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Contextualização, inovação e competitividade

para negócios em alimentação

Paulo Sousa

Editora Senac São Paulo – São Paulo – 2020


Sumário
Capítulo 1
História e evolução da gastronomia
1 A história da gastronomia: da pré-história ao mundo contemporâneo

2 A globalização da gastronomia e os hábitos de consumo no Brasil e no mundo

3 Inovação e perspectivas futuras

Considerações finais

Referências

Capítulo 2
Panorama do food service e tendências mundiais
1 O segmento e seus nichos

2 Aspectos operacionais

3 Perspectivas de mercado

Considerações finais

Referências

Capítulo 3
Segmentação de mercado e competitividade
1 Identificação dos nichos de mercado, onde atuar e estudo do potencial de crescimento

2 Vantagem competitiva e diferencial competitivo

3 Áreas de atuação e características do mercado

4 Lazer e turismo

Considerações finais

Referências
Capítulo 4
Tendências no mercado de alimentação
1 Praticidade e conveniência

2 Onde estaremos daqui a 20 anos?

3 Alimentação saudável

4 Perfil do consumidor

5 Food design

6 Tecnologia como investimento

Considerações finais

Referências

Capítulo 5
Modelos de negócios
1 Operação e gestão

2 A hora de abrir um negócio

Considerações finais

Referências

Capítulo 6
Ferramentas para o empreendedorismo: Canvas e design
thinking
1 Definição e conceitos da metodologia Canvas

2 Desenvolvimento estratégico

3 A ideia de inovação com base no design thinking

Considerações finais

Referências
Capítulo 7
Perfil do empreendedor e atitudes empreendedoras
1 Tipos de empreendedores, habilidades e o seu papel na criação de novos negócios

2 Empreendedorismo social: intenção, contexto e desafios

3 Atitudes inovadoras, realizáveis e sustentáveis

Considerações finais

Referências

Capítulo 8
Gestão empreendedora, inovação e criatividade
1 Empreendedorismo a partir da gestão da inovação

2 Boas práticas de gestão empresarial para a competitividade

3 Atividades empreendedoras e capacidade criativa

4 Estudo de casos: empreendedorismo em pequenos e médios negócios

Considerações finais

Referências

Sobre o autor
Capítulo 1
História e evolução da gastronomia

Com base em uma reflexão histórica, serão discutidos temas que envolvem a gastronomia
num âmbito social e cultural para que entremos em uma abordagem mais específica sobre
empreendimentos de sucesso. Este primeiro capítulo vai além de uma perspectiva generalizada
sobre a história da gastronomia, elucidando o papel da alimentação na formação social do
homem, desde os nossos ancestrais até os dias contemporâneos. Portanto, não se pretende
elaborar uma reconstrução linear e única a respeito da gastronomia, mas apontar os momentos
históricos em que a comida e seus significados ilustraram relações de poder e dinâmicas sociais
em diferentes culturas.

Durante a evolução do ser humano, a caça, o fogo e o hábito de se alimentar em conjunto


são elementos que representam os primeiros passos para a socialização, ou seja, é por meio da
comida que deixamos de ser hominídeos para nos tornar humanos. Vale lembrar que a
descoberta do fogo e o cozimento da comida foram fatores cruciais para as transformações
cranianas que nos levaram a uma maior complexidade cerebral. Nessa linha de pensamento, não
podemos desconsiderar a presença do imaginário como capacidade de atribuir significados às
coisas e, dessa maneira, a caça, que já era uma atividade coletiva, aparece permeada por rituais e
significados, assim como a preparação da comida e o ato de comer. A partir de então, desenrola-
se a história da humanidade. O imaginário, como será abordado adiante, é a ferramenta para
compreender os desejos e os anseios da humanidade, ou seja, explorar e compreender os
imaginários de cada grupo social é o segredo para a construção de um negócio de sucesso.

Por meio do pensamento de Edgar Morin sobre o imaginário e o processo de hominização,


temas como a comensalidade e sua organização social serão abordados como elementos
indispensáveis para a formação do ser humano como conhecemos hoje. Por uma reconstrução
sobre a alimentação em diferentes períodos históricos, pretende-se não apenas informar, mas
conduzir uma reflexão sobre o papel da comida no decorrer da história ocidental. A proposta do
capítulo seguinte consiste em demonstrar os caminhos para compreender o imaginário de cada
sociedade em relação à alimentação com os olhos voltados a empreendimentos de sucesso que
articulam presente, futuro e tradição.
1 A história da gastronomia: da pré-história ao
mundo contemporâneo
Desde a pré-história, a comida sempre foi investida de muitos significados, além das necessidades
nutricionais. Ela pode expressar opções culturais, emoções conscientes e inscientes, relações de poder, entre
tantos outros significados da comida e do comer (Pérles, 1998). A própria escolha do tipo de alimento que um
povo faz, diferentemente de outro, não apenas por habitar regiões diferentes, dá uma mostra do amplo
significado da alimentação (BORGES, 2010, p. 17).

Em O enigma do homem, Edgar Morin descreve o processo de hominização como


decorrente da relação entre fatores genéticos, ecológicos, práxicos, cerebrais, sociais e culturais.
Entre os fatores cruciais para o processo de hominização, há a atuação de mutações genéticas, a
seleção natural das savanas (fazendo do homem, ao mesmo tempo, presa e predador), o uso de
instrumentos como armas, construção de abrigos e o desenvolvimento da complexidade social. O
homem começa a se diferenciar fisicamente dos demais hominídeos por meio do bipedismo e do
aumento da caixa craniana, assim como pelo surgimento da dialética pé-mão-cérebro, que, para
Morin, é o que liberta o homem do domínio da natureza: o cérebro conduz as mãos que fabricam
utensílios e armas.

Durante a Era Terciária, com o recuamento das florestas e a conflituosa pressão


demográfica, os hominídeos passam a habitar as savanas, onde se locomovem guiados pelos
odores e passam a dividir processos de aprendizagem para sobreviver coletivamente. Esse novo
ecossistema estimula o desenvolvimento de aptidões já existentes nos antepassados da floresta,
como andar e caçar coletivamente. Dessa maneira, os primatas começam a se alimentar da carne
de pequenas presas. A caça, como fenômeno humano, transforma a relação do hominídeo com o
ambiente e com outros indivíduos, sendo ou não da mesma espécie.

PARA SABER MAIS


Assista ao filme Caverna dos sonhos esquecidos para refletir sobre o imaginário pré-histórico.

Figura 1 – A caça representada em pinturas rupestres


A muito longa aventura começa, sem dúvida, pelas predações menores esporádicas dos macacos superiores
onívoros; depois, desde os primeiros homínidas até o homo sapiens, a prática torna-se cada vez mais central,
cada vez mais organizada, cada vez mais organizadora. Passa da caça pequena para a caça média, para a caça
fugitiva e amedrontada para a caça que luta e é perigosa, passa da busca para o acaso e, depois, para a busca
de novo, mas já segundo indícios, do segmento de pistas ao rastejo perseverante, da tática improvisada à
estratégia treinada, das preocupações e dos ardis à engenhosidade da armadilha e da emboscada, das armas
rudimentares e polivalentes às armas bem acabadas especializadas (MORIN, 1975, p. 67).

A caça estimula o pensamento e a capacidade de avaliar, intensificando a relação pé-mão-


cérebro-instrumento apontada por Edgar Morin. Com a capacidade de manusear instrumentos
com precisão e dominar o fogo, ocorrem mudanças anatômicas nos hominídeos, além da
capacidade de dormir profundamente e sonhar durante o sono. São essas características que
levam à complexidade da mente, uma consciência subjetiva de si e dos outros junto ao
desenvolvimento do imaginário.O imaginário surge como resposta a uma consciência subjetiva,
como a capacidade de distinguir o sonho da realidade e de atribuir sentidos e significados a
instrumentos materiais e situações sociais (surgimento de rituais e explicações mágicas).

