seguinte maneira:
“Internet” é a rede mundial de computadores, ou
seja, um conjunto de redes (vários computadores
ligados entre si trocando dados) interligadas
que permite o acesso e troca de informações em
qualquer lugar do planeta. Surgida na época da
Guerra Fria, a intenção era de que caso acontecesse
uma guerra nuclear, existisse uma rede espalhada
para garantir a troca de informações.
Em outras palavras, a Internet é um gigantesco rio de
informações fluindo de e para todas as partes do mundo. Com ela
podemos não só acessar como produzir qualquer conteúdo. Com
isso, qual a relevância do livro didático nesse mar de informação?
Tentar responder essa questão será o próximo assunto.

A reação das editoras e o efeito da Internet


Com a democratização do acesso da informação
proporcionada pela Internet, muitos meios tradicionais de
informação passaram a ter sua legitimidade questionada. Porém,
uma questão que tem sido levantada ultimamente é de que,
muita informação errada tem sido divulgada, já que ao serem
publicadas na Internet, as informações não passam pelo crivo
de especialistas que envolve a publicação de um livro didático.
Com isso, muitas vezes informações falsas são divulgadas.
Metodologia do Ensino de História 33

Figura 3: Os dois lados da internet

INTERNET

POSITIVO NEGATIVO

Democratização na Ausência de curadoria


produção de conteúdos

Divulgação de
Conhecimento ao informações falsas
alcance de todos em nível global

Fonte: Editorial Telesapiens O Autor

Mesmo assim, a Internet tem ganhado cada vez mais espaço


entre diversos segmentos e influenciado até a política mundial.
Então, o livro didático se torna uma fonte segura de informação e
sob a orientação de um profissional qualificado capaz de apontar
suas inconsistências, que é o professor. Muitas editoras além de
recorrerem a uma diagramação mais ágil, tem se utilizado da
internet como forma de oferecer um conteúdo complementar
para o livro. Através dos sites das editoras muitas vezes existem
vídeos, animações exercícios e diversos materiais que podem
servir de suporte para o professor, transformando o livro numa
espécie de “pacote de serviços” que oferecido ao professor e
aos alunos. Sendo assim, podemos dizer que tanto editoras,
quanto autores e políticas públicas estão se mobilizando para
realizar uma “transposição didática das inovações tecnológicas”
(SCHMIDT apud COSTA & RALEJO, 2013). Mas como estas
mudanças tem se processado na realidade dos anos iniciais do
ensino fundamental?
34 Metodologia do Ensino de História

O livro didático nos anos iniciais do ensino


fundamental
Como já vimos o ensino de História nos anos iniciais do
ensino fundamental e tende a ter uma característica bem mais
lúdica do que teórica. Além do mais, normalmente até o terceiro
ano do ensino fundamental, história e geografia são fundidas na
disciplina ciências sociais, mesclando tanto o já mencionado
caráter de “efemeridades”, quanto de conhecimentos básicos
como o que é um bairro, um município, etc.
Criada pela lei 5692/71, a disciplina ciências sociais foi
uma criação de o governo militar. Como parte das suas mudanças
no sistema educacional, eles fundiram História e geografia em
uma única disciplina. Mesmo após a lei 9394/96, esta fusão foi
mantida nos primeiros anos como forma de introduzir os alunos
aos conteúdos destas disciplinas.
No próximo item nos aprofundaremos de como estes
conteúdos se processam nestes livros.

História para crianças


Como Circe Bittencourt (2009: 112,113) aponta, nos
livros dos anos iniciais há uma preocupação de se ultrapassar
a limitação do ensino de História como o ensino do nome de
grandes que são vistos como figuras atemporais. Isto tem a ver
com a substituição do paradigma romântico pelo paradigma da
escola dos Annales, como recordamos na tabela a seguir.

Tabela 3: Diferenças entre o paradigma romântico e da escola dos Annales

Paradigma romântico Paradigma dos Annales

História factual História problema

Foco nos grandes nomes Foco em grandes estruturas


Metodologia do Ensino de História 35

Valorização do nacionalismo Crítica ao nacionalismo

Utilização da História como Utilização da História como


um elemento de formação da elelmento de formação de um
unidade nacional. cidadão crítico e consciente.

