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Ciência Política
e Teoria Geral do
Estado
UnisulVirtual
Palhoça, 2014
1
Créditos
2
Luiz Henrique Queriquelli
Ciência Política
e Teoria Geral do
Estado
Livro didático
Designer instrucional
Marcelo Tavares de Souza Campos
UnisulVirtual
Palhoça, 2014
3
Copyright © Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por
UnisulVirtual 2014 qualquer meio sem a prévia autorização desta instituição.
Livro Didático
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Q53 Queriquelli, Luiz Henrique
Ciência política e teoria geral do estado : livro didático / Luiz
Henrique Queriquelli ; design instrucional Marcelo Tavares de Souza
Campos. – Palhoça : UnisulVirtual, 2014.
149 p. : il. ; 28 cm.
Inclui bibliografia.
ISBN 978-85-7817-616-7
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Sumário
Introdução | 7
Capítulo 1
Política na Antiguidade | 9
Capítulo 2
Do absolutismo medieval ao Estado moderno:
atores e eventos cruciais | 37
Capítulo 3
A consolidação do Estado moderno | 79
Capítulo 4
Tópicos de política contemporânea | 125
Referências | 143
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Introdução
Caro estudante,
Quando alguém fala em Política, use uma linguagem comum ou uma linguagem
culta, esteja em um ambiente comum ou em uma universidade, está se referindo ao
exercício de alguma forma de poder e, naturalmente, às múltiplas consequências desse
exercício. Como diria João Ubaldo Ribeiro, importante escritor brasileiro, “a Política tem
a ver com quem manda, por que manda, como manda” (1998, p. 8). Mandar é decidir,
é conseguir consentimento, apoio ou até submissão. Porém também é persuadir e,
portanto, não se trata de um processo simples.
Apesar dos esforços dos estudiosos, que, há milhares de anos, vêm tentando
dissecar, analisar e categorizar o fenômeno político, ninguém pode alegar
compreendê-lo totalmente. Em toda sociedade, desde que o mundo é mundo,
existem estruturas de governo. Alguém, de alguma forma, sempre mandou em
outrem. Normalmente uma minoria governa a maioria, e este é um fato central.
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Capítulo 1
Política na Antiguidade
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Capítulo 1
Seção 1
O surgimento da sociedade
A população humana passa a se chamar humanidade a partir do momento em
que deixa de enfrentar apenas a sobrevivência e se depara com outro problema
crucial para sua espécie: a convivência. Desse período inicial da história dos
homens, além do desenvolvimento das mais diversas técnicas que transformaram
sua relação com a natureza, podemos destacar a atividade que os homines
sapientes, servindo-se da capacidade cognitiva que os distingue, elevaram a uma
condição de existência: a política.
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Capítulo 1
1.2 Cidade-estado
Os mesopotâmicos não se caracterizaram pela formação de uma unidade política.
Cada cidade controlava seu próprio território e sua própria rede de irrigação;
tinha governo e burocracia próprios e era independente em relação às outras.
Segundo Pierre Lévêque (1990, p. 15), “o Estado mesopotâmico é, antes de tudo,
uma cidade, à qual o príncipe está ligado por estreitos laços; é igualmente uma
dinastia, o que dá legitimidade ao seu poder.”
Por estes motivos, isto é, por concentrar todas as dimensões da vida política
de um povo no território de uma única cidade, tais cidades são chamadas de
cidades-estado.
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Capítulo 1
Seção 2
Egito Antigo: o desenvolvimento do estado teológico
Não muito longe da Mesopotâmia, a oeste do Mar Vermelho, outro povo também
soube aproveitar a dádiva trazida por um rio em meio ao deserto: os egípcios. O
Rio Nilo, que nasce de uma confluência de rios africanos e corta o nordeste do
Saara até desembocar no Mar Mediterrâneo, esteve para o Egito Antigo, assim
como o Tigre e o Eufrates estiveram para a Mesopotâmia: nem uma e nem outra
civilização teria existido sem suas águas.
Por esta razão, a região que compreende os territórios dessas duas antigas
civilizações ficou conhecida como Crescente Fértil. O nome foi dado no final do
séc. XIX, pelo arqueólogo James Henry Breasted (1865-1935), que enxergou no
contorno da região o desenho de uma lua crescente – um símbolo apropriado
para a fertilidade.
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Capítulo 1
Época Baixa: XXVI, XXVII, XXVIII, XXIX, XXX e XXXI. 664-332 a.C.
A primeira delas iniciou-se há cerca de cinco mil anos, quando uma cadeia de
cidades-estado situadas à beira do Nilo ganhou um governo central. O faraó –
como se chamava o rei egípcio – detinha, então, o controle completo das terras e
de seus recursos. Ele era o supremo comandante militar e também a cabeça do
governo. No entanto, não era exatamente um déspota, pois dividia sua autoridade
com uma burocracia de oficiais.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Figura 1.4 - Deus Rá, portando símbolos de poder, recebe as oferendas de um humano (peça do séc. X a.C.)
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Capítulo 1
Os grãos poderiam ser comercializados por outros bens, de acordo com a lista de
preços fixada. Durante o século V a.C., o dinheiro em forma de moeda foi
introduzido no Egito, vindo de fora. No princípio, as moedas foram usadas mais
como peças de metal precioso padronizadas do que, de fato, como dinheiro; nos
séculos seguintes, mercadores internacionais vieram a dar confiabilidade ao
sistema monetário.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Artistas e artesãos tinham um status mais alto que os agricultores, mas também
ficavam sob o controle estatal, trabalhando em tendas vinculadas aos templos,
financiadas diretamente pelo tesouro do estado. Os escribas e os oficiais
formavam uma classe superior, que se distinguia das demais através de vestes
brancas. Esta classe demarcou sua proeminência social na arte e na literatura.
Abaixo da nobreza estavam os sacerdotes, médicos e engenheiros, cada qual
com sua especialidade. Sabe-se que a escravidão existiu no Egito Antigo, mas a
extensão e a prevalência desta prática ainda não foram plenamente esclarecidas.
Os registros dos tribunais egípcios mostram que a lei era baseada em uma
visão do bem e do mal advinda do senso comum, que enfatizava a obtenção de
acordos e a resolução de conflitos mais do que qualquer adesão estrita a uma
série de estatutos.
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Capítulo 1
O conselho local dos anciãos, conhecido no Império Novo como Kenbet, era
responsável por julgar casos que envolvessem pequenas reivindicações e
disputas menores. Casos mais sérios, que envolvessem assassinato, transações
de grandes porções de terra e roubo de tumbas, cabiam ao Grande Kenbet, que
era presidido pelo tjati ou pelo faraó.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
lo próspero por quase cinco milênios? Em nossa avaliação, pudemos ver que
o faraó e sua máquina administrativa encontraram meios de conciliar religião,
economia e justiça, atendendo aos desejos mais sensíveis de seus súditos.
Seção 3
Grécia Antiga: a descoberta do homem através
da política
É muito comum encontrarmos teóricos que atribuem aos gregos antigos a
“invenção da política”. Por tudo o que já estudamos até aqui, isto é, considerando
todas as invenções políticas realizadas por povos anteriores aos gregos, parece
impróprio confirmar esta afirmação. Em outras palavras, será mesmo possível
afirmar que os gregos inventaram a política?
Para os gregos antigos, a política era uma nova forma de pensar, de sentir e,
sobretudo, de relacionamento entre as pessoas. Como nos lembra Kenneth
Minogue (1996, p. 19), “os cidadãos eram diferentes uns dos outros em riqueza,
beleza e inteligência, mas eram iguais enquanto cidadãos, porque eram racionais
e a única relação adequada entre os seres racionais é a persuasão.”
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Capítulo 1
O uso da razão – aquela faculdade que o ser humano tem de avaliar, julgar,
ponderar ideias universais – era, portanto, uma condição primária para que
um grego tivesse uma vida política.
Platão (428-347 a.C.), em seu diálogo Críton, narra o fim daquele que se tornou o
maior exemplo de homem e cidadão para a humanidade. Segundo ele, o filósofo
Sócrates, tendo sido condenado à morte, acusado de corromper a juventude,
recusou a oferta de ajuda para fugir de Atenas, argumentando que a fuga não
seria condizente com seu empenho pela cidade, à qual havia dedicado sua vida.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Período Duração
Com relação ao território, o mapa a seguir representa a Grécia no século VIII a.C.
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Capítulo 1
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
A cidadania grega, portanto, estava restrita aos adultos livres do sexo masculino
e, em algumas cidades, nem sequer a todos estes.
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Capítulo 1
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
A história, que é feita de atos e palavras, tem nas próprias palavras o seu veículo.
Daí a importância que os gregos deram à retórica – a arte das palavras. Eles
entenderam que apenas com termos bem pensados, argumentos devidamente
construídos, voltados para o público que os julgaria, teriam sucesso nas
assembleias. Entenderam que apenas com discursos bem elaborados poderiam
fazer história. Parece natural, hoje em dia, que a política se realizasse daquela
maneira, mas, pela primeira vez na história, as decisões públicas eram tomadas à
luz do dia, sujeitas a críticas de toda a gente.
