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Quaresma 2024 - Retiro Online com o P.

Tiago de Jesus (Lucien Bunel) - Pela Cruz à Luz

Leitura da Carta de São


Pedro: (1Pe 3,18-22)
«Caríssimos, também Cristo pade-
ceu pelos pecados, de uma vez para
sempre - o Justo pelos injustos -
para nos conduzir a Deus. Morto
na carne, mas vivificado no Espíri-
to. Foi então que foi pregar tam-
bém aos espíritos cativos, outrora
incrédulos, no tempo em que, nos
dias de Noé, Deus os esperava pa-
cientemente enquanto se construía
a Arca; nela poucas pessoas - oito
apenas - se salvaram por meio da
água. Isto era uma figura do ba-
tismo, que agora vos salva, não
por limpar impurezas do corpo,
mas pelo compromisso com Deus
de uma consciência honrada, em
virtude da ressurreição de Jesus
Cristo, que, tendo subido ao Céu,
está sentado à direita de Deus, e a
Ele se submeteram Anjos, Domi-
nações e Potestades».

Acolhamos o ensinamento
de São Pedro
Iniciámos o tempo da Quaresma na
quarta-feira passada pela imposição
Carême 2024 avec le Père Jacques de Jésus (Lucien Bunel) - Par la Croix vers la Lumière
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das cinzas e por um tempo de jejum
e abstinência.
São Pedro, na segunda leitura da eu-
caristia deste primeiro domingo da
Quaresma, coloca diante dos nos-
sos olhos a realidade da Paixão de
Cristo Jesus que celebramos durante
o Tríduo Pascal: «Cristo padeceu pe-
los pecados. (…) Foi morto na carne».
Mas, ao mesmo tempo, São Pedro ex-
plica-nos a razão: «Para nos condu-
zir a Deus» e clarifica à partida que
a paixão e a morte na Cruz não são
o fim do percurso: «Morto na carne,
mas vivificado no Espírito».

Somos, desde o início, chamados à es-


piritualidade própria deste tempo de
Quaresma: passar «pela Cruz» para
chegar «à Luz».
Os quarenta dias em que a Igreja nos
propõe caminhar em direção à Páscoa
são marcados por este dinamismo de
vida.
Deixemos que os nossos corações se
encham desta boa nova. No tempo
da Quaresma, a nossa participação
no mistério pascal tem como objetivo
«conduzir-nos a Deus», permitir-nos
viver na Sua intimidade.
A seguir, São Pedro fala do dilúvio que
é uma «figura do batismo, que agora
vos salva».
Neste início de Quaresma, podemos
questionar-nos sobre a graça que rece-
bemos no batismo. Fomos mergulha-
dos na morte de Cristo para viver já
da Sua Ressurreição. O batismo faz de
nós pessoas salvas, nas duas aceções
Quaresma 2024 - Retiro Online com o P. Tiago de Jesus(Lucien Bunel) - Pela Cruz à Luz
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deste termo: por um lado, faz de nós
pessoas que retrocedem dos caminhos
errantes, das situações de perigo, e por
outro, dá-nos vida, a própria vida de
Deus. Deus salva-nos, ou seja, Deus
faz-nos viver. Faz-nos experimentar a
Sua vida. É um presente que Ele nos
dá e que se renova a cada instante.
Sabemos fazer memória do nosso ba-
tismo? Desse instante em que Deus
Trindade, Pai, Filho e Espírito San-
to veio estabelecer a Sua morada no
mais íntimo do nosso ser?
Pela graça do batismo temos um futu-
ro de eternidade. Porém, pode acon-
tecer deixarmos turvar esta fonte de
vida, por isso, este tempo de retiro
pode ser um tempo privilegiado para
deixar a fonte jorrar plenamente, com
força, levando-nos a novas margens.
Retirarmo-nos, rezarmos é religar-
mo-nos a esta fonte de vida.
São Pedro apresenta o batismo não
como um acontecimento do passado,
mas como uma situação atual: «um
compromisso para com Deus de uma
consciência reta». O batismo é uma
realidade ativa na minha vida que en-
cerra uma garantia de vida nova para
cada momento da minha existência.
Um Padre da Igreja, Gregório de Nis-
sa, afirmava: «És batizado cada vez
que renuncias ao mal». Somos mer-
gulhados no mistério pascal de Cristo
se nos comprometermos com Deus,
de consciência reta, e isso nunca se
faz de uma vez por todas.
Temos consciência do dinamismo de
vida contido no batismo?
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Batismo e santidade
Ao receber a vida divina em herança
é a santidade de Deus que recebemos.
São Paulo fala diversas vezes dos bati-
zados chamando-os «santos».