PARA SABER MAIS


Para se aprofundar neste tema, leia o capítulo “O caçado sabendo caçar”, em O enigma do homem, de Edgar
Morin.

Comer não é um ato solitário ou autônomo do ser humano, ao contrário, é a origem da socialização, pois, nas
formas coletivas de se obter a comida, a espécie humana desenvolveu utensílios culturais diversos, talvez até
mesmo a própria linguagem. O uso do fogo há pelo menos meio milhão de anos trouxe um novo elemento
constituidor da produção social do alimento. A comensalidade é a prática de comer junto, partilhando
(mesmo que desigualmente) a comida, sua origem é tão antiga quanto a espécie humana, pois até mesmo
espécies animais a praticam. A diferença entre a comensalidade humana e a dos animais é que atribuímos
sentidos aos atos da partilha e eles se alteram com o tempo. A comensalidade ajuda a organizar as regras da
identidade e da hierarquia social – há sociedades, por exemplo, em que as mulheres ou as crianças são
excluídas da mesa comum –, assim como ela serve para tecer redes de relações serve também para impor
limites e fronteiras, sociais, políticas, religiosas, etc. Ao longo das épocas e regiões, as diferentes culturas
humanas sempre encararam a alimentação como um ato revestido de conteúdos simbólicos cujo sentido
buscamos atualmente identificar e classificar como “políticos” ou “religiosos”. O significado desses
conteúdos não é interpretado pelas culturas que o praticam, mas sim cumprido como um preceito
inquestionável, para o qual não são necessárias explicações (CARNEIRO, 2008, p. 71-72).

Com o decorrer do tempo, a comensalidade se expressa por meio dos banquetes, exemplo
de alimentação fora do padrão doméstico da época. Esses primeiros banquetes têm a constante
característica de suntuosidade e riqueza; o anfitrião apoia-se no que tem para marcar sua posição
social diante dos seus convidados. Os temas e as motivações por trás dos banquetes variam de
acordo com a região e a época em que ocorrem. Os banquetes são muitas vezes religiosos, mas
também relacionados com épocas do ano de acordo com a produção agrícola e do processamento
de alimentos como vinho, queijo e pão. O significado atribuído ao banquete celebra a
solidariedade entre determinada classe social como aparente nas culturas mesopotâmicas,
egípcia, grega, entre outras sociedades antigas que desenvolveram seus rituais e significados
próprios por meio da comida.

Com a fundamentalização da Igreja Católica e a tentativa de implementar seu modo de vida


nas sociedades, a alimentação passa a ser regulamentada por meio de dogmas religiosos (comida
como pecado, adequação dos horários de refeição, épocas do ano como quaresma, páscoa, etc.) e
pela mentalidade do catolicismo. O mesmo ocorreu com a alimentação em outras religiões: foi se
tornando restritiva e condicionada ao estilo de vida de cada grupo. Com o avanço das
navegações, o paladar europeu começa a se abrir para o leque de opções culinárias de outras
regiões e se apropriar de matérias-primas e técnicas para a constituição de uma culinária própria
do mundo europeu ocidental.

A alimentação no Brasil Colônia reflete um pouco da influência da culinária desenvolvida


nessa época. Gilberto Freyre, em Casa grande & senzala, apresenta a africanização dos brancos
e dos indígenas como consequência da dominação negra da cozinha; a alimentação era preparada
por mulheres negras com técnicas e instrumentos africanos, ingredientes brasileiros e receitas
europeias. Isso é o germe da identidade culinária propriamente brasileira:

Variado era o uso da mandioca na culinária indígena; e muitos dos produtos preparados outrora pelas mãos
avermelhadas da cunha preparam-nos hoje as mãos brancas, pardas, pretas e morenas da brasileira de todas as
origens e de todos os sangues. Da índia a brasileira aprendeu a fazer de mandioca uma série de delicados
quitutes: a farinha fina, de curimã, para o filho pequeno; o mingau; o mbeiu ou beiju. “Conheciam”, escreve
Couto de Magalhães dos indígenas do Brasil, “processos de fermentação pelos quais preparavam excelentes
conservas alimentares e próprias para estômagos enfraquecidos; entre outros, citarei os bolos de carimã, com
os quais quase todos nós fomos alimentados durante o período da nossa infância (FREYRE, 1998, p. 67).

Figura 2 – A realidade nos engenhos de café

Com o decorrer da história, iniciam-se investimentos em pesquisa e desenvolvimento em


relação à produção agropecuária, como consequência das guerras e crises alimentícias,
resultando em novas tecnologias de cultivo, uso intensivo de defensivos agrícolas e fertilizantes,
máquinas adaptadas para uma agricultura tecnológica e novos métodos de manejo agrícola.

A adoção dessas ferramentas, isolada ou conjuntamente, foi a base para a grande mudança no padrão de
produção agrícola, a chamada Revolução Verde. A partir da Segunda Guerra Mundial, as inovações
cumpriram com os seus objetivos: proporcionaram um expressivo aumento da oferta de alimentos e criaram a
cultura da busca continuada por novos indutores da produção, com a premissa fundamental da preservação do
ativo terra (...) No Brasil, a relativa disponibilidade de terras retardou os efeitos locais da Revolução Verde
(BRASIL FOOD TRENDS 2020, 2010, p. 14).
2 A globalização da gastronomia e os hábitos de
consumo no Brasil e no mundo
A partir do período das grandes navegações, produtos estrangeiros passam a ser
incorporados na cultura alimentar e nos hábitos cotidianos dos europeus. Isso pode ilustrar o que
seria o início de uma globalização alimentar: alimentos como a batata, o tomate e as especiarias
introduzidas na alimentação e no cotidiano, como canela e ópio, foram levados para a Europa e
incorporados em sua cultura. As frutas brasileiras, por exemplo, demoraram muito mais para
serem reconhecidas e incorporadas no paladar global (como aconteceu com o consumo do açaí e
da pitaia).

Como toda produção cultural, a gastronomia também está inserida em um contexto


temporal e espacial, além de carregar uma bagagem de costumes. Inovação dentro desse ramo
envolve usar o que temos como costume e conseguir causar pequenas alterações, lembrando que
o hábito alimentar é um dos mais difíceis de ser mudado.

No século XXI, temos um desafio que encontra um apoio: além da globalização dos
alimentos, agora há também a alta difusão da informação e dos costumes. A internet e a difusão
das redes sociais trazem maior ansiedade para o público buscar novas experiências, novos
sabores e entrar em contato com o que ocorre no mundo além do que vemos por perto. Para o
empresário do ramo da gastronomia, isso é vantajoso. Não mais precisamos nos prender ao
comum, ao sempre aceitável. Inovações não só são bem-vindas, como são estratégias de
mercado. São opções que podemos trazer destarte para um negócio.

NA PRÁTICA
Aberto há pouco mais de um ano na cidade de São Paulo, o bar Negroni surgiu em resposta ao recente
crescimento do consumo de coquetéis na cidade e à tradição paulistana de consumir pizza, e uniu ambos em uma
proposta contemporânea.

A era da informação difundiu as diferentes opções alimentares. Por uma foto ou um artigo
de revista, muitas vezes até propagandas, o comensal é motivado a experimentar produtos com
os quais não se vê familiarizado ou mesmo nem considerou como alimento. A curiosidade e a
facilidade de acesso a produtos importados permitem que alimentos diferentes sejam consumidos
no cotidiano. A globalização do alimento, que é apoiada também na prévia globalização dos
ingredientes, já explicada anteriormente, é em si uma oportunidade nova de mercado. Trazer a
variação para o cardápio, seja de maneira explícita, como em cardápios focados em culinária
oriental ampla (japonesa, chinesa, indiana), ou implícita, como os que utilizam técnicas e
ingredientes diferentes para criar uma variedade de produtos com característica própria, é uma
saída para o empreendedor.

