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DESENVOLVIMENTO PESSOAL
A frase é da obra “Os trabalhos e os dias”, do poeta grego Hesíodo, que viveu e
escreveu no século 8 a.C. No texto em questão, ele aconselha o seu irmão
Perses, com quem tem desavenças, sobre a questão do trabalho – alertando-o
para nunca deixar as tarefas importantes para depois.
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“Não adies para amanhã nem depois de amanhã, pois não enche o celeiro o
homem negligente, nem aquele que adia: a atenção faz o trabalho prosperar”,
continua o poeta.
Pior. Tecnologias que facilitam a vida sempre trouxeram como efeito colateral
um convite ao adiamento sem fim. Em 1920, por exemplo, a escritora inglesa
Virginia Woolf reclamou sobre estar perdendo tempo demais com as novidades
de sua época em vez de se concentrar naquilo que realmente importava.
“Planejei uma manhã de escrita tão boa, e gastei a nata do meu cérebro no
telefone”, escreveu em seu diário.
Tudo bem, Mrs. Woolf. Até este texto foi finalizado poucas horas antes do
prazo derradeiro – em parte por conta da procrastinação deste que vos escreve.
As raízes da procrastinação
Na dúvida, culpe Darwin. Humanos não são muito afeitos a tarefas cuja
recompensa só vem em longo prazo. “Nosso cérebro é bom em escolher o que
nos traz benefício no aqui e agora”, explica Claudia Feitosa-Santana,
neurocientista pela Universidade de São Paulo (USP) e autora do livro Eu
controlo como eu me sinto (2021). “Tudo que é visto como algo que está lá no
futuro, o cérebro é bom em literalmente não escolher.”
Curtir memes no TikTok, jogar um game ou ver aquele episódio a mais de uma
série na Netflix à 1h da manhã trazem doses de prazer e felicidade
instantaneamente. Adiantar o relatório, estudar para a prova ou organizar o
guarda-roupas são tarefas que, além de desagradáveis, seguem uma lógica de
longo prazo – e podem (quase) sempre ser deixadas para depois. O lado
primitivo do seu cérebro sempre vai preferir gastar energia e atenção com algo
que traga resultado imediato.
Os primatas do gênero Homo, que deram origem à nossa espécie, evoluíram por
dois milhões de anos em ambiente selvagem. Nossa massa cinzenta foi forjada
ali, não no relativo conforto da civilização. E segue programada para viver sob
aquelas condições. Gastar energia com tarefas que só trarão algum benefício lá
na frente simplesmente não é a melhor opção para um cérebro que está a todo
momento tentando achar comida e fugir de predadores. O melhor mesmo é
focar no agora.
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Mas claro que nosso cérebro também tem um lado 100% racional – é o córtex
pré-frontal, a parte que, como o nome diz, fica bem na frente da nossa cabeça.
Ele é responsável por aquilo que nos diferencia dos animais – o pensamento a
longo prazo, o planejamento. O córtex pré-frontal sabe que estudar
matemática, ler um pouquinho por dia e adiantar o trabalho para não deixar
acumular em cima do prazo são decisões importantes.
Mas, para ser justo, apontar o dedo para Darwin não é lá a melhor desculpa. É
que as origens biológicas são apenas uma parte da causa – e nem são as mais
relevantes.
(Arte/VOCÊ S/A)
A mente procrastinadora
O vício de adiar até o último momento não afeta todo mundo de maneira igual.
“Embora todo mundo procrastine, nem todo mundo é um procrastinador”, diz
Joseph Ferrari, professor de psicologia da Universidade DePaul, em Chicago
(EUA), e autor de Still Procrastinating (“Ainda Procrastinando”, sem tradução
para o português). Ferrari foi um dos pioneiros no estudo científico da
procrastinação, ainda na década de 1990.
Ao longo dos anos, o professor Ferrari reuniu dados de que a existência desse
comportamento procrastinador é mais ou menos parecida entre diferentes
grupos, independentemente de fatores como gênero, raça, idade ou
nacionalidade – o que reforça o caráter universal do problema.
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É comum, por exemplo, que procrastinadores crônicos adiem tarefas por medo
de enfrentar os desafios, de se colocar à prova e de ser julgado. Há uma
correlação entre se cobrar mais e ser perfeccionista com uma maior tendência a
procrastinar – justamente porque estas pessoas têm um receio patológico de se
mostrar frágeis ou incompetentes perante os outros.
Por conta disso, até tarefas rápidas podem ser um convite à procrastinação.
Mandar uma mensagem sensível para um amigo, por exemplo, ou mesmo um e-
mail simples, só que escrito em inglês, acabam virando monstros que parecem
consumir mais esforço e tempo na nossa cabeça do que realmente o fazem na
prática.
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Mais: o medo de enfrentar as tarefas pode virar uma bola de neve com o
tempo. Um estudo acompanhou estudantes universitários que tinham de se
preparar para uma prova. Os pesquisadores pediram para que eles
classificassem quão estressante a missão parecia. No começo, quando ainda
faltava muito tempo, não houve esse tipo de queixa. À medida que os
estudantes procrastinavam, porém, o grau de dificuldade da tarefa ia
aumentando na percepção deles, até atingir seu nível máximo quando o dia da
prova estava prestes a chegar.
Quando finalmente se sentavam para estudar, porém, percebiam que não era
algo tão difícil assim. A procrastinação, por si só, criou uma imagem que
incentivava ainda mais o adiamento das obrigações.