Fonte: BARROS,José Costa D‟Assunção. Os historiadores e o tempo: a contribuição dos Annales; In:
Cadernos de História, Belo Horizonte, v. 19, n. 30, 1º sem. 2018. Disponível em https://bit.ly/2tPkK67

Nesta tabela vemos que, apesar de ainda ter a valorização


das datas comemorativas (dito pela própria autora) vemos uma
importante mudança. Com a influência deste viés mais crítico,
já há uma diminuição do impacto do “lugar das efemeridades”
já citado anteriormente. Relembrando que este viés mais
crítico tanto na História como na própria pedagogia vai estar
representado nos Parâmetros Curriculares Nacionais, como
mostrado no diagrama abaixo.
Figura 4

Fonte: O Autor
36 Metodologia do Ensino de História

Isso por si só já obriga diversas mudanças no ensino


destes anos fundamentais, onde as crianças além de começarem
a desenvolverem suas habilidades básicas começam a construir
uma relação com o conhecimento mais formal. Além de aprender
a ler, escrever e desenvolver a coordenação motora é necessário
nessa idade (entre seis e dez anos de idade, relembrando que o
ensino de História tende a se intensificar a partir do terceiro ano,
quando os alunos em média estão com oito anos de idade).
Por isso, tem-se a preocupação em se apresentar noções de
conceitos históricos que serão expandidos ao longo dos anos na
vida escolar do aluno. Com isso o profissional dos anos iniciais já
introduz ao aluno certos conceitos como permanência, mudança,
temporalidade, entre outros que serão trabalhados pelo professor
especialistas. Este trabalho é de suma importância, pois, já começa
a familiarizar o aluno com versões mais simples de conceitos
complexos que ele trabalhará ao longo de sua vida escolar.
Vale lembrar que atentar para este fato não é desvalorizar o
trabalho do professor dos anos iniciais e muito menos subordiná-
lo ao professor especialista que ele terá contato só nos quatro anos
finais do ensino fundamental. Muito pelo contrário, é reconhecer
a importância que este profissional tem para o desenvolvimento
social e cognitivo da criança.

A organização do nosso sistema educacional


Nos seus primeiros três anos de vida a criança costuma
a estar (salvo aqueles que têm necessidade e condições para
colocar seus filhos em creches) em contato mais direto com
seus pais (principalmente, a mãe e/ou parentes mais próximo
que auxiliem nos primeiros cuidados). A partir dos quatro anos
a criança vai vagarosamente sendo iniciada no mundo escolar
quando cursa três anos de pré-escola/educação infantil (o que
também chamado de jardim da infância) e em seguida passa para
os anos iniciais do ensino fundamental (com duração de quatro
Metodologia do Ensino de História 37

anos), e a partir do quinto ano do ensino fundamental contará


com professores especialistas para todas as disciplinas até o
último ano do ensino médio.
Analisando o descrito acima, vemos que o nosso sistema
educacional está organizado de uma forma progressiva e
acumulativa. A criança é introduzida no sistema educacional aos
quatro anos e aos poucos vai sendo apresentada pela professora
a uma série de conhecimentos. Á medida que vão ficando mais
complexos vão sendo adicionados professores especialistas
(lembrando que artes, educação física e língua estrangeira são
disciplinas com professores especialistas que fazem parte da
grade curricular dos anos iniciais do ensino fundamental), até a
grade ser ocupada em sua totalidade por professores especialistas
a partir do sexto ano do ensino fundamental (quando a criança
está com onze anos de idade). Porém, mais do que a aquisição
de conhecimentos temos outro fator que costuma a ser deixa de
lado: a socialização.