A busca da primazia nos discursos levou a uma perversão desta prática. Jovens
aristocratas ambiciosos, instruídos por professores chamados sofistas, que
haviam codificado a arte da retórica, vieram a manipular as palavras conforme os
seus interesses, desviando o sentido da política. Em sua História da Guerra do
Peloponeso, Tucídides (460-400 a.C) registrou uma série de discursos proferidos
pelos participantes daquele conflito, os quais Minogue (1996, p. 24) ironiza: “no
seu conjunto, estes discursos constituem um manual
Estultícia Estupidez.
completo da sabedoria e também da estultícia políticas.”
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Capítulo 1
Após estabelecer sua reforma, Sólon ausentou-se de Atenas por dez anos,
para que a constituição fosse posta em prática por outras pessoas. Com isso,
Sólon sugeriu que quem concebe a lei não pode pô-la em prática, pois, caso
contrário, dará margem a arbitrariedades. Esse princípio seria retomado pelos
modernos sob o título de separação dos poderes.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
3.5 A constituição
O conjunto de cargos que formavam o governo da polis e as leis que
estabeleciam suas relações representavam a constituição. A constituição,
para os gregos, tinha uma importância particular: sem ela, um governo não
teria o tipo específico de limitação moral que distingue a atividade política. Os
gregos clássicos acreditavam que um governo sem constituição não possuía
legitimidade. As constituições têm duas funções básicas:
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Capítulo 1
constituição equilibrada, que ele chamou de politeia. Para ele, todo tipo de
mudança na forma de governo, isto é, todo tipo de revolução política é motivada
por uma causa apenas: a exigência da igualdade.
Ora preocupado com a ética, ora com a política, Aristóteles fez, a si mesmo e à
humanidade como um todo, a seguinte pergunta: um bom cidadão pode ser um
bom homem? Ao responder a essa pergunta, Maquiavel faria nascer a Ciência
Política moderna. No entanto, este assunto extravasa nossas pretensões nesta
seção. Por ora, fiquemos com este breve panorama do pensamento político
desenvolvido pelos gregos antigos, certamente o primeiro povo a descobrir a
essência humana através da política.
Seção 4
Roma Antiga: a política só existe na prática
A maioria dos estudiosos atribui uma merecida importância aos gregos antigos,
porém costuma subestimar seus sucessores e conquistadores, os romanos,
tomando-os apenas como meros reprodutores dos modelos gregos. Há alguma
verdade nisso; no entanto, ao imitar seus mestres gregos, os romanos, ao menos
na prática, vieram a superá-los.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Figura 1.10 – “Eneias foge de Tróia em chamas”, quadro de Federico Barocci (1598)
Vestal Sacerdotisa
Numitor, filho do rei Procas e legítimo herdeiro do trono, é
virgem, consagrada à deposto por seu ambicioso irmão Amúlio. Este obriga a
deusa Vesta. esposa de Procas, Reia Sílvia, a tornar-se uma vestal e
fazer um voto de castidade. O deus Marte, no entanto,
seduz a legítima princesa, que engravida e dá a luz a dois gêmeos homens,
chamados Rômulo e Remo. Amúlio ordena que os gêmeos sejam mortos, mas o
escravo incumbido desiste da tarefa de matá-los e os abandona no rio Tibre.
A cesta com os bebês vai parar nas margens do rio, entre os montes Palatino e
Capitolino, onde são encontrados, adotados e amamentados por uma loba. Os
gêmeos crescem e decidem, então, fundar uma nova cidade. Mas novamente a
ambição pelo poder abala a fraternidade e faz com que eles entrem em conflito.
Rômulo prevalece e, em homenagem a seu nome, funda a cidade de Roma,
tornando-se seu primeiro rei.
Com o governo de Rômulo, Roma inicia a sua primeira fase política, o Reino, que
vai de 753 a 509 a.C. Nesse período, foram estabelecidas suas bases políticas.
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Capítulo 1
Além disso, durante o Reino, Roma também exibiu sua tendência expansionista,
que ficaria evidente durante o período republicano e, principalmente, durante
o Império. Em seus 243 anos de duração, a monarquia romana impôs o seu
domínio no Lácio, conquistando Alba Longa e estendendo seu território até a foz
do rio Tibre.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
A forte base oferecida pelo governo republicano permitiu que Roma, de uma
pequena cidade-estado, fosse transformada em um império. No século III a.C., os
exércitos romanos já haviam tomado todas as cidades etruscas, conquistando o
domínio completo da península itálica.
Entre os séculos III e II a.C., Roma iniciou sua expansão para além da península.
O primeiro passo foi conquistar os territórios dos cartagineses, que tinham sua
capital no norte da África e haviam colonizado toda a costa setentrional daquele
continente, além da Sicília, Sardenha, Córsega e Península Ibérica. Enquanto
acabavam de liquidar os púnicos, os romanos voltaram
Púnicos Como os
romanos chamavam
seus olhos para o oriente, onde o Império de Alexandre
os cartagineses. Daí Magno (356-323 a.C.) se havia diluído. Em menos de
o nome “Guerras um século, Roma dominou a maior parte do território
Púnicas”.
macedônico, além da Grécia e do Egito.
Figura 1.11 - Expansão do território romano, desde o Reino até o início do Império
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Capítulo 1
Talvez tenha sido Agostinho de Hipona (mais conhecido como Santo Agostinho),
um dos maiores pensadores cristãos, que viveu durante a fase final do Império
Romano (354-430 d.C.), o primeiro a perceber o patriotismo como a paixão
orientadora dos romanos; em parte porque viu em tal paixão uma prefiguração
do amor que animava os cristãos. No entanto, é do poeta Horácio (65-8 a.C.) o
verso que, por muito tempo, representou o mais nobre dos sentimentos políticos:
“dulce et decorum est pro patria mori” (morrer pela pátria é maravilhoso e digno).
Este sentimento perderia seu valor após a II Guerra Mundial, devido aos horrores
causados pelo patriotismo exagerado dos nazistas.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
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Capítulo 1
No século I d.C., após os tempos gloriosos de Otávio Augusto (63 a.C.-14 d.C.),
os governos que se estabeleceram, ainda que sejam inclusos no período clássico
da história romana, não fizeram por merecer. Os imperadores da Dinastia Júlio-
Claudiana, especialmente os tiranos Calígula (12-37 d.C.) e Nero (37-68 d.C.),
ao imergir Roma em um mar de vícios, fizeram de sua época um período de
decadência anunciada.
Todavia, se queremos fazer da política uma ciência, não cabe a nós julgar
os períodos críticos da história romana. Assim como fizeram aqueles que
prosperaram nas terras pantanosas do Lácio, devemos analisar friamente o que
fez a política funcionar e o que a prejudicou.
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Capítulo 2
37
Capítulo 2
Seção 1
A organização política na Europa medieval
Segundo uma convenção histórica, o Império Romano do Ocidente termina no
ano de 476 d.C., quando Odoacro, rei dos Hérulos, toma a cidade de Roma e
depõe o imperador Rômulo Augusto, tornando-se o primeiro rei bárbaro de Roma.
O povo de Odoacro e os demais povos bárbaros que derrubaram o império jamais
apagariam o legado romano, presente até os dias de hoje, porém instituiriam
alguns costumes que mudariam o mundo civilizado pelos séculos seguintes.
Figura 2.1 – “Rômulo Augusto abdica à coroa”, gravura de Charlotte Mary Yonge (1880)
A insegurança talvez tenha sido a maior das aflições sofridas pelos que viveram
nessa época. As muitas guerras travadas até que Roma fosse definitivamente
tomada acabaram por debilitar as defesas das cidades europeias. Os novos
reinos, à medida que se formavam, nasciam completamente frágeis. Isso obrigou
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Figura 2.2 - Pirâmide feudal: relações de vassalagem entre Luís VI e seus nobres e camponeses
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Capítulo 2
Todavia, por mais que, na Idade Média, tenham existido reis capazes de
concentrar um grande poder em suas mãos, nenhum de fato se igualou à
potência dos romanos. No período medieval, as cidades eram os principais alvos
de ataques, o que causou a dispersão do povo em pequenas vilas, os feudos,
dificultando a centralização do poder. Isso fez com que os camponeses – servos
e homens livres – fossem submetidos ao governo da autoridade política mais
próxima a eles: o senhor feudal.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
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Capítulo 2
Entretanto, a Igreja não cumpriu apenas a função de censura. Entre outras muitas
intervenções na vida política, ela combateu as lutas entre nobres, instituindo
a chamada “Trégua de Deus”, uma proibição de lutas durante certas épocas
do ano. Além disso, transformou a Cavalaria numa instituição em defesa da
religião, da mulher, dos fracos, dos órfãos, da lealdade até para com os inimigos,
da cortesia e da honra. De certa forma, podemos dizer que a Igreja foi assim
precursora da assistência social.
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A partir do ano 1000 até cerca de 1150 d.C, o feudalismo entra em ascensão,
definindo seus elementos básicos. Na França, nos Países Baixos e na Itália, seu
desaparecimento começa a se manifestar no final do século XIII. Na Alemanha e
na Inglaterra, entretanto, ele ainda permanece por mais tempo, extinguindo-se
totalmente na Europa ocidental por volta de 1500.
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Capítulo 2
Seção 2
Maquiavel e a percepção de um paradigma
nascente
Nesta seção, você será levado à reflexão a partir do pensamento político de
Nicolau Maquiavel (1469-1527). Como será possível perceber ao longo das
páginas que seguem, este pensador influenciou significativamente as discussões
sobre o Estado moderno, apesar de não haver formulado este conceito conforme
o entendemos hoje em dia.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Cada região da Itália, por menor que fosse, tornou-se um paese (um país)
indiferente ou hostil aos seus vizinhos. A península, que havia conhecido um dos
maiores apogeus da civilização, voltava então aos tempos pré-romanos. Como
definiu certa vez o príncipe austríaco, Klemens Wenzel von Metternich (1773-
1859), a Itália tinha deixado de ser o território onde se estabeleceu o Império
Romano para ser apenas uma “expressão geográfica”.