PARA SABER MAIS


Um exemplo de inovação foi a churrascaria rodízio, mundialmente conhecida como Brazilian steakhouse. Nesse
caso, um problema de atendimento durante a operação de almoço fez com que o proprietário do restaurante
vendesse qualquer tipo de carne com qualquer acompanhamento pelo preço da carne mais barata, levando as
carnes às mesas ainda no famoso espeto corrido. Aos poucos, isso foi se transformando no que conhecemos como
o rodízio de carnes atual.

O modelo de rodízio foi se aperfeiçoando e logo atingiu o gosto do público brasileiro. Em


uma estratégia de aproveitar dois casos de sucesso, surgiu o rodízio de pizzas. Já havia um
produto amplamente difundido no costume brasileiro, a pizza, e o rodízio como estrutura
aparentemente vantajosa para o cliente.

Um outro exemplo de sucesso é o rodízio de comida japonesa, que, até então, era de difícil
acesso aos brasileiros, devido ao alto custo e ao sabor diferenciado. A comida tradicional
japonesa surgiu no Brasil há tempos, quando os imigrantes desse país conseguiram se apropriar
de uma área urbana paulistana, o bairro da Liberdade. Assim, conseguiram trazer produtos
importados e cultivar produtos de origem nipônica no cinturão verde da cidade. Porém, somente
na década de 1990 a culinária japonesa invade o horizonte gastronômico brasileiro, começando
por São Paulo e pelo estado do Paraná. Como é um tipo de comida servida em pequenas porções
e com grande variedade, em 1990 o restaurante Mariko, no Rio de Janeiro, adotou a prática do
rodízio, tendo aceitação imediata.

Mundialmente, a virada do século foi recebida com uma oferta de produtos de qualidade
superior e a busca pelos alimentos gourmets cresceu, permitindo uma oferta maior de produtos
com alto valor agregado. O cenário brasileiro, então, recebeu essa iniciativa de diversas
maneiras, aprimorando seus produtos. Começou-se a utilizar produtos de qualidade, matéria-
prima mais cara, criando uma preocupação com sustentabilidade e produtos orgânicos e naturais,
o que foi viável economicamente e socialmente abriu uma porta para um novo ramo da
agricultura, que até então era inexpressivo.
No entanto, esse processo não se restringiu a oferecer produtos de qualidade e preço
superior, mas abriu a mente do comensal brasileiro; não só produtos de maior qualidade ou
elevado cuidado de preparo se difundiram como também teve início o consumo de produtos
diferenciados. Começamos a comer novos tipos de carne, cortes a que não estávamos
acostumados; além disso, abriu-se espaço para uma pizza mais tradicional, mais parecida com a
servida na Itália. Ainda, as antigas cantinas italianas deram lugar a restaurantes modernos e a
produtos variados.

Agora com foco no alimento como um costume, devemos lembrar que a sociedade
brasileira, apesar de bastante influenciada pela cultura italiana, tem em sua base o arroz e feijão,
a carne e o acompanhamento. O empresário do ramo deve sempre ter isso em mente: será difícil
agradar e atrair a maioria dos brasileiros sem oferecer essas combinações. Já com uma
mentalidade atual, há uma forte campanha midiática para o incentivo e a formação de novos
hábitos. Empreendimentos baseados em uma nova maneira de comer estão surgindo em larga
escala no país (pizza no almoço, prato executivo de comida japonesa, restaurantes com bufê
inaugurando unidades à la carte, entre outros), mostrando essa tendência.
3 Inovação e perspectivas futuras
A capacidade de explorar e transitar dentro do meio gastronômico reside no fato de que a
alimentação é, ao mesmo tempo, um hábito difícil de mudar e uma fonte de cansaço e mesmice.
Por mais que queiramos manter nossos hábitos, não buscamos sempre as mesmas coisas.
Andamos em uma corda bamba, podendo cair para o lado do desconhecido ou do que é
conhecido demais.

Hoje temos como tendência mundial o cuidado do corpo como cuidado de si, o que reflete
em uma maior atenção ao que se come e a como se come. A questão alimentar na Grécia Antiga
envolvia mais do que o ato de comer: ela se relacionava com a dieta, a saúde, o exercício, a
higiene e era um meio de prevenir e curar doenças em busca do equilíbrio. Para Sócrates, a
política deve promover a felicidade; ser feliz é ter domínio de si mesmo, ser autônomo, racional,
a política se concebe como técnica relacionada à alma. Na linha desse pensamento grego, temos
como tendência uma maior preocupação com a alimentação em relação à esfera política da vida
das pessoas, como um comprometimento com a realidade e uma maior preocupação com a saúde
e a sustentabilidade.

PARA SABER MAIS


Para compreender melhor as influências do pensamento grego nos dias atuais, leia o livro de Platão na coleção
Os Pensadores.

Apesar de todos esses aparentes contrapontos, o mercado gastronômico apresenta uma


dinamicidade ímpar. A influência midiática nos permite envolver diferentes aspectos aos
pequenos costumes sedimentados. Vemos restaurantes que funcionam há dez anos com o mesmo
cardápio e que obtêm sucesso justamente por esse motivo, ao mesmo tempo que, em outros,
encontramos negócios que se apoiam na realidade do slow food, com produtos sazonais e um
cardápio que varia toda semana, ambos atingindo o mesmo público.

Portanto, a gastronomia seguirá a linha de oferecer produtos novos se apoiando em


tendências sociais expressas no mercado. É preciso avaliar o objetivo ao empreender nesse ramo,
uma vez que não adianta investir apenas em costumes antigos, pois o mercado está aberto para o
que é novo. Interessa observar a maneira como há pouco tempo os indivíduos eram apegados a
sua cultura culinária e, atualmente, o costume é ser versátil em relação à alimentação,
transformando em tendência diferentes maneiras de experienciação culinária.

Para as indústrias atentas aos movimentos do mercado, as tendências como “sensorialidade e prazer”,
“saudabilidade e bem-estar”, “conveniência e praticidade”, “confiabilidade e qualidade”, “sustentabilidade e
ética” já fazem parte dos seus produtos, por meio de atributos que ofereçam um diferencial de
competitividade presente nos processos produtivos, nos ingredientes e nas embalagens. Estes, influenciados
pelos diferentes objetivos e tecnologias existentes, além de determinarem fortemente a competitividade do
negócio, hoje também são capazes de, por conta própria, potencializar as vendas por proporcionarem
diferenciais relevantes às marcas e produtos (BRASIL FOOD TRENDS 2020, 2010, p. 14).

Assim, chegamos na relação entre diversidade alimentar e sustentabilidade, desde a questão


da soja e do desmatamento, como o posicionamento político de determinados grupos por meio de
sua alimentação, o crescimento e a valorização de produtos orgânicos que dispensam defensivos
agrícolas, além da preparação orgânica dos solos sem uso de agrotóxicos como uma realidade
próxima. O fato de a qualidade da alimentação estar sendo mais valorizada como parte do
cuidado com o corpo e com a mente traz um novo nicho de mercado e uma maior consciência em
relação à saúde e à sociedade.
Considerações finais
A alimentação é um hábito que, por mais pessoal que seja, se constrói socialmente em
vários eixos: no ambiente familiar ou profissional, de acordo com a região, a etnia e a classe
social. Não é possível conceber a formação da sociedade sem considerar os alimentos, assim
como não se concebe um empreendimento gastronômico sem levar em conta a sociedade no qual
se insere.

