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Resumo: A presente pesquisa aborda uma reflexão crítica e decolonial acerca dos
Planos Curriculares dos Cursos (PCC) da disciplina de história e religião no ensino
médio, elencando aspectos positivos e negativos com relação à temática
pesquisada, capitaneada pela análise da bibliografia pertinente ao tema das
religiosidades, com ênfase no ateísmo, buscando apontar aspectos relevantes na
acerca do ensino confessional em início do século XXI na capital do Acre, Rio
Branco, com ênfase em colégios cristãos. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, na
qual os dados serão levantados por meio da análise teórica, legal e documental
relacionadas à construção dos currículos confessionais do ensino básico em tais
escola confessionais acrianas, e a maneira como a formação teórica
predominantemente cristã é observada e seu reflexo na futura prática docente no
ensino básico. A análise dos dados coletados será subsidiada pelo estudo seguintes
estudiosos do tema: DELORS (2010), PEREIRA (2013), FREIRE (1993), dentre
outros.
Abstract: This research addresses a critical and decolonial reflection on the Course
Curriculum Plans (CCP) of the discipline of history and religion in high school, listing
positive and negative aspects in relation to the researched theme, led by the analysis
of the bibliography pertinent to the theme of religiosities, with an emphasis on
atheism, looking for relevant points about confessional teaching at the beginning of
the 21st century in the capital of Acre, Rio Branco, with an emphasis on Christian
schools. This is a qualitative research, in which data will be collected through
theoretical, legal and documentary analysis related to the construction of
confessional basic education curricula in such Acre confessional schools, and the
way in which the predominantly Christian theoretical formation is observed and its
reflection in the future teaching practice in basic education. The analysis of the
collected data will be subsidized by the study of the following scholars on the subject:
DELORS (2010), PEREIRA (2013), FREIRE (1993), among others.
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1 NO TÚMULO DA HISTÓRIA: O APAGAMENTO ATEÍSTA NO CURRÍCULO
Neste ponto o apagamento dos professores de história é total: pois não são
eles, os especialistas que irão ministrar tais disciplinas, especialmente para que não
se tornem o que de fato são: palcos intermináveis de lavagem cerebral e inculcação
de preconceitos (menino de azul e menina de rosa, por exemplo). O carnaval
sempre propicia a manifestação de tais preconceito de maneira mais latente, veja o
exemplo do festeja deste ano e a polêmica (novamente) sobre o demônio presente
ali. Tais recordações me levam aos idos do milênio passado, da inscrição que agora
fulgura à lembrança: “mesmo que proibido, olhais por nós!”
O domínio “cristão” sobre o ensino de história no Brasil é de uma claridade
solar, segundo Itamar Freitas “[...] até 1930 não se tinha clareza sobre o que deveria
ser o ensino de História para os jovens, aventando-se teorias que mesclavam
positivismo, catolicismo ultramontano e pragmatismo norte-americano, entre
outras abordagens; [...]” (FREITAS, 2010, p. 11). Assim, não apenas pelos debates
levantados pelo ENA, mas pelo que ocorria pelo país enquanto o tema do presente
estudo era debatido. Ao final, se as hipóteses aqui levantadas forem atingidas, o/a
leitor(a) será transportado para uma era (no sentido epistemológico que lhes
atribuíram os gregos) do mito da laicidade na educação acriana e dos ateus
“radicais”, ou seja, a época atual.
Deve-se salientar no trabalho que será desenvolvido, tendo como fontes
tanto o ENA (Encontro Nacional de Ateus) quando a ADI 4439 - em níveis diversos,
todavia - representam aspectos estruturais do mito da laicidade no ensino público
acriano ora aventado. Um mito, além de um componente fundamental das
sociedades humanas através da história com tragédia (ruptura), faz parte desse
imaginário do qual falará Marilena Chauí, Nietzsche, Strauss, dentre outros
pensadores, cada um a sua maneira e em suas áreas de estudo. Os gregos já
tinham uma concepção bastante avançada sobre a “tragédia da vida” e a
necessidade mitológica como resposta a esta tragédia, como amiúde ocorre com
cristianismo sempre infiltrado através da história e no próprio ensino público pátrio.
E, no entanto, os currículos escolares estão cada vez mais
sobrecarregados; nesse caso, será necessário fazer escolhas, com a
condição de preservar os elementos essenciais de uma educação básica
que ensine a viver melhor pelo conhecimento, pela experiência e pela
construção de uma cultura pessoal (DELORS, 2010, p. 09).
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Nietzsche entendia a tragédia como algo necessário, daí a necessidade de uma análise mítica no
sentido em que será defendido no presente projeto de pesquisa, posto, como é visto comumente, a
desunião de dos laicos que permite, consequentemente, uma dominação imposta na esfera jurídica
de cima para baixo, como restou claro na decisão da ADI 4431 que será igualmente analisada e que
retumba nas esferas, social, econômica (vide a poderosa igreja erigida por Edir Macedo).
próprio conceito de deus. Eles (a maioria, os não laicos) controlam o poder político,
logo, dominam o Estado, a Educação (e seus vieses, seu currículo), o poder em si.