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Capítulo 2
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
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Capítulo 2
Figura 2.7 - Estátua de Nicolau Maquiavel, por Maquiavel – que viria a ser um dos
Lourenço Bartolini
pensadores políticos mais influentes de toda
a história, considerado fundador da Ciência
Política moderna – foi um funcionário público
de Florença, eventual conselheiro dos Médici.
Nascido no mesmo ano em que Lourenço,
o Magnífico, foi levado ao poder, Maquiavel
acompanhou de perto as ações de seu
príncipe frente ao desafio da unificação.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
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Capítulo 2
Além disso, como observa Pinzani (2009), outro aspecto incipiente em Maquiavel
do ponto de vista da Ciência Política que se constituiu posteriormente – está no
fato de que ele se esquiva de questões socioeconômicas.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
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Capítulo 2
O que interessa a este pensador, no entanto, não é o poder em si, mas “o poder
como instrumento irrenunciável para unificar uma comunidade política, para dar-
lhe ordem e segurança e para deixá-la prosperar.” (PINZANI, 2009, p. 25).
Dizer que Maquiavel separou a política e a moral significa dizer que ele passou a
avaliar um ato político não em função de seu valor moral, mas em função de seu
sucesso perante a manutenção do poder.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Um pensador preso à moralidade cristã, por exemplo, jamais diria ser bom um
príncipe que matou milhares de inocentes para preservar sua soberania, por
mais que isso fosse interessante para a Igreja. Já Maquiavel avaliaria tal príncipe
em termos de custo e benefício político: se a matança lhe foi favorável e se a
converteu em sucesso político, o príncipe seria, sim, visto como um bom príncipe.
Foi esse rigor analítico, desprovido de pudor, que rendeu ao termo “maquiavélico”
o significado pejorativo que até hoje possui.
Contudo, o alerta de Maquiavel é que o príncipe pode até ser temido por seu
povo, no lugar de ser amado, mas aconselha a cuidar para que não venha a
ser odiado e desprezado. O medo que o povo tiver de seu príncipe lhe é mais
favorável para manter o poder do que o amor, mas o ódio e desprezo apenas
prejudicam esta tarefa.
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Capítulo 2
É importante que fique claro para você o sentido da palavra fortuna, quando
empregada por Maquiavel. Fortuna para os antigos, assim como para o pensador
florentino, não tem a conotação de riqueza ou grandes somas dinheiro, como
atualmente. Este termo, antigamente, denotava o imprevisível, a boa ou a má
sorte, a ambivalência das coisas. Portanto, ao afirmar que o príncipe virtuoso deve
controlar a fortuna para imperar, ele sugere que o bom governante deve antecipar-
se às adversidades, provenham elas da natureza ou da atividade humana.
Este é mais um ponto que aproxima Maquiavel dos modernos. A modernidade,
desde o seu nascimento, caracteriza-se por uma incessante busca de controle por
parte do homem sobre a natureza, o que coincide plenamente com a relação entre
virtù e fortuna, tal como a explanamos aqui. Na figura a seguir, você pode ver a roda
da fortuna presente no Hortus Deliciarum (Jardim das Delícias), uma enciclopédia
medieval compilada durante o século XII pelo alemão Herrad de Landsberg.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Maquiavel, no entanto, ao contrário do que muitos pensam, não quer que a reforma
encerre-se na chegada do príncipe ao poder e em seu sucesso na tarefa de
Tito Lívio unificar a Itália. Ele sabe que, uma hora, o príncipe morrerá
(59 a.C.-17 d.C.) foi e que, junto dele, morrerá também a estabilidade de sua
um historiador romano, comunidade política, caso não se tomem medidas as quais
autor de História de
garantam a perenidade dela.
Roma, um conjunto
de livros que relatam a
história romana desde a
E quais seriam essas medidas? Maquiavel manifesta
sua fundação, em 753 de forma mais explícita seus ideais republicanos em
a.C., até o século I d.C. Discursos sobre a primeira década de Tito Lívio. Nessa
Maquiavel escreve os
obra, fica claro que, após conquistar um território e
Discursos, analisando
e comentando, do dar-lhe unidade, o príncipe, caso queira preservá-lo,
ponto de vista político, deve providenciar uma constituição republicana, pois
os primeiros dez anos nada garante que seus sucessores terão as mesmas
historiados por Tito Lívio.
capacidades que ele.
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Capítulo 2
Para demonstrar isso, Maquiavel recorre ao historiador grego Políbio (203 a.C.-120
a.C.), um dos primeiros a discutir o ciclo natural das formas de governo, apoiado
diretamente em fatos históricos. Segundo Políbio – e isso foi discutido por muitos
outros pensadores antigos – quando uma sociedade nasce, a primeira forma de
governo a despontar é a monarquia. Caso o monarca confira ordem à comunidade,
surgirá a consciência do que é útil e honesto e do que é pernicioso e ruim, e assim
surgirão as leis. Com o tempo, no entanto, o poder pode vir a ser transferido
hereditariamente, e os herdeiros, se não forem virtuosos como seu antecessor,
irão sucumbir aos vícios do poder e deixar com que a monarquia se degenere em
tirania. Caso isso aconteça, é provável que os nobres se revoltem e tomem o poder
do tirano, instaurando uma aristocracia. Os filhos desses nobres revolucionários,
porém, podem não ter os mesmos princípios que seus pais, e, dessa forma,
com o tempo, a aristocracia degenera-se em oligarquia. Nesse caso, uma revolta
chefiada por um só homem (Maquiavel tem certeza de que o povo não é capaz de
se organizar sem uma liderança) derruba a oligarquia e instaura uma democracia.
Porém – mais uma vez, quando nascem as próximas gerações – a democracia por
si só não se sustenta, degenerando-se em anarquia, e o ciclo recomeça.
Veja a seguir um esquema sobre o ciclo das formas de governo que representa a
ideia de República para Maquiavel:
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Monarquia
Anarquia Tirania
República
Democracia Aristocracia
Oligarquia
Os cônsules têm poder de liderança, execução, mas não podem passar por cima
da prudência do senado e do sentimento popular; os senadores têm o poder de
legislar, mas não podem fazê-lo sem considerar os anseios do povo e as políticas
consulares; o povo tem força e, de alguma forma, é ele quem inspira a justiça
numa república, mas seu ímpeto é controlado pelas leis dos senadores e pelas
rédeas dos cônsules.
•• Constituição mista
•• Império das leis
•• Boas leis
•• Bons costumes
•• Milícia popular
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Capítulo 2
Em seu entendimento, as leis são inúteis, se os cidadãos não forem bons, isto
é, se eles não tiverem bons costumes. Assim como a virtù está diretamente
associada à fortuna, as boas leis estão inseparavelmente ligadas à virtude cívica.
De nada adianta que o comandante proponha leis pretensamente boas, se o povo
não tiver condições de suportá-las, ou seja, se o povo não estiver em um estado
de espírito moralmente adequado.
Tanto em O Príncipe como nos Discursos, Maquiavel deixa claro que, caso uma
comunidade chegue à decadência moral e a república não se sustente mais,
um homem extraordinário, um príncipe de virtù, deve tomar o poder. Ao fazer-
se absoluto no governo, o príncipe de virtù deve restabelecer as leis originais
daquela comunidade em sua pureza e força, para que a república não se precipite
em uma anarquia, da qual não sairá senão com a instauração de uma monarquia,
reiniciando assim o errante – e sanguinário – ciclo das constituições, que tirou o
sono de todos os que viveram no período medieval, inclusive o de Maquiavel.
Embora nos pareça claro que Maquiavel tenha sido um republicano, parece-nos
igualmente evidente que suas constantes recomendações ao governo absoluto de
um príncipe fizeram com que a tradição o considerasse um pensador absolutista.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Seção 3
Hobbes e o medo como paixão civilizadora
Nesta seção, você entrará em contato com as reflexões sobre o Estado
desenvolvidas por Thomas Hobbes (1588-1679), um dos pensadores
contratualistas, ao lado de Locke e Rousseau. Como a alcunha sugere, o que
une esses pensadores é a ideia de que um contrato entre os indivíduos faz-se
necessário para que todos possam aderir ao Estado jurídico, deixando de lado
os inconvenientes do estado natural. No entanto, perceba que tanto a concepção
de estado natural quanto a concepção de Estado propriamente dito terão suas
particularidades nos pensadores abordados, o que também implica dizer que a
legitimação do Estado possui uma configuração própria em cada um deles.