Inovações são baseadas em realidades estabilizadas e o empreendedor e gestor do ramo


deve sempre estar atento ao que funciona na nossa sociedade e às tendências que a permeiam
para obter sucesso e até mesmo prever alguns casos de sucesso.
Referências
BORGES, Maria Beatriz Ferarri. Lícito ou ilícito. In: Interfaces: ensaios sobre o feminino. São
Paulo: Memnon Edições Científicas, 2010.

CARNEIRO, Henrique. Comida e sociedade: significados sociais na história da alimentação.


História: Questões & Debates, 2005.

FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala. Rio de Janeiro: Record, 1998.

MORIN, Edgar. O caçado sabendo caçar. In: O enigma do homem: para uma nova
antropologia. Rio de Janeiro: Zahar, 1975.

PLATÃO. Diálogos. São Paulo: Nova Cultural, 2004. (Coleção Os Pensadores).

PROJETO BRASIL FOOD TRENDS 2020. Brasil Food Trends 2020. São Paulo: Fiesp Ital,
2010.

RIBEIRO, Carlos Manoel A.; PAOLUCCI, Luciana. Gastronomia, interação cultural e turismo:
estudo sobre a dispersão da culinária nipônica na cidade de São Paulo – 100 anos da imigração
japonesa no Brasil. In: IV SeminTUR – Seminário de Pesquisa em Turismo do MERCOSUL.
Caxias do Sul: Universidade de Caxias do Sul, 2006.
Capítulo 2
Panorama do food service e tendências
mundiais

Como visto no capítulo anterior, o mercado de alimentos e bebidas é guiado por diferentes
diretrizes. Os costumes na alimentação são um resultado da época em que vivemos somada a
diferentes fatores, como a situação econômica e social do país onde o alimento é consumido, o
ambiente de produção, os hábitos familiares e religiosos da sociedade. A alimentação permeia
uma série de atividades humanas desde a educação infantil, com as merendas e lanchonetes,
eventos familiares, comemorações, até o âmbito profissional, com a alimentação em grandes
eventos. Notamos, assim, que o mercado na área abrange outros aspectos além de simplesmente
vender comida em um restaurante.

Esse mercado polivalente carrega em si benefícios e dificuldades. Aspectos operacionais se


misturam, se modificam e se reestruturam dependendo do nosso escopo. Funções semelhantes,
como compras e estoque; aspectos logísticos equivalentes, como entrega e recebimentos; nichos
de mercado e oportunidades surgem de maneira mais ou menos específica e podem dialogar
entre si. Um olhar atento de um empreendedor resulta no aproveitamento das diferentes nuanças
dos mercados, tornando suas escolhas estratégicas e produtivas.
1 O segmento e seus nichos
Reduzir o mercado alimentício com base no perfil de apenas um consumidor pode não ser
viável no sentido da multiplicidade de procura por alimento. Na sociedade em que vivemos, os
consumidores se encontram em diferentes posições na cadeia econômica, o que depende da
situação, evidenciando a complexidade desse mercado. A seguir, serão designados alguns dos
diferentes tipos de consumidor do alimento, também conhecido por “comensal”, sendo ele
pagante ou não, cliente de um restaurante ou criança de uma família que produz seu próprio
alimento.

Na introdução do livro Empreendedorismo na prática, de José Dornelas, Ozires Silva


aponta essa diversidade de nichos e suas oportunidades:

São muitos outros estudos que geram os conceitos de base para essas ideias e, muitos deles, – consagrados
intensamente pelos estudiosos –, concentram-se na identificação das chamadas “vantagens competitivas” que
podem se conseguidas e exercidas pelo setor produtivo, por pessoas ou países. Aqueles que coletaram e
puderam concertar um maior número dessas vantagens, operando com eficiência e qualidade em nichos de
oportunidade e de mercado identificados, chegaram a conquistar uma boa parcela de sonhados e perseguidos
sucessos (SILVA, 2007, p. 12).

1.1 Escolas infantis


Um dos nichos viáveis de mercado, com características particulares, são as crianças do
ensino infantil. As particularidades desse público seguem uma linha bem específica. Os clientes
são as crianças em si, elas escolhem e pagam pelos produtos. Nesse caso, as peculiaridades são:
as opções de alimentos devem ser limitadas à capacidade de escolha da criança, à diversidade de
costumes presentes em cada família e à dificuldade da criança de experimentar novos produtos.

1.2 Jantares e festas


As empresas especializadas em bufê para jantares e festas são famosas na nossa sociedade.
Nesse caso, o cliente é quem contrata a empresa que fornece os alimentos, e não o comensal.
Suas peculiaridades são: escolha de alimentos que agrade a todos, suas quantidades específicas, o
custo e a logística de produção em larga escala. O propósito de cada evento também deve ser
pensado: se é uma festa de aniversário, o lançamento de um livro, uma premiação ou um jantar
de negócios. A maneira que a comida será servida ou apresentada deve ser coerente com a
proposta do evento, se é um coquetel que acontece de forma dinâmica ou um jantar montado
com serviço onde os convidados vão compartilhar a mesa, se haverá bufê, brindes, etc. E,
principalmente, deve ser considerado o público para o qual o alimento será servido, suas
características, a faixa etária, a classe social e as restrições alimentares.

1.3 Gastronomia hospitalar


Na alimentação hospitalar, observa-se uma produção de alimentos específicos, um maior
cuidado com as compras, diferentes temperos e objetivos. Também nesse caso o comensal se
mescla com o cliente, mas não de maneira direta. O paciente-cliente escolhe o hospital por uma
série de fatores, porém, o mesmo paciente, como comensal, tem seu leque de escolhas diminuído
de acordo com a circunstância (diferentes tipos de doenças e tratamentos, cirurgias e apenas
como acompanhante) que o levou a procurar um hospital. Nesse caso, os fatores que delimitam o
que será servido não são diretamente ligados à vontade de comer e consumir.

1.4 Mercado itinerante de alimentos


Nos dias atuais, o nicho do mercado itinerante de alimentos se mostra muito amplo.
Superando as expectativas de mercado, os food trucks (veículos adaptados com cozinha) e food
bikes (bicicletas adaptadas para servir alimentos) exploram além da comida de rua em seu
formato convencional. Em uma tentativa de minimizar processos logísticos e estruturais, o
alimento itinerante apareceu como serviço de catering (alimentação de evento) e não só está
presente nas ruas, mas também em eventos de diferentes portes, dentro de empresas, em escolas.
Surgiram food truck parks, terrenos onde os trucks estacionam, formando uma espécie de feira,
como a Vila Butantan, em São Paulo. Dessa maneira, a culinária itinerante, além do produto
pronto e de sua estrutura para produção e consumo, alivia os diferentes processos logísticos e de
armazenamento de comida.

Figura 1 – Food park a céu aberto


1.5 Consultorias
Nesse ramo, o produto a ser vendido deixa de ser necessariamente o alimento. Existe no
mercado um nicho específico que procura auxílio e soluções para o desenvolvimento, a gestão e
a administração de negócios. Serviços desse tipo são muito importantes quando desenvolvemos
um negócio de alimentos e bebidas (A&B). Eles podem auxiliar de diferentes maneiras: com o
desenvolvimento de cardápio, a estrutura logística, a contabilidade, o treinamento de equipes, o
recrutamento, entre outros.

1.6 Restaurantes
É o nicho de mercado que carrega um número maior de especificidades. Eles podem variar
em preço, estilo, função social, horários e tipos de alimento. É o modelo de negócio mais geral e
de difícil abordagem. O empreendedor que decide por esse mercado livre e abrangente deve se
atentar a uma série de aspectos que aparecem muitas vezes de maneiras indiretas e mais difíceis
de identificar.

