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MÓDULO 6

ANÁLISE DE BALANÇOS
PROFESSOR MARCOS PIELLUSCH

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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 3
ANÁLISE DE BALANÇO PATRIMONIAL ................................................................. 6
ANÁLISE VERTICAL E HORIZONTAL ......................................................................... 10
ANÁLISE DA DEMONSTRAÇÃO DE FLUXO DE CAIXA .................................... 24
CONCEITO E ANÁLISE DO CAPITAL DE GIRO ................................................... 35
NECESSIDADE DE CAPITAL DE GIRO E CICLO FINANCEIRO ......................... 45
ANÁLISE DO ENDIVIDAMENTO............................................................................ 51
ANÁLISE INTEGRADA DO DESEMPENHO: MARGEM, ATIVIDADE E
RENTABILIDADE...................................................................................................... 58
ESTRUTURA E CUSTO DE CAPITAL ..................................................................... 66
ANÁLISE DA CRIAÇÃO DE VALOR ...................................................................... 76
ANÁLISE COM MÚLTIPLOS ................................................................................... 80
PRICE-TO-BOOK ...................................................................................................... 80
EV/EBITDA .............................................................................................................. 81
PRICE-EARNINGS .................................................................................................... 81
DIVIDEND YIELD ...................................................................................................... 83
CONCLUSÃO ........................................................................................................... 84

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INTRODUÇÃO
O objetivo dessa disciplina é mostrar como analisar as demonstrações
financeiras das empresas para extrair informações que vão basear uma
análise fundamentalista para a tomada de decisão de investimento.

A estrutura do curso:

• Introdução
• Análise do balanço patrimonial.
• Análise da demonstração do resultado.
• Análise da demonstração do fluxo de caixa.
• Conceito e análise do capital de giro.
• Necessidade de capital de giro e ciclo financeiro.
• Análise de endividamento.
• Análise integrada do desempenho.
• Estrutura e custo de capital.
• Análise da criação de valor.
• Análise com múltiplos.

As demonstrações financeiras trazem uma série de indicadores, mas não


podemos nos restringir a eles. É preciso contextualizá-los e interpretá-los,
combinando-os com outras informações que fazem parte da análise
fundamentalista. A empresa precisa ser situada no seu contexto
econômico, político, legal, social, ambiental, além analisar a concorrência
e as condições do mercado, observando os aspectos relacionados ao ESG
(o impacto social e ambiental da empresa e a sua governança corporativa)

O ponto de partida da análise das demonstrações financeira é entender o


que a empresa faz, qual seu projeto e em que atividades atua, onde ficam
suas unidades. Seus negócios podem sofrer impacto, por exemplo, de
fatos que ocorram num país ou numa região em que a empresa tenha
instalações. Algumas dessas informações podem ser obtidas nas Notas
Explicativas das demonstrações financeiras. Veja a seguir o item chamado
A companhia e seus negócios das Notas Explicativas das lojas Renner. Nele
há um pouco sobre a fundação da empresa, as marcas e empresas que

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compõem seu portfólio, o número de lojas e sua localização (com dados
sobre a abertura e o fechamento de filiais ano a ano e a área total de
vendas). São informações que possibilitam uma análise um pouco mais
completa do negócio.

Outro exemplo, apresentado a seguir num formato um pouco diferente, é


o da Weg. As Informações sobre a companhia mostram onde fica a sede e
suas unidades fabris. Indica ainda que a empresa não está ligada somente
a negócios tradicionais como a fabricação de motores elétricos e outros
componentes, mas atua também em segmentos relacionados a
tendências futuras, como soluções para energia renovável e indústria 4.0.
Entre outros aspectos, essa nota explicativa trata um pouco da
governança e das negociações de ADRs no mercado americano. Dados
assim ajudam a contextualizar o negócio antes mesmo de partir para a
análise das demonstrações financeiras.

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Saber o que a empresa faz é um ponto de partida fundamental para a
análise das demonstrações financeiras. A atividade ou o setor de atuação
da empresa resultam em estruturas de balanço patrimonial bem distintas.
Os exemplos a seguir mostram a distribuição percentual do ativo total de
quatro companhias de segmentos diferentes – uma indústria, uma
incorporadora, uma empresa de meios de pagamento e um varejista.
Vejamos as diferenças de cada uma delas.

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Empresa A: Dá para deduzir que se trata de uma empresa varejista pela
distribuição do ativo em três contas principais: Imobilizado (39%), Contas
a receber (28%) e Estoques (11%).

Empresa B: A análise da estrutura do ativo permite classificá-la como


incorporadora (empresa que atua na constituição dos empreendimentos
imobiliários e na construção dos imóveis, seja por meios próprios ou pela
contratação de outras construtoras). Observe que a maior parte dos ativos
está distribuída entre Estoques (45%) e Contas a receber (25%). Os
Estoques de uma incorporadora costumam ser altos, por considerar os
terrenos e os gastos com a construção em si. As Contas a receber também
são normalmente altas nesse setor, já que muitas vezes as empresas
financiam os imóveis aos clientes com recursos próprios. Isso também leva
a um Realizável a longo prazo relativamente alto (17% do ativo),
constituído dos valores com prazo de recebimento superior a 12 meses. A
parcela dos Ativos imobilizados e intangíveis é pequena.

Empresa C: A maior parte do ativo está em Contas a receber (76%), o que


é característico de uma empresa de meios de pagamento. Esse tipo de
companhia pode estar em vários pontos da cadeia, mas de maneira geral
tem valores a receber das pessoas que fizeram compras no cartão de
crédito ou das próprias emissoras dos cartões. Esses recursos precisam ser
repassados aos estabelecimentos, fazendo com que naturalmente exista
um grande volume de Contas a receber

Empresa D: Trata-se de uma indústria. Perceba que não há uma diferença


tão grande assim entre a estrutura dos ativos da Empresa A (varejista) da
Empresa D. As indústrias também têm um imobilizado significativo, um
bom volume de Contas a receber e Estoques.

ANÁLISE DE BALANÇO PATRIMONIAL


A análise do balanço patrimonial pode não trazer grandes revelações para
os investidores, mas é importante para que se compreenda de onde vêm e
como são aplicados os recursos das empresas, além de apresentar alguns
aspectos relacionados ao retorno, ao risco e à liquidez dos investimentos,
pelo menos do ponto de vista potencial.

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Vamos relembrar a estrutura do balanço patrimonial:

• No lado esquerdo, temos o ativo, composto pelos bens e direitos


(recursos controlados pela entidade como resultado de eventos
passados e dos quais se espera que resultem futuros benefícios
econômicos para a entidade).

• No lado direito, temos o passivo, que são as fontes de recursos –


dentre as quais temos as obrigações presentes derivadas de
eventos já ocorridos, cuja liquidação resulte em saída de recursos, e
o patrimônio líquido (valor residual dos ativos da entidade depois
de deduzidos todos os passivos e pertencente aos sócios).

A distribuição do ativo está relacionada ao prazo de sua realização


(quando esses ativos estarão disponíveis para serem transformados em
dinheiro ou em outros ativos): até 12 meses no caso do ativo circulante e
mais do que 12 meses no caso do não circulante. Essa distribuição reflete
as decisões de investimento. Cabe à gestão da empresa decidir se haverá

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maiores ou menores níveis de estoque, de contas a receber, de ativos
imobilizados e assim por diante – com a ressalva de que parte dessa
estrutura do ativo também reflete o setor de atuação, como vimos
anteriormente.

Do lado do passivo, também é possível observar a distribuição entre


circulante, não circulante e patrimônio líquido – o que, por sua vez, está
relacionado às decisões de financiamento (onde a empresa obtém
recursos, o que em parte se deve a uma decisão da gestão, mas ao mesmo
tempo é fruto das próprias características do setor de atividade).

Os ativos circulantes, que são realizáveis em até doze meses, se


transformam em caixa mais rapidamente. A velocidade em que um bem
ou um ativo se converte em caixa é o que chamados de liquidez. Podemos
dizer, portanto, que os ativos circulantes têm maior liquidez do que os não
circulantes.

A liquidez é inversamente relacionada ao risco (quanto maior a liquidez,


menor o risco). Se um determinado ativo se transforma mais rapidamente
em dinheiro, o risco ao se investir nesse ativo é menor. Por outro lado,
num investimento de longo prazo (de baixa liquidez) existe o risco de que
muita coisa aconteça ao longo do tempo.

Quanto mais elevado o risco, porém, maior o potencial de rentabilidade.


Não quer dizer que risco maior vai garantir uma rentabilidade maior – mas
uma empresa só investirá num ativo de maior risco se esperar uma
rentabilidade mais alta (o que não é garantia de que acontecerá).

Do ponto de vista da liquidez, aparentemente às empresas só teriam


ativos circulantes, reduzindo a exposição aos riscos. No entanto, nem todo
negócio consegue se viabilizar dessa forma. Em determinadas atividades,
como a mineração, é necessário investir em ativos que proporcionem
ganhos no longo prazo.

Podemos fazer uma análise semelhante para os passivos. Vamos


relembrar que a empresa obtém recursos dos sócios, dos próprios
resultados ou por meio de empréstimos e financiamentos de longo prazo
(passivo não circulante) ou de curto prazo (passivo circulante). Quanto

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menor o prazo, maior a exigibilidade, que é a velocidade com que uma
obrigação deve ser cumprida pela empresa. E quanto maior a
exigibilidade, maior o risco. Suponha que a empresa tenha uma série de
obrigações que devem ser cumpridas em até doze meses. Isso gera
naturalmente um risco maior, pois a empresa terá problemas se não tiver
recursos suficientes para pagar essas obrigações.

Organizando melhor:

• Ativos circulantes - maior liquidez, menor risco, menor potencial de


rentabilidade.
• Ativos não circulantes - menor liquidez, maior risco, maior
potencial de rentabilidade.
• Passivo circulante - maior risco para a empresa
• Passivo não circulante - risco “médio” para a empresa
• Patrimônio líquido - menor risco para a empresa.

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ANÁLISE VERTICAL E HORIZONTAL

A análise do balanço patrimonial exige a utilização de alguns indicadores.


Podemos usar duas continhas:

Análise vertical: Trata-se da análise da estrutura das contas num período


específico para ver quão representativos são num determinado momento
os valores dos ativos circulantes, dos passivos circulantes (ou até mesmo
de cada uma das contas, como caixa ou estoque). Para a análise vertical,
calculamos a razão entre o valor de cada uma das linhas (ou seja, de cada
uma das contas) e o total do ativo ou do passivo (sabemos que o ativo
total é igual ao total do passivo, então tanto faz um ou outro).

Análise horizontal. Traz a informação sobre a variação (aumento ou


redução) dos valores de uma determinada linha do balanço. Sua fórmula é
a seguinte: o valor de uma determinada linha no período dividido pelo
valor dessa mesma linha no período anterior, menos 1.

Vamos pegar um exemplo de uma empresa real. O objetivo é apenas


didático, e não vamos tirar nenhuma conclusão a respeito de investir ou
não nessa companhia. O balanço patrimonial abaixo é da Azul Linhas
Aéreas, referente a 2017 e 2018 (são dois períodos mais distantes
justamente para que não se fique analisando a situação da empresa
atualmente). Vemos o ativo e o passivo total e sua distribuição. Temos a
análise vertical de 2018 na coluna C, a análise vertical de 2017 na coluna E,
e a análise horizontal na coluna F, usando as fórmulas apresentadas antes.

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BALANÇO AZUL – 2018 E 2017

O que fazer com esses dados? No processo de análise do balanço


patrimonial, algumas informações serão extraídas:

Sobre as decisões de investimento, devemos observar:

• A proporção de ativos de curto e de longo prazo (lembrando que


quanto maior a liquidez, menor o risco).
• A evolução na estrutura e na relevância dos ativos.
• A análise da evolução do risco e do potencial de retorno.

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Sobre as decisões de financiamento, devemos observar:

• A proporção de capital próprio e de terceiros (lembrando que


quanto maior o capital de terceiros, maior a pressão para o
cumprimento de obrigações e, consequentemente, maior o risco).
• A proporção de obrigações de curto e de longo prazo.
• Se essas obrigações acarretam ou não o pagamento de juros,
fazendo a distinção entre passivo oneroso (financeiro) e
operacional.