O primeiro a assinalar esta distinção foi o francês Jean Bodin (1530-1596), mas
Thomas Hobbes, pelo contexto onde ele e suas ideias surgiram e, também,
pela universalidade de suas teses, tornou-se um autor mais proeminente dentro
da tradição do pensamento político. A propósito, o contexto em que Hobbes
59
Capítulo 2
escreveu sua obra é o contexto da Guerra Civil Inglesa (1642-1649), um dos mais
turbulentos do período moderno e também um dos mais inspiradores para a
Filosofia Política.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Figura 2.10 - “E quando você viu seu pai pela última vez?”, de William Frederick Yeames
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Capítulo 2
Assim como Maquiavel, Hobbes deseja o bem de sua nação e anseia ver o fim da
crise e, por isso, escreve sua obra a favor de um monarca, crente que somente um
homem virtuoso poderia conferir ordem a uma comunidade política. No entanto,
se Maquiavel dirige sua obra ao próprio monarca, Hobbes dirige a sua ao povo, na
intenção de convencê-lo da necessidade de submeter-se ao governo do monarca.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
são semelhantes sob certos aspectos e, sendo assim, podem ser submetidos ao
mesmo método de investigação: o método matemático e empírico defendido por
Bacon e Galilei. Não é por menos que Hobbes aplica a noção de corpo, própria das
ciências naturais, ao Estado.
Em sua perspectiva, o Estado é criado por homens, os quais estão sujeitos a impulsos
naturais, e, por isso, o próprio Estado está sujeito ao imponderável, ao imprevisível.
Eis o motivo pelo qual Hobbes recorre ao método científico, racional: para reduzir este
aspecto (o imprevisível) a um fenômeno mensurável. Esse é outro ponto de contato
evidente entre os pensamentos de Hobbes e Maquiavel: assim como o italiano,
Hobbes também entendia que a necessidade de superar o imprevisível (a Fortuna)
deve ser umas das razões do Estado.
•• Sensação
•• Imaginação
•• Entendimento
•• Linguagem
•• Razão
•• Paixões
•• Bem e mal
•• Medo e esperança
•• Conflito
•• Hedonismo humano
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Capítulo 2
Portanto, o mundo exterior é percebido por nós através das sensações. Essas
sensações, esses “movimentos” que agitam o interior de nosso corpo, são
contínuas e só cessam com a morte. No entanto Hobbes observa que, quando o
corpo não está submetido à “pressão” de objetos externos, as sensações ainda
permanecem nele, porém diminuídas. Essas sensações diminuídas, Hobbes
chama-as de imaginação. Ou seja: as sensações que já foram tidas pelo sujeito,
mas que ainda reverberam em seu interior, tornam-se imaginação.
Mas por que Hobbes vai tão longe para falar do Estado?
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
No entanto, só a linguagem não basta para organizar a vida comum. Deve haver
previsão, deve haver ponderação, deve haver cálculo em nossos atos e palavras.
Isto é, deve haver razão. Para Hobbes, razão pode ser entendida como a
faculdade de fazer cálculos “das conseqüências de nomes gerais estabelecidos
para marcar e significar nossos pensamentos.” (HOBBES, 1974, p. 31).
Por exemplo: estabelecemos o nome “fogo” para uma determinada coisa; o nome
“combustível”, para outra coisa; e, o nome “incêndio” para outra coisa. Uma vez
que usamos a razão e incluímos fogo e combustível em nosso cálculo, podemos
prever o incêndio como consequência. Este é um exemplo de uma operação
racional, à qual Hobbes se refere quando trata da razão.
Assim como para a maioria dos pensadores modernos – Descartes, por exemplo
– para Hobbes as paixões ocupam um lugar central dentro de sua teoria
mecanicista do agir humano. As paixões estão diretamente ligadas às sensações.
Entretanto as sensações são causadas por pressões externas, enquanto que
as paixões são causadas por pressões internas, derivadas da imaginação (o
resquício das sensações em nós). As paixões mais elementares são o desejo e a
aversão. Se nossa imaginação move-nos em direção a alguma coisa, temos um
desejo. Se nossa imaginação faz-nos evitar alguma coisa, temos uma aversão.
Desejo e aversão são nossos critérios básicos de bem e mal. Se algo causa-
nos desejo, é bom. Se algo causa-nos aversão, é mau. Por mais óbvio que isso
pareça, nós somos de fato condicionados por essas noções, e nossa vida –
principalmente nossa vida em sociedade – é determinada por elas. Qualquer tipo
de lei, por exemplo, visa o nosso bem, seja contemplando nossos desejos ou
afastando-nos do mal.
Na situação que precede a criação do Estado, cada um julga o que é bom e o que é
mau para si. Todavia, no pensamento de Hobbes, com a criação do Estado o juízo
do monarca soberano passa a ser o juízo de todos os homens. Nesse sentido, o
soberano nunca erra, uma vez que não há critério para julgá-lo, pois, se houvesse,
existiria outra instância superior a ele e, dessa forma, o soberano não seria soberano.
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Capítulo 2
E por que essas paixões, medo e esperança, são tão caras para Hobbes? Como
já sabemos, os sujeitos são movidos por paixões. Logo, a diferença entre os
sujeitos está na qualidade dessas paixões, e isso determina o espírito de um
corpo político. Um corpo político formado por sujeitos bem-educados, isto é,
sujeitos que têm paixões nobres, é muito mais próspero que um corpo político
formado por sujeitos com paixões vis. Todavia, independente da educação,
todos os sujeitos são movidos pelo desejo do poder, definido como “o conjunto
dos meios que um homem possui para obter qualquer bem visível no futuro.”
(HOBBES, 1974, p. 57).
Entre tais meios, há a força física e a reputação de poder, que incluem qualidades
como astúcia, saber, inteligência e beleza (outro ponto de contato com
Maquiavel). E, nesse sentido, o pensamento, que compreende entendimento
e razão, está a serviço das paixões. Isto é, pensamos para satisfazer nossos
desejos ou para evitar os males. A paixão preencheria o fim, e a razão preencheria
os meios necessários.
•• Riqueza
•• Honra
•• Mando
Todo homem quer enriquecer, quer ser honrado e quer mandar em algo. A disputa
desses bens leva os homens inevitavelmente à luta, à inimizade e à guerra. E é
este o principal motivo que leva Hobbes a querer compreender como se dá o
agir humano: Hobbes quer encontrar as chaves para tomadas de decisão que
ajudem a interferir positivamente nos conflitos. Isso evoca uma discussão muito
pertinente no que diz respeito a este autor.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Por muito tempo os intérpretes difundiram a ideia de que Hobbes tem uma visão
completamente ruim, pessimista e negativa do homem. Deu-se isso pelo mesmo motivo
pelo qual o adjetivo maquiavélico ganhou o sentido de diabólico: Hobbes, assim como
Maquiavel, buscava entender o homem e as relações políticas sem pudores, friamente;
buscava ver as coisas como realmente são. Acontece que a visão de Hobbes sobre o
homem não é tão simplista quanto pode parecer. Isso fica claro quando ele atribui ao
homem o hedonismo (a busca constante de prazer), e não o egoísmo.
Hobbes sugere que a razão nem sempre interfere nas ações dos homens. Se
interferisse, se os homens usassem sempre a razão, não haveria a necessidade
do Estado para organizar a convivência deles. Esta concepção de Hobbes vai de
encontro a uma série de pensadores que, ao contrário, sugerem que o Estado
somente é possível se os homens utilizarem a razão, uma vez que contra sujeitos
não racionais não existe dispositivo que o Estado possa utilizar na busca do
controle de ações, isto é, na aplicação do direito jurídico.
Entretanto, para melhor compreensão desta questão, cabe salientar que Hobbes
pode ser entendido como um positivista jurídico, isto é, pode ser entendido como
um pensador que concorda com a tese de separação entre moral e direito,
segundo a qual, para que o sistema dê condições de convivência em sociedade,
o direito necessita ser coativo.
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Capítulo 2
•• Estado de natureza
•• Pavor da morte
•• Pleonexia
•• Escassez de bens
•• Condição de igualdade
•• Rivalidade
•• Desconfiança
•• Glória
•• Guerra de todos contra todos
•• Aversão ao estado de natureza: sociedade civil organizada
O primeiro deles, o estado de natureza, é aquele estado primitivo em que os
homens, hedonistas, viviam supostamente à mercê de suas paixões, sem uma
autoridade soberana, mas apenas estabelecendo relações sociais naturais, como
laços familiares, por exemplo.
Uma vez que a vida para os homens, naturalmente hedonistas, é uma busca
contínua de prazeres, os homens terão sempre a sensação de que algo ainda está
por ser obtido, de que não possuem algum bem, algum prazer. Essa sensação é o
que os antigos chamavam de pleonexia. Isso é característica inerente ao homem, e
Hobbes a vê apenas como uma característica, não necessariamente como um mal.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
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Capítulo 2
Hobbes apresenta, no Leviatã, vinte e uma leis naturais. Entretanto, não caberia
nem seria conveniente comentar todas aqui. As leis mais fundamentais são
certamente as duas primeiras, pois delas derivam todas as outras:
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
A maioria das comunidades é composta por tolos, e os tolos dizem em seu foro
íntimo que justiça é coisa que não existe e que, por isso, cada um é livre para
decidir se deve, ou não, respeitar os pactos. Mediante esta situação, Hobbes vê
três possibilidades:
1. concordar com os tolos e abandonar as leis naturais, uma vez que seria
perigoso aceitar os pactos sem ter a certeza de que todos os aceitaram;
2. constituir um poder civil capaz de impor, através do uso da força,
o cumprimento das promessas, fazendo com que seja perigoso
não respeitar os pactos, pois isso significaria correr o risco de ser
punido pela mão do soberano;
3. formar alianças para se defender dos inimigos, em um regime de
“livre cooperação” (democracia).
