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NACIONALISMOS,

POPULISMOS E MILITARI-
ZAÇÃO NA AMÉRICA
NACIONALISMOS,
POPULISMOS E MILITARI-
ZAÇÃO NA AMÉRICA
Copyright © UVA 2019
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meio sem a prévia autorização desta instituição.

Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico


da Língua Portuguesa.

AUTORIA DO CONTEÚDO PROJETO GRÁFICO


Elisa Goldman UVA

REVISÃO DIAGRAMAÇÃO
Marcia Glenadel UVA
Maria Lucia Daflon
Theo Cavalcanti
Lydianna Lima
SUMÁRIO

Apresentação 6
Autor 7

UNIDADE 1

Nacionalismos na América 8
• Nacionalismos na América Anglo-Saxônica

• Nacionalismos na América Espanhola

• Nacionalismos na América Portuguesa

UNIDADE 2

Populismos e projetos de modernização na América 34


• Projetos de modernização e Guerra Fria na América anglo-saxônica

• Populismos na América espanhola

• Populismos e modernidade na América portuguesa


SUMÁRIO

UNIDADE 3

Militarização, ditaduras e intervenções 58


• Autoritarismo e democracia na América anglo-saxônica no contexto
da guerra fria

• Militarização, ditaduras e intervenções: a América espanhola

• Militarização, ditaduras e intervenções

UNIDADE 4

Redemocratização na América contemporânea: 87


características históricas e perspectivas
• Democracia e crise econômica na América anglo-saxônica contemporânea

• Redemocratização e neoliberalismo na América espanhola contemporânea

• Crise da ditadura militar: propostas de abertura, redemocratização ou


reconstitucionalização? A Nova República: perspectivas para a democra-
cia na América portuguesa
APRESENTAÇÃO

Esta disciplina pretende analisar a América Espanhola, Anglo-Saxônica e o Brasil no con-


texto histórico do século XIX e XX, com destaque para os diferentes projetos nacionalistas,
de desenvolvimento, além do fenômeno do populismo; suas características e particulari-
dades. A crise do pacto populista no caso da América Espanhola e Portuguesa teria coin-
cidido com a eclosão do regime militar e suas respectivas propostas políticas autoritárias.

Devemos destacar que a nova ordem político-institucional, que aparece no formato do


autoritarismo, porta uma doutrina de segurança militar. Esse cenário possui uma produ-
ção cultural significativa que apresenta uma resistência intelectual aos regimes autori-
tários a serem contemplados na respectiva disciplina. A mesma disciplina deve nortear
um debate teórico-historiográfico sobre a transição do regime autoritário para o regime
democrático que na América tomou uma escala gradual. Reconhecemos a importância
de se refletir sobre o processo de abertura política e a crise econômica que alcançou
proporções expressivas.

Começamos pelo debate sobre o nacionalismo na América Anglo-Saxônica, Espanhola e


Portuguesa. Entendemos o nacionalismo como uma tradição inventada, em que o termo
“tradição inventada” é utilizado no sentido abrangente, porém definidor, o que envolve tan-
to as tradições construídas e institucionalizadas quanto as que são difíceis de localizar
no contexto de origem.

O objetivo e o sentido das tradições inventadas são o seu caráter invariável. As práticas
devem se repetir e se inserir em uma formalidade. A tradição tal como Hobsbawm imagi-
na é distinta da convenção rotinizada: esta deve possuir uma função simbólica que pode
ser ritualizada. Os argumentos pragmáticos desprovidos de função simbólica demons-
tram a fraqueza da tradição.

Hobsbawm considera que a invenção das tradições exige um processo de formalização


e ritualização que se refere ao passado, ainda que pela imposição da repetição. No caso
do nacionalismo sem suposta origem, torna-se necessário uma invenção da continui-
dade histórica, pela elaboração de um passado antigo que transcenda a continuidade
histórica real.

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AUTOR

ELISA GOLDMAN

Historiadora formada pela Pontifícia Universidade Católica − PUC-Rio (1994). Possui


mestrado em História Social da Cultura − PUC-RJ (1997). Doutora em História pelo pro-
grama de Pós-Graduação em História Política da Universidade do Estado do Rio de Ja-
neiro − PPGH-Uerj (2014). Atualmente, é professora no curso de licenciatura em História
da Universidade Veiga de Almeida – UVA e professora tutora na disciplina de Teoria da
História, na graduação de História a distância na Unirio/UAB. Professora de História na
Fundação de Amparo à Escola Técnica do Estado − Faetec-RJ.

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UNIDADE 1

Nacionalismos na América
INTRODUÇÃO

Essa unidade possui significativa importância para que possamos identificar aspectos
históricos da trajetória do nacionalismo no continente americano e a formação dos es-
tados nacionais no século XIX. Devemos chamar atenção para os diferentes debates
que são reconhecidos nos cenários intelectuais que abordam o ethos nacional, ou seja,
percebemos dois movimentos paralelos; a saber: o debate intelectual sobre o naciona-
lismo e a formação do estado nacional após a emancipação na América Anglo-Saxô-
nica, América Espanhola e América Portuguesa.

OBJETIVO

Nesta unidade você será capaz de:

• Distinguir as características inerentes aos nacionalismos no continente ameri-


cano a partir das últimas décadas do século XIX.
• Problematizar o conceito de república ao historicizar os diversos projetos de
república desenvolvidos desde o século XIX.

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Nacionalismos na América Anglo-Saxônica

A ideia de nação tornou-se central na construção da vida social no período moderno,


especialmente nos séculos XVIII e XIX. Seria difícil demarcar o ponto de origem histórica
do surgimento das nações e dos discursos/narrativas nacionalistas.

O nacionalismo seria a culminância ou realização das identidades


primárias organizadas politicamente?

O nacionalismo abrangia uma esperança secularizada ou um tipo


de lealdade coletiva que se desenvolvia paralelamente ao Estado
moderno político?

O que nos interessa debater tem relação com o lugar reservado ao nacionalismo no percur-
so histórico da América Anglo-Saxônica. Para a realização do desenvolvimento dessa te-
mática, é necessário situar alguns dos principais debates em torno da questão do naciona-
lismo e as análises historiográficas que posicionam os autores em relação a essa temática.

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O nacionalismo pode ser definido como uma declaração de pertencimento a
um lugar, a um povo e a uma herança cultural.

A afirmação nacional rejeita o exílio!

O nacionalismo vitorioso no processo de disputas regionais justifica uma his-


tória amarrada seletivamente por origens, textos básicos, retóricas de per-
tencimento e determinados marcos históricos.

Inicialmente, podemos ler o nacionalismo como um mecanismo rancoroso e estreito de


identidade que pode produzir conformismo. O debate sobre o nacionalismo nos remete
diretamente à relação estreita entre cultura e Imperialismo porque uma das formas de
manifestação do legado nacionalista tem ligação com a luta anticolonial.

Cultura Nacionalismo Imperialismo

Importante

Na luta anticolonial existem dois lados, duas nações em combate, ou seja, eri-
ge-se a alteridade da ruptura, do conflito e da batalha.

Podemos reconhecer que as nações são supostas narrativas. O problema de narrar ou


de impedir que se formem e surjam outras narrativas é fundamental para demarcar a
relação entre a cultura e o imperialismo. O contraponto entre as narrativas de dominação
e de resistência é o elemento-chave para se compreender o processo imperialista. A cul-
tura parece ser uma poderosa fonte de identidade.

O conflito colonial justifica a elaboração dos mitos nativos e ressignifica elementos do


passado da colônia com o objetivo de fortalecer um suposto ethos nacional.

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Otto Bauer, líder político austríaco. Otto Bauer procurou definir a nação a partir da cate-
goria de caráter nacional, entendida como um conjunto
de características físicas e mentais que distinguiam
uma nação de outra. O caráter nacional vai se modifi-
cando no decorrer da história. A comunhão do caráter
nacional é feita e refeita a cada contingência. A ciência,
ao afirmar o caráter mutável dessa comunhão coletiva,
enuncia um problema e não o soluciona.

Bauer (2000) identifica o espírito do povo como um


elemento misterioso que compõe as escolas filosófi-
cas do romantismo. O substrato nacional único e homo-
gêneo que permanece estável no devir histórico é utiliza-
do como fundamento da escola historicista romântica.
IMAGNO/Austrian Archives

Qual seria o ponto de partida do caráter nacional?

Bauer responde que sua origem tem relação com a determinação diferencial da von-
tade. A nação é vista como uma comunhão de destino, ou seja, o compartilhamento
da experiência.

A diferença do caráter nacional é um fato empírico, que só pode ser ne-


gado por uma ideia doutrinária que vê apenas aquilo que quer ver e não
enxerga o que todos os outros veem. Apesar disso, porém, fizeram-se
esforços reiterados para negar a diferença do caráter nacional e afir-
mar que o que distingue as nações é apenas sua língua. Essa opinião é
compartilhada por muitos teóricos que se baseiam na doutrina católica.
Foi extraída da filosofia humanista do iluminismo burguês e apropriada
por muitos socialistas, que procuraram usá-la para defender um cosmo-
politismo proletário que, como veremos, representa a posição inicial e
primitiva da classe trabalhadora perante as lutas nacionais do mundo
burguês. (HOBSBAWM, 1990, p. 63)

As forças históricas condicionam as individualidades, e a consciência vem a posteriori,


o que significa que a consciência nacional faz da nacionalidade uma motivação para o
comportamento político.

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Para Bauer, a expansão e a consolidação da consciência nacional é con-
sequência histórica da nossa sociedade capitalista.

O sistema estatal se transformou por meio do princípio da nacionalidade. De maneira


geral, temos:

• O Estado forma uma nação e uma nação constitui um estado.


• A ausência de premência histórica explica a interdependência entre as duas ins-
tâncias.
• A nação, como totalidade, tem relação com o aparato estatal.
• O próprio sistema estatal teria se transformado com o advento do princípio da
nacionalidade.

Nacionalismo norte-americano

Quando falamos em nacionalismo norte-americano, abordamos o nacionalismo em-


brionário de 1780/1790, que se manifesta no contraponto à metrópole britânica e seus
privilégios aristocráticos. Esse nacionalismo assume diferentes aspectos ideológicos.
Podemos classificar em três modalidades de nacionalismo: o imperial, o revolucioná-
rio e o republicano.

Nacionalismo imperial

O componente ideológico do nacionalismo


imperial é representativo dos senhores de
terra. Esse primeiro formato é um embrio-
nário nacionalismo que aparecia por meio
dos cidadãos colonos que imaginavam-se
britânicos no continente americano. Defen-
diam as liberdades pessoais e o bem-es-
tar material.

O cálculo da identidade política aparecia por meio de uma imaginação recolonizadora


cuja denominação principal era a chamada de anglicização. Suas manifestações no sé-
culo XVIII apareciam por meio de um forte ódio aos franceses e um grande desprezo
pelo protestantismo e pela cultura anglo-saxônica norteadora dessa referência cultural.

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Os americanos endossavam as crenças e convicções inglesas predominantes e incorpo-
ravam as principais correntes do pensamento político inglês. A idealização do comércio
e da liberdade caminhava em conjunto, parte de uma nação que se sentia integrando o
império britânico em expansão.

Nacionalismo revolucionário

Quando a crise do sistema colonial começou a se manifestar por meio do rigor fiscal
— aumento dos preços dos produtos mediados pela Inglaterra, houve uma progressiva
erosão da lealdade imperial. A surpreendente constatação de que os americanos não
eram considerados irmãos britânicos criou um ambiente de conversão do nacionalismo
imperial em nacionalismo revolucionário.

O nacionalismo revolucionário par-


tia de uma ampla insatisfação que
culminou com a rejeição aos mitos
e tradições de uma identidade míti-
ca calcada na experiência colonial.

Sheila Fitzgerald / Shutterstock.com

A linguagem lockeana (originário de John Locke), que abordava possibilidades universa-


lizantes dos direitos humanos, aparecia com força na retórica do nacionalismo reativo
à dominação colonial. Esse grupo rejeitava argumentos históricos para favorecer uma
ideologia de inclusão que defendia igualdade e liberdade.

Nacionalismo republicano

O nacionalismo republicano estabeleceu


barreiras para uma participação política in-
clusiva associada à mobilização revolucio-
nária. Aborda uma linguagem vinculada à
cidadania, embora limitada ou exclusiva.

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Exaltava-se um novo Estado no qual se destacava um regime formado
por proprietários rurais masculinos.

As ideias nacionalistas estariam entremeadas por inúmeras lealdades circunstanciais.


Os nacionalismos cívico e racial fundamentaram ideologicamente a nação americana
em suas próprias origens. A seguir, veja origem de cada nacionalismo:

Nacionalismo cívico Nacionalismo racial

Representa um ímpeto de constru-


ção de uma forma de organização
Aborda um pertencimento com critérios
política que idealiza direitos iguais a
de etnia, sangue ou cor da pele e fala em
todos os cidadãos sem critério racial,
capacitação de um autogoverno.
religioso, de sexo ou etnicidade ou
credo político.

A declaração de independência e a afirmação de que todos os homens são iguais in-


corporou um paradoxo de uma nação que falava em igualdade social, mas mantinha a
escravidão no interior da sociedade.

MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 1 e conheça o conteúdo indicado pela professo-


ra sobre nacionalismo, identidade nacional e segregacionismo.

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Nacionalismos na América Espanhola

Abordaremos, neste tópico, o nacionalismo no contexto da América Espanhola. No pri-


meiro momento, é fundamental estabelecer alguns marcos teóricos para o debate em
torno do conceito de nacionalismo.

Eric Hobsbawm situa o marco inicial da historiografia


do nacionalismo após a Primeira Guerra Mundial. A
conjuntura histórica da reorganização do mapa da Eu-
ropa no pós-guerra elabora a centralidade do princípio
da nacionalidade. O sentido moderno da categoria de
nação não é mais antigo do que o século XVIII.

Segundo o autor citado, os percursos definidores da na-


cionalidade seriam originados a partir da:

• língua;
• etnia;
• conjunto de critérios, como: território comum e alguns
Eric Hobsbawm, principal
historiador marxista. traços culturais.

A nação tal como identificada pelo nacionalismo pode ser reconhecida “a posteriori” ou
como origem histórica da ideologia nacionalista.

Saiba mais

Para o autor de Nações e Nacionalismos, a nação se corporifica tendo como


principal referência o passado. O que justifica uma nação em relação à outra é
o passado e os historiadores são as pessoas que elaboram a fundamentação
e o rastreamento dos traços que preenchem essa existência. Funciona como
uma mitologia retrospectiva. Os movimentos nacionais do Terceiro Mundo se
baseiam nas tradições liberais e revolucionárias democráticas do século XIX.

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Hobsbawm se apropria do conceito de nacionalismo, tal como desenvolvido na obra de
Ernest Gellner. O nacionalismo significa “fundamentalmente um princípio que sustenta
que a unidade política e nacional deve ser congruente.” Com Gellner, Hobsbawm ressal-
ta o conceito de invenção.

Para efeito de análise, o nacionalismo precede a nação. Os nacionalismos elaboram


os Estados e a nação.

Segundo o autor, as nações são fenômenos duais, construídos do alto, porém compreen-
didas pela aceitação das massas. Gellner identifica, com destaque, a modernização feita
pelo Estado.

A chamada visão de baixo significa a nação vista sob a ótica de quem é objeto da ação
e da propaganda nacionalista.

• Objeto dos historiadores sociais: deve abranger as ideias, as opiniões e os senti-


mentos do chamado plano subliterário.
• Identificação nacional: deve ser vista no conjunto de outros laços de identidade
para além da dinâmica temporal inerente à identidade nacional.

A consciência nacional emerge de forma desigual entre diferentes grupos


regionais e essas desigualdades não foram levadas em conta nos estudos
sobre o nacionalismo.

Para o autor de Nações e nacionalismos, o movimento nacionalista pode ser dividido


em três fases (A, B, C). A última etapa (fase C) de consolidação do movimento naciona-
lista, quando este alcança a sua fase popular, de assimilação das massas, destaca-se
nessa temporalidade.
NACIONALISTA
MOVIMENTO

Existe uma militância Representa o


Corresponde ao período
sistemática da ideia momento em que os
do século XIX e foi cultural,
nacional e o início das programas adquirem
literário e folclórico sem
campanhas políticas a sustentação de
implicações políticas diretas.
favor dessa ideia. massa.

Fase A Fase B Fase C

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Saiba mais

Miroslav Hroch, historiador A trajetória do movimento nacionalista obedece


e teórico político tcheco.
à lógica compreensiva do professor da Univer-
sidade Carlos, em Praga, Miroslav Hroch. Este
teria publicado um estudo comparativo pioneiro
sobre os movimentos nacionalistas dos países
das Europas Central e Oriental. O autor definia
as nações como conformações antropológicas
com nexos fracos entre a ascensão do naciona-
lismo e a moderna sociedade industrial. O autor
em questão trabalha com uma tipologia de fa-
ses do nacionalismo.

Reconhecemos a importância do protonacionalismo (apologia à formação da nação do


ponto de vista político) para o desenvolvimento do estado-nação e das nacionalidades.
Uma base protonacional é desejável para a formação de movimentos que aspiram a
um Estado, mas não é imprescindível para a formação das lealdades e dos patriotis-
mos nacionais.

Mesmo pensando na relação do nacionalismo com a modernização dos Estados no sé-


culo XIX, o Estado confrontava o nacionalismo como uma força separada divergente do
patriotismo estatal.

Nacionalismo

Caso exista integração entre os dois, seria


Mecanismo um recurso bem poderoso politicamente,
de exaustão pois esse processo poderia culminar em
um mecanismo de exclusão.

Patriotismo
estatal

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Quando Hobsbawm (1990) reflete sobre os nacionalismos do Terceiro Mundo proces-
sados no período da descolonização, ele conclui que essas são experiências coladas à
referência europeia.

A atualização histórica dos nacionalismos do século XIX ao XX não interfere


intensamente no desenvolvimento histórico como aconteceria no passado.

Nacionalismo latino-americano

Falar do nacionalismo latino e falar de latinidade com um viés mais cultural, de uma “mes-
tiçofilia” indigenista, afro-americana no seu aspecto mais social ou de um nacionalismo
anti-imperialista com ênfase no econômico teve profundo impacto nos anos 1920/30.
Esse último teve o seu ponto alto nos anos 1920 com reações à invasão norte-americana
na Nicarágua, revigorando um certo pan-americanismo.

