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John Williams sua obra

– Segue postagem especial sobre o compositor JOHN WILLIAMS que fará 92 anos neste
08/02/2024. Ele também foi indicado para o Oscar deste ano por Indiana Jones V, além
de ter sido homenageado pela SONY CORPORATION que renomeou com o seu nome o
edifício de música no complexo MGM.

– O INÍCIO DA LENDA

A história humana constrói muitas lendas no decorrer do tempo, algumas positivas e


inspiradoras, outras nem tanto, e não seria diferente no mundo das artes, com Hollywood
certamente sempre mostrando os dois lados da moeda, mas sempre é melhor abordar o
lado artístico e positivo. No que se refere ao mundo da música, uma lenda viva ainda
está presente atualmente, forjando seu caminho desde os tempos da Golden Age, da
Hollywood clássica.

O compositor John Williams, comemorando 92 anos agora neste 08 de fevereiro – e ainda


ativo no meio hollywoodiano – tornou-se uma destas lendas, sendo sinônimo de
Hollywood, da boa Hollywood, conhecido mundialmente como o grande compositor de
trilhas sonoras, com 54 indicações da Academia – a deste ano com “Indiana Jones e o
Chamado do Destino” – onde nenhuma outra personalidade o supera, exceto Walt Disney,
com 59 indicações. Recentemente Williams foi homenageado, em 18 de Janeiro, pela
Sony Corporation, que lhe deu o nome do prédio musical localizado no histórico Culver
City Lot, antiga casa dos MGM Studios. O recém-nomeado “John Williams Music Building”
homenageia o compositor vencedor dos prêmios Academy, Emmy e Grammy por suas
contribuições ao mundo do cinema e da música, em uma carreira prolífica que já dura
mais de seis décadas.

Mas uma lenda não se forma de uma hora para outra, um longo caminho foi percorrido
pelo compositor. Nascido John Towner Williams, filho de um percussionista de jazz em
Nova York – também chamado Johnny Williams – estudou na renomada Juilliard School e
foi para a Califórnia fazer história. Mas sua história em Hollywood não começou com o
thriller “Tubarão” de Steven Spielberg em 1975, ou mesmo com seus primeiros anos
musicando séries de TV como “Perdidos no Espaço”. Tudo começou há sete décadas, a
cerca de dez quilômetros de distância do Hollywood Bowl, pela 101 Freeway, quando
Williams ainda era um adolescente de cabelos cacheados na North Hollywood High School
e tinha, de acordo com um artigo da revista Time de 1949, “a banda mais quente de
Hollywood”. Eles tocavam apenas três noites por semana, relatava o artigo – “os
trabalhos escolares os impediam de fazer mais… O sinal mais seguro de que eles estavam
realmente chegando era a maneira silenciosa como os fãs ouviam quando os meninos se
sentavam com ‘os chefes do jazz’, como o baterista Zutty Singleton, no Club 47; um
bistrô em Ventura Boulevard onde os melhores músicos de rádio e cinema de Hollywood
vão depois do trabalho para tocar”.

Williams chegou a Los Angeles em 1948. Seu pai era baterista de jazz no Raymond Scott
Quintette – mais conhecido por seu hit “Powerhouse”, um clássico dos desenhos animados
do Looney Tunes – e tocava em bandas locais, em programas de rádio em Nova York.
Quando um programa, “Your Hit Parade” da Lucky Strike – famosa marca de cigarros
americana – foi transferido para a televisão, Johnny Williams Senior então se juntou à
orquestra da Columbia Pictures, onde tocou em dezenas de trilhas sonoras de filmes e
TV. Johnny Junior tinha apenas 16 anos, mas já era um talentoso pianista de jazz.

“Eles tinham o que chamavam de ‘banda de kicks’ na Columbia Pictures, onde os caras se
reuniam e tocavam as paradas uns dos outros”, conta o irmão mais novo de Williams,
Jerry Williams, 86 anos. “Papai trazia John junto e todo mundo dizia: ‘Ei, espere um
minuto – quem é o novo pianista?’ Então ele foi apresentado e reconhecido muito cedo,
porque ele era, e é, um grande pianista.”