A importância dos anos iniciais na construção de


um cidadão crítico
Conforme vimos no item anterior, a criança começa
a frequentar a escola em média a partir dos quatro anos.
Normalmente, é a partir deste momento que a criança toma
contato com pessoas fora de seu círculo familiar e da sua
vizinhança. Sendo assim, este momento se torna fundamental
para a criança começar a construir o seu contato com a
diversidade. A experiência de se tomar contato com o diferente,
de ver outras formas de arranjos familiares, crenças, situação
econômica, etc. se dá a partir da escola. Esta convivência se
torna importantíssima para construir duas habilidades de suma
importância para o convívio em sociedade: empatia e tolerância.
Por empatia, entendemos “a capacidade psicológica para
sentir o que sentiria uma outra pessoa caso estivesse na mesma
38 Metodologia do Ensino de História

situação vivenciada por ela” e tolerância como sendo “o ato de


agir com condescendência e aceitação perante algo que não se
quer ou que não se pode impedir”. Fonte: https://bit.ly/2QqrQWn e https://bit.
ly/366H8WY.

Cidadão critico, consciente e tolerante


Sendo assim, os anos iniciais do primeiro segmento se
tornam fundamentais para a criança desenvolver capacidades
que serão importantíssimas para ela se tornar um cidadão crítico.
Empatia e tolerância são fundamentais para a boa convivência.
Como sendo uma fase onde a criança está tomando contato
pela primeira com diversas situações que são diferentes da sua
realidade. Esse contato com o diferente vai ser fundamental
para que a criança aprenda a se colocar no lugar dos outros e se
solidarizar com outras pessoas.
Lembremos que os Parâmetros Curriculares Nacionais
destacam a importância da formação do senso crítico e da
consciência da sua realidade histórica e social como seus
objetivos. Estas capacidades acima ditadas são de grande
importância para a tomada da consciência histórica e social tem
a ver com alinhar os conteúdos aprendidos da disciplina com o
desenvolvimento de habilidades ligadas à empatia e à tolerância.
Um ensino meramente bancário (para adotar uma terminologia
mais cara ao nosso patrono da educação) se concentraria apenas
na pura e simples repetição e memorização de conteúdos, o que
quase invariavelmente seria uma sequência de fatos organizados
de forma cronológica. Isso não basta para que se desenvolva no
indivíduo a compreensão do seu papel como agente da História.
Para este objetivo ser alcançado, mais do que o aluno ter
conhecimento do processo de desenvolvimento do seu país e
do mundo, é necessário que o aluno se veja como parte dessa
engrenagem. Para que este objetivo seja alcançado, é importante
que desde os anos iniciais o professor deve trabalhar com o aluno
a noção de que ele também é um ator da História.
Metodologia do Ensino de História 39

Então, o trabalho do professor deve ser focado neste


misto de socializar e ajudar ao aluno a adquirir conhecimentos
básicos relativos à disciplina. É importante que ao se trabalhar
com as séries iniciais estes conceitos sejam introduzidos de
forma lúdica, pois estamos falando de crianças em tenra idade.
Brincadeiras, rodas de contação de estórias e diversas outras
atividades podem ser ótimas formas para fazer as crianças a
refletirem sobre estes assuntos, mais do que qualquer livro que
você possa escolher. Outra boa saída é criar espaços onde as
crianças podem falar de suas experiências. Rodas de conversa,
desenhos, brincadeiras do estilo “mostre e conte” podem servir
como forma das crianças expressarem suas visões de mundo e
trocarem as suas experiências umas com as outras.
É importante que tudo seja feito com a devida mediação
e orientação do professor. Em escolas que tenham realidades
muito diversas (alunos de classes sociais muito díspares ou
moradores de comunidades rivais) isto pode virar um momento
para conflitos como exteriorização de preconceitos, por
exemplo. Nesta hora que vai entrar o papel do docente como
árbitro de conflitos e alguém que vai desconstruir concepções
equivocadas e convidar o aluno para a reflexão, com a intenção
de desenvolver nele justamente a empatia e a tolerância. Por
mais que estes momentos possam ser espinhosos e até mesmo
estressantes, são oportunidades excelentes para que se comece a
construção de um cidadão crítico, consciente e tolerante.
Sendo assim, meu caro futuro colega, não se furte a
tentar desenvolver este tipo de trabalho. Lembre que mais do
que passar conteúdos, nós temos uma responsabilidade legal de
auxiliar na construção de cidadãos. Com isso, é fundamental
que nós auxiliemos as crianças a aprenderem a conviver com o
diferente e a se colocar no lugar do outro.
No próximo item, começaremos a colocar o como o
professor pode construir seu próprio material com a finalidade de
atingir estes objetivos. Como já disse em outras oportunidades,
40 Metodologia do Ensino de História

certas necessidades não haverá manual, material ou livro que


supra. Então, sempre será útil que você mais do que saber
selecionar o seu material, você aprenda a confeccionar o seu
próprio material. Então, no próximo item serão abordadas
possíveis estratégias que você possa utilizar para criar seu
próprio material de trabalho, afim de que você consiga dar conta
dos seus objetivos.