Nesta bola de neve também entram outras atividades que parecem inofensivas
– aquelas coisas que você consegue concluir em cinco minutos ou menos, como
pagar uma conta ou lavar a louça do café da manhã.
Parece paradoxal, já que, como vimos, tendemos a adiar aquilo que é difícil e
demorado, mas nesses casos a procrastinação acontece exatamente porque
tendemos a julgar que, como são tarefas rápidas, podem ser feitas de última
hora. É uma meia verdade – quando acumuladas, acabam atrapalhando a rotina
como um todo, inclusive a conclusão de outras obrigações mais complexas.
1. Prazos incertos
Se o prazo é aberto demais, ou se atrasos são tolerados como algo
normal, a procrastinação se instala naturalmente. O ideal é ter um
planejamento claro – quando começar, quando desenvolver, quando
pausar e, finalmente, quando entregar.
2. Medo de errar
Tarefas que são entendidas como difíceis ou desafiadoras são mais
procrastináveis porque criam sensação de insegurança, medo do
julgamento e aversão ao risco. Em casos de procrastinadores crônicos,
trabalhar o gerenciamento das emoções é essencial.
3. Autoengano
A ideia de que procrastinar é ok porque a pressão do prazo faz o
indivíduo “funcionar melhor” não passa de mito. Estudos mostram que a
procrastinação gera não só mais estresse, como também trabalhos mal
feitos. O primeiro passo é reconhecer o problema.
4. Falta de incentivos
Punir atrasos é uma atitude menos efetiva do que recompensar
adiantamentos. Mesmo assim, a sociedade trabalha na lógica da
penalização.Líderes que querem combater a procrastinação na equipe
devem inverter esse raciocínio.
5. Falta de organização
Para 80% da população (a fatia que não é procrastinadora crônica),
grande parte do problema vem de uma gestão do tempo ineficaz. O
primeiro passo é mapear como você gasta seu tempo por alguns dias, e
então refletir quais pontos podem melhorar.
Procrastinadores crônicos são ótimos em arranjar desculpas – sabem que procrastinam, mas tentam minimizar
o impacto do problema ou terceirizar a culpa. (Mari Andrello/VOCÊ S/A)
1. Divida tarefas
Missões grandes, difíceis e complexas incentivam a procrastinação
eterna. Um jeito bastante eficaz é quebrá-las em tarefas menores e mais
rápidas, de forma a cumprir uma de cada vez, inclusive com pausas no
meio para descanso e lazer.
3. Recompense-se
Se o gestor não seguir a lógica dos incentivos, faça você mesmo. Premie–
se quando avançar na empreitada – podem ser pausas para descanso,
comida, momentos de lazer. Isso dá um gás para enfrentar as próximas
etapas.
4. Planeje
Parte da procrastinação também vem da ansiedade de sentar e enfrentar
uma tarefa que parece difícil ou desafiadora. Antes de encará-la, então,
planeje como será o processo, quais passos você tomará, quanto tempo
vai gastar e a quem poderá pedir ajuda.
Vencendo a procrastinação
Agora que já visitamos as causas da procrastinação, fica mais fácil explorar
estratégias para vencê-la. Infelizmente, não existe receita de bolo.
Para os 80% dos procrastinadores não-crônicos, técnicas de gerenciamento de tempo e organização são
eficazes em minimizar o problema. Para os 20% restantes, é preciso ir a fundo nas causas. (Mari Andrello/VOCÊ
S/A)
Uma das estratégias mais indicadas é tentar vencer a ideia de que as tarefas são
difíceis ou desafiadoras demais. Lembra daquele conceito de que, quanto mais
procrastinamos, mais a bola de neve aumenta e parece ameaçadora? Para evitar
isso, quebre as obrigações em missões menores, e vá cumprindo-as uma a uma
ao longo de todo o prazo. Ao vencer as primeiras etapas, as restantes vão se
tornando menos e menos amedrontadoras – afinal, você percebe que consegue
cumpri-las mais rápido do que pensava.
Nessa mesma lógica, é preciso elencar o que fazer primeiro. Há quem prefira
começar com as atividades mais leves e fáceis e ir aumentando de dificuldade. É
uma estratégia legítima, mas, em caso de dúvida se funciona para você ou não,
prefira o contrário. Gastar tempo com atividades fáceis e deixar o grosso para o
final do prazo é justamente uma estratégia de procrastinação. E fazer o mais
difícil primeiro serve de incentivo para matar o resto – na lógica do “o pior já
passou”.
Também dá para aplicar a estratégia das recompensas aqui. Para cada “etapa”
da empreitada cumprida com antecedência, se dê algum benefício – uma pausa
maior, um episódio da série, uma partida de seu game favorito etc. Se você
estiver numa posição de liderança, considere o mesmo para toda a equipe.
Tente ser honesto e descobrir se realmente vale a pena adiar aquela tarefa –
porque já cumpriu outras no dia, por exemplo – ou se está arranjando desculpas
para procrastinar. Se quer engatar uma mudança de rotina nesse sentido,
separe alguns dias para mapear como você realmente gasta o seu tempo.
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Por fim, uma boa notícia: procrastinadores crônicos, por mais que saibam do
problema, dificilmente se esforçam para tentar resolvê-lo. Se você chegou até o
fim deste texto, é porque provavelmente está engajado em combater esse
vício. Agora resta ir à ação. Não deixe para depois.
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