Williams, que começou a ter aulas aos 7 anos, dormia perto de seu piano na garagem da
casa de seus pais na Vantage Avenue, em North Hollywood, e praticava religiosamente –
uma disciplina que ainda mantém aos 91 anos.

“Ele ficava ao piano o dia todo”, disse o outro irmão do compositor, Don Williams.
“Minha mãe me mandava lá: ‘Diga ao John que o jantar está pronto’. ‘Ei, John, o jantar
está pronto!’ ‘OK, estarei aí em um minuto.’ Quinze minutos depois, minha mãe me
mandava de volta para lá. Ele simplesmente adorava trabalhar. Ele sempre foi assim. Não
pode ficar longe do piano – não quer ficar longe do piano. Por que ele deveria?”.

Estudou com vários professores, sendo os mais influentes Robert Van Eps na UCLA, que
compôs concertos para piano antes de se tornar compositor e arranjador da MGM, e Mario
Castelnuovo-Tedesco, o grande professor de diversos compositores emergentes nos anos
1960. Williams também estava arranjando números de jazz para seu quinteto do ensino
médio,”The Melodaires”, que incluía os filhos de outros famosos hepcats de Hollywood –
incluindo Don Ingle, Gene Estes e Perry Botkin Jr., que seguiram carreiras na música.
“Tudo muito difícil no início”, disse Williams, de 16 anos, à Time, “todos lutando por seu
próprio espaço”. Mas eles eram bons o suficiente para deixar os bailes das irmandades
para trás e tocar em clubes legítimos, e não demorou muito para que Williams tocasse
solo no Cocoanut Grove.

A casa dos Williams era uma ‘jam session’ constante. Todos os amigos de Johnny Senior
eram músicos, pessoas como o compositor de filmes George Duning (“From Here to
Eternity”), Perry Botkin Senior (guitarrista de Bing Crosby) e o pianista Claude Thornhill,
e eles apareciam para conversar e fazer música, com Johnny Jr. frequentemente
dedilhando os marfins do piano.

Para o adolescente Johnny, a música era tudo. Alguma outra coisa importava para ele?
“Mas claro, garotas!”, disse Botkin, que era amigo de sua colega de classe Barbara Ruick,
a atriz de “Carrossel”, filha dos atores Mel Ruick e Lurene Tuttle, e que viria a se casar
com Williams em 1956 (e que relataremos adiante). “No que diz respeito a ir à praia,
jogar boliche ou algo assim… não”, disse Jerry Williams. “Sua recreação, sua diversão e
tudo mais sempre foi música. Se ele fosse sair – e nós saíamos – iríamos ouvir um grupo.
Ele me levava para ouvir Oscar Peterson no Sardi’s ou algo assim. Essa era a noite dele”.

E, prenunciando seu futuro, Johnny Jr. frequentava os estúdios de gravação, onde seu pai
tocava em sessões para compositores como Bernard Herrmann – “Bernard adorava a
maneira como papai tocava tímpanos”, disse Don Williams.

John Jr. foi para a UCLA depois de se formar em 1950, mas logo foi convocado para a
Força Aérea. Ele regeu e fez arranjos para bandas militares e, enquanto estava em
Newfoundland, aos 22 anos, fez a trilha sonora de um curta-metragem de viagem (“You
Are Welcome”) – e o caminho da trilha sonora estava pronto.

Fora do serviço militar, depois de estudar na Juilliard, ele voltou para Hollywood e
gravou alguns álbuns de jazz (“World on a String”, “The John Towner Touch”), atuou
como arranjador e líder de banda em uma série de álbuns populares com o cantor Frankie
Laine, e ao piano para o álbum “Calypso”, de Harry Belafonte.