SAIBA MAIS

Quer se aprofundar neste tema? Recomendamos o acesso à


seguinte fonte de consulta e aprofundamento: Artigo: “O ensino
de história através de atividades lúdicas na educação infantil da
escola municipal Mariano Rocha em Bocaina-PI (2011 –2013) ”
(SOUSA & MOTA), acessível pelo link: https://bit.ly/39hRNjE.

E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo


tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente
entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos resumir tudo o
que vimos. Você deve ter aprendido que há diferentes propostas
de livros didáticos, mas que podemos basicamente dividi-las
em dois grandes grupos: aqueles livros que defendem uma
pedagogia mais tradicional, onde o aluno é visto como uma
espécie de “folha em branco”, onde o professor vai depositar
seu conhecimento, e aqueles que vêm com uma proposta mais
moderna reconhecendo que o aluno já traz toda uma bagagem de
vivência fora da escola. Vimos também que esse movimento tem
a ver tanto como uma mudança promovida tanto pelo contexto
da redemocratização, quanto de certas correntes teóricas que
ganhavam força no meio acadêmico e ressoavam no meio
escolar como a pedagogia crítico-social dos conteúdos e a escola
dos Annales. Outro fator de grande importância foi o boom da
Metodologia do Ensino de História 41

internet, a crise do mercado editorial e o Programa Nacional do


Livro Didático. Você também viu que a atuação do professor
nos anos iniciais do ensino fundamental para estimular a criança
a desenvolver empatia e tolerância, que são características
fundamentais para se construir um cidadão crítico e consciente
da sua realidade histórica e social.

Elaborando seu próprios materiais

OBJETIVO

Ao término deste capítulo você será capaz de desenvolver


metodologias para elaborar seus próprios. Isto será fundamental
para o exercício de sua profissão. É de suma importância que
você seja capaz de desenvolver materiais que se adequem às
necessidades da sua turma. E então? Motivado para desenvolver
esta competência? Então vamos lá. Avante!

Por que o professor deve saber desenvolver


seus materiais?
Como já discutido anteriormente, livros didáticos são
produtos da indústria cultural. Isso os torna inúteis para a sala de
aula? De forma alguma! Como também dito anteriormente, nestes
tempos de explosão de informação sem nenhuma checagem, o
livro pode ser um excelente fonte de conhecimento seguro para
o aluno, pois passou por toda uma equipe de especialistas até
ser publicado, além de servir como uma ótima ferramenta de
trabalho para o professor.
Porém, sendo eles um produto em série e feito em escala
para ser vendido no país inteiro, ele tende a uniformizar conteúdo,
42 Metodologia do Ensino de História

não se atentando aos conteúdos regionais, salve aqueles livros


que são produzidos para atender uma demanda específica de
algum estado.
Além do mais, o contexto da sala de aula tem uma variedade
que não há editora que dê conta! Em uma país extremamente
desigual e de dimensões continentais como o nosso, os contextos
variam muito até mesmo dentro de um município ou bairro.
Com uma variedade como essa tão enorme, que outra saída tem
o docente além de confeccionar parte do material?
Há também um outro bom motivo para se confeccionar o
seu próprio que é de se criar um elo com a turma. O processo de
se realizar um esforço coletivo com os alunos para desenvolver
seu próprio material pode ser uma excelente ferramenta para
se criar estreitar laços com a turma. Eu mesmo já relatei
na primeira unidade uma experiência que tive que, ao dar
liberdade de criação para um grupo de alunos indisciplinados,
fui alegremente surpreendido com um dos melhores trabalhos
da minha carreira docente.
Outro fator importante de se levar em conta é de que para
as crianças a experiência de uma atividade mais prática pode
ajudar. Como já falado anteriormente, os anos iniciais estão
em uma fase que estão adquirindo habilidades sendo assim.
Atividades que explorem de forma mais lúdica conceitos
ligados ao conhecimento histórico, podem ser mais interessante
para as crianças.
Além de elas não ficarem simplesmente paradas atrás de
uma mesa com uma folha escrevendo (o que pode ser bastante
enfadonho para crianças com pouca idade), a experiência de eles
participarem ativamente na construção do conhecimento propicia
um momento único para eles, além de ser uma oportunidade se
trabalhar habilidades motoras e de socialização junto com leitura
e interpretação.
Metodologia do Ensino de História 43