O nacionalismo latino-americano foi erigido dentro de uma perspectiva de defesa contra


o imperialismo, ou seja, teria uma perspectiva defensiva de orientação centrípeta. Defen-
dia-se a soberania nacional leiga e esquerdista.

Exemplo

Como exemplo, podemos destacar o modelo argentino que se enquadra no


caráter fortemente anti-imperialista, por oposição ao capital estrangeiro e, por
vezes, por um viés antinorte-americano.

Nacionalismo boliviano

O nacionalismo boliviano recupera o indigenismo inerente ao pensamento intelectual


como síntese da nacionalidade por meio da conformação social. Haveria uma necessi-
dade de se aproximar das diversas modalidades da vida nacional. Buscava-se no índio
os elementos de diferenciação. Paralelamente, o tema do imperialismo vai se tornando
expressivo. É a defesa da soberania nacional e a manutenção do escopo de um naciona-
lismo continental não fragmentário.

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O caráter anti-imperialista na sua dimensão dual político-econômica aparece na revolu-
ção mexicana

Exemplo

Como exemplo, se, por um lado a revolução mexicana atualiza a agenda te-
mática da soberania nacional e do caráter anti-imperialista, por outro lado,
Rodó e sua obra Ariel representava a obra mais lida pela juventude universi-
tária latino-americana.

No arielismo haveria certa latinidade nostálgica, antimoderna, cuja ideia de América seria
um contraponto ao utilitarismo norte-americano.

Curiosidade

Ariel, do uruguaio José Enrique Rodó, talvez seja o texto mais influente de
toda a história do aparato educacional latino-americano. Na primeira metade
do século XX, dificilmente se encontrará, na América Hispânica, prática peda-
gógica na área de ciências humanas intocada, de alguma forma, pelo breve
opúsculo de Rodó. Dirigido à “juventude” da América, o título tem como mote
A Tempestade, de Shakespeare. O escravo de Próspero, Caliban, seria o perso-
nagem preso aos interesses materiais, enquanto Ariel seria a figura espiritual,
capaz de ir além dos interesses pragmáticos. A operação central do texto de
Rodó é associar aquele ao materialismo anglo-saxão e este à vocação “cultural”
da América Latina. Para Rodó, os povos anglo-saxões teriam se enclausurado
em um materialismo estreito, em um cálculo pragmático e instrumental. Os
povos latino-americanos estariam em condições de contrapor a isso a herança
genuína das civilizações clássicas. Rodó desenvolve um conceito aurático de
cultura, ligado à “experiência verdadeira” da arte, por oposição à brutalidade
massificada do cotidiano capitalista.
Há, portanto, uma crítica ao capitalismo em Rodó, mas ela é feita de um ponto
de vista aristocratizante e culturalista. Rodó tem horror à “multidão” e à “vul-
garidade”. Seu grande adversário é o utilitarismo, que ele via encarnado nos
Estados Unidos.

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O texto é uma nítida reação à modernização, uma tentativa de determinar um
novo espaço para o intelectual “desinteressado” e “estético”, em meio à massi-
ficação moderna. Daí os insistentes chamados de Rodó a uma existência total,
na qual o indivíduo fosse um exemplar não mutilado da humanidade, em que
nenhuma faculdade do espírito ficasse obliterada. (AVELAR, I. Revista Fórum
– 2011) (https://revistaforum.com.br/noticias/biblioteca-latino-americana-ariel-
-1900-de-jose-enrique-rodo/)

Nacionalismo revisionista

Uma outra forma de nacionalismo aparece na faceta revisionista que reivindica o passa-
do colonial como aquilo que é característico do americano. Muitas vezes, o revisionismo
funda uma idade do ouro primordialista que dá ênfase à origem nacional e pode, em
última instância, culminar com o conservadorismo político.

São postulados nacionalistas que vigoraram desde o século XVIII até o início do século
XX, a saber:

• Insistência na valorização do índio como um autóctone em oposição à tradição


ibérica.
• Crítica ao modelo político-liberal.
• Forte sentimento anti-imperialista.
• Papel preponderante do Estado, anti-intervencionismo.

Além dos elementos citados, há a forte presença da ideia de que a nação está em perigo
contra forças avassaladoras de um inimigo externo.

Nacionalismo conservador

O nacionalismo conservador assume uma forma de oposição ao sufrágio universal e


ao teor antidemocrático. Algumas manifestações desse nacionalismo aparecem ilus-
trados no:

• Conservadorismo chileno.
• Integralismo brasileiro da AIB nos anos 1930.
• Hispanismo peruano.

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Nesse contexto, a modernidade seria representada como a degeneração, o que poderia
afetar a identidade básica americana.

A construção da identidade latino-americana foi aos poucos se estruturando por meio de


um sentimento nacional embrionário nos movimentos de independência que não podem
ser generalizados. Entre 1808 e 1810, os criollos ilustrados manifestaram suas inquieta-
ções por meio da criação de juntas autônomas que apresentavam sinais de mudanças
políticas, o que dividia o mundo colonial entre rebeldes e defensores da Coroa espanhola.

Novas ideias importadas das revoluções liberais, especialmente da Revo-


lução Francesa, com seu ideário iluminista, atravessavam os movimen-
tos de emancipação da América Espanhola.

Com as respectivas atualizações e dinâmicas diacrônicas, o nacionalismo latino-ame-


ricano assumiu diversas formas e configurações na trajetória histórica do continente.
A virada do século XIX, tanto no Brasil quanto no resto do continente latino-americano,
marca uma preocupação central com o ethos nacional e com uma identidade coletiva
que partia da exclusão do reflexo inverso do colonizador europeu.

Muitos intelectuais se debruçaram sobre isso não só em ensaios sociológicos sobre a


trajetória histórica dos seus países como também na literatura formativa.

Segundo Quijano (1991), a identidade na Amé-


rica Latina seria vista como um projeto his-
tórico aberto e heterogêneo que comportava
inúmeras identidades sociais (negros, mesti-
ços, europeus e índios) além dos variados pas-
Aníbal Quijano, sociólogo e pensador huma- sados envolvidos.
nista peruano, conhecido por ter desenvolvi-
do o conceito de “colonialidade do poder”.

Os países que integram a América Latina são dotados de grande diversidade cultural, o
que não permite uma abordagem única ou conclusões definitivas sobre a questão da
identidade. Rever o processo histórico que deu origem à concepção de identidade que
temos hoje é determinante, pois ela não é algo acabado e imutável.

22
MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 1 e conheça o conteúdo indicado pela professo-


ra sobre História: Século XIX na América Latina.

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Nacionalismos na América Portuguesa

Ao abordar o nacionalismo no contexto da formação da nação e de uma ideologia nacio-


nalista no Brasil, devemos estabelecer como preâmbulo um debate teórico e conceitual
que circunscreve a temática.

Para darmos início, podemos reconhecer a atribuição historicista do nacionalismo. Se,


por um lado, os historiadores promoveram a sua lógica primordialista e o seu mapea-
mento, por outro, foram seus mais argutos críticos. As críticas se dirigiam à multiplicida-
de dos efeitos perniciosos que perpassavam desde as políticas sociais e culturais até as
experiências históricas definidas pelo totalitarismo extremista.

O fenômeno do nacionalismo era condicionado pela vivência intelectual do país receptor.


O nacionalismo se desenvolve nas circunstâncias do imperialismo e do colonialismo eu-
ropeus e sua disseminação é autorreprodutora.

Tanto a nação quanto o nacionalismo são constructos artificiais, elabo-


rações. Isso promove o esforço de desconstrução da nação e estimula a
proposta de revelação dos recursos ideológicos manipuladores.

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Smith sinaliza para o potencial nacionalista e a sua disseminação provocada pela resso-
nância entre as massas. Nesse sentido, Eric Hobsbawn e Ranger destacam o conjunto
de “tradições inventadas”. A questão do artifício e da sobrevivência ou assimilação em
contextos culturais ou políticos diferentes aparecem em destaque.

Curiosidade

O nacionalismo como ideologia e movimento pode ser datada do final do século


XVIII. Nesse contexto, reconhecemos a correlação entre a nação e a moder-
nidade. A nação é vista como um fenômeno moderno que exige pré-condições
de desenvolvimento, a saber: a burocracia estatal, o capitalismo, a seculari-
zação e a democracia.

Reconhecemos que a fundamentação do mito da idade do ouro tem relação


com o passado e a atribuição de modernidade, com o nacionalismo, que se
encaminham criticamente para o superficialismo histórico.

Outro teórico em destaque, Benedict Ander- Benedict Richard O’Gorman


son, define que as nações são comunidades Anderson, historiador e cien-
políticas imaginadas, objetos de projeções. tista político estadunidense.
Inexistem comunidades verdadeiras; as na-
ções são imaginadas como comunidades na
medida em que independem das hierarquias e
desigualdades, e são concebidas como estru-
turas de vinculação horizontal.

Anderson elabora uma abordagem antropo-


lógica do nacionalismo como um resultado
de um prévio sistema cultural. Seu interesse
parte da motivação de que, após a Segunda
Guerra, todas as revoluções vitoriosas se defi-
niram em termos nacionais. Sua tese é explo-
rar como ponto de partida a ideia da naciona-
lidade, a condição nacional ou o nacionalismo
como produto cultural específico. A sua expan- Charles Harrington/Cornell
são e migração ocorrem em meio a uma varia- University
ção de conjunturas políticas e ideológicas.

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Saiba mais

Benedict Anderson é um especialista em política e história da Indonésia e do


sudoeste asiático, estudou na universidade de Cambridge e se tornou professor
emérito da Universidade de Cornell. Autor do clássico Comunidades imagina-
das, reflexões sobre a origem e difusão do nacionalismo. Nessa obra, desen-
volve o conceito de comunidades imaginadas, eu que fundamenta a análise so-
bre os nacionalismos contemporâneos. Sua afirmação parte de que a condição
de nação é o valor de maior legitimidade universal na história contemporânea.
A nação é uma comunidade imaginada que pode ser limitada e soberana, e
tem a sua essência marcada por uma conjuntura cultural. Inspirado na obra de
Walter Benjamin, intenciona demonstrar como os discursos da nacionalidade
são caracterizados pela noção de simultaneidade, inaugurando uma noção de
tempo vazio e homogêneo.

Para o autor, a nação nasce da convergência do capitalismo, da tecnologia da imprensa


e da diversidade da língua humana. Se a nação é intrinsecamente limitada, ela é, ao mes-
mo tempo, soberana e conformadora de uma comunhão entre seus membros.

A nação é uma comunidade política imaginada, quase uma questão de


parentesco ou religião.

Anderson afirma que o que tornou possível as novas comunidades foi a vivência intera-
tiva entre, a saber:

• Modo de produção.
• Relações de produção características do capitalismo.
• Tecnologia de comunicação (a imprensa).
• Desenvolvimento da diversidade linguística.

A tríade fatalidade-tecnologia e capitalis-


mo provocou a elaboração das comuni-
Fatalidade Tecnologia Capitalismo dades imaginadas. Estas promovem um
cenário ideal para a formação das nações
modernas.

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Anderson remete à ampliação do estado colonial e à formação de lideranças nativas
bilíngues, inseridas nas repartições públicas e educadas nas escolas do capitalismo co-
lonial. Essas lideranças formadas nas salas de aulas dos modelos caóticos e turbulentos
da história americana e europeia se distinguiam e se dissociavam da burguesia local.

A nação imaginada sofre uma adaptação, uma transformação social com o advento da
consciência nacional. A superação da armadilha em torno do projeto do nacionalismo
derivativo infere a reflexão sobre o caráter de invenção do nacionalismo e da revolução.

Desde o final do século XVIII, o nacionalismo passou por um processo


de adaptação que variava conforme as épocas, os modelos políticos, as
economias e as estruturas sociais.

Anderson não usa a equação — condições mise-


ráveis iguais a processo revolucionário. As con-
dições e causalidades do movimento nacional
de emancipação das ex-colônias podem ser
atribuídas às forças externas. A herança do re-
gime deposto deixa traços de um modelo mais
conformador da situação pós-colonial.

No capítulo Censo, mapa e museus o autor escreve uma justificativa, retificando a sua
colocação sobre o nacionalismo nas ex-colônias, nas edições anteriores do livro Co-
munidades imaginadas. Anderson, nas edições anteriores do livro , identificava que as
políticas de construção nacional das ex-colônias eram miméticas e inspiradas nos esta-
dos europeus. O autor assume posteriormente que a genealogia desses nacionalismos
deveria ser procurada nos estados coloniais e nas respectivas trajetórias históricas.

No caso do Brasil, a questão nacional ocupa um lugar de destaque e se realiza pela


missão intelectual executada pelos historiadores, artífices da ideia de nação. A “verda-
de” proferida pelo historiador no ápice de sua missão intelectual é realçar a materializa-
ção da narrativa nacional. Coube à instituição monárquica a legitimação do espaço do
discurso histórico nacional. Um dos espaços responsáveis por elaborar uma memória
histórica é o IHGB.

27
Curiosidade

O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) nasceu, em 1838, da as-


piração de uma entidade que refletisse a nação brasileira que, não muito antes,
conquistara a sua Independência. Em 177 anos de profícua existência, tem-se
caracterizado por atividades múltiplas, nos terrenos cultural e cívico, pela reunião
de volumoso e significativo acervo bibliográfico, hemerográfico, arquivístico, ico-
nográfico, cartográfico e museológico à disposição do público, durante todo o
ano, e pela realização de conferências, exposições, cursos, congressos e afins.

Contou com o patronato do imperador d. Pedro II, a quem foi dado o título de
Protetor, o qual incentivou e financiou pesquisas, fez doações valiosas, cedeu
sala no Paço Imperial para sede do Instituto, em seus passos iniciais, e presidiu
mais de 500 sessões. (IHGB)

O IHGB tinha como foco de orientação dos seus integrantes a organização de uma His-
tória Nacional pautada pelo ideal de unidade territorial e política. Sob a tutela do im-
perador, a tarefa da escrita da história era encarada como tarefa oficial e obra magna
intelectual.

O projeto imperial estava em elaboração de um perfil da nação brasileira que deveria


dotá-la de uma identidade nacional entre as mais diversas nações.

Como se pensar uma nação em processo de gestação com variados ele-


mentos étnicos?

O Brasil era uma sociedade marcada pelo trabalho escravo, pela presença das popula-
ções indígenas e com uma população marcadamente mestiça e, no entanto, os historia-
dores do IHGB imaginavam um Brasil refletido no espelho civilizatório europeu.

28
Como afirmamos anteriormente, é no mesmo movimento de definição
da Nação brasileira que se está definindo também o outro em relação a
ela. Movimento de dupla face, tanto para dentro quanto para fora. Cabe-
-nos, aqui, perguntar quem é definido como o ‘outro’ desta Nação, seja no
plano interno, seja no plano externo. (GUIMARÃES, 1988)

Pensar uma nação nesse contexto do século XIX, em pleno regime monárquico, diz res-
peito à idealização de uma nação predominantemente branca gestada no campo restrito
do universo de letrados.

O IHGB perpassa um duplo projeto de leitura da história e elaboração da na-


ção inserida no contexto de tradição civilizatória e progresso, ideário central
para o iluminismo. A nação pensada pelo projeto do IHGB deveria ser uma
civilização branca e europeia.

O processo de formação da nação no século XIX tem relação intrínseca com os efeitos
do processo revolucionário na Europa. Entre a consolidação do estado nacional pós-inde-
pendência e a gestação da nação como unidade territorial, haveria uma lacuna de quase
um século. Paralelamente, essa dinâmica histórica abarca o prolongamento da escravi-
dão e a permanência da monarquia.

Dessa maneira, podemos abordar os diversos nacionalismos em curso ao longo do im-


pério que singularizava as propostas inerentes ao romantismo, ao IHGB, aos abolicionis-
tas e outros ideários em curso.

Havia um projeto central que tendia a cancelar as iminentes possibilidades de risco de


fragmentação como havia ocorrido na experiência hispano-americana. A economia sus-
tentada pelo café havia consolidado um mercado interno bem antes do projeto nacional
ter se firmado.

Mesmo tendo se divorciado de uma possível associação popular, o projeto nacional as-
sumia como prioridade máxima o nacionalismo na América e a integridade territorial.
Sem assumir o povo no projeto nacional, o ideário de nação se apoiava na elite ociosa da
manutenção de uma hierarquia social baseada na liberdade em contraponto ao cativeiro.

29
O curioso é que o Brasil não teria que firmar a unidade nacional com base na variante da
existência de um inimigo externo. Apesar dos inúmeros conflitos externos ao longo do pe-
ríodo monárquico, como a Guerra da Cisplatina e a Guerra do Paraguai, o orgulho nacional
foi explorado por meio do apego ao território e das características internas do “povo”.

A exaltação da mestiçagem como marca histórica da experiência nacio-


nal aparece na produção intelectual do século XIX.

Por fim, embora algumas interpretações racialistas insistissem nas visões negativas
acerca da experiência da mestiçagem, essa marca da brasilidade seria retomada inúme-
ras vezes. A tarefa de construir a ideia de nação brasileira seria um projeto não só ideoló-
gico, mas especialmente político, encaminhado pelo Estado monárquico e retomado em
diversas outras conjunturas históricas ao longo da trajetória histórica brasileira.

MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 1 e conheça o conteúdo indicado pela professo-


ra sobre a modernidade na América Latina.

NA PRÁTICA

Vamos refletir sobre o nacionalismo e a identidade nacional na sociedade


contemporânea. Supondo que você encontre um refugiado/imigrante no
Brasil, como você identifica essa identidade nacional? Que perguntas faria a
esse imigrante?

Alguns historiadores refletem sobre em que medida o nacionalismo poderia


despertar um sentimento comum a todas as pessoas que se identificavam
com sua nação e vivenciavam sentimentos de pertencimento. Transfira isso
para o contemporâneo. Observe os contextos em que podemos perceber a
emergência das experiências nacionalistas.