Ele rapidamente se tornou um pianista de estúdio, atuando em partituras de


compositores como Jerry Goldsmith, em “Pânico que Emudece” (City of Fear – 1959) e
“Uma Vida em Pecado” (Studs Lonigan – 1960); Henry Mancini, para quem tocou o riff de
abertura de “Peter Gunn” (1958), nos filmes “Days of Wine and Roses” (1962) e
“Charade” (1963); e para Leonard Bernstein em “West Side Story”. Como orquestrador
trabalhou com os compositores Franz Waxman, Bernard Herrmann e Alfred Newman. Foi
apenas uma questão de tempo até que ele começasse a compor seus próprios shows,
principalmente na TV – Williams começou a compor trilhas sonoras para programas de
séries de televisão no final dos anos 1950. A primeira grande composição cinematográfica
de Williams foi para o filme B “Daddy-O” em 1958, seguido de “Because They’re Young”,
em 1960.

Os irmãos de Williams tornaram-se percussionistas como o pai – e como o pai, nenhum


deles compõe. “Eu tentei, e tudo soou como um exercício de harmonia”, disse Jerry
Williams, e todos os três tocaram as partituras de Williams enquanto sua estrela ascendia
rapidamente. Williams pode ter se tornado um compositor mundialmente famoso e
premiado com o Oscar, para não mencionar um elogiado compositor e maestro de
concertos, mas para seus amigos mais antigos e familiares, continua sendo o Curley,
como o apelidaram por causa de seu cabelo ruivo encaracolado. E ele nunca mais parou
de tocar. “Eu sei o que John está fazendo agora”, disse Don Williams, olhando para o
relógio. “São cerca de 9h30, 10 horas – ele provavelmente está sentado ao piano,
trabalhando em alguma coisa. Ele simplesmente não quer parar. Ele está se divertindo
tanto, por que deveria? Acho que talvez seja esse o seu forte, o fato de não querer parar
de aprender.”

– OS ANOS 1970: TRAGÉDIA E SUCESSO

O ano de 1956 foi muito importante profissionalmente para John Williams, pois além de
marcar o início de sua história em Hollywood, com um contrato de emprego assinado com
o diretor musical da MGM, Morris Stoloff – Williams então com 24 anos – também casou-se
com a atriz Barbara Ruick, sua conhecida dos tempos da High School, embora ela fosse
dois anos mais velha que ele e já viesse de dois casamentos fracassados. Ruick foi casada
com seu primeiro marido, Frank Howren, em 1949, no entanto, o casamento terminou no
mesmo ano. Em 1953 se casou novamente com o ator Robert Horton Jr. em Las Vegas,
mas o casamento não saiu como planejado, terminando em 1956, devido a maus tratos
alegados pela atriz.

Homem de família, Williams permaneceu com Barbara durante 18 anos, abençoado com
três filhos – Joseph Williams (vocalista do grupo pop Toto, dos anos 80), Mark Towner
Williams e Jennifer Williams – enquanto John trabalhava como pianista para a orquestra
do estúdio Fox e começando a compor em projetos menores.

Barbara Ruick nasceu em 23 de dezembro de 1930, em Pasadena, Califórnia. Ela era filha
dos atores Lurene Tuttle e Melville Ruick, e com ambos os pais já na indústria de
atuação, Bárbara cresceu representando cenas com bonecas, empregando a mãe como
plateia e professora. Tornou-se atriz, cantora e dançarina, e dentre todos os seus
trabalhos, Ruick é mais notável por “Confidentially Connie” (1953), “The Affairs of Dobie
Gillis” (1953), “Carrousel” (1956) e “Rodgers and Hammerstein’s Cinderella” (TV remake
de 1965). Mas dedicou-se nos anos 1960 a cuidar da casa e da criação dos filhos.