Quanto à segunda possibilidade, que prevê o uso da força, cabe observar que
esta solução persiste até os dias de hoje, em todo o mundo. A polícia – uma
instituição existente em qualquer país contemporâneo – é a maior prova de que o
Estado só sustenta sua autoridade através do uso da força.
No entanto, Hobbes procura deixar bem claro que não está defendendo uma
tirania, mas sim uma monarquia devidamente constituída, de modo legítimo:
Hobbes é um absolutista, não um despotista. E essa legitimidade passaria
naturalmente por instâncias jurídicas: a concessão do direito natural ao soberano
(que representa o Estado) ocorre por meio de um contrato de autorização.
71
Capítulo 2
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
O cargo do soberano [...] consiste no objetivo para o qual lhe foi confiado
o soberano poder, nomeadamente a obtenção da segurança do povo,
ao qual está obrigado pela lei de natureza e da qual tem de prestar conta
a Deus, o autor dessa lei, e a mais ninguém além dele. Mas por segurança
não entendemos aqui uma simples prevenção, mas também todas as
outras comodidades da vida, que todo homem por uma indústria legítima,
sem perigo ou inconveniente do Estado, adquire para si próprio. (HOBBES,
1974, p. 204).
2) Bíblia: Não farás para ti imagem, não te inclinarás diante dela nem a servirás.
Hobbes: Obrigação de ser grato aos pais, já que cada um lhes deve a primeira
educação e, portanto, os pais são responsáveis pelo que as crianças aprendem a
obedecer (do ponto de vista político, a família é simplesmente o lugar em que se criam
os futuros súditos).
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Capítulo 2
Hobbes: Proibição de tirar dos outros “sua vida e membros”; proibição da vingança
pessoal.
É importante ressaltar que Hobbes escreve sua obra em meio aos conflitos que
contrapunham a coroa (o Estado) e as igrejas (católica e protestante). Portanto,
há a possibilidade de que ele se tenha visto obrigado a incluir a religião dentro
de suas justificativas para o contrato social e dentro de sua explicação sobre a
condição do soberano, apesar de esta compreensão ser discutível. Além disso,
não apenas por conta da conjuntura, mas também por conta da própria cultura da
época: mesmo no início da Idade Moderna, os sujeitos eram religiosos a ponto de
obedecer mais a desígnios divinos do que a desígnios jurídicos.
O curioso nisso tudo é que Hobbes faz de sua teoria um sistema tão fechado, tão
perfeito, que, de fato, parece forçada a inserção do elemento religioso no final,
como um regulador do soberano.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Seção 4
A Paz de Westfália e o surgimento da
comunidade internacional
Embora Maquiavel e Hobbes tenham indicado as bases
Westfália era o nome
dado à região situada para a soberania estatal, isso só viria a se realizar de fato
entre o rio Reno e o um pouco mais tarde, com a Paz de Westfália: uma série
rio Weser. No século de tratados de paz que marcou não só o fim da Guerra
XVII, situavam-se na
Westfália as cidades de
dos Trinta Anos, mas também a concretização do ideal
Münster e Osnabrück, de soberania e o início de uma verdadeira comunidade
onde aconteceram os internacional. O contexto da Paz de Westfália é bastante
dois principais tratados
complicado, pois derivou da confluência de diversos acordos
de paz que marcaram o
fim da guerra. diplomáticos e, mais do que isso, significou o surgimento de
uma nova ordem mundial. Vamos tentar entendê-lo!
O século XVI iniciou-se com uma Europa dominada por duas potências
hegemônicas: a Igreja Católica – que exercia influência absoluta sobre os
assuntos políticos dos Estados europeus – e o Império Habsburgo, de orientação
católica. O Império Habsburgo, também conhecido como Império Austríaco,
passou a dominar o Sacro Império Romano no século XVI, e era visto, desde
então, como a maior e mais temerosa hegemonia política da Europa.
75
Capítulo 2
O domínio dessas duas grandes potências foi, no entanto, abalado por dois
acontecimentos principais: a Reforma Protestante, iniciada em 1517 por Martinho
Lutero (1483-1546), e a Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), provocada pela
França e pela Suécia.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Soberania significa que nenhum ator externo pode exercer qualquer tipo
de autoridade dentro das fronteiras de um determinado Estado, como
faziam o Império Habsburgo e a Igreja Católica no período medieval.
Reforçando o dissemos até aqui, Kalevi Holsti (2004) admite serem quatro os
princípios mais importantes estabelecidos nos tratados de Westfália:
77
Capítulo 2
1. Não à Igreja
Os participantes dos acordos consentiram quanto a uma negação
à Igreja Católica em seu direito de interferir nas questões seculares
dos Estados europeus.
Muitos autores, entre eles Adreas Osiander (2001), acreditam que, em partes, a Paz
de Westfália tornou-se um mito na área das Ciências Humanas, tendo recebido
uma importância maior do que realmente teve. Osiander acredita que não se pode
tomar a Paz de Westfália como um fato isolado, e lembra que, por exemplo, outras
transformações políticas ocorridas no século XVIII e, principalmente, as inovações
cartográficas do século XIX exerceram igual ou maior influência no estabelecimento
das bases para uma comunidade internacional.
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Capítulo 3
A consolidação do Estado
moderno
79
Capítulo 3
Seção 1
Locke e as bases do liberalismo clássico
Nesta primeira seção, você entrará em contato com reflexões sobre o Estado a
partir das ideias de John Locke (1632-1704), pensador inglês, cuja concepção de
estado de natureza apresenta elementos como o uso da razão, a situação de paz
e, ainda, a existência da propriedade. Essa compreensão, de que a propriedade
já está presente no estado de natureza, eleva-a à categoria de direito anterior à
instituição do Estado – ao lado da vida e da liberdade. Por esse motivo, Locke inclui
a propriedade entre os direitos que se busca garantir a partir do contrato social.
Essas e outras questões controversas levantadas por Locke fariam nascer uma
corrente de pensamento político que, apesar das transformações pelas quais
passou, predomina até os dias atuais. Acompanhe o desenvolvimento desses
temas nas próximas seções.
Em 1681, três anos após a morte de Hobbes, seu príncipe predileto, Carlos II,
reedita os feitos do pai tirano e dissolve o parlamento outra vez, reacendendo o
conflito entre realistas e parlamentaristas que havia marcado todo o último século.
O Conde de Shaftesbury, um dos principais opositores de Carlos II, vê-se
obrigado a deixar a Inglaterra e decide exilar-se na Holanda de Guilherme de
80
Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Maria II era casada com Guilherme de Orange, rei da Holanda – ambos eram
protestantes. Em 1688, os parlamentaristas, decididos a depor Jaime, organizam
uma conspiração e convocam o rei holandês a tomar-lhe o trono e assumir o
governo da Inglaterra. Diante de tal favorável situação, em novembro daquele
ano, acompanhado de sua esposa inglesa e do exército holandês, Guilherme de
Orange desembarca na Inglaterra disposto a entrar em conflito com Jaime II. O
exército inglês, no entanto, frente à potência holandesa, deserta, e Jaime decide
fugir. Em 1689, o parlamento reúne-se em uma convenção, declara que a fuga de
Jaime significou sua abdicação e oferece o trono a Maria e seu esposo holandês.
81
Capítulo 3
Nessa época, John Locke volta então à Inglaterra como membro do partido
vencedor e põe-se a escrever suas principais obras políticas: o Primeiro e o
Segundo Tratado sobre o Governo Civil, publicados entre 1689 e 1690.
82
Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Por conta das perseguições que já havia sofrido, receoso de que voltassem
a acontecer, Locke publicou seu livro anonimamente. A obra só foi atribuída
oficialmente a ele nas edições que vieram após a sua morte.
•• Estado de Natureza
•• Propriedade
•• Trabalho
•• Dinheiro
•• Lei
•• Liberdade e Licença
•• Consentimento
•• Divisão de poderes
•• Prerrogativa
Assim como Hobbes, Locke entende que as leis naturais são ditames da razão,
ou seja, são noções de justiça às quais se pode chegar usando apenas a razão.
No entanto Locke acredita que, ainda no estado de natureza, todo e qualquer
homem já traz consigo essas noções.
83
Capítulo 3
Mas como explicar tais direitos naturais? Aqui emerge uma questão central no
pensamento de Locke, que o alçou à condição de pai do liberalismo clássico: a
propriedade. Para Locke, propriedade não são apenas os bens adquiridos pelo
indivíduo, mas também sua própria vida e sua liberdade.
Em suas palavras, “se cada homem tem uma propriedade em sua própria pessoa,
o trabalho do seu corpo e a obra das suas mãos são seus”, já que derivam de sua
pessoa. “A extensão de terra que um homem lavra, planta, melhora, cultiva, cujos
produtos usa, constitui a sua propriedade.” (LOCKE, 1988, p. 37).
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Segundo Locke, uma economia baseada no dinheiro não requer um governo civil
ou um poder central (Estado) que garanta o valor da moeda. Em suas palavras,
“os homens tornaram praticável semelhante partilha em desigualdade de posses
particulares fora dos limites da sociedade e sem precisar de pacto, atribuindo
valor ao ouro e à prata, e concordando tacitamente com respeito ao uso do
dinheiro.” (LOCKE, 1988, p. 50).
Tal noção é – como você pode imaginar – a mais polêmica e problemática não
só na teoria de Locke, mas em toda a ideologia liberal. Você verá mais adiante
que praticamente todas as críticas ao liberalismo concentram-se justamente
nesse ponto. Locke acredita que o objetivo do Estado restrinja-se a garantir a
convivência dos homens, julgando-os mediante leis civis devidamente criadas.