NA PRÁTICA
A Affari é uma empresa especializada em consultoria e treinamento de funcionários em diversas áreas. Focando-
se em comunicação direta e planejamento profissional, ela se responsabiliza por todo o processo de
desenvolvimento de recursos humanos de uma empresa.
2 Aspectos operacionais
O funcionamento do mercado se encontra envolvido em uma série de processos, alguns
específicos da área, outros gerais. Esses processos englobam questões financeiras, contábeis e
gerenciais. A operação desse segmento é geral, complexa e com diferentes especialidades dentro
de um mesmo empreendimento. Dessa maneira, navega-se entre questões de especificidade
técnica e objetivas e questões humanas e subjetivas.

O autor Paul J. Trott, em seu livro Gestão da inovação e desenvolvimento de novos


produtos, resume bem o conteúdo trabalhado em relação aos aspectos operacionais:

A maioria das organizações apresenta itens que são uma mistura de produtos e serviços – por exemplo, um
restaurante oferece um produto (comida) e um serviço (atendimento à mesa). O termo gestão de operações foi
criado para denotar as habilidades e técnicas desenvolvidas em setores de fabricação e serviços no intuito de
auxiliar no apoio à transferência de melhores práticas. Em uma era globalizada de produção e concorrência
em massa, é, frequentemente, o elemento serviço, em qualquer transação, que confere a vantagem
competitiva essencial às operações de fornecimento. O estudo de caso, ao final deste capítulo, mostra como a
produção de um livro é apenas parte da operação que envolve sua publicação e a consequente
disponibilização ao cliente. Logo, a inovação dentro da função operacional é fundamental para atingir os
objetivos estratégicos da organização (TROTT, 2012, p. 114).

Quando pensamos nas questões técnicas, algumas são aplicáveis em todo e qualquer
segmento de A&B. A seguir, apresentamos e comentamos alguns exemplos.

2.1 Matéria-prima
Consideramos matéria-prima em alimentação produtos de origem agropecuária e derivados.
Nesse caso, contamos com aspectos técnicos gerais e específicos.

A validade dos alimentos, os métodos de conservação, armazenamento e fornecimento são


exemplos a serem considerados quando abordamos o aspecto técnico. Dessa maneira, chefes de
cozinha, cozinheiros, nutricionistas, fornecedores e fiscais devem ser guiados por aspectos
científicos e deve ser criado um acordo comum para um sistema funcional no segmento.

Um diferencial do profissional dessa área é justamente negociar aspectos logísticos, levando


em conta questões financeiras, para poder transitar dentro dos padrões exigidos de maneira
flexível, correta e economicamente viável. O empreendedor deve ter isso em mente no processo
de recrutamento: o conhecimento sobre a matéria-prima é essencial e saber como tratá-la,
também.
Existem no mercado diferentes fornecedores que já estão preparados para lidar com
diferentes tipos de negócio. Distribuidores de hortifrúti (hortaliças e frutas) que compram de
produtores e vendem para as empresas do ramo estão capacitados tecnicamente para atender
pequenos restaurantes, hospitais, grandes refeitórios e eventos. O mercado em si exigiu de seus
fornecedores organização para poder atingir ao máximo suas necessidades específicas. Ao entrar
no ramo alimentício, percebemos que esses problemas já estão resolvidos.

2.2 Alimento
Como alimento, consideramos o produto a ser consumido em si. Seja o consumidor cliente
ou o consumidor comensal, o alimento deve agradar a quem o consome. A viabilidade de um
empreendimento na área de alimentos depende diretamente do prazer oferecido com a
experiência, e a qualidade do alimento em si é um dos pontos importantes a serem considerados.

A questões técnicas aqui são inúmeras, mas podem ser resumidas em dois grandes grupos:
transformar e combinar matéria-prima. Portanto, além da questão técnica, devemos considerar
que, independentemente da produção do alimento, há o consumo. Não adianta atentar-se somente
ao aspecto técnico ou ao resultado final. O conhecimento das técnicas aprimora o controle,
porém o que atinge o comensal será somente o resultado disso. Novamente, aqui, dependemos de
uma relação próxima e efetiva entre o profissional da área e sua matéria-prima, além de
conhecimentos sobre como transformá-la, levando em consideração o resultado apresentado ao
consumidor.

NA PRÁTICA
Na Itália dos anos 1980 ocorreu um escândalo decorrente da mistura do vinho com etanol. Tal fato acabou
demonstrando a estreita relação entre a produção de alimentos, a economia do país e o estilo de vida das pessoas.
Ou seja, a enologia não estava apenas conectada com o setor econômico, mas também estritamente relacionada
com a vida das pessoas, principalmente as de classe social baixa, que produziam os vinhos: “gente que cultivava
e transformava, era também a vida dos territórios, a sua fertilidade, o seu tecido social, a sua cultura e o seu
ecossistema” (PETRINI, 2015, p. 16). Segundo Carlo Petrini, a partir desse momento houve uma mudança de
concepção em relação à produção, à responsabilidade social e à concepção do empreendedor sobre o próprio
negócio:

Naquele contexto histórico, repentinamente parecia que nossas degustações, que no início
nos eram revolucionárias pelo modo como nos auxiliavam a despertar os sentidos, assumiram
quase os tons do absurdo. Para que servia examinar os detalhes de uma impressão, um
perfume, uma cor no copo, se nesse meio tempo explodia o vínculo com o território, com a
existência real das pessoas? Se tudo podia ser poluído, adulterado, desnaturado? (PETRINI,
2015, p. 16).
Por meio desse escândalo do vinho, Petrini demonstra exatamente isso: um público
preocupado com o aspecto estético do alimento e empreendedores, com o viés econômico. A
partir de acontecimentos como esse, a gastronomia passa a conquistar um território para se
firmar como ciência e técnica:
Muitos anos depois, tornou-se urgente reformular essa ciência, para que se tornasse holística,
interdisciplinar, em condições de abraçar todo o saber, mas também o ser que está por trás de
cada alimento. Não só gosto, porque era inconcebível limitar-se a experimentar, diante do
drama dos vinhateiros obrigados a se ajoelhar pelo escândalo do metanol. Não só economia,
porque pensar a gastronomia unicamente do ponto de vista dos negócios é estritamente
funcional e equivale a se enganar, exatamente como inebriar-se com o aroma de frutos
silvestres de um buquê do Sauvignon, cujo cheiro remete tipicamente a urina de gato.
(PETRINI, 2015, p. 18)

Atualmente, existem faculdades e cursos de gastronomia que oferecem um olhar tanto técnico como criativo para
a produção de alimentos. O profissional que tem essa formação pode auxiliar na organização de estoque, compras
e contas, não necessariamente sendo essencial para o processo criativo e de desenvolvimento de produtos. O
cuidado e a produção de alimentos deve envolver profissionais com diferentes capacidades e funções. Algo que o
empreendedor deve ter em mente no processo de recrutamento.

2.3 Pesquisa
A pesquisa é outro fator indispensável para a manutenção de um empreendimento
duradouro. É importante estar sempre atento a novas tendências de mercado e diferentes
características dos consumidores. De acordo com Donald Cooper, no livro Métodos de pesquisa
em administração, em relação à pesquisa e às táticas em restaurantes:

A pesquisa em administração também pode ser usada para ajudar um gestor a decidir qual das diversas táticas
tem maior probabilidade de realizar a estratégia desejada com sucesso. No exemplo anterior, o gerente do
restaurante pode ter alterado o cardápio (tática de marketing) para incluir entradas que poderiam ser
preparadas com maior rapidez (tática operacional) e servidas em menos tempo. O gerente também poderia ter
instituído um novo programa de treinamento (tática de RH) para implementar uma nova estrutura de
atendimento de mesas por zona (tática operacional), juntamente com um novo programa de incentivo de
vendas (tática de RH) que desencorajasse a equipe de garçons a jogar conversa fora com os fregueses e
recompensasse o trabalho em equipe e a eficiência. Todos os exemplos anteriores demonstram os propósitos
da pesquisa em administração: Identificar e definir oportunidades e problemas. Definir, monitorar e refinar
estratégias. Definir, monitorar e refinar táticas. Melhorar nosso entendimento acerca dos vários campos da
administração (COOPER, 2016, p. 10).