30
Resumo da Unidade 1

Podemos entender o nacionalismo como um conceito que define uma experiência histó-
rica baseada em um tipo de narrativa que pressupõe a existência de um começo, meio e
fim, cuja linearidade encaminha o movimento por meio do progresso e que o seu ápice
é projetado no tempo futuro. A narrativa é a forma mais adequada dos tipos de relatos
históricos em que o elemento nacional fornece as fronteiras, enquanto a principal trama
histórica narra o surgimento, a expansão e o sucesso dos movimentos nacionais. Ao
definirmos o nacionalismo como um fenômeno moderno, o conceito precisa levar em
conta as doutrinas, as políticas de Estado e os sentimentos de pertencimento. Quanto
mais a modernização política se torna solidamente desenvolvida, mais intensamente são
constituídas as oposições nacionalistas. As três experiências nacionalistas podem ser
levadas em conta no interior da perspectiva comparativa inserida na temporalidade.

CONCEITO

Se a língua e a cultura não são demarcadores dos princípios nacionalistas, pelo


menos estabelecem critérios de integração. Os ideários nacionalistas de ordem
étnica, fundamentados em questões de raça, etnia, parentesco, língua ou cultu-
ra comum, estiveram presentes no período contemporâneo.

A nação pode ser vista como um sistema de significação cultural ou como uma
narrativa portadora de fronteiras culturais.

31
Referências

ANDERSON, B. Comunidades imaginadas, reflexões sobre a origem e a difusão do


nacionalismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.

BAUER, O. A nação. In: BALAKRISHNAN, G. Um mapa da questão nacional. Rio de Janei-


ro: Contraponto, 2000.

BALAKRISHNAN, G. Um mapa da questão nacional. Rio de Janeiro: Contraponto, 2000.

DOYLE, D.; PAMPLONA, M. A. (org.) Nacionalismo no Novo Mundo: a formação dos es-
tados-nação no século XIX. Rio de Janeiro: Record, 2008.

FRIZZO, F. Uma história do pensamento histórico do século XIX. Curitiba: Intersaberes,


2019.

GELLNER, E. Dos nacionalismos. Lisboa: Teorema, 1994.

GUIMARÃES, M. L. S. Nação e civilização nos trópicos: o IHGB e o projeto de uma história


nacional. Revista Estudos Históricos, v. 1, n. 1, 1988.

HOBSBAWM, E.; RANGER, T. A invenção das tradições. São Paulo: Paz e Terra, 1984.

HOBSBAWM, E.; RANGER, T. Nações e nacionalismos desde 1780: programa, mito e


realidade. São Paulo: Paz e Terra, 1990.

INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO BRASILEIRO – IHGB. Fundação do instituto.


Disponível em: https://www.ihgb.org.br/ihgb/historico/fundacao-instituto.html. Acesso
em: 20 set. 2019.

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Contexto, 2007. Biblioteca Virtual.

MIGNOLO, W. D. Histórias locais, projetos globais, colonialidade, saberes subalternos

32
MIGNOLO, W. D. (org.) Capitalismo y geopolítica del conocimento: el eurocentrismo y la
filosofia de la liberación en el debate intelectual contemporâneo. Buenos Aires: Ediciones
del Signo, 2001.

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TULCHIN, J. S. América Latina × Estados Unidos: uma relação turbulenta. São Paulo:
Contexto, 2016.

33
UNIDADE 2

Populismos e projetos de
modernização na América
INTRODUÇÃO

Esta unidade pretende caracterizar a América anglo-saxônica na perspectiva do desen-


volvimento dos nacionalismos e da limitação da cidadania nos anos 1920 e 1930. Além
da Crise de 1929 e de suas respectivas consequências sociais, políticas e econômicas,
pretende-se desenvolver uma análise dos respectivos projetos modernizantes na América
espanhola e no Brasil. No contexto de modernização, identificamos alguns dilemas políti-
cos que acompanham os modelos populistas inerentes à trajetória histórica da América
espanhola e do Brasil. Entendemos que as experiências populistas e caudilhistas fazem
parte desse contexto histórico da América espanhola e, no caso do Brasil, identificamos
experiências de transição de um modelo econômico agrário-exportador para uma eco-
nomia industrial com crise de mandonismo local.

OBJETIVO

Nesta unidade você será capaz de:

• Reconhecer aspectos históricos relativos aos populismos e os respectivos pro-


jetos de modernização no continente americano a partir das últimas décadas do
século XIX.

35
Projetos de modernização e Guerra Fria na
América anglo-saxônica

Neste tópico, abordaremos os aspectos históricos inerentes aos contextos de moderni-


zação na América anglo-saxônica. Vamos começar!

Os anos de 1920 nos EUA representaram um período de relativa prosperidade e,


simultaneamente, de expressivo conservadorismo, com o contexto de repressão aos
movimentos sociais, abandono das reformas e encolhimento do Estado na gestão da
questão social.

A sociedade norte-americana se deparava com o paradoxo da prosperi-


dade econômica acompanhada de um otimismo na sociedade de consu-
mo e em uma gestão liberal frágil.

A Crise de 1929 e uma fraca perspectiva de resolver o descontrole da economia promo-


veram uma cultura de protestos sociais que questionava a desenfreada emergência de
uma sociedade de consumo e a respectiva cultura de massa.

A riqueza econômica e o A concentração de renda


O consumo se tornou um
poder político incentivaram atrofiou o desenvolvimento
critério de cidadania.
uma desigualdade. em escala macro.

Grande parte da população americana vivia no campo nos anos de 1920.

Havia excedente de produção em decorrência da tecnologia. As posições econômicas


dos governos americanos de 1920 a 1932 eram marcadas pela defesa do livre mercado,
pelo favorecimento da classe empresarial e pelos limites da intervenção do Estado. A
especulação financeira tornou-se um setor lucrativo e ampliado.

36
Em 1924, foi criada uma lei da imigração que limitava a entrada nos EUA a 150.000
imigrantes por ano, estabelecendo cotas raciais e étnicas como critério de entrada. Eu-
ropeus e asiáticos eram limitados com base em uma nova definição de cidadão com
critérios excludentes e racistas.

Os loucos anos 1920!

Definia-se um americanismo nacionalista que se pautava por um moralismo chauvinis-


ta e xenófobo. Mesmo com esse clima sufocante de controle intelectual e cultural, os
anos de 1920, conhecidos como anos loucos, foram caracterizados como um período
de uma gama de mudanças sociais e econômicas com manifestações de protestos
social e cultural.

Nesse período, o movimento de contenção da “sociedade moderna” perpassou uma lei


seca que proibia a venda de álcool, o que acabou fortalecendo o crime organizado com
a elaboração do mercado negro.

Nesse mesmo contexto, temos o renascimento do supremacismo branco e protestante


com a retomada da Ku Klux Klan – KKK, instituição que pregava o ódio e a violenta coer-
ção com a segregação de negros, imigrantes e grupos feministas e socialistas.

37
Curiosidade

A Ku Klux Klan – KKK foi uma organização racista secreta que nasceu no final
do século XIX nos Estados Unidos. Ela foi fundada em 1866, no Tennessee,
como um clube social que reunia veteranos confederados, ou seja, soldados
que haviam lutado pelos estados do Sul, o lado derrotado na Guerra Civil Ameri-
cana (1861-1865). As duas palavras iniciais do nome da organização, “Ku Klux”,
aparentemente vêm da palavra grega kyklos, que significa “círculo”. Já o termo
“Klan” teria sido acrescentado para dar melhor sonoridade à expressão, além de
fazer uma referência aos velhos clãs, grupos familiares tradicionais. Muito mais
do que um clube, a KKK se transformou em uma entidade de resistência à polí-
tica liberal imposta pelos estados do Norte após a Guerra Civil, que assegurava,
entre outras coisas, que a abolição da escravatura fosse mesmo cumprida. Na
defesa da manutenção da supremacia branca no país, o grupo promovia atos
de violência e intimidação contra os negros libertados. Seus militantes adota-
ram capuzes brancos e roupões fantasmagóricos para esconder a identidade
e assustar as vítimas. A partir de 1870, o governo americano decidiu enfrentar
a organização, e, em 1882, a Suprema Corte do país declarou inconstitucional
a existência da KKK. “Ela parecia ter desaparecido durante os últimos anos da
década de 1880, mas foi revivida em meados do século XX”, diz a historiadora e
jornalista americana Patsy Sims, da Universidade de Pittsburgh.

Fonte: https://super.abril.com.br/mundo-estranho/o-que-foi-a-ku-klux-klan-ela-
-ainda-existe/.

O otimismo e a esperança deram lugar à quebra


da bolsa de valores norte-americana em outu-
bro de 1929.

A Crise de 1929 representou o pior colapso vi-


vido pelo capital mundial, com desdobramentos
além da fronteira norte-americana. Os especula-
dores tiveram prejuízos significativos, e os efei-
tos sociais foram sentidos até o início da Segun-
da Guerra Mundial.

38
Cinco mil bancos faliram e houve queda na produção industrial, diminuição do produto
interno bruto, além de declínio do poder aquisitivo da população em geral. O desemprego
ficou em torno de 20% ao longo de uma década, além da expressiva redução salarial.

Herbert Clark Hoover, que


serviu como o 31º Presiden-
te dos Estados Unidos entre O presidente H. Hoover subestimou a gravidade da crise, o
1929 e 1933. que promoveu seus alastramento e aprofundamento pelo
mundo inteiro.

O elemento central que havia provocado a crise se relacio-


na com:

• Falta de diversificação da economia americana.


• Distribuição da renda desigual com um mercado consu-
midor restrito.
• Dependência do capital financeiro em relação aos em-
préstimos contraídos.
Fonte: www.britannica.com.

Os devedores em uma conjuntura de crise não conseguiram honrar seus compromissos,


gerando a quebradeira (falência) dos bancos. A especulação descontrolada representou
a causa imediata da crise sem precedentes na história mundial.

As condições de vida estiveram próximas da miséria social. O desemprego paralisou a


vida econômica de inúmeras cidades, alterando o perfil familiar, desmembrando casa-
mentos e produzindo um efeito decrescente nas taxas de fecundidade.

Franklin Delano Roosevelt,


As eleições de 1932 demonstraram uma larga insatisfa- popularmente conhecido como
ção com a gestão de H. Hoover, o que ajudou a promover FDR, foi um estadista e líder
político americano que serviu
a ascensão de F. D. Roosevelt, candidato do Partido De- como o 32º Presidente dos
mocrata. O presidente recém-eleito admitiu a interven- Estados Unidos de 1933 até
sua morte em 1945.
ção estatal com o intuito de reduzir a crise econômica e
minimizar os conflitos sociais.

Entre 1933 e 1934, promoveu o “New Deal”, um conjunto


de medidas que visava:

• A recuperação industrial e agrícola.

Fonte: www.historyextra.com.

39
• O controle do sistema financeiro.
• O empreendimento de obras públicas associadas à assistência social.

O esforço do Estado para reanimar a economia passava pela criação de um sistema de


previdência, pela geração de empregos públicos e por um planejamento de obras além
do subsídio da construção civil.

Fonte: www.estudopratico.com.br.

O segundo “New Deal” de 1935 ampliava programas de assistência social emergencial,


taxava as grandes fortunas e incentivava a sindicalização, inspirado no welfare state (es-
tado de bem-estar social) das primeiras experiências europeias.

O “New Deal” norte-americano não recuperou a economia integralmente nem redistribuiu


renda, mas promoveu algum grau de segurança econômica.

A aliança do Partido Democrático com os imigrantes e os sindicatos, além da distri-


buição dos serviços públicos, como eletricidade e previdência emergencial, muda o
perfil do Estado norte-americano. O sistema de seguridade social estava limitado pelo
emprego assalariado formal urbano, excluindo os trabalhadores do campo e os empre-
gados domésticos.

40
A “ameaça vermelha”. A década de 1930 é chamada de década vermelha por
esforços persistentes de sindicalistas e radicais, es-
pecialmente do Partido Comunista norte-americano.

Nos primeiros anos da repressão, houve greves enor-


mes sob a liderança de base e socialistas ou comu-
nistas. Com o presidente Roosevelt, foi implementada
a política da boa vizinhança, que pretendia finalizar as
intervenções na América Latina (política do big stick)
para estabelecer relações econômicas mais próximas.

Roosevelt organizou vários acordos comerciais com


os países latino-americanos e amplos investimentos
na região. Houve uma montagem de suporte finan-
Fonte: www.cafehistoria.com.br. ceiro e de logística direcionado para a América Latina
com o intuito de garantir a influência nas esferas políti-
ca, econômica e cultural, e esvaziar a ingerência do eixo na América Latina.

A Segunda Guerra encerrou a depressão e o desemprego, e conseguiu ampliar o PIB,


alterando a vida de muitos trabalhadores.

O final da Segunda Guerra representou para os EUA uma centralidade militar e o cresci-
mento econômico. No contexto da Guerra Fria, os Estados Unidos empreenderam uma
política fortemente anticomunista que resultou em patrulhamento e perseguição ideo-
lógica contra as vozes dissidentes.

Os EUA representaram um percentual majoritário de investimento, produção indus-


trial e exportações no mundo.

O crescimento econômico demandava estabilidade política interna e externa. O governo


de Truman abandonava as reformas sociais, favorecendo uma aliança entre empresas,
Estado e militares com limitados avanços sociais para a classe trabalhadora.

41
Curiosidade

Harry S. Truman foi o 33º presidente dos Estados Unidos, o último que con-
correu com Franklin D. Roosevelt em 1944. Truman assumiu a presidência em
1945 após o falecimento de Roosevelt.

A “paz formal” entre EUA e URSS, os movimentos populares e o fantasma do potencial


nuclear resultaram em largos investimentos na militarização da economia americana. A
intervenção dos EUA na Coreia no início dos anos de 1950 representou uma prevenção.
A ideia era prevenir e impedir a influência do Partido Comunista da China na Ásia. Ao se
utilizar da retórica do anticomunismo, os EUA mantiveram os países latino-americanos
sob a influência ocidental por meio da invasão, da elaboração de golpes e do apoio a
governos autoritários e impopulares.

A histeria anticomunista denominada macarthismo investiu na censura e no patrulha-


mento contra intelectuais, artistas e funcionários do governo federal. A década de 1950
representou não só o desenvolvimento da sociedade de consumo, como o início do
cenário de luta pelos direitos civis dos negros.

MIDIATECA

Para ampliar o seu conhecimento veja o material complementar da Unidade 1


disponível na midiateca.

42
Populismos na América espanhola

Neste tópico abordaremos os aspectos históricos relativos aos populismos e ao caudi-


lhismo na América espanhola.

A crise do liberalismo que havia emergido no entreguerras fomentou a disseminação


do pensamento antiliberal que defendia a necessidade da presença de um Estado
centralizador.

Na América espanhola, as revoltas populares iniciaram-se a partir da independência, e,


nos anos de 1920, a questão social ganhou uma centralidade e foi enquadrada por gover-
nos com tendências autoritárias que temiam o poder popular. Alguns dirigentes olhavam
para as ideias liberais e as consideravam inadequadas para a realidade latino-americana.

O antiliberalismo ganhou espaço atrelado a uma política de massas que se esforçaria por
impedir uma revolução popular: o chamado avanço do comunismo.

43
Estado forte legislação social beneficiária de uma parcela da classe trabalhadora
modelo de governo.

Os modelos latino-americanos em destaque poderiam ser ilustrados pelo:

• Varguismo no Brasil.
• Peronismo na Argentina.
• Cardenismo no México.

A cultura política populista se manifesta por meio de uma cultura política originária em
uma intervenção de Estado e novas formas de controle social.

O que precisa ser ressaltado é que a condição de precariedade econô-


mica da maioria da população gera massas disponíveis que não atuam
motivadas por interesses coletivos e, portanto, são facilmente manipu-
láveis por líderes “personalistas” e/ou “carismáticos”. Ao mesmo tempo,
é preciso enfatizar que esse comportamento massificado, considerado
anômalo pelas ciências sociais, é, de fato, um comportamento racional
em virtude das circunstâncias em que ocorre. Instituições formais de
mediação política, quando ineficientes e combinadas com as condições
econômicas precárias da população, geram relações sociais que ope-
ram por meio de redes clientelísticas, nas quais os eleitores trocam seu
apoio eleitoral por favores e pela obtenção de serviços essenciais. (BA-
QUERO, 2010)

O conceito de populismo na América Latina derivou fenômenos muito distintos e pode


ser ilustrado pelas experiências de Lázaro Cárdenas, que ocupou a presidência da repú-
blica no México de 1934 a 1940, e Juan Domingos Perón, que exerceu dois mandatos
entre 1946 e 1955. Reconhecemos na teoria da modernização:

• Identidade nesses movimentos de transição de uma sociedade tradicional para a


moderna.
• Uma inconsistência da organização operária e da ideologia autônoma.

44
Saiba mais

O termo “populismo”, como conceito teórico, é um dos temas mais polêmicos


da ciência política latino-americana. Nas décadas de 1930 e 1950, produziu-se
no panorama político da América Latina uma mudança significativa no que diz
respeito às orientações políticas dos governos da época. Surgia, nesse período,
uma nova modalidade de governo — o populismo. Alguns autores continuam a
insistir em definir o populismo em termos de sua base social e econômica de
apoio, enquanto outros enfatizam seu conteúdo ideológico ou estratégia de dis-
curso. Entretanto, o fato é que o termo tem sido aplicado a um amplo conjunto
de líderes e movimentos, enquanto alguns autores questionam se o populismo
é realmente um fenômeno único e distinto. A palavra “populismo” também foi
utilizada para identificar certos movimentos políticos e até determinados tipos
contemporâneos de Estado no chamado Terceiro Mundo. Em uma retrospecti-
va histórica conceitual sobre o populismo na América Latina, estudos revelam
divergências em relação a seu significado. Por exemplo, Weffort (1978) consi-
dera o populismo uma ideologia da pequena burguesia. Já para Saes (1976),
o populismo é visto como a ideologia das camadas médias urbanas. Outros
estudiosos o têm analisado em termos de situação e estrutura social e de supe-
restrutura ideológica. Também vem sendo caracterizado como um movimento
político, uma síndrome, uma resposta às crises do desenvolvimento e sinônimo
de nacionalismo.

BAQUERO, M. Populismo e neopopulismo na América Latina: o seu legado nos


partidos e na cultura política. Soc. e Cult., Goiânia, v. 13, n. 2, p. 181-192, jul./
dez. 2010.