Por atividades lúdicas entenda-se atividade relacionadas


com jogos e com o ato de brincar. Na educação Infantil podemos
comprovar a influência positiva das atividades lúdicas em um
ambiente aconchegante, desafiador, rico em oportunidades e
experiências para o crescimento sadio das crianças.

SAIBA MAIS

Para maiores informações, veja Queiroz et ali (2006), disponível


em https://bit.ly/2F00cdC.

Figura 5: Organograma resumindo as etapas envolvidas no planejamento de uma atividade

Fonte: O Autor

É de grande importância ter esses elementos claros para


se planejar uma atividade, principalmente se ela tem como um
objetivo mais geral produzir um material final. Esse material
final pode ser algo que vai ser exposto para a escola, que a
44 Metodologia do Ensino de História

circulação ficará dentro da turma mesmo. Independente de qual


seja a circulação desse material, uma atividade que terá este tipo
de produto necessita de maior atenção, pois pode vir a mobilizar
muitos recursos, além de ser necessário uma cautela extra, já que
estamos falando de crianças. Então vamos começar com o nosso
alvo primário, ou seja, os objetivos

Delimitando os objetivos
Antes do primeiro passo de toda caminhada, sempre
se pensa em qual o destino, ou seja qual o objetivo dessa
caminhada. a mesma coisa pode se dizer de quando planejamos
alguma atividade ou curso. Qual a meta que eu quero alcançar
com essa atividade? Que competências que eu quero que sejam
desenvolvidas ao longo desse curso?
Todos estes exemplos acimas citados são objetivos que
se desejam alcançar no processo de ensino-aprendizagem.
Eles são parte importante do nosso trabalho porque é a partir
deles que iniciaremos a nossa jornada. Tendo um destino em
mente é que apontamos a nossa bússola e planejamos a nossa
viagem. A mesma coisa vale para o nosso processo de ensino-
aprendizagem.
Uma atividade que tem por objetivo avaliar os alunos
vai ser pensada de uma forma, uma atividade que tenha por
objetivo integrar alunos, família e comunidade será pensada de
outra forma e assim por diante. Os objetivos são metas a serem
alcançadas e que demandaram estratégias diversas.
Uma mesma atividade, pode ter mais de um objetivo.
Particularmente, eu gosto de pensar em objetivos gerais e
objetivos específicos. Os objetivos gerais tem uma definição
mais ampla, genérica. Os objetivos específicos já carregam
um grau maior detalhismo. Por exemplo, ao se organizar uma
festa junina poderíamos citar como objetivo geral integrar
a comunidade escolar (responsáveis, alunos, professores e
funcionários) e como objetivos específicos sobre a importância
do meio rural na nossa sociedade.
Metodologia do Ensino de História 45

Mas se toda caminhada precisa de um destino, ela também


precisa de condições mínimas para que ocorra. Ou seja, ela
precisa de recursos, que será o próximo assunto.