2.4 O humano
Outro aspecto que permeia todo o segmento A&B é o fator humano. Como já abordado,
esse fator é um dos que mais podem trazer complexidades para um empreendimento. Lidamos
com um aspecto íntimo do comensal que é a fonte de prazer. Quando, por exemplo, abrimos um
restaurante, devemos considerar todos os modos de atingir as individualidades, como o ambiente,
a música, a localidade, as opções do cardápio, o atendimento, entre muitas outras. Assim, o
cliente que não vai necessariamente consumir o alimento também deve ser considerado. O
cuidado com esse fator, em negócios de alimentação, deve ser aplicado na gestão operacional da
equipe.

Em relação às organizações no ambiente de trabalho, Kevin Ashton, no livro A história


secreta da criatividade, desenvolve uma comparação entre o comportamento infantil e o adulto
no momento de tomar decisões:

A divisão entre palavras e ações persiste no local de trabalho, onde os grupos resolvem problemas falando –
ou “planejando” – até que concordem com relação ao que acham ser a melhor resposta; só depois agem. As
crianças não fazem reunião na escola; elas descobrem a sua existência quando ficam adultas, no trabalho (...)
[sobre uma dinâmica em equipe proposta em uma experiência] todas as crianças que fazem parte da equipe
constroem e experimentam, comparam resultados, aprendem umas com as outras e criam em comunidade
assim que o relógio começa a marcar o tempo. Não discutem antecipadamente. Só vão adiante. Todos os
adultos numa equipe não fazem nada nos primeiros minutos, porque, em vez disso, estão falando; e a maioria
deles não faz nada além de olhar – ou “administrar” – outra pessoa (ASHTON, 2016, p. 214).
3 Perspectivas de mercado
Como citado anteriormente, as oportunidades e as ameaças dentro do ramo da alimentação
se misturam. Dessa forma, o que ameaça um negócio, quando detectado previamente, pode
originar uma oportunidade. Por exemplo, as pizzarias podem ser prejudicadas pela diminuição do
consumo de produtos com glúten, mas também surge a oportunidade de atender a demanda de
produtos sem glúten e, assim, destacar-se para esse público específico.

Atualmente, o aumento da preocupação com o que se consome é uma tentativa de entender


e aprender as diferenças entre os alimentos para controlar o efeito deles na saúde e no bem-estar.
O empreendedor deve levar essa nova demanda em consideração quando desenvolve um
negócio. Se seu público-alvo tem como tendência a procura por alimentação saudável, é possível
encarar isso como uma oportunidade, e não como uma ameaça. É uma questão de ponto de vista
que pode ter resultados positivos se houver embasamento técnico e percepção social que
possibilitem uma ideia prévia de um modelo de consumo.

Há uma variação contínua no quanto um alimento pode ser sau-dável. Enxergando dessa
maneira, é possível atingir aos poucos um acordo entre o saudável, o saboroso e o
economicamente viável. É assim que adversidades podem se tornar oportunidades.

Bons exemplos disso são histórias contadas por Carlo Petrini no livro Comida e liberdade:
slow food – histórias de gastronomia para a libertação. No início do livro, o autor descreve
como surgiu a Arcigola, movimento anos depois denominado slow food. Petrini descreve, por
meio de suas experiências nos Estados Unidos, a maneira que ameaças ao mercado se
desenvolveram como tendências bem aproveitadas:

Tive a oportunidade de descobrir fenômenos emergentes que já se tornaram tendências reais norte-americanas
e internacionais; de pensar sobre a relação entre comércio e identidade, e de entender como, para cada
tendência negativa que surgir, sempre ocorre algo contrário que está perfeitamente em condições de subverter
a ordem aparente das coisas. É chocante o quanto aquela sociedade pode mudar rapidamente, quanto se
percebe que a pátria do fast food e da agricultura industrial, aquela que nos “presenteou” com tantos daqueles
elementos que tornaram o sistema mundial do alimento o grave problema que é hoje (organismos
geneticamente modificados – OGM, híbridos comerciais, DDT, pesticidas como a conversão da produção de
armas, etc.), seja ao mesmo tempo a terra em que o conceito de tradição e de biodiversidade se desenvolvem
com maior velocidade, em formas muito criativas que sabem doar uma perspectiva totalmente diferente ao
eurocêntrico que se alberga dentro de cada nativo do Velho Continente. (PETRINI, 2015, p. 101)

Outro exemplo é o bom aproveitamento da difusão de informação por meio de redes sociais.
Podemos saber o que é consumido ao redor do mundo, como se diferencia e se assemelha com o
que nos é de costume. O comensal está mais curioso e aberto a novas experiências. O diferencial
é uma oportunidade importante no cenário atual e tem várias nuanças. Por exemplo, podem-se
mudar:

Produtos, que o comensal buscará por ser diferente.

Técnicas, que o comensal nem mesmo perceberá conscientemente, mas seu paladar vai
aceitar melhor.

Combinações, que o comensal buscará por estar curioso.

Ambientes, o que chamará mais atenção antes mesmo do alimento.

Paradigmas alimentares, como comer com as mãos ou comer em pé.


Considerações finais
Concluímos neste capítulo que o sucesso vai muito além do conhecimento teórico e de uma
boa seleção de equipe. São diversos os fatores que influenciam e movimentam o mercado da
gastronomia e, para um empreendimento crescer, é preciso muito trabalho, estudo e atenção ao
que acontece ao redor. José Dornelas aponta a seguinte característica do setor, como resultado da
análise de dados da pesquisa com empreendedores envolvidos no próprio negócio que são sócios
ou responsáveis pela gestão há pelo menos cinco anos:

A experiência anterior no ramo ou em atividade correlatada é fator fortemente presente entre as


características dos empreendedores de sucesso. Considerando ambas as situações, em mais de 60% dos casos
de sucesso a experiência anterior foi relevante. Essa constatação é condizente com muitos outros estudos
internacionais e ratifica o fato de empreendedores que conhecem o ramo onde atuam terem mais chances de
sucesso. Neste âmbito, além da preparação técnica e profissional, em muitos casos a experiência auxilia o
empreendedor a conhecer o mercado, suas falhas e demandas, levando-o a perceber e aproveitar
oportunidades (DORNELAS, 2007, p. 34).

Reforçando o pensamento sobre experiência e percepção no mercado para desenvolver


negócios inovadores e bem-sucedidos, concluímos o capítulo com mais uma experiência descrita
por Petrini a respeito dos hábitos alimentares dos norte-americanos nos anos 1980:

Difícil encontrar uma cerveja diferente das duas ou três grandes marcas industriais principais, impossível
comer um queijo que não trouxesse o gosto do plástico em que estava embalado; as hortaliças geralmente,
sobretudo nas grandes cidades, não tinham gosto, eram seriais como um parafuso poderia ser. (PETRINI,
2015, p. 101)

Em paralelo, temos a questão da cerveja e o surgimento de oportunidades que refletem


muito o momento em que a cerveja brasileira se encontra:

Entretanto, a coisa que mais me surpreendeu naquela viagem foi conhecer a nascente diversidade das
microcervejarias e das cervejas locais, que julguei exemplares. Garrett era mestre cervejeiro desde a fundação
da Brooklyn Brewery havia onze anos, uma marca quase impossível de não ser encontrada em Nova York,
presente em quase todos os bares e restaurantes. Na época, essa cervejaria ainda não era tão poderosa, tinha
dimensões médias e conservava muitas características do verdadeiro artesanato. Ao contrário, hoje é muito
grande e seus produtos são distribuídos de forma capilar, se bem que não seja quase nada em comparação
àquelas duas ou três marcas industriais de que eu me lembrava como as únicas cervejas disponíveis nos
Estados Unidos (PETRINI, 2015, p. 103).