Para Locke, a economia independe do Estado.
85
Capítulo 3
Perceba que a lei, segundo essa definição, é algo emancipador, e não algo que
restringe e aprisiona; algo que limita a liberdade. Locke, a propósito, faz questão
de enfatizar que “apesar do possível equívoco, o objetivo da lei não consiste em
abolir ou restringir, mas em preservar e ampliar a liberdade.” (LOCKE, 1988, p.57).
Outra insistência do autor diz respeito à distinção entre licença e liberdade :
86
Ciência Política e Teoria Geral do Estado
87
Capítulo 3
Por fim, algo importante a se frisar diz respeito à maneira como Locke combina
elementos republicanos e liberais em sua teoria. Como interpreta Pinzani (2009),
Locke mistura elementos genuinamente liberais (o individualismo metodológico,
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
O fato é que Locke soube tão bem aproveitar seu momento histórico, dialogando
com a tradição e elaborando justificativas precisas para os anseios do liberalismo
nascente, que o sucesso de sua teoria tornou a corrente do pensamento liberal
dominante até os dias de hoje e deixou o republicanismo em segundo plano no
debate político.
Seção 2
Rousseau: a vontade geral como fonte das leis
Figura 3.3 - Monumento a Jean-Jacques Nesta seção, você refletirá sobre o
Rousseau, de François Masson Estado na perspectiva de Jean-Jacques
Rousseau (1712-1778), pensador
que marcou a história francesa,
principalmente no que concerne à
filosofia política. Rousseau sugere que os
seres humanos teriam liberdade enquanto
estivessem no estado de natureza.
Nesse estado, os homens seriam
originalmente bons, porém, à medida
que se organizaram em sociedade,
escravizaram-se, tornando-se desiguais.
89
Capítulo 3
O homem está no centro de qualquer reflexão feita por Rousseau. Mesmo quando
fala em sacrificar os desejos pessoais em favor da comunidade, ele visa o bem-estar
do ser humano, certo de que os homens só podem chegar à felicidade como
membros de uma comunidade, apesar de todos os inconvenientes que isso lhes traz.
90
Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Tanto Emílio quanto Jean-Jacques têm algo do ser humano no estado original –
que deve ser tomado como referência ideal para encontrar a felicidade. Todavia
Emílio, embora busque preservar sua inocência sadia, tem de se adequar à
civilização para sobreviver. Já Jean-Jacques, embora se aproxime desse ideal em
seu isolamento, carrega uma profunda decepção com o mundo, o que o impede
de ser feliz. A segunda possibilidade, a vida enquanto cidadão, a que mais nos
interessa aqui, é talvez a mais difícil de realizar.
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Capítulo 3
92
Ciência Política e Teoria Geral do Estado
93
Capítulo 3
Como não poderia ser diferente, Rousseau – que vivenciou o auge do liberalismo
clássico – chega a discutir, em seu discurso sobre a desigualdade entre os
homens, a propriedade, que, segundo ele, é a causa de toda desigualdade. Para
Rousseau, o desejo de superioridade decorrente do amor-próprio gera sempre
novos desejos, e, uma hora, chega-se ao ponto em que não é possível satisfazer
o próprio desejo sozinho. Com isso, surge a divisão do trabalho. Entre as
empresas humanas, a que mais colaborou para o surgimento da propriedade foi a
agricultura, a qual propiciou a posse fundiária.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Já comentamos, por mais de uma vez, que não foram poucas as críticas feitas
à eventual ingenuidade da argumentação de Rousseau. Muitas delas são
infundadas, porém, neste ponto especificamente, cabe endossá-las. Como
entende Pinzani (2009, p. 107), há de fato ingenuidade nas categorias econômicas
e sociológicas de Rousseau:
Todavia, por mais ingenuidade que possa haver em seu pensamento, sua
concepção de sociedade civil não deixa de ser interessante e inspiradora. As
modernas democracias, a propósito, devem em muito às ideias de Rousseau.
As ideias que discutimos até aqui estão contidas basicamente no Discurso sobre
a origem da desigualdade entre os homens, entretanto sua teoria do Estado
está expressamente formulada no Contrato social, obra sobre a qual nos iremos
deter daqui em diante. Você verá, por exemplo, que Rousseau atribui um valor ao
exercício da cidadania, como ninguém fizera antes.
95
Capítulo 3
A existência de uma ordem social é algo que Rousseau admite ser superior ao
indivíduo, algo que existe mesmo antes que a humanidade pudesse manifestar
consciência, e que, por isso, constitui uma convenção
Axioma Um axioma
é uma premissa
incontestável – um axioma de sua teoria. A conclusão de
imediatamente evidente que a ordem social seja uma convenção universal passa
que se admite como por uma reflexão histórica: Rousseau considera as diversas
universalmente
formas que a ordem social assumiu ao longo dos tempos,
verdadeira sem
exigência de incluindo a família, o governo do mais forte e a escravidão.
demonstração. Mas conclui que nenhuma delas pode ser considerada
legítima politicamente, a não ser o pacto social.
Poderes Rousseau,
Dessa forma, o ser humano, ao contar apenas com suas
após analisar algumas próprias forças (poderes individuais), associa-se com
teorias sobre a outros, a fim de unir suas forças em prol de uma defesa
legitimidade do poder,
mútua: tanto da “pessoa” dos associados quanto de seus
sugere que o mesmo
é legitimado por bens. Nesse sentido, busca consultar a razão antes de
convenção humana, impulsos individuais, uma vez que interesses coletivos
desconsiderando devem sobrepor-se a desejos individuais. O filósofo
a legitimidade por
reconhece que os desejos individuais não desaparecem
imposição divina ou
perspectivas naturais. do associado, mas salienta que, a partir desse ponto, o
associado escolhe quais desejos satisfazer; e virtuoso é o
que opta pela vontade geral.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
O corpo político, para Rousseau, não é formado apenas por meros súditos, mas
sim por sujeitos que são, ao mesmo tempo, autores e destinatários das leis.
Portanto observe que, para Rousseau, cada membro do corpo político, isto
é, cada indivíduo da comunidade, é soberano no momento em que toma
as decisões em assembleia; e é súdito no momento que cumpre o que foi
determinado pela assembleia soberana.
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Capítulo 3
98
Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Provavelmente, ao ler esta definição de religião civil, você deve tê-la associado
a certas determinações feitas pelos Estados modernos em seus currículos
escolares, a fim de garantir a formação de hábitos civis adequados.
99
Capítulo 3
Seção 3
Montesquieu e o constitucionalismo
Se, no século XVII, Locke reformulou os elementos do pensamento republicano
a fim de dar as bases para o liberalismo, no século seguinte surgiria, pela
combinação de elementos republicanos e liberais, uma nova e perene corrente de
pensamento político: o constitucionalismo. Seu maior expoente certamente foi o
escritor e político francês Charles-Louis de Secondat, mais conhecido por Charles
de Montesquieu (1689-1755).
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
101
Capítulo 3
102
Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Montesquieu entende que cada uma dessas três espécies de governo possui um
princípio ou, em suas palavras, uma “mola do governo”. Da mesma forma que
Hobbes e assim como todos os principais pensadores políticos modernos,
Montesquieu refere-se às paixões humanas, que motivam os
Modernos Buscando
conter as intempéries governos. A paixão, ou a mola, que impulsionaria a
das paixões humanas, democracia (uma das possibilidades de governo republicano),
todos os principais é a virtude cívica. A virtude cívica seria sinônima de um amor
pensadores políticos
pela república ou pela pátria, isto é, um desejo de ver a nação
modernos tiveram a
racionalidade como próspera, saudável politicamente, o que acarreta a pureza dos
obsessão. costumes. Em última instância, a virtude cívica pode ser
entendida como um amor pela igualdade.
Um monarca, por sua vez, é impulsionado pela honra. Tal como entende
Montesquieu, um governo monárquico pressupõe “preeminências, categorias e
até mesmo nobreza de origem” (1973, p. 53). Um monarca, levado pelas vaidades
da nobreza, jamais põe em jogo a sua honra, e isso – desde que ele tenha virtude
– o levará a querer garantir a saúde de seu Estado.
À altura do 11º livro do Espírito das Leis, Montesquieu vem a discutir uma quarta
espécie de governo. Esse certamente é o mais famoso dos livros que compõem
a obra, pois é nele que Montesquieu apresenta a sua célebre teoria da separação
dos poderes. Antes, porém, a fim de amparar sua argumentação, o autor
apresenta uma definição de liberdade política:
Liberdade política é entendida como “o direito de fazer tudo o que as leis permitem”,
o que é diferente de fazer o que se bem quer. Esta liberdade incondicional, a liberdade
de agir conforme a própria vontade, sem nenhum regramento, Montesquieu chama
de independência. “A verdadeira liberdade só se dá quando existem leis que
determinam o que o cidadão pode ou não fazer.” (ibid., 155).
103
Capítulo 3
Montesquieu compreende, portanto, que não pode haver liberdade política nem
mesmo na democracia por si só, pois, se o poder estiver totalmente nas mãos
do povo, não haverá um elemento externo que regule este poder, impedindo
eventuais abusos.