Com os filhos já mais crescidos, Barbara voltaria a atuar em 1973, quando voou para
Reno, Nevada, para aparecer em um filme chamado “Jogando Com a Sorte” (California
Split – 1974), dirigido por Robert Altman. Williams teria planejado compor a trilha sonora
de “California Split”, porém essas funções foram assumidas pela cantora Phyllis Shotwell.
Mas então a morte colocou sua mão gelada sobre a esposa do lendário compositor e pôs
fim à sua história de amor. Em 3 de março de 1974, Barbara desmaiou em seu quarto de
hotel devido a uma aparente hemorragia cerebral, e foi declarada morta aos 43 anos.
Williams recorreu à música para lidar com a perda: “Foi uma grande virada emocional em
minha vida”, disse ele, “que ainda ressoa em mim. E me ensinou quem eu era, o que
estava fazendo e o que isso significava”. Também impactou sua abordagem musical:
“Antes daquele momento da minha vida, eu não sabia o que estava fazendo”, disse
Williams, “Mas depois disso – na minha escrita e no que eu estava fazendo – ficou claro o
que eu estava tentando fazer e como poderia fazê-lo”. Na verdade, foi esta tragédia
intensa e pessoal que precedeu os primeiros grandes sucessos de Williams, quando foi
abordado por Steven Spielberg para compor a música de seu longa de estreia na direção,
“The Sugarland Express” (1974). O jovem diretor ficou impressionado com a trilha sonora
de Williams para o filme “The Reivers” (1969), e estava convencido de que o compositor
poderia fornecer o som que desejava para seus filmes. A seguir. com “Jaws” (1975),
Williams ganhou seu primeiro Oscar de trilha sonora original e o segundo por “Star Wars”
(1977). “Isso é uma coisa profundamente emocional. E, de certa forma, foi o maior
presente que já me foi dado – se posso dizer dessa forma – por qualquer pessoa”, disse
ele. “Eu soube imediatamente aonde ir com isso emocionalmente.” Williams dedicou seu
Primeiro Concerto para Violino à memória da esposa falecida, adotando um guarda roupa
predominantemente em preto até os dias de hoje.

Somente em 1980, vários anos após o falecimento de Ruick, John Williams encontrou o
amor novamente, tendo casado com Samantha Winslow, uma atriz pouco conhecida, que
atuou brevemente em “Medical Center” – o show durou de 1970 a 1971 – onde
interpretou a enfermeira Becker em episódios do drama médico, mas ela deixou depois a
atuação, seguindo posteriormente como fotógrafa. O casal vive tranqüilamente e é visto
sempre em eventos e concertos.

Após todos estes acontecimentos das duas primeiras décadas de carreira musical, muitos
outros ocorreram na vida de Williams, como por exemplo sua nomeação ao concorrido
cargo de diretor musical da histórica e aclamada Boston Pops Orchestra em 1980 – cargo
vago com o falecimento do lendário maestro Arthur Fiedler – onde mais uma vez a trilha
sonora de “The Reivers” intercedeu em seu favor, pois foi a peça principal enviada para a
apreciação dos mantenedores da The Boston Symphony – onde a Pops é o braço popular
da sinfônica. As patituras de uma Suite para Narrador e Orquestra, baseada nos temas
principais do filme – e que Williams gravou com o veterano ator Burguess Meredith, aos
72 anos como narrador, juntamente com a Pops, o detalhe é que o próprio ator foi o
narrador original no filme de 1969 – foram enviadas aos avaliadores, que adoraram o
trabalho e isto garantiu sua indicação ao cargo, como o décimo nono maestro a ocupa-lo
e onde permaneceu ativo até 1993. Depois disso e até os dias atuais, Williams detém o
título de ‘George e Roberta Berry Boston Pops Conductor Laureate’, o que significa que
ele pode reger como maestro de honra em eventos especiais, se assim ele desejar.

Nas décadas seguintes o grande público se tornou mais conhecedor do grande compositor,
tendo familiaridade com as trilhas sonoras de grandes sucessos do cinema, não só na já
lendária parceria com Steven Spielberg mas também com outros grandes diretores de
renome e projetos, além de sua maior participação em grandes concertos pelo mundo,
com obras também fora do espectro cinematográfico.

A grande pergunta dos fans e apreciadores do lendário artista é: após décadas e décadas
de carreira, e ainda trabalhando, até onde irá John Williams? Aparentemente gozando de
excelente saúde, fica dificil uma resposta segura, uma vez que a idade de um ser humano
vai se tornando traiçoeira à medida que o tempo mais e mais vai avançando. Será que
teremos o prazer de comemorar o centenário do compositor, festejando com ele entre
nós? Aguardemos com esperança e carinho que este previlégio nos seja concedido, para
todos que apreciam a boa música e o que sobrou da boa Hollywood.

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