Os movimentos sociais e políticos são entendidos:

Como reflexos mecânicos das alterações socioeconômicas. Nesse con-


texto, discute-se a autonomia ou a heteronomia das classes sociais em
relação ao Estado.

45
Estudar as relações entre classe trabalhadora, Estado e classes dominantes é importan-
te. Vamos entender o porquê! Observe um exemplo:

Exemplo

• Na Argentina, a produção industrial se tornou expressiva após a Crise de 1929.


• O número de operários duplicou nos anos de 1930 e 1940.
• As taxas de adesão ao sindicalismo cresceram exponencialmente, com ex-
pressiva adesão ao comunismo.
• Juan D. Perón foi um incentivador do sindicalismo nos moldes da existência
da unicidade sindical. O Ministério do Trabalho era responsável pela outorga
das autorizações.

Na estrutura política centralizada pelo governo, os trabalhadores sindicais possuíam pro-


teção e respaldo do Estado, além da garantia da aplicação das leis sociais e uma política
de bem-estar social. A centralização sindical pelo Estado acabou se desdobrando em
um viés autoritário de sublimação de qualquer tipo de oposição. Os benefícios materiais
eram inegáveis, porém com um custo de retrocesso da ampla liberdade sindical e elabo-
ração de qualquer oposição ao regime.

O discurso peronista era antecipatório das demandas dos traba-


lhadores e possuía propostas de alcance imediato. A linguagem
era simples, direta e emotiva, sempre procurando abordar temas
cotidianos, prosaicos, e propunha melhoras para reverter a desi-
gualdade social entendida como natural.

No entanto, temos outros olhares de teóricos:

• Alguns apostam na leitura da origem agrária dos trabalhadores urbanos, o que ex-
plica a limitada capacidade política de articulação e a imatura consciência de classe.
• Outros fazem uma leitura da coexistência de traços tradicionais e modernos na
organização das massas.

46
• Algumas leituras mais contemporâneas insistem em uma abordagem mais vol-
tada para a representação do trabalhador como protagonista, e não como massa
cooptada, manipulada como se fosse um ator passivo nas relações com o Estado
beneficiário. O trabalhador integra uma classe social assimilando as relações so-
ciais e políticas.

O movimento peronista releu a noção de cidadania na Argentina nos anos de 1930 com
ênfase no caráter autoritário do regime.

O indivíduo estava limitado pela deman- Os sindicatos seriam vistos como ins-
da dos direitos trabalhistas, e o Estado trumentos do Estado para organizar a
cerceava os direitos políticos mais massa na perspectiva do controle social
amplos. e político.

O paradoxo do peronismo pode ser ilustrado pela efetiva ampliação da cidadania e dos
direitos sociais, mas junto com a introdução do controle social e de um viés autoritário.

Cardenismo

O cardenismo no México também é lido como uma expe-


riência clássica de populismo. A Revolução Mexicana co-
meçou em 1910 e prolongou a luta armada até 1917.

O governo Cárdenas (1934-1940) representou a perspec-


tiva da consolidação dos ideais da revolução, entre eles:

• A legislação trabalhista.
• A reforma agrária.

Os conflitos políticos da década de 1920 adiaram as reformas previstas na constituição.

Alguns autores operam na leitura da ambiguidade de Cárdenas na medida em que a lide-


rança atuou promovendo as liberdades políticas e os direitos sociais, mas encaminhou
as bases sociais do autoritarismo.

A ideia seria converter o capitalismo liberal no capitalismo social com


princípios de regulação econômica.

47
Cárdenas criou uma nova cultura política com:

• A inversão das relações entre público e privado.


• A inversão entre o social e o civil.
• A conversão do espectro de representação dos interesses no Estado e no governo.
• A reafirmação da necessidade de limitar a grande propriedade rural.

Esse processo estava imbricado no debate iniciado com a Revolução Mexicana.

Nesse contexto histórico, houve a reforma industrial, que passava por três eixos:

Consolidação
das redes
sindicais

Política Previdência
industrial social

A política industrial pressupunha a expropriação nos setores petrolífero e ferroviário. O


cardenismo, além de representar a promoção das reformas agrária e industrial, significou
um intervencionismo na economia em uma esfera maior do que o espírito conciliatório
dos empresários poderia admitir.

Sua política externa demonstrou resistências: ao fascismo, à frente popular, à invasão


italiana na África, à invasão do Japão à China e à própria vitória do franquismo na Guerra
Civil Espanhola.

O México de Cárdenas recebeu muitos republicanos de esquerda emigrados da Espanha


franquista.

Houve um significativo aumento do papel do Estado e as organizações populares se


transformaram no elemento importante de pressão e capitalização da questão social.

48
Esse regime promoveu alterações como:

• Reformas agrária e trabalhista.


• Nacionalização da exploração do petróleo.
• Reorganização da burocracia política.

No caso mexicano, a liberdade política esteve mais presente do que na Argentina, embo-
ra devamos considerar que a máquina burocrática do Estado autoritário foi gestada no
governo cardenista.

É necessário lembrar que a agenda de realizações trabalhistas não foi inaugurada pe-
los regimes populistas da Argentina e do México. A cultura política inaugurada por
esses regimes associava direitos sociais e trabalhistas com políticas autoritárias de
controle social.

MIDIATECA

Para ampliar o seu conhecimento veja o material complementar da Unidade 1


disponível na midiateca.

49
Populismos e modernidade na América
portuguesa

Neste tópico reconheceremos traços históricos dos projetos de modernização incorpo-


rados pelo Estado a partir do século XIX, além de identificar uma especificidade política
do populismo na América portuguesa.

Podemos identificar a origem do conceito de populismo no processo da entrada de Var-


gas no poder, o que nos remete aos confrontos políticos inerentes ao contexto da república.

Foto: CPDOC/FGV

Para F. Weffort, o populismo pode ser lido como um estilo de governo sensível a uma
política de massas que deve ser entendido em um contexto de: crise política e do man-
donismo local associado a um desenvolvimento econômico que se inaugura contextual-
mente com a Revolução de 30.

Na Era Vargas, o populismo se confundia com o trabalhismo por meio da


ideologia da outorga.

50
A crise da oligarquia e o advento do liberalismo foram vividos no âmbito do autoritarismo,
tanto em sua acepção institucional como vinculado a um personagem expressivo, caris-
mático e paternalista. A temporalidade do populismo segundo Weffort obedece a uma
primeira etapa, que seria marcada pela origem do populismo e pelo tempo da consolida-
ção da república populista (1945-1964), no âmbito da redemocratização.

Com a crise do liberalismo oligárquico, surgiu uma necessidade de ampliação das bases
sociais do poder do Estado.

Nesse contexto de leitura do fenômeno do populismo, as massas exercem papel pas-


sivo, sendo objeto de cooptação/manipulação em uma imbricada relação entre Esta-
do e bases populares.

As camadas populares seriam vistas como massa de manobra, estabelecendo uma de-
pendência reduzida com o tempo no processo de amadurecimento da democracia e de
uma cidadania mais ativa.

Havia um debate inerente à questão da relação de classe/estado sobre a heteronomia ou


autonomia das classes populares.

A década de 1950 aparece como um contexto clássico e intenso do pacto populista


pelo fato de cenários de pressão popular se constituírem com mais expressividade. No
campo, isso fica mais claro com as ligas camponesas lideradas por Francisco Julião
no Nordeste.

A redemocratização contou com uma maior participação das massas urbanas no ce-
nário político. O movimento operário recrudesceu buscando novas formas de represen-
tação. O governo Dutra consolidou uma aliança conservadora imprimindo uma atuação
repressora direcionada ao movimento operário, com intervenção dos sindicatos.

A volta ao poder
1951-1954

51
O segundo governo Vargas, eleito pela força do voto e pela representatividade legitima-
da pelos trabalhadores urbanos sindicalizados, reforçou a organização das massas. O
nacionalismo e o reformismo sindical reforçavam a expressividade cada vez maior dos
movimentos sociais e suas manifestações.

As frequentes greves dos trabalhadores, as bandeiras nacionalistas, a mobilização da


opinião pública a favor das reformas de base, entre elas a reforma agrária, a consolidação
dos direitos sociais e a mobilização política no campo com as ligas camponesas conso-
lidavam um cenário de democracia.

Governo Jango

O governo Jango empreendeu discursos favoráveis à realização das reformas de base e


produziu comícios para anunciar sua plataforma.

O governo Goulart, pelas condições em que se estruturou e por condicio-


nar, por ação ou omissão, o conjunto do movimento que emergia, apre-
sentava as reformas de base como uma de suas principais orientações.
Precipitava-se a crise final do “regime populista”; se até então as massas
tinham servido como fonte de legitimidade para o Estado, isto só era
possível enquanto estivessem contidas dentro de um esquema de alian-
ça policlassista, que as privava de autonomia. Agora, crescia uma mobili-
zação popular que, embora muitas vezes dependesse da iniciativa do Es-
tado, tendia a superar os limites institucionais vigentes. (CPDOC – FGV)

O governo de Jango foi execrado pela direita e esvaziado pela esquerda, ou seja, o iso-
lamento político seria um desdobramento do compromisso social que desagradava os
grandes proprietários, a burguesia industrial e os interesses estrangeiros. O capital nor-
te-americano, mediante a operação “Brother Sam”, estava interessado em apoiar o golpe
civil-militar de 1964.

52
Saiba mais

A operação “Brother Sam” foi articulada entre militares e civis de direita tendo
o apoio americano por meio do diplomata Lincoln Gordon e da CIA. Como não
houve resistência aos militares, a operação não precisou sair de solo americano.

No final da década de 1970, os documentos sobre a operação foram desco-


bertos pela historiadora Phyllis Parker, que a trouxe a conhecimento público.
No final daquela mesma década, diante dos horrores dos anos de chumbo e
do caminho tomado pela ditadura no Brasil, o governo norte-americano e o
próprio diplomata, Gordon, declararam-se chocados com os rumos tomados
pelo movimento de 1964.

Fonte: https://www.infoescola.com/ditadura-militar/operacao-brother-sam/.

Em refutação ao nacionalismo reformista, as classes dominantes optaram por uma mo-


dernização conservadora com um processo excludente que impunha um desencontro
entre direitos sociais, civis e políticos.

Saiba mais

Portanto, dos anos 1940 aos 1960, o populismo teria como que duas faces ab-
solutamente indissolúveis: a econômica, traduzida pelo processo de industriali-
zação em curso, reconhecido como exitoso, no país; e a política, mais complexa
e ambígua em termos de diagnósticos, materializada pela experiência de demo-
cracia (relativa, porém ímpar), exemplificada pelos anos JK. O início da década
de 1960, com a emergência da figura do presidente João Goulart, o herdeiro de
Vargas, e de seus competidores, Leonel Brizola e Miguel Arraes em particular,
eleva o tom do debate, que, como todos os demais, sofrerá o impacto do movi-
mento militar de 1964. O fenômeno do populismo passa, então, a integrar, com
destaque, a nova agenda de investigações que visava responder a uma grande
e crucial questão: quais foram as razões do golpe? É nesse contexto intelectual
e político que uma associação fundamental é traçada: as causas do golpe deita-
riam raízes no esgotamento da experiência populista, que passa a possuir uma
clara periodização. Ela tem início em 1930, quando eclode o movimento militar
liderado por Vargas, e se conclui em 1964, quando do movimento militar que
depõe João Goulart. Dessa forma, tanto o tema como o período se transformam

53
em um imperativo de pesquisa na área das ciências sociais. De 30 a 64, vive-se
o “ciclo populista”, e esse adjetivo passa a se estender a diferentes substantivos.
GOMES, A. C. O populismo e as ciências sociais no Brasil: notas sobre a trajetória
de um conceito. Tempo, Rio de Janeiro, v. 1, n. 2, p. 31-58, 1996.

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NA PRÁTICA

Quando reconhecemos alguns fenômenos relacionados ao populismo, pensa-


mos em governantes carismáticos e populares, com uma estrutura política de-
finida pelo Estado de compromisso.

Vamos pensar em exemplos atuais que poderiam se enquadrar nesse estudo


de caso?

Este deve ser pensado como um Estado de massas, expressão da prolongada


crise agrária, da dependência social dos grupos de classe média, da dependên-
cia social e econômica da burguesia industrial e da crescente pressão popular.

Vamos pensar em um governante populista? Podemos pensar em uma lideran-


ça atual com o perfil do carisma, do controle das massas?

É muito comum no contemporâneo o populismo estar associado a governos de


extrema direita, como o governo Trump, nos EUA, ou de Orban, na Hungria. E no
contexto latino americano? Podemos pensar no governo do Maduro na Venezuela.

54
Resumo da Unidade 2

Esta unidade apresenta os fenômenos relacionados ao populismo nos contextos da


América espanhola e do Brasil. Esse fenômeno está imbricado no processo de desen-
volvimento de uma política de massas, além do desenvolvimento de uma modernidade
centralizada pelo Estado. No caso da América espanhola, isso pode ser atrelado a um
modelo autoritário inerente ao caudilhismo. Nos EUA, o processo de modernização é
atravessado por uma crise econômica severa nos anos de 1920 e 1930, o que mobiliza o
desenvolvimento de um modelo de estado de bem-estar social (welfare state) inspirado
nas sociais democracias na Europa.

CONCEITO

Podemos definir o populismo por uma política de massas que se associa a


uma progressiva proletarização dos trabalhadores em uma sociedade inserida
no processo de modernização, oferecendo um indicativo de uma precária cons-
ciência de classes e de um alargamento do Estado e de sua ampla mediação
no campo das ações políticas vinculadas à questão social. Esse conceito pres-
supõe uma trajetória teórica e a inserção empírica histórica diferenciada nos
contextos da América espanhola e do Brasil.

55
Referências

BAQUERO, M. Populismo e neopopulismo na América Latina: o seu legado nos partidos e


na cultura política. Soc. e Cult., Goiânia, v. 13, n. 2, p. 181-192, jul./dez. 2010.

FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS. CPDOC. Verbete temático “Populismo”. Disponível em:


http://www.fgv.br/Cpdoc/Acervo/dicionarios/verbete-tematico/populismo. Acesso em: 8
out. 2019.

FERREIRA, J. (org.). O populismo e sua história: debate e crítica. Rio de Janeiro: Civiliza-
ção Brasileira, 2001.

GOMES, A. C. O populismo e as ciências sociais no Brasil: notas sobre a trajetória de um


conceito. Tempo, Rio de Janeiro, v. 1, n. 2, p. 31-58, 1996.

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das origens ao século XXI. São Paulo: Contexto, 2007. Biblioteca Virtual.

MAZZUCCHELLI, F. A crise em perspectiva: 1929 e 2008. Novos Estudos, Cebrap, São


Paulo, n. 82, nov. 2008.

MIGNOLO, W. D. Histórias locais - projetos globais: colonialidade, saberes subalternos


e pensamento liminar. Belo Horizonte: UFMG, 2003.

MIGNOLO, W. D. (org.) Capitalismo y geopolítica del conocimiento. El eurocentrismo y la


filosofia de la liberación en el debate intelectual contemporáneo. Buenos Aires: Ediciones
del Signo, 2001.

NAPOLITANO, M. História do Brasil República: da queda da Monarquia ao fim do Estado


Novo. São Paulo: Contexto, 2016.

PRADO, M. L. História da América Latina. São Paulo: Contexto, 2014.

PINSKY, J. et al. História da América através de textos. 11. ed. São Paulo: Contexto,
2010.

56
QUIJANO, A. Dom Quixote e os moinhos de vento na América Latina. Dossiê América
Latina. In: Revista Estudos Avançados do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP,
São Paulo, v. 19, n. 55, p. 9-31, dez. 2005.

RINKE, S. História da América Latina: das culturas pré-colombianas até o presente. Por-
to Alegre: EdiPUCRS, 2017.

TODOROV, T. O medo dos bárbaros, para além do choque das civilizações. Petrópolis:
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TULCHIN, J. S. América Latina X Estados Unidos: uma relação turbulenta. São Paulo:
Contexto, 2016.

WEFFORT, F.. O populismo na política brasileira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.

57
UNIDADE 3

Militarização, ditaduras
e intervenções
INTRODUÇÃO

Nesta unidade pretendemos problematizar a trajetória histórica das intervenções mili-


tares e da gestação dos governos autoritários no contexto da América hispânica e da
América portuguesa. Para além da identificação dos mecanismos de repressão, vamos
analisar os meandros da montagem do aparato de censura e propaganda das ditaduras
ao longo dos anos 1960 e 1970, no Brasil e no resto da América Latina. No contexto dos
EUA, identificamos diversas rebeldias, rupturas e movimentos sociais que procuraram
romper com os governos representantes de uma política intervencionista característica
do contexto da guerra fria.

OBJETIVO

Nesta unidade você será capaz de:

• Identificar aspectos históricos peculiares a militarização, ditaduras e interven-


ções militares no continente americano, bem como ao desgaste e à crise da dita-
dura militar brasileira e suas propostas de abertura, redemocratização e recons-
titucionalização.

59
Autoritarismo e democracia na América
anglo-saxônica no contexto da guerra fria

O contexto dos governos democratas de J. Kennedy e L. Johnson (1960-1968) preten-


deram consolidar um projeto de estado de bem-estar social brando. Por outro lado, a po-
lítica externa dos seus governos foi marcada por um intervencionismo na Ásia, ilustrado
pela guerra do Vietnã, em um projeto desastroso de combate ao comunismo.

Por outro lado, as dificuldades de combate ao racismo acabaram por provocar a eclosão
de diversos movimentos sociais com o objetivo de empreender a luta pelos direitos civis.
As palavras de ordem eram: progresso, cidadania e liberdade.

Havia inegavelmente uma crise de autoridade e um paradoxo entre:

Uma preocupação Uma política belicosa,


norteadora com a intervencionista e
questão social conservadora no campo
internamente. da política externa.

60
A crise mundial do petróleo nos anos 1970, em decorrência do aumento do preço do
barril pela Organização dos Países Exportadores de Petróleo – OPEP, após a derrota dos
países árabes na guerra do Yom Kipur, impôs dificuldades para a promoção do cresci-
mento econômico mundial.

O assassinato de Kennedy em 1963, e sua mitificação no imaginário popular atenuou a


agenda liberal de sua gestão e sua política enfática de contenção do comunismo.

A gestão do presidente Johnson foi marcada por reformas sociais e econômicas que
envolveram iniciativas tais como os chamados programas da grande sociedade, que
mobilizaram esforços voltados para programas populares de saúde direcionados aos
idosos e desfavorecidos.

O objetivo era a redução da pobreza e a retomada


do crescimento econômico.

No pós-guerra o governo norte americano buscou:

• Subsídios para empresas de construção civil.


• Estímulos a aquisição da casa própria.
• Investimentos públicos direcionados para a construção de estradas e de infraes-
trutura, de modo a alterar o quadro geográfico da riqueza.

A decadência econômica norte americana nos anos 1970 enfraqueceu sua hegemonia
e a experiência dos anos dourados do capitalismo norte-americano no pós-guerra. A
dependência do petróleo do Oriente Médio atingiu a economia americana com força. A
recessão pós-crise do petróleo foi duramente sentida na sociedade americana, diminuin-
do a certeza da prosperidade do American way of life.

Os americanos tinham que manejar a ameaça do comunismo na América Latina e dire-


cionavam sua perspectiva expansionista e imperialista para Cuba, localizada a 200 qui-
lômetros da Florida.

A revolução nacionalista de 1959, que derrubou Fulgêncio Batista, se radicalizou em


1961 e optou pelo socialismo. Fidel Castro se aproximou da URSS por meio da consoli-
dação de vários acordos comerciais.

61
Quer conhecer mais um pouco sobre Revolução Cubana? Leia a reportagem abaixo.

Saiba mais

Revolução cubana

O movimento guerrilheiro liderado por


Fidel Castro, iniciado em 1956, tomou
o poder em Cuba em janeiro de 1959,
com a derrubada do governo ditatorial
do general Fulgêncio Batista e a no-
meação de Castro como primeiro-mi-
nistro. Apesar de uma acolhida inicial-
mente favorável dos EUA, as relações
entre o governo revolucionário cubano
e Washington se deterioraram ao longo dos anos de 1959 e 1960, primeira-
mente devido às reformas de caráter econômico e social adotadas pelo novo
governo, que afetavam diretamente os interesses econômicos norte-america-
nos na ilha. Além disso, Cuba iniciou um processo de aproximação econômica
e política com a URSS – o vice-presidente soviético Anastas Mikoyan visitou
Havana no início de 1960 e assinou uma série de acordos de comércio e ajuda
econômica entre os dois países, que se constituiu num desafio gravíssimo à
manutenção da América Latina como zona de influência dos EUA. O desafio
se torna ainda mais grave quando se considera a estratégica localização da
pequena ilha caribenha, tão próxima da costa da Flórida.

O conflito entre EUA e Cuba teria uma evolução dramática nos anos 1960, com
repercussões não apenas regionais, mas também internacionais. Os pontos
culminantes foram a tentativa fracassada de invasão da ilha, por parte de exila-
dos cubanos apoiados pela CIA, através do desembarque na Baía dos Porcos;
o bloqueio econômico de Cuba decretado pela OEA em 1962; e, finalmente, a
Crise dos Mísseis, em outubro de 1962, que quase levou a um confronto militar
direto entre EUA e URSS.

Alexandra de Mello e Silva


Fonte: cpdoc.fgv.br.

62
Nos anos 1960 e 1970 os EUA viviam um cenário onde importantes organizações políti-
cas negras atuavam em nome de mensagens de liberdade. Vários líderes se destacavam
nos protestos bem-sucedidos contra segregação nos estados do sul.

O expressivo e articulado líder Martin Luther King pregava a desobediência civil, um


mecanismo de resistência pacifista. Ao cultivar uma política fortemente religiosa e mo-
ral, recorria a valores americanos vinculados à liberdade e justiça social. Lutava-se
pelo fim do racismo e da discriminação nas escolas e universidades, em cinemas, ôni-
bus, ruas etc.

Desse conjunto de mobilizações surgiu o Comitê de Coordenação Não-Violenta integra-


do por estudantes e militantes, entre eles, S. Carmichael, Ella Baker e Bob Moses.

Os protestos se desdobraram no chamado verão da liberdade quando universitários


brancos e negros viajaram em conjunto rumo ao Sul com o objetivo de organizar um
movimento para que os negros do sul tirassem seus títulos eleitorais.

Paralelo ao movimento pela luta dos direitos civis dos negros, houve outros movimen-
tos, como:

• Movimento do índio americano.


• Movimentos pelos direitos dos latino-americanos nos EUA, para além dos desdo-
bramentos internacionais, como por exemplo a adoção, pelos católicos da Irlanda,
de várias expressões ou canções originárias do movimento negro norte americano.

63
O apogeu dos movimentos pela luta dos di-
reitos civis dos negros aconteceu em 1963,
quando realizou-se uma passeata denomi-
nada Marcha de Washington, que trouxe
até 200.000 participantes para aclamar Lu-
ther King e seu discurso centrado na ideia
“eu tenho um sonho”.

Esse movimento provocou uma reação conservadora por parte das autoridades políti-
cas, intelectuais de direita e cidadãos do sul, inconformados com os rumos da mudança
política e social. Lideranças foram assassinadas, militantes foram espancados e presos
em passeatas. Luther king falava em ação afirmativa para os negros pobres.

No governo Johnson, foram decretados vários atos legislativos proibindo discriminação


nos empregos, nos serviços públicos e nas eleições. Movimentos como o Black Power
(poder negro) surgiram na segunda metade da década agregando nacionalismo cultural
e luta combativa contra discriminação racial.

Os Panteras Negras defendiam a autodefesa armada para lutar contra a violência ar-
bitrária dos policiais contra a população negra. Paralelo ao movimento negro surgiram
vários movimentos sociais de protestos que questionavam a sociedade de consumo
norte-americana.

64
Militarização, ditaduras e intervenções: a
América espanhola

Os anos 1960 e 1970 marcam um alto grau de mobilização política em países como Ar-
gentina, Bolívia, Brasil, Chile, Equador, Peru e Uruguai, nos quais se articulavam sindicatos
e partidos de esquerda, ligas camponesas, a luta armada e o movimento estudantil.

Os golpes militares empreendidos nos anos 1960 e 1970 desmobilizaram esses setores
e movimentos sociais, além de terem implementado políticas sociais excludentes.

Exemplo

No Peru as forças armadas se aliaram às elites políticas e deram lugar à to-


mada de poder em 1968, derrubando o governo de Fernando Belaunde Terry.
O projeto visava o desenvolvimento integral da nação e a consolidação de re-
formas sociais. A visão organicista e tecnocrata atribuía ao Estado uma certa
neutralidade que visava esvaziar o caráter político das ações governamentais.

65
As ideologias eram vistas como antipatriotas. Uma preocupação no discurso e
na mentalidade era a questão da integração nacional.

Com o quadro de dependência econômica do Peru, as forças armadas defen-


diam a extinção da participação das companhias estrangeiras nos setores es-
senciais da economia e limites consideráveis à participação do capital estran-
geiro na economia.

Nos anos 1970, foi estabelecida uma lei geral das indústrias que definia o papel do
estado no desenvolvimento industrial e um controle mais estrito sobre a indústria
básica. O general Velasco Alvarado tinha como objetivo:

• Aumentar a renda dos trabalhadores.


• Envolver-se no processo de participação política.
• Construir um projeto de identidade nacional.
• Empreender reformas sociais substanciais.

Empresas foram nacionalizadas, entre elas algumas mineradoras, e grandes fazendas


açucareiras foram expropriadas, o que visou atingir o setor social das elites agrárias.

Em 1975, o general foi removido e substituído


pelo general Morales Bermúdez, que gover-
nou até 1980, quando acabou o regime militar. A
agenda reformista perdeu força e algumas plata-
formas foram deixadas de lado; nos anos 1980
surgiu o grupo guerrilheiro Sendero Luminoso,
de orientação maoísta, que empreendeu várias
Fonte: g1.globo.com. revoltas e ações violentas no território peruano.

O autoritarismo se fez experiência na Argentina nos anos 1960 e 1970. Houve um movi-
mento de neutralização das massas pelo peronismo. Entendia-se esse ímpeto popular
como uma ameaça à ordem nacional e à estabilidade política. No final da década de
1950, percebemos uma aproximação da esquerda com os diversos grupos peronistas.

Perón estava exilado na Espanha, após seu afastamento em 1955 e o peronismo am-
pliou suas posições sendo difícil definir apenas uma corrente.

66
Curiosidade

Juan Domingo Perón nasceu no dia 8 de outubro de 1895, em Lobos, província


de Buenos Aires, Argentina, filho de Mario Tomás Perón e Juana Sosa.

Ingressou no Colégio Militar de la Nación em 1911, saindo dois anos depois sub-
tenente de infantaria. Mais tarde, cursou a Escola Militar de Guerra, graduando-
-se em 1929. No ano seguinte, participou do golpe militar que derrubou o pre-
sidente Hipólito Yrigoyen, sendo designado secretário particular do ministro da
Guerra. Posteriormente, tornou-se professor titular de História Militar na Escola
Superior de Guerra. Adido militar na embaixada da Argentina no Chile em 1936,
três anos depois foi enviado à Itália em missão de estudos, onde especializou-
-se em infantaria de montanha. Regressou à Argentina em 1941.

Em 1943, depois de ter fundado o Grupo de Oficiais Unidos, Perón aderiu à


conspiração militar que derrubou o presidente Ramon Castillo. No novo gover-
no, chefiou o Departamento Nacional do Trabalho e Bem-Estar Social, vindo
a conquistar grande popularidade na classe trabalhadora, sobretudo entre os
mais humildes – os “descamisados” –, e os sindicatos.

Em outubro de 1945, Perón – que, naquele ano, se tornara vice-presidente e


ministro da Guerra – foi afastado dos cargos por um golpe civil e militar para
ser, em seguida, preso. Os trabalhadores organizaram uma greve geral em todo
o país e, comandados por Eva Duarte, companheira de Perón e líderes sindicais,
promoveram uma grande concentração diante da sede do governo, em Buenos
Aires, a fim de pressionar por sua libertação, em 17 de outubro. Os militares
não tiveram outra escolha senão libertá-lo. Naquela noite, Perón, em discurso
proferido perante 300.000 pessoas e retransmitido por rádio para todo o país,
disse que iria levar o povo à vitória na eleição presidencial e prometeu construir
uma nação forte e próspera. Dias depois, casou-se com Evita (apelido dado à
Eva Duarte pelos trabalhadores), que o ajudaria a governar o país nos anos se-
guintes, sobretudo na área social.

Perón venceu o pleito de 1946, obtendo 56 % dos votos. Ao longo do mandato,


nacionalizou as companhias de estradas de ferro, de telefone, e de gás e algu-
mas empresas de energia elétrica. Promoveu o desenvolvimento industrial e
garantiu o aumento da taxa de emprego e dos salários. Os trabalhadores rece-
beram importantes benefícios, como aposentadoria, férias pagas e assistência
médica. Reeleito em 1951, enfrentou sérios problemas durante o seu segundo

67
mandato presidencial. A morte de Evita em 1952, as dificuldades econômicas
e as reivindicações dos trabalhadores enfraqueceram sua posição e, em 1955,
ele foi deposto pelos militares, exilando-se no Paraguai. Mais tarde, instalou-se
na Espanha, onde, em 1961, casou-se com a ex-dançarina argentina Maria Es-
tela Martínez. Durante os anos de exílio, continuou exercendo um importante
papel na política argentina.

Perón retornou à Argentina em junho de 1973 e, em outubro, concorrendo pelo


Partido Justicialista por ele fundado, foi eleito mais uma vez presidente, tendo sua
mulher como vice. Contudo, não cumpriu o seu terceiro mandato até o fim. Já
doente, morreu em 1º de julho de 1974. Após sua morte, Maria Estela Martínez de
Perón assumiu a presidência, mas foi derrubada pelos militares em 1976.

Fonte: www.jdperon.gov.ar; www.historiadelpais.com.ar; www.easybuenosairescity.com.

Saiba mais: cpdoc.fgv.br.

Decorrente de uma vertente que acreditava na luta armada


como recurso para se defender da ditadura, formou-se o grupo
do Montoneros, que elaborou uma estrutura de guerrilha dizi-
mada pelos militares ao longo da ditadura iniciada em 1976.

Curiosidade

Os Montoneros tiveram sua primeira aparição na história em maio de 1970, com


o sequestro do general Pedro Eugenio Aramburu. Através de um comunicado,
reivindicavam a ação para essa organização até então desconhecida. Com a ale-
gação de que o regime pretendia recolocar Aramburu no poder para sustentar
uma vez mais uma falsa democracia e a entrega da Argentina ao imperialismo,

68
eles sequestravam esse antigo inimigo do peronismo, um dos líderes do movi-
mento que retirou Juan Domingo Perón em 16 de setembro de 1955 e presidiu a
Argentina nos anos seguintes. A complexidade da organização Montoneros está
na conjunção de elementos ideológicos que ela congregou. Tem-se o elemento
do cristianismo militante, que se aproximou dos ideais de esquerda através da
Teologia da Libertação e que, no contexto latino-americano, se radicalizou com a
visão de que a guerrilha seria a solução para o problema da pobreza, que muito
os tocava, inspirados pela figura de Camilo Torres, sacerdote colombiano que
morreu em 1966 com as armas em punho enquanto praticava a guerrilha arma-
da em seu país. Somado a isso tem-se o socialismo trazido pelo caso cubano,
não os levando a uma aproximação com o comunismo marxista clássico, ou à
ortodoxia do Partido Comunista Soviético, e sim à ação revolucionária imediata
através do foquismo, inspirado pela estratégia de Che Guevara. E, por último, o
elemento do peronismo, explicado pelo fato de as massas populares, a grande
maioria dos trabalhadores, enxergarem em Perón seu representante e salvador.
Por esta razão vão seguir esse clamor e defender o peronismo enquanto via ao
socialismo. O fato de Perón ter sido deposto em 1955 e substituído por um regi-
me militar claramente reacionário, somado ao imenso apoio popular de que ele
gozava, fez com que parcelas da esquerda fizessem uma autocrítica e enxergas-
sem na resistência peronista um caminho revolucionário.

Fonte: Martins (2018, p. 43-66).

As forças conservadoras vinham fragilizando a democracia na Argentina por meio de


uma movimentação participativa de forças armadas, igreja e empresários. Os militares
teriam uma trajetória inicial de apoio ao peronismo e, posteriormente, de derrubada e
fragilização dessa corrente antes apoiada.

Em 1962 voltaram a desestabilizar o poder do radical Arturo Frondizi e criaram um go-


verno de fachada que se prolongou até 1963 quando Arturo Illia, da União Cívica Radical,
vendeu as eleições.

Após Illia, Juan Carlos Ongania chegaria ao poder, iniciando a chamado Revolución
Argentina.

69
Intervenção das Instável e ineficaz
universidades política econômica

Dissolução Defesa do
dos partidos anticomunismo

Constituição Catolicismo
invalidada conservador
Revolución
Argentina

Suspensão do Visão organicista


estado de direito da sociedade

A reação popular foi violenta e gerou profunda divisão nos grupos de apoio ao governo.
Perón voltou do exílio da Espanha e recuperou a popularidade apoiando o governo de
Hector José Campora, que se elegeu em 1973. Campora renunciou em meio ao caos
social e a um episódio conhecido como o massacre de Ezeiza, onde multidões de dife-
rentes vertentes do peronismo se enfrentaram, gerando conflitos e instabilidade.

Com o falecimento de Perón assumiu sua viúva Maria Estela Martinez de Perón. A
gestão de Isabelita, como era conhecida, foi marcada pela ação do movimento parami-
litar de extrema direita, Triple A, que promovia atentados e confrontos abertos contra
a esquerda.

Em 1976, um grupo de militares depunha Isabelita Perón com o argumento de superar


a desordem política e social e com o intuito maior de reprimir os grupos guerrilheiros.
Intitulavam-se defensores de um “processo de reorganização nacional”. A junta militar
reunia militares da Marinha, da Aeronáutica e do Exército e foi chefiada por Jorge Rafael
Videla, que cometeu crimes contra os direitos humanos.

Os discursos retóricos esvaziados falavam em defesa da nação, em unidade política, e


se distanciavam de um projeto político e econômico consistente. Houve uma expres-
siva ênfase na repressão com a elaboração de um amplo aparato de terror, que acabou
saindo do controle do estado e serviu a interesses privados e empresariais.

Estima-se que, nos três primeiros anos, o número de mortos tenha chegado a 30.000.
O terrorismo de Estado sequestrava, torturava e matava. A economia passou a seguir
as regras do livre de mercado. Com a entrada franqueada ao capital estrangeiro, várias
indústrias nacionais foram a falência.

70
Os excessos da ditadura argentina são co-
nhecidos e divulgados pelo grupo das Mães
da Praça de Maio, que estiveram à frente
das denúncias sobre desaparecidos, tortu-
rados e mortos.

Com um lenço na cabeça, reuniam-se na


Plaza de Mayo, perto do palácio presiden-
Fonte: politize.com.br. cial para exigir notícias dos filhos desapa-
recidos. Encorajados pela experiência das
Mães da Praça de Maio, sindicalistas, estudantes, empresários e intelectuais começaram
a exigir do governo o combate ao desrespeito aos direitos humanos.

A guerra das Malvinas no ano de 1982, uma campanha para recuperar a posse argen-
tina das ilhas das Malvinas, sensibilizou a esquerda e outros setores do país com o dis-
curso anti-imperialista. Com a derrota no conflito, a ditadura argentina se viu fragilizada.
A renúncia do general Leopoldo Galtieri pôs fim ao regime e projetou a imagem de Raúl
Alfonsín do partido União Cívica Radical.

Os desafios de Alfonsín com a redemocratização eram inúmeros e iam desde o combate


à inflação e uma saída para a crise econômica até o julgamento dos militares que desres-
peitaram os direitos humanos.

No Chile as eleições presidenciais de 1970 foram vencidas pelo candidato socialista Sal-
vador Allende, da Unidade Popular, defensor do socialismo com democracia. Seu gover-
no procurou estatizar o sistema bancário, alguns setores da indústria e a exploração do
cobre, responsável por oitenta por cento da exportação chilena. A reforma agrária expro-
priou 35% das terras e as redistribuiu entre camponeses. A via chilena do socialismo ins-
pirava resistência: pecuaristas se opunham a nacionalização, proprietários suspendiam
investimentos na produção, havia remessas de dólares para o exterior e escassez de
mercadorias. Os Estados Unidos patrocinaram uma greve dos caminhoneiros que estag-
nou o país, ao tentar derrubar os preços do cobre no mercado externo para desestabilizar
a economia chilena.

Um grupo de extrema direita, Pátria y Libertad, chegou a conspirar para derrubar Allende
e se envolveu em atividades terroristas. A instabilidade chegou ao seu apogeu quando
setores radicais da Unidade Popular, entre eles grupos do MIR (Movimento de Esquerda
Revolucionária) decidiram tomar as fábricas e invadir as propriedades rurais, desorgani-
zando os setores agrários e promovendo desabastecimento.

71
A situação econômica do Chile se mostrava grave em 1971: recessão, aumento de pre-
ços, escassez de mercadorias e esgotamento de reserva das moedas estrangeiras.
A nacionalização das empresas exigiu esforços financeiros com sobrecarga do estado.
Allende era impopular entre as camadas médias e inspirava forte desconfiança por parte
da direita. Enfrentava a concorrência do partido democrata cristão e sofria críticas da
extrema esquerda.

O clima de radicalização política se acentuava em 1972. As forças armadas retomaram


o interesse pelos debates políticos. Se entre os militares existiam aqueles defensores da
legalidade, havia o grupo adesionista ao golpe de extrema direita e à campanha de esva-
ziamento de Allende.

Em 1973 o general Augusto Pinochet assu-


miu o ministério da guerra e mandou reco-
lher as armas nos sindicatos e associações
de trabalhadores. No dia 11 de setembro de
1973 Pinochet liderou um golpe para derru-
bar Salvador Allende. O palácio de La Mo-
neda, sede da presidência foi bombardeado
pela força aérea e Allende se suicidou. Ini-
ciou-se então um dos mais brutais regimes
ditatoriais na América Latina. Fonte: bol.uol.com.br.

O regime militar de Pinochet perseguiu militantes de esquerda, sindicalistas, artistas e


intelectuais, que foram presos e torturados.

No estádio nacional de Santiago várias


pessoas eram interrogadas e submeti-
das a toda sorte de arbitrariedades. Al-
guns morreram fuzilados. As garantias
constitucionais foram suspensas e o
congresso, fechado. Havia censura aos
meios de comunicação e os sindicados
foram extintos. A política econômica de
Pinochet era neoliberal e privatista, havia
uma abertura ao capital estrangeiro e a
progressiva privatização do sistema de
Fonte: www.todamateria.com.br. previdência social.

72
Articulador da Operação Condor, Pinochet manteve uma integração com outros regimes
ditatoriais da América Latina, com o intuito de consolidar a cooperação entre os regimes
autoritários (Brasil, Uruguai, Paraguai e Argentina).

Entre 1973 e 1980, a Operação Condor definiu uma cooperação entre as ditaduras do
cone sul para reprimir o que esses regimes consideravam elementos subversivos.

A CIA foi um importante personagem nas conspirações contra o governo de Allende e no


suporte ao golpe de Pinochet. A DINA (direção de inteligência nacional) organizava cen-
tros de tortura e investigação para reprimir os opositores do regime. A ditadura chilena
se sobressaiu no campo de montagem de um estado terrorista que se destacou no grau
de brutalidade da repressão contra opositores.

73
Militarização, ditaduras e intervenções

Vamos iniciar o tópico apresentando, em linhas gerais, alguns aspectos históricos sobre
a militarização, ditaduras.

1930 Início do “populismo na política brasileira”.

Conjunto de rearranjos institucionais que teriam permitido sua con-


1945
tinuidade na experiência democrática.

O “populismo” como noção para explicar a política brasileira tornou-se


1930 a 1964 uma das mais bem-sucedidas imagens que se firmaram nas ciências
humanas no Brasil.

1964 Finalmente, o colapso.

Na sociedade brasileira dos anos 1960, além dos fa-


tores que marcaram internacionalmente uma crise da
cultura e dos valores burgueses, o golpe civil militar
de 1964 representou o principal elemento do trauma-
tismo ético-cultural.

Em 31 de março a imprensa noticiava a derrubada


de João Goulart. O presidente da república soube do
movimento realizado por Olímpio Mourão filho, que
sairia com tropas de Juiz de Fora para a Guanabara.
Jango temeroso de uma reação da sociedade e da possibilidade iminente de guerra civil
resolveu não resistir ao golpe engendrado pelos militares, com o apoio da sociedade civil
e a retaguarda norte-americana.

Leonel Brizola, no Rio Grande do Sul, tentava organizar a resistência, apelando para a
manutenção da legalidade. O presidente do Congresso declarou vago o cargo de presi-
dente da república. O projeto dos golpistas era retirar Jango do poder e adiar o processo
de democratização.

74
Havia um projeto ideológico em curso baseado na doutrina de segurança nacional da
Escola Superior de Guerra.

A consolidação da ditadura militar no Brasil ocorreu por meio de um processo exten-


so de alteração das normas até então vigentes, que instituiu um campo de coerção até
que se iniciasse o processo de abertura lenta, gradual e segura, com a flexibilização do
aparato repressivo a partir dos governos de Ernesto Geisel (1974-1979) e João Figueiredo
(1979-1985).

Durante o regime ditatorial, o Executivo exercia poder sobre o Judiciário e direitos e ga-
rantias individuais foram extintos. Também foram suspensas algumas ações:

• A vigência da vitaliciedade.
• Estabilidade dos servidores públicos civis e militares.
• Possíveis e arbitrárias demissões.
• Dispensas.
• Aposentadorias ou transferências para a reserva, no caso dos militares.

Os militares estenderam os processos


jurídicos dos civis para um enquadra-
mento nos chamados Inquéritos Policiais
Militares – IPM. Além do AI-1 (o primeiro
de uma série de atos institucionais pro-
mulgados pelo regime militar para alte-
rar a constituição e reduzir o conjunto de
direitos civis e políticos do cidadão), foi
Julio Lovera / Shutterstock.com promulgada e divulgada uma lista com
nomes de 140 pessoas que deveriam
perder seus direitos políticos. Entre eles estavam políticos como Juscelino Kubistchek,
João Goulart, Leonel Brizola e Miguel Arraes.

Diferente do senso comum, a violência do regime militar não tardou a expressar a brutali-
dade da ditadura, que começou a se manifestar desde o dia 02 de abril quando incendia-
ram o prédio da UNE e a sede do ISEB (Instituto Superior de Estudos Brasileiros).

O Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), as ligas camponesas e diversas outras organi-
zações ligadas aos movimentos sociais foram declaradas ilegais. A repressão foi violenta
e militantes comunistas, como Gregório Bezerra, foram espancados. A Universidade de
Brasília (UNB) foi invadida e várias manifestações coletivas foram duramente reprimidas.

75
Logo no início da ditadura foi criado o Serviço Nacional de Informação – SNI com o obje-
tivo de coletar informações sobre segurança nacional e a chamada “subversão inter-
na”. No nível estadual criou-se o Departamento de Ordem Política e Social – DOPS. Esses
órgãos criados no âmbito do estado de repressão implantado desde o início da ditadura
compunham a tríade de pilares repressivos: censura, propaganda e polícia política.

A resistência começou a se organizar e o inconformismo a aparecer na imprensa que


procurava mesmo de forma cifrada denunciar a censura e a supressão dos princípios
norteadores do estado de direito.

No entanto, durante o regime militar foi promulgada uma nova constituição que aca-
bava por referendar as medidas excepcionais e os atos institucionais de desrespeito à
democracia no contexto nacional. As eleições para presidente e governador se tornaram
indiretas e o executivo alcançou um poder extenso que lhe permitia:

• Decretar leis.
• Definir prerrogativas sobre segurança nacional e finanças públicas.

Após a posse do presidente Costa e Silva, no ano de 1967, houve intensificação das ma-
nifestações nas ruas, com a realização de passeatas e comícios.

Foi criada a Frente Ampla, para agregar li-


deranças políticas de modo a organizar a
oposição e convocar para uma campanha
defensora de eleições diretas. Essa campa-
nha fracassou e esse contexto acabou por
recrudescer o embrutecimento da ditadura
com a decretação do AI-5, sem limite de vi-
Fonte: acervo.oglobo.globo.com.
gência. O ato institucional consolidou a sus-
pensão dos direitos civis mais fundamentais, como o habeas corpus por exemplo.

Velório do estudante Edson Luís na Cinelândia,


em 29 de março de 1968. No ano de 1968, várias manifestações ga-
nharam as ruas, a mais expressiva devido
à morte do estudante secundarista Edson
Luís, assassinato pela ditadura. Em protesto
pela morte do rapaz, realizou-se a passeata
dos 100.000. Em sua homenagem, a missa
na Candelária foi duramente reprimida com

Fonte: une.org.br.

76
ataques violentos da polícia militar. O poder executivo manteve o fechamento do con-
gresso, a cassação de mandatos políticos e precipitou a decretação do estado de sítio.

Nesse mesmo contexto houve mais prisões políticas dirigidas à opositores do regime.
Com o endurecimento do regime militar foi criada a pena de expulsão e banimento do
país, além do retorno da pena de morte ou prisão perpétua no contexto de “subversão”.

A segurança nacional seguia a diretriz da Doutrina de Segurança Nacional empreendida


pela Escola Superior de Guerra. Essa diretriz ideológica amparava a criação dos Desta-
camentos de Operações e Informações – CODI-DOI, no ano de 1970, cuja matriz inspira-
dora era a chamada Operação Bandeirante – Oban, por sua vez, criada pelo Exército no
estado de São Paulo. Esses órgãos incluíam:

• A Operação Bandeirante: destacamento de planejamento, que visava a efetiva


execução das medidas de repressão.
• O Destacamentos de Operações e Informações: destacamento para buscas,
apreensões e prisões, responsáveis também por torturar e assassinar opositores.

No governo Médici, explorou-se o chamado crescimento econômico com o mote do


milagre econômico, que acabou sendo apropriado pela ditadura nos slogans patrióticos.

Saiba mais

A política econômica no regime militar

De 1967 a 1973 o Brasil alcançou taxas médias de crescimento muito eleva-


das e sem precedentes, que decorreram em parte da política econômica então
implementada principalmente sob a direção do Ministro da Fazenda Antônio
Delfim Neto, mas também de uma conjuntura econômica internacional muito
favorável. Esse período (e por vezes de forma mais restrita os anos 1968-1973)
passou a ser conhecido como a fase do milagre econômico, uma terminologia
anteriormente aplicada a fases de rápido crescimento econômico no Japão e
em outros países. O milagre econômico brasileiro foi também, em certa medi-
da, o desdobramento de diagnósticos e políticas adotados entre 1964 e 1966
por Otávio Gouveia de Bulhões e Roberto de Oliveira Campos, respectivamente
ministros da Fazenda e do Planejamento do governo de Castelo Branco, e con-
substanciados no Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG).

77
Quanto às principais personalidades envolvidas com a política econômica no
período, cabe recordar que, no início de 1967, Castelo Branco foi sucedido por
Costa e Silva na presidência da República. Delfim Neto foi então nomeado mi-
nistro da Fazenda e Hélio Beltrão recebeu a pasta do Planejamento. Em 1969,
com a doença e a morte de Costa e Silva, após o breve período de transição da
junta militar, Garrastazu Médici assumiu a presidência e João Paulo dos Reis
Veloso, o cargo de ministro do Planejamento.

De 15 de março de 1967 a 15 de março de1974, Delfim Neto permaneceu à


frente do Ministério da Fazenda, mantendo uma orientação para a condução
da economia inalterada em suas linhas gerais, o que justifica a abordagem dos
sete anos (de 1967 a 1973) como um único período do ponto de vista da política
econômica. Coube a ele a escolha dos presidentes do Banco Central, inicial-
mente Rui Leme e depois Ernâni Galveias, e sua influência foi determinante para
a definição dos rumos da economia.

A nova equipe econômica, que assumiu em 1967 e em parte tinha origens


acadêmicas, dificilmente poderia negar os progressos alcançados pela ad-
ministração anterior em várias frentes e, quanto ao diagnóstico da crise, não
discordaria da hipótese de que, nos anos anteriores, o processo inflacionário
brasileiro poderia ser caracterizado como resultante de uma “inflação de de-
manda”. Esta, no entanto, já parecia em boa medida enfrentada, pelo menos
em suas causas básicas

O novo governo logo anunciaria uma estratégia bastante semelhante à do go-


verno anterior: a busca do crescimento econômico promovido pelo aumento
de investimentos em setores diversificados, a diminuição do papel do setor pú-
blico e o estímulo a um maior crescimento do setor privado, os incentivos à ex-
pansão do comércio exterior e, finalmente, elevada prioridade para o aumento
da oferta de emprego e o cumprimento de outros objetivos sociais. No entanto,
esses objetivos claramente não tinham sido alcançados no governo Castelo
Branco e essa constatação levou a um novo diagnóstico de certos problemas
da economia e, em particular, as causas da inflação remanescente.

Luís Aranha Correia do Lago CPDOC – FGV

Fonte: http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/milagre-econo-
mico-brasileiro.

78
Depois do golpe de 1964 multiplicaram as entidades que se organizaram em torno de
projetos de resistência ao regime militar a partir da luta armada, em função do descon-
tentamento com os rumos da resistência pacífica empreendida pelo PCB (Partido Comu-
nista Brasileiro). Alguns projetos se inspiravam na revolução cubana, outros, na revolução
maoísta empreendida pela China em 1949.

A luta armada: movimentos de resistência ao regime militar

A luta armada no Brasil teve duas áreas de atuação: o campo e a cidade, sendo a guerri-
lha urbana a mais conhecida. Há registro de várias organizações como:

1. Ação Libertadora Nacional – ALN, liderada por Carlos Marighella;


2. Movimento Nacional Revolucionário – MNR.

Da cisão da organização revolucionária Política Operária – POLOP, surgiram dois grupos:

1. Comandos de Libertação Nacional (COLINA), da dissidência mineira.


2. Vanguarda Popular Revolucionária – VPR, resultado de uma parcela do MNR so-
mada à dissidência paulista da POLOP, liderada pelo ex-militar Carlos Lamarca.

Em 1969, a VPR e os COLINA juntaram-se e formaram a Vanguarda Armada Revolu-


cionária (VAR-Palmares), que também não demoraria a sofrer cisões. Temos, portanto:

1. A reconstituição da VPR.
2. A Dissidência da VAR-Palmares – DVP.

Ainda, da dissidência gaúcha do PCB, que se fundiu ao que restou da POLOP, surgiu:

1. Partido Operário Comunista (POC).

Havia também entre as organizações de resistência o Partido Comunista Brasileiro Re-


volucionário – PCBR, as Ligas Camponesas, o Movimento Revolucionário 8 de Outubro
– MR-8, o Grupo dos Onze 11 – G-11, o Movimento Revolucionário Tiradentes – MRT e a
Ala Vermelha do PCdoB – ALA, entre outros.

79
As ações guerrilheiras no Brasil transitavam em três áreas de atuação:

Assaltos Justiçamento Sequestros

Segundo os Tratava de exe- Embaixador dos EUA,


gerrilheiros cução capital Charles B. Elbrick, trocado
eram opera- como ato de por quinze presos políti-
ções de desa- justiça revolu- cos, em ação realizada em
propriação. cionária. 1969 pela ALN e o MR-8).

Embaixador alemão, Ehren-


fried von Holleben, trocado
por 70 presos políticos, em
ação realizada em 1970
pela ALN e a VPR.

Embaixador Suíço Giovan-


ni Bucher, trocado por
70 presos políticos, em
ação realizada em 1970
pela VPR.

A guerrilha rural, porém, também se destacou. Nesse caso, havia um projeto de luta
pelo comunismo por meio de uma “guerra popular”, estabelecida por focos guerrilhei-
ros. Nesse ponto, o contexto internacional influenciou a esquerda brasileira, embora
não a ponto de comandá-la. O mundo dos anos 1960 vivia um turbilhão de mudanças
e a vitória de Fidel Castro, Che Guevara e seus companheiros na ilha de Cuba, com
a derrubada de Fulgêncio Batista em 1959 e sua adesão ao socialismo soviético em
1961, levou à euforia a esquerda latina, fazendo com que muitos aderissem à sua tática
de guerrilha: o foquismo 6.

80
O Movimento Nacional Revolucionário –
MNR aderiu a essa teoria e formou o pri-
meiro foco guerrilheiro no Brasil contra a
ditadura militar, na região do Caparaó (fron-
teira entre os Estados do Espírito Santo e
de Minas Gerais), no período de 1966-1967.
Seus membros, em grande maioria, eram
ex-militares.
Fonte: altocaparao.mg.gov.br.

O MNR contou com o apoio do governo cubano (que proporcionou o treinamento de


militantes) e do político Leonel Brizola, que, mesmo exilado no Uruguai, ajudou na orga-
nização estratégica e na busca de verbas para a estruturação do movimento. Porém,
ocorreu a capitulação prematura dessa guerrilha, que teve seus revolucionários presos,
antes mesmo de uma ação efetiva contra o governo (ALMEIDA, 2013).

Para uma parte das camadas intelectualizadas de orientação política à esquerda havia
uma distância entre seus ideais radicalmente democráticos e a realidade do regime
civil-militar. O final dos anos 1970 e a década de 1980 assistiram, por toda a América
Latina, a um intenso movimento de redemocratização, com a substituição das dita-
duras militares que desde várias décadas dominavam o panorama político continental.
O Brasil não era um caso único ou modelar do processo de transição democrática,
embora, é claro, guarde, como veremos inúmeras especificidades.

Quer entender mais sobre o golpe de 1964? Leia a matéria abaixo.

Saiba mais

Golpe de 1964

Na madrugada do dia 31 de março de 1964, um golpe militar foi deflagrado


contra o governo legalmente constituído de João Goulart. A falta de reação do
governo e dos grupos que lhe davam apoio foi notável. Não se conseguiu arti-
cular os militares legalistas. Também fracassou uma greve geral proposta pelo
Comando Geral dos Trabalhadores (CGT) em apoio ao governo. João Goulart,
em busca de segurança, viajou no dia 1o de abril do Rio, para Brasília, e em
seguida para Porto Alegre, onde Leonel Brizola tentava organizar a resistência
com apoio de oficiais legalistas, a exemplo do que ocorrera em 1961. Apesar da

81
insistência de Brizola, Jango desistiu de um confronto militar com os golpistas
e seguiu para o exílio no Uruguai, de onde só retornaria ao Brasil para ser sepul-
tado, em 1976.

