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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.

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A Utilidade e a Importância de
Credos e Confissões.
Porque Credos e Confissões são de vital importância.

Dr. Samuel

Miller

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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Título original em inglês: The Utility and Importance of Creeds and


Confessions. MILLER, Samuel.
Copyright ©2024 por Editora Credo Reformado. Todos os direitos de
tradução reservados.

M651u

Todas as citações bíblicas foram extraídas da versão Almeida Revista e


Atualizada (ARA), 2ª edição (Sociedade Bíblica do Brasil), salvo
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Tradução e edição: Rodrigo Gonçalez

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1. Teologia; 2. Doutrinas Cristãs; 3. Confessionalidade Reformada.

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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A Utilidade e a Importância de
Credos e Confissões.
Porque Credos e Confissões são de vital importância.

Dr. Samuel

Miller

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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SUMÁRIO

Prefácio......................................................................................................... 8
1. Porque Credos e Confissões São de Vital Importância...................... 12
2. Argumentos a Favor de Credos............................................................16
2.1. Sem um Credo explicitamente adotado, não é fácil verificar como
os ministros e os membros de uma igreja particular, e mais ainda de uma
grande denominação de cristãos, podem manter a unidade entre si.......18
2.2. A necessidade e a importância de Credos e Confissões tornam-se
evidentes quando consideramos que um dos principais objetivos ao se
estabelecer uma Igreja no mundo é que ela seja, em todas as épocas,
uma depositária, guardiã e testemunha da verdade................................ 25
2.3. A adoção e a publicação de um Credo [e de uma Confissão] são um
tributo à verdade e à sinceridade que cada igreja cristã deve às outras
igrejas e ao mundo ao seu redor............................................................. 30
2.4. Outro argumento a favor dos Credos, publicamente adotados e
mantidos, é que eles são favoráveis ao estudo da doutrina cristã e,
naturalmente, ao domínio do conhecimento cristão...............................33
2.5. É um argumento de considerável peso a favor dos Credos que a
experiência de todas as épocas os tenha considerado indispensáveis.... 38
2.6. Outro argumento a favor dos Credos e Confissões pode ser derivado
do notável fato de que os seus opositores mais fervorosos geralmente
foram os liberais e os hereges................................................................ 43
2.7. Um argumento adicional a favor dos Credos é observar que os
opositores mais fervorosos dos credos acabam empregando-os na prática
em procedimentos eclesiásticos............................................................. 46
3. Respostas para Objeções aos Credos................................................... 51
3.1. E a primeira que mencionarei é que formar um determinado Credo
[ou Confissão] e exigir a subscrição dele como um teste religioso, seria
superar a Bíblia e fazer de uma composição humana, ao invés da Bíblia,
um padrão de fé..................................................................................... 51
3.2. Outra objeção frequentemente feita aos Credos da igreja é que eles
interferem nos direitos de consciência e, naturalmente, levam à
opressão.................................................................................................. 58

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3.3. Uma terceira objeção frequentemente levantada contra a subscrição


aos Credos e Confissões é que isso é prejudicial à livre investigação... 71
3.4. Uma quarta objeção comum contra os Credos é que eles falharam
em cumprir completamente o propósito que se dizia ser destinado à eles.
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3.5. A última objeção que vou considerar é que a adesão aos Credos [e
Confissões] não só falhou em gerar os benefícios esperados por seus
defensores, mas, ao contrário, foi identificada como uma fonte de males
opostos, fomentando discórdia e conflitos............................................. 82
4. A Extensão dos Credos..........................................................................87
5. Um Outro Exemplo: A Questão do Batismo Infantil......................... 90
6. Considerações Finais............................................................................. 94
6.1. A partir das considerações que foram apresentadas, nós podemos
observar quão pouca razão existe para temer os Credos como
instrumentos de opressão....................................................................... 94
6.2. Nós podemos observar, a partir do que foi dito, que subscrever um
Credo da igreja não é uma mera formalidade, mas um rito muito solene,
que significa muito e implica em obrigações muito sérias.....................96
6.3. Diante da perspectiva apresentada sobre este assunto, nós podemos
determinar como um homem honesto deve agir após subscrever a um
Credo público....................................................................................... 100
6.4. Nós refletimos, a partir da representação que foi apresentada, sobre
quão fácil é para um único ministro imprudente ou insensato causar
danos extensos e irreparáveis à igreja.................................................. 104
6.5. Nós podemos inferir, a partir do que foi dito, o dever e a
importância de todos os membros, especialmente os ministros da Igreja
Presbiteriana, esforçarem-se para difundir o conhecimento de seus
padrões públicos................................................................................... 108
6.6. Mais uma vez, se os princípios anteriores forem justos, então como
é infeliz o equívoco daqueles que imaginam que, ao abandonar todos os
Credos e todas as Confissões, estão prestes a prestar um serviço
essencial à igreja, do que edificá-la de maneira mais extensiva e gloriosa
do que nunca!....................................................................................... 112
Sobre o Autor........................................................................................... 117

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Prefácio

Desde os primeiros momentos da História da Igreja Cristã,


ou seja, a Igreja do Novo testamento, ela não apenas proclamou
fervorosamente a verdade das Sagradas Escrituras, mas também
enfrentou, com firmeza e determinação, distorções e desvios
drásticos da verdade bíblica. Os próprios escritos inspirados do
Novo Testamento buscam corrigir os desvios doutrinários que
surgiram logo no primeiro século, poucos anos após a morte do
Senhor Jesus Cristo. Dessa forma, os cristãos são sempre
encorajados a lutar com todas as suas forças, em todas as épocas,
e a batalhar “diligentemente, pela fé que uma vez por todas foi
entregue aos santos” (Judas 3).

Portanto, já a partir do primeiro século e ao longo dos


seguintes diversas heresias horríveis surgiram, representando
sérias ameaças à integridade e à pureza da fé cristã. Os grandes
Credos da História da Igreja, como o Credo Niceno e o Credo de
Calcedônia, por exemplo, foram meticulosamente elaborados por
Concílios de eminentes teólogos em resposta a essas visões
heréticas, que lançaram sombras sobre os princípios fundamentais
da doutrina cristã. Esses credos não apenas reafirmaram os
ensinamentos ortodoxos, bíblicos, mas também serviram como
baluartes contra as correntes de pensamento que tentavam
subverter a verdade revelada nas Escrituras.

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Isso também é verdadeiro para as confissões históricas dos


séculos 16 e 17, como por exemplo as conhecidas “Três Formas
de Unidade” (Confissão Belga, Catecismo de Heidelberg e os
Cânones de Dort) e os Padrões de Westminster (Confissão de Fé,
Catecismos Maior e Breve). Essas confissões representaram uma
tentativa cuidadosa e precisa de cristalizar a essência da doutrina
encontrada nas Sagradas Escrituras. Elas nunca devem ser
interpretadas como um substituto das Escrituras ou como
possuindo autoridade sobre a Palavra de Deus. Os credos e as
Confissões, assim como os Catecismos reformados, nunca
tiveram esse ousado propósito e em seus artigos, perguntas e
respostas, eles se protegem contra tal erro primário. E
permanecem assim.

Pelo contrário, essas confissões oferecem um resumo


conciso e fiel do que os cristãos reformados crêem, expressando
os fundamentos da ortodoxia confessional. Ao fazê-lo, fornecem
um quadro claro e coeso da fé cristã, delineando os princípios
fundamentais que orientam a compreensão e a prática da vida
cristã. Assim, as confissões históricas desempenham um papel
vital na preservação e na transmissão da fé bíblica, servindo como
guias confiáveis e verificáveis por qualquer pessoa, além de
pontos de referência para a compreensão e a interpretação das
Escrituras Sagradas dentro da comunidade cristã reformada.

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Com este propósito, este ebook traz a tradução de uma das


aulas/palestras ministradas pelo Dr. Samuel Miller, professor e
ministro presbiteriano, aos seus alunos da Universidade de
Princeton. Leia (e ouça em sua própria consciência) atentamente
tudo o que o Rev. Miller disse aos seus alunos, e veja que o seu
discurso parece mais atual do que as aulas que serão ministradas
amanhã em nossos principais seminários teológicos,
principalmente os confessionais.

As suas palavras são bastante precisas, atacam os problemas


reais e propõe soluções muito práticas. É impressionante como os
problemas enfrentados pela Igreja Presbiteriana dos Estados
Unidos no século 19 com relação à sua confessionalidade é o
mesmo que nós enfrentamos hoje. Os mesmos ataques, o mesmo
desprezo, a mesma rejeição.

Por desprezarem os seus profetas, esta denominação


sucumbiu ao liberalismo teológico e deixou de ser, há décadas,
uma igreja fiel, assim como de ser uma voz profética à nação
americana. Outras denominações surgiram dela, como a Orthodox
Presbyterian Church (OPC) e a Presbyterian Church of America
(PCA), que ainda hoje permanecem fiéis - pelo menos em grande
medida. Mas a igreja tão amada pelo Rev. Miller, que teve
expoentes teológicos como o Dr. Charles Hodge e B. B. Warfield
no passado, morreu espiritualmente por abandonar os seus
princípios confessionais.

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Que nós possamos agir como o Rev. Miller (e tantos outros),


o qual preocupou-se com a honesta preservação da
confessionalidade reformada e lutou até o fim por sua
manutenção. Confessionalidade é importante? Sem sombra de
dúvidas! São de vital importância! Portanto, leia este livro.
Deguste-o. Medite em suas palavras. Ouça os verdadeiros
profetas do passado, e prosperareis. Retornemos às antigas
veredas, ao bom caminho (cf. Jeremias 6.16), e que não venhamos
sucumbir diante das incríveis seduções do nosso tempo presente.

Soli Deo Gloria!

Rodrigo Gonçalez
Tradutor e editor.

Fevereiro de 2024.

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1. Porque Credos e Confissões São de Vital


Importância.

O caráter e a situação daquele que se prepara para o sagrado


ofício são fascinantes. Estão além do poder que a linguagem pode
expressar. Tal pessoa, como o Mestre a quem ele professa amar e
servir, está “destinado tanto para ruína como para levantamento
de muitos em Israel e para ser alvo de contradição” (Lucas 2.34).
O bem-estar temporal e eterno dele e de milhares pode estar
envolvido em tudo que ele é e em tudo o que ele faz. Por todos os
lados, ele está cercado de perigos.

Quaisquer que sejam os seus talentos e os seus


conhecimentos, se não houver uma piedade genuína
neles, provavelmente serão uma maldição para a
Igreja, em vez de serem uma bênção para ela.

Ele está exposto a mais do que apenas um perigo. Ele pode


possuir piedade sincera, talentos e conhecimento. No entanto,
devido à sua indiscrição habitual, à falta de sobriedade mental -
tão valiosa para todos, mas especialmente para aqueles em cargos
públicos - à sua inclinação por novidades e inovações, ou ao seu
amor pela distinção, tão natural aos homens, ele pode acabar não
edificando o “corpo de Cristo”, e se tornar um perturbador de

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sua paz e aquele corrompe a sua pureza; de modo que quase


poderíamos dizer que, seja qual for o resultado em relação a ele
mesmo, “teria sido bom para a igreja se ele nunca tivesse
nascido” (Mateus 26.24).

Daí a razão pela qual cada parte do caráter daquele que se


apresenta para o sagrado ministério - as suas opiniões, o seu
temperamento, as suas realizações, fraquezas e, acima de tudo, o
seu caráter como um cristão prático - é de importância
inestimável para a comunidade eclesiástica da qual ele está
destinado a ser ministro. Nada que lhe diga respeito é
desinteressante. Se fosse possível, para ele, estritamente falando,
“viver para si mesmo” ou “morrer para si mesmo” (Romanos
14.7), a situação seria diferente. Mas não é possível. As suas
deficiências, assim como as suas excelências, os seus dons e as
suas graças, assim como os pontos fracos de seu caráter, devem e
terão todo o seu efeito apropriado em tudo o que ele toca.

Você pode se questionar o motivo, ao orientar a formação de


candidatos para este ofício elevado e sagrado, nós sentimos uma
responsabilidade tão solene, até mesmo aterradora. Por que, tendo
adquirido um pouco mais de experiência neste ofício antes de
você, temos a maior preocupação a cada passo que você dá? Por
que insistimos diariamente para você “tem cuidado de ti mesmo e
da doutrina” (1 Timóteo 4.16) e por que imploramos
incessantemente para que você se esforce ao máximo para se

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apresentar a Deus e à Sua Igreja como servos competentes e fiéis?


Mesmo sem qualquer obrigação oficial, se nós não sentíssemos e
agíssemos dessa maneira, estaríamos demonstrando uma
insensibilidade inescusável e degradante tanto para os interesses
da igreja quanto para o seu verdadeiro bem-estar.

Devido à nossa profunda preocupação com o seu


desenvolvimento em todas as formas de preparação para o
ministério, não só nos esforçamos para conduzir o curso regular
de sua instrução da maneira que nós cremos ser mais propícia
para promover o principal objetivo de todos os seus estudos, mas
também utilizamos a oportunidade proporcionada por esta “Aula
Geral” (introdutória a cada sessão) para destacar uma série de
tópicos que não estão incluídos no curso regular de nossa
instrução.

Um assunto dessa natureza envolverá nossa atenção na


presente ocasião: a importância de credos e confissões para
manter a unidade e a pureza da igreja visível.

Este é um tópico que, embora pertença ao departamento de


Governo da Igreja, tem sido omitido nas “Aulas Gerais”,
normalmente ministradas nesta divisão de nossos estudos, devido
à falta de tempo. Sinto-me inclinado a trazer este assunto à sua
atenção agora, pois, como mencionei, ele pertence ao
departamento que me foi confiado; é um tópico de grande

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interesse e importância; tem sido alvo de críticas severas por parte


de liberais e hereges nos últimos anos; e, embora seja plenamente
justificado pela razão, pelas Escrituras e pela experiência
universal, muitos, especialmente sob o governo livre que temos a
sorte de desfrutar, se opõem ao que consideram e às vezes
chamam de “rigor” excessivo e até “tirania” na exigência de
adesão a artigos de fé.

Meu objetivo é, primeiro, oferecer algumas observações


sobre a utilidade e a importância de credos escritos; e em segundo
lugar, responder a algumas das objeções mais comuns e plausíveis
que têm sido feitas contra eles por seus adversários.

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2. Argumentos a Favor de Credos.

Definição: Por Credo, ou Confissão de Fé, entendo uma


exposição, em linguagem humana, daquelas grandes doutrinas
que são cridas por quem as elaborou como ensinadas nas
Sagradas Escrituras. Tais doutrinas são delineadas em ordem
regular, com o propósito de determinar até que ponto aqueles que
desejam unir-se em comunhão eclesiástica realmente concordam
nos princípios fundamentais do Cristianismo.

Credos e Confissões de Fé não afirmam ser em si mesmos


leis da Igreja de Cristo, nem atos legislativos pelos quais qualquer
conjunto de opiniões sejam constituídos como verdades e que, por
esse motivo, devem ser aceitos como verdades entre os membros
de sua família.

Os Credos apenas professam ser resumos extraídos


das Escrituras de algumas das grandes doutrinas do
evangelho que são ensinadas pelo próprio Cristo.
Aquelas pessoas que elaboram este resumo em cada
caso concordam em considerá-lo importante e
concordam em torná-lo o teste de sua união religiosa.

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Os Credos e as Confissões de Fé não pretendem tornar algo


verdadeiro que não o era antes ao compor esse resumo, nem
estabelecem uma obrigação de acreditar em algo que não estava
previamente imposto pela autoridade de Cristo.

No entanto, eles simplesmente o encaram como uma lista


das principais verdades que a Bíblia ensina, que, naturalmente,
todos os seres humanos deveriam acreditar, pois a Bíblia as
ensina. Além disso, uma certa parte da igreja católica visível1
concorda em considerá-lo uma fórmula pela qual podem se
conhecer e se entender.

Agora, afirmo que a adoção de tal credo não é apenas


legal e conveniente, mas é também necessária e
indispensável para a harmonia e a pureza da igreja
visível.

Para estabelecer essa posição, peço que prestem atenção às


seguintes considerações.

1
Católica no sentido de universal, como a reunião de todos os eleitos por toda a parte. Não confundir com
a igreja romana, papista e apóstata.

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2.1. Sem um Credo explicitamente adotado, não é fácil


verificar como os ministros e os membros de uma igreja
particular, e mais ainda de uma grande denominação de
cristãos, podem manter a unidade entre si.

Se cada cristão fosse um indivíduo isolado, que investigasse,


sentisse e agisse apenas para si mesmo, nenhum credo de
formação humana seria necessário para o seu avanço em
conhecimento, conforto ou santidade. Com a Bíblia em seu
armário, e com seus olhos abertos para ver as maravilhas que ela
contém (Salmo 119.18), ele teria tudo o que seria necessário para
a sua edificação. Mas o caso é bem diferente.

A igreja é uma sociedade: uma sociedade que, por mais


ampla que seja, é “um corpo em Cristo”, e todos que a compõem
são “membros uns dos outros” (Romanos 12.5). E essa sociedade
não é apenas requerida a ser uma em nome, ou a reconhecer uma
união meramente teórica; mas também cuidadosamente a manter
“a unidade do Espírito no vínculo da paz” (Efésios 4.3). Eles são
exortados a permanecer “firmes em um só espírito, como uma só
alma” (Filipenses 1.27). São todos ordenados a “falar a mesma
coisa” e a serem “de um mesmo parecer” (1 Coríntios 1.10;
Filipenses 2.2). E essa “unidade de espírito” é tão essencial para o
conforto e edificação daqueles que estão unidos em comunhão da
igreja, quanto é para cumprir o mandamento de seu Mestre.

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“Andarão dois juntos, se não houver entre eles acordo?” (Amós


3.3).