Escutemos algumas saudações intro-


dutórias às suas cartas: «A todos os
amados de Deus que estão em Roma,
chamados a ser santos» (Rom 1,7);
«À igreja de Deus que está em Corin-
to, como a todos os santos que estão
na Acaia inteira» (2Co 1,1); «Aos san-
tos e fiéis em Cristo Jesus» (Ef 1,1);
«A todos os santos em Cristo Jesus
que estão em Filipos» (Fl 1,1); «Aos
irmãos em Cristo, santos e fiéis, que
vivem em Colossos» (Col 1,2).
Sim, em virtude do nosso batismo,
em virtude da nossa pertença a Cristo
Jesus, já somos santos… em gérmen.
Temos de deixar crescer esta semente
para que ela dê, pouco a pouco, ver-
dadeiros frutos de santidade. E este
tempo de Quaresma é um tempo pri-
vilegiado para cuidar esta semente.
Numa pregação a 14 de setembro de
1933, o P. Tiago disse:
«Se, pelo batismo, recebemos o gérmen da
vida do Céu, se a Igreja deposita então nas
nossas almas a riqueza sobrenatural das
virtudes e dos dons, não é menos verdade que
ela não elimina logo o homem velho que está
em nós. Ela infunde em nós a força para o
combater, mas deixa-nos a responsabilidade
para o fazermos nós mesmos».

Numa outra pregação de 27 de janeiro


de 1929, esclarece:

«O batizado ama a Deus, porque todo


seu ser ficar orientado para Deus pelo ba-
tismo. Desde esse momento, Deus passa
a habitar na sua alma e aí repousa com
amor como em morada escolhida!»

Num artigo que apareceu na revista


Le Prêtre Éducateur, (O Padre Educa-
dor), órgão da Obra dos Padres Edu-
cadores, 36º, n°1, janeiro de 1936, o P.
Tiago escreve:
«E, no entanto – repetimos, com
risco de que possam encolher os
ombros – a criança, toda a crian-
ça é chamada por Deus à santidade.
Toda a criança deve tornar-se santa,
porque todo o batizado é destinado
a desenvolver em si uma vida inte-
rior profunda que vá até à mais ab-
soluta intimidade com Deus».
Muito recentemente, um antigo alu-
no do Petit-Collège que não conhe-
ceu o P. Tiago senão durante uns
meses, de setembro de 1943 a janei-
ro de 1944, confiou-nos que estava
admirado e maravilhado por ouvir
o P. Tiago falar-lhes muitas vezes da
santidade à qual todos estavam cha-
mados, como uma resposta em fide-
lidade à graça recebida no Batismo.
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Deixar-se interpelar pelo
P. Tiago de Jesus

Num curto retiro que ele pregou aos


jovens estudantes de filosofia, insiste
nesta noção de santidade. Fala-lhes
primeiro do mistério da Eucaristia e
depois apresenta-lhes uma meditação
sobre a santidade a partir do que virá
a ser a terceira fase do seu testamento
espiritual, que já evocámos na semana
passada.

Esta pregação não está totalmente re-


digida. Trata-se de notas assentes num
papel para servirem de guia às suas
apresentações. Mas podemos fazer
nossas estas intuições no início deste
tempo da Quaresma. Deixemo-nos
interpelar e desinstalar pela palavra
deste apóstolo de coração ardente:

Qui facit veritatem venit


ad lucem! (Quem prati-
ca a verdade aproxima-se
da Luz (Jo 3,21). Cristo é a
Verdade!
Nós nunca seremos a verdade. Te-
mos sempre manchas, imperfei-
ções. Mas, apesar destas limitações,
podemos fazer coisas boas e belas.
Como praticar a verdade? Só há um
meio: trabalhar para atingir o obje-
tivo para o qual Deus nos criou.
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Mas para que fomos nós criados?
A flor, para perfumar, e a verdade
para... O pássaro para cantar, e a
verdade para... A verdade para…
sermos santos! Sim, repito, Deus
criou-nos para sermos santos.
St Paul : São Paulo diz: «Esta é, na ver-
dade, a vontade de Deus: a vossa santifi-
cação» (1Ts 4,3; Haec est voluntas Dei...)
São Paulo diz: «Esta é, na verdade, a
vontade de Deus: a vossa santifica-
ção» (1Ts 4,3; Haec est voluntas Dei...)