Analisando e disponibilizando os recursos


Uma parte importante de todo o planejando é analisar as
ferramentas e materiais disponíveis que você tem para trabalhar,
para que você saiba o como aquele objetivo que você almeja será
alcançado. Ou seja, você precisa ver os recursos disponíveis.
Mais do que ver os recursos disponíveis, você também
deve ver os recursos necessários. Uma vez que você esteja
ciente dos recursos disponíveis e dos recursos necessários,
você poderá fazer os devidos ajustes necessários. Este ajustes
podem ser desde ir buscar recursos para suprir as deficiências,
quanto reajustar a sua atividade para se encaixar aos recursos
disponíveis.
Voltemos ao exemplo da festa junina. Vamos dizer que
você queira juntar todas as turmas da escola na quadra para se
apresentarem para todos os responsáveis. Porém, a escola não
possui um sistema de som com potência suficiente para dar
vazão a todos os pais. Duas possíveis saídas seriam arrumar um
sistema de som mais ponto (alugando um, pedindo emprestado
de algum membro da comunidade escolar ou de uma escola
vizinha, por exemplo) ou realizar apresentações menores apenas
das turmas com seus responsáveis.

Administrando o tempo e analisando o perfil da turma


Dois outros pontos importantíssimos para se levar em
conta é o tempo disponível e o perfil da turma. Junto com os
recursos estes dois fatores tem que ser levados em conta. O perfil
da turma e o tempo disponível vão ser dois fatores que terão
muita influência para alcançar o objetivo.
Uma turma com um perfil mais disperso (ou mais tímida),
por exemplo, pode demandar uma pouco mais tempo para se
organizar numa dança, voltando ao nosso exemplo da festa
junina. Porém, por ser uma atividade que toda a escola participe,
46 Metodologia do Ensino de História

talvez fique inviável ceder mais tempo. Uma saída pode ser uma
coreografia simples e com orientação da professora.

Construindo exemplos
Para ficar mais claro o que falei no item anterior, construí
um exemplo de ficha de planejamento e vou preenchê-la com
exemplos de atividades. Pretendo com isso tornar mais claro o
como isto pode funcionar na prática.

Figura 6: Exemplo de ficha de planejamento de atividades

Fonte: O Autor
Metodologia do Ensino de História 47

Fique bem claro que , não importa o quanto você planeja,


esteja sempre preparado para imprevistos. Sempre acontecerá
algum problema que não estava previsto. Então, acostume-se a
improvisar. Planeje, mas sempre esteja com o espírito pronto
para lidar com acontecimentos alheios à sua vontade.
Passemos agora aos estudos de caso.

A batalha do passinho
Por volta de 2008 estourou no meio funk carioca o passinho.
Este fenômeno cultural que ganhou até um documentário (“A
Batalha do Passinho”, ver https://bit.ly/2t6QfZe) era uma
verdadeira febre entre os meus alunos em 2014 (a maioria
moradores das comunidades do Morra do Dendê, Parque
Royal, Praia da Rosa e Tubiacanga). Em um dia de atividades
lúdicas que a escola organizou resolvi promover uma batalha do
passinho, com os seguintes objetivos abaixo.

Tabela 4: Objetivos da batalha do passinho

Objetivos gerais Objetivos específicos


Promover a integração entre
Dar protagonismo dos alunos
os alunos

Promover um espírito de
Estimular representatividade
competividade de forma
entre eles
saudável

Aliviar as tensões antes das


Valorizar a cultura local
provas finais de dezembro

Fonte: O Autor

Com este objetivos em mente fui ver os recursos e tempos


que eu teria disponíveis. O evento foi planejado com quinze dias
de antecedência, tempo que os alunos poderiam se inscrever.
48 Metodologia do Ensino de História

A escola disponibilizaria uma caixa de som, microfone e um


computador, além de ceder o auditório na meia hora final do dia.
Sendo assim, redigi um pequeno regulamento com limites
de tempo, prazos de inscrição e limites de temas para as músicas
que eles deveriam trazer (nada de palavrões, apologia ao crime
e menções explícitas sobre sexo), além de colocar como prêmio
a divulgação do vídeo da apresentação no meu blog https://
rockehistoria.blogspot.com/. Comecei a divulgar nas minhas
turmas e alguns colegas divulgaram nas turmas deles e em pouco
tempo a notícia correu a escola como um rastilho de pólvora.
Quando chegou no dia, dos dez inscritos, só um veio e outros
quatro não inscritos queriam participar. Outro problema que
aconteceu foi que ninguém trouxe um arquivo com música e meu
celular estava descarregado. Como já estava com um arquivo de
música em minha posse, esta parte já estava resolvida. Pedi para
uma aluna filmar o vencedor e depois editei o arquivo que estava
com ela.

Avaliando os resultados
No geral, eu diria que os objetivos foram alcançados com
sucesso. Os alunos se divertiram muito e ficaram empolgados
desde o anúncio do evento. Era comovente ver o como eles
estavam felizes de ver uma manifestação cultural surgida no meio
deles e de grande relevância para eles estava presente na escola.
Me lembro que durante o período de inscrições fui procurado
por vários alunos. Mesmo no ano seguinte alunos vinham me
procurar para saber se teria uma outra edição e comentavam
sobre o desempenho o vencedor.
Da minha parte o que eu mudaria, seria ter mais atenção com
o video. Tentar ver se a escola disponibilizaria um câmera, pegar
uma câmera emprestada ou estar com o meu celular carregado
e um aluno responsabilizado de filmar seriam estratégias que eu
utilizaria.
Metodologia do Ensino de História 49

Passemos agora ao nosso próximo estudo de caso: a


avaliação digital de História e geografia.

A Avaliação digital de História e Geografia


Como já mencionei anteriormente, gosto de utilizar
recursos multimídias nas minhas avaliações como filmes,
vídeos do YouTube, clipes musicais, etc. Na escola que leciono
atualmente vi que existem vários notebooks ã disposição. Sendo
assim, resolvi fazer uma quinzena de avaliação digital em
História. Com isso eu precisaria de cerca de quinze computadores
e no mínimo uma hora de tempo disponível e cada aluno teria
que ter seu próprio fone de ouvido. Após dois meses de conversa
com direção e alunos resolvi por realizar a atividade tendo estes
objetivos em mente.

Tabela 5: Objetivos da avaliação digital de História e geografia

Objetivos gerais Objetivos específicos


Dar oportunidade do aluno
Avaliar conteúdos de História
realizar a sua avaliação
e geografia
dentro do seu próprio tempo
utilizar recursos que
Estimular o uso educativo da
se encontravam sub
tecnologia entre os alunos
aproveitados na escola

Fonte: O Autor

Um dos maiores problemas que sempre vi nas minhas


avaliações de vídeo é a dificuldade que certos alunos tinham de
acompanhar o ritmo dos demais, me pedindo constantemente
para voltar. Sendo assim, resolvi essa prova para dar uma
oportunidade destes alunos pararem e voltarem os vídeos quantas
vezes quisessem, dentro do limite de tempo de uma hora.
50 Metodologia do Ensino de História

Nas duas semanas das avaliações cheguei com cerca de


quatro horas de antecedência para carregar todos os computadores
e colocar os arquivos de vídeo neles. Qual a minha surpresa
ao descobrir no processo que algumas máquinas estavam com
vírus ou com a parte de áudio comprometida, isso sem falar de
máquinas que sequer ligavam, o que me limitou a um repertório
de dez máquinas por dia. A estratégia adotada foi de usar as dez
máquinas e a medida que fossem acabando, o aluno cedia a vez
para o próximo. Outra consequência dessa estratégia foi ter que
transferir a avaliação para o início da aula, pois com três horas
de duração, haveria mais tempo hábil para o rodízio de alunos.
Outro imprevisto que tive que lidar foi com a falta de fones de
ouvidos. Apesar dos repetidos avisos em diferentes momentos
ao longo de dois meses, ocorreram de (a bem da verdade, uma
minoria) alguns alunos não virem com fones de ouvido porque
ou se esqueceram ou havia quebrado no dia seguinte. A solução
para o problema foi separar alguns alunos em salas ou pedir
fones emprestados para outros alunos, além de eu ter emprestado
o meu pr’prio fone.

Avaliando os resultados
Os resultados desta avaliação foram bem positivos
também. As médias giraram em torno de 80% de acerto e os
alunos com maior dificuldade me deram um feedback muito
positivo de como ajudou poder parar, voltar e avançar o vídeo.
Outro motivo que me levou a fazer a prova foi a
empolgação que eu vi em alguns alunos de ter a oportunidade
de operarem um computador. Mesmo eles tendo facilidade
para usar a tecnologia (são adolescentes entre 15 a 19 anos de
idade), muitos não têm computadores em casa (atualmente, os
meus alunos são oriundos de comunidades de Bangu como Vila
Aliança, Vila Kennedy, Sapo, etc). Então, vários se mostraram
empolgados com esta oportunidade.
Metodologia do Ensino de História 51

Algo que pretendo manter para o ano que vem é a ordem


da prova. Dados os imprevistos que aconteceram, a realização
da prova no início da aula se torna mais proveitosa.

