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ESPÍRITO SANTO
Diretor da série:
Prof. Dr. Francisco Gilson Rebouças Porto Junior
Universidade Federal do Tocantins (UFT), Brasil
Comitê Editorial e Científico:
Profa. Dra. Cynthia Mara Miranda
Universidade Federal do Tocantins (UFT), Brasil
Prof. Dr. João Nunes da Silva
Universidade Federal do Tocantins (UFT), Brasil
Prof. Dr. Luis Carlos Martins de Almeida Mota
Instituto Politécnico de Coimbra, Portugal
Prof. Dr. Nelson Russo de Moraes
UNESP - Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Brasil
Prof. Dr. Rodrigo Barbosa e Silva
Universidade do Tocantins (UNITINS), Brasil
Prof. Dr. Rogério Christofoletti
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Brasil
Prof. Dra. Maria Luiza Cardinale Baptista
Universidade de Caxias do Sul:Universidade Federal do Amazonas, Brasil
Profa. Dra. Thais de Mendonça Jorge
Universidade de Brasília (UnB), Brasil
Profa. Dra. Verônica Dantas Menezes
Universidade Federal do Tocantins (UFT), Brasil
Prof. Dr. Fagno da Silva Soares
CLIO & MNEMÓSINE Centro de Estudos e Pesq. em História Oral e Memória
Instituto Federal do Maranhão (IFMA)
Dr. Luís Francisco Munaro
Universidade Federal de Roraima (UFRR)
Dr. José Manuel Peláez
Universidade do Minho, Portugal
Prof. Dr. Geraldo da Silva Gomes
Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional do
Ministério Público do Tocantins, CESAF/MPTO
A festa do divino
ESPÍRITO SANTO
Memória e religiosidade em
Natividade-Tocantins
φ
Diagramação: Lucas Fontella Margoni
http://www.abecbrasil.org.br
222 p.
ISBN - 978-85-5696-133-4
INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 19
1.1. FESTAS RELIGIOSAS POPULARES E A SUA RELAÇÃO COM O SAGRADO E O PROFANO .......................... 35
1.2. A FOLKCOMUNICAÇÃO E SUA RELAÇÃO COM O SAGRADO E O PROFANO NA FESTA DO DIVINO ESPÍRITO SANTO ....... 40
1.3. A PERSPECTIVA DA HISTÓRIA ORAL: EM BUSCA DE UMA ABORDAGEM INTERDISCIPLINAR ................... 45
1.4. CAMINHOS METODOLÓGICOS: FOLKCOMUNICAÇÃO E HISTÓRIA ORAL ............................................ 50
11 Para ver mais sobre esse devoção à Terceira Pessoa da Trindade, que se
estende desde os estados germânicos à Península Ibérica, indico FÜLOP-
MILLER, René. Os Grandes Sonhos da Humanidade. Livraria Globo: Porto
Alegre, 1937.
12Entre estudiosos existe uma versão de que, embora a Rainha D. Isabel fez
construir um Império do Espírito Santo, o instituidor do culto ao Divino
Espírito Santo é o monge cisterciense Joaquim de Fiori que viveu de 1135 a
1202, sendo considerado um santo e cujo ideário havia se difundido na
Europa. A ele é atribuído a difusão de idéias que originou o franciscanismo,
na defesa de uma igreja mais ligada aos pobres. Com a colonização do Brasil,
presume-se que inúmeros adeptos da nova crença migraram para as terras
brasileiras, aí difundindo o culto ao Divino Espírito Santo (LEAL, 2004).
13Conforme as pesquisas que realizamos, o Bodo era os alimentos doados no
dia da festa, um presente do Espírito Santo aos seus devotos.
70 | A FESTA DO DIVINO ESPÍRITO SANTO: MEMÓRIA E RELIGIOSIDADE EM NATIVIDADE-TOCANTINS
15Outra teoria sobre o início da festa está em Piazza apud Pereira (2005, p. 25)
de que as festividades do Divino Espírito Santo são oriundas dos “Estados
Alemães” onde, inicialmente, foi praticada durante a dinastia dos Othons15 e
destinava-se a lançar fundamentos de uma instituição, que, na forma de um
banco formado de esmolas, acudisse aos pobres nos anos de penúria. Logo
depois nasceram os festejos religiosos que invocavam o culto ao Divino
Espírito Santo fazendo com que esse costume expandisse por toda a Europa
(ABREU, 1999).