Antes, dissera Cristo a Nicodemos:


«Quem não nascer do Alto não pode
ver o Reino de Deus» (Jo 3,3; Nisi quis
renatus fuerit denuo, non potest videre
regnum Dei). «O que nasce da carne é
carne e o que nasce do Espírito é espíri-
to» (Jo 3,6; Quod natum est ex carne,
caro est, et quod natum est ex spiritu,
spiritus est).
A vontade de Cristo é clara: o dever
e missão de todos nós é caminhar
para a santidade.
Não ignoro objeções que cada um
de vós possa fazer. Habitualmente,
pensamos que há duas categorias
de cristãos: os privilegiados e os
outros; uns seriam conduzidos à
santidade; e os outros deveriam
contentar-se com uma vida cristã
de saldos, de mínimos.
Ora, há apenas uma categoria de
cristãos, tal como há um só batis-
mo. E todos são chamados à san-
tidade porque todos recebem o
gérmen da santidade com o batis-
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mo. E quereis saber qual é o maior
obstáculo à santidade? A cobardia,
somos uns cobardes. Somos co-
bardes na nossa vida pública e na
nossa vida íntima.
Cobardes quando temos de escol-
her e de viver aos olhos de todos
o ideal da santidade.
Cobardes quando se trata de orde-
nar a nossa vida, de amordaçar as
nossas paixões, de calar os maus
desejos, de rejeitar as tentações se-
cretas.
Cobardes quando é preciso levan-
tarmo-nos de uma queda, através
duma confissão profunda e trans-
parente que nos redima aos olhos
de Deus.
Ora a santidade é o contrário da
cobardia.
Os santos são enérgicos, valentes,
fortes na ousadia, nos desejos; são
pessoas que se põem tudo da sua
parte acolher a graça de Deus e
caminhar ao seu encontro, porque
Ele está sempre a querer vir ao
nosso.
Compreendei bem duas coisas:
Deus quer que sejais santos e, além
disso, não tendes nenhuma des-
culpa para não o serdes.
Já estou à espera das vossas per-
guntas: Como podemos tornar-
nos santos?
É o próprio Cristo que nos vai res-
ponder.
«Quem pratica a verdade aproxima-se
da luz» (Jo 3,21; Qui facit veritatem,
venit ad lucem) «Se alguém me quiser
seguir, renuncia a si mesmo, tome a sua
cruz e siga-Me» (Mt 16,24; Si quis vult
venire post me, abneget semetipsum, et
tollat crucem suam et sequatur me).

Portanto, retenhamos
duas convicções:

O essencial é a santidade, que


consiste em que cada um faça, a
todo o momento, o seu dever,
dizendo “sim” a Deus. Deus fa-
la-nos através do quotidiano, atra-
vés do trabalho, através de tudo
o que acontece... Dizer sempre
“sim”. Mas não um “sim” qualquer:
um “sim” sorridente, um “sim”
feliz, um “sim” cheio de amor.
Beijar a mão de Deus.
Eis o essencial da santidade.
E eis a consequência que brota ime-
diatamente daqui: Deus revela-se.
Novos abismos se destapam em nós e
Deus vem preencher esses abismos.
“Se alguém me ama, guar-
dará a minha Palavra, meu Pai o
amará e viremos a ele e faremos
nele a nossa morada” (Jo 14,23).
Somos morada de Deus por graça.
Deus está vivo em nós.
O trabalho constante de um atura-
do cumprimento do dever aproxi-
ma-nos cada vez mais de Deus.
E um dia algo de sobrenatural-
mente prodigioso poderá despon-
tar: a alma dentro do seu ritmo
habitual será, de repente, tomada
por um sentimento de presença...
E se essa alma for corajosa, este
contacto com Deus renovar-se-á.
Não penseis que vos digo coi-
sas que para vós são impossíveis
de realizar. Eu já as vi realizadas».
Estas palavras precisas e vigoro-
sas do P. Tiago de Jesus voltam
a recentrar-nos diante do projeto
de Deus sobre nós, diante do seu
desígnio de amor. Elas recordam-
nos a nossa responsabilidade para
que este desígnio se possa realizar.
Invoquemos o Espírito Santo para
que Ele venha sobre nós e nos encha
da sua força neste início do tempo
de Quaresma.