Vamos analisar na prática o balanço da Azul. Primeiro, usaremos a análise


vertical para descobrir qual a distribuição dos ativos de curto e de longo
prazo. De maneira geral, nessa empresa o ativo não circulante (de longo
prazo) tem uma participação maior do que o ativo circulante. A estrutura
de capital, portanto, é de maior risco – o que de certa forma diz respeito
ao setor da aviação comercial, que concentra investimentos de longo
prazo. Além disso, a análise horizontal nos mostra que o crescimento do
ativo não circulante (18,0%) foi maior do que o do ativo circulante (6,6%).
Assim, de 2017 para 2018 cresceu a fatia dos ativos de longo prazo no
ativo total, mostrando que as decisões de investimento aumentaram o
risco, reduziram a liquidez e elevaram o potencial de rentabilidade.

DISTRIBUIÇÃO DOS ATIVOS DE CURTO E LONGO PRAZO


– 2017 E 2018 (%)

A segunda questão é a própria distribuição desses ativos. Em 2017, o


imobilizado concentrava a maior parte dos ativos (32,2%). O valor dessa
linha, porém, diminuiu em 2018, reduzindo sua participação para 27,9%
do ativo total. A maior concentração passou a ser no Realizável a longo
prazo, correspondendo a 33,6% do ativo total.

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O próximo passo é analisar os passivos e as decisões de financiamento,
com atenção a três aspectos:

1. Participação do capital dos sócios e do capital de terceiros no


passivo total. Olhando a linha do Patrimônio Líquido, a análise
vertical nos mostra que a participação do capital dos sócios no total
do passivo era de 26,8% em 2018 e de 27,5% em 2017. Essas foram
as parcelas oriundas do investimento dos sócios ou do
reinvestimento dos lucros. A participação do capital de terceiros,
correspondente à soma do passivo circulante e do passivo não
circulante, foi de 72,5% em 2017 e de 73,2% em 2018. Mais: a
análise horizontal nos mostra que de 2017 para 2018, o capital dos
sócios cresceu numa velocidade menor do que o capital de
terceiros. Podemos dizer, portanto, que as decisões de
financiamento aumentaram a proporção do capital de terceiros e,
com isso, elevaram o risco.

PARTICIPAÇÃO DO CAPITAL DOS SÓCIOS E DE TERCEIROS (%)

2. Prazo das obrigações. Observa-se que a proporção do passivo não


circulante é maior do que a do circulante: 40,2% ante 32,3% em
2017 e 38,8% ante 34,4% em 2018. A análise horizontal mostra que
de um ano para o outro o circulante aumentou 21,7%, enquanto o
não circulante cresceu bem menos: 10,2%. O crescimento maior das
obrigações de curto prazo indica um aumento do risco.

DISTRIBUIÇÃO DO PASSIVO ENTRE CURTO E LONGO PRAZO (%)

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3. Proporção de passivos onerosos e de não onerosos. Passivo
oneroso é aquele que gera gastos (um ônus, portanto), como o
pagamento ou a contabilização de juros. É o caso dos empréstimos,
financiamentos, arrendamentos e títulos emitidos, por exemplo. Os
passivos operacionais são obrigações assumidas com fornecedores,
clientes, os impostos e salários a pagar. São itens que podem
acarretar o pagamento de juros somente se o pagamento ocorrer
com atraso. A diferença entre os dois é que os passivos onerosos
geram despesas financeiras, enquanto os não onerosos mostram
que a própria operação é capaz de financiar a atividade da empresa
(mais adiante veremos a o veremos a importância disso na gestão
do capital de giro).

No balanço padronizado, é fácil identificar os passivos onerosos. No


nosso exemplo, são os empréstimos e financiamentos do passivo
circulante e do passivo não circulante. Somando as duas linhas,
vemos que em 2018 o passivo oneroso da empresa representava
31,4% de todo o passivo. Quer dizer: eram pagos juros por 31,4
reais de cada 100 reais em recursos aplicados em ativos. Foi uma
situação um pouco melhor do que no ano anterior, quando o
passivo oneroso correspondia a 33,8% do passivo total. Essa é uma
situação favorável para empresa, uma vez que diminuiu a
proporção do passivo pela qual é preciso pagar juros.

Outro aspecto que podemos observar nesse balanço é a proporção de


ativos operacionais e de financeiros. Ativos operacionais indicam um valor
aplicado na operação. São praticamente todas as contas do ativo, exceto
as disponibilidades e os investimentos. Essa regra vale na análise da
demonstração consolidada – no balanço da controladora, os
investimentos representam a participação nas controladas.

Em 2018, os ativos operacionais da Azul equivaliam a 85,7% do ativo total.


Os ativos financeiros, compostos por caixa, aplicações financeiras (as
disponibilidades) e os investimentos correspondiam 14,3%. Um ano antes,
essa distribuição era de 82,5% em ativos operacionais e de 17,5% em
ativos financeiros. O aumento na parcela de ativos operacionais é um bom
indicador, refletindo um crescimento nos investimentos na atividade da
empresa. Em algumas situações, encontramos balanços com muito

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dinheiro em caixa ou em aplicações financeiras. Se a empresa tem muita
liquidez, o risco é baixo – mas aquele dinheiro está parado e, para uma
empresa, crescer é preciso haver investimento na atividade. No caso da
Azul, o que observamos é que de 2017 para 2018 houve um aumento nos
investimentos na atividade operacional.

ANÁLISE DA DEMONSTRAÇÃO
DO RESULTADO DO EXERCÍCIO
Antes de ir adiante, vamos relembrar a estrutura da Demonstração de
Resultados do Exercício.

• A DR começa com a receita da venda de bens e serviços (o valor


obtido pela venda de bens ou prestação de serviços,
independentemente de a empresa ter já recebido esses valores).
Desse valor, abate-se o custo dos bens e dos serviços vendidos para
chegar ao resultado bruto.

• Do resultado bruto, são abatidas as despesas operacionais para se


chegar ao resultado operacional, ou Ebit (resultado antes do
resultado financeiro e dos tributos, na sigla em inglês).

• A partir do Ebit, chegamos ao resultado antes dos tributos sobre o


lucro ao adicionar as receitas financeiras ou subtrair as despesas
financeiras.

• Do resultado antes dos tributos sobre o lucro, subtraímos o Imposto


de Renda e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido para chegar
ao resultado líquido, que é o resultado para os acionistas ou sócios.

Obviamente, o resultado líquido é muito relevante – mas diferentes coisas


podem ter contribuído para chegar até ele. A empresa pode ter tido
alguma grande perda registrada em outras despesas – olhando apenas o
resultado líquido, a evolução do resultado bruto passaria despercebida.
Talvez a empresa tenha obtido receitas financeiras ou tido despesas

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financeiras muito elevadas, fazendo com que o resultado financeiro
assuma uma grande relevância, mascarando o desempenho operacional.

Por esses motivos, torna-se importante avaliar cada um dos itens da DRE,
incluindo alguns indicadores de análise vertical e horizontal. Desses
indicadores, nascem algumas margens:

• Margem bruta – a relação entre o resultado bruto e a receita de


venda.

• Margem operacional ou margem Ebit – o resultado antes do


resultado financeiro e dos tributos dividido pela receita de venda de
bens e de prestação de serviços.

• Margem líquida – resultado líquido dividido pela receita de vendas.

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Vejamos um exemplo para apresentar a importância e o significado de
cada uma dessas margens. Considere uma empresa que teve os seguintes
resultados:

Com base nesses dados, encontramos os resultados brutos de 5 milhões


de reais no Ano 1 e de 6,5 milhões de reais no Ano 2.

Veja que em termos absolutos, o resultado cresceu do Ano 1 para o Ano 2


– mas não na mesma proporção das receitas e dos custos. Isso vai ficar
muito claro com a análise vertical dos dois períodos. Para isso, vamos
pegar cada linha e dividir pela receita total de bens e serviços.

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Aplicando as fórmulas, encontramos os seguintes resultados:

Descobrimos que no Ano 2 os custos foram equivalentes a 54,17 reais de


cada 100 reais vendidos pela empresa. No Ano 1 essa relação foi melhor
do ponto de vista do resultado: o custo correspondeu a 50 reais de cada
100 reais em receitas, sobrando um lucro um pouco maior. Desse ponto
de vista, o desempenho da empresa piorou de um ano para o outro. A
análise horizontal mostra que do Ano 1 para o Ano 2 as receitas cresceram
20% e os custos subiram 30% – o resultado bruto, porém, aumentou numa
velocidade menor: 10%.

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O que a análise vertical nos dá é a própria margem bruta, obtida pela
divisão do resultado bruto pela receita com bens e serviços vendidos. O
que determina essa margem é a relação entre preço e custo. Trata-se de
um indicador importante para mostrar a capacidade de um negócio
produzir mais barato ou vender mais caro, o que está associado às
vantagens competitivas da empresa. No nosso exemplo, fica evidente que
a empresa perdeu poder competitivo e criou menos valor.

Vamos supor agora que essa empresa tenha tido no Ano 1 despesas
operacionais de 3,5 milhões de reais, chegando a um resultado
operacional de 1,5 milhão de reais. No Ano 2, as despesas operacionais
foram de 4,2 milhões de reais, para um resultado operacional de 1,3
milhão de reais.

A análise vertical mostra que as despesas operacionais se mantiveram em


35% do total das receitas em ambos os anos. Elas cresceram na mesma
velocidade da receita: 20% no ano. O resultado operacional, porém,
diminuiu em 13% de um ano para o outro.

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O resultado antes dos resultados financeiros e dos tributos (Ebit) foi de
15% no Ano 1 e de 10,83% no Ano 2 – essas são as margens Ebit, ou
margens operacionais, para os dois anos. A queda na margem mostra uma
perda de eficiência operacional de um ano para o outro.

Prosseguindo com a análise, suponha que o resultado financeiro da


empresa tenha sido uma despesa financeira de 200 mil reais no Ano 1 e
uma receita financeira de 200 mil reais no Ano 2.

O indicador de análise vertical mostra que o resultado financeiro foi 1,67%


da receita no Ano 2 e de -2,00% da receita no Ano 1. A análise horizontal
vai apresentar uma variação de -200% no resultado financeiro de um ano
para o outro, e é preciso muito cuidado com a interpretação desse
indicador: quando essa porcentagem de análise horizontal der um valor
negativa superior a 100%, significa que algo que o sinal foi trocado (algo
positivo virou negativo, ou algo negativo virou positivo).

Continuando: o resultado antes dos tributos passou a ser de 1,3 milhão de


reais no Ano 1 e de 1,5 milhão de reais no Ano 2. Considere agora que o IR
e a CSLL correspondam a 30% do resultado antes dos tributos – isso nos
leva a um resultado líquido de 910 mil reais no Ano 1 e de 1,050 milhão no
Ano 2.

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Em termos absolutos, o resultado melhorou de um ano para o outro. A
análise vertical, no entanto, mostra que a margem líquida (que é igual ao
resultado líquido dividido pela receita) caiu de 9,10% para 8,75%. Deve-se
tomar muito cuidado, portanto, quando se vê reportagens dizendo que o
lucro de uma empresa aumentou em valores absolutos, pois isso por si só
não diz se o resultado foi melhor ou pior. É preciso analisar o quanto a
empresa foi eficiente em gerar lucro – e esse indicador é dado pela
margem líquida.

Por meio da análise horizontal nota-se que o lucro cresceu 15% de um ano
para o outro, numa velocidade inferior à das vendas, que aumentaram
20%. Além disso, o resultado operacional da empresa no Ano 2 foi menor
do que no Ano 1. O resultado líquido só cresceu devido ao resultado
financeiro, que passou de despesa para receita. Ocorre que, considerando
as taxas de juros, a variação cambial e muitos outros eventos, devemos ter
o cuidado de perceber que os resultados financeiros podem ser
consequência de situações temporárias e pouco sustentáveis ao longo do
tempo. Por isso é fundamental olhar com atenção às demais margens.

Margem EBITDA

A margem Ebitda não pode ser encontrada na DRE. Vamos recordar: o


Ebitda corresponde ao resultado Ebit mais as amortizações e
depreciações. Esse indicador mostra o potencial de geração de caixa da
operação (por conta do regime de competência, não é simplesmente a

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geração de caixa). Para encontrar a margem Ebitda, basta dividir o Ebtida
pela receita de vendas.