O Brasil de hoje vive um Estado de exceção ao estado laico, sendo defeso sua
defesa e, porque não dizer, desaconselhada.
A filosofia não surge para dividir, mas sim para unir, tentar encaixar as
diversas peças por meio de uma retórica em forma de escrutínio: ao saber que nada
sei, sei ao menos uma coisa, o fato de que não se sabe. Teoria e prática não
necessitam serem excludentes entre si, podem muito bem complementarem-se de
maneira positiva para a formação do futuro professor do ensino básico: “[...] Boa
parte dos autores até contrapõe teoria à prática. Se não como duas realidades
excludentes entre si, pelo menos como tese e antítese de um mesmo processo.
(PEREIRA, 2003, p. 09). Essa vertente é bastante analisada pelo imortal Lukács no
trecho que se segue:
Por isso, informa Lukács (1979, p. 32), é necessário que o ponto de partida
do conhecimento se constitua em uma abstração correta, que em sua
estrutura interna já possua características da pesquisa científica. Filosofia e
ciência originam-se na vida cotidiana, desenvolvem-se como instâncias
autônomas para, finalmente, retornarem à práxis imediata e informá-la com
novas ou melhores concepções. [...] Marx (1865) assinala que é um
paradoxo que a “terra se mova em volta do sol e que a água seja constituída
por dois gases altamente inflamáveis. A verdade científica é sempre um
paradoxo do ponto de vista da experiência imediata que alcança apenas a
mistificada aparência das coisas”. (p. 594)
O ENA representa apenas uma das facetas (ou rupturas) da luta dos laicos
na prática, da tentativa de saída dessa cova onde sempre esteve na história e, claro,
em seu ensino: parafraseando Marx, foi a "epifania" de uma minoria para sair das
páginas dos livros e transformar de fato a realidade 3, tal projeto, por si só, é
justificativa suficiente para um estudo acerca do tema proposto, agora pelo viés de
seus ecos na educação acriana. A queima da bíblia foi o "basta", o rompimento e
porque não o réquiem deste mito, a "chegada do meio dia" do qual Nietzsche fala na
obra Assim Falava Zaratustra; ou ainda representado na sustentação oral da
advogada da Associação Nacional de Ateus (ATEA) na ADI ora analisada. E que
implicações isso trará para os processos educacionais num futuro não tão distante?
5 CONCLUSÃO
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É famoso o aforismo marxista de que “chega” de estudar a história, pois é chegada a hora de transformá-la.
Assim, resta claro que as deficiências curriculares constantes nos Planos
Curriculares de história e religião necessitam de uma análise mais aprofundada, não
se pretendendo aqui jamais - o parco e pequeno artigo - abarcar a totalidade de
significados e problematizações possíveis relacionados ao tema em debate. Por
outro espeque, o presente trabalho buscou de forma humilde aventar que tais
configurações poderão prejudicar de forma indelével a formação não apenas dos
futuros cidadãos, mas daqueles que estes igualmente formarão, tendo em vista que
“nenhum homem é uma ilha”, muito menos o ofício de ensinar se faz só, ou seja,
formando-se um péssimo círculo vicioso e porque não dizer, preconceituoso e
colonial.
A filosofia, a história, e penso que a própria religiosidade humana, não
surgem para dividir, mas sim para unir, tentar encaixar as diversas peças daquilo
que denominamos existência por meio de uma retórica em forma de escrutínio: ao
saber que nada sei, sei ao menos uma coisa, o fato que desconheço. Teoria e
prática seculares não necessitam serem excludentes com as religiosidades, podem
muito bem complementarem-se de maneira positiva para a formação do futuro
cidadão do ensino básico: “[...] Boa parte dos autores até contrapõe teoria à prática.
Se não como duas realidades excludentes entre si, pelo menos como tese e antítese
de um mesmo processo. (PEREIRA, 2003, p. 09). Essa vertente é bastante
analisada pelo imortal Lukács no trecho que se segue:
Por isso, informa Lukács (1979, p. 32), é necessário que o ponto de partida
do conhecimento se constitua em uma abstração correta, que em sua
estrutura interna já possua características da pesquisa científica. Filosofia e
ciência originam-se na vida cotidiana, desenvolvem-se como
instâncias autônomas para, finalmente, retornarem à práxis imediata e
informá-la com novas ou melhores concepções. [...] Marx (1865)
assinala que é um paradoxo que a “terra se mova em volta do sol e que a
água seja constituída por dois gases altamente inflamáveis. A verdade
científica é sempre um paradoxo do ponto de vista da experiência imediata
que alcança apenas a mistificada aparência das coisas”. (LUKÁCS, 1979, p.
594)
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