Pode um grupo de adoradores, composto por


calvinistas, arminianos, pelagianos, arianos e
socinianos, orar, pregar e terem comunhão juntos, de
maneira proveitosa e confortável, cada um mantendo
os sentimentos, as emoções e a linguagem
apropriados à sua denominação? Isso realmente
transformaria a casa de Deus em uma Babel
miserável. E como!

Aqueles que veem Jesus Cristo como Deus, igual ao Pai, e o


adoram dessa maneira, e aqueles que veem tal adoração como
idolatria repugnante; aqueles que renunciam a qualquer
dependência de suas próprias obras ou méritos para justificação
diante de Deus, confiando apenas em sua generosa graça, “pela
redenção que está em Cristo Jesus” (Romanos 3.24), e aqueles
que veem tal dependência como fanatismo, considerando a justiça
do homem como a única base de esperança; será que pessoas com
essas visões e sentimentos diametralmente opostos sobre o
assunto mais importante de todos podem se unir construtivamente
nas mesmas orações, ouvir as mesmas instruções todos os

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domingos e sentar-se confortavelmente juntas à mesma mesa


sacramental?

Se é assim, poderiam judeus e cristãos adorarem juntos no


mesmo templo. Eles devem ser completamente indiferentes aos
grandes temas que os dividem, ou todo o seu convívio deve
resultar em discórdia e sofrimento. Uma assembleia tão desunida
pode falar sobre comunhão na igreja, mas será que eles realmente
desfrutam da comunhão que a Bíblia descreve como tão valiosa, e
que os devotos se deleitam tanto em cultivar?

Isso é impossível - tão impossível quanto: “Não vos ponhais


em jugo desigual com os incrédulos; porquanto que sociedade
pode haver entre a justiça e a iniquidade? Ou que comunhão, da
luz com as trevas? Que harmonia, entre Cristo e o Maligno? Ou
que união, do crente com o incrédulo?” (2 Coríntios 6.14-15).

Tendo em vista essas considerações como autoevidentes,


pergunto, como uma igreja pode se proteger dessa discórdia
prejudicial, desse conflito perpétuo de sentimentos, se não por
meio de palavras e de conduta, que inevitavelmente ocorrerão
quando ela é composta por documentos tão heterogêneos?

Além disso, como uma igreja pode evitar a culpa de abrigar


em seu seio e de apoiar em sua comunhão as piores heresias que
já envergonharam o nome cristão? Não é suficiente, para atingir
esse objetivo, que todos os admitidos professam concordar em

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receber a Bíblia, pois muitos que se autodenominam cristãos e


professam seguir a Bíblia mantêm opiniões e usam uma
linguagem tão estranha, sim, tão oposta às opiniões e à linguagem
de muitos outros que igualmente se afirmam cristãos e professam
receber a Bíblia, quanto aparentam tão enormes discordâncias
com ela. Daqueles que concordam com essa profissão geral, a
maioria reconhece como de autoridade divina todo o cânon
sagrado, conforme o recebemos, enquanto outros rejeitariam
capítulos inteiros e alguns até mesmo livros inteiros do volume da
vontade revelada de Deus.

Os ortodoxos mantêm a inspiração plena das Escrituras,


enquanto alguns que insistem que são cristãos negam totalmente
sua inspiração. Em resumo, há multidões que, professando
acreditar na Bíblia e segui-la, rejeitam cada doutrina fundamental
que ela contém. Isso era assim no início, bem como permanece
agora.

Um apóstolo inspirado declara que, em seu tempo, alguns -


que não apenas professavam acreditar nas Escrituras, mas até
mesmo “pregavam Cristo” (Filipenses 1.15-16) - realmente
pregavam “outro evangelho”, cujos mestres ele encarrega aqueles
a quem escreveu de considerar “amaldiçoados” (Gálatas 1.6-9); e
ele assegura que há algumas “heresias” tão profundas e radicais
que devem ser consideradas “condenáveis” (2 Pedro 2.1).
Certamente aqueles que mantêm o verdadeiro evangelho não

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podem “caminhar juntos” em “comunhão da igreja” com aqueles


que são “amaldiçoados” por pregar “outro evangelho” e que
defendem “heresias condenáveis”, cujos defensores os discípulos
de Cristo não são permitidos sequer “receber em suas casas” ou
“desejar boa viagem!” (2 João 10).

Portanto, pergunto mais uma vez, como os membros de uma


igreja podem garantir que estejam, de acordo com o mandamento
divino, “de um só pensamento” e “de um mesmo caminho”? Eles
podem exigir que todos que entram em sua comunhão professem
uma crença na Bíblia; sim, podem exigir que essa profissão seja
repetida todos os dias e, no entanto, podem ser corrompidos e
divididos por todas as formas da mais grosseira heresia. Essa
profissão, é evidente, não garante concordância; não é um vínculo
de união real, uma garantia de comunhão espiritual. Deixa tudo
dentro da gama do cristianismo nominal tão perfeitamente
indefinido e exposto à discordância total quanto antes.

No entanto, talvez seja proposto como um remédio mais


eficiente que haja um entendimento privado, rigorosamente
seguido, de que não sejam admitidos ministros ou membros,
exceto aqueles que sejam conhecidos, por meio de conversas
privadas com eles, por concordar substancialmente com o corpo
original, tanto em relação à doutrina quanto à ordem.

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Dessa forma, alegam alguns, a discórdia pode ser banida, e


uma igreja mantida pura e pacífica, sem a presença odiosa de
credos e confissões.

A essa proposta, respondo, em primeiro lugar, que, para


todos os efeitos, isso equivale a apresentar um credo e exigir
subscrição a ele, enquanto o contrário é insinuado e professado. É
fazer uso de um teste religioso da maneira mais rigorosa, sem a
honestidade ou a coragem de o afirmar. Pois, qual é a
importância, no que diz respeito ao verdadeiro espírito do
procedimento, se o credo for reduzido à escrita ou registrado
apenas nas mentes dos membros da igreja, e aplicado por eles
como corpo, se ele igualmente exclui candidatos que não são
aprovados?

Mas a esta proposta de remédio, respondo, em segundo


lugar, que a questão “O que é solidez na fé?” mesmo que seja
explicitamente acordada pelos membros da igreja entre si, não
pode ser deixada com segurança ao entendimento e à memória de
cada indivíduo pertencente ao corpo em questão. Tão bem poderia
a constituição civil de um Estado, em vez de ser reduzida por
escrito, ser deixada às impressões vagas e sempre variáveis dos
cidadãos individuais que vivem sob ela. Em uma tal constituição,
todos veem que não poderia haver certeza nem estabilidade.
Dificilmente dois varejistas de seus artigos concordariam
perfeitamente; e as mesmas pessoas a interpretariam de forma

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diferente em momentos diferentes, conforme os seus interesses ou


as paixões pudessem prevalecer.

Igualmente irracional e inseguro, para dizer o mínimo, seria


deixar o instrumento de comunhão de uma igreja em uma situação
semelhante. Tal credo oral, quando mais necessário como meio de
acalmar distúrbios ou de excluir a corrupção, seria colocado em
dúvida e, naturalmente, inútil, tendo as suas disposições mais
importantes questionadas de todos os lados; em um caso em que,
se fosse aplicado, seria muito mais provável ser pervertido em um
instrumento de opressão popular do que ser usado como meio de
governo sóbrio e saudável.

Portanto, a conclusão torna-se bastante evidente:


nenhuma igreja pode esperar manter uma identidade
coesa; nenhuma igreja pode assegurar pureza ou
harmonia, nem que seja por um único ano; em outras
palavras, nenhuma igreja pode eficazmente se
resguardar contra os mais elevados graus de
corrupção e desacordo, a menos que adote
explicitamente algum teste de verdade em sua
capacidade eclesiástica. Esse teste deve ser algo
registrado, publicamente conhecido e pronto para ser
referido quando necessário. Não deve ser aceito
apenas por membros individuais, mas também pela
igreja como um todo, como um elo de união.

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Em outras palavras, uma igreja, a fim de “preservar a


unidade do Espírito no vínculo da paz” (Efésios 4.2–3), deve ter
um credo - um credo escrito - que ela tenha dado formalmente o
seu consentimento, e por meio do qual as suas ministrações estão
comprometidas. Enquanto um teste desse tipo for aplicado
fielmente, ela não deixará de estar unida e harmoniosa em algum
grau. E quando nada do tipo é empregado, não vejo como se pode
esperar que ela, sem um milagre, escape de todos os males da
discórdia e da corrupção.

2.2. A necessidade e a importância de Credos e Confissões


tornam-se evidentes quando consideramos que um dos
principais objetivos ao se estabelecer uma Igreja no mundo é
que ela seja, em todas as épocas, uma depositária, guardiã e
testemunha da verdade.

Os cristãos, coletiva e individualmente, são representados


nas Escrituras como testemunhas de Deus. São ordenados a
manter a Sua verdade e a “expor a Palavra da vida” em toda a
sua pureza e brilho perante uma geração perversa, a fim de que
outros possam ser iluminados e convertidos. São exortados a
“comprar a verdade e não a vendê-la” (Provérbios 23.23), a
“batalhardes, diligentemente, pela fé que uma vez por todas foi
entregue aos santos” (Judas 1.3), a manter “o padrão das sãs

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palavras que de mim ouviste com fé e com o amor que está em


Cristo Jesus” (2 Timóteo 1.13) e “lutando juntos pela fé
evangélica” (Filipenses 1.27). Esses e muitos outros
mandamentos de natureza similar deixam claro que é dever de
cada igreja cristã detectar e expor heresias prevalentes, excluir
todos aqueles que abraçam heresias radicais de sua comunhão e a
“levantar um estandarte” para a verdade sempre que “o inimigo
vier como uma inundação”.

Mas tudo isso não implica a adoção de medidas eficazes


para distinguir entre verdade e erro? Isso não implica
necessariamente o dever de traçar e manifestar publicamente uma
linha divisória entre aqueles que, embora professando em geral
crer na Bíblia, negam realmente todas as suas doutrinas
essenciais, e aqueles que simples e humildemente recebem “a
verdade que está em Jesus”? No entanto, como essa distinção
pode ser feita, visto que aqueles que abraçam as doutrinas
essenciais do evangelho professam igualmente receber a Bíblia?

Isso só pode ser feito ao se certificar cuidadosamente


e declarar explicitamente como a igreja, ela mesma, e
como aqueles que ela suspeita de erro entendem e
interpretam a Bíblia: ou seja, ao extrair certos artigos
de fé das Escrituras, de acordo com o seu
entendimento delas, e comparar esses artigos com a

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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crença professada daqueles que ela supõe serem


hereges.

E isso não é senão extrair das Escrituras uma confissão de fé


- um credo - e aplicá-lo como um teste de princípios saudáveis.
Realmente me parece que os irmãos ortodoxos que reconhecem a
obrigação e a importância de um grande dever, mas rejeitam
credos e confissões, são, no mais alto grau, inconsistentes
consigo mesmos.

Eles reconhecem a obrigação e a importância de um grande


dever, mas rejeitam o único meio pelo qual ele pode ser
cumprido. São tão irracionais, devo dizer, quanto os “opressores
do Egito”, pois exigem que o trabalho seja feito, sem permitir que
os materiais necessários sejam concedidos para a sua realização.

Antes que a igreja, como tal, possa detectar hereges e


excluí-los de seu seio - antes que ela possa levantar a voz em “um
dia de repreensão e blasfêmia” contra erros predominantes - os
seus governantes e membros devem concordar com o que é a
verdade. E, a menos que desejem se entregar, em seus
julgamentos oficiais, a todos os caprichos e efervescências febris
de sentimentos ocasionais, eles devem possuir um documento
acreditado e permanente que exiba o que concordaram em
considerar como verdade. Realmente não há outra alternativa

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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viável. Eles devem ter “uma forma de palavras sãs” que adotaram
voluntariamente e se comprometeram a “apegar-se” uns aos
outros, ou não podem ter segurança de que duas ou mais decisões
sucessivas sobre a retidão na fé serão semelhantes. Em outras
palavras, eles não podem alcançar, de forma consistente e
uniforme, um dos grandes propósitos para os quais a igreja visível
foi estabelecida.

Certamente, uma pessoa ponderada não afirmaria que a


igreja ou qualquer um de seus membros individuais possa cumprir
adequadamente o dever em questão simplesmente proclamando
de tempos em tempos, no meio do erro circundante, a sua adesão
e o seu compromisso com a Bíblia. Deve ficar claro que isso não
constituiria uma verdadeira ação como “testemunhas da verdade”
(João 18.37), pois não seria algo distintivo, nada que todo herege
no Cristianismo não esteja pronto para fazer, ou, mais
precisamente, não esteja fazendo diariamente, tão alto e
frequentemente quanto a igreja mais ortodoxa.

A própria ideia de “dar testemunho da verdade” e de se


separar daqueles que são tão corruptos que a comunhão cristã não
pode ser mantida com eles, implica necessariamente em algum
ato público de discriminação, no qual a igreja concorda e expressa
a sua crença nas grandes doutrinas do Cristianismo, em
contraposição àqueles que creem erroneamente.

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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Agora, supor que algo desse tipo possa ser alcançado,


fazendo uma profissão, exatamente a mesma em
todos os aspectos com a dos piores hereges, é
manifestamente absurdo para satisfazer qualquer
pesquisador sóbrio.

De que importância, devo perguntar, teriam sido os


Valdenses e Albigenses como testemunhas da verdade, como
faróis em meio à escuridão da corrupção circundante,
especialmente que relevância teriam tido para a igreja em épocas
posteriores e para nós nos dias atuais, se eles não tivessem
formulado e transmitido à posteridade aquelas renomadas
confissões de fé, tão preciosas quanto memoráveis, que nós
encontramos em sua história? Essas confissões servem como
monumentais testemunhos do verdadeiro “evangelho da graça de
Deus” (Atos 20.24).

Sem essas confissões, como nós teríamos conhecido de que


maneira eles interpretavam a Bíblia, ou em que diferiam dos
hereges mais grosseiros que viveram na mesma época e
professavam receber a mesma Bíblia? Sem essas confissões,
como nós teríamos visto com tanta clareza e satisfação como
vemos agora que eles mantiveram a verdade e a ordem da casa de
Cristo, no meio de todas as desolações causadas pelo “homem do
pecado” (2 Tessalonicenses 2.3); e assim cumpriram a promessa

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de que sempre haverá “uma descendência para servi-lo, que será


considerada pelo Senhor como uma geração” (Salmo 22.20)?

2.3. A adoção e a publicação de um Credo [e de uma


Confissão] são um tributo à verdade e à sinceridade que cada
igreja cristã deve às outras igrejas e ao mundo ao seu redor.

Todo homem sábio desejará se unir em dever religioso e


privilégio àqueles que mais se aproximam de suas opiniões em
doutrina e ordem - àqueles com quem ele pode ser mais feliz e
melhor edificado.

Naturalmente, ele desejará, antes de se juntar a


qualquer igreja, saber algo sobre a sua fé, algo de seu
governo e do caráter geral desta igreja.

Vou supor que um indivíduo piedoso e sincero está prestes a


formar as suas conexões religiosas para a vida. Ele olha ao redor
das igrejas às quais tem mais acesso e anseia por decidir com qual
delas ele pode estar mais confortável. Vou supor que, nessa
pesquisa, ele volta os seus olhos para a igreja verdadeiramente
bíblica e primitiva, à qual nós temos a felicidade de pertencer. Ele

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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deseja conhecer a doutrina, bem como a ordem que ele pode


esperar encontrar em conexão com o nosso corpo.

Como ele pode saber disso?

Certamente não indo de igreja em igreja em todo o nosso


território e aprendendo a confissão de fé de cada ministro
individual de sua própria boca. Isso seria fisicamente impossível,
sem dedicar ao trabalho uma quantidade de tempo e esforço que
dificilmente qualquer homem poderia suportar. Ele não poderia
realmente ouvir por si mesmo as doutrinas ensinadas em um
vigésimo de nossos púlpitos. E se ele pudesse, ainda assim seria
incapaz de decidir, apenas por esta fonte, até que ponto o que
ouviu poderia ser considerado como o caráter uniforme e
universal, e especialmente como o caráter permanente da igreja, e
não como uma exibição acidental.

Mas quando um tal inquiridor descobre que nós temos um


credo publicado, declarando como entendemos as Escrituras e
declarando explicitamente, em detalhes, as grandes verdades nas
quais concordamos juntos em mantê-las, ele pode descobrir em
algumas horas, e sem sair de sua própria casa, o que nós
professamos crer e praticar, e até onde ele pode esperar estar em
casa em nossa comunhão. E enquanto ele está habilitado a
entender o sistema ao qual professamos aderir, ele nos permite

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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entender as suas opiniões, descobrindo até que ponto elas estão de


acordo com o nosso credo publicado.

Além disso, o que é devido a indivíduos sinceros que


desejam conhecer o verdadeiro caráter de nossa igreja é devido
também às igrejas vizinhas, que podem ter o mesmo desejo de
saber os princípios que abraçamos. É delicioso para comunidades
eclesiásticas, que se aproximam em fé e ordem, manifestar o seu
afeto um pelo outro, nutrindo algum grau de intercâmbio cristão.

Qual igreja, que preza pela preservação de sua própria


pureza e paz, se aventuraria em tal comunhão com um corpo que
não tem um sistema definido - seja doutrinário ou de governo - ao
qual está comprometida e que, portanto, poderia se tornar uma
fonte de poluição e desordem para qualquer outra igreja com a
qual tenha o mínimo de comunhão de serviços?

Um dos ministros de tal denominação, quando convidado


para o púlpito de um irmão ortodoxo, pode dar total satisfação;
enquanto o próximo a quem uma marca semelhante de afeto e
confiança cristã for demonstrada pode pregar a heresia mais
corrupta.