16Há relatos de que na França, no século XVI, aconteciam os “royames” ou
“reynages”, onde reis e rainhas, geralmente os mecenas da festa, eram eleitos e
gozavam de soberania sobre os “irmãos” do santo padroeiro. [...] A pouca
presença dos “reinados” cristãos no período colonial pode ser fruto da
condenação que esses ritos vinham sofrendo na Europa pela Igreja oficial,
74 | A FESTA DO DIVINO ESPÍRITO SANTO: MEMÓRIA E RELIGIOSIDADE EM NATIVIDADE-TOCANTINS
segundo Yves-Marie Bercé, desde meados do século XVI. Lá, tais restrições
contribuíram para o desaparecimento da eleição de adultos – substituídos por
crianças – da caridade mútua e da ordem real para a realização de
divertimentos e alegrias, permanecendo apenas a organização da devoção.
POLIANA MACEDO DE SOUSA | 75
A vida no Planeta
É tudo tão lindo,
Mas meu pedido falou mais alto
Ohhh é a natureza
Chora em apelo
Igual uma mãe em dores de parto (2x)22
Figura 27 – Momento em que a Folia de Cima se prepara para sair para o Giro.
Foto: Poliana Macedo
A vida no Planeta
É tudo tão lindo,
Mas meu pedido falou mais alto
Ohhh é a natureza
54Na hora do almoço ou da “janta”, primeiro são servidos só os foliões. As
pessoas da casa, os visitantes e acompanhantes da Folia esperam até que todos
os da folia tenham comido para então fazerem seus pratos.
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Chora em apelo
Igual uma mãe em dores de parto (2x)55
que com ele não se brinca. Ainda mais, que tudo que for pedido
com fé para o Divino será atendido.
[...] na minha vida é tudo. Foi tudo pra mim, sabe? Não só
pelo fato de Rodrigo ter recuperado, mas, assim, a
convivência. Nasci vendo meus pais seguindo o Divino
Espírito Santo, que é a terceira pessoa da Santíssima
Trindade, e devoto mesmo. Creio no Espírito Santo sim e
pra mim é ele a pessoa. [...] Todos ficaram satisfeitos, o
povo nativitano, e pelo menos por onde eu passo, todos
falam que a festa foi muito boa e a gente fica só
agradecido, né? E se precisar de fazer outra, a gente tá
pronto! Pronto pra fazer outro!59
Para ela, a festa mexe muito com a fé. “Quem não tiver
fé, nem adianta vir em uma festa dessa para participar. Porque
isso aí é para quem tem fé e está na religião. Se você não tiver fé
e nem tá na religião, não adianta. A festa é linda demais! Você
larga tudo65”.
No local da arrumação, seja na casa do Imperador ou na
casa do Capitão do Mastro, homens e mulheres de todas as
idades trabalham em conjunto para cortar, fritar, pilar (em um
pilão de madeira) e colocar em recipientes plásticos as paçocas de
carne de sol, além de preparar, assar e empacotar os vários tipos
de biscoitos (biscoito do céu, bolacha, peta e amor-perfeito), que
serão distribuídos para a comunidade. Uma animação e
disposição sem fim. Ao som de forró, causos eram contados no
decorrer das atividades e fogos de artifícios eram disparados
como sinal de comunicação, tanto da casa do Imperador quanto
na casa do Capitão do Mastro, como resposta ao chamado de um
e do outro. Os foguetes continuam a noite toda.
que viriam ajudar apareciam e que pessoas com quem ele não
tinha contato, também apareceram para colaborar com o Divino.
Uma das questões abordadas pelo Imperador Julio Dias
Rocha foi que algumas pessoas que haviam colocado o nome
para a sorte67 do Divino pediram para que fosse retirado. E que,
até aquele dia (quinta-feira), não havia nenhum nome para a sorte.
O Imperador disse que “essa história é nossa e muita gente aqui
de Natividade não dá valor. Nós que somos nativitanos temos
que convencer nossos irmãos da importância de ter a festa do
Divino e, claro, de ajudá-los com essa tarefa do Divino”68.