Exemplo prático:

Vamos analisar as margens que estudamos até agora num caso real, por
meio dos balanços da Ambev de 2018 e 2019 (ressalte-se que vamos usar
esses números apenas para fins didáticos e não é o propósito fazer uma
recomendação de investimento ou dizer se a empresa é boa ou ruim).

A primeira coisa a fazer é calcular os indicadores de análise vertical,


dividindo cada linha pela receita líquida do respectivo ano. Em seguida,
fazemos a análise horizontal, avaliando a variação de cada linha de um
ano para o outro.

Vejamos agora o que essa análise vertical mostra a respeito das margens:

• Margem bruta (igual à análise vertical do resultado bruto): 58,8%


em 2019 e de 61,7% em 2018.

• Margem operacional (na linha do resultado antes do resultado


financeiro e dos tributos): 30,5% em 2019 e 34,1% em 2018.

• Margem líquida: 23,2% em 2019 e 22,6% em 2018

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Será que as margens melhoraram ou pioraram?

Tipo de margem 2019 2018 O que aconteceu


Margem bruta 58,8% 61,7 Queda – menor criação de valor
Margem operacional 30,5% 34,1% Queda – menor eficiência operacional
(Ebit)
Margem liquida 23,2% 22,6% Aumento – Maior eficiência para gerar lucro

Observando a margem líquida, tudo parece estar indo bem – até porque o
resultado líquido aumentou 7,4% em valores absolutos. Mas já vimos que
a operação foi menos eficiente e a empresa criou menos valor. Para
identificar corretamente o que aconteceu, vamos comparar as análises
verticais de um ano para o outro e calcular a diferença:

Interpretando os resultados:

• Custo dos Bens e/ou Serviços vendidos: Para cada 100 reais de
vendas, o custo aumentou em 2,9 reais

• Despesas/Receitas Operacionais: Para cada 100 reais de vendas, a


despesa aumentou em 0,7 real.

• Resultado financeiro: Para cada 100 reais de vendas, o resultado


financeiro acrescentou 2,10 reais a mais

• Imposto de Renda e CSLL: Para cada 100 reais de vendas, os


impostos consumiram 2,10 real a menos.

Veja que a relação entre receita, custo e despesa piorou – a melhoria na


margem líquida veio do resultado financeiro.

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Vamos finalizar a análise da DRE com o Ebitda e a margem Ebitda. O
Ebitda é o resultado antes do resultado financeiro e dos tributos mais a
depreciação e amortização (que encontramos na Demonstração dos
Fluxos de Caixa). A margem Ebitda é o resultado Ebitda dividido pela
receita de vendas:

Tanto o Ebitda quanto a margem Ebtida (embora ainda seja elevada)


caíram de um ano para o outro – ou seja, houve uma queda na capacidade
da empresa gerar caixa.

ANÁLISE DA DEMONSTRAÇÃO
DE FLUXO DE CAIXA
Sabemos que a Demonstração do Fluxo de Caixa mostra as atividades que
geraram ou consumiram caixa.

• Fluxo de Caixa Operacional (ou caixa líquido das atividades


operacionais): Mostra o quanto a operação gera caixa (caso seja
positivo) ou consome caixa (caso seja negativo). O que se espera é
que o resultado seja positivo, uma vez que a operação deve gerar
caixa, e não o consumir. É construído por meio do método indireto.
O ponto de partida, portanto, é o lucro líquido do exercício, do qual

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se soma ou subtrai os itens que afetaram o resultado, mas não o
caixa – como a depreciação, o resultado de participações, a baixa de
itens, as variações de ativos e passivos, entre outros.

• Fluxo de Caixa de Investimentos (ou caixa líquido das atividades


de investimento): Mostra quanto caixa foi consumido para adquirir
ativos ou foi gerado pela venda de ativos. O que se espera de uma
empresa em crescimento é que as atividades de investimento
consumam caixa. Diferentemente do fluxo de caixa operacional,
portanto, o que se espera é que o fluxo de caixa de investimentos
seja negativo – resultados positivos podem ser decorrentes de um
reposicionamento ou da reestruturação de uma empresa, durante
os quais os ativos são vendidos. É composto pela aquisição de
imobilizados, as adições ou reduções em investimentos, o
recebimento pela venda de ativos e os investimentos em títulos e
valores mobiliários, além dos dividendos recebidos.

• Fluxo de Caixa de Financiamento (ou caixa líquido das atividades


de financiamento): Quando positivo, mostra que a empresa gerou
de caixa ao captar recursos de investidores, sócios ou por meio de
empréstimos. Quando negativo, indica que a empresa está pagando
dividendos ou juros para os investidores, quitando os empréstimos
com os credores ou recomprando ações.

É muito importante interpretar o que leva aos resultados positivos ou


negativos em cada um dos três casos para que se possa fazer uma análise
adequada da Demonstração do Fluxo de Caixa.

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Vamos ver com mais detalhes a estrutura e os itens que compõem cada
um desses fluxos. A soma dos fluxos de caixa operacional, de investimento
e de financiamento vai resultar no aumento ou na redução de caixa e
equivalentes.

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Vejamos alguns exemplos práticos. O primeiro deles é de uma empresa do
setor industrial:

O fluxo de caixa operacional dessa empresa foi negativo em 2,87 milhões


de reais. Significa que as operações consumiram caixa. Podemos ver que
houve um lucro líquido positivo de 2,753 milhões de reais, ao qual se
devem somar a depreciação, a amortização e outros ajustes. O que pesou
negativamente foi a variação de ativos e passivos (-11,446 milhões de
reais), o que pode ser atribuído a aumento de estoques ou de contas a
receber. A empresa também teve um fluxo de caixa de investimento
negativo em 3,539 milhões de reais – portanto, consumiu caixa para
investir. O fluxo de caixa de financiamento também foi negativo em 355
mil reais.

Podemos dizer que o resultado negativo no fluxo de caixa operacional não


foi favorável, pois o que se espera é que as operações tenham um fluxo
positivo. O fato de o fluxo de caixa de investimentos ser negativo não
significa necessariamente um resultado ruim – isso indica apenas que a
empresa aplicou recursos em novos investimentos. O fluxo de caixa de
financiamento negativo significa que a empresa pagou aos investidores.

Somando o fluxo de caixa operacional com o de investimento e o de


financiamento, a variação total foi negativa. Não quer dizer que o caixa

27
ficou negativo, mas que houve uma diminuição, no caso, de 6,764 milhões
de reais.

A variação final de caixa pode não ser o número mais importante para a
análise da DFC. Compare, por exemplo, os resultados de duas empresas
que durante um ano tiveram ambas uma variação de caixa positiva em
1.000 reais:

A Empresa A teve 42 mil reais positivos de fluxo de caixa operacional, 25


mil reais negativos de fluxo de investimentos, e 16 mil reais negativos de
fluxo de financiamento. Aparentemente, a empresa está numa boa
situação: suas atividades geram caixa, há investimentos em curso, os
investidores são remunerados e ainda houve uma variação de caixa
positiva.

A Empresa B teve 18 mil reais negativos de fluxo de caixa operacional, 10


mil reais positivos de fluxo de investimentos (significa que houve resgate
de investimentos ou venda de ativos) e 9 mil reais positivos de fluxo de
financiamento (são recursos que foram captados ou com
sócios/investidores ou por meio de empréstimos). Pode ter sido uma
medida necessária devido ao consumo de caixa pela operação. Não é um
bom sinal. Veja que, apesar da variação total do caixa também ser positiva

28
em 1 mil reais, a Empresa A provavelmente tem uma operação mais
saudável do que a da Empresa B.

Alguns indicadores nos ajudam a extrair informações da DFC:

A primeira informação extremamente importante diz respeito à eficiência


na geração de caixa. Dividindo o fluxo de caixa operacional pela receita,
obtém-se o indicador de quanto a operação gerou de caixa para cada real
vendido.

A outra informação importante diz respeito ao nível de investimento


mantido pela empresa. Um fluxo de caixa de investimentos negativo
mostra que há investimento sendo realizado. Esse valor pode ser
comparado à amortização e depreciação, que representam a utilização
dos ativos de uma empresa. Se o investimento evoluir no mesmo ritmo da
utilização, a empresa está mantendo o nível de atividade. Se o
investimento evoluir mais rapidamente que a utilização, há um aumento
de capacidade e a empresa estará em crescimento. Se a evolução for num
ritmo menor, significa que a empresa está reduzindo capacidade.

O terceiro indicador que se pode extrair da DFC é a geração livre de caixa.


Trata-se da soma do fluxo de caixa operacional com o fluxo de

29
investimentos. Suponha que uma empresa gere 1 milhão de reais de caixa
e invista 400 mil reais em expansão. Sobram 600 mil reais para utilizar
como a empresa desejar. Por isso chamamos esse fluxo de caixa de “fluxo
de caixa livre”. Trata-se de um indicador importantíssimo: uma empresa é
avaliada pela magnitude e pelo momento em que gera fluxos de caixa livre
no futuro.

Por fim, temos o estágio provável no ciclo de vida de uma empresa, que
não é exatamente um indicador, mas a interpretação desse conjunto de
indicadores. A geração ou consumo de caixa em cada um dos três
componentes da DFC guarda uma relação com o ciclo de vida do negócio.
Veja no gráfico abaixo (considere que o que está acima do eixo horizontal
representa um fluxo de caixa positivo, sendo negativos os fluxos de caixa
que estão abaixo):

Na fase inicial (startup e crescimento acelerado), o mais provável é que a


operação de uma empresa consuma caixa. O fluxo de caixa de

30
investimentos também tende a ser negativo, já que nessa etapa do ciclo
de vida um negócio precisa adquirir ativos imobilizados, sistemas, direitos
e outros intangíveis. Se há consumo de caixa pela operação e pelos
investimentos, os recursos precisam vir de algum lugar – e os fluxos de
caixa de investimento é que geralmente são positivos, devido ao aporte
dos acionistas ou de investidores de capital de risco. É um momento em
que a empresa necessita de recursos para obter um retorno que
provavelmente só vira num prazo um pouco mais longo – por isso nem
sempre é fácil obter dinheiro com empréstimos, pois o prazo maior de
retorno é visto como um risco pelos bancos.

A próxima fase no ciclo de vida de uma empresa é de um crescimento


mais moderado. Nessa etapa, é possível que a operação já tenha uma
geração de caixa positiva, mas é necessário a continuidade do
investimento (fluxo de caixa negativo). Muitas vezes, os investimentos
consomem mais caixa do que a operação consegue gerar, levando a
necessidade de novas captações com sócios ou credores. É mais provável
que bancos se disponham a dar crédito ou que a empresa consiga emitir
títulos (debêntures, por exemplo) – mas ainda não é o momento
adequado para a empresa adotar uma política generosa de distribuição de
dividendos, e isso é um ponto importante para o investidor.

A terceira fase é a da maturidade, quando geralmente o fluxo de caixa


operacional é mais generoso, sendo menor a necessidade de investir na
variação de ativos e passivos, que é um dos componentes do fluxo de
caixa operacional. Nessa etapa do ciclo de vida, pode-se apelidar a
empresa de cash cow, ou vaca leiteira. Ao mesmo tempo, não é
necessário investir demais em ativos e passivos circulantes ou em ativos
imobilizados e intangíveis. O consumo de caixa pelos investimentos
costuma corresponder ao valor da depreciação e amortização. Como o
fluxo de caixa operacional é grande e o fluxo de caixa de investimentos é
pequeno, o fluxo de caixa livre vai ser positivo e a empresa pode pagar
dividendos. Por isso, o fluxo de caixa de financiamento tende a ser
negativo, representando os pagamentos aos investidores.

Vamos ver alguns exemplos práticos.

31
Empresa do setor industrial. O primeiro exemplo é o de uma empresa do
segmento industrial, com o um fluxo de caixa operacional de 1,299 bilhão
de reais, o que é bastante elevado. Dividindo esse valor pela receita de
11,97 bilhões, descobrimos que de cada 100 reais em vendas a operação
gera 11 reais para o caixa. (Para saber se isso é muito ou pouco,
precisamos comparar com outras companhias do mesmo segmento ou
com a própria empresa nos períodos anteriores).