Com isso, percebe-se que o olhar fixo em algum aspecto do ramo gastronômico pode
parecer suficiente, mas também pode ser um equívoco. Um empreendimento deve sempre
considerar as diferentes nuanças para se posicionar e, consequentemente, manter-se no mercado.
Renovar e buscar profissionais qualificados e diferenciados é um ponto crucial. Abrir os olhos
para o mundo ao redor e entender o consumidor como parte da sociedade pode ajudar a perceber
potenciais comerciais que não são tão claros e tampouco óbvios. A polivalência do mercado de
alimentos deve ser aproveitada no sentido de criar oportunidades de produção e consumo, para
que se adéquem a uma sociedade consumidora e obtenham sucesso.
Referências
ASHTON, Kevin. A história secreta da criatividade. São Paulo: Sextante, 2016.

COOPER, Donald; SCHINDLER, Pamela. Métodos de pesquisa em administração. 12. ed.


Porto Alegre: AMGH, 2016.

DORNELAS, José. Empreendedorismo na prática: mitos e verdades do empreendedor de


sucesso. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.

PETRINI, Carlo. Gastronomia libertada e libertar a diversidade. In: Comida e liberdade: slow
food – histórias de gastronomia para a libertação. 2. ed. São Paulo: Editora Senac, 2015.

TROTT, Paul J. Gestão da inovação e desenvolvimento de novos produtos. 4. ed. Porto


Alegre: Bookman, 2012.
Capítulo 3
Segmentação de mercado e competitividade

Como abordado nos capítulos anteriores, as possibilidades de atuação no mercado


gastronômico são inúmeras. Não só podemos buscar nichos diferentes como encontrar em cada
um deles variedades de público-alvo. Seja por idade, classe social, sexo, entre outras, o
empreendedor possui infindáveis possibilidades de se posicionar.

Porém, a escolha de uma área para desenvolvimento deve considerar as atividades


envolvidas e não se basear somente na relação demanda/oferta. O mercado pode, sim, estar
saturado em alguns aspectos, mas isso não é motivo suficiente para deixarmos de empreender. O
inverso também é valido: uma grande demanda não garante um empreendimento bem-sucedido.
Vamos ver neste capítulo que se posicionar no mercado de maneira estratégica é essencial, ainda
que pareça complexo. Avaliaremos alguns dos nichos atuais e também os que se mantêm
perenes. Depois disso, será proposta uma análise de potencial de crescimento, descrevendo os
aspectos importantes a se levar em conta nesse processo.

Segundo o autor José Dornelas, no livro Empreendedorismo na prática:

Em relação à falta de planejamento formal, há pesquisas recentes realizadas internacionalmente que mostram
que o planejamento inicial do negócio dificilmente reflete o que a empresa realmente será nos próximos
meses ou anos. Esses empreendedores que não fizeram um planejamento detalhado aparentemente se
encaixam nessa categoria e passam a aperfeiçoar seu planejamento com o tempo, de acordo com a
necessidade. Na verdade, mais importante que um plano de negócios completo no início é ter a consciência
de que esse plano de negócio deverá ser atualizado com muita frequência e que não deve ser considerado uma
receita pronta e acabada. O empreendedor experiente e conhecedor das dificuldades de se gerenciar um
negócio próprio acaba por equilibrar a necessidade do planejamento formal com a de fazer sua empresa
crescer rapidamente e encontrar um equilíbrio entre o ótimo e o bom ou necessário (DORNELAS, 2007, p.
43).

Veremos com mais detalhes os aspectos operacionais de um negócio na área de alimentos e


bebidas e como essas operações podem ser desenvolvidas de maneira mais eficiente. Com esses
dados em mãos, discutiremos as perspectivas de mercado e as tomadas de decisão que podemos
ter na posse desses conhecimentos.
1 Identificação dos nichos de mercado, onde
atuar e estudo do potencial de crescimento
Identificar como agir no mercado não é tão simples como parece. Um empreendimento
pode abordar diferentes nichos, concentrar produtos que alcancem clientes de diferentes tipos.
Portanto, quando percebemos o potencial do empreendimento, devemos analisar como pode se
encaixar dentro de uma relação de oferta e demanda.

Começamos fazendo a relação sobre a região e a estrutura onde o negócio acontecerá. Esses
são fatores importantes, pois o local de um comércio gastronômico normalmente dita seu
público-alvo e a estrutura física que vai limitar a oferta, em quantidade e tipo de alimento.

Determinando o que e onde vender, passamos a entender para quem vamos vender, o poder
aquisitivo desse consumidor, seu grupo social, horários e dias de funcionamento do negócio.
Tudo isso depende do nosso público-alvo, e todos esses itens alterarão, por exemplo, o preço
praticado. Podemos pensar em um lugar que funcione em um bairro comercial e que sirva
somente almoço, pois durante a noite os consumidores estão em suas casas, em bairros
residenciais.

Outro exemplo de empreendimento adaptado às demandas da região é o Mano, restaurante


em Pinheiros, São Paulo, do mesmo grupo do restaurante Nou. O Mano é uma sanduicheria que
foi montada na mesma rua do restaurante Nou. A proposta é vender lanches de qualidade a
preços justos oferecendo uma logística mais dinâmica, na qual os pedidos são feitos e retirados
no balcão e as bebidas expostas em geladeiras nas quais os clientes podem se servir. É
interessante observar nessa empreitada como as necessidades do mercado foram atingidas: em
um bairro onde se localizam grandes empresas, como subprefeitura de Pinheiros, Editora Abril,
Centro Cultural Britânico e Instituto Tomie Ohtake, existe uma grande demanda por refeições de
qualidade, rápidas e a preços acessíveis no almoço executivo. Da mesma maneira, é interessante
observar a sagacidade dos sócios em perceber que, uma vez que o restaurante estava sempre
lotado e com espera, abrir um negócio a uma quadra de distância, que oferece um produto
semelhante, mas com uma proposta diferenciada, poderia ser uma solução para atender toda a
demanda de clientes.

Assim que um negócio se estabiliza, existe a possibilidade de expansão da empreitada, o


que pode acontecer de diferentes maneiras, como atender eventos no horário noturno. Expandir
não necessariamente se aplica a um empreendimento específico. Supondo uma demanda alta por
um serviço de almoço que, por apresentar bons resultados, não necessita de mudanças, apresenta-
se então a oportunidade de um novo negócio nas imediações. Caso queira expandir, desenvolva o
projeto de um segundo restaurante que atinja um público novo, mudando-se temas, preços,
ambiente e outros fatores. Pode-se alimentar a competitividade e lucrar sendo um aparente
concorrente.

De novo, percebemos o que vem sendo discutido: é na percepção do mercado que


encontraremos onde e como empreender, para onde seguir e até mesmo a hora de mudar a
estratégia. A seguir, abordaremos conceitos e fundamentos e analisaremos alguns casos de
sucesso.
2 Vantagem competitiva e diferencial
competitivo
Antes de analisar o mercado, seus nichos e opções de desenvolvimento, vamos discutir dois
conceitos importantes: o de vantagem competitiva e o de diferencial competitivo.

Não adianta levar em conta somente demanda e oferta quando decidimos empreender, pois
independentemente delas, devemos ser competitivos. Algumas estratégias se aplicam nesses
casos e alguns conceitos devem ser considerados.