Antes mesmo de Jango deixar o país, o presidente do Senado, Auro de Moura


Andrade, já havia declarado vaga a presidência da República. O presidente da
Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli, assumiu interinamente a presidência,
conforme previsto na Constituição de 1946, e como já ocorrera em 1961, após
a renúncia de Jânio Quadros. O poder real, no entanto, encontrava-se em mãos
militares. No dia 2 de abril, foi organizado o autodenominado “Comando Supre-
mo da Revolução”, composto por três membros: o brigadeiro Francisco de Assis
Correia de Melo (Aeronáutica), o vice-almirante Augusto Rademaker (Marinha)
e o general Artur da Costa e Silva, representante do Exército e homem-forte do
triunvirato. Essa junta permaneceria no poder por duas semanas.

Os militares envolvidos no golpe de 1964 justificaram sua ação afirmando que


o objetivo era restaurar a disciplina e a hierarquia nas Forças Armadas e deter
a “ameaça comunista” que, segundo eles, pairava sobre o Brasil. Uma ideia fun-
damental para os golpistas era que a principal ameaça à ordem capitalista e à
segurança do país não viria de fora, através de uma guerra tradicional contra
exércitos estrangeiros; ela viria de dentro do próprio país, através de brasileiros
que atuariam como “inimigos internos” – para usar uma expressão da época.
Esses “inimigos internos” procurariam implantar o comunismo no país pela via
revolucionária, através da “subversão” da ordem existente – daí serem chama-
dos pelos militares de “subversivos”. Diversos exemplos internacionais, como
as guerras revolucionárias ocorridas na Ásia, na África e principalmente em
Cuba, serviam para reforçar esses temores. Essa visão de mundo estava na
base da chamada “Doutrina de Segurança Nacional” e das teorias de “guerra
antissubversiva” ou “antirrevolucionária” ensinadas nas escolas superiores das
Forças Armadas.

Os militares que assumiram o poder em 1964 acreditavam que o regime demo-


crático que vigorara no Brasil desde o fim da Segunda Guerra Mundial havia se
mostrado incapaz de deter a “ameaça comunista”. Com o golpe, deu-se início à
implantação de um regime político marcado pelo “autoritarismo”, isto é, um regi-
me político que privilegiava a autoridade do Estado em relação às liberdades indi-
viduais, e o Poder Executivo em detrimento dos poderes Legislativo e Judiciário.

Fonte: <https://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/FatosImagens/Golpe1964>.

82
MIDIATECA

Para ampliar o seu conhecimento veja o material complementar da Unidade 3


disponível na midiateca.

NA PRÁTICA

Vamos observar as semelhanças entre o momento autoritário que o Brasil vi-


veu de 1964 a 1985 com o atual contexto?

Sabemos que a democracia brasileira vem sofrendo desgastes institucionais


desde 2016. Vamos pensar nos elementos que estiveram presentes no regime
militar e desgastaram o estado de direito e trazê-los para o nosso contexto
atual? Que elementos (censura, desrespeito à constituição, limites conservado-
res à cultura, afastamento de governantes eleitos, manipulação da informação,
afastamento de servidores públicos, esvaziamento dos direitos sociais) podem
ser atualizados para o Brasil contemporâneo?

É possível exercitar o método comparativo sem cair no chamado anacronismo.


Refletimos que a democracia contemporânea está sendo atacada, especial-
mente o conjunto de suas instituições e poderes (judiciário, legislativo). Perce-
bemos que o poder executivo está hipertrofiado e delimita os outros poderes e
esferas da democracia. Os direitos sociais estão sendo limitados e, além disso,
verifica-se a censura ideológica à cultura e à ciência, em nome de uma visão
obscurantista e retrógrada que cerceia a liberdade de expressão e o desenvol-
vimento do conhecimento.

83
Resumo da Unidade 3

Nesta unidade pretendemos analisar os diferentes ideais de modernização inerentes aos


movimentos sociais ocorridos a partir da década de 1940 na América Espanhola e Por-
tuguesa. É necessário compreender em que medida esses projetos de modernização
foram incorporados pelo Estado a partir dessa data. Inclui-se na temática da moderniza-
ção uma análise dos diferentes diagnósticos do “atraso” brasileiro presentes na historio-
grafia produzida a partir do início desse período.

Para além dos objetivos descritos devemos incluir a identificação de uma especificidade
política no período que se inicia com o golpe de 1964 e termina com a crise do regi-
me autoritário, no início da década de 1980, no caso brasileiro. No contexto da América
Latina, estivemos atentos a ascensão de regimes autoritários e suas práticas políticas
populistas. Por meio de alguns estudos de caso, analisamos, da gestação ao ocaso, o
autoritarismo e o estabelecimento de estados de repressão no continente. Em relação
aos Estados Unidos da América, procuramos identificar o contexto político de reformas
e da política intervencionista na Guerra Fria, por meio da guerra do Vietnã, bem como dos
movimentos sociais originários das lutas por direitos sociais.

CONCEITO

No contexto da Guerra Fria, os EUA e grupos estratégicos das elites financeiras


da América Latina, temendo o efeito expansivo do comunismo, fomentaram
golpes autoritários que instauraram governos autocráticos nos países do con-
tinente. Em 1959 a Revolução Cubana tornava esse fantasma em algo apro-
ximado ou palpável, segundo a leitura conservadora dos militares e da direita
encastelada nos grupos detentores do capital e na classe média temerosa de
reformas por uma sociedade mais justa e igualitária. O alinhamento da revolu-
ção cubana ao socialismo, a partir de 1961, gerou a consolidação de regimes
no campo da chamada Doutrina de Segurança Nacional, que imaginava um
inimigo interno inserido na sociedade como propagador de ideias subversivas.
A cultura política autoritária hegemônica ultrapassa a esfera exclusivamente
militar e se dissemina em camadas sociais diversas.

84
Referências

ALMEIDA, D. L. R. A repressão e os descaminhos da luta armada no Brasil. In: Simpósio


Nacional de História, n. 27, 2013, Natal. Artigo, São Paulo, ANPUH, 2013. Disponível em:
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REVISADO-ArepressaoeosdescaminhosdalutaarmadanoBrasil_Anpuh2013_-DinorahRu-
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85
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TODOROV, T. O medo dos bárbaros, para além do choque das civilizações. Petrópolis:
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TULCHIN, J. S. América Latina X Estados Unidos: uma relação turbulenta. São Paulo:
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VIANNA, L. W.; CARVALHO, M. A. R. República e Civilização Brasileira. In: Bignotto, N.


(org.). Pensar a República. Belo Horizonte: UFMG, 1999.

86
UNIDADE 4

Redemocratização na América
contemporânea: características
históricas e perspectivas
INTRODUÇÃO

Estudar a redemocratização na América contemporânea equivale a analisar os aspectos


históricos da crise do autoritarismo, os impasses da reconstitucionalização, a elaboração
do pluripartidarismo, as eleições diretas para os parlamentares e para o Executivo, além
do desenvolvimento de uma crise econômica que se desdobra no processo gradual de
privatização e no estabelecimento de um sistema neoliberal.

OBJETIVO

Nesta unidade você será capaz de:

• Identificar aspectos históricos contemporâneos relativos aos processos de de-


mocratização e o ocaso dos regimes autoritários, com o desenvolvimento da cri-
se econômica que se desdobra nos regimes neoliberais.

88
Democracia e crise econômica na América
anglo-saxônica contemporânea

Distintos do conjunto de políticos liberais dos anos 1930, os governos republicanos de


Ronald Reagan (1980-1988), George Bush Sr. (1988-1992) e o do democrata Bill Clinton
(1992-2000) reagiram às animosas recessões decorrentes das políticas neoliberais e do
esvaziamento do Estado na regulação da economia e do corte dos programas vincu-
lados à questão social.

Uma nova direita passou a regular a vida cultural, o cenário intelectual e o contexto
político, principalmente depois da derrocada do socialismo real e da queda do muro de
Berlim. O capitalismo norte-americano envolvia intervenções políticas como no Iraque ou
no Afeganistão, especialmente depois do episódio do 11 de setembro.

Os direitos do capitalismo deveriam se impor ainda que a lógica bipolar


da Guerra Fria estivesse desaparecendo depois de 1991.

As pressões da competição global e o


Redução do espectro do Estado, que se
capitalismo corporativo implicavam redu-
tornara um projeto de Estado mínimo.
ções salariais e desemprego crescente.

Os sindicatos e os movimentos sociais se organizavam para os ataques da política


privatista e monetarista que atravessavam esse contexto, conforme mostra o esque-
ma ao lado.

89
O neoliberalismo parecia uma proposta na forma de resposta à crise econômica dos
anos 1970. Em primeira instância, houve uma crise de acumulação com perda da mar-
gem de lucro:

• Muitos serviços públicos foram privatizados.


• O Estado se retraiu nas esferas da previdência social e na desregulamentação da
indústria.

Ronald Reagan, ex-ator de Hollywood, enfatizava o dis-


curso da liberdade americana com amplas críticas
aos programas de auxílio aos pobres e idosos, além
da defesa da saúde da iniciativa privada condicionada
à diminuição dos impostos e à livre concorrência.

Joseph Sohm / Shutterstock.com

Várias divisões de propostas políticas foram sentidas nos


governos norte-americanos nos anos 1980 e 1990. Tanto o
partido democrata como o republicano defenderam cortes
nos gastos sociais. Bill Clinton, apesar de democrata, foi um
enfático defensor do equilíbrio fiscal e da contenção de
despesas na questão social por parte do Estado.

stocklight / Shutterstock.com

O dirigente verbalizava que a “era do governo grande havia acabado”. Houve um ataque
frontal aos direitos trabalhistas e aos sindicatos, e uma progressiva eliminação de direi-
tos e perdas salariais foram duramente sentidas pelos trabalhadores.

No contexto do governo Reagan, os EUA:

FINANCIARAM INCENTIVARAM AJUDARAM


os mercenários para grupos militares de direita a desestabilizar os
sabotar o regime sandi- em El Salvador, aumen- governos comunistas de
nista nicaraguense. tando o apoio à guerrilha Angola e Moçambique.
afegã contra os soviéticos.

90
A Era Reagan/Thatcher (Grã-Bretanha) ficou conhecida como uma segunda
Guerra Fria. A política externa e belicosa contra a União Soviética – URSS
tinha como objetivo restaurar o quadro de bipolaridade entre EUA e URSS.

Os defensores dos princípios neoliberais estavam reunidos em torno do consenso de


Washington, que criticava o controle do Estado sobre o mercado defendendo que o ca-
pitalismo deveria funcionar livre de regras ou limitações. Reagan aplicava um programa
neoliberal, mas se determinava a provocar o colapso econômico da URSS com a preser-
vação dos gastos armamentistas.

O modelo que vigorava tinha como objetivo:

1. Relação com a alta de juros e a redução de impostos de empresas.


2. Diminuição de investimentos públicos.
3. Intransigência com movimentos grevistas.
4. Ações sindicais no corte ou na redução de gastos sociais.

91
As empresas em geral criavam obstáculos a campanhas de sindicalização
com a intimidação de ativistas. As grandes organizações se utilizavam de
greves longas para desestabilizar os sindicatos. Com a fragilidade de enti-
dades sindicais, “o exército de reserva” dos trabalhadores urbanos aceitava
trabalhar em situações degradantes, com salários miseráveis.

Em 2000, somente 13,5% da mão de obra nacional era sindicalizada. Com a


crise econômica, uma onda de fechamentos de fábricas ocorreu nas regiões
tradicionais de indústria no nordeste e no meio-oeste do país. O número de
empregos decaiu, e a mobilidade transnacional de bens e capital contribuiu
para essa tendência.

O imperialismo americano se transformou após a derrota dos EUA na guerra do Vietnã.


Reagan era um anticomunista convicto, que possuía intenções de acelerar a contenção
do comunismo mundial, e sua doutrina representava um conjunto de iniciativas agrega-
das em uma política de ajuda aos movimentos comunistas no Terceiro Mundo.

Na América Central, o governo americano treinou e financiou guerrilhas. O governo Bush


invadiu o Panamá para desconstruir o governo aliado de Manuel Noriega, que contrariava
os interesses dos EUA.

As intervenções foram sangrentas e pressupunham a morte de milhares de civis. O


propósito do enfraquecimento dos Estados nacionais não inibiu o imperialismo econô-
mico, que fazia da nação norte-americana um eixo hegemônico em termos de poder
militar-econômico.

92
As agências financeiras (FMI e Banco Mundial) pressionavam os países da América La-
tina a um ajuste estrutural em troca do abrandamento das dívidas. A hegemonia norte-
-americana enfatizava uma política externa interventora e exaltadora do neoliberalismo.

A doutrina Carter, fundamentada na doutrina Monroe, foi esboçada para


realçar a hegemonia militar dos EUA na região.

O governo Reagan reorganizou as Forças Armadas criando um comando central respon-


sável pelo Oriente Médio, que reforçou o Iraque na guerra contra o Irã nos anos 1980.

Na nova ordem mundial permaneceram alguns direitos políticos adquiridos nos anos
1960 e 1970 por negros, mulheres e imigrantes. Nesse contexto, várias manifestações
ocorreram em protesto contra a nova ordem mundial e seus princípios neoliberais.

Nova Ordem Mundial

O envelhecimento da
As políticas públicas população atribuía ao
pareciam contemplar Estado mais gastos
as minorias raciais e de com previdência e
gênero. saúde pública.

Os estímulos para
imigração para
O progresso em substituir a mão de
direitos sociais e a obra que envelhecia
consolidação das foram ampliados.
liberdades pareciam Entre os imigrantes
oscilar nas décadas de mais expressivos
1980 e 1990. estavam os latino-
americanos e asiáticos.

93
Saiba mais

O mundo despertou do pesadelo neoliberal em Seattle

Em 30 de novembro de 1999, ministros e políticos de 135 países foram convi-


dados para a chamada Rodada do Milênio, terceiro encontro mundial da OMC
(Organização Mundial do Comércio) em Seattle (EUA). Só não contavam com a
presença de 50 mil manifestantes, que não precisaram de convite, para clamar
por uma economia mais solidária durante os quatro dias do encontro, que pre-
tendia estabelecer as regras comerciais do século 21.

Os protestos em Seattle, cidade até então mais conhecida como o berço do


novo rock dos anos 90, entraram para a história como a primeira grande mani-
festação contra o capitalismo neoliberal globalizado. A devoção pelo mercado,
que dominou o cenário mundial nos anos 80 e 90, gerou mais concentração de
poder nas mãos de algumas corporações e ainda mais empobrecimento em
países da periferia do capitalismo.

A pluralidade da pauta dos manifestantes ia da luta contra o trabalho infantil


e semiescravo particularmente em países pobres, os alimentos transgêni-
cos e a destruição do meio ambiente. Formada por trabalhadores, anarquis-
tas e estudantes, o movimento foi batizado a grosso modo de movimento
antiglobalização.

Fonte: http://www.zonacurva.com.br/o-mundo-despertou-pesadelo-neoliberal-em-seattle/

94
Redemocratização e neoliberalismo na
América espanhola contemporânea

O final dos anos 1970 e a década de 1980 assistiram por toda a América Latina a um
intenso movimento voltado para a redemocratização, com a substituição das ditaduras
militares que predominaram no panorama contemporâneo.

Os anos 1980 são de mudanças no leste europeu, que se


sensibiliza para transformações nos regimes de socialismo
real. Paralelamente a isso, nos EUA assistimos à ascensão
de Jimmy Carter à presidência americana, que repensa a po-
lítica dos direitos humanos no contexto da política externa.

Essa abertura acaba por se desdobrar no contexto de re-


tração do apoio norte-americano às ditaduras do Cone Sul.
Nir Levy / Shutterstock.com

No contexto latino-americano, o esforço para manter a so-


brevida do regime militar levou a Argentina, na figura do
general Galtieri, a declarar guerra contra a Inglaterra no ano
de 1982. Em linhas gerais:

• O objetivo era recuperar as Ilhas Malvinas no esfor-


ço para manter a unidade quebrada com o movimento
crescente de descontentamento com a ditadura militar
de 1976. Fonte: www.dailymail.co.uk.
• Nem o clamor da participação na Copa do Mundo em
1978 atenuaria o desencanto com o regime autoritário e seus esforços fracassados
de recuperar as Ilhas Malvinas.
• As famílias pediam explicações sobre as vítimas de desaparecimento e tortura dos
dissidentes do regime vigente.

95
As eleições gerais de 1983 foram vitoriosas para Raul R.
Alfonsín. Durante sua gestão, foi revista a lei de autoanis-
tia que perdoava os militares por excessos cometidos
no regime militar, além disso foram assinados decretos
que viabilizaram julgamentos de militares que comete-
ram crimes de lesa-humanidade.

Nesse contexto foi criada a Comissão Nacional sobre o Desaparecimento de Pessoas


– Conadep. A comissão e seu relatório culminaram com a condenação de militares da
cúpula do regime pelos crimes cometidos nos anos de chumbo.

No caso do Uruguai, os partidos demonstraram eficácia na convocação das eleições.


Nos anos 1970, surgiu uma frente que agregava as esquerdas alternativas aos partidos
tradicionais, denominada Frente Ampla, representando cerca de 30% dos votos da capital
e 20% do país. A estrutura bipartidária se tornara tripartidária.

30%
votos da capital

Frente ampla
Estrutura tripartidária

20%
votos do país

A democracia venceu por meio de um plebiscito ainda durante a ditadura. A moderni-


zação após a ditadura foi acompanhada de uma maior participação da sociedade civil
na política.

Quer saber mais sobre o movimento Frente Ampla? Leia o ícone Curiosidade logo a seguir.

96
Curiosidade

Frente Ampla

A manutenção do regime militar por 21 anos não foi realizada a partir do consen-
so popular, nem mesmo das elites. Diversos movimentos se destacaram na luta
contra a ditadura, e um deles foi a Frente Ampla, composta por figuras públicas
bastante conhecidas: Juscelino Kubitschek, João Goulart e Carlos Lacerda.