Analisemos agora o investimento. O caixa líquido das atividades de


investimento foi negativo em 833 milhões de reais, mais do que o dobro
dos 317 milhões de reais da depreciação e amortização. Podemos dizer,
portanto, que a empresa está em fase de crescimento.

Por fim, o fluxo de caixa livre, que é a soma do fluxo de caixa operacional
com o fluxo de caixa de investimentos, foi positivo em 466 milhões de
reais, mostrando que a empresa gerou caixa livre para pagar investidores.
O fluxo de caixa do financiamento, porém, foi bem maior, chegando a um
a valor negativo em 1,466 bilhão de reais, levando a uma variação do caixa
total que ficou negativa em 980 milhões de reais.

Veja que nesse caso existem sinais aparentemente contraditórios. O fluxo


de caixa de investimentos num valor negativo que supera a depreciação

32
mostra que a empresa está em crescimento, enquanto o fluxo de caixa
livre indica uma maturidade. Embora aparentemente conflitantes, esses
sinais são bastante favoráveis para o negócio, que mantém os
investimentos ao mesmo tempo em que gera caixa livre para os
investidores, o que assegura uma valorização maior.

Empresa do segmento de utilities. O próximo exemplo é de uma empresa


do setor de utilities (com atuação em serviços de saneamento ou energia,
por exemplo). Seu fluxo de caixa operacional foi de 465 milhões de reais. A
razão entre esse fluxo e a receita mostra, curiosamente, a mesma
proporção da empresa anterior (11%).

O fluxo de caixa dos investimentos foi de 145 milhões de reais, para um


valor de 125 milhões de reais de depreciação e amortização – ambos em
patamares muito próximos. Isso mostra uma situação de estabilidade e
maturidade. O fluxo de caixa livre é de 320 milhões, sendo que a empresa
pagou aos 252 milhões de reais, de acordo com o fluxo de caixa do
financiamento (menos do que poderia pagar, portanto).

Nesse exemplo, os indicadores apontam para uma empresa em fase de


maturidade: há um fluxo de caixa livre positivo e um nível de investimento
compatível com a depreciação.

33
Empresa de mineração: O terceiro exemplo é de uma empresa de
mineração com um fluxo de caixa operacional gigantesco: 47 bilhões de
reais. Em relação a receita, a eficiência na geração de caixa aponta um
indicador de 36%. A depreciação no período foi de 12 bilhões de reais,
para um fluxo de caixa de investimentos negativo em apenas 900 milhões.
Significa que a empresa não repôs a depreciação e não investiu para
manter o nível de atividade. É uma característica de declínio ou de
reposicionamento. Pode ser uma situação transitória e que, no momento
seguinte, a empresa retome o investimento.

Por fim, vemos que o fluxo de caixa livre foi de expressivos 47 bilhões de
reais. Desse valor, 40 bilhões foram pagos aos investidores – o restante foi
incorporado ao caixa. Nesse caso, a empresa apresenta uma característica
de maturidade e outra de declínio, mas é importante observar os períodos
subsequentes para verificar se esse processo de declínio será mantido.

34
CONCEITO E ANÁLISE
DO CAPITAL DE GIRO
O termo capital de giro tem muitas interpretações equivocadas. Por isso é
importante prestar atenção em algumas definições. Ao falar em capital de
giro, estamos nos referindo ao dinheiro que uma empresa tem aplicado
no curto prazo.

O capital de giro, portanto, seria o ativo circulante. Veja, porém, que uma
parte dos recursos aplicados no ativo circulante tem origem no passivo
circulante.

É bom, portanto, que o ativo circulante seja superior ao passivo circulante,


de modo a que se tenha um capital de giro líquido (CGL). O capital de giro
líquido mostra se a empresa tem mais ou menos capacidade para honrar
seus compromissos de curto prazo. É interessante, portanto, que aquilo
que a empresa tem a expectativa de realizar seja maior do que as
obrigações que terá a pagar.

35
Vejamos agora um exemplo de duas empresas apresentadas na figura a
seguir.

A Empresa 1 tem um CGL de 500 reais, que é a diferença entre o ativo


circulante (1.300 reais) e o passivo circulante (800 reais). O CGL da
Empresa 2 é de 600 reais (resultante da diferença de um ativo circulante
de 40.000 reais e de um passivo circulante de 39.400 reais). Veja que,
embora seu CGL seja maior, a Empresa 2 tem uma estrutura de ativo e
passivo circulante bem maior. Essa comparação mostra que nesse caso,
como em alguns outros que estamos vendo nessa disciplina, um indicador
relativo é mais útil do que um número absoluto. Nessa situação, podemos
usar o índice de liquidez corrente, que vai relacionar o ativo circulante
com o passivo circulante, dividindo um pelo outro. O índice de liquidez
corrente mostra o quanto a empresa tem de bens e direitos a realizar em
até 12 meses para cada 1 real em obrigações de curto prazo:

𝐴𝑡𝑖𝑣𝑜 𝐶𝑖𝑟𝑐𝑢𝑙𝑎𝑛𝑡𝑒
Í𝑛𝑑𝑖𝑐𝑒 𝑑𝑒 𝑙𝑖𝑞𝑢𝑖𝑑𝑒𝑧 𝑐𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒 =
𝑃𝑎𝑠𝑠𝑖𝑣𝑜 𝐶𝑖𝑟𝑐𝑢𝑙𝑎𝑛𝑡𝑒

36
Dá para aprofundar essa análise. Imagine uma empresa com um grande
ativo circulante, como é comum no segmento imobiliário, no qual o
estoque é constituído pelos imóveis disponíveis para venda. Ora, pode ser
que demore mais para vender um imóvel do que que as peças de roupa
que estão no estoque de um varejista ou os alimentos de um
supermercado. Em situações assim, o investidor pode querer analisar a
situação da empresa independentemente da venda dos estoques. Para
isso, existe um indicador: o índice de liquidez seca, que considera a razão
entre o ativo circulante, excluídos os estoques, e o passivo circulante.

𝐴𝑡𝑖𝑣𝑜 𝐶𝑖𝑟𝑐𝑢𝑙𝑎𝑛𝑡𝑒 − 𝐸𝑠𝑡𝑜𝑞𝑢𝑒𝑠


Í𝑛𝑑𝑖𝑐𝑒 𝑑𝑒 𝑙𝑖𝑞𝑢𝑖𝑑𝑒𝑧 𝑠𝑒𝑐𝑎 =
𝑃𝑎𝑠𝑠𝑖𝑣𝑜 𝐶𝑖𝑟𝑐𝑢𝑙𝑎𝑛𝑡𝑒

Avançando um pouco: a nata da liquidez, por assim dizer, é composta pelo


caixa e as aplicações financeiras. Pegando esses valores e dividindo pelo
passivo circulante, encontramos o índice de liquidez imediata. Esse
indicador mede o quanto das obrigações de curto prazo podem ser
cobertas com o saldo em caixa e equivalentes.

𝐶𝑎𝑖𝑥𝑎 𝑒 𝑒𝑞𝑢𝑖𝑣𝑎𝑙𝑒𝑛𝑡𝑒𝑠
Í𝑛𝑑𝑖𝑐𝑒 𝑑𝑒 𝑙𝑖𝑞𝑢𝑖𝑑𝑒𝑧 𝑖𝑚𝑒𝑑𝑖𝑎𝑡𝑎 =
𝑃𝑎𝑠𝑠𝑖𝑣𝑜 𝐶𝑖𝑟𝑐𝑢𝑙𝑎𝑛𝑡𝑒

Desses indicadores que vimos até agora, os mais utilizados para uma
análise de risco são o Capital de Giro Líquido (CGL) e o índice de liquidez
corrente (os outros dois indicadores ajudam a aprofundar a análise, como
veremos adiante).

Em linhas gerais, consideramos o seguinte:

• Quando o capital de giro líquido é superior a 0, o ativo circulante


será maior do que o passivo circulante e o índice de liquidez

37
corrente vai ser superior a 1 – e há baixo risco de a empresa não
cumprir as obrigações de curto prazo.

• Quando o capital de giro líquido for menor que 0, o ativo circulante


será menor do que o passivo circulante e o índice de liquidez
corrente será inferior a 1. Nessa situação, será maior o risco de a
empresa não cumprir as obrigações de curto prazo.

Voltando ao exemplo das empresas do início deste capítulo, calculemos os


indicadores de liquidez:

Observe que, de acordo com o índice de liquidez corrente, a Empresa 1


tem 1,625 real de ativos a realizar para cada 1 real de obrigações de curto
prazo. Essa relação é mais apertada para a Empresa 2: 1,015 real de bens
e ativos a realizar para cada 1 real em obrigações. A exposição ao risco da
Empresa 1 é, portanto, menor.

38
A análise pode ser aprofundada com os demais indicadores, começando
pelo índice de liquidez seca. O resultado mostra que, se a Empresa 1 não
vender nada de seus estoques, terá ativos de curto prazo suficientes para
cumprir 87,5% do passivo com vencimento em até 12 meses. Essa
dependência é maior no caso da Empresa 2, com um ILS de 0,508 – ou
seja, os ativos de curto prazo cobrem 50,8% (praticamente a metade) do
passivo circulante, que são as obrigações de curto prazo.

Considerando o índice de liquidez imediata, vemos que o caixa e


equivalentes de caixa da Empresa 1 são suficientes para cobrir 37,5% das
suas obrigações de curto prazo – uma parcela maior do que os 20,3% da
Empresa 2.

Para aprofundar melhor a análise, é preciso identificar quanto do capital


de giro necessita permanecer investido na operação. Esse
aprofundamento passa pela identificação dos itens operacionais ou
financeiros. Veja a representação gráfica na figura a seguir:

39
Podemos dividir os componentes do ativo circulante em dois grupos:

• ACO (Ativo Circulante Operacional). Estão nesse grupo as contas a


receber, estoques, tributos a recuperar, despesas antecipadas e
tudo mais que estiver relacionado com a operação.

• ACF (Ativos Circulantes Financeiros). Esse grupo é composto pelos


recursos disponíveis em caixa ou em alguma operação financeira
(como um CDB, um título público ou uma operação
compromissada).

O passivo circulante também pode ser dividido em dois grupos:

• PCO (Passivo Circulante Operacional). São passivos relacionados à


operação, como Fornecedores (que são obrigações assumidas com
outras empresas para aquisição de estoques e matérias-primas),
obrigações sociais e trabalhistas, obrigações tributárias e outros
passivos circulantes.

• PCF (Passivo Circulante Financeiro). São as obrigações relacionados


a empréstimos e financiamentos, como dividendos a pagar e
debêntures, além de outras operações financeiras.

Para analisar melhor a operação, pegamos apenas os itens operacionais


do ativo e do passivo circulante. Suponha que uma empresa tenha 2 mil
reais de Ativo Circulante Operacional e 1.100 reais de Passivo Circulante
Operacional. A diferença de 900 reais é o que chamamos de Necessidade
de Capital de Giro (NCG), que representa o dinheiro aplicado na operação
e que não está disponível no caixa.

Na prática, a NCG é financiada pelo capital dos sócios (patrimônio líquido)


ou por empréstimos e financiamentos concedidos por terceiros, emissões
de títulos e assim por diante.

40
Vejamos um exemplo com os dados da Empresa 1, que vimos
anteriormente, e encontraremos uma NCG de 500 reais:

41
Agora veja um outro exemplo. Vamos calcular a NCG para a empresa
abaixo:

ACO = Contas a receber + estoques PCO = Forn. Obrig. Sociais+ Obrig. Tribut.
ACO = 400+300 PCO = 300+150+120
ACO = 700 PCO = 570

NCG = ACO – PCO


NCG = 700 – 570
NCG = 130

Vamos supor que essa empresa cresça 50% de um ano para o outro.
Inicialmente, um empreendedor pode achar que vai sobrar dinheiro, já
que as vendas vão aumentar. Isso engana muita gente. Veja qual a
consequência desse crescimento para o caixa da empresa, considerando
algumas premissas:

• As vendas crescem 50%.


• O quadro de funcionários aumenta.
• Todo o lucro é distribuído.
• Os empréstimos são renovados.
• O imobilizado não aumenta (a estrutura atual suporta o
crescimento).

42
Vejamos o que acontece:

O que mudou no Ativo:

• Contas a receber: aumenta de 400 para 600.