Portanto, credos e confissões, ao contrário de ter uma


tendência a “alienar” e “amargar” essas denominações cristãs
que pensam de maneira semelhante e devem manter vínculo
fraternal, realmente tendem a torná-las conhecidas umas para as

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outras; a lançar uma base para o intercâmbio regular e cordial; a


gerar confiança mútua; e, assim, promover a harmonia da Igreja
de Deus.

Logo, não hesito em afirmar que, em todas as épocas, as


igrejas cristãs que se destacaram de forma mais honrosa por sua
piedade, zelo e aderência à simplicidade do evangelho foram
notáveis não apenas por sua atenção ao estabelecimento de seu
credo doutrinário, mas também por sua sinceridade na declaração
dele e sua disposição em tornar claro para todos ao seu redor
quais eram as doutrinas fundamentais de nossa santa religião que
professavam acreditar.

2.4. Outro argumento a favor dos Credos, publicamente


adotados e mantidos, é que eles são favoráveis ao estudo da
doutrina cristã e, naturalmente, ao domínio do conhecimento
cristão.

É o princípio geral dos inimigos dos credos que todos os que


professam acreditar na Bíblia devem, sem mais investigações,
unir-se, manter a comunhão eclesiástica e viver juntos em paz.
Mas não é evidente que a única maneira pela qual aqueles que
diferem essencialmente uns dos outros em relação às doutrinas
fundamentais do evangelho podem viver juntos em comunhão

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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eclesiástica perfeitamente harmoniosa é tornando-se indiferentes à


verdade.

Em outras palavras, convencendo-se de que as formas de fé


têm pouca ou nenhuma importância prática para a igreja e,
portanto, não valem a pena lutar por elas, fica uma pergunta: que
visões claras e discriminatórias da doutrina cristã são
completamente desnecessárias e de pouca utilidade na formação
do caráter cristão?

Mas na medida em que os cristãos professos são indiferentes


à verdade, não serão propensos a negligenciar o estudo dela? E se
o estudo for geralmente negligenciado, a ignorância grosseira e
lamentável dela não prevalecerá eventualmente e geralmente?

A verdade é que, quando os homens amam a verdade


do evangelho o suficiente para estudá-la com
cuidado, logo aprenderão a estimar o seu valor; logo
estarão dispostos a “lutar por ela” contra os seus
inimigos ( Judas 3), estes que são numerosos em todas
as épocas. Isso, inevitavelmente, os levará a adotar e a
defender aquela “forma de palavras saudáveis”
(2Timóteo 1.13) que eles acreditam encontrar nas
Escrituras sagradas.

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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Por outro lado, deixe que alguém adote a ideia de que credos
e confissões são anti-bíblicos - e, claro, ilegais -, e ele natural e
rapidamente chegará à conclusão de que toda contenda pelas
doutrinas é inútil e até mesmo criminoso. A partir disso, será
muito simples a transição para o abandono do estudo da doutrina
ou, pelo menos, o estudo zeloso e diligente dela.

Assim, deixar de lado todos os credos, naturalmente, tende a


tornar os cristãos professos indiferentes ao estudo das verdades
cristãs, comparativamente desinteressados na obtenção de
conhecimento religioso e, finalmente, negligentes e, claro,
ignorantes da “fé uma vez entregue aos santos” (Judas 3).

Não pretendo, de forma alguma, afirmar que nenhum herege


tenha sido zeloso na divulgação e na defesa de suas opiniões
corruptas. As páginas da história eclesiástica mostram
abundantemente que muitos dos defensores do erro, tanto em
tempos antigos quanto modernos, têm contido não apenas com
pertinácia, mas até mesmo com ferocidade, as suas doutrinas
peculiares. Mas a minha posição é que os inimigos de todos os
credos e confissões geralmente adotam um princípio que, se
levado às suas consequências legítimas, desencorajaria todo zelo
na defesa das doutrinas peculiares do evangelho. Se todo o zelo
na defesa de doutrinas peculiares fosse deixado de lado, todo o
fervor e toda a diligência em estudá-las provavelmente também
seriam deixadas de lado. Se esse fosse o caso, dificilmente

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poderia ser imaginado um estado de coisas mais desfavorável ao


crescimento e prevalência do conhecimento cristão.

Olhe para o caráter frouxo, vago e indeciso da pregação


ouvida em noventa por cento2 dos púlpitos unitaristas e de outras
tendências liberais nos Estados Unidos, e, suponho, em toda a
Cristandade. Se os ocupantes desses púlpitos tivessem como
objetivo distinto e principal tornar os seus ouvintes indiferentes
quanto ao entendimento e, consequentemente, indiferentes quanto
ao estudo das doutrinas fundamentais do evangelho, dificilmente
poderiam adotar um plano mais diretamente calculado para atingir
o seu objetivo do que aquele que realmente seguem. O seu grito
incessante é: “Questões de opinião são entre Deus e a
consciência de um homem. Ninguém mais tem o direito de se
intrometer nelas”.

Portanto, em conformidade com esse princípio, eles fazem,


de fato, questão de se intrometer muito pouco com as doutrinas
distintivas do evangelho. Nós conjecturamos quais são as suas
opiniões doutrinárias, em geral, não tanto pelo que dizem, mas
pelo que não dizem. E a verdade é que, se esse caráter de
pregação se tornasse universal, todas as visões discriminatórias da
verdade do evangelho seriam, em trinta anos, banidas da igreja.

Logo, se os amigos da ortodoxia e da piedade realmente


desejam cultivar e manter um amor pelo estudo discriminatório da
2
Original: “nove décimos”.

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doutrina cristã, um gosto pelo conhecimento religioso, um espírito


de zelo pela verdade, em oposição a essa indiferença miserável
em relação aos artigos de fé - que é tão prejudicial a todas as
comunidades cristãs em que é encontrada -, então, que eles
tenham o cuidado de apresentar e de serem diligentes em manter
diante dos olhos uns dos outros e dos olhos do público aquela
“boa confissão” que são ordenados a “professar diante de muitas
testemunhas” (1 Timóteo 6.12-13).

Se os opositores aos credos deixarem de fazer isso, sob o


pretexto de aderirem ao importante princípio protestante de que a
Bíblia é a única autoridade infalível em matéria de fé e de conduta
(um princípio que não deve ser repetido com frequência o
suficiente), falarem e agirem como se todos os que professam
aceitar a Bíblia estivessem em uma base igualmente sólida e
segura, e, em resumo, considerarem desnecessário e até
prejudicial selecionar as verdades fundamentais das Escrituras e
defendê-las como tais, as doutrinas essenciais do evangelho,
então, somente um milagre poderá evitar que eles caiam em apatia
fria em relação ao estudo da doutrina e, por fim, na lamentável
“falta de conhecimento” que leva à perdição constante de milhões
(Oséias 4.6).

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2.5. É um argumento de considerável peso a favor dos Credos


que a experiência de todas as épocas os tenha considerado
indispensáveis.

Mesmo nos dias dos apóstolos, quando toda a sua inspiração


e todos os seus poderes miraculosos eram insuficientes para
conter os hereges que espalhavam as suas falsas doutrinas,
homens que se autodenominavam cristãos e professavam pregar a
religião de Cristo distorceram a sua verdade e trouxeram “outro
evangelho” (Gálatas 1.6), que Ele não havia ensinado. Nessa
situação, como as igrejas agiram?

Um apóstolo inspirado orientou-as a não se contentarem


com uma mera profissão de fé na religião de Cristo por parte
daqueles que se apresentavam como mestres cristãos, mas a
examiná-los e testá-los, verificando se os seus ensinamentos eram
compatíveis com “o padrão das sãs palavras” (2 Timóteo 1.13)
que havia sido ensinada por ele. Ele acrescentou com solenidade:

“Se alguém vos prega evangelho que vá além daquele


que recebestes, seja anátema” (Gálatas 1.9). Aqui, na
prática, estava um exemplo, autorizado por Deus, de
usar um credo como teste de ortodoxia.

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Isso significa que homens que professam o cristianismo


foram explicitamente orientados por um apóstolo inspirado a
serem submetidos ao teste de como entendiam o evangelho ao
qual, em termos gerais, declaravam a sua aceitação e como eles
explicavam as suas principais doutrinas. Parece que a confissão
de fé exigida na época era muito curta e simples, mas,
independentemente de ser longa ou curta, consistindo em três
artigos ou trinta, o princípio era o mesmo.

No segundo século, nos escritos de Irineu, e no terceiro, nos


escritos de Tertuliano, Orígenes, Cipriano, Gregório Taumaturgo e
Luciano, o mártir, encontramos uma série de credos e confissões
mais formalmente elaborados, detalhados e extensos do que os
anteriores. Eles foram criados para testemunhar contra as várias
formas de erro que haviam surgido. Isso mostra claramente que à
medida que as artimanhas e as corrupções dos hereges
aumentavam, a Igreja Ortodoxa dava maior importância à adoção
e manutenção dessas fórmulas consideradas indispensáveis.

No quarto século, quando a igreja estava ainda mais agitada


pela prevalência da heresia, a demanda por testes reconhecidos
para julgar e detectar os hereges era ainda maior. Isso foi
exemplificado de forma marcante no Concílio de Nicéia, quando
a heresia de Ário estava sob consideração. Quando o Concílio
começou a examinar o assunto, encontrou-se extremamente difícil
obter de Ário qualquer explicação satisfatória de suas opiniões.

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Ele não apenas estava disposto a professar que acreditava na


Bíblia tanto quanto o mais ortodoxo dos teólogos presentes, mas
também afirmou estar disposto a adotar todas as palavras das
Escrituras em detalhes sobre a pessoa e o caráter do abençoado
Redentor.

No entanto, quando os membros do Concílio desejavam


saber como ele entendia essa linguagem, ele demonstrou uma
disposição para a evasão e o erro, e na verdade, por um tempo
considerável, frustrou as tentativas dos mais engenhosos dos
ortodoxos de especificar os seus enganos e trazê-los à luz. Ele
afirmava que estava disposto a usar a linguagem comum sobre o
assunto em questão e desejava que se acreditasse que diferia
muito pouco do corpo da igreja.

Consequentemente, os ortodoxos examinaram os diversos


títulos de Cristo que claramente expressavam a Sua Divindade,
tais como “Deus”, “o verdadeiro Deus”, a “imagem expressa de
Deus”, etc. (Tito 2.13; 1 João 5.20; Hebreus 1.3), aos quais Ário e
os seus seguidores aderiram prontamente, reivindicando o direito
de dar a sua própria interpretação a esses títulos bíblicos. Depois
de gastar muito tempo e muito esforço em vão na tentativa de
desmascarar esse líder astuto e obter uma explicação de suas
opiniões, o Concílio percebeu que seria impossível alcançar o seu
objetivo enquanto permitissem que ele se escondesse atrás de uma
mera profissão geral de crença na Bíblia.

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Portanto, eles seguiram o que o bom senso, assim como a


Palavra de Deus, havia ensinado a Igreja a fazer em todas as
épocas anteriores, e o que sozinho pode capacitá-la a detectar o
ardiloso advogado do erro. Eles expressaram, em sua própria
linguagem, o que supunham ser a doutrina da Escritura sobre a
Divindade do Salvador. Em outras palavras, elaboraram uma
Confissão de Fé sobre esse assunto, pedindo a Ário e aos seus
discípulos para a subscrever. Os hereges recusaram-se, o que os
levou virtualmente a reconhecer que não entendiam as Escrituras
da mesma maneira que o restante do Concílio as entendia, e, é
claro, que a acusação contra eles estava correta.

O mesmo procedimento foi adotado por todos os defensores


da verdade piedosa ao longo das eras obscuras, quando, em meio
à corrupção e desolação circundantes, foram chamados a dar
“testemunho da verdade” (João 18.37). Todos professavam a sua
crença na Bíblia e o seu amor por ela, recorrendo constantemente
a ela como a única regra infalível de fé e de prática.
Estudavam-na com muito mais reverência e diligência do que
qualquer dos hereges ao seu redor. Isso é claramente evidente em
toda a história.

No entanto, eles perceberam a futilidade de fazer nada além


de proclamar, de forma geral, a sua adesão às Escrituras Sagradas.
Isso não teria sido uma distinção significativa e, é claro, não teria
representado um testemunho eficaz. Teria sido o mesmo que o

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que os inimigos mais ardentes da verdade proclamavam com


empenho e até mesmo de forma clamorosa todos os dias.
Portanto, eles seguiram o exemplo dos defensores da ortodoxia
desde as épocas mais antigas. Eles elaboraram credos de tempos
em tempos, de acordo com as necessidades da igreja, para
poderem testemunhar sobre Deus, defender a Sua verdade e
transmitir o registro da Sua fidelidade a gerações futuras.

Finalmente, na “gloriosa” Reforma do Papismo - durante a


qual o grande líder da igreja de Roma pode ser considerado como
tendo novamente “libertado o seu povo” (João 8.32,36) e cuja
memória nunca será apagada - ao separar “o precioso do vil”
(Jeremias 15.19), os defensores da verdade seguiram o mesmo
caminho. Eles, de comum acordo, elaboraram credos e confissões
que serviram como defesa da verdade e como uma barreira contra
a heresia. Talvez não seja um exagero afirmar que a coleção
desses credos é um dos monumentos mais preciosos e duradouros
da piedade, sabedoria e zelo do século 16.

Qual é, portanto, a conclusão que se pode tirar de toda


essa experiência da igreja de Deus, tão universal e uniforme?
Ela é clara e inequívoca. Ela fala por si mesma. Quando os
defensores da verdade em todas as épocas e circunstâncias,
mesmo aqueles que mais enfatizavam a liberdade de julgamento e
a liberdade cristã, sempre creram ser necessário recorrer à adoção
de credos para, como um corpo coletivo, compreender e

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comunicar, para o benefício de todos, o significado das Sagradas


Escrituras, somos naturalmente levados a concluir que essa
necessidade não é tão “irracional” ou “prejudicial” como muitos
podem argumentar, mas que, na verdade, não há outro método
prático de manter a unidade e a pureza na igreja de Cristo.

2.6. Outro argumento a favor dos Credos e Confissões pode


ser derivado do notável fato de que os seus opositores mais
fervorosos geralmente foram os liberais e os hereges.

Embora seja verdade que o uso de credos tenha sido


contestado por indivíduos substancialmente ortodoxos e, em
alguns raros casos, até mesmo por igrejas ortodoxas, em geral,
essa oposição não era comum entre os antigos. Tais casos de
oposição eram raros e geralmente ocorriam sob a influência de
fortes preconceitos ou circunstâncias muito peculiares. No
entanto, não se encontram exemplos disso entre as gerações mais
antigas da igreja. Tais casos se tornaram mais proeminentes em
tempos mais modernos. Por outro lado, é importante destacar que,
por vezes, os hereges demonstraram grande zelo na formulação e
na manutenção de credos corruptos. A história inicial da igreja
está repleta de exemplos disso, e esses períodos posteriores não
estavam isentos desse fenômeno.

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O ponto que quero enfatizar é que, em geral, os


oponentes mais ardentes e ruidosos dos credos eram
aqueles que mantinham opiniões corruptas.

Aqueles que se consideravam cristãos raramente foram tão


amargos na oposição aos credos como os defensores do
unitarismo e aqueles que se inclinavam para o abandono da
ortodoxia. Por outro lado, os defensores mais consistentes e
zelosos da verdade sempre foram identificáveis por seu apoio às
formulações de fé. Isso não foi mero acaso, mas sim uma
tendência previsível com base em princípios fundamentais.

Os ortodoxos valorizam a verdade, considerando-a essencial


para a santidade. Eles acreditam que parte da fidelidade a Cristo
envolve a defesa da verdade contra o erro. Por outro lado, os
hereges modernos, especialmente os que se enquadram na
categoria de unitaristas, muitas vezes menosprezam as
formulações de fé, mostrando indiferença pela verdade e
argumentando pela inocência do erro. Naturalmente, eles criticam
e difamam as tentativas fiéis de se opor à heresia e de distinguir
os hereges da igreja.

Portanto, aqueles que se afastaram, ou começaram a se


afastar, da “fé que foi entregue uma vez aos santos” (Judas 1.3)
raramente falam positivamente sobre os Credos e Confissões. Não
é surpreendente que aqueles que sustentam a inocência do erro

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resistam a estabelecer barreiras para impedir que ele entre na


igreja. Não é surpreendente que os arianos, os socinianos, os
pelagianos e os seus simpatizantes rejeitem firmemente qualquer
tentativa de definir uma linha de distinção entre os amigos e
inimigos de Cristo. Como alguém sabiamente observou, “as
pessoas raramente se opõem aos credos até que os credos se
oponham a elas”. É natural que aqueles que rejeitam a verdade se
oponham aos credos que a defendem.

Portanto, se examinarmos a história da igreja, especialmente


nos últimos séculos, veremos que essas observações são
frequentemente confirmadas.

Os grupos que se afastaram da ortodoxia muitas


vezes protestam no início que não têm objeções às
doutrinas contidas nos credos que subscreveram,
mas protestam sim ao princípio de se adotar credos.

No entanto, com o tempo, torna-se claro que a sua oposição


aos credos se deve, em grande parte, ao fato de que estão se
afastando das doutrinas que uma vez afirmaram acreditar. Isso
acontece de forma gradual e muitas vezes involuntária, até que a
distância entre suas crenças e as doutrinas ortodoxas se torne
evidente. É notável que os liberais e os hereges, especialmente os

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unitaristas, se oponham a tais formulações de fé e, ao mesmo


tempo, afirmem que desejam preservar a pureza da igreja.

Em resumo, a história da igreja demonstra que, em geral, os


Credos e as Confissões desempenharam um papel fundamental na
defesa da verdade e na manutenção da pureza na Igreja de Cristo.
A oposição mais veemente a essas formulações muitas vezes veio
daqueles que estavam se afastando da ortodoxia e da verdade,
enquanto os defensores mais consistentes da verdade sempre
foram identificáveis por seu apoio aos credos. Portanto, a
necessidade e a utilidade dos credos e confissões na igreja são
evidentes ao longo da história.