O Padre Pedro complementou o pedido do Imperador e
disse que “ao retirar o nome da sorte do Divino é sinal de
rompimento com a tradição, pois se você colocou o nome, a
sorte e a festa não é você que vai realizar, mas sim, o Divino. Pois
o Divino que vai escolher o corpo em que ele quer agir para
realizar o dia da caridade entre a comunidade”69. Quando a missa
foi finalizada, os devotos formaram uma fila para beijar a
bandeira da Misericórdia e fazer pedidos ao Divino.
No segundo dia do Tríduo, sexta-feira, as atividades com
os últimos preparos para as solenidades envolvem todos os
foliões. Se os devotos terminam algum serviço e estão sem fazer
nada, já partem para auxiliar outro grupo em qualquer atividade,
seja na produção de bandeirolas, assando e preparando os bolos
(de arroz, de polvilho e bolo de mãe) que serão distribuídos no
domingo.
À noite, houve a benção das velas em tributo ao Pai,
sábado será ao Filho e Domingo ao Espírito Santo. Ainda
durante a missa, o Imperador Julio Dias Rocha tomou a palavra
antes do final e cantou a ladainha composta por ele e intitulada
“Roda Crítica Progressiva”, que fala sobre a falta de união dos
67Receber a sorte do divino é ser agraciado para ser festeiro da festa do ano
seguinte.
68Fala do imperador Julio Dias Rocha durante a missa do Tríduo ao Divino
Espírito Santo.
69Fala do Padre Pedro Novaes durante a missa do Tríduo ao Divino Espírito
Santo.
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Sobre a promessa que sua mãe (Nila) fez para que ele
recuperasse do acidente, Rodrigo diz que teve que carregar a
bandeira da Misericórdia no dia da Esmola Geral.
72Em 2010, para representar o Capitão foram colocados dois nomes e para
Imperador só um nome.
73 Valor definido pela Igreja.
POLIANA MACEDO DE SOUSA | 199
[...] tem ano que é mais baixa e tem ano que é mais alta, e
é melhor pra festa que é quando cai mais alta, porque já
passou a chuva, tem muita água no sertão, mas não tem
cheia e nem chuva. E aí fica melhor. Nesse ano que nós
estamos (2011) ela caiu bem alta, porque a festa foi em
junho. Né? E assim é melhor, né? [...] E, olhe. Tudo isso
tem é um processo natural, porque a natureza ela é um
poder criado pelo Criador. O Criador é Deus que é de
infinita sabedoria e misericórdia. Ele é da trindade
gloriosa, pai, filho e divino espírito santo. [...] Hoje você
anda na natureza e os varjão encheram de mato, os
chapadão fecharam e viraram tabuleiro e o campo, o
tabuleiro virou mato de roça. Acabou tudo. Você não vê
uma arara, não vê um papagaio, não vê um periquito, a
coisa mais difícil é você vê um veado do campo. [...] Mas
está totalmente diferente, o povo largou o sertão. Isso não
é culpa deles, foi o procedimento das transformações
políticas, sociais.
Festa do Divino tem início com a saída dos foliões. Jornal do Tocantins,
Caderno Arte & Vida, p. 02, 12 de abr de 1998.
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 3ª ed. São Paulo:
Atlas, 1991.
MATA, Luís Antonio Santos Nunes. Ser, ter e poder: o hospital do Espírito
Santo nos finais da Idade Média. Coleção História e Arte. Número 5.
Magno Edições &Câmara Municipal de Santarém: Leiria, 200. p.
21- 33
218 | A FESTA DO DIVINO ESPÍRITO SANTO: MEMÓRIA E RELIGIOSIDADE EM NATIVIDADE-TOCANTINS
MEIHY, José Carlos Sebe Bom. Manual de história oral. 5ª ed. - São
Paulo: Edições Loyola, 2005
em: <www.gpcir.sites.uol.com.br/ce/claudefranklin.pdf>.
Acesso em: 13 mai 2010.
SANTOS, João Rafael Coelho Cursino dos. A Festa do divino de São Luiz
de Paraitiga: o desafio da cultura popular na contemporaneidade. 2008,
226 f. Dissertação (Mestrado em História Social) Programa de
Pós-Graduação em História Social, Universidade de São Paulo,
2008.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
DEL PRIORE, Mary Lucia. Festas e utopias no Brasil colonial. São Paulo:
Brasiliense, 2000.