• Estoques: aumenta de 300 para 450. O estoque tem de acompanhar
o crescimento das vendas para atender a demanda.
• O imobilizado se manteve.
• Caixa: caiu de 100 para 35 (veja adiante).

O que mudou no Passivo:

• Fornecedores: aumentou de 300 para 450, acompanhando a


necessidade elevar a produção.
• Obrigações Sociais: aumentou de 150 para 225, acompanhando o
crescimento no número de funcionários.
• Obrigações tributárias: aumentou de 120 para 180 (o aumento das
vendas faz a empresa recolher mais impostos).
• Empréstimos: foram mantidos.
• Lucro: totalmente distribuído, sem causar alteração no patrimônio
líquido.

Vemos que o passivo total chegou a 2.585 reais. Somando contas a


receber, estoques e imobilizado, vemos que faltam 35 reais para chegar

43
ao mesmo valor – é isso que está no caixa. Ou seja: a empresa cresceu e o
caixa diminuiu. Motivo: o aumento da Necessidade de Capital de Giro, que
cresceu de 130 reais para 195 reais. Esse adicional não veio dos sócios,
pois o patrimônio líquido não aumentou, nem de terceiros (o valor dos
empréstimos e financiamentos se manteve). Logo, esses recursos vieram
do próprio caixa, cuja variação é exatamente a mesma da NCG: 65 reais. A
conclusão é que o aumento da NCG consome caixa.

Vamos avançar um pouco e ver um exemplo com duas empresas, das


quais temos o balanço patrimonial e a receita líquida de vendas:

Calculemos a NCG das duas empresas:

Empresa 1 Empresa 2
ACO ACO
Estoques + Contas a receber + outros Estoques + Contas a receber + outros
1.200+3.000+300 = 4.500 900 + 1.200 + 200 = 2.300

PCO PCO
Fornecedores + Obrig. Fiscais + Outros Fornecedores + Obrig. Fiscais + Outros
2.500 + 300 + 200 = 3.000 800+ 250 + 120 = 1.170

NCG NCG
ACO - PCO = ACO – PCO =
4.500 - 3.000 = 1.500 2.300 – 1.170 = 1.130

44
Encontramos que a Empresa 1 tem uma NCG maior do que a da Empresa
2, em termos absolutos – mas também tem vendas duas vezes maiores.
Vamos calcular então a NCG em relação a receita líquida para saber
quanto cada empresa precisa de capital de giro para cada real em vendas:

Empresa 1 Empresa 2
NCG/Receita líquida = ACO
1.500/9.000 = 17% 1.130/4.500 = 25%

Conclusão: embora em termos absolutos sua NCG seja menor do que o da


Empresa 1, em termos relativos a Empresa 2 precisa de mais capital de
giro (é mais dependente, portanto, dos recursos que precisam ficar
aplicados nos ativos como estoques e recebíveis.

NECESSIDADE DE CAPITAL
DE GIRO E CICLO FINANCEIRO
Existem alguns fatores que influenciam a necessidade de capital de giro:

Contas a receber: o aumento no prazo de pagamento concedido aos


clientes faz crescer o valor das contas a receber no ativo circulante
operacional. O aumento no ativo circulante leva a um crescimento na
NCG.

Estoques: o aumento no prazo de giro dos estoques também aumenta


essa conta no ativo circulante operacional, também provocando um
aumento da NCG.

Fornecedores: o aumento no prazo de pagamento dos fornecedores faz


crescer essa conta no Passivo Circulante Operacional. O aumento no
passivo circulante operacional leva a uma redução da NCG.

Esses aspectos envolvendo prazos precisam ser contextualizadas no que é


chamado de ciclo operacional da empresa, como mostra a figura a seguir,

45
com alguns momentos importantes para determinar os prazos e a
movimentação financeira de uma operação.

Começa com a empresa comprando matéria-prima ou mercadorias, que


serão pagas um tempo depois. Podemos chamar o prazo que vai da
compra até o pagamento de prazo médio de pagamento.

Depois de um certo tempo, a empresa vai vender as mercadorias ou


produtos. Da compra de matéria-prima até a venda do produto pode
ocorrer um processo de fabricação, ou pode ser que a mercadoria
simplesmente fique disponível para ser vendida. O prazo que vai da
compra de matéria-prima ou das mercadorias até o momento da venda é
o chamado prazo de estocagem (pode envolver ou não um prazo de
fabricação).

Da venda até receber o pagamento dos clientes, temos o prazo de


recebimento.

46
Do momento da compra da matéria-prima até o recebimento dos clientes
fecha-se um ciclo operacional, do qual decorre um ciclo de caixa ou ciclo
financeiro, que começa no momento em que a empresa paga os
fornecedores (com uma saída de dinheiro) e finaliza com o recebimento
do pagamento feito pelos clientes (uma entrada de dinheiro).

Na figura apresentada no início desse capítulo, usamos como premissa um


ciclo operacional de 150 dias, que é a soma de 90 dias de prazo de
estocagem com os 60 dias de prazo de recebimento. O ciclo de caixa ou o
ciclo financeiro é um pouco mais curto, porque chegamos a ele excluindo
do ciclo operacional os 30 dias de prazo de pagamento para os
fornecedores. Quanto maior o ciclo financeiro, maior será a necessidade
de capital de giro em relação à receita.

Vamos considerar o exemplo de uma empresa com os seguintes dados

• Vendas anuais (R$ mil): 2.400


• Contas a receber (R$ mil): 400

Qual será o prazo médio de recebimento?

Primeiro, calculamos a venda média mensal dividindo as vendas anuais


por 12 meses:

• Venda média mensal = 2.400/12 = 200

O prazo médio de recebimento será encontrado dividindo o valor das


contas a receber pela venda média mensal:

• Prazo médio de recebimento = 400/200 = 2 meses.

Para encontrar o prazo médio em dias, basta multiplicar esse resultado


por 30. O cálculo também pode ser feito com base nos valores anuais:

• Prazo médio de recebimento = (400/2.400) * 360 = 60 dias.

47
Vamos calcular o prazo médio de estocagem. Suponha que a mesma
empresa que vende 2,4 milhões de reais por ano tenha os seguintes dados
de custo anual de mercadoria vendida (CMV) e de estoque:

• CMV (R$ mil): 1.800.


• Saldo de estoque (R$ mil): 450.
• Qual seria o prazo de estocagem?

O primeiro passo é dividir o CMV anual por 12 meses:

• CMV mensal = 1.800/12 = 150.

(Lembre-se que o estoque é contabilizado a preço de custo.)

O prazo médio de estocagem pode ser encontrado dividindo o valor dos


estoques pelo CMV mensal:

• Prazo médio de estocagem = 450/150 = 3 meses.


Em dias: 3 * 30 = 90.

Calculando com base nos dados anuais:

• Prazo médio de estocagem = (450/1800) * 360 = 90 dias.

Considere agora que essa empresa tenha os seguintes dados de compras


anuais:

• Compras anuais (R$ mil): 2.040.


• Saldo de fornecedores a pagar: 170.

Qual o prazo médio de pagamento aos fornecedores?

O processo é semelhante ao dos cálculos anteriores. Primeiro, dividimos a


compra anual por 12 meses:

• Compra média mensal = 2.040/12 = 170

48
Para encontrar o prazo médio de pagamento ao fornecedor, dividimos o
valor do saldo de fornecedores a pagar pela compra média mensal:

• Prazo médio de pagamento = 170/170 = 1 mês.

Calculando com base nos dados anuais:

• Prazo médio de pagamento = (170/2.040) * 360 = 30 dias.

Onde encontrar os dados para fazer essas contas? As vendas e o CMV


estão na DRE. A conta de Fornecedores se encontra no balanço
patrimonial. É preciso, porém, calcular o valor das compras – para
empresas comerciais, é relativamente simples. Considere que a empresa
do nosso exemplo tenha os seguintes dados de estoque:

• Estoque em 31/12/X1 (R$ mil) = 210


• Estoque em 31/12/X2(R$ mil) = 450
• Além disso, conhecemos o CMV:
• CMV (R$ mil) = 1.800

49
Perceba então que:

• Estoque inicial + Compras – CMV = Estoque final


• 210 + Compras – 1.800 = 450
• Compras = 450 +1.800 – 210
• Compras = 2.040

Podemos também concluir que a fórmula para encontrar as compras é:

• Compras = Estoque final – Estoque inicial + CMV

Com os prazos que já encontramos, podemos calcular o ciclo financeiro da


empresa que, conforme vimos é o seguinte:

• Ciclo financeiro = prazo médio de estocagem + prazo médio de


recebimento dos clientes – prazo médio de pagamento aos
fornecedores

• Ciclo financeiro = 90 dias + 60 – 30


• Ciclo financeiro = 120 dias.

Um ciclo financeiro alto ou longo (em que há um período grande entre a


saída de dinheiro para o pagamento ao fornecedor e a entrada dos
recursos recebidos dos clientes) leva a uma alta NCG em relação à receita.
Essa costuma ser uma situação desfavorável para a empresa, que
precisará de uma captação maior para financiar esse capital de giro (com
os sócios ou com terceiros). Alguns setores naturalmente apresentam essa
característica (como a indústria da moda, cujas coleções duram cerca de
seis meses, ou o setor imobiliário, cujo ciclo é ainda mais longo,
geralmente de mais de um ano da compra do terreno à venda de um
imóvel acabado).

De maneira geral, entre duas empresas dentro do mesmo setor, aquela


que tiver o NCG menor e o ciclo financeiro mais baixo tende a ser a mais
rentável – essa empresa pagará menos juros ou proporcionará aos sócios
um lucro maior em relação ao investimento.

50
Existe ainda uma outra situação: a das empresas com ciclo financeiro
negativo – ou seja, em que a empresa recebe dos clientes antes de pagar
aos fornecedores. Nesse caso, a NCG, em percentagem da receita,
também será negativa. Redes de supermercados podem apresentar essa
característica. O estoque dessas empresas costuma ser vendido
rapidamente, principalmente no caso de produtos alimentícios e
perecíveis. O mais comum é que os clientes comprem à vista, pagando em
dinheiro e em cartões de crédito, débito ou alimentação. O pagamento
aos fornecedores, porém, costuma ser a prazos mais longos
(principalmente nas redes maiores e com maior poder de negociação). Ou
seja: os prazos de recebimento e de estocagem são curtos e o de
pagamento é longo. Uma NCG negativa significa que a empresa tem mais
valores a pagar aos fornecedores do que em estoques e contas a receber.
Essa é uma situação favorável – o cuidado a tomar é que a empresa
mantenha saldo em caixa para cumprir as obrigações com os fornecedores
e manter o risco baixo.

Falamos dos supermercados, mas há outras companhias em que o ciclo


financeiro negativo é uma característica. É o caso das seguradoras e
operadoras de planos de saúde, cuja natureza do negócio é receber antes
de pagar. No entanto, alguns grupos empresariais, como a Ambev, põem
na estratégia de gestão do capital de giro a busca por uma NCG negativa,
esticando o prazo de pagamento aos fornecedores justamente para
manter esse ciclo negativo.

ANÁLISE DO ENDIVIDAMENTO
O endividamento é geralmente percebido como algo ruim por aumentar o
risco, mas ele também é importante, já que as empresas precisam captar
recursos para realizar suas atividades. Logicamente, é preciso verificar se o
endividamento é excessivo não está trazendo mais riscos para o negócio.
Essa análise, porém, deve ser equilibrada. Nem toda empresa endividada
está indo para uma direção ruim, e nem todo negócio com baixo
endividamento tem um excelente desempenho.

O problema é que a teoria das finanças não tem uma resposta sobre qual
o nível ideal de endividamento. Cabe ao responsável pela análise de uma

51
empresa considerar dois aspectos: a evolução dessas dívidas e a
comparação com outras companhias.

O ponto de partida dessa análise são os indicadores relacionados a


estrutura do endividamento. Sabemos que o passivo circulante e o passivo
não circulante de uma empresa representam de maneira geral o capital de
terceiros. Uma parte desse capital vem da operação (o endividamento não
oneroso) e parte é obtida pela captação de recursos por meio de
empréstimos, por exemplo (o endividamento oneroso). Assim, podemos
calcular qual a porcentagem dos recursos que veio de terceiros e qual veio
dos sócios.