Seção 4
Reflexos das ideias nos fatos
Maquiavel, Hobbes, Locke e Rousseau representaram momentos históricos muito
significativos para a consolidação do ideal de Estado. Tais momentos sinalizaram
a transição de um modo medieval para um modo moderno de conceber e fazer
política. O ápice dessa transição seria a realização de uma sociedade civil
regida por instituições, e não mais por pessoas, com suas arbitrariedades e
idiossincrasias.
104
Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Nesta seção, você estudará dois dos eventos políticos mais expressivos que
aconteceram no limiar do mundo moderno, os quais foram reflexo evidente dos
debates ocasionados pelas obras de Maquiavel, Hobbes, Locke e Rousseau: a
Revolução Francesa e a Primavera dos Povos.
105
Capítulo 3
Naquela época, havia pelo menos quinhentos anos, o governo francês era
dividido em três ordens ou, como eram chamados, Estados gerais: o clero
(Primeiro Estado), a nobreza (o Segundo Estado) e o
Governo francês
A França chegou a Terceiro Estado (representado pela burguesia e os
constituir o maior camponeses). Esse período da história francesa
império do período compreendido entre os séculos XIV e XVIII, justamente por
medieval e preservava
anteceder o novo regime que seria estabelecido pela
sua autoridade política
ainda no século XVIII. revolução de 1789, ficou conhecido como Antigo Regime.
Daí a importância de
uma revolução como Embora os burgueses e os camponeses tivessem um
esta, que modificou reconhecimento formal enquanto grupo social no Antigo
suas bases políticas. Regime, na prática, o Primeiro e o Segundo Estado
governavam conforme a sua vontade. Durante o governo de
Luís XIII (1601-1643), entre os anos de 1610 e 1643, a França foi palco de conflitos
entre católicos e protestantes, o que fez gerar uma grave crise em sua aristocracia.
O sucessor de Luís XIII, seu filho Luís XIV (1638-1715), soube aproveitar aquele clima
de instabilidade geral para tomar o poder e afirmar-se absoluto no trono. Tendo
relegado a aristocracia a um segundo plano, Luís XIV demonstrou-se altamente
despótico no governo, cometendo abusos das mais diversas naturezas. Sua
conduta seria repetida por seus sucessores
Figura 3.8 - “O Terceiro Estado carregando a até o governo de Luís XVI, que enfrentaria
nobreza e o clero nas costas” (1790), de autor a ira de toda a sociedade francesa,
desconhecido
exausta de qualquer despotismo.
106
Ciência Política e Teoria Geral do Estado
107
Capítulo 3
108
Ciência Política e Teoria Geral do Estado
109
Capítulo 3
A Revolução ilustrou, ainda, de forma sintética, o ciclo dos governos proposto pelos
antigos e resgatado por Maquiavel. Em pouco tempo, a França experimentou todas
as formas de governo possíveis, tanto as ditas puras quanto suas perversões.
O final do Antigo Regime é a perfeita representação da monarquia pervertida em
tirania. A cisão do Segundo Estado entre alta e baixa aristocracia, cujos interesses
começaram a não se conciliar, sugere a perversão da aristocracia em oligarquia.
Da mesma forma, os burgueses, especialmente os jacobinos, quando tiveram o
poder, demonstraram como a tirania da democracia pode pervertê-la em anarquia
generalizada. E, como ainda veremos, os franceses chegaram a conciliar as formas
puras em uma constituição devidamente estabelecida, tal qual o ideal republicano
do pensador florentino. Além disso, toda a argumentação dos revolucionários e
até mesmo seus atos ilustraram a tendência moderna de apreciar os problemas
políticos de forma mais pragmática, ao invés de moralizá-los – tendência
impulsionada por Maquiavel, especialmente por influência de sua obra O Príncipe.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Figura 3.10 - “Execução de Luís XVI” (1793), gravura alemã de autor desconhecido
Essa coligação foi encabeça pela Inglaterra que, além de rival política, era a
principal concorrente da França nos negócios, e, por isso, também temia a
ascensão burguesa no mercado europeu. No Departamento da Vendeia,
camponeses contrários à Revolução tomaram o poder da Comuna local e
formaram uma frente contrarrevolucionária. No Comitê da Salvação Pública
– como se intitulou o governo jacobino – o líder Danton, considerado moderado,
111
Capítulo 3
foi substituído por Robespierre, que intensificou o terror. Além do rei Luís XVI,
milhares de pessoas – entre elas, sua esposa Maria Antonieta, o químico Antoine
Lavoisier, aristocratas, clérigos, girondinos e especuladores – também foram
guilhotinadas. O país estava imerso no caos.
Em 1799, Napoleão e suas tropas foram enviados ao Egito para tentar interferir
nos negócios da Inglaterra. No entanto, surpreendido pela marinha inglesa, sua
inventiva é fracassada. Ele, então, abandona os soldados e retorna à França,
trazendo consigo apenas seus generais mais fiéis. Em 18 Brumário (10 de
18 Brumário Tratava- novembro de 1799), já em terras parisienses, embora
se do 18º dia do tivesse fracassado no Egito, Napoleão sente o clima
período Brumário, a
favorável e decide trocar a carreira militar pela política.
fase intermediária do
outono no calendário Naquele que ficou conhecido como Golpe de 18 Brumário,
revolucionário francês. Napoleão Bonaparte suprime o Diretório e instaura o
112
Ciência Política e Teoria Geral do Estado
113
Capítulo 3
O Código de Napoleão não foi o primeiro código legal estabelecido em uma nação.
Antes dele, na Baviera (em 1756), na Prússia (em 1792) e na Galícia (em 1797),
já haviam surgido códigos semelhantes. No entanto, nenhum deles obteve tanto
sucesso e exerceu tanta influência sobre resto do mundo quanto o de Napoleão.
Um código civil, tal qual o de Napoleão, não diz como as leis e normas
devem ser elaboradas, pois isso compete a uma constituição. O código
civil estabelece os domínios da lei, isto é, agrupa e sistematiza as normas
jurídicas esparsas no direito consuetudinário e no direito escrito.
A história do Império Napoleônico dura apenas uma década, mas nos mostra
um movimento de ascensão e queda jamais visto. Ao estabelecer o Império,
Napoleão partiu obstinado em busca de novas terras. Em 1812, chegou a
dominar quase toda a Europa Ocidental e grande parte da Europa Oriental.
O Império possuía, então, 150 departamentos, com cerca de 50 milhões de
habitantes: quase um terço da população europeia da época.
Uma das causas do sucesso do exército francês está diretamente ligada aos ideais
da Revolução. Se o povo era a fonte da legitimidade política, então lhe cabia também
a responsabilidade de defender seus próprios direitos de eventuais ataques. Assim,
“o direito de voto acarretou o dever do serviço militar.” (BOBBIT, 2003, p. 70).
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
115
Capítulo 3
Vale destacar, ainda, que a Revolução Francesa deu origem efetiva a dois
fenômenos extremamente caros à Filosofia Política: o sufrágio universal e os
movimentos sociais. Tanto um quanto outro têm seu marco inicial fixado no
período da Revolução.
O termo “movimento social”, por sua vez, foi usado pela primeira vez em
uma obra cujo título remete diretamente à Revolução Francesa: A História do
Movimento Social Francês de 1789 até o Presente, escrita pelo sociólogo alemão
Lorenz von Stein, publicada em 1850.
116
Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Charles Tilly (2004) define os movimentos sociais como uma série de atos,
manifestações e campanhas através das quais pessoas comuns fazem
reivindicações coletivas. Segundo esse autor, os movimentos sociais – o maior
veículo para a participação de pessoas comuns nas decisões do Estado – têm
três elementos fundamentais:
Stuart Mill, filho do político James Mill, foi discípulo do filósofo Jeremy Bentham.
Tanto seu pai como seu preceptor foram grandes defensores do liberalismo e
fundaram uma corrente de pensamento que ficou conhecida como utilitarismo.
Essa corrente defende que a essência da moralidade é o princípio da utilidade,
segundo o qual qualquer ação que contribua para a utilidade geral da sociedade
deve ser considerada boa, isto é, moralmente correta.
117
Capítulo 3
que a felicidade não se consuma nos prazeres físicos. Ele difere os prazeres
físicos – os quais chama de prazeres inferiores, dos prazeres intelectuais – os
prazeres superiores. Portanto, para chegar à felicidade, para chegar a realizar
ações úteis, cada indivíduo deveria desenvolver ao máximo suas faculdades
mentais, ou seja, seus prazeres superiores.
Figura 3.12 - Garantia de educação e dignidade: deveres do Estado para Stuart Mill
118
Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Além disso, Mill opõe-se a Rousseau em um outro ponto crucial: ele rejeita a
noção de contratualismo. Em sua concepção, a sociedade não se funda sobre
um contrato. “Todos que recebem a proteção da sociedade devem-lhe uma
retribuição por tal benefício, e o fato de viver em sociedade torna indispensável
que cada um esteja obrigado a observar uma certa linha de conduta para com os
demais.” (ibid., p. 115).
119
Capítulo 3
E exatamente por isso Marx não se dedica a discutir as formas de governo. De seu
ponto de vista, quaisquer que sejam elas, mais ou menos corretas, serão sempre
uma mera expressão dos interesses da classe dominante. Essa postura negligente
à questão do Estado levou a maior parte dos críticos a afirmar que Marx não dispõe
de uma teoria política. No entanto, como você verá, ele possui, sim, um
pensamento político interessante. Ocorre que tamanha foi a importância dada por
Marx à Economia em sua obra que seu pensamento político sempre pareceu estar
em segundo plano, por vezes até mesmo reduzido a categorias econômicas.