Criada em 1966, a Frente Ampla agrupou diversas correntes políticas de es-


querda e tinha como consenso entre seus integrantes a busca pelo retorno à
democracia. O grupo tinha como reivindicações o retorno às eleições diretas, a
anistia e o retorno ao pluripartidarismo e ao direito de greve.

A Frente Ampla realizou entre os anos de 1966 e 1968 diversos comícios e ma-
nifestações de rua.

Conflito com o governo

A curiosa aliança entre antigos inimigos — Carlos Lacerda e aqueles que tanto
criticou em seus artigos, João Goulart e Juscelino Kubitschek — iniciou-se a
partir do afastamento de Lacerda da direita após a edição do AI-1, que anulou
as esperanças de Lacerda sobre as eleições de 1965, que seriam realizadas
pelo voto indireto. A partir desse momento, Lacerda, que antes era visto como
uma das principais lideranças civis do Golpe de 1964, passa a ser um de seus
maiores críticos.

Fonte: https://www.infoescola.com/historia-do-brasil/frente-ampla/.

Os regimes militares tinham (e, talvez, ainda tenham, em alguns casos)


um projeto de reorganização da sociedade, de modernização dos seus
vínculos com o sistema capitalista internacional. No caso do Chile, com
sua frustrada experiência de transição socialista, o projeto militar envol-
veria a reinserção do país nos marcos do sistema capitalista. Em alguns
casos, como é, notoriamente, o da Argentina de após 1976, o “projeto
histórico” dos militares envolve a ideia sinistra — aliás de ressonâncias
nitidamente totalitárias, em que pesem suas origens supostamente libe-

97
rais — de que eles estariam diante de uma sociedade enferma, como tal
merecedora de tratamentos de choque e de um empenho de regenera-
ção sob direção das Forças Armadas. (WEFFORT, 1989)

No Chile, as questões sociais se inseririam no interior do sistema oficial desde a década


de 1930 vinculando a democracia formal com o autêntico sistema real.

Chile, o país que mais avançou no caminho para o socialismo!

A democracia socialista de Allende apontava para uma possível mudança interrompida


com o golpe de Pinochet. Essa ditadura teve:

• Forma peculiar, assumindo um caráter pessoal e hierarquizado ao extremo.


• Certa rigidez e a gradualidade ou lentidão da abertura.

Mencione-se, em primeiro lugar, o inelutável compromisso da forma po-


lítica com os conteúdos sociais. Exemplo disso é o fato de que se tenha
tornado geral nos países do Cone Sul uma atitude nova em relação ao
significado social e econômico das instituições formais da democracia
política. Mencione-se, em segundo lugar, que o caso chileno, por sua pró-
pria história, mostra de modo mais nítido que o tema do socialismo tem
algo a ver com a realidade, quaisquer que sejam as preferências ideoló-
gicas, pró ou contra o socialismo, de quem quer que seja. O caso chileno
mostra que os países do Cone Sul são chamados a se decidir sobre o
socialismo, como um dos possíveis caminhos, evidentemente não o úni-
co. (WEFFORT, 1989)

As nações da América Latina de herança elitista e oligárquica vivenciam um processo


de continuidade à desmontagem do Estado de Bem-estar Social. Isso incide em uma
tendência privatista e neoliberal, que inibe os processos de amparo social. Talvez não
tenhamos concluído a consolidação de um pequeno ensaio da solidificação do Estado
de Bem-estar Social, interrompido precocemente com as ditaduras.

98
Esvaziado de legitimidade perante amplos se-
tores sociais, o regime militar tentava fortalecer
sua imagem com o recrudescimento e a inten-
sificação do envolvimento da Argentina na re-
cuperação das Malvinas. Essa ação seria uma
expressiva estratégia para recuperar uma ima-
gem positiva perante a opinião pública.

Com a derrota nas Malvinas, o governo militar expunha suas fraturas e acelerava sua der-
rota. O general Galtieri renunciou e abriu espaço para a redemocratização do país. Raul
Alfonsín venceu as eleições de 1983 com o desafio de consolidar o regime democrático
com uma sociedade de memória recente.

Ainda na gestão do presidente Raul Alfonsín, a Argentina começou a investigar os inúme-


ros casos de bebês retirados arbitrariamente dos presos políticos e entregues a famílias
ligadas ao regime militar. Os arquivos secretos foram abertos, e militares e torturadores,
condenados por crimes e desrespeito aos direitos humanos.

A crise econômica se intensificava com a inflação, uma limitada produção industrial,


altos índices de desemprego e alguns dos problemas que continuaram a rondar o país.
Os desafios da redemocratização eram inúmeros, entre eles:

Alcançar metas de
Melhorar a qualidade
Desenvolver a cidadania. desenvolvimento
de vida da população.
econômico.

Promover ações
Responder aos desequilí- Coibir a corrupção com vista a
brios ambientais. e a violência. consolidar
a justiça.

Reparar os crimes
contra a humanidade
perpetrados
pela ditadura.

99
Na Era da Globalização, as economias nacionais buscaram se fortalecer com a forma-
ção dos blocos de mercado comum. Uma das tônicas que acompanharam a afirmação
dos regimes democráticos na América Latina foi:

O fortalecimento da sociedade civil e a ampliação das comunidades


originárias, e a maior participação das mulheres no mercado de trabalho
e na política.

A partir dos anos 1990, as mulheres conquistaram a Presidência da República no Brasil,


na Argentina e no Chile. Com o advento da isonomia dos direitos, os desafios perpassa-
ram o equilíbrio das assimetrias profundas, com a adoção de políticas afirmativas com a
meta de criar uma base social concretamente mais democrática.

100
Crise da ditadura militar: propostas de aber-
tura, redemocratização ou reconstitucio-
nalização? A Nova República: perspectivas
para a democracia na América portuguesa

A opção pela “abertura lenta, gradual e segura” não criou obstáculos para que parte da
comunidade de informações operasse no controle diário das pessoas que organizavam
uma oposição ao regime autoritário vigente desde 1964.

A repressão, a tortura e o controle de informa-


ções não foram eventos pontuais e ocasionais
ao longo da ditadura militar.

No processo de distensão as lutas democráticas pela abertura foram marcantes, com


inúmeras manifestações sociais e com a decretação da lei da anistia no ano de 1979.
A rearticulação dos movimentos sociais gerava contradições internas no processo de
organização da repressão, especialmente se pensarmos na divisão das Forças Armadas
quanto ao momento de flexibilizar e abrir o regime.

O primeiro ano do governo Geisel (1974), reconhecido pela historiografia como o início
da distensão, contou com o número de 54 desaparecidos e uma morte oficial. Longe de
uma aparente normalidade institucional, o governo Geisel marcou:

A continuidade das torturas e das ações realizadas pelo estado de terror im-
plantado nos governos reconhecidos como de linha dura (Costa e Silva e Mé-
dici). As mortes de Vladimir Herzog e Manoel Fiel Filho nas dependências do
DOI-Codi ilustraram esse contexto.

A lei de segurança nacional continuava operando, a despeito da autonomia do aparato


repressor. Os órgãos de informações e segurança funcionavam em sintonia com uma
parcela das Forças Armadas que não estava muito satisfeita com o projeto de conclusão
do regime militar, ainda que gradual. A manutenção da oposição dentro dos limites da
ordem demonstrava o distanciamento com o projeto de redemocratização.

101
Em 1976, foi aprovada
a Lei Falcão, que definia
que a campanha dos
partidos na televisão O pacote de abril no ano
e no rádio deveria se de 1977 editou reformas
limitar à aparição dos institucionais que objetivavam
nomes e das imagens impedir o avanço político do
dos candidatos. MDB, oposição consentida a
possibilitar a vitória da Arena
nas eleições subsequentes.

Nesse mesmo período ganhava força a bandeira da anistia, movimento popular que
abrangia lideranças de esquerda, estudantes e intelectuais, além de uma corrente estran-
geira de solidariedade.

Nesse sentido, é possível supor que a abertura política não foi baseada
em um projeto de redemocratização coerente e previamente articulado.
Segundo Maria Celina D’Araújo, “podemos caracterizar a abertura como
um projeto, que se iniciou pelo alto, com importantes passos liberalizan-
tes, mas que logo virou processo, cujo rumo foi determinado por muitas
forças”. Dessa maneira, Geisel assumiu a Presidência tendo que enfrentar
não apenas a crise política e econômica herdada dos governos anterio-
res, mas também a crise interna deflagrada dentro do próprio regime por
setores que viam na abertura política uma forte ameaça à sua perma-
nência no poder. As Forças Armadas, como é possível supor, tinham em
sua composição uma série de divergências de posturas, comportamen-
tos e alinhamentos, sendo essa característica um dos maiores desafios
enfrentados por Geisel durante seu mandato. (RESENDE, 2014, p. 38)

A anistia incluía uma agenda que pressupunha uma parcela de apoio ao projeto da di-
tadura que previa uma anistia ampla, geral e irrestrita na perspectiva compreensiva da
existência de um grupo de revanchistas que se distanciavam da reconciliação nacional,
demanda do país segundo os militares. Com o fim do AI-5, da censura surgia um reforço
pela polaridade: anistia parcial versus anistia ampla, geral e irrestrita.

102
Em 1979, a ditadura percebia um movimento plural com diversas demandas, além da
perspectiva da alta do custo de vida e do descontentamento com o milagre econômico,
que “fazia o bolo crescer, mas não dividia”, ou seja, a concentração de renda era alarmante.

As greves se
multiplicavam.

A bandeira O movimento
da anistia se estudantil se
fortalecia. rearticulava.

O movimento
negro ganhava
expressão.

O processo de luta árdua pela democracia se iniciou em 1974: de um lado, o movi-


mento iniciado pela dupla Geisel-Golbery e, de outro, a formidável vitória do MDB nas
eleições estaduais.

Você conhece o caso sobre o escândalo Watergate?

A pressão externa norte-americana consolidada


pela posição do governo Carter e os estímulos da
economia mundial condicionaram efeitos na di-
tadura brasileira. A virada da política externa dos
EUA, especialmente após a derrota da Guerra do
Vietnã, é acompanhada da degeneração no plano
interno do fazer política. Esse contexto foi marca-
do pelo escândalo Watergate (1973-1974), com a Fonte: guiadoestudante.abril.com.br.
denúncia das escutas clandestinas na Casa Bran-
ca e as relações promíscuas com o mundo empresarial.

103
Dica

Quer saber mais sobre o escândalo Watergate? Assista ao longa-metragem


Watergate (2018).

O governo Carter já representou uma virada na estratégia americana com o objetivo de re-
cuperar uma imagem chamuscada pelo desrespeito aos direitos humanos e se fortalecer
para retomar o confronto com a URSS. Nos anos 1970, percebemos os primeiros sinais de
esgotamento que apontam para um processo de abertura que representa uma dimensão
fluida e múltipla das forças sociais, e alguns ensaios de reconstitucionalização foram
esboçados, a saber:

• A sociedade se manifestaria com a articulação de estudantes, líderes, trabalhado-


res e intelectuais.
• A disputa em torno da sucessão de Médici, que foi gestada em 1973, foi o primeiro
ato de enfrentamento entre o projeto oficial de abertura e a oposição ao novo contex-
to político do país.
• O MDB, oposição consentida, começou a ser substituído pela representação de um
MDB legítimo, e um projeto parlamentar e democrático encaminhava para a democracia.

Geisel, como sucessor de Médici, fez uma dupla com Golbery com o objetivo de organizar
a reconstitucionalização do país. A meta era:

O alcance da distensão lenta, gradual e segura.

A volta ao Estado de Direito pressupunha uma reconstitucionalização do regime no lugar


da ampla redemocratização.

• O projeto de abertura deveria comportar o impedimento do retorno de pessoas,


instituições e partidos anteriores a 1964.
• A oposição era desejosa de imprimir um ritmo mais intenso e uma maior amplitude
ao processo de abertura.
• Foram realizadas eleições parlamentares em 1974.
• A oposição alcançou expressiva vitória, demonstrando a longa insatisfação com o
regime militar.

104
• A vitória da oposição desestabilizou o projeto original de abertura inerente aos militares.
• A linha dura se organizou em torno da comunidade de informações, os Cies e os
DOI-Codis.
• A violência da repressão aumentou e prolongou as casas de tortura e o assassinato
dos opositores.

No governo Figueiredo, a
campanha da anistia se Essa sabotagem se ma-
No governo Geisel, su-
concretizou, o que pro- nifestou no atentado ao
primiram o AI-5 e houve
vocou, por parte da linha Riocentro (1981) e, por
o fim da censura e da
dura atrelada ao estado consequência, na demis-
imprensa.
de terror, um processo de são do Golbery.
sabotagem à abertura.

A repressão focava o PCB, tendo anteriormente desconstruído a esquerda em suas mani-


festações rurais e urbanas. O PCB seria alvo porque era visto como a retaguarda política
do MDB autêntico e, portanto, responsável pela vitória da oposição nas eleições.

O descontentamento popular se avolumava não só em decorrência da


lentidão da abertura política, como também devido ao impacto da crise
do petróleo e dos desdobramentos na economia.

A crise econômica se intensificava com:

• A inflação.
• A limitada produção industrial.
• Os altos índices de desemprego.
• Alguns dos problemas que continuaram rondando o país.

E os desafios para a redemocratização?

Os desafios eram inúmeros, e podemos destacar os seis principais:

1. Ampliar a cidadania.
2. Melhorar a qualidade de vida da população.

105
3. Alcançar metas de desenvolvimento econômico.
4. Responder aos desequilíbrios ambientais.
5. Coibir a corrupção e a violência.
6. Promover ações com vista à justiça e reparar os crimes contra a humanidade per-
petrados pela ditadura.

Saiba mais

Diretas Já

Movimento político suprapartidário em defesa do retorno de eleições diretas


para a presidência da República. Tendo se iniciado em maio de 1983, o movi-
mento ganhou dimensões políticas e sociais mais amplas, culminando numa
série de comícios, nos primeiros meses de 1984, que mobilizaram milhões de
brasileiros quando da campanha para a sucessão do governo do general João
Batista Figueiredo, último presidente do regime militar instituído em 1964.

No Brasil, a última eleição direta para a presidência da República havia sido a


de 3 de outubro de 1960, quando foi eleito Jânio Quadros. Com a promulgação,
pelo regime de 1964, do Ato Institucional nº 2, de 27 de outubro de 1965, e
como definido em seu artigo 9º, o presidente e o vice-presidente da República
passaram a ser eleitos por maioria absoluta dos membros do Congresso Na-
cional, em sessão pública e votação nominal, com o povo brasileiro perdendo o
direito de escolher seu presidente através do voto direto.

Com a Constituição de 1967, promulgada a 24 de janeiro, através de seu artigo


74, o presidente da República passou a ser escolhido através do voto do Colé-
gio Eleitoral, composto dos membros do Congresso Nacional e de delegados
indicados pelas assembleias legislativas dos estados, cujo número final era
determinado pela proporcionalidade do número de eleitores inscritos em cada
estado. Em 1982, o governo uniformizou a representação das assembleias le-
gislativas estaduais no Colégio Eleitoral, atribuindo seis representantes indistin-
tamente a cada estado. Dessa forma, o Executivo buscava diminuir a influência
da oposição no Colégio Eleitoral e, portanto, na escolha presidencial.

A ideia do retorno imediato de eleições diretas para presidente da República


começou a tomar força quando, em 1982, o governo Figueiredo restabeleceu —
dentro da perspectiva de abertura política “lenta e gradual” que se desenvolvia
desde o governo anterior — as eleições diretas para os governos estaduais.

Fonte: http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/diretas-ja.

106
MIDIATECA

Para ampliar o seu conhecimento veja o material complementar da Unidade 4


disponível na midiateca.

NA PRÁTICA

Vamos imaginar na nossa sociedade um plebiscito sobre as “Diretas Já”, que,


no caso do contexto do ocaso da ditadura, foi uma votação parlamentar. Se
fosse um plebiscito democrático, como a população brasileira se comportaria?
Pela campanha popular com forte adesão da sociedade, imaginamos que, se
fosse um plebiscito popular, as Diretas teriam sido vitoriosas. No entanto, as
eleições requererem o voto obrigatório. Será que a nossa sociedade é a favor
do voto obrigatório ou opcional?

Existem alguns caminhos de reflexão, já que o voto opcional pode facilitar a


fraude ou sua comercialização. Vamos refletir sobre essa possibilidade no nos-
so contexto?

107
Resumo da Unidade 4

A conjuntura apresentada nesta unidade busca analisar no caso latino-americano o


processo de luta pela redemocratização e, com a crise das ditaduras e a remontagem
do processo constitucional, a reorganização partidária no sentido mais plural e a rearti-
culação dos movimentos sociais no novo cenário. No contexto dos anos 1970 e 1980,
houve um enfraquecimento do aparato autoritário aliado a um desinteresse dos EUA na
manutenção do apoio político a regimes que descumpriam a agenda de direitos civis e
políticos. A mudança do quadro político externo norte-americano na era pós-Guerra do
Vietnã marca uma virada na estratégia global orientada pela manutenção da hegemonia
norte-americana distante da perspectiva de apoio aos golpes autoritários que marcaram
o Brasil e o resto da América Latina nos anos 1960 e 1970.

CONCEITO

A nova ordem mundial dos anos 1990 representou o reforço de uma hierarquia
complexa na qual os EUA retiveram um lugar culminante na ordem dos gru-
pos imperialistas. Com ímpetos intervencionistas e pautados pela doutrina do
Choque das Civilizações, pressuposto da dualidade Oriente-Ocidente, os EUA
emplacaram políticas econômicas imperialistas e projetos de expansão de con-
tenção do chamado comunismo mundial.

Entendidos como uma segunda Guerra Fria, os anos 1990 representaram um


momento histórico de retração do Estado de Bem-estar e de uma política exter-
na belicosa e expansionista.

Os regimes militares latino-americanos, grupo que abrange o Brasil, vivenciou


uma sucessão de aberturas políticas como ensaio de regimes representativos
ainda que de forma gradual e limitadora. Alguns regimes entraram em colapso
por condições históricas internas, um movimento de pressão da sociedade ci-
vil, e outros, por condicionantes externos.

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