Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
3
Modelos de periodização
3.3.1
Origens e racional da periodização
Origens e racional da periodização (1)
• A obtenção de resultados de alto nível não se faz sem submeter o organismo a elevadas
cargas de treino. Porém, se o esforço de sobrecarga do organismo for feito sem um
planeamento adequado, os resultados do treino podem traduzir-se por processos de
sobretreino, os quais podem inviabilizar a obtenção dos resultados desportivos desejados.
• A organização cíclica (ou periodizada) dos estímulos de treino tem como objectivo evitar os
processos de fadiga extrema, proporcionar a recuperação das capacidades dos
desportistas e adoptar estratégias e conteúdos de preparação orientados para a obtenção
dos melhores resultados.
• Por isso, a periodização é entendida como um instrumento fundamental no processo de
planeamento do treino e na gestão do rendimento.
Origens e racional da periodização (2)
• O modelo de Selye propõe-nos que um stress sobre o organismo pode resultar numa
adaptação, através da qual o organismo se torna mais tolerante ou resistente a esse
tipo de stress.
Origens e racional da periodização (3)
• Para que isso aconteça é necessário que ocorra um período de recuperação (A). Quando uma carga de
treino é administrada de forma contínua o organismo começa a desenvolver os mecanismos de adaptação,
mas, se a carga não for interrompida, isto é, se o stress não for removido, o organismo entra em
sobretreino, podendo chegar à exaustão (B).
• Desta forma, o efeito de supercompensação poderia ser induzido, não no final de uma sessão de treino,
mas no final de um ciclo de treino específico, promovendo-se níveis de adaptação superiores (Figura).
• Esta ideia constitui o fundamento da criação de pequenos ciclos de treino, os chamados microciclos
(Issurin, 2010a).
Figura: Variante do efeito acumulado de várias unidades de treino
(I, II, III – Microciclos) (Matveyev, 1977, 70)
Origens e racional da periodização (8)
• Os princípios metodológicos do sistema de treino atual, entre os quais os da periodização, foram desenvolvidos
pelos treinadores russos no início dos anos 1950, quando a ex-URSS preparava a sua primeira participação
olímpica nos J.O. Helsínquia (Verchoshanski, 1999).
• A experiência prática então adquirida foi organizada e publicada sob a forma de uma “Teoria da Periodização” e os
especialistas do treino começaram a ganhar consciência de que era impossível manter níveis de rendimento
elevado durante toda uma época desportiva e, por esta razão, a concentrar os seus esforços sobre as competições
mais importantes (Issurin, 2010a; Bakken, 2013).
Origens e racional da periodização (9)
• Internacionalmente, o nome mais associado aos esforços de construção de uma teoria da periodização é Lev P.
Matveev, o primeiro a fazer uma organização e sistematização de conceitos, fundamentos teóricos e de modelos
empíricos que deram origem ao que se chama hoje a Teoria da Periodização do Treino (Issurin, 2010a, 2014).
• Estes modelos e conceitos, nos seus aspectos básicos, continuam a merecer nos nossos dias aceitação entre os
treinadores (Issurin, 2010a; 2014; McGregor, 2013), embora com nuances próprias para cada desporto e para os
diferentes níveis de enquadramento da prática.
• Não obstante, a teoria clássica da periodização tem vindo a ser modificada desde a sua introdução nos anos 1960, e a
integrar novas ideias apresentadas por diferentes especialistas e pelo próprio Matveev.
Lev P. Matveyev
INEF Madrid 1977
Lev P. Matveiev
Vigot, Paris 1983
Origens e racional da periodização (12)
• Estas, todavia, não se eximem a uma crítica por parte de alguns especialistas (Yuri Verchoshanski ou Tudor
Bompa) da teoria e da prática do treino, que vêem nos contributos da teoria clássica e nas alterações
entretanto introduzidas propostas desajustadas à prática e sem a necessária consistência teórica.