Situação ideal Marx Marx almeja uma sociedade sem classes, na qual,
teve como principal consequentemente, não haverá domínio de uma classe
influência o filósofo
sobre outra; na qual não haverá Estado. Essa situação
Hegel, fundador do
idealismo. Isso explica,ideal chamar-se-ia comunismo. Portanto, se o objetivo
em parte, as tendências final é encontrar uma conformação social que não possua
idealistas do marxismo. relações de domínio, estas relações, por sua vez, passam
a ser o seu principal objeto de estudo no que diz respeito
à Política. Portanto, sempre que Marx – em obra vasta, prolixa e um tanto confusa
– volta os olhos para temas políticos, ele se dedica a analisar como se deu a
conquista do poder.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
1. Como já dissemos, a forma do Estado e das demais instituições políticas decorre das
relações de produção, e não do desenvolvimento das ideias ou vontades humanas.
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Capítulo 3
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
123
Capítulo 3
124
Capítulo 4
Tópicos de política
contemporânea
125
Capítulo 4
Seção 1
Síntese de conceitos básicos
Conceitos hoje comuns a cientistas políticos, a gestores públicos e ao público
em geral emergiram na história da humanidade e foram ganhando (ou perdendo)
sentido de acordo com as condições de cada época, em cada comunidade.
Nesta primeira seção, antes de abordar alguns tópicos de grande relevância para
a política contemporânea, você poderá conhecer ou recapitular alguns desses
conceitos básicos como forma de sintetizar o “estado da arte” da Ciência Política.
O Estado também pode ser entendido como o local onde reside o poder político
legítimo. Portanto, quem dirige o Estado tem autoridade para exercer o poder político.
126
Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Por fim, pela abordagem relacional, o poder existe mediante as relações sociais. O
indivíduo (aquele que possui o poder) obtém do segundo (que não possui poder)
um comportamento que, caso contrário, não ocorreria (BOBBIO, 1977). Dessa
abordagem, podemos extrair os conceitos de poder econômico, ideológico e político.
127
Capítulo 4
Por fim, o caminho mais usual para diferenciar o poder político, que nos
interessa particularmente aqui, das outras formas de poder remete ao uso da
força física. Em outras palavras, o detentor do poder político é aquele que tem
exclusividade o direito de uso da força física sobre um determinado território.
Quem tem o direito exclusivo de usar a força sobre um determinado território é
o soberano – lembrando que, nos tempos modernos, o detentor da soberania é
o Estado. O sociólogo alemão Max Weber (1999 [1920]) foi quem observou essa
especificidade do poder político. Em sua fórmula clássica, Weber define o Estado
como detentor do monopólio da coação física legítima.
Sob certo ponto de vista, se a política dos gregos baseou-se na razão, a dos
romanos baseou-se no amor – um amor ao país, um amor à própria Roma. Os
romanos, de fato, inventaram o patriotismo, e esta é uma das grandes chaves de
seu sucesso. Eles consideravam-se uma espécie de família e viam em Rômulo, seu
fundador, um antepassado comum. Talvez tenha sido Agostinho de Hipona (mais
conhecido como Santo Agostinho), um dos maiores pensadores cristãos, que viveu
durante a fase final do Império Romano (354-430 d.C.), o primeiro a perceber o
patriotismo como a paixão orientadora dos romanos, em parte porque viu nela uma
128
Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Agora que você pôde conhecer ou rever alguns dos principais conceitos que
compõem o repertório da Ciência Política, vamos passar a abordar alguns tópicos
de especial relevância no mundo contemporâneo, começando pela discussão
sobre as gerações de direitos humanos.
Seção 2
Gerações de direitos humanos
O surgimento do Estado moderno, além de ter revolucionado as formas de
governo, deu origem efetivamente ao que hoje chamamos de direitos humanos
ou direito universais. Entretanto, os chamados direitos humanos não surgiram
de uma hora para outra, de uma só vez, como se fosse um pacote de direitos.
Esses direitos foram sendo gerados e efetivados gradualmente, de acordo com
condições específicas pelas quais o mundo ocidental (notadamente a Europa)
passou ao longo dos últimos séculos.
129
Capítulo 4
Muito embora esta carta de direitos tenha sido cronologicamente antecedida pela
Constituição dos Estados Unidos da América, de 17 de setembro de 1787, foram
os ideais revolucionários nela expressos que inspiraram os norte-americanos.
Tanto que, inicialmente, a Constituição Americana não previa uma lista de direitos
civis, a qual só foi inserida através de emendas, por pressão de alguns dos treze
estados independentes, ex-colônias da Inglaterra, para aderirem ao pacto que
daria origem ao Estado Federal.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Por isso, faz sentido a analogia de Karel Vasak, segundo a qual enquanto
os direitos de primeira geração estavam ligados ao ideal francês de
liberdade perante o Estado absenteísta, os direitos de segunda
geração, por sua vez, exprimem o símbolo da igualdade de um governo
intervencionista.
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Capítulo 4
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Por exemplo, o uso inadequado dos recursos naturais por indústrias compromete
o meio ambiente para todos, indiscriminadamente, com reflexos em direitos
inerentes a uma determinada comunidade ou mesmo a todo o gênero humano.
Ou, ainda, a disseminação inescrupulosa de fatos inverídicos por órgãos de
reprodução de notícias acaba gerando transtornos de difícil superação para
quase toda a população de determinado país. Ambos os exemplos revelam fatos
que se proliferam na sociedade massificada e, assim, ensejam reclamações
coletivas ou mesmo difusas, no sentido de preservar a integridade de aspectos
inerentes à condição humana.
Logo, mesmo que os direitos das gerações anteriores ainda não estejam
plenamente concretizados, o processo civilizatório fez com que o homem se
deparasse com uma vasta gama de novas situações em que a sua personalidade
era atingida, ensejando a enunciação de novos direitos. Gradativamente, tais
prerrogativas jurídicas estão incorporando-se aos diversos ordenamentos
jurídicos, no plano infraconstitucional ou mesmo nas leis fundamentais, à medida
que ocorre a sua maturação.
Seção 3
Dilemas da participação política
Assim como a sociedade massificada ensejou a terceira geração de direitos,
os chamados direitos da coletividade, ela também agravou os dilemas da
participação política. Em um mundo superpopuloso no qual o regime democrático
– independente do sistema de governo – tornou-se uma tendência predominante,
a participação dos cidadãos nas esferas de deliberação política representa um
problema central.
133
Capítulo 4
Isso configura um grande dilema, pois, ainda que a democracia direta mostre-se
cada vez mais inviável, os modelos de democracia representativa existentes não são
totalmente satisfatórios, pois fazem com que os cidadãos sintam-se muito distantes
do poder político e impotentes diante das instâncias que decidem como vai ser
a sua vida pública. Além disso, esses modelos também alimentam classes de
políticos profissionais que se perpetuam no governo e passam a reconhecer a coisa
pública como coisa privada, apropriando-se dela. Ou seja, favorecem vícios.
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
135
Capítulo 4
Seção 4
Políticas públicas e métodos de gestão de políticas
Em primeiro lugar, nunca é demais esclarecer que, em português, podemos
usar o vocábulo “política” para falar do fenômeno político ou, ainda, para falar
de medidas adotadas por um governo a fim de atender a demandas populares.
Neste último caso, falamos em política pública, por exemplo, ou políticas
públicas. Em outras línguas, há um item lexical para cada sentido. Em inglês, há
politics (para falar da política como um fenômeno geral) e policy (para falar de
uma política pública).
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Ciência Política e Teoria Geral do Estado
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Capítulo 4
138
Ciência Política e Teoria Geral do Estado
Quando se avalia uma política pela sua eficácia, o foco é a relação entre os
objetivos estabelecidos e instrumentos utilizados versus resultados efetivos. Por
exemplo, se uma política pretendia oferecer livros para estudantes de escolas
públicas e, por causa dela, depois de determinadas ações, os estudantes das
escolas públicas de dada localidade portavam livros, então a política foi eficaz.
Quando se avalia uma política pela sua eficiência, o foco é a relação entre o
esforço empregado versus resultados obtidos (custo/benefício). Por exemplo,
considerando aquela mesma política que pretendia oferecer livros aos estudantes:
se ela foi eficaz em fornecer os livros, mas os estudantes não passaram a lê-los,
então a política foi ineficiente.
139
Capítulo 4
E quando se avalia uma política pela sua efetividade, o foco recai sobre os
impactos e resultados (sucesso ou fracasso na mudança das condições de vida).
Voltando ao exemplo dos livros, se a política foi eficaz em fornecer os livros e
eficiente porque os estudantes passaram a lê-los, no entanto, dentro de um
certo prazo, não se observaram mudanças nos índices de avaliação educacional
(principalmente no que se refere às habilidades de leitura e compreensão de
texto), então a política não foi efetiva.
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Considerações Finais
Caro(a) estudante,
Com as noções introdutórias apresentadas neste livro, espero que você esteja
mais bem-informado(a) do que estava antes e, portanto, mais apto(a) a fazer suas
próprias escolhas – não só quanto ao que leu aqui, mas quanto ao que lerá depois
e, principalmente, quanto àquilo em que acreditará. A partir de agora, você dispõe
de um primeiro mapa, bastante pontual, com os possíveis caminhos oferecidos
pela Ciência Política.
141
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Sobre o professor conteudista