2.1 Vantagem competitiva


Esse conceito se refere à vantagem que um empreendimento tem diante de seus
concorrentes; é um grupo de fatores que, juntos, definem o valor de uma empresa e de um
produto. Um exemplo é um bar que vende uma cerveja específica a preço mais baixo, o que se
tornou possível com parcerias. O fornecedor cobra menos, aumentando a lucratividade, e vende
com exclusividade, o que valoriza seu produto. A experiência dentro do mercado ajuda a
perceber suas pequenas nuanças vantajosas.

Segundo Thomas Bateman e Scott Snell, no livro Administração: série A, a vantagem


competitiva está diretamente relacionada a aspectos operacionais como os citados nos capítulos
anteriores e, principalmente, à capacidade de inovar.

A chave está na vantagem competitiva de que goza uma determinada empresa e em sua capacidade de
sustentar tal vantagem. Os bons gestores sabem que estão em uma luta competitiva pela sobrevivência e pela
vitória. Para sobreviver e vencer é preciso conquistar vantagem sobre os competidores e lucrar. Conquista-se
essa vantagem competitiva superando os concorrentes na realização de coisas de valor para os clientes. Mas o
que isso quer dizer? Para obter êxito, os gestores precisam fornecer os vetores fundamentais do sucesso:
inovação, qualidade, serviço, velocidade e competitividade em custo (BATEMAN; SNELL, 2012, p. 9).

2.2 Diferencial competitivo


Esse conceito muda, pois aqui o empreendimento e/ou o produto, em vez de tirar vantagens
da concorrência, desenvolve suas próprias vantagens. Assim, cria-se um diferencial atrativo,
como a melhoria na qualidade de um produto que pode aumentar sua possibilidade de vendas. O
mercado gastronômico é um comércio, ou seja, depende das vendas, mas também envolve
manipulação e produção, como uma indústria, e envolve aspectos de hotelaria, eventos,
arquitetura, linguagem, publicidade e muitos outros. Essa complexidade de processos aumenta a
possibilidade de diferentes vantagens e torna o mercado mais competitivo se esses vários
aspectos forem abordados adequadamente.

O diferencial competitivo pode ser encontrado também na comunicação entre os sócios e os


gestores da empresa, ou seja, reuniões, grupos de e-mail ou mídias sociais são essenciais para
que haja esse tipo de coerência e compreensão nas escolhas tomadas pela empresa. No livro
Redes de cooperação empresarial: estratégias de gestão na nova economia, Balestrin e
Verschoore apontam:

Nesse sentido, um segundo instrumento para a tomada de decisões relevantes em colegiado é a reunião geral
de associados, conhecida também como assembleia da rede. Nela, os representantes de todas as empresas são
convocados para discutir e deliberar sobre o andamento das ações referentes aos objetivos que a rede almeja
alcançar. A reunião geral de associados tem outras funções. Ela monitora a implementação das estratégias e a
consecução dos objetivos, por meio da avaliação comparativa entre os indicadores e os resultados alcançados
pela rede. É importante que essas decisões sejam tomadas com a participação dos associados, pois só assim a
rede de cooperação exercerá efetivamente seu maior diferencial competitivo: a capacidade e a sinergia do
grupo na busca de objetivos comuns. Além do mais, as decisões tomadas em assembleia devem ser assumidas
por todas as empresas envolvidas, ainda que ausentes ou discordantes, prezando pela busca constante do
consenso e evitando votações que desunam o grupo de associados (BALESTRIN; VERSCHOORE, 2016).
3 Áreas de atuação e características do mercado
O mercado gastronômico se transforma constantemente, diferentes inovações descobrem
novos nichos e alteram suas características e possibilidades. Dessa maneira, surgem novas
opções e tendências, como a alimentação itinerante, ou opções exclusivas.

Inovação é a introdução de novos bens e serviços no mercado. Sua empresa precisa adaptar‐se a mudanças
das demandas dos consumidores e a novos competidores. Os produtos não vendem para sempre; aliás,
justamente porque tantos competidores introduzem novos produtos o tempo todo, já não vendem mais por
tanto tempo quanto antes. (...) A inovação é o Santo Graal de nossos dias. E, assim como outras fontes de
vantagem competitiva, ela vem das pessoas, deve ser uma meta estratégica e precisa ser corretamente gerida.
(BATEMAN; SNELL, 2012, p. 9).

NA PRÁTICA
As paletas mexicanas surgiram repentinamente e se difundiram pela cidade de São Paulo, porém, em menos de
dois anos, quase não víamos mais lojas com esse tipo de produto. O que fica evidente aqui é a diferença entre
tendência e modismo. Este último tem duração mais curta e não evidencia um comportamento de consumo.

3.1 Casual food e franchising


Percebemos, com a virada do milênio, a demanda por uma alimentação acessível, rápida,
mas que não se encaixa no padrão de qualidade do fast food. Modelos desse tipo chegaram ao
Brasil praticamente prontos. Redes como Outback, Applebee’s, Abraccio, entre outras, aparecem
no mercado oferecendo um produto diferencial em vários aspectos, tanto para o cliente como
para o empreendedor.

Para o cliente, a casual food oferece uma opção de alimentação segura no cuidado com o
alimento, na qualidade de matéria-prima e na elaboração do produto, além de manter o padrão
rápido de serviço.

O sistema de franchising oferece a venda de licenças, estrutura e logística para o


desenvolvimento de filial de uma empresa. Para o empreendedor franqueado, as redes oferecem:
implementação do estabelecimento, recrutamento e treinamento de brigada, auxílio com
aquisição de matéria-prima, pesquisa de mercado e outras vantagens que mantêm o negócio em
constante evolução.

A excelência também se aprimora quando as empresas ajustam bens e serviços aos desejos de um consumidor
individual. As opções da Starbucks dão aos consumidores literalmente milhares de variações de bebidas: com
ou sem cafeína, com leite desnatado ou de soja, doses de expressos e uma variedade de xaropes aromatizados.
Os compradores de carros podem usar a internet para optar entre centenas de características para “fazer o
próprio” Mini Cooper, indo até a cor da luz do velocímetro. E, por um preço especial, os amantes de doces
podem eles mesmos criar as mensagens de seus confeitos M&M’s (BATEMAN; SNELL, 2012, p. 9).

Sobre esse ramo, é interessante perceber a lucratividade que elas apresentam aqui no Brasil.
Ao entrar no nosso mercado, eles focaram no público que pode pagar mais caro. Em outros
países, a margem de lucro é significantemente menor. Isso fica claro quando vemos que, de
acordo com o semanário Meio & mensagem, no caso do Outback, nove das dez unidades mais
lucrativas do mundo estão no Brasil.

Atualmente, esse segmento está bastante ocupado, porém sempre existe espaço para novos
empreendimentos se sua proposta for coerente, inovadora e embasada em percepções e pesquisas
de mercado.

3.2 O renascimento da coquetelaria


O mercado da coquetelaria sempre esteve relativamente inacessível em larga escala para o
brasileiro. Por experiência própria, observamos que os preços altos das bebidas, por motivos
como os impostos, fizeram com que a procura por bebidas alcoólicas no Brasil fosse direcionada
a cervejas, principalmente as mais acessíveis. Antes da ampliação da coquetelaria no Brasil,
observou-se essa tendência já com a caipirinha. Diferentes bebidas e diferentes frutas começaram
a aparecer para compor o coquetel brasileiro, inicialmente à base de limão e cachaça.

Devido a estratégias de marketing desenvolvidas inicialmente no exterior, alguns drinks


começaram a aparecer com maior frequência na mídia e nas redes sociais, o que, como vimos em
capítulos anteriores, é significativo para influenciar o consumo. Um bom exemplo é o Aperol
Spritz, drink à base de um aperitivo, o Aperol, elaborado por seu distribuidor, que trabalhou sua
divulgação nos pontos de venda.

Figura 1 – Aperol Spritz


Esses fatores unidