Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Publicação:04/2011
1
CasodesenvolvidopeloprofessorLuizFernandoAndreottiTuratti.Oautoragradeceacontribuiçãodoprofessor Sérgio
Giovanetti Lazzarini, bem como aos sócios da empresa-caso, pela disponibilidade de tempo e deinformações. O
caso é somente para fins de discussão em sala de aula: não se propõe julgar a eficácia ou
aineficáciagerencial,nemtampoucodeveservircomofonte de dados primários.
MK-P0004
Sobre a Papaiz
O grupo Papaiz foi fundado em 1952, estando desde 2003 sob o comando da segunda
geração familiar (três sócios). Apesar da origem italiana do fundador, a empresa era uma
multinacional brasileira que exportava regularmente para mais de 25 países, com escritórios
ou representantes em quase toda a América do Sul, nos EUA, no Canadá, no Reino Unido, na
Austrália e na França, além de uma embrionária operação na Ásia.
Sob a marca Papaiz, a organização atuava principalmente em cadeados e fechaduras. O
grupo tinha negócios em outras áreas, como em componentes para esquadrias (marca
Udinese) e no segmento imobiliário. Historicamente, sempre houve investimentos
significativos na construção e na consolidação da marca Papaiz, o que gerou um bom
brandequity, com associações positivas e bom nível de lembrança por parte dos clientes. Por
exemplo, desde que surgiram rankings setoriais, em 1999, a marca sempre apareceu entre
osprimeiros lugares da categoria, como o prêmio Ibope/Anamaco, 3o Top Marcas da revista
Projeto Design4 e o Top of Mind da revista Casa & Mercado.5
Com fábricas em Diadema, SP, e em Salvador, BA, em 2005, o grupo contava com mais de
1.000 funcionários, em torno de 10 mil clientes ativos e faturava aproximadamente 180
milhões de reais.
Até por volta de 2000, o mercado de cadeados era disputado por duas marcas principais,
Papaiz e Pado, que juntas chegaram a representar cerca de 85% da categoria. 6 Os portfólios
de produto das duas empresas eram muito similares. Os cadeados Papaiz custavam cerca de
3 a 7% a mais que os da Pado, que tinha uma participação de mercado de 45% (contra 40% da
Papaiz). O restante do mercado era disputado por pequenas marcas locais ou produtos
importados de diversas origens, que chegavam ao Brasil de modo inconstante, por alguns
distribuidores de ferragens e atacadistas.
O produto cadeado era disponibilizado no mercado em diversos tamanhos – cerca de seis
a oito–, mas todos com características e funcionamento bastante similares.
O cadeado convencional se compõe, essencialmente, de um corpo de liga de latão maciço,
de aspecto dourado escuro, no qual é embutido um sistema mecânico de trava e pinos de
segredo (onde se introduz a chave para abertura), além de uma haste em arco feita de aço
temperado para garantir maior dureza ao material. O anexo traz um descritivo da estrutura
de funcionamento de um cadeado convencional.
A categoria cadeados sofreu muito poucas inovações tecnológicas nos últimos 40 anos.Em
meados de 1970, a Papaiz introduziu no mercado a versão com chave tetra, em adição ao
modelo de chave tradicional, incrementando a segurança do produto por conta do maior
número de combinações de segredo/chave e posição de pinos no sistema tetra. Alguns anos
2
MK-P0004
depois, a Pado também lançou sua versão tetra de cadeados. Quanto ao aspecto visual,
praticamente nada mudou em todo esse tempo. O tipo de material utilizado em cadeados
(corpo de latão e haste de aço) tem boa resistência mecânica e dureza, e é relativamente
difícil rompê-lo ou cortá-lo com ferramentas como alicates ou serras. Além disso, ambos os
materiais têm boa resistência às intempéries, isto é, não enferrujam e suportam longos anos
de exposição ao tempo e ao clima.
No entanto, a partir de 2001, houve uma mudança no mercado, e começaram ganhar
espaço marcas relativamente novas, “de combate”, sem tradição, oferecendo cadeados feitos
com outras ligas como zamack7 e alumínio, a preços cerca de 25% inferiores aos dos cadeados
convencionais de latão.
O corpo desses novos cadeados era banhado ou pintado, para dar um aspecto amarelado,
imitando a aparência do latão. À primeira vista, eram muito parecidos com os cadeados
convencionais de latão e, dentro de sua embalagem plástica de autosserviço, sua semelhança
visual acabava levando os consumidores a confundirem os dois tipos.
Porém, numa análise mais criteriosa, as diferenças ficavam evidentes. Primeiro, esses
cadeados tinham um sistema mais simples de chave, com menos pinos, gerando menos
combinaçõese, portanto, menor segurança. Segundo, suas ligas metálicas tinham uma
resistência muito inferior às intempéries – em particular o zamack, que entra em corrosão
rapidamente quando exposto, travando o mecanismo de abertura–e também menor dureza e
resistência mecânica, tornando os cadeados mais vulneráveis a ferramentas e serras.