2.7. Um argumento adicional a favor dos Credos é observar


que os opositores mais fervorosos dos credos acabam
empregando-os na prática em procedimentos eclesiásticos.

A máxima favorita dos opositores dos credos é que todos


aqueles que reconhecem a Bíblia devem ser recebidos não apenas
na comunhão cristã, mas também na comunhão ministerial, sem
hesitação. No entanto, essa máxima é consistentemente
abandonada por aqueles que a defendem sempre que surge um
caso que a coloca à prova. Por exemplo, raramente se ouve falar
de uma congregação unitarista contratando um pastor que
professe crenças calvinistas, mesmo que ele venha com a sua

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Bíblia na mão e afirme crer nela sinceramente. Seguindo seu


próprio princípio, por que isso não seria suficiente para os
unitaristas?

No entanto, na prática, não é suficiente para eles. Antes de


concordarem em receber alguém como seu guia espiritual, eles
exigem saber explicitamente como ele interpreta a Bíblia, ou seja,
qual é o seu credo específico. Se as suas crenças não estiverem
alinhadas com as crenças dos unitaristas, ele será rejeitado por
eles. Aqui, nós encontramos a aplicação rigorosa do princípio de
exigir a subscrição a um credo, um princípio que é praticado com
a mesma firmeza que pelos defensores da ortodoxia.

Na prática, isso mostra que os opositores dos credos seguem


um caminho semelhante ao dos defensores dos credos, embora
com uma diferença significativa. Em vez de aplicar um credo
escrito e tangível como teste, eles baseiam suas decisões nos
credos que residem nos corações daqueles que explicam e
empregam as doutrinas. No entanto, isso permite que ajam de
maneira arbitrária e até tirânica, sem apelação. Ao mesmo tempo,
eles tentam persuadir os outros de que estão seguindo um plano
inteiramente diferente, o que cria uma contradição entre a sua
prática e a sua retórica. Portanto, essa contradição revela que, na
realidade, o princípio da subscrição a credos é amplamente
aplicado, mesmo por aqueles que o negam publicamente.

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Existe verdade mais clara do que esta?

Agora, nós observamos que os opositores dos credos, por


mais que neguem a validade e a necessidade dos mesmos, não
conseguem passar um dia sem empregá-los. É fútil alegar que, em
seu caso, nenhum credo é imposto e que tudo é voluntário e deixa
inteiramente à escolha das partes envolvidas.

Nós veremos mais adiante que o mesmo pode ser afirmado


com igual veracidade em todos os casos de subscrição a artigos,
que defendo sem exceção. Também é inútil afirmar que, no caso
deles, os artigos exigidos são poucos e simples, e não suscitam
objeções, ao contrário do longo e detalhado credo adotado por
algumas igrejas.

O ponto central em consideração é o princípio da


subscrição aos credos. Se a legalidade e a necessidade de agir
com base nesse princípio podem ser estabelecidas, nossa causa
está ganha. A extensão a que devemos ir em multiplicar artigos é
uma questão secundária, cuja resposta depende das necessidades
da igreja que elabora o credo.

No entanto, os opositores dos credos, embora rejeitem a


conveniência e até a legalidade do princípio geral, demonstram
que não podem avançar um passo sem adotá-lo na prática. A sua
conduta na realidade é mais sólida do que seu raciocínio teórico,
pois sua conduta é ditada pelo bom senso, experiência prática e

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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pela evidente necessidade do caso. Enquanto seu raciocínio é uma


teoria, que se origina de uma fonte menos esclarecida e menos
confiável.

Vários outros argumentos poderiam ser apresentados a favor


dos credos escritos, mas os limites desta aula impedem que eu me
alongue mais sobre o assunto.

É fácil demonstrar que as Confissões de Fé, cuidadosamente


elaboradas e solenemente adotadas por igrejas específicas, são
inestimáveis não apenas como vínculos de união e barreiras
contra o erro, mas também servem a um propósito importante
como manuais credenciados da doutrina cristã. São bem
adequadas para a instrução dos membros leigos das igrejas que
não têm tempo nem hábitos de pensamento profundos o suficiente
para elaborar um sistema consistente de verdade a partir das
Escrituras Sagradas.

É de utilidade incalculável para o indivíduo que tem pouco


tempo para leitura e pouca familiaridade com livros ser fornecido
com um compêndio claro e bem organizado de doutrina. Esse
compêndio não é considerado apenas como a obra de um teólogo
isolado, mas é elaborado e adotado pela sabedoria coletiva da
igreja à qual ele pertence. Muitas vezes, para mentes simples e
descomplicadas, há uma satisfação indescritível em percorrer tal
compêndio, artigo por artigo, examinar as provas apresentadas a

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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partir da Palavra de Deus em apoio a cada um e seguir o exemplo


dos bereanos que “receberam a palavra com toda a avidez,
examinando as Escrituras todos os dias para ver se as coisas eram,
de fato, assim” (Atos 17.11).

Além disso, pode ser demonstrado que Confissões de Fé


sólidas e bíblicas têm grande valor para se transmitir à
posteridade o conhecimento do que a igreja fez em prol da
verdade em épocas específicas. Cada Confissão desse tipo,
formulada ou adotada pelos seguidores de Cristo em uma era, é
um legado precioso transmitido aos seus filhos e a todos os que
vierem depois deles. Isso não apenas testemunha a favor da
verdadeira doutrina de Jesus Cristo, mas também lança luz sobre
essas doutrinas, para a instrução de todos a quem esse testemunho
pode alcançar.

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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3. Respostas para Objeções aos Credos.

Mas enquanto nós atendemos aos principais argumentos a


favor dos credos escritos, a justiça ao assunto exige que nós
examinemos algumas das principais objeções que foram feitas
aos credos por seus adversários.

3.1. E a primeira que mencionarei é que formar um


determinado Credo [ou Confissão] e exigir a subscrição dele
como um teste religioso, seria superar a Bíblia e fazer de uma
composição humana, ao invés da Bíblia, um padrão de fé.

“A Bíblia”, dizem aqueles que levantam essa objeção, “é a


única regra infalível de fé e prática. É tão completa que não
precisa de adição humana e tão facilmente compreendida que não
requer explicação humana. Por que, então, deveríamos desejar
qualquer outro padrão eclesiástico? Por que subscrevermos, ou
pedir aos outros para que subscrevam, qualquer outro credo além
deste simples, inspirado e perfeito? Toda vez que nós fazemos
isso, estamos oferecendo uma indignidade pública ao volume
sagrado, pois declaramos virtualmente que ele não é infalível ou
não é suficiente”.

Essa objeção é a mais enganosa de todas as listadas. E


embora se acredite que uma resposta suficiente tenha sido

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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fornecida por alguns princípios já estabelecidos; ainda assim, a


confiança com que é repetida todos os dias torna uma atenção
formal a ela conveniente. Mais especialmente porque tem, à
primeira vista, tanto a aparência de veneração peculiar pelas
Escrituras Sagradas, que muitos são cativados por seu aspecto
plausível e o consideram decisivo.

Todo o argumento que essa objeção apresenta é baseado em


uma suposição falsa.

Nenhum protestante jamais professou considerar o


seu credo, considerado como uma composição
humana, como de autoridade igual às escrituras, e
muito menos de autoridade suprema.

Todo princípio desse tipo é, com uma só voz, renunciado,


por todos os credos e defesas de credos, que eu já li. E se, apesar
disso, a constante repetição da acusação deve ser considerada
como um argumento justo ou como uma calúnia grosseira, o
imparcial julgará. Um credo da igreja se propõe a ser, como foi
observado antes, apenas um resumo ou exposição resumida do
que as escrituras ensinam. Professa ser deduzido das Escrituras
e referir-se às Escrituras para toda a sua autoridade. Claro, quando
alguém o assina, está longe de desonrar a Bíblia. Pelo contrário,

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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ele presta honra pública a ela. Ele simplesmente declara, por um


ato solene, como ele entende a Bíblia - em outras palavras, quais
doutrinas ele considera que ela contém.

Em resumo, a linguagem de um crente ortodoxo, ao


subscrever seu credo eclesiástico, tem simplesmente o seguinte
significado:

“Enquanto o sociniano professa acreditar na Bíblia e


entende-a como ensinando apenas a humanidade de
Cristo; enquanto o ariano professa receber a mesma
Bíblia e nela encontrar o Salvador representado como
a criatura mais exaltada de todas, mas ainda uma
criatura; enquanto o pelagiano e o semipelagiano
fazem uma profissão semelhante de sua crença geral
nas Escrituras e as interpretam como ensinando uma
doutrina muito mais favorável à natureza humana e
muito menos honrosa para a graça de Deus do que,
na minha opinião, elas realmente ensinam; peço o
privilégio de declarar, por mim mesmo, que,
enquanto acredito de todo o coração que a Bíblia é a
Palavra de Deus, a única regra perfeita de fé e
conduta e o único teste final em todas as
controvérsias, ela ensina claramente, como leio e
acredito, a depravação total e lamentável da natureza
humana; a divindade essencial do Salvador; uma
Trindade de pessoas na Divindade; a justificação
[pela fé] pela justiça imputada de Cristo; e a
regeneração e a santificação pelo Espírito Santo,

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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como indispensáveis para preparar a alma para o céu.


Eu creio que essas são as verdades fundamentais que
Deus revelou em Sua Palavra. E, embora sejam
negadas por alguns e deturpadas por outros que
professam acreditar naquela bendita Palavra, estou
realmente convencido de que são os princípios
fundamentais do plano de salvação”.

Agora, pergunto: Há, em toda essa linguagem, algo


desonroso para a Bíblia? Algo que tende a suplantar sua
autoridade ou introduzir um padrão ou tribunal de autoridade
suprema? Pelo contrário, na linguagem e no espírito de tal
declaração, há um reconhecimento da Palavra de Deus como a
autoridade excelente e suprema e uma expressão de crença em
certas doutrinas, simplesmente porque se acredita que elas são
reveladas nessa Palavra. Verdadeiramente, se isso é desonrar as
Escrituras ou estabelecer um padrão acima delas, não há mais
sentido em palavras ou ações.

Ainda assim, pergunta-se: “Onde está a necessidade de uma


declaração definitiva daquilo que nós entendemos que as
Escrituras ensinam? Elas não são suficientemente compreensíveis
por si mesmas? Podemos torná-las mais claras do que o seu Autor
as fez? Por que segurar uma vela ao sol? Por que tentar criar um
teste mais explícito do que aquele que deu a Bíblia achou
adequado criar - uma tentativa, tão vã quanto é presunçosa?”

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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Para essa alegação, é suficiente responder que, embora as


Escrituras sejam, sem dúvida, simples e claras - tão claras que
“possa ler até quem passa correndo” (Habacuque 2.2) -, é
igualmente certo que milhares, de fato, as interpretam
erroneamente. Isso não pode ser negado, porque milhares as
interpretam (e isso em pontos confessadamente fundamentais) não
apenas de maneira diferente, mas de maneira diretamente oposta.

Portanto, nem todos podem estar igualmente certos. Pode


ser errado, então, para um homem piedoso e ortodoxo - ou para
uma igreja piedosa - apresentar e tentar recomendar aos outros
sua maneira de interpretar o livro sagrado? Como o mundo é
reconhecido, por todos os lados, como cheio de erros e enganos
quanto ao verdadeiro significado das Sagradas Escrituras, pode-se
considerar uma tarefa supérflua para aqueles que têm mais luz e
opiniões mais corretas, mostrá-las como testemunho da verdade e
como guia para aqueles que podem estar em erro? Certamente não
pode. No entanto, isso não é mais nem menos do que exatamente
a formação e a manutenção de uma Confissão de Fé bíblica pela
qual estou pleiteando.

No entanto, ainda podemos questionar: qual é o direito de


qualquer homem ou grupo de homens de interpor a sua autoridade
e propor-se a interpretar as Escrituras para os outros? Isso não é
ímpio por si só e uma presumida interferência nas mentes de

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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nossos semelhantes? Respondo que esse raciocínio levaria a


conclusões extremas e, portanto, não prova nada.

Se fosse aceito, provaria que toda pregação do evangelho é


presunçosa e criminosa, pois a pregação sempre envolve explicar
e aplicar as Escrituras, muitas vezes nas palavras do próprio
pregador. Na verdade, se a objeção em questão fosse válida, ela
provaria que todos os escritos piedosos dos mais eminentes
teólogos em todas as épocas, que buscavam elucidar e aplicar a
Palavra de Deus, eram tentativas profanas e arrogantes de
aprimorar a revelação divina e torná-la mais adequada do que é
para cumprir seu grande propósito.

Além disso, com base no princípio dessa objeção, não


apenas nenhum ministro do evangelho deveria fazer mais no
púlpito do que simplesmente ler ou repetir as próprias palavras da
Escritura, mas também deveria lê-las ou repeti-las para seu
público apenas nos idiomas em que foram originalmente dados à
igreja.

Pois, como já foi observado muitas vezes, não se pode


afirmar que as palavras de qualquer tradução da Bíblia sejam as
próprias palavras do Espírito Santo, mas são as palavras que
homens não inspirados escolheram para expressar, da melhor
maneira possível, o sentido do original. Portanto, se a objeção em
questão fosse aceita, ninguém teria permissão para ensinar as

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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grandes verdades da revelação de nenhuma outra forma senão


repetindo literalmente o texto hebraico do Antigo Testamento e o
grego do Novo Testamento diante do povo. Tais são os absurdos
aos quais um princípio errôneo inevitavelmente levará aqueles
que o seguem até suas conclusões lógicas!

No entanto, após tudo isso, que testemunho os fatos


fornecem sobre esse assunto? Aqueles indivíduos ou igrejas que
se destacaram por sua afeição e adesão aos credos são
desprezadores da Bíblia em comparação com outros cristãos
professos? Eles a leem menos? Eles apelam para ela com menos
frequência como sua autoridade suprema e última? Eles a citam
com menos respeito em sua pregação? Quando se referem às suas
Confissões de Fé ou Catecismos para autoridade ou ilustração no
púlpito, não fazem referência notória à Bíblia milhares de vezes?
Eles não se esforçam menos do que outros para impressionar o
conteúdo do livro sagrado nas mentes de seus filhos e
apresentá-lo como objeto constante de estudo para todos?

Olhe para as Igrejas Reformadas da Escócia e da Holanda,


da França e de Genebra, em seu melhor estado, quando as suas
Confissões de Fé eram mais reverenciadas e tinham mais
influência, e então diga se alguma igreja, desde os dias dos
apóstolos, já demonstrou mais reverência pelas Escrituras ou as
tratou com mais respeito devoto como o único padrão perfeito de
fé e prática do que elas? Posso fazer um apelo semelhante em

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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relação às igrejas em nosso país que se destacaram por sua adesão


aos credos? Os seus ministros, em geral, são igualmente notáveis
por raramente citar os seus próprios formulários eclesiásticos, seja
para prova ou ilustração, como o são por suas constantes e
abundantes citações das Escrituras para ambos os propósitos? A
mesma recorrência incessante e devota às Sagradas Escrituras
pode ser atribuída com a mesma veracidade ao grande corpo dos
opositores de credos, em tempos antigos ou modernos?

Não vou aprofundar ainda mais essa comparação. Mas não


tenho nenhuma preocupação de que até mesmo o inimigo mais
amargo dos credos, que tem um conhecimento razoável dos fatos
e uma pequena quantidade de imparcialidade, ousará dizer que o
resultado, deduzido de maneira justa, está a favor de sua causa.

3.2. Outra objeção frequentemente feita aos Credos da igreja


é que eles interferem nos direitos de consciência e,
naturalmente, levam à opressão.

“Que direito”, dizem aqueles que levantam essa objeção,


“têm qualquer igreja ou grupo de igrejas de impor um credo a
mim, ou ditar o que devo acreditar? Tentar tal ditadura é tirania;
submeter-se a ela é abrir mão do direito de julgamento privado”.

Haveria alguma base para essa objeção se um credo fosse,


em qualquer caso, imposto pelo governo civil ou por uma igreja

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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estabelecida pelo Estado, ou se alguém fosse obrigado a


recebê-lo, sob graves penalidades e desvantagens, quer o
aprovasse ou não. Mas como tal caso não existe, e, felizmente,
não pode existir em nosso país favorecido, a objeção é, com
certeza, tão ilegítima em termos de raciocínio quanto falsa em
termos de fato.

É tentador suspeitar que aqueles que levantam essa objeção


entre nós a tenham encontrado fabricada por pessoas que vivem
sob governos civis e estabelecimentos eclesiásticos de caráter
opressivo. Acabam vendo-a como uma arma que poderia ser
empunhada com grande efeito popular, a incorporaram em seu
serviço e, a partir de então, se recusaram a abandoná-la, embora
tenha sido provada mil vezes que não tem mais aplicação a
qualquer credo ou igreja nos Estados Unidos do que aos
habitantes de outro planeta.

Certamente, ninguém negará que um grupo de cristãos têm o


direito, em todos os países livres, de se associar e caminhar juntos
com base nos princípios que escolherem concordar, desde que não
sejam inconsistentes com a ordem pública. Eles têm o direito de
concordar e de declarar como entendem as Escrituras, quais
artigos encontrados nas Escrituras concordam em considerar
como fundamentais e de que maneira desejam que a sua pregação
pública e sua organização sejam conduzidas, para edificação deles
próprios e de seus filhos. Eles não têm o direito de decidir ou

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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julgar pelos outros, nem podem compelir qualquer homem a se


juntar a eles.

Mas certamente é seu privilégio julgar por si mesmos,


concordar com o plano de sua própria associação, determinar com
base em quais princípios receberão outros membros em sua
fraternidade e elaborar um conjunto de regras que excluirá de seu
grupo aqueles com os quais não podem andar em harmonia.

A questão não é se eles fazem, em todos os casos, um uso


sábio e bíblico desse direito de seguir os ditames da consciência,
mas se eles possuem o direito em primeiro lugar. Eles são, de fato,
responsáveis pelo uso que fazem desse direito, e solenemente
responsáveis perante o seu Mestre nos céus. Mas certamente não
podem nem devem ser compelidos a prestar contas aos homens. É
assunto deles. Os seus semelhantes não têm nada a ver com isso,
desde que não cometam nenhuma ofensa contra a paz pública.
Decidir de outra forma seria, de fato, um ultraje ao direito de
julgamento privado. Se os princípios de liberdade civil e religiosa
geralmente prevalentes em nosso país feliz estiverem corretos, a
demonstração em si não pode ser mais incontestável do que essas
posições.

Mas se um grupo de cristãos professos têm o direito natural


de se associar, extrair o seu próprio credo das Escrituras e
concordar com os princípios pelos quais outros podem ser

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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admitidos em seu número, não é igualmente evidente que eles têm


o mesmo direito de recusar a admissão àqueles com os quais
acreditam que não podem estar confortavelmente conectados?

Vamos supor que uma igreja esteja realmente associada com


base no princípio estabelecido, seu credo e outros artigos
adotados e publicados para informação de todos que desejam ser
informados, e seus membros caminhando juntos em harmonia e
amor. Suponha que, enquanto as coisas estão nessa situação, uma
pessoa chega até eles e os aborda assim: “Exijo admissão em seu
corpo, embora não possa acreditar nas doutrinas que vocês
professam abraçar, nem consentir em ser governado pelas regras
que vocês concordaram em adotar”.

Que resposta eles seriam propensos a dar a ele? Certamente


eles responderiam: “Sua exigência não é muito razoável. Nossa
união é voluntária, para nosso mútuo benefício espiritual. Não
solicitamos a você para se juntar a nós. Você não pode, de forma
alguma, ter o direito de se impor em nosso corpo. O mundo
inteiro está diante de você. Vá para onde quiser. Nós não podemos
concordar em recebê-lo, a menos que você esteja disposto a
caminhar conosco com base em nossos próprios princípios”.

Tal resposta, sem dúvida, seria considerada apropriada por


qualquer pessoa razoável. Suponha, no entanto, que esse
candidato ainda insista em sua demanda, que ele reivindique a

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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admissão como um direito, e, ao ser finalmente recusado, reclame


que a sociedade o “perseguiu” e o “feriu”? Alguém o consideraria
dotado de bom senso? Não cessaria a sociedade em questão, se
fosse obrigada a receber tal candidato, de ser opressora de outros,
para deixar de ser livre?

O mesmo princípio se aplicaria ainda mais fortemente no


caso de um clérigo que se oferecesse para tal igreja como
candidato ao cargo de pastor entre eles. Suponha que, quando ele
aparecesse para oferecer os seus serviços, eles lhe apresentassem
uma cópia desse credo e daquele formulário de governo e de culto
que eles adotaram por unanimidade e dissessem:

“Isso é o que acreditamos. Não pretendemos prescrever para


os outros, ‘mas assim aprendemos de Cristo’ (Efésios 2.20).
Assim nós entendemos as Escrituras, e assim desejamos que nós,
nossos filhos e todos que nos procuram orientação sejam
instruídos. Você pode subscrever a essas fórmulas? Você está
disposto a vir entre nós com base nesses princípios e, como o
nosso pastor, assim compartilhar, conosco e com os nossos
pequeninos, o que consideramos ‘o Pão da Vida’?”

O candidato poderia reclamar de tal demanda? Muitos falam


como se a igreja, ao submetê-lo a este teste, estaria disposta a
“julgar por ele”. Mas nada pode estar mais distante da verdade.
Eles apenas se propõem a julgar por si mesmos. Se o candidato

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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não puder ou não quiser aceitar o teste, ele será, naturalmente,


rejeitado. Mas, nesse caso, nenhum julgamento é proferido sobre
sua relação com Deus. Nenhuma censura eclesiástica, nem
mesmo a menor, é infligida sobre ele.

As igrejas apenas reivindicam o direito de serem servidas no


cargo ministerial por um homem que tem a mesma religião que
eles. Isso é uma demanda não razoável? Os direitos de
consciência não são recíprocos? Ou eles demandam que, enquanto
uma igreja será proibida de “oprimir” um indivíduo, a um
indivíduo será permitido “oprimir” uma igreja? Certamente não
deve ser necessário esperar por uma resposta.

Portanto, as transações da vida secular fornecem todos os


dias uma refutação prática da objeção que estou considerando. O
chefe de uma família, quando alguém se candidata a ser recebido
como residente sob seu teto, alguma vez duvidou que tem o
direito de perguntar se o candidato está disposto a se conformar
com as regras de sua família ou não, e, se ele se recusar a essa
conformidade, recusar-lhe a admissão? E mesmo depois de ter
sido recebido e experimentado por um tempo, se porventura ele
demonstrar ser um morador desconfortável, todos consideram o
chefe da família como tendo a liberdade de excluí-lo? Não tem
todo pai e, é claro, toda associação voluntária de pais, o direito
reconhecido de determinar quais qualificações eles exigirão de
um preceptor para seus filhos? E, nesse caso, de submeter todos

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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os candidatos ao teste acordado e de rejeitar aqueles que não


correspondem a ele? E se um candidato que ficasse totalmente
aquém das qualificações exigidas, e que, portanto, fosse rejeitado,
fizesse um grande tumulto alegando que foi “injusta” e
“tiranicamente” privado do cargo ao qual aspirava, alguém o
consideraria insano ou pior do que insano?

O mesmo princípio se aplica a toda associação voluntária,


para fins morais, literários ou outros legais.

Se os membros não têm o direito de concordar com quais


princípios eles vão se associar e de recusar a adesão daqueles que
são conhecidos por serem totalmente hostis ao grande objetivo da
associação, não há mais liberdade. Da verdade evidente por si
mesma de tudo isso, ninguém duvida. Mas qual é a diferença
essencial entre qualquer um desses direitos e o direito de qualquer
comunidade de cristãos professos concordar com o que eles
consideram os princípios bíblicos de sua própria união? E de
recusar a admissão em seu corpo daqueles a quem consideram
hostis aos grandes propósitos da verdade e edificação, para a
promoção dos quais se associaram?

Negar-lhes esse direito seria torná-los escravos de fato!

No entanto, provavelmente será alegado que uma igreja não


pode, propriamente falando, ser considerada como uma
associação voluntária, que ela é uma comunidade instituída pela

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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autoridade de Cristo, que suas leis são dadas por Ele, como seu
soberano Cabeça e Senhor. Além disso, que os seus governantes
são na verdade apenas mordomos, obrigados a se conformar em
tudo o que fazem à sua vontade, e que, se a própria igreja
pertencesse a eles, eles teriam o direito de excluí-lo se
desejassem. Mas como a Igreja é de Cristo, eles devem encontrar
algum outro critério de procedimento além de suas próprias
vontades.

Sem dúvida, tudo isso é verdade. A igreja de Cristo


certamente não pode ser considerada como uma mera associação
voluntária, no mesmo sentido em que muitas outras sociedades
são assim chamadas. Ela é propriedade de Cristo. A vontade de
Cristo é a base e a lei de sua fundação e, é claro, ninguém pode
ser admitido ou excluído senão com base nos princípios que Sua
própria palavra prescreve. Isso, no entanto, acredita-se que não
altera, “nem um jota ou til”, o espírito do raciocínio anterior.

A união dos cristãos em um estado de igreja deve, ainda,


pela natureza das coisas, ser um ato voluntário, pois se não fosse
assim, não seria um ato moral. Mas se a união é voluntária, então
aqueles que a formam certamente devem ser considerados como
tendo o direito de seguir as suas próprias convicções quanto ao
que seu Divino Mestre revelou e ordenou sobre as leis de sua
união.

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Se eles não devem julgar nesta matéria, quem, pergunto,


deve julgar por eles? O Chefe da igreja, então, prescreveu alguma
qualificação como necessária para a membresia privada, ou para a
admissão ao cargo ministerial em Sua igreja? Se sim, quais são
elas? Qualquer grau de afastamento da pureza da fé ou prática
será suficiente para excluir alguém? Se for, a quem nosso Senhor
confiou a tarefa de aplicar sua lei e julgar em algum caso
específico? Aos próprios requerentes ou infratores, ou à igreja na
qual a membresia é desejada? Se à última, com base em que
princípio ela é obrigada a proceder? Como os seus membros se
associaram voluntariamente para sua instrução mútua e edificação
em coisas espirituais, eles não têm o direito de se satisfazer que o
indivíduo que se candidata a ser recebido entre eles, seja como
membro particular ou como um ministro, mantém opiniões e tem
um caráter que será consistente com o grande objetivo que
buscam?

Qualquer indivíduo desse tipo pode razoavelmente se


recusar a satisfazê-los quanto à conformidade de suas opiniões
religiosas com as deles, se eles acreditam que tanto a lei de Cristo
quanto a natureza do caso tornam tal conformidade necessária
para a comunhão cristã?

Se ele não pudesse, razoavelmente, recusar a dar satisfação


verbalmente sobre esse assunto, poderia, com ainda mais razão,

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recusar-se a declarar suas próprias opiniões por escrito e assinar o


seu nome a essa declaração por escrito?

Certamente, recusar isso, enquanto ele concordava em dar


uma exposição verbal de sua fé, teria a aparência de uma singular
impulsividade ou perversidade. Mas se nenhuma objeção razoável
pudesse ser feita a ele subscrever uma declaração elaborada por
ele próprio, não seria a mesma coisa, quanto ao espírito da
transação, se - com o objetivo de simplesmente verificar o fato de
sua crença, não de ditar leis à sua consciência - uma declaração,
previamente elaborada pela própria igreja, fosse apresentada para
a sua subscrição voluntária?

No caso, a exigência feita a um indivíduo não é que ele


compartilhe das crenças da igreja, mas apenas que ele declare,
como questão de fato, se ele realmente detém as mesmas crenças
que se presume que ele possui, com base em sua escolha
voluntária de se unir à comunhão da igreja cristã.

Mais uma vez, pergunto se é possível negar a uma igreja


esse direito sem minar as bases das convicções da consciência e
prejudicar a experiência da comunhão cristã? É inegável, de fato,
que a autoridade da igreja se baseia completamente na vontade
declarada por Cristo, e, aos olhos de Deus, ela não tem o direito
de impor ao candidato algo além de um credo ortodoxo sólido.

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Ela não tem a prerrogativa de exigir a concordância com


princípios contrários às Escrituras.

No entanto, uma vez que os direitos da consciência


são inalienáveis e, considerando que cada igreja age
em sincero cumprimento da vontade de seu Mestre, é
legítimo que ela exija dos que desejam se unir a ela
uma concordância solene com seus documentos
confessionais, aos olhos dos homens.

Alguém pode questionar: quando um indivíduo já se tornou


membro ou ministro de uma igreja através de uma subscrição
voluntária e sincera de seus artigos, e depois muda de opinião,
não seria opressivo excluí-lo da comunhão da igreja como
membro ou depô-lo do cargo de ministro? Não seria uma
imposição de uma “penalidade pesada” por suas “opiniões”,
punindo-o por suas “convicções sinceras e conscientes”?

Respondo que, se o Senhor Jesus Cristo não apenas


autorizou, mas também ordenou solenemente que sua igreja
exclua os hereges, da mesma forma que exclui os imorais de sua
comunhão, e retire seu apoio daqueles que pregam “outro
evangelho” (Gálatas 1.6), é evidente que a igreja, ao agir com
base nessa autoridade, não está prejudicando ninguém. Ao
excluí-lo da comunhão como membro ou do cargo de ministro, a

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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igreja não está privando ninguém de um direito natural. Ela está


simplesmente revogando o que foi concedido voluntariamente e
poderia ter sido retido, sem injustiça.

Ela está efetivamente dizendo:

“Conforme as nossas crenças, você não pode mais


exercer o papel de ministro ou ser membro de nossa
comunidade. Você pode encontrar felicidade e
utilidade em outra comunhão, mas nós precisamos
retirar a autoridade e os privilégios que uma vez lhe
concedemos, uma vez que o exercício continuado
destes dentro de nossa comunidade entraria em
conflito com os princípios que nos comprometemos a
manter solenemente”.

Essa abordagem é irracional? A ação que ela prevê é


opressiva? Seria mais justa ou mais favorável aos direitos da
consciência permitir que qualquer indivíduo mantenha a sua
posição como líder e guia em uma igreja, contrariando as suas
crenças, minando sua fé e perturbando a sua paz, indo em direção
à possível ruína da comunidade, e tudo isso em oposição a seus
compromissos solenes e ao entendimento claro de seus membros
quando se uniram à igreja?

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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Certamente, qualquer defensor da liberdade religiosa


responderia indignado: “Não!” Nesse cenário, a igreja seria a
parte oprimida, e o membro, o tirano.

Portanto, a conclusão é que, quando uma igreja utiliza um


credo da maneira descrita - como um elo de união, como uma
barreira contra o que ela considera heresia, e em conformidade
com o que ela acredita conscientemente ser a vontade de Cristo -,
está longe de violar os “direitos” dos outros; está longe de ser
acusada de “opressão”. Na verdade, ela está, de maneira
esclarecida e abrangente, preservando os direitos da consciência.
Para uma igreja assim, renunciar ao seu próprio testemunho pela
verdade e ordem da casa de Deus, abdicar do seu conforto, paz e
edificação, para atender às exigências injustas de um indivíduo
corrupto, seria, na verdade, submeter-se à pior forma de
escravidão.

A submissão de muitos, com todos os seus interesses,


direitos e felicidade, à ditadura de um ou alguns, não seria a
essência da tirania?

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3.3. Uma terceira objeção frequentemente levantada contra a


subscrição aos Credos e Confissões é que isso é prejudicial à
livre investigação.

“Quando um homem”, dizem os opositores dos credos,


“subscreveu uma fórmula pública e tomou sua posição
eclesiástica com uma igreja que a exige, ele deve continuar a
acreditar assim até o fim da vida ou renunciar ao seu lugar.
Novas luzes em abundância podem se apresentar diante dele, mas
ele deve fechar os olhos para isso. Agora, pode ser certo,” dizem
eles, “que alguém se coloque voluntariamente em circunstâncias
de tamanha tentação? Colocar-se voluntariamente ao alcance de
fortes incentivos para mexer com a consciência e resistir à
convicção?”

Em resposta a essa objeção, minha primeira observação é


que, quando um homem assume o cargo solene e altamente
responsável de instrutor público de outros, nós devemos presumir
que ele examinou os credos mais importantes (chamados
cristãos!) com toda a deliberação, sinceridade e oração de que é
capaz, e que ele formou sua opinião com relação aos princípios
fundamentais das Escrituras.

Supor que alguém é capaz de assumir os deveres do


ministério enquanto está indeciso e instável,

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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suscetível de ser “levado por todo vento de doutrina”


(Efésios 4.14), é supor que ele é tanto fraco quanto
criminoso em um grau muito grande.

Eu sei, de fato, que alguns ardentes opositores dos credos


consideram um estado de completa indecisão, mesmo em relação
às principais doutrinas teológicas, como o estado de espírito mais
louvável e desejável. Eles desejam que cada homem, não apenas
se sinta um aprendiz até o fim da vida, o que é indubitavelmente
correto, mas também, se possível, que se mantenha em um
equilíbrio de espírito em relação às opiniões doutrinárias mais
importantes, que estejam equivalentes a uma indiferença perfeita
sobre se ele mantém ou abandona suas opiniões atuais. Isso eles
elogiam como “abertura para a convicção”, “liberdade de
preconceitos”, etc.

Sem parar para combater esse sentimento em geral, não


hesito em afirmar que é irracional em si mesmo, contrário às
Escrituras e um inimigo de toda estabilidade e conforto cristãos.
Sabemos o que é dito na Palavra de Deus sobre aqueles “que
aprendem sempre e jamais podem chegar ao conhecimento da
verdade” (2 Timóteo 3.7).

Eu repito: nós devemos supor que aquele que se propõe a


ser um instrutor dos outros está ele mesmo, como o apóstolo

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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expressa, “fundamentado e firmado na fé” (Colossenses 1.23).


Então, nós deveríamos ser considerados como tendo toda a
segurança que a natureza do caso permite, de que aquele que se
apresenta como uma das luzes e líderes de uma comunidade
religiosa está firme nos princípios que ele professou e não será
muito propenso, essencialmente, a alterar o seu credo.

Além disso, a mesma objeção poderia ser levantada, com


igual força, contra um homem fazer qualquer declaração pública
de suas opiniões, seja pregando, seja escrevendo ou seja
imprimindo, caso ele possa, depois, obter mais luz e ainda assim
ser tentado a aderir, contrariamente à sua consciência, ao que ele
havia anteriormente defendido publicamente.

Mas algum ministro honesto do evangelho acha que é seu


dever deixar de pregar ou expressar as suas opiniões porque é
possível que ele as mude posteriormente? Nós sabemos que se o
pregador de uma congregação unitarista mudar as suas opiniões e
se tornar ortodoxo, ele deve deixar o seu lugar, renunciar ao seu
salário e procurar emprego entre suas novas conexões.

A mesma coisa aconteceria se ocorresse uma mudança


inversa, e um pregador ortodoxo se tornasse unitarista. E então?
Porque um homem honesto, ao mudar de ideia sobre o assunto da
religião, sempre se manterá pronto para mudar a sua situação e
fazer todo sacrifício necessário. Portanto, ele nunca deveria se

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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aventurar a assumir qualquer posição pública, para que ele não


pense sempre como pensa no presente?

Não. Esta objeção, se prova alguma coisa, será encontrada


provando muito mais do que os próprios opositores imaginam. Os
adversários dos credos reconhecem, de comum acordo, que cada
um deve estar pronto para professar a sua crença na Bíblia. Mas
mesmo essa profissão não estaria sujeita à acusação de ser
“prejudicial à livre investigação” como qualquer outra?

Suponha que alguém, após declarar solenemente sua crença


na Bíblia, deixe de acreditar nela. Ele estaria obrigado a
considerar sua antiga subscrição ainda vinculativa e que impede
uma nova análise? Ou seria razoável para qualquer homem
declinar qualquer profissão de fé na Bíblia, para que ele, um dia,
não mude de opinião e se sinta constrangido por sua profissão?

Não há dúvida de que todo ato público pelo qual um homem


se compromete, mesmo como um membro privado, a uma
denominação específica de cristãos, coloca algum obstáculo em
seu caminho para depois abandonar essa denominação e unir-se a
outra. E, talvez, possa ser dito que, quanto mais delicada e
honrosa for a sua mente, mais relutante e lento ele será para
abandonar as suas antigas conexões e escolher novas. Assim, tal
pessoa realmente enfrentará uma tentação de resistir à luz e de
permanecer onde ele está.

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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Mas porque isso é assim, deveria um homem nunca se unir a


nenhuma igreja, nunca dar um passo que, direta ou indiretamente,
comprometa o seu credo ou caráter religioso, para que ele não
mude de opinião depois e se veja obrigado a transferir sua relação
para um corpo diferente, ficando assim sujeito a se ver
constrangido por seus passos anteriores?

Seguindo esse princípio, nós devemos ir além e adotar a


doutrina, igualmente absurda e pagã, de que nenhum pai deveria
instruir o seu filho naquilo que considera as verdades mais
preciosas do evangelho, para que ele não encha a sua mente de
preconceitos e apresente um obstáculo à livre e desimpedida
investigação posterior. Pois não há dúvida de que a instrução
parental precoce apresenta mais ou menos obstáculo ao caminho
de uma mudança subsequente de opinião sobre os assuntos que
essa instrução abraçou.

No entanto, o nosso Pai celestial ordenou


expressamente que instruíssemos os nossos filhos e
que nós procurássemos preencher as suas mentes
com tudo o que é excelente em princípio e prática.

Em resumo, se a objeção mencionada for válida, então


ninguém deveria avançar no cumprimento de qualquer dever, pois

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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ele pode um dia deixar de considerá-lo um dever. Em outras


palavras, ele deve habitualmente, e por princípio, desobedecer a
alguns dos comandos mais claros de Deus, para que ele possa
posteriormente entreter as visões diferentes daquelas que ele tem
atualmente.

Não. Se isso for verdade, então cada livro que um homem lê


e cada investigação cuidadosa e profunda que ele faz sobre o
assunto, deve ser considerado como tendendo a influenciar a
mente e a interferir na imparcialidade perfeita em qualquer
investigação subsequente sobre o mesmo assunto, e, portanto,
deve ser evitado! Certamente nenhum homem em sã consciência
julga ou age assim. Especialmente, nenhum cristão se permite
raciocinar ou agir assim.

No caminho do que parece ser o dever presente, ele se sente


obrigado a seguir em frente, deixando as coisas futuras com Deus.
Se a subscrição a um credo correto é realmente conforme a
vontade de Deus, se ela é necessária tanto para a pureza quanto
para a harmonia da igreja, e, portanto, em si mesma um dever,
então nenhum homem deve hesitar em cumprir esse dever, assim
como em cumprir qualquer um desses deveres mencionados ou
outros que possam ser supostos. Não há posição na vida em que
seu ocupante não encontre alguma tentação peculiar.

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Mas, se ele é uma pessoa de espírito correto, ele a enfrentará


com integridade cristã e a superará com coragem cristã. Se ele é
um homem verdadeiramente honesto, será fiel ao seu Deus e fiel à
sua própria consciência, a qualquer custo! Se ele não é honesto,
não será muito provável que beneficie a igreja com as suas
descobertas e especulações.

Nesse sentido, a voz da história confirma este raciocínio.


Por um lado, quantos milhares de casos os últimos dois séculos
forneceram de homens dispostos a incorrer não apenas em calúnia
e reprovação, mas também em mendicância, prisão e até mesmo
na própria morte, em suas formas mais horríveis, antes de
abandonar a verdade e subscrever a fórmulas que não podiam
adotar conscientemente!

Por outro lado, quantos casos ocorreram, nos últimos


cinquenta anos, de homens sem princípios que, após
subscreverem solenemente credos ortodoxos, ignoram os seus
votos e se opuseram ao espírito desses credos, ainda retendo as
suas posições eclesiásticas sem reserva!

Portanto é evidente que toda essa objeção, embora


enganosa, não tem a menor solidez. Homens verdadeiramente
íntegros e piedosos sempre seguirão as suas convicções.
Enquanto, em relação àqueles de caráter oposto, sua luz, quer

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permaneçam quer partam, se mostrará de nenhum valor, seja para


eles mesmos ou para a igreja de Deus.

3.4. Uma quarta objeção comum contra os Credos é que eles


falharam em cumprir completamente o propósito que se dizia
ser destinado à eles.

Afirma-se que “igrejas com credos mais elaborados e


rígidos estão longe de estar unidas em opiniões doutrinárias,
assim como algumas que nunca tiveram credos, ou há muito
tempo deixaram de exigir a subscrição a eles. Dois exemplos
citados são a Igreja da Inglaterra, que teve artigos decididamente
calvinistas por quase três séculos, aos quais os seus candidatos
ao ministério são obrigados a subscrever, mas que, ao longo do
tempo, permitiu várias formas de heresia, e a Igreja da Escócia,
que teve uma confissão rigidamente ortodoxa, mas agora se
supõe ter um ministério longe de ser unânime em honrar os seus
padrões públicos. A objeção sugere que, se os credos não
conseguiram eliminar completamente a dissensão e a discórdia
nas igrejas, por que continuar com eles?”

Essa objeção parte do pressuposto de que um remédio que


não possui eficácia de cura completa não tem valor algum. Se os
credos não eliminaram totalmente a dissensão e a discórdia nas

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igrejas que os adotaram, então, de acordo com essa visão, eles não
cumpriram o seu propósito e são inúteis.

No entanto, esse raciocínio é válido? Ele se alinha com o


senso comum ou com a experiência em qualquer área da vida? A
Constituição dos Estados Unidos, por exemplo, não conseguiu
erradicar completamente a animosidade política e a contenda, mas
isso a torna sem valor? Nós seríamos mais unidos e harmoniosos
sem qualquer disposição constitucional? Porque o sistema legal
não erradica todo crime, nós devemos concluir que seria
igualmente bom sem ele? Ninguém afirmaria isso.

Poderia a objeção ser virada contra aqueles que a


apresentam? Eles argumentam que os credos são desnecessários,
que a Bíblia é suficiente como teste de verdade.

No entanto, a Bíblia eliminou a dissensão e a discórdia na


igreja? Certamente, ninguém argumentaria que sim. Mas por quê?
Não por causa de algum defeito na Bíblia, mas devido à
obstinação humana, que continua a guerrear contra a paz do
mundo.

Além disso, sustento que a história da influência prática dos


credos os apoia fortemente. Embora não tenham alcançado tudo o
que se poderia desejar, eles obtiveram sucesso em muitos casos,
inclusive em igrejas frequentemente citadas como exemplos de
sua falta de eficácia.

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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Os artigos calvinistas da Igreja da Inglaterra, por exemplo,


mantiveram-na doutrinariamente pura durante a maior parte de
cem anos. No reinado de Tiago I, poucos opositores do
calvinismo ousavam declarar publicamente as suas opiniões, e
aqueles que o faziam eram severamente disciplinados. Assim, os
credos foram eficazes em conter o avanço do erro e retardar o
seu triunfo. A aplicação fiel desses padrões públicos foi crucial.
Quando essa aplicação fiel cessou, o efeito dos credos foi
comprometido. Isso é surpreendente? Não mais do que nós
ficarmos surpresos quando um medicamento não cura após o seu
uso ser interrompido.

Uma representação substancialmente semelhante pode ser


delineada em relação à Igreja da Escócia. O seu credo
preeminente e excelente foi, sob a providência de Deus, um meio
eficaz de mantê-la unida e pura, enquanto esse credo foi
honestamente utilizado como teste, conforme a sua verdadeira
intenção e espírito. Quando isso deixou de ocorrer, teria sido
estranho, de fato, se a situação tivesse permanecido inalterada.

No entanto, isso não ocorreu.

Com a subscrição relaxada e desonesta, a heresia


encontrou espaço: inicialmente com reserva e cautela. Mas,
posteriormente, mais abertamente. Mesmo assim, até os dias
atuais, para aqueles familiarizados com o estado dessa igreja, os

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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movimentos heréticos em seu seio são mantidos sob controle


muito saudável, e sua condição é incomparavelmente mais
favorável do que poderia ter sido caso seus padrões públicos
tivessem sido abolidos há muito tempo.

Os credos dessas igrejas nacionais da Inglaterra ainda não


alcançaram todos os benefícios destinados à causa da verdade e
da justiça. Embora o espírito genuíno tenha sido esquecido por
muitos há muito tempo, isso não é o caso de todos. Em ambas as
igrejas, sempre houve um corpo de fiéis testemunhas da verdade.
Este corpo está crescendo, graças ao Rei Todo-Poderoso e
Todo-Gracioso de Sião!

Suas “boas confissões” formam um ponto de encontro, ao


redor do qual muitos estão se reunindo, e esses formulários
famosos, cuja influência favorável muitos supuseram estar há
muito tempo esgotada, tornar-se-ão novamente, há todas as razões
para acreditar, um “estandarte para o povo”, para o qual haverá
uma aglomeração daqueles que amam a “simplicidade que há em
Cristo”, mais extensa e mais gloriosa do que nunca.

Não estamos sem testemunhos significativos para a eficácia


dos credos e para os prejuízos de estar sem eles em nosso próprio
país. Quanto ao primeiro, a Igreja Presbiteriana nos Estados
Unidos é um dos exemplos mais notáveis. Embora tenha
enfrentado conflitos, foram do tipo incidente a toda comunidade,

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eclesiástica ou civil, administrada pelos conselhos de homens


imperfeitos.

No meio de tudo isso, a igreja tem, pelo favor de seu Cabeça


Divino, seguido o seu caminho, substancialmente fiel ao seu
sistema de doutrina e ordem. Embora inicialmente constituída por
membros de diferentes países e hábitos, ela permaneceu unida em
grau, considerando todas as coisas, verdadeiramente maravilhoso.

Quanto ao último, as igrejas congregacionais de


Massachusetts fornecem um memorial melancólico. Embora
originalmente formadas por um povo muito mais homogêneo em
seu caráter e hábitos, e muito mais unido em suas opiniões, ainda
assim, sendo desprovidas de qualquer vínculo de união eficiente e
igualmente desprovidas dos meios de mantê-lo, mesmo que os
possuíssem, elas caíram vítimas da dissensão e do erro, em um
grau igualmente instrutivo e lamentável.

3.5. A última objeção que vou considerar é que a adesão aos


Credos [e Confissões] não só falhou em gerar os benefícios
esperados por seus defensores, mas, ao contrário, foi
identificada como uma fonte de males opostos, fomentando
discórdia e conflitos.

Alguns argumentam que os “credos”, em vez de promover a


reconciliação e a união mais estreita entre os membros das igrejas,

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têm sido uma fonte de disputas, incitando acusações mútuas de


heresia e gerando sentimentos negativos entre aqueles que, de
outra forma, poderiam estar perfeitamente em harmonia.

Em resposta a essa objeção, minha primeira observação é


que o suposto fato que ela implica é categoricamente negado. Não
é verdade que credos tenham gerado conflitos e contendas entre
as igrejas que os adotaram.

Pelo contrário, seria fácil mostrar, por meio de uma extensa


indução de fatos, que nas igrejas em que credos e confissões
foram mais valorizados e observados, a união e a paz
prevaleceram de maneira notável. De fato, a falta de um respeito
fiel por tais formulações tem levado à divisão e contenda na igreja
de Cristo. É duvidoso que qualquer denominação de cristãos já
tenha existido, por meio século, sem um credo público, por mais
unida e harmoniosa que possa ter sido no início desse período,
sem apresentar, antes do seu término, ou um silêncio como o da
morte, resultado da indiferença fria à verdade, ou uma cena
miserável de discórdia, na qual o “separar-se” (Atos 15.39) era o
único meio de escapar da violência aberta.

Minha próxima observação é que, mesmo que fosse provado


que os credos ortodoxos públicos, indiretamente, estão de maneira
frequente ligados a conflitos e contendas na igreja, isso não
constituiria um argumento sólido contra eles. O ardente apego

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àquilo que consideravam verdade é o princípio que, em todas as


épocas, levou as comunidades cristãs a adotarem credos e
confissões de fé. O mesmo ardente apego à verdade naturalmente
os levará a vigiar com cuidado contra tudo o que lhe é hostil e a
“batalhar diligentemente” (Judas 3) em sua defesa quando ela é
atacada. Nesse caso, um credo, supondo que seja sólido e bíblico,
não é mais a causa de conflito e divisão do que um medicamento
saudável é a causa da doença que se destina a curar.

A palavra de Deus nos ordena a “batalhar” e a “batalhardes,


diligentemente, pela fé que uma vez por todas foi entregue aos
santos” (Judas 3) e a considerar “anátema” aquele que prega
“outro evangelho” que não seja o revelado nas escrituras (Gálatas
1.6-9). Mas quando tal “contenda” se torna necessária, quem é o
culpado por isso? Certamente não a verdade, ou os seus
defensores, mas aqueles que patrocinam o erro e assim tentam
corromper o corpo de Cristo, tornando, é claro, a contenda pela
verdade um dever.

Admite-se, de fato, que, nesse conflito, pode surgir muito


comportamento profano: não apenas por parte dos defensores do
erro, mas também, em certa medida, por parte dos amigos da
verdade. Eles podem contender, mesmo pela verdade, com
fanatismo e amargura. Ainda assim, isso não torna a verdade em
si menos preciosa, nem o dever de contender por ela menos

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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imperativo, nem esses resumos que os cristãos foram levados a


formar menos valiosos como testemunhos para Deus.

Antes da pregação do Cristianismo no Império Romano,


diversas classes de pagãos conviviam pacificamente. A base dessa
harmonia residia na crença de que o erro era inofensivo e que
todas as vertentes religiosas eram igualmente seguras.

Contudo, quando a religião de Jesus Cristo foi proclamada e


os seus ministros afirmaram que não havia outro sistema
verdadeiro ou seguro, que não existia outra fundação de
esperança, que todas as religiões falsas eram não apenas
altamente criminosas, mas também eternamente destrutivas, e que
os seguidores de Cristo não podiam tolerar nenhuma delas, uma
cena de perseguição e violência chocante, perpetrada pelos
pagãos, teve início. Entretanto, sobre o que ou quem nós devemos
atribuir a culpa por essas cenas de violência?

Certamente, ninguém dirá que é culpa do Cristianismo. Nós


devemos atribuir isso à corrupção da natureza humana e à
cegueira e violência da malícia pagã. Se os cristãos primitivos
tivessem estado dispostos a renunciar à preciosa verdade que lhes
foi confiada e a agir com base no princípio de que todas as formas
de fé eram igualmente seguras, eles poderiam ter escapado em
grande parte, senão totalmente, da terrível perseguição que foram
chamados a suportar.

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A única observação adicional que tenho a fazer sobre a


objeção apresentada é que ela não pode ter força, exceto no
princípio de que o erro deve ser deixado sem oposição e que a
contenda pela verdade não é um dever, pois toda defesa da
verdade contra seus opositores ativos - todo “batalhar pela
verdade” (cf. Judas 3) - deve, é claro, perturbar aquela
tranquilidade fria e semelhante à morte que a indiferença à pureza
da fé tende a introduzir.

Nós somos ordenados a “se possível, quanto depender de


vós, tende paz com todos os homens” (Romanos 12.18). Mas não
é “possível” estar em paz com alguns homens. Nós não devemos
estar em paz com o erro ou com a maldade. A autoridade divina
torna o nosso dever opor-nos a eles ao máximo sob nosso risco. E
se, no cumprimento desse dever, a paz da igreja for, por algum
tempo, perturbada, o pecado está à porta daqueles que tornaram o
conflito necessário.

Esses resumos da verdade, cuja incorporação e publicação


se tornam importantes em ocasiões específicas, não têm mais
culpa pela luta do que a sábia e saudável lei do país é culpada pela
agitação que inevitavelmente acompanha a prisão, o julgamento e
a execução de um criminoso.

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4. A Extensão dos Credos.

Ao se admitir que os credos sejam legítimos e necessários,


surge frequentemente a indagação por parte de alguns que
professam ser seus defensores: deveriam esses credos conter
apenas alguns poucos artigos estritamente fundamentais?

Em outras palavras, seria apropriado inserir em um credo,


destinado a ser assinado por todos os candidatos a cargos em uma
igreja, mais do que alguns poucos artigos, cuja aceitação é
geralmente considerada como absolutamente essencial para o
caráter cristão?

Esta é uma questão de real importância, que certamente


merece consideração séria e uma resposta franca.

Pessoalmente, eu não hesito em afirmar que, na minha


opinião, os credos das igrejas não apenas podem legalmente, mas
sempre devem, conter diversos artigos além daqueles que são
fundamentais. Para estabelecer isso, parece-me que nenhuma
outra prova é necessária além de simplesmente observar que há
muitos pontos, inegavelmente não fundamentais, sobre os quais,
no entanto, é de extrema importância para a paz e edificação
cristã que os membros, e especialmente os ministros de cada
igreja estejam harmonizados em suas visões e práticas.

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Enquanto a igreja visível de Cristo continuar dividida em


diferentes seções ou denominações, os diversos credos que
utilizam, se pretendem cumprir algum propósito efetivo, devem
ser construídos de maneira a excluir de cada um aqueles
professores que a igreja conscientemente acredita serem não
bíblicos e corruptos, e que enquanto mantiverem essa crença,
devem ser excluídos.

Para ilustrar o meu ponto: a Igreja Presbiteriana, assim


como a maioria das outras denominações com um sistema regular
de governo, acredita que o ministério cristão é uma ordenança
divina, e que apenas aqueles devidamente autorizados a
exercer suas funções devem, de qualquer maneira, tentar
pregar o evangelho ou administrar os sacramentos da igreja.

No entanto, há homens muito piedosos e excelentes que


adotaram os sentimentos de alguns Independentes mais convictos,
que realmente pensam que todo “irmão dotado”, seja ele
ordenado ou não, tem o mesmo direito de pregar que qualquer
homem. Caso este seja convidado pela igreja a fazê-lo, de
também administrar os sacramentos.

Agora, nenhum presbiteriano de mente sóbria considerará


isso como uma questão fundamental. De fato, ela é fundamental
para a ordem eclesiástica. Mas não para a existência do caráter
cristão. Homens podem diferir completamente sobre esse ponto e,

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ainda assim, estar igualmente unidos a Cristo pela fé e, portanto,


igualmente seguros em relação às suas perspectivas eternas.

No entanto, algum presbiteriano verdadeiro e consistente


estaria disposto a se associar a uma igreja, chamando-se por esse
nome, na qual, enquanto uma parte considerasse apenas um
ministro regular como competente para exercer as funções
mencionadas, tantos da outra parte quanto desejassem
reivindicassem e realmente exercessem o direito de se levantar na
congregação, [em atos como] pregar, batizar e dispensar a Ceia do
Senhor, quando e como cada um pensasse ser adequado? E, não
apenas isso, mas quando os ministros ordenados ocupando o
púlpito, em sucessão, diferissem tão completamente entre si em
relação à questão controversa, alguns encorajando, e outros
reprimindo, os esforços desses “irmãos dotados”?

Não pergunto se tal igreja poderia ser tranquila ou


confortável, mas se poderia possivelmente existir em um estado
de coesão por doze meses consecutivos?

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5. Um Outro Exemplo: A Questão do Batismo


Infantil.

Tomemos outro exemplo. Nenhum homem em seu juízo


considerará a questão que divide os pedobatistas e os
antipedobatistas como fundamental. Embora eu não tenha dúvidas
de que o batismo infantil é uma doutrina bíblica e uma doutrina
extremamente importante, e que a rejeição dela é um erro
prejudicial, ainda assim eu não tenho dúvidas de que alguns
homens eminentemente piedosos têm tido uma opinião diferente.

Mas qual seria a situação de uma igreja igualmente dividida,


ou quase isso, neste ponto: ministros, assim como membros
leigos, constantemente discordando entre si; membros de cada
partido conscientemente persuadidos de que os outros estavam
errados; cada um dando grande ênfase ao ponto de divergência,
como um sobre o qual não poderia haver compromisso ou
acomodação; todos reivindicando e se esforçando para exercer o
direito não apenas de raciocinar, mas de agir, de acordo com suas
respectivas convicções; e cada um zelosamente se esforçando
para fazer prosélitos de suas próprias doutrinas e práticas?

Com qual dessas igrejas esta mais se assemelharia? Aos


construtores de Babel, quando a sua linguagem foi confundida?
Ou a uma família santa e unida, “edificando-se e caminhando no

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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temor do Senhor, e, no conforto do Espírito Santo, crescia em


número” (cf. Atos 9.31; Efésios 4.16)?

Permita-me oferecer mais uma ilustração. A questão entre


os Presbiterianos e os Prelatistas é geralmente reconhecida como
não sendo fundamental.

Não quero dizer que isso seja reconhecido por nossos


irmãos Episcopais que tranquilamente relegam ao que eles
chamam de “misericórdia não pactuada de Deus” todas as
denominações que não têm um ministério episcopalmente
ordenado, e que devido a esse sentimento exclusivo, elas são
chamadas pelo Bispo Andrews de “corações de ferro” e pelo
Arcebispo Wake de “loucos”.

Mas o que eu quero dizer é que todos os Presbiterianos, sem


exceção, a grande maioria dos melhores Prelatistas, e todos os
protestantes moderados e equilibrados, de todos os países,
reconhecem que esse ponto de controvérsia não afeta de maneira
alguma o caráter ou a esperança cristã.

Ainda assim, não é evidente que um corpo de ministros que


difere completamente entre si nesse ponto - embora possam se
amar e ter comunhão como cristãos - não poderia ser possível agir
harmoniosamente juntos no importante rito da ordenação,
qualquer que seja a sua atuação em outras questões religiosas?

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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Em todos esses casos, é evidente que não há nada


fundamental para a existência da piedade vital.

No entanto, é igualmente evidente que aqueles que diferem


total e zelosamente sobre os pontos sutis não podem estar
confortáveis na mesma comunhão eclesiástica. Mas como a
reunião deles, e a discordância e contenda consequentes que
seriam inevitáveis, pode ser evitada? Não conheço outro método
além de elaborar as suas Confissões de Fé de maneira a formar
diferentes famílias (ou denominações) e excluir de cada uma delas
aqueles que são hostis aos seus princípios distintivos de ordem.

É claro que, a menos que as Confissões de Fé incluam


artigos que não sejam estritamente fundamentais,
elas não conseguem cumprir efetivamente o
propósito primordial para o qual são elaboradas. Esse
propósito é preservar as igrejas que buscam a ordem
e a disciplina puras, assim como a verdade das
Escrituras, protegendo-as contra a interferência de
professores que, mesmo sendo piedosos, poderiam
perturbar a paz e prejudicar a edificação da parte
mais sólida e correta do corpo eclesiástico.

Para uma análise mais aprofundada deste assunto, tanto a


favor quanto contra a doutrina que defendo, recomendo a consulta

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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às obras dedicadas a uma discussão mais detalhada.


Especificamente, destaco o que é mencionado pelo perspicaz e
excelente Sr. Dunlop no habilidoso “Prefácio” à sua Coleção de
Confissões, além de “The Confessional” do Sr. Blackburne, um
dos opositores mais fervorosos e formidáveis dos credos (que o
preparará para a leitura de algumas das melhores respostas
valiosas a essa obra famosa). Recomendo também a leitura de
“Vindication of the Church of Scotland” de Walker, entre outros,
e por fim, “Inquiry into the Nature of Subscription to Articles of
Religion” do Sr. Dyer.

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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6. Considerações Finais.

Caros alunos, o tema sobre o qual tenho me dirigido a vocês


é eminentemente prático. Ele adentra profundamente em muitas
questões de dever pessoal e oficial.

Portanto, permitam-me prendê-los por mais alguns


momentos, chamando a atenção para algumas inferências práticas
a partir dos princípios e raciocínios anteriores, que me parecem
merecer sua séria consideração.

6.1. A partir das considerações que foram apresentadas, nós


podemos observar quão pouca razão existe para temer os
Credos como instrumentos de opressão.

Há algo tão perfeitamente visionário e irracional no próprio


pensamento de “tirania” ou “opressão” associado à subscrição
de credos neste país, que o único espanto é como isso pode ser
admitido, por um momento sequer, na mente de alguém sóbrio.

Quem impõe ou pode impor um credo a alguém, ou já


tentou fazê-lo? Alguém nos Estados Unidos é obrigado a
professar alguma crença, subscrever algum credo ou juntar-se a
qualquer igreja? De fato, cada pessoa é obrigada pela lei de Deus
a crer corretamente e a se unir a uma igreja pura. Ela não tem e

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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não pode ter a liberdade, diante do Senhor, de negligenciar


qualquer uma dessas responsabilidades.

No entanto, algum ser humano, seja pela lei eclesiástica ou


civil, é obrigado a fazer alguma dessas coisas? Alguma pessoa
nos Estados Unidos, depois de assinar um credo e se juntar a uma
igreja, é obrigada por alguma autoridade humana a permanecer
nessa condição por um único dia a mais do que deseja? Ela não
tem total liberdade para se retirar a qualquer momento, com ou
sem dar uma razão para sua conduta, conforme achar adequado?

Eterno agradecimento àquele que nos concede essa


liberdade! Que ela seja eterna e universal! Agora, alguém
pensaria que esta é liberdade suficiente para satisfazer qualquer
pessoa razoável.

Mas parece que há realmente aqueles que desejam mais.


Eles exigem, na prática, que a igreja esteja disposta a aceitar todo
tipo de heresia, assim como de ortodoxia em seu meio, e a agir
como se considerasse ambas com um olhar igual.

Na verdade, eles pedem que os hereges sejam livremente


autorizados a impor-se sobre ela, quer ela queira ou não - não
para unir e edificar os seus membros, mas para dividir e distraí-lo.
Para que eles tenham a liberdade de entrar na família do Redentor
e, lá, sem considerar as regras bíblicas ou a harmonia feliz da
comunidade, propagar sentimentos tão discordantes e estabelecer

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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princípios de ordem (ou desordem) conforme os intrusos


escolherem adotar.

Mas isso é liberdade cristã? É esse o tipo de liberdade que


qualquer homem benevolente, ou mesmo honesto, gostaria de
possuir? É verdadeiramente uma liberdade extraordinária para o
indivíduo que se intromete. Mas o que acontece com a liberdade
do corpo eclesiástico ao qual ele entra, contrariando os seus
desejos, conforto e causando-lhe prejuízo real?

É evidente que é o mesmo tipo de privilégio na igreja que o


privilégio de invadir o refúgio de famílias particulares, ou
perturbar a paz da sociedade civil, a seu bel-prazer e com
impunidade, seria considerado pelos habitantes de qualquer país
livre.

6.2. Nós podemos observar, a partir do que foi dito, que


subscrever um Credo da igreja não é uma mera formalidade,
mas um rito muito solene, que significa muito e implica em
obrigações muito sérias.

Certamente, é um rito que deve ser encarado com profunda


deliberação e oração humilde, no qual, se um homem é obrigado a
ser sincero em alguma coisa, ele é obrigado a ser honesto com seu
o Deus, honesto consigo mesmo e honesto com a igreja à qual se
junta. Quanto a mim, não conheço nenhum rito em que a

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Credo Reformado - Estudos e Artigos Sobre Confessionalidade Reformada.
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insinceridade seja mais justamente acusada do terrível pecado de


“mentir ao Espírito Santo” (Atos 5.3) do que este.

É verdadeiramente humilhante e angustiante saber que em


algumas igrejas tornou-se costume gradual considerar os artigos
de fé apenas como artigos de paz. Em outras palavras, como
artigos que aquele que subscreve não é considerado como
professando acreditar, mas apenas comprometendo-se a não se
opor - pelo menos de maneira pública ou ofensiva.

Se nós aplicarmos esse princípio ao teste da razão, da


Escritura, da estrutura original dos credos ou do significado
comum da linguagem entre homens honrados, parece igualmente
sujeito à mais severa repreensão, como algo desonroso e criminal
em alto grau. Não me parece que haja qualquer atenuante, seja da
desgraça ou do pecado, no fato de muitos dos presbíteros das
igrejas mencionadas, bem como daqueles que subscrevem [os
seus documentos], declararem publicamente a adoção desse
princípio, admitirem a sua correção, apoiarem-se mutuamente, e
assim escaparem, como imaginam, da acusação de hipocrisia.

O que se pensaria de um princípio semelhante, se


geralmente adotado e confessado, em relação à administração de
juramentos nos tribunais civis? Suponha que tanto jurados quanto
testemunhas, sentindo como uma injustiça serem obrigados por
seus juramentos a falar a verdade, concordassem entre si e

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anunciassem abertamente que não pretendiam, ao jurar, assumir


tal obrigação; que não entendiam assim o significado de seus
juramentos e não tinham a intenção de reconhecer tal significado?
E suponha que os juízes os admitissem livremente aos seus
juramentos com uma compreensão semelhante? Uma testemunha
ou jurado, nesse caso, estaria isento da acusação de perjúrio, ou o
juiz da culpa de suborno ao perjúrio?

Presumo que não, na estimativa de qualquer pessoa de


mente sóbria. Se fosse de outra forma, então homens maus, que
formam a maioria de toda comunidade, poderiam,
combinando-se, violar todos os princípios de virtude e ordem, não
apenas impunemente, mas também sem pecado.

Assim, estabeleça como um primeiro princípio de


honestidade comum, bem como de verdade cristã, que a
subscrição aos artigos de fé é um rito ponderoso que realmente
significa o que professa significar. Que nenhum homem jamais
está autorizado a subscrever artigos nos quais não acredita
verdadeira e plenamente. Ao subscrevê-los, ele se coloca sob um
compromisso solene de aliança com a igreja à qual se une, para
caminhar com ela “na unidade da fé” e “no vínculo da paz e do
amor” (Efésios 4.13; cf. Efésios 4.2–3).

Se ele não puder fazer isso honestamente, que não professe


fazê-lo de forma alguma. Não vejo razão para que, aqui, a falta de

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sinceridade, o ocultamento, a dupla negociação e as reservas


mentais não sejam, no mínimo, tão mesquinhas e vis quanto
podem ser nas transações da vida social e civil.

Talvez, você me questionará sobre o que deve ser feito por


um homem que ama a Igreja Presbiteriana, que a considera como
se aproximando mais do modelo bíblico do que qualquer outra
que ele conheça, que vê na sua Confissão de Fé como de longe a
melhor, em seus grandes contornos e em todos os seus artigos
fundamentais, que ele conhece, e que, no entanto, em alguns de
seus detalhes menores, não pode concordar inteiramente? Pode tal
pessoa subscrever honestamente [os seus padrões confessionais],
sem qualquer explicação prévia de suas opiniões? Eu respondo:
“De modo algum!”

Deve ele, então - você questionará -, abandonar todo


pensamento de se unir à nossa igreja, quando está em harmonia
cordial com ela em todos os princípios fundamentais e mais
próximo dela, em todos os aspectos, do que de qualquer outra
igreja na terra? Eu respondo novamente: “De modo algum!”

Não conheço outro modo de proceder em um caso como


este - que a honestidade cristã e uma consciência pura
justificariam - do que o seguinte: Que o candidato à admissão
exponha, diante do Presbitério perante o qual se apresenta, todas
as suas dúvidas e escrúpulos, com perfeita franqueza, abrindo

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todo o seu coração, como se estivesse sob juramento, sem


amenizar ou ocultar qualquer coisa. Deixe-o fazê-los entender
claramente que, se assinar a Confissão de Fé, deve-se entender
que o faz em conformidade com as exceções e explicações que ele
especifica.

Se o Presbitério, após essa compreensão justa, considerar


que os pontos excepcionados eram de pouca ou nenhuma
importância, que não interferiam em nenhum artigo de fé, e
estiver disposto a receber a sua subscrição da maneira usual, ele
pode prosseguir. Tal método de procedimento estará mais de
acordo com cada princípio de verdade e de honra, e eliminará
todo fundamento tanto para a auto-reprovação quanto para a
reprovação por parte de outros posteriormente.

6.3. Diante da perspectiva apresentada sobre este assunto, nós


podemos determinar como um homem honesto deve agir após
subscrever a um Credo público.

Tal homem sentirá ser o seu dever aderir sinceramente e


fielmente a esse Credo, em público e em particular, e fará o
estudo de promover, por todos os meios ao seu alcance, a paz e a
pureza do corpo ao qual se pactuou.

Se, em algum momento, ele alterar as suas visões sobre


qualquer parte do credo ou da ordem da igreja em questão, será

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incumbência dele indagar se os pontos nos quais mudou de ideia


são de tal natureza que ele pode conscientemente silenciar sobre
eles e “não se tornar causa de tropeço” ao corpo ao qual pertence
(1 Coríntios 10.32; 2 Coríntios 6.3). Se ele puder conciliar isso
com um senso esclarecido de dever, ele pode permanecer em paz.

Mas se os pontos nos quais as suas visões sofreram mudança


são de tamanha importância, em sua avaliação, que ele não possa
ficar em silêncio, mas sinta-se obrigado a publicá-los e a tentar
propagá-los, então que ele se retire pacificamente e se una a
algum outro ramo da igreja visível, com o qual possa caminhar de
forma harmoniosa.

Ele pode encontrar tal lugar quase em qualquer lugar, a


menos que as suas visões sejam singularmente excêntricas. De
qualquer forma, ele não tem mais o direito de insistir em
permanecer - e de ser permitido opor-se publicamente ao que ele
solenemente prometeu receber e apoiar - do que um membro de
qualquer associação voluntária, na qual ele entrou sob
determinados compromissos, mas com a qual ele já não concorda,
tem o direito obstinado de manter a sua conexão com ela e de
aproveitar a influência que sua conexão lhe dá para tentar
despedaçá-la.

Não é uma objeção sólida a essa visão do assunto alegar que


todo homem está sob determinadas obrigações de obedecer ao

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grande Cabeça da Igreja, obrigações estas que são completamente


superiores às que o vinculam, em virtude de quaisquer
compromissos eclesiásticos, a obedecer à igreja em si. Isso é
prontamente concedido.

Nenhum homem pode licitamente se comprometer a


desobedecer a Cristo, em qualquer caso que seja.

Mas esse princípio concebido não tem nada a ver com o


ponto em consideração. Embora um homem não possa
propriamente se comprometer a crer sempre como crê agora, nem
a permanecer sempre em conexão com o corpo eclesiástico ao
qual se junta agora, ele pode prometer com segurança que será um
membro regular e ordenado do corpo, enquanto permanecer em
conexão com ele.

Quando ele deixa de ser capaz de fazer isso, sem pecar


contra Deus, se é um homem honesto, ele se retirará
imediatamente. Se ele permanecer e se permitir habitualmente
violar o seu compromisso, sob a premissa de beneficiar o corpo
ao qual jurou lealdade, ele será responsável pelo pecado de vil e
traiçoeiramente “praticar males para que venha o bem” (Romanos
3.8).