• De facto, nos últimos 50 anos, não apenas a organização e as condições da prática no desporto de alto nível
mudaram de uma forma muito significativa (desenvolvimento do desporto como indústria, valorização dos
espetáculos desportivos, profissionalização do desporto levando a exigências cada vez maiores sobre o
rendimento dos atletas e a sua manutenção durante períodos de tempo, mesmo para além do que seria
razoável), como a Ciência do Desporto foi acumulando novos conhecimentos que vieram alterar o nosso
entendimento sobre o planeamento e a periodização do treino.
3.3.2
A teoria clássica da periodização
A teoria clássica da periodização (1)
• Na teoria clássica da periodização, Matveev apoia-se na ideia de que a forma desportiva: (1) É adquirida por
fases; (2) Pode ser mantida apenas durante um certo período de tempo; e (3) Deve ser perdida temporariamente.
• Como se torna necessário que a forma não seja atingida num momento qualquer da época, mas num momento
pré-determinado (durante as competições principais), o processo de treino deve ser dirigido de modo a que ela
venha a acontecer no momento planeado.
• Daqui decorre, como já vimos, a organização de um ciclo de treino com 3 períodos: o Período Preparatório, o
Período de Competições, e o Período de Transição.
Figura: Variante típica da dinâmica do volume e da intensidade das cargas no ciclo
anual de treino (Matveyev, 1977, 76)
I e Ia: grandes ondas; II e IIa: ondas médias; III (colunas) : microciclos.
A teoria clássica da periodização (3)
• Com efeito, Matveev entende que cada fase da preparação deve ser consagrada a conteúdos e a
uma estrutura do treino bem determinados e que as exigências da carga e a escolha de conteúdos
em cada uma dessas fases formam uma relação indissociável (Fig. 10).
Figura 10: Em cima: tendências da
dinâmica da carga (volume e
intensidade) num macrociclo de treino.
Em baixo: conteúdos de treino na
preparação geral (a seco) e específica
(na piscina) (Lewin 1974, 150. In:
Martin et al., 1997, 249).
A teoria clássica da periodização (5)
• Na fig. 10, a intensidade da carga aumenta linearmente até ao início do PC e atinge o seu máximo neste período. O
volume, por sua vez, aumenta de forma rápida até ao meio do PP, mas com o aumento da intensidade diminui de
novo.
• A intensidade é o primeiro factor de controlo a influir sobre o momento da “forma”. Se a intensidade atinge o seu
máximo depressa, é de esperar que também o rendimento seja conseguido depressa e que não possa permanecer
estável durante muito tempo. Por outro lado, no final do PP e no início do PC só é possível treinar com intensidade
elevada se anteriormente tiver sido feito um grande volume de treino (Martin et al., 1997).
• O segundo factor de direção e controlo é a escolha dos conteúdos, que devem vir inseridos no processo de treino em
cada momento segundo uma sequência lógica, pois tanto a composição e estruturação dos conteúdos, quanto a
natureza dos objectivos são diferenciadas em cada período de treino (Martin et al., 1997).
Figura: Unidade (relação orgânica) da FE e da FG na preparação dos desportistas.
Proporção entre os meios de preparação geral e os meios de preparação especial ao
longo do ciclo anual de treino (Matveyev, 1977, 66).
Branco: PG; Tracejado: PE; Colunas: desvios possíveis nessas percentagens em função
da natureza dos desportos.
A teoria clássica da periodização (7)
• Durante o PP (ou de preparação fundamental), o objectivo é criar os pressupostos condicionais e técnico-tácticos para o
desenvolvimento de cargas de treino e de prestações desportivas elevadas no PC. Habitualmente vem dividido em duas
etapas: EPG e EPE.
• Durante o PC (ou de competições principais), o objectivo é atingir níveis de rendimento elevados, através do recurso a
exercícios específicos e de competição com cargas de elevada intensidade.