O endividamento geral pode ser calculado considerando a soma do


passivo circulante com o passivo não circulante dividido pelo ativo total.
Essa conta mostrará a proporção do capital que veio de terceiros,
considerando evidentemente tanto as obrigações onerosas e quanto as
operacionais. Se o resultado, por exemplo, der 50%, significa que metade
do capital veio de terceiros – os 50% restantes, por exclusão, vieram dos
sócios.

O próximo indicador é o do endividamento oneroso, que vai mostrar a


proporção do total do passivo que representa as obrigações onerosas ou
financeiras. Para isso, somam-se os empréstimos e financiamentos tanto
do passivo circulante quanto do não circulante – o resultado é dividido
pelo ativo total.

Quanto mais alto o endividamento oneroso, maior o risco. E há um outro


elemento importante: um endividamento oneroso elevado significa que
parte do resultado da empresa necessariamente está comprometida com
o pagamento desses juros, causando o movimento chamado de
alavancagem. O resultado dessa empresa pode ser gravemente
prejudicado se houver uma redução significativa na receita. Num caso
assim, elementos fixos como as despesas operacionais e as próprias
despesas financeiras vão fazer com que o resultado caia numa proporção
muito maior do que a das vendas.

Vamos observar alguns exemplos. Considere o seguinte três empresas de


diferentes setores, com os dados do passivo.

52
Primeiro, vamos calcular o endividamento geral, somando o passivo
circulante e o não circulante e dividindo o resultado pelo passivo total.

ENDIVIDAMENTO TOTAL

Empresa 1 Empresa 2 Empresa 3


(71.159 + 9.342)/89.663 = (1.034 + 1.148)/4.396 = (8.299 + 18.297)/40.819 =
90% 50% 65%

À primeira vista, a Empresa 1 é a mais endividada. Mas é preciso entender


o contexto em que ela atua. Essa empresa de meios de pagamento é uma
intermediadora que tem um valor a receber do consumidor e um passivo
a pagar para os estabelecimentos que venderam, geralmente num volume
muito grande, que ajuda a explicar esse endividamento elevado. Isso quer
dizer que o fato de ser a mais endividada não significa necessariamente
que seja a pior das três. Dá para dizer que essa companhia tem maior
risco, porque 90% do capital é de terceiros, e só conseguirá pagar suas
obrigações se também conseguir receber dos clientes, o que é um risco do
próprio negócio.

A Empresa 2, do setor de vestuário, é em princípio a menos endividada,


com 50% do capital de terceiros. Para aprofundar a análise, porém, é

53
preciso avaliar o endividamento oneroso, que mostrará a porcentagem do
total dos recursos que vem de dívida onerosa.

ENDIVIDAMENTO ONEROSO

Empresa 1 Empresa 2 Empresa 3


(2.372 + 6.779)/89.663 = (644 + 1.129)/4.396 = (3.076 + 17.591)/40.819 =
10% 40% 51%

Veja que a Empresa 1 tem um endividamento oneroso de 10% (para saber


se isso é muito ou pouco seria preciso comparar esse resultado com o dos
anos anteriores ou com outras empresas do setor). Atenção: esses 10%
estão inseridos dentro dos 90% do endividamento total. Em outras
palavras: a maior parte do endividamento dessa empresa é operacional.
No caso das Empresas 2 e 3, a maior parte do endividamento é oneroso.

É importante olhar o endividamento geral e o oneroso é importante, mas


não o bastante. O que importa é a capacidade que a empresa tem para
pagar essas dívidas. Para isso, podemos recorrer a outros indicadores. Um
deles é o índice de cobertura de juros, que mostra a porcentagem das
despesas financeiras coberta pelo resultado operacional (Ebit). O ideal é
que o resultado dessa conta seja superior a 100% para que seja possível
pagar as despesas e ainda sobrar dinheiro. Nesse caso, será baixo o risco
de a empresa não cumprir suas obrigações. Se a cobertura de juros for
inferior a 100%, o risco será mais alto. Não quer dizer que a empresa vai
quebrar, mas que naquele momento seus resultados não são capazes de
cobrir as despesas financeiras. Esse indicador é utilizado pelas áreas de
crédito dos bancos e pelas empresas de classificação de risco de crédito.

Vamos voltar, então, às três empresas do nosso exemplo, para as quais


acrescentamos os dados sobre os resultados operacionais e as despesas
financeiras.

54
CÁLCULO DO ÍNDICE DE COBERTURA DE JUROS

Empresa 1 Empresa 2 Empresa 3


1.974/439 = 241/166 = 6.721/3.271 =
4,50 1,46 2,05

O cálculo mostra que o Ebit da Empresa 1 é capaz de cobrir mais de


quatro vezes suas despesas com juros (ou 450%) – um risco muito baixo.
Indo em ordem decrescente, a Empresa 3 tem um resultado operacional
que cobre 2,05 vezes suas despesas com juros – ou seja, é quase como se
a cada 2,00 reais de resultado operacional, 1,00 vá para o pagamento de
juros e 1,00 para o pagamento de impostos ou para os sócios. É um baixo
risco, mas um pouco mais alto do que o da Empresa 1. A Empresa 2, por
sua vez, caminha na direção de um aumento do risco, pois a cada 1,46 real
de resultado operacional, 1,00 é destinado ao pagamento de despesas
financeiras.

As empresas não saem numa busca desenfreada para quitar as dívidas,


que são uma importante fonte de recursos para bancar o crescimento
(abrir novas unidades, aumentar a capacidade, expandir para o exterior e
assim por diante). Apesar disso, é importante medir também o quanto do
resultado da empresa representa em relação ao total do endividamento
para saber se ele não está se tornando muito grande para a empresa. Em
resumo, o endividamento não pode crescer mais do que a própria
empresa. Essa comparação pode ser feita com o Ebitda, que mostra o
potencial de geração de caixa da operação. Relembrando que o Ebitda é
usado para:

55
• Aumentar o capital de giro.
• Investir em ativos imobilizados e intangíveis.
• Pagar imposto de renda.
• Remunerar os sócios.
• Pagar dívidas.

A distribuição do Ebitda depende muito do estágio de desenvolvimento da


empresa. A parcela destinada a financiar o crescimento será maior numa
empresa que estiver nas fases iniciais do ciclo de vida, assim como a
proporção a ser usada para pagar dívidas e remunerar os sócios se tornará
mais importante num negócio mais maduro. Como então usar o Ebitda
para criar um indicador do endividamento? Toma-se o valor da dívida
líquida (que é a soma de empréstimos e financiamentos, menos o caixa e
aplicações financeiras) e divide-se o resultado pelo Ebitda.
Considere, por exemplo, que uma empresa tenha uma dívida de 1 milhão
de reais e um Ebitda anual de 200 mil reais. Dividindo uma coisa pela
outra, percebemos que a empresa levaria 5 anos para quitar a dívida, se
decidisse destinar todo o Ebitda para isso (lembrando que essa é apenas
uma medida – dificilmente uma empresa faria algo assim).

Voltando às três empresas dos exemplos deste capítulo, com as


informações sobre empréstimos e financiamentos e o caixa:

56
O primeiro passo é calcular a dívida líquida, somando e empréstimos e
financiamentos e subtraindo desse resultado o caixa e as aplicações.

CÁLCULO DA DÍVIDA LÍQUIDA

Empresa 1 Empresa 2 Empresa 3


(2.372 + 6.779) - 8.763 = (644 + 1.129) - 575 = (3.076 +17.591) – 6.111 =
388 1.197 14.556

À primeira vista, a dívida líquida da Empresa 3 é a maior de todas. Mas é


preciso olhar não o valor absoluto, mas o relativo. Para isso, é preciso
calcular o Ebitda – o que fazemos, lembre, somando o Ebit à depreciação e
amortização:

CÁLCULO DO EBITDA

Empresa 1 Empresa 2 Empresa 3


1.974 + 343 = 241 + 92 = 6.721 + 2.534 =
2.316 334 9.255

Agora, resta dividir a dívida líquida pelo Ebit:

ALAVANGEM EBITDA

Empresa 1 Empresa 2 Empresa 3


388/2.316 = 334/1.197 = 9.255/14.556 =
0,17 3,59 1,57

O resultado mostra o seguinte: para pagar sua dívida líquida, a Empresa 1


usaria apenas 0,17 do seu potencial de geração de caixa da operação – ou
seja, menos de um ano do Ebitda. Seu risco é muito baixo. A Empresa 3
precisaria cerca de um ano e meio para quitar a dívida líquida. A Empresa
2 é a que tem o risco mais alto: 3,59.

Interpretando os resultados: pode ser considerada de risco mais alto a


alavancagem Ebitda maior do que 3 ou 4, de risco médio os indicadores
entre 1 e 3, e de baixo risco o indicador abaixo de 1. Se a alavancagem

57
Ebitda for menor que zero, é preciso tomar um certo cuidado. O indicador
pode ser negativo porque o Ebitda é negativo – e nesse caso o risco será
muito alto, pois a empresa não tem capacidade para gerar caixa. Se a
dívida líquida for negativa, significa que a empresa tem mais caixa do que
dívida – e seu risco será muito baixo.

ANÁLISE INTEGRADA DO DESEMPENHO:


MARGEM, ATIVIDADE E RENTABILIDADE
Qual a diferença entre lucratividade e rentabilidade? Mais: uma empresa
lucrativa é melhor do que uma rentável? Respondendo: a lucratividade
mostra a relação entre lucro e receita, enquanto a rentabilidade dá a
relação entre lucro e investimento. Para um investidor, a rentabilidade é
muito mais relevante. Não quer dizer que a lucratividade seja algo
secundário, pois se trata de um caminho para a rentabilidade.

Quando falamos sobre a análise da demonstração de resultado, vimos a


relação entre receita e lucro (calculada por meio da margem líquida, que
estabelece a razão entre lucro e receita). Faltou falar sobre outro aspecto:
a relação entre o lucro e os ativos, que representam o investimento. Para
relacionar os ativos com lucro, é preciso fazer a ponte entre ativos e
receita. Isso é feito por meio de um indicador chamado giro do ativo, que
vai me dizer o quanto que a empresa obtém de receita para cada 1 real
investido no ativo. É necessário construir, portanto, uma cadeia formada
por duas etapas: os ativos geram receita e a receita vai gerar lucro.

Para saber quanto lucro está sendo obtido em relação à receita, deve-se
calcular uma medida de rentabilidade (lucro dividido pelo ativo). Essa
relação entre lucro e ativo é o que determina a rentabilidade, refletida
num indicador chamado de ROA (Return On Assets, ou simplesmente
retorno sobre os ativos). Note que essa relação naturalmente depende do
giro e da margem.

58
Vamos ver aqui um exemplo numérico para observar a lucratividade e a
rentabilidade. Suponha que uma empresa tenha uma receita de 150 reais
e um lucro de 15 reais. Sua margem líquida será de 10% (lucro divido pela
receita). Quer dizer que a empresa obtém 10 reais de lucro a cada 100
reais em vendas.

Considere que a mesma empresa possui 100 reais em ativos. O giro do


ativo vai ser de 1,5 (150 de receita divididos por 100 dos ativos). Em
outras palavras, para cada 1 real de ativo, a empresa gera 1,50 de receita.

O ROA, o retorno sobre os ativos. será obtido pela razão entre o lucro e os
ativos, ou seja, 15% (15 reais de lucro sobre 100 reais de ativos). Note que
nesse caso o ROA de 15% equivale ao giro do ativo (1,5) multiplicado pela
margem líquida (10%). Isso não acontece por acaso.

Dissemos que o ROA é obtido pela razão entre lucro e ativo. Além disso,
também pode ser obtido pelo produto do giro do ativo (que é igual à
receita sobre o ativo) pela margem líquida (obtida pela razão do lucro
líquido sobre a receita).

59
ROA = Giro do ativo x Margem líquida
↓ ↓ ↓
Lucro líquido = Receita Lucro líquido
ativo Ativo Receita

Em termos práticos, um giro alto significa que a empresa tem muita


eficiência para gerar receita a partir dos ativos. A margem, por sua vez, é a
eficiência em gerar lucro a partir da receita. Nos últimos anos, cresceu o
número de empresas com modelos de negócio que buscam ter ativos mais
enxutos e gerar muita receita, e com isso aumentar a rentabilidade.
Possuir muitos ativos não é algo necessariamente bom. É claro que,
dependendo do que a empresa faz, não é possível ter um giro muito
grande. Uma mineradora, por exemplo, tem um giro baixo, pois são
necessários muitos ativos para gerar receita. Uma empresa de distribuição
tende a ter um giro mais elevado.