Enquanto um cadeado de latão chegava a durar 15 ou mais anos, um de zamack ou alumínio
raramente chegaria aos cinco anos sem apresentar algum problema de funcionamento.8
Apesar dessas diferenças técnicas, a venda de cadeados de zamack disparou. Em 2005, o
market share da Papaiz havia caído para cerca de 30% da categoria, e o da Pado, para 33%; ao
mesmo tempo, as chamadas marcas de combate nacionais já respondiam por 27% do total
dos cadeados comercializados no Brasil. O restante vinha de importações tanto da China
como de outros países. Como referência, entre 2001 e 2005, o consumo interno de cadeados
cresceu cerca de 15%9.
A categoria cadeados era distribuída por canais específicos. De 30 a 40% eram vendidos
pelo varejo tradicional de ferragens, como lojas de material de construção com balcão e
vendedores.10
Nesses canais mais tradicionais, a indústria atendia diretamente os grandes e médios
varejistas, enquanto os pequenos – normalmente em áreas de menor poder aquisitivo – eram
atendidos por atacadistas e distribuidores, que escolhiam poucos produtos do portfólio do
fabricante para comercializar (os chamados bestsellers). A Pado tinha ampla penetração nos
7
Zamackéumaligametálicafeitadezinco,alumínio,magnésioecobre,cercade30%maisbarataqueolatão(tomandocomobaseo
spreçosda LondonMetalExchangedofinal de2005).
8
Conformetestesdelaboratóriorealizadospelaempresa-caso.
9
Dadosaproximadoserelativosa2001e2005.combasenosvalorespublicadosnaResoluçãon.51/2007daCâmaradeComércioEx
terior (Camex). Disponível em:<www.mdci.gov.br>. Acessoem: 5jul. 2011.
10
Estimativasdeparticipaçãodecadacanaldevendasfeitaspeloautorcombaseemmercadosanálogos,comometais sanitários.
3
MK-P0004
11ConformedadosdaResoluçãon.38/2001,daCâmaradeComércioExterior(Camex).Disponívelem:
<www.mdci.gov.br>.Acessoem:5jul.2011.
4
MK-P0004
destruir os modelos que não tinham esse recurso. Novos modelos começaram a aparecer no
Brasil, trazidos principalmente por viajantes. Quando estavam disponíveis no mercado
nacional, cadeados com esse tipo de abertura pela TSA chegavam a custar três vezes mais
que os convencionais.
Outro fato que incrementou a demanda de novos tipos de cadeado foi a crescente
necessidade de segurança nos grandes centros. Muitas pessoas passaram a trancar seu
armário, em academias, e mesmo sua mochila, na escola. Essas novas aplicações
demandavam produtos com características diferentes: agora eram “exibidos” pelos usuários
– o que implicava demanda de um apelo estético e de diferenciação visual, que antes não
existia.
A praticidade também era uma nova característica demandada, representada por
cadeados que dispensavam o usuário de portar chaves e do risco de perdê-las. Usuários que
já haviam precisado chamar um chaveiro ou estragar seu cadeado estavam dispostos a pagar
mais por produtos com combinação numérica ao invés de chave – algo ainda pouco
disponível no mercado. Testes com cadeados de haste mais longa ou flexível para prender
notebooks ou objetos maiores – com cabo de aço ao invés de haste – reforçavam a ideia de que
uma parcela considerável do mercado estava aberta a inovações na categoria.
Assim como ocorreu em diversos outros mercados, nessa época também começou a sede
linear o consumo em classes mais populares. Com a estabilidade econômica e maior acesso a
renda, aumentava expressivamente a base de consumidores de renda C e D e, do lado dos
fabricantes, surgiam diversas marcas regionais e de preço mais baixo. Foram principalmente
esses novos consumidores que criaram espaço para o surgimento de cadeados em zamack a
partir de 2003.
O mercado consumidor apresentava, então, duas perspectivas muito diferentes quanto ao
preço e à qualidade dos produtos: por um lado, o fato de a compra ser pouco frequente, os
produtos parecerem muito semelhantes e o custo unitário ser relativamente baixo fazia com
que consumidores fossem sensíveis ao apelo de preço baixo; por outro lado, ao considerar as
perdas pessoais quando um cadeado não dava a necessária segurança, os consumidores
tendiam a preferir produtos de melhor qualidade, com desempenho superior, inovadores e
específicos para o seu caso.
As duas principais marcas no mercado desfrutavam de uma percepção de boa qualidade e
de dar segurança ao usuário. As marcas novas e mais baratas eram um ponto de
interrogação. Quanto ao Made in China, os consumidores brasileiros ainda viam esses
produtos – independentemente da categoria –como de qualidade inferior, mas essa
percepção estava mudando à medida que surgiam no mercado produtos chineses com
qualidade aceitável.