• O PT é uma fase de recuperação ativa, cujo objectivo é promover uma diminuição temporária do rendimento e favorecer
a recuperação das capacidades dos atletas, diminuídas pelas cargas acumuladas ao longo da época. Em média dura 2
a 4 semanas e é caracterizado por: diminuição da carga, não realização de competições, conservação relativa do estado
de treino com formas não específicas de treino, utilização sistemática de medidas de apoio ao treino (Martin et al., 1997).
A teoria clássica da periodização (8)
• Em resultado das críticas, têm surgido novas experiências cujas conclusões apoiam os esforços de
reformulação ou aperfeiçoamento das teorias de Matveev.
• Estes novos modelos, dentro dos contextos e especificidades que consideraram, apresentaram
resultados positivos e, em alguns casos, até superiores aos da periodização tradicional (Silva, 1995).
• No entanto, carecem de maior diversificação em termos experimentais, antes da sua aplicação a outras
realidades poder ser generalizada.
3.3.3
Os novos modelos de periodização
Os novos modelos de periodização (1)
• Por modelo deve entender-se uma construção teórica que incorpora as características
principais do domínio em estudo, no sentido de melhor o compreender.
•Desta forma, constitui o primeiro modelo a estabelecer um certo afastamento em relação às teorias de Matveev
(Silva, 1995, 99).
Os novos modelos de periodização (5)
•Utilizada em desportos que requerem a força rápida (saltos e lançamentos no atletismo) e em desportos dependentes de
condições climáticas durante os ciclos anuais, como o remo (Grosser et al., 1989).
•Propõe a organização do treino em etapas de concentração de cargas unilaterais, formando verdadeiros blocos de treino
específico de condição física e técnica, planeados separadamente e várias vezes durante o ano.
•Como refere Tschiene (1985. In Silva, 1995): “O núcleo característico da subdivisão em períodos é a constituição do
bloco, no qual há uma concentração de cada factor condicional e técnico-táctico que determina a prestação em cada
desporto”.
Os novos modelos de periodização (6)
•PC
•Desenvolvimento simultâneo de capacidades motoras e técnica.
•Média (baixa) concentração de cargas de treino
•Foco: períodos de treino
•Background – efeito acumulado das cargas de treino
•PeB
•Desenvolvimento consecutivo de capacidades motoras e técnica
•Elevada concentração de cargas de treino
•Foco: blocos - mesociclos
•Background - efeitos acumulado e residual das cargas de treino
(Issurin, 2010)
Os novos modelos de periodização (9)
• A figura 14 mostra um modelo com dois blocos de força que devem promover um
efeito de treino retardado a longo prazo, ao qual se chega através de uma dupla
periodização.
• No segundo bloco de força o volume da carga é menor e realizado num período
mais breve.
• Por isso, a intensidade global de carga no II PP tem um nível mais elevado.
Figura 14: Modelo de
dupla periodização nos
desportos de força
rápida. Parte superior:
dinâmica do
desenvolvimento das
prestações de Força
Máxima (FM), de Força
Explosiva (FEs) e da
Força Inicial (Fi). Parte
inferior: volume das
cargas de treino de
Técnica (T), de
Velocidade (LR) e da
Condição Geral (PSC)
com dois blocos de força
(a tracejado). I – 1º PP; II
– 1º PC; III – 2º PP; IV –
2º PC (Verchoshanski
1988, 149. In: Martin et
al. 1997, 252).
Fi: Capacidade do sistema neuromuscular acelerar o mais rapidamente possível desde o zero. Componente
da Força Rápida essencial em gestos desportivos nos quais é requerida uma grande velocidade inicial.
Os novos modelos de periodização (11)
O treino do atleta é uma unidade que não pode ser partilhada e cada atleta um
processo singular (individual) de adaptação. A estruturação do treino está, por
isso, fundamentada em alguns princípios básicos (Silva, 1995):