Um investidor pode ter outro ponto de vista: não foi ele que financiou o
total dos ativos da empresa. Em termos contábeis, sua participação
corresponde ao patrimônio líquido. Portanto, é preciso olhar para o
patrimônio líquido na continuação dessa análise. Existe uma relação entre
lucro e patrimônio líquido. O acionista quer saber o quanto obtém de
lucro em relação ao patrimônio dos acionistas. O indicador que dá essa
resposta é o chamado ROE (Return On Equity, ou retorno sobre o

60
patrimônio líquido) e é calculado pela razão entre lucro e patrimônio
líquido. Fazendo a conexão entre o PL e o lucro, percebe-se que o ROE
depende do giro, da margem e também da relação entre patrimônio
líquido e ativos (quanto a empresa tem de ativos em relação ao
patrimônio líquido), o que é chamado de indicador de alavancagem do
patrimônio líquido.

A alavancagem do patrimônio líquido é calculada pela razão entre ativos e


patrimônio líquido. Quanto maior a alavancagem, mais ativos para cada
real de patrimônio líquido a empresa terá.

Vamos voltar ao nosso exemplo. Suponha que a empresa, cujo ativo era
de 100 reais, tenha um patrimônio líquido de 40 reais. Sua alavancagem
do PL será de 2,5 (100/40). Ou seja: para cada 1,00 real de PL, a empresa
tem 2,50 reais de ativos – assim a relação com o passivo (circulante e não
circulante) vai ser de 1,50. Em outras palavras, para cada 1,00 real de ativo
a empresa terá 1,50 real em capital de terceiros. Quanto maior a
alavancagem, portanto, mais alto o endividamento.

61
Vamos agora calcular o ROE. O acionista obteve um lucro de 15 reais a
partir de um investimento de 40 reais, o que dá 37,5%. Perceba que o ROE
é igual ao ROA (que calculamos anteriormente em 15%) pela alavancagem
do PL (2,5). A explicação matemática é a seguinte:

ROE = ROA x Alavancagem do PL


↓ ↓ ↓
Lucro líquido = Lucro líquido x Ativo
PL Ativo PL

Podemos nos perguntar o seguinte: uma empresa endividada, com uma


alavancagem maior, pode trazer mais rentabilidade para o acionista?
Depende: se o custo médio da dívida for menor do que o retorno sobre o
investimento proporcionado pela operação, o endividamento será
benéfico, sendo que o retorno sobre o investimento é um indicador
chamado ROI, obtido pela razão do Ebit sobre o total do ativo (Ebit/Ativo).

O exemplo a seguir mostra o retorno ao acionista obtido por uma


empresa sem dívidas e o que mudaria com um passivo equivalente a 60%
dos ativos:

62
Perceba que o custo médio da dívida foi de 7%, metade do retorno sobre
o investimento. O endividamento, nesse caso, elevou o retorno ao
acionista, calculado pelo ROE, de 9,8% para 17,2%. O lucro, em números
absolutos, caiu de 9.800 reais para 6.860 reais, devido às despesas
financeiras. No entanto, sobrou mais dinheiro para cada real investido
pelo acionista.

Vejamos agora outro exemplo, mostrando quando o endividamento não é


saudável.

63
Nesse segundo exemplo, o custo da dívida superou o ROI. Assim, a
empresa captou recursos a uma taxa maior do que o retorno obtido com a
operação. Isso acabou reduzindo o retorno para o acionista.

Consolidando o que foi visto nesse capítulo, há três fatores que


contribuem para a rentabilidade para o acionista:

• Margem: está relacionada às vantagens competitivas, à criação de


valor para os clientes e ao controle de despesas.

• Giro do ativo: está relacionado à produtividade dos ativos (o quanto


à empresa é eficiente em gerar receita com ativos que possui).

• Alavancagem: está relacionado ao uso eficiente do capital de


terceiros, principalmente se o custo desse capital for baixo.

É importante observar que nem todas as empresas seguem o mesmo


caminho para chegar à rentabilidade, combinando alguns desses três

64
fatores, o que muitas vezes está relacionado ao setor de atividade e à
natureza do negócio.

A relação entre risco e retorno precisa ser bem compreendida para que
possamos ter uma análise sobre a rentabilidade mínima de uma empresa.
Suponha que um investidor tenha uma rentabilidade igual à da taxa Selic
para um investimento sem risco (com base nas projeções de juros para os
próximos anos). Se for para investir numa empresa, que obviamente
oferecerá alguns riscos, é preciso ter a expectativa de obter uma
porcentagem adicional, que é um prêmio pelo risco. Quanto maior o risco,
mais alto o prêmio que o investidor esperará obter.

Perceba que uma empresa muito exposta aos riscos pode proporcionar
uma rentabilidade muito alta, mas também está sujeita a perdas. A lógica
é que a expectativa de rentabilidade mais elevada compensa o risco a que
o investidor se expõe. É preciso, portanto, saber avaliar os riscos a partir
de uma série de fatores qualitativos:

• Endividamento - quanto maior a dívida, maior o risco.

• Instabilidade da receita e do lucro - se há muita variação de um ano


para o outro, o risco é alto).

• Governança – observe se a empresa é bem estruturada, qual a


formação dos gestores, a sucessão e assim por diante.

• Setor em que a empresa atua – existem setores mais sujeitos às


oscilações da economia do que outros.

• Concorrência – um setor muito concorrido representa um risco


mais alto para a empresa.

• Produto ou serviço comum X marca diferenciada – se o produto ou


serviço que a empresa faz é uma commodity ou sem marca forte,
haverá maior exposição às oscilações de preço.

• Dependência de inovações tecnológicas - se a empresa tem um


elevado nível de inovação, seu produto pode ser diferenciado, mas

65
também existe um risco associado à necessidade de inovação
constante para lançar novos produtos.

ESTRUTURA E CUSTO DE CAPITAL


Saindo do âmbito de contabilidade e da análise específica das
demonstrações financeiras, vamos ver como as empresas tomam decisões
estratégicas de captação de recursos de acordo com a estrutura e o custo
de capital.

O primeiro ponto a considerar: qual a origem do capital. Existem as fontes


próprias ou internas, que são o capital dos sócios – seja na forma de
investimento ou da geração de resultados da atividade –, e as fontes de
terceiros (que de maneira ampla são os fornecedores, os empréstimos, as
obrigações sociais, as obrigações fiscais e outros passivos circulantes e não
circulantes).

Uma outra forma de classificar as fontes de recursos é entre onerosas,


(que acarretam despesas financeiras, como empréstimos bancários,
financiamentos e emissões de títulos) e as operacionais ou não onerosas

66
(que não acarretam despesas financeiras se forem pagas até o
vencimento, como fornecedores a pagar, obrigações sociais e trabalhistas
e outros passivos).

As diferentes origens de recursos têm pontos positivos e negativos, do


ponto de vista da empresa. O capital de terceiros tem como principais
vantagens a dedutibilidade do imposto de renda (as despesas com juros,
por exemplo, podem ser deduzidas da base de cálculo do IR) e o fato de
não dar ao credor interferência na gestão – as desvantagens são que suas
obrigações são fixas, têm prioridade sobre o fluxo de caixa e têm
vencimentos definidos.

O capital próprio, por sua vez, tem as vantagens de ser um direito residual
– ou seja, o acionista/investidor recebe de acordo com o resultado da
empresa –, tem menor prioridade sobre o fluxo de caixa e não contam
com vencimento definido, a menos que haja o compromisso de pagar
dividendos, por exemplo. Suas desvantagens para a empresa (que são
vantagens para o acionista) é que essas obrigações não são dedutíveis do
imposto de renda (a não ser no caso do pagamento de juros sobre o
capital próprio) e dão ao acionista ou investidor direito de influenciar a
gestão.

67
A teoria de finanças não determina o que seria uma estrutura de capital
ideal. É um tema muito complexo e depende de cada caso. Para tomar
decisões estratégicas, as empresas levam em conta não só a estrutura,
mas também o custo do capital, que é o retorno mínimo que a empresa
vai obter com suas atividades para remunerar os investidores (sócios e
credores). Em outras palavras, se a rentabilidade de um determinado
investimento de uma empresa for inferior ao custo de capital, o retorno
obtido não será suficiente para remunerar quem nela investiu.

Imagine, por exemplo, que uma companhia tome um empréstimo


bancário com juros de 20% ao ano para bancar um determinado projeto.
Evidentemente, esse projeto precisará dar um retorno de pelo menos 20%
ao ano, caso contrário não será possível nem mesmo pagar os juros.

Já vimos que uma empresa pode ter fontes de recursos próprios e de


terceiros. Agora vejamos ver um exemplo que mostra como se chega ao
custo de capital, começando pela estrutura dos investimentos efetuados
na empresa.

68
A estrutura de capital é diferente da estrutura patrimonial contábil. O lado
direito está dividido entre os investimentos em capital de giro e os ativos
não circulantes (imobilizados, intangíveis, realizáveis ao longo prazo). Os
recursos destinados ao capital de giro ou aos ativos não circulantes vêm
de duas fontes: a dívida líquida (que como vimos é a dívida bruta de
empréstimos e financiamentos menos o caixa e as aplicações) e o
patrimônio líquido (o dinheiro dos acionistas).

Pois bem: os recursos captados pela empresa precisam ser remunerados –


a dívida por meio de juros e o dinheiro dos acionistas por meio de
dividendos. Chamamos de kd (cost of debt) o custo de capital da dívida e
de ke (cost of equity) o custo de capital dos sócios.

É fácil de visualizar o kd – ao emprestar dinheiro, os credores sempre


definem uma taxa de juro (vamos considerar de 10% no nosso exemplo).
O ke, por sua vez, não tem uma taxa estabelecida, mas essa porcentagem
será determinada por um modelo financeiro que veremos adiante. Por
ora, vamos considerar que o ke seja de 20% (como o acionista tem direitos
residuais e, por isso, incorre em maior risco, é normal que o custo do seu
capital seja superior ao de terceiros).

Considere ainda que o total dos empréstimos seja de 400 reais e que os
recursos captados pelos acionistas somem 600 reais, totalizando 1.000
reais de capital investido

69
Se os credores investiram 400 reais e querem uma rentabilidade de 10%,
sua remuneração será de 40 reais. Esse valor é considerado como despesa
financeira para a empresa e, portanto, pode ser abatido da base de
cálculo do Imposto de Renda (gerando, assim, um benefício fiscal de 13,60
reais, considerando uma alíquota de 34%). Esse benefício fiscal vai reduzir
o custo da dívida para 26,40 reais (40,00 reais de juros pagos menos 13,60
reais do benefício fiscal).

Do lado dos acionistas não consideraremos nenhum benefício fiscal. O ke


será 20% de 600 reais, o que dá 120 reais. Assim, a empresa precisará
gerar no mínimo um resultado de 146,40 reais para remunerar o credor e
os acionistas. Percentualmente, então, o custo de capital dessa empresa
será de 14,64% (146,40 reais sobre 1.000 reais de capital investido).

Quem já conhece como se calcula o custo médio ponderado de capital,


também chamado de Wacc, pode ter visto esse cálculo feito de outra
maneira. A fórmula mais conhecida é a seguinte:

Onde:
• Kd – custo da dívida
• T – alíquota dos tributos sobre o lucro
• D% - proporção de capital de terceiros
• ke – custo de capital dos sócios
• E% - a proporção do capital dos sócios

Aplicando a fórmula no nosso exemplo:

Muito cuidado: o custo médio ponderado de capital não se compara com


o ROE (em seguida falaremos mais sobre isso).

70
Para calcular o custo médio ponderado de capital precisamos da estrutura
de capital, do ke e do kd. Vejamos as fórmulas para encontrar esses três
valores:

1. Para encontrar a estrutura de capital, precisamos ver a dívida


líquida (lembrando que esse valor corresponde a empréstimos e
financiamentos menos caixa e aplicações financeiras) e o capital dos
sócios, que pode considerar a visão contábil (pelo patrimônio
líquido) ou a visão de mercado (por meio do valor de mercado da
empresa).

2. O custo de capital dos sócios ou custo de capital dos acionistas


obedece à lógica do risco e retorno. Já vimos num capítulo anterior
que o investidor exige um prêmio para compensar o risco do
investimento, partindo de uma taxa de retorno sem risco – ou seja,
um retorno adicional para investir em ações. Somando o retorno
livre de risco com o prêmio de risco de mercado encontramos o
retorno esperado para o mercado de ações para uma empresa
média.

Para empresas específicas, porém, esse retorno requerido vai


depender da exposição aos riscos, que é determinada por um
indicador chamado beta, que indica a sensibilidade da empresa às

71
movimentações do mercado. Uma empresa com beta inferior a 1
seria pouco sensível às oscilações de mercado – no caso brasileiro,
poderia ser uma companhia de energia ou indústria de alimentos.
Uma empresa com beta maior do que 1 tem alta exposição aos
riscos – como uma companhia aérea, que no Brasil tem parte
significativa dos custos em moeda estrangeira, um componente de
grande volatilidade. É isso que vai determinar o ke de cada empresa
– e para ter bom desempenho, uma empresa deve ter um ROE
superior ao ke.

A fórmula para calcular o ke é a seguinte:

72
Em outras palavras, o ponto de partida é uma taxa de retorno livre de
risco, à qual é somada o prêmio requerido pelos investidores – para a
seguir multiplicar tudo pela sensibilidade da empresa ou das ações à
economia.

Esse é o modelo básico. No Brasil, porém, para conseguir uma estimativa


de forma mais estável para o custo médio ponderado do capital,
aplicamos alguns parâmetros externos à seguinte fórmula:

Para a taxa livre de risco (rf), consideramos o rendimento dos Treasuries


americanos para 10 anos (a taxa de juros dos títulos americanos, uma
informação que pode ser encontrada no site do Tesouro dos Estados
Unidos). A esse valor somamos o beta da empresa.

O prêmio de risco de mercado (rm - rf) pode ser obtido pelo chamado
Implied Equity Risk Premium (o prêmio de risco implícito do mercado de
ações - uma das fontes é o site do professor Aswath Damodaran, da New
York University e um dos maiores especialistas em avaliação de empresas
no mundo). Esse indicador reflete o diferencial de retorno requerido pelos
investidores que está implícito no preço das ações.

73
Ao Implied Equity Risk Premium, somamos o prêmio de risco país (Country
Risk Premium - CRP), que pode ser obtido pelo Embi (que é a diferença
entre a taxa de retorno dos títulos brasileiros em moeda estrangeira e os
títulos americanos) ou a taxa do CDS do Brasil (credit default swap, um
derivativo que protege o investidor contra a inadimplência de um título do
país).

Vamos supor, por exemplo, que encontremos os seguintes valores:

• rf (rentabilidade dos US Treasuries): 4,0%


• beta: 1
• rm – rf (Implied Equity Risk Premium): 5,5%
• Country Risk Premium (Embi ou CDS): 3,0%

ke = rf + beta X (rm – rf) + CRP


ke = 4,0% + 1 x 5,5% + 3,0%
ke = 12,5%

Esse seria o retorno em dólar requerido pelos acionistas. Veja como


exemplo o laudo de avaliação elaborado em 2013 como parte do
valuation da empresa NET (para o valuation, é preciso calcular o custo do
capital próprio):

74
Vamos aplicar os dados desse laudo na fórmula que acabamos de estudar:

ke = rf + beta x (rm – rf) + CRP


ke = 3,06% + 0,882 x 6,62% +2,45%
ke = 11,35%

Ao utilizar parâmetros externos, o custo de capital é obtido sob forma de


retorno em moeda estrangeira. Se quisermos saber o retorno de uma
empresa considerando os resultados no mercado internos, temos de fazer
o cálculo em reais. Nesse caso, é necessário converter a taxa para a
moeda local, usando o diferencial de inflação. A equação é a seguinte:

Onde:
• ke BRL: custo do capital próprio em reais.
• Ke USD: custo do capital próprio em dólares
• Inf BRL: projeção de inflação no Brasil (IPCA – vamos supor que seja
de 4%)
• Inf USD: projeção de inflação nos Estados Unidos (CPI – considere
que seja 2%)

Convertendo em reais o custo de capital encontrado pelo laudo de


valuation da NET:

keBRL = (1 + 0,1135) x (1+0,04)/(1+0,02) -1


keBRL = 13,53%

75
Assim, vimos como calcular o custo de capital próprio. O custo de capital
de terceiros pode ser encontrado pela taxa média ponderada de todas as
taxas de juros que a empresa possui.

Suponha que a empresa tenha uma taxa de juros pré-fixada (IPCA, por
exemplo) e um indexador (2%). Devemos então calcular o kd para todas as
dívidas que a empresa tem e por fim tirar a média ponderada:

ANÁLISE DA CRIAÇÃO DE VALOR


O custo de capital (o Wacc) representa a rentabilidade mínima que uma
empresa precisa obter. Se o retorno proporcionado for maior, significa
que a empresa está criando valor. Ou seja: a criação de valor ocorre
quando um negócio supera o desempenho mínimo requerido,
proporcionando um retorno superior ao custo de capital. Vimos que esse
desempenho mínimo tem a ver com o custo médio de capital, que é a taxa
mínima de retorno requerida para remunerar os investidores. O custo
capital vai ser comparado, portanto, com o desempenho da operação, que
é de onde virá a remuneração dos credores e os acionistas.

Para saber se a empresa está criando ou não valor, utiliza-se o conceito do


EVA (economic value added, ou lucro econômico). O cálculo do EVA parte
do lucro operacional, do qual se subtrai o imposto de renda para chegar
ao Nopat (net operating profit after taxes, ou lucro operacional após os
impostos).

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Do Nopat, subtraímos o custo do capital, que é o capital investido
multiplicado pelo custo de capital). O resultado será o EVA.

O primeiro passo para calcular o EVA, portanto, é calcular o Nopat. Para


isso, pegamos o Ebit e multiplicamos por 1 – T, sendo T a alíquota de
impostos (em regra, podemos usar 34%, a não ser em casos específicos de
empresas que têm algum benefício fiscal).

A seguir, calculamos o Capital Investido (C.I.), que é igual a Necessidade de


Capital de Giro (encontrada pela diferença entre o Ativo Circulante
Operacional e o Passivo Circulante Operacional) somada aos Ativos Não
Circulantes Operacionais.

Depois, encontramos o EVA, que é igual ao Nopat, menos o Custo Médio


Ponderado de Capital (Wacc) multiplicado pelo Capital Investido.

Podemos a seguir calcular a rentabilidade (ROIC, ou retorno sobre o


capital investido), que é o Nopat dividido pelo Capital Investido.

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Se o resultado for um EVA negativo, significa que o desempenho da
empresa foi inferior ao mínimo requerido pelo custo de capital – e a
empresa destruiu valor, pois a rentabilidade medida pelo ROIC ficou
abaixo do custo médio ponderado do capital (Wacc.). O ROIC mostrar a
capacidade da operação para gerar resultado e remunerar os investidores.

Sabemos que o valor contábil das empresas pode ser diferente do valor de
mercado, que é guiado sobretudo pelas expectativas futuras. Quando o
valor de mercado é superior ao do capital investido, chamamos a
diferença de MVA, sigla de Market Value Added, ou Valor de Mercado
Adicionado.

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A fórmula para calcular o MVA é a seguinte:

Detalhando um pouco mais:

• O MVA é a diferença entre o Entreprise Value e o Capital Investido,


que nós vimos o que é.

• O Enterprise Value (também chamado de valor do negócio ou valor


da firma) corresponde à soma do Market Capitalization com a
Dívida Líquida.

• A Dívida Líquida nós já vimos que é a soma de empréstimos e


financiamentos, menos o caixa e aplicações financeiras. E o Market
Capitalization (ou Market Cap)? Trata-se do valor de mercado
(preço das ações multiplicado pela sua quantidade).

O MVA será positivo se houver a expectativa de que a empresa dê um


retorno futuro superior ao custo do capital investido – e negativo se o
retorno esperado for inferior ao custo do capital investido.

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ANÁLISE COM MÚLTIPLOS
A análise com múltiplos, muito utilizada nos processos de valuation,
relaciona informações de mercado com alguns dos indicadores que
encontramos nas demonstrações financeiras das empresas. Os múltiplos
ajudam a compreender se o preço da ação está acima ou abaixo do que
seria o “valor justo” com base em empresas comparáveis. Existem
diferentes múltiplos, e cada um deles é mais adequado a determinados
tipos de empresas.

PRICE-TO-BOOK
O primeiro múltiplo que vamos ver é o chamado price-to-book, ou preço-
valor patrimonial (PBV). Pode ser calculado dividindo o preço dessa ação
pelo seu valor patrimonial, ou dividindo o market cap da empresa pelo seu
patrimônio líquido.

Esse indicador é interessante sobretudo para bancos e empresas do setor


imobiliário. O price-to-book vai mostrar se o valor de mercado de uma
empresa é maior ou menor do que o valor contábil. Pode ajudar a
entender se uma ação está barata, embora esse tipo de análise demande
mais cuidado – é preciso observar melhor os resultados que a empresa
vem entregando, verificar se eventualmente não há uma expectativa
desfavorável que seja justificável e fazer uma análise qualitativa das

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projeções futuras para avaliar ameaças que possam comprometer os
negócios da empresa.

EV/Ebitda

Outro múltiplo amplamente utilizado para empresas nos setores


industriais, varejistas e de serviços não financeiros é o chamado
EV/Ebitda. Esse múltiplo relaciona o Enterprise Value (soma do Market
Cap com a dívida líquida) dividido pelo Ebitda. Ele mostra quanto a
empresa inteira vale em relação ao potencial de geração de caixa. Quando
esse múltiplo está mais alto, significa que há uma expectativa de
crescimento futuro para a empresa.

É interessante observar que um EV/Ebitda muito alto pode significar duas


coisas: ou há uma expectativa muito positiva quanto ao futuro da empresa
ou o Ebitda pode ser baixo demais.

PRICE-EARNINGS
O price-earnings, ou preço-lucro, vai mostrar quanto vale a parte do
acionista em relação ao lucro líquido. Pode ser calculado dividindo-se o

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preço da ação pelo lucro por ação, ou dividindo o market cap pelo lucro
líquido. Suponha por exemplo que num dado momento você esteja vendo
a ação de uma empresa cotada a 20 reais, com um lucro por ação
projetado para o ano seguinte de 4 reais por ação (seja por meio
dividendos ou lucros retidos).

4 reais

20 reais

O price-earnings dessa ação seria o seguinte:

P/E = 20/4 = 5

Em outras palavras, quer dizer que a expectativa é de que em cinco anos o


investidor terá um retorno equivalente ao valor da ação, se esses lucros se
repetirem.

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Um aspecto importante para ressaltar: invertendo o indicador e
calculando o lucro sobre o preço (4/20, portanto) se chega à rentabilidade
para o acionista (no caso, 20%) – e a rentabilidade ao valor de mercado. E
para que um investimento numa empresa seja viável, a rentabilidade para
o acionista ao valor de mercado precisa ser superior ao ke.
Evidentemente, o investidor quer adquirir ações que tenham price-
earnings baixo. Mas pode haver empresas com price-earnings alto. Isso
pode ocorrer em duas situações: quando a ação de fato está cara ou
quando existe uma expectativa de crescimento futuro embutida no preço.

DIVIDEND YIELD
O Dividend Yield representa a rentabilidade que o investidor vai obter com
o recebimento de dividendos. Seu cálculo é a divisão do dividendo por
ação pelo preço da ação.

Suponha, por exemplo, uma ação cujo preço seja de 20 reais e pague um
dividendo por ação de 2,50 reais:

Dividend Yield = 2,50/20 = 12,5%

Ou seja, além da possível valorização da ação, ela proporciona uma


rentabilidade em dividendos de 12,5% sobre o capital investido. em
As empresas com Dividend Yield mais alto costumam ser as mais maduras,
no que diz respeito ao seu ciclo de vida (e não empresas que estão num
momento de crescimento mais acelerado, o que consome mais caixa).

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CONCLUSÃO
Chegamos ao fim da apostila de Análise de Balanços, na qual vimos como
extrair as principais informações das Demonstrações Financeiras das
empresas.

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