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Para ilustrar o meu ponto com um exemplo familiar: Todo


estudante desta seminário fez, em sua entrada, uma promessa
solene de que “enquanto permanecer membro dela, observará
consciente e vigilante todas as regras e regulamentos
especificados no plano para sua instrução e governo, na medida
em que se relacionam aos alunos. Além disso, que obedecerá a
todas as exigências legítimas dos Professores e Diretores”, etc.

Como esse compromisso foi feito voluntariamente, nenhum


homem honesto duvidará que todos estão obrigados a agir em
conformidade com ele, até o último detalhe, na medida de sua
capacidade. Suponha, no entanto, que um de vocês fique
convencido de que algumas das “regulações especificadas no
plano” do seminário não são apenas imprudentes e
inconvenientes, mas também imorais. O que ele deveria fazer?
Deveria permanecer na instituição e violar habitualmente as
regulamentações às quais se opôs, alegando que não poderia
obedecê-las conscientemente, porque, embora tivesse se
comprometido solenemente a fazê-lo, sentia-se sob uma
obrigação anterior e superior de “obedecer antes a Deus que aos
homens” (Atos 5.29)? Isso, com certeza, nenhum cristão
aprovaria, nem governo fiel algum toleraria.

Não. Todo princípio de honra e de integridade ditaria que


ele se retirasse imediatamente do seminário. Além disso se, após a
retirada, ele conseguisse convencer a Assembleia Geral de nossa

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igreja de que suas exceções eram justas e conseguisse persuadir


esse corpo a alterar as regras ofensivas, então, e somente então,
ele poderia, com boa consciência, retomar seu lugar na
instituição.

6.4. Nós refletimos, a partir da representação que foi


apresentada, sobre quão fácil é para um único ministro
imprudente ou insensato causar danos extensos e irreparáveis
à igreja.

Tal pessoa, especialmente se for um homem de talento e


influência, ao posicionar-se - seja aberta ou dissimuladamente -,
contra os padrões públicos de sua igreja, ao dirigir-se aos
sentimentos e aproveitar-se dos preconceitos populares, pode
fazer mais, em pouco tempo, para preparar o caminho para o erro
fatal, do que toda a sua utilidade - ainda que multiplicada cem
vezes -, seria capaz de contrabalançar.

Ministros, meus jovens amigos, podem ser considerados


como detentores dos interesses da igreja, em grau que nenhuma
outra classe de homens detém, e isso deveria fazê-los tremer sob o
peso de sua responsabilidade! O caráter do ministério de qualquer
igreja em particular será, geralmente falando, o caráter da igreja
em si.

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Por um lado, se os ministros da religião forem geralmente


esclarecidos, ortodoxos, santos, diligentes e fiéis, a igreja à qual
pertencem nunca deixará de mostrar a influência desse caráter em
resultados felizes. Por outro lado, nunca foi a igreja, em qualquer
país ou época, corrompida, dividida e arruinada, sem que o mal
tenha sido causado por seus ministros. Por mais humilhante ou
dolorosa que seja esta afirmação, ela é indubitavelmente
confirmada por toda a Escritura e por toda a experiência.

E como a influência geral do caráter clerical é tão vital, não


é fácil medir o estrago que pode ser causado por um único
ministro insensato, ímpio, imprudente e turbulento. Se, em todos
os setores da sociedade, “um pecador destrói muitos bens”
(Eclesiastes 9.18), quanto mais difundido, deplorável e fatal é o
estrago quando o indivíduo criminoso é um ministro!

Por meio de opiniões errôneas, por hábitos corruptos, por


amor à inovação, ao abraçar a si mesmo e difundir
extensivamente para outros os seus delírios perniciosos, ele pode
fazer mais em cinco ou dez anos para agitar, dividir, corromper e
enfraquecer a igreja do que, talvez, uma dezena dos ministros
mais fiéis na terra pode fazer, humanamente falando, para
promover a sua pureza e paz em meio século!

Em Massachusetts, há mais de 50 anos, a influência de dois


ou três indivíduos, com talentos populares, minando gradualmente

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a ortodoxia e reconciliando a mente pública com opiniões


heréticas, é tão conhecida quanto profundamente lamentada por
muitos que estão familiarizados com a história eclesiástica de
Nova Inglaterra.

Os autores deste mal há muito partiram para a prestação de


contas, mas as suas obras sobreviveram a eles, e sobre as suas
terríveis devastações, ninguém pode estimar a extensão ou
vislumbrar o fim.

Amados alunos! Que seja vossa constante preocupação


nutrir um profundo senso de vossa solene responsabilidade para
com Deus e Sua igreja! Em pouco tempo, vocês estarão entre
aqueles a quem os mais sérios interesses que podem ser confiados
a um homem serão entregues. Sejam fiéis à vossa elevada
responsabilidade!

Guardem, com a máxima vigilância, a ortodoxia da igreja!

Nada pode ser verdadeiramente correto quando os princípios


doutrinários dela são essencialmente equivocados. Mas, oh, não
pensem que uma mera ortodoxia fria, por mais perfeita que seja, é
tudo o que é necessário. Trabalhem para difundir, em todas as
direções, a influência santa e benigna da verdade.

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Se “a família da fé” (Gálatas 6.10) for corrompida por


heresia, dilacerada por cisma, agitada por inovações profanas ou
tornada fria pela falta de fidelidade ministerial, certifiquem-se de
que nenhum de vocês seja encontrado entre os promotores do mal.

Certifiquem-se de buscarem incessantemente não “as vossas


próprias coisas” (Filipenses 2.21), o vosso próprio
engrandecimento, a vossa própria honra, as vossas próprias
fantasias ou as vossas próprias especulações, mas “as coisas que
são de Jesus Cristo”. Se não puderem beneficiar a Igreja (e
nenhum homem tem o direito de dizer que não pode, se tiver um
coração para isso), pelo menos não emprestem a sua influência ao
trabalho profano de corrompê-la e dividi-la.

E se, em algum momento, vocês se encontrarem em


circunstâncias em que não possam fazer mais nada, certifiquem-se
de que sejam encontrados, como os “ministros do Senhor” de
outrora, chorando, como “ministros do Senhor, entre o pórtico e o
altar, e orem: Poupa o teu povo, ó Senhor, e não entregues a tua
herança ao opróbrio, para que as nações façam escárnio dele”
(Joel 2:17).

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6.5. Nós podemos inferir, a partir do que foi dito, o dever e a


importância de todos os membros, especialmente os ministros
da Igreja Presbiteriana, esforçarem-se para difundir o
conhecimento de seus padrões públicos.

Digo “padrões públicos”, apesar de todas as zombarias e


censuras lançadas sobre essa linguagem. Pois todo homem
inteligente e honesto na comunidade sabe que a empregamos para
designar não fórmulas que colocamos acima da Bíblia, mas
simplesmente aquelas que determinam e expõem como
interpretamos a Bíblia.

Essas fórmulas, se realmente são um resumo da


Palavra de Deus, e certamente pensamos que são,
todo ministro é obrigado a divulgá-las, com
assiduidade incansável, entre as pessoas de sua
responsabilidade.

No geral, isso está tão longe de ser feito fielmente, que eu


duvido seriamente se existe uma igreja protestante no cristianismo
em que haja uma deficiência tão evidente no cumprimento desse
dever, especialmente em algumas partes do país, como na Igreja
Presbiteriana.

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Os nossos irmãos episcopais exercem uma diligência


louvável ao colocar o volume que contém os seus artigos, formas
e ofícios em cada família ao alcance deles, que pertence à sua
comunhão ou pode ser considerada como inclinando-se para ela.
Os nossos irmãos metodistas e batistas, com não menos
diligência, fazem o mesmo em relação a esses livros que
apresentam as doutrinas e a ordem de suas respectivas
denominações. Isso está correto, conforme deveria ser. Isso
denota homens sinceros em sua crença e zelosos na disseminação
do que consideram princípios corretos.

Por que tantos ministros da Igreja Presbiteriana, com uma


Confissão de Fé e Catecismos que, sinceramente acredito, e que a
maioria deles prontamente reconhece, são de longe os melhores já
elaborados pela sabedoria não inspirada - e com uma Forma de
Governo e Disciplina mais em conformidade com a prática
apostólica do que a de qualquer outra igreja na terra - ainda são
tão negligentes, para não dizer indiferentes, em relação à
circulação dessas fórmulas?

Eles, talvez, nem se deem ao trabalho de perguntar se há


uma cópia do volume que as contém em cada família, ou mesmo
em cada vizinhança, de suas respectivas congregações.

Como nós podemos explicar a peculiar frequência dessa


negligência no ministério de nossa igreja? Seria longe de ser

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verdade, espero, afirmar que o nosso clero é mais infiel no


cumprimento geral de seus deveres do que o de qualquer outra
comunhão. Não podemos atribuir o fato em questão a outro fato,
do qual seria natural esperar que surgisse?

O fato ao qual me refiro é que, na Igreja Presbiteriana, nos


dias de hoje, e neste país - seja qual tenha sido o caso em tempos
anteriores - há menos sentimento sectário; menos do que é
chamado de espírito de corpo, do que em qualquer outro corpo
eclesiástico entre nós. Na verdade, se não me engano, nós estamos
tão excessivamente livres disso que mal estamos prontos para nos
defender quando atacados.

Nós estamos tão dispostos a fraternizar com todas as


denominações evangélicas que quase esquecemos que temos uma
denominação própria à qual somos peculiarmente ligados. Agora,
esse espírito geral é indubitavelmente excelente, digno de cultivo
constante e dos maiores elogios. Mas isso não pode estar sendo
levado a extremos?

A benevolência universal e ativa é um dever cristão. Mas


quando o chefe de uma família, no ardor de seu exercício, sente
pouca preocupação ou responsabilidade com relação à sua própria
família, do que sente pelas famílias dos outros, ele age de maneira
irracional e, pior ainda, desobedece ao mandamento de Deus.

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Eu percebo que algo análogo a isso é o equívoco daquele


cristão, ou daquele ministro, que no fervor de sua catolicidade
perde de vista o fato de que Deus, em Sua providência,
conectou-o a uma determinada vertente da igreja visível, cujo
bem-estar e edificação ele está especialmente obrigado a buscar.

Se a sua própria vertente da igreja tem alguma excelência


peculiar em sua avaliação, em virtude da qual ele a prefere - o que
sempre deve ser pressuposto - pode ser errado que ele deseje que
outros a vejam da mesma forma? E se ele for justificável em
recomendar essas peculiaridades do púlpito (como todos
concordam), ele não é igualmente justificável em recomendá-las
pela imprensa, especialmente por meio de publicações
reconhecidas?

Será uma fortuna para a nossa igreja se o seu futuro


ministério for mais atento ao dever em questão do que muitos dos
que os precederam.

A vocês, amados candidatos ao sagrado ofício,


permitam-me recomendar um respeito sagrado por este dever.
Resistam sempre, até onde estiver ao seu alcance, à estreiteza do
sectarismo fanático e esforcem-se por erradicá-lo da igreja.

Ao mesmo tempo, cultivem entre seus membros um apego


esclarecido àquela específica vertente da família de Cristo na qual
vocês estão inseridos. Com esse propósito, busquem promover

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entre eles um conhecimento geral e íntimo de nossa Confissão de


Fé, Forma de Governo e Disciplina, assim como de nossos
Catecismos, os quais, espero sinceramente, não são inteiramente
negligenciados em nenhuma parte da igreja.

Nunca aconselhem as pessoas a aceitar o conteúdo dessas


fórmulas públicas de maneira cega. Pelo contrário,
incentivem-nas a comparar diligentemente cada parte com as
Escrituras e a verificar até que ponto estão de acordo com o
padrão infalível. Dessa forma, vocês provavelmente se tornarão
instrumentos na formação de cristãos sólidos e inteligentes.
Assim, poderão esperar tornar-se os pais espirituais de multidões
cuja fé “não se apoiasse em sabedoria humana, e sim no poder de
Deus” (1 Coríntios 2.5).

6.6. Mais uma vez, se os princípios anteriores forem justos,


então como é infeliz o equívoco daqueles que imaginam que,
ao abandonar todos os Credos e todas as Confissões, estão
prestes a prestar um serviço essencial à igreja, do que
edificá-la de maneira mais extensiva e gloriosa do que nunca!

Há aqueles que imaginam que uma nova ordem de coisas


está prestes a se abrir na igreja, equivalente a uma mudança de
dispensação tão grande quanto a que marcou o progresso do reino
do Redentor em qualquer era anterior. Nesse prospecto novo e

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indefinido, eles se veem antecipando a prostração iminente da


maioria das barreiras e a dissolução da maioria dos laços que, até
então, eram considerados indispensáveis para a manutenção da
unidade e harmonia na família de Cristo.

Apenas direi que será tempo suficiente para lidar com essa
nova ordem de coisas quando ela chegar. Enquanto isso, no estado
atual do mundo, eu tão prontamente pensaria em estender e
edificar a igreja ao deixar de lado todos os meios de graça, quanto
em promover a sua pureza e paz, ao abandonar os métodos de
união entre seus membros que têm sido considerados necessários
desde os dias dos apóstolos?

O apóstolo Pedro exortou assim os cristãos de seu tempo:


“Sede sóbrios e vigilantes. O diabo, vosso adversário, anda em
derredor, como leão que ruge procurando alguém para devorar” (1
Pedro 5.8). E outro apóstolo lembrou àqueles a quem escreveu
que esse adversário muitas vezes “se transforma em anjo de luz”
(2 Coríntios 11.14). Assim era há dezoito séculos, e assim é neste
momento.

As bênçãos da igreja, como foram em todas as eras, agora


são convertidas em meios de decepção. A harmonia progressiva
das diferentes denominações evangélicas, o zelo crescente pela
disseminação do evangelho, a disposição crescente de sacrificar
muitas diferenças menores no altar do nosso cristianismo comum,

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têm tão inflamado as imaginações de alguns espíritos ardentes e


sanguíneos, de forma que eles permitiram a si próprios serem
levados à conclusão não autorizada de que todas as regras
anteriores estavam prestes a serem deixadas de lado e todas as
barreiras anteriores serem derrubadas.

Mas lembrem-se, meus jovens amigos, que uma ideia


semelhante tem sido concebida e, posteriormente, abandonada,
em quase todos os séculos desde a encarnação de Cristo.
Lembrem-se também de que mesmo quando o Milênio chegar, a
natureza humana ainda será depravada e ainda precisará de lei e
regulamentação, talvez não tanto, mas tão realmente quanto
agora.

E, finalmente, lembrem-se de que antes que esse dia


abençoado realmente amanheça em nosso mundo, provavelmente
teremos muitos conflitos dolorosos com os inimigos da verdade e
precisaremos de todos esses métodos de distinguir e unir os seus
amigos, aos quais a palavra de Deus e a experiência uniforme têm
dado seu aval por tanto tempo.

Enquanto eu vos exorto a saudar com alegria o espírito de


harmonia, união e cooperação ativa, que está entre os mais
preciosos e estimulantes “sinais dos tempos” em que vivemos, e
enquanto espero sinceramente que nenhum estudante deste
seminário jamais permaneça distante, ou desvie o olhar com um

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olhar maligno, quando o verdadeiro padrão de Cristo é erguido


por qualquer denominação, permitam-me, ao mesmo tempo,
suplicar que sempre temperem o zelo com a sobriedade.

Digo sobriedade, pois esta é uma qualidade nem sempre


encontrada associada mesmo com grande vigor de talento e
grande fervor de piedade. Muitos homens de admiráveis dotes em
outros aspectos - dotes que os qualificariam, se tivessem sido
direcionados de maneira feliz, para adornar e abençoar a igreja -
foram tão transportados pelas visões de uma imaginação
aquecida, ou tão enganados ao manterem seu olhar fixo em um
único ponto apenas da vasta cena diante deles, ou tão impelidos
pelas abordagens de outros, tão anômalos quanto eles próprios
que, como o cometa do filósofo infiel só foi capaz de desviar
algumas estrelas errantes da luminária-mãe, enquanto ele próprio,
entregue a uma órbita cada vez mais excêntrica, nunca retornou
nem à regularidade nem à utilidade.

A igreja ainda está “no deserto” (Atos 7.38; 1 Coríntios


10.1-11), e cada tempo tem as suas provações apropriadas. Entre
as provações do presente dia está um espírito de inovação
inquieta, uma disposição para considerar tudo o que é novo como,
naturalmente, uma melhoria. Felizes são aqueles que, tomando a
palavra de Deus como seu guia e caminhando “nas pegadas do
rebanho” (Cantares 1.8), buscam continuamente a pureza, a paz e
a edificação da família do Mestre. Ouvindo com mais respeito o

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Oráculo infalível e as lições sóbrias da experiência cristã do que


as ilusões do erro da moda, mantém o seu caminho, “nem para a
direita nem para a esquerda” (Provérbios 4.27; Deuteronômio
28.14), e consideram como a sua maior honra e felicidade serem
empregados como instrumentos humildes e pacíficos na
construção desse “reino de Deus [que] não é comida nem bebida,
mas justiça, paz e alegria no Espírito Santo!” (Romanos 14.17).

Que Deus nos conceda a cada um essa melhor de todas as


honras! E a Ele seja o louvor, para sempre! Amém!

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Sobre o Autor

Samuel Miller nasceu em 1769 d.C.


em Dover, Delaware. Depois de se
formar na Universidade da
Pensilvânia em 1789 d.C., ele
continuou o treinamento para o
ministério pastoral e posteriormente
serviu como pastor da Primeira Igreja
Presbiteriana na cidade de Nova
York. De 1813 a 1849 d.C., ele
trabalhou como Professor de História Eclesiástica e Governo da
Igreja no Seminário Teológico de Princeton, do qual foi um dos
principais fundadores.

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