SAIBA MAIS

Curioso para saber quem ganhou a batalha do passinho que eu


organizei? Veja o post no meu blog “Rock e História”, acessível
pelo link https://bit.ly/2SsGCi9.

E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo


tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente
entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos resumir tudo
o que vimos. Você deve ter aprendido que mesmo sendo uma
fonte de informação confiável, se comparada com a Internet, os
livros didáticos por serem produtos da indústria cultural não dão
conta da multiplicidade da sala de aula. Sendo assim, o ideal
é que o professor também construa seus materiais didáticos
com os seus alunos. Você deve ter aprendido que este tipo de
atividade tanto auxilia a construir maiores laços do professor
com a turma, como também auxilia os alunos a se enxergarem
como protagonistas nos eu processo de ensino-aprendizagem.
Mas que para você realizar este processo é necessário planejar e
ao planejar você tem que ter em mente seus objetivos, recursos e
tempos disponíveis e necessários, e após realizado é necessário
avaliar os resultados.
52 Metodologia do Ensino de História

REFERÊNCIAS
AZEVEDO, Prof Dr Antulio José de; BELGAMO,
Taiz Cavalcanti; BORANGA, M. C. & MARTINS, B. M.
Contribuições da pedagogia crítico social dos conteúdos na
prática docente: um estudo de caso. Revista científica eletrônica
de pedagogia Ano XI – Número 21 – Janeiro de 2013. Acesso
em 08 de dez de 2019, disponível em https://bit.ly/2t4rsoH.
BITTENCOURT, C. M. F. Ensino de História: fundamentos
e métodos. São Paulo: Cortez, 2009
BARROS, J. C. D. Os historiadores e o tempo: a
contribuição dos Annales. Cadernos de História, Belo Horizonte,
v. 19, n. 30, 1º sem. 2018. Disponível em https://bit.ly/352w1gz,
acesso 09 de dez 2019.
CABRAL, M. A. O ensino de história nos anos iniciais do
ensino fundamental: o lugar das efemeridade. XXVII Simpósio
Nacional de História: Conhecimento Histórico e Diálogo Social,
acessível pelo link https://bit.ly/2tXk1jv (Acesso em 04/12/2019)
COSTA, M.A.F.; RALEJO, A.S. Pensando a interface entre os
livros didáticos de História e as demandas tecnológicas: negociações
possíveis. Anais do VII Seminário Internacional As Redes Educativas
e as Tecnologias: transformações e subversões na atualidade. Rio de
Janeiro: Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 2013.
LEÃO, D. M. M. Paradigmas contemporâneos de
educação: escola tradicional e escola construtivista. Cadernos
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Metodologia do Ensino de História 53

PEREIRA, B. S. & ARRAIS, T. S. Influência Das


Tecnologias Na Infância: Vantagens E Desvantagens. IV Colóquio
de Educação, Cidadnia e Exclusão: Didática e Avaliação.
Disponível em: https://bit.ly/39lad2M, acessado em 04/12/2019
QUEIROZ, N. L. N., MACIEL, D. A. & BRANCO, A. U.
Brincadeira E Desenvolvimento Infantil: Um Olhar Sociocultural
Construtivista. Paidéia, 2006, 16(34), 169-179. Acessível no
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SOUSA, M. G. A. B. & MOTA, F. B. O ensino de história
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municipal Mariano Rocha em Bocaina-PI (2011 –2013). Form@
re. Revista do Plano Nacional de Formação de Professores da
Educação Básica. Universidade Federal do Piauí, Teresina, v.
3, n. 1, p. 60-63, jan. / jun. 2015, acessível pelo link https://bit.
ly/39jIKPh (Acesso em 12/12/2019)

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