Frei Didier-Marie GOLAY,


ocd (convento de Paris)

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Primeira semana:
«Salvos pelo Batismo»
Segunda-feira, 19 de fevereiro:
Viver do meu batismo

«Um cristão é alguém que ‘viu’ a Cristo. Há


poucos cristãos porque há poucas almas que
tenham ‘visto’ a Cristo. Há multidões de bati-
zados […] que permanecem frios, mornos».
(Retiro no Carmelo de Pontoise)
«Todos os que fostes batizados em Cristo, es-
tais revestidos de Cristo». (Gl 3,27)
Que fiz eu do meu batismo? Celebro o seu
aniversário todos os anos?

Terça-feira, 20 de fevereiro:
O combate espiritual

1939, le Père Jacques avec d’autres soldats


à la frontière Belgique-­Luxembourg
«Antes do meu serviço militar ainda ten-
ho alguns meses para lutar contra mim
próprio, (…) para me dominar melhor, me
recolher mais em Deus e viver uma vida
interior mais intensa». (Carta à Ir. Marthe,
em 1920)
«Revesti-vos da armadura de Deus, para
terdes a capacidade de vos manterdes de
pé contra as maquinações do diabo». (Ef
6,11)
Qual será o meu principal combate espiri-
tual nesta Quaresma? Como é que o vou
orientar?
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Quarta-feira, 21 de fevereiro:
Escolher a verdadeira felicidade

«A imensa fonte de felicidade, a única fonte


capaz de extinguir o ardor dos nossos dese-
jos, o único ser suficientemente grande para
saciar o nosso coração é Deus. (…) Basta pen-
sar nele, na sua presença contínua ao nosso
lado». (Sermão de 1928)
«Senhor, sois o meu Deus, desde a aurora Vos
procuro. A minha alma tem sede de Vós».
(Sl 62)
O meu desejo de felicidade está corretamente
orientado para Deus?

Quinta-feira, 22 de fevereiro:
Com a fé de São Pedro

Sebastiano Ricci « Saint Pierre libéré par l'ange »

«Vós, os meus mais crescidos, (…) desen-


volvei uma vida espiritual profunda. Que
Cristo seja para vós um Ser vivente, um
Amigo pessoal. Procurai-O muitas vezes
na oração silenciosa, na Sua presença, e
na comunhão eucarística». (Boletim En fa-
mille quand même, n° 2)
«E para vós, quem sou Eu?» (cf. Mt 16,15)
Depois da confissão de Pedro («Tu és Cristo,
o Filho de Deus vivo»), que responderia eu
a esta pergunta de Cristo?

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Sexta-feira, 23 de fevereiro: Porquê?

«Como vê, eu levo uma existência que está


longe dos meus sonhos. Onde está a soli-
dão? Onde está a vida ignorada e silen-
ciosa à qual aspira todo o meu ser? Misté-
rio do bom Deus! Porque é que Ele coloca
em nós tais desejos, tão fortes e dolorosos
em certas horas, e não permite que se rea-
lizem?» (Carta de 1926, a Antoine Thouve-
nin)
«Filho, porque nos fizeste isto?» (Lc 2,48)
Apresento a Deus na oração todos os «por-
quês» que tenho e todos os dos meus próxi-
mos.

Sábado, 24 de fevereiro:
Abrir o meu coração

«Já pensastes que Ele Se põe pessoal-


mente à porta do vosso coração, à espera
do momento em que vos decidireis a abrir-
Lhe a porta? Ah! Se por uma só vez Ele nos
aparecesse na Sua afetuosa atitude de es-
pera!» (Sermão de 1926, em Havre)
«Eu estou à porta e bato: se alguém ou-
vir a minha voz e me abrir a porta, entra-
rei em sua casa e cearei com ele e ele
Comigo.» (Ap 3,21)
Medito sobre esta espera de Cristo, à por-
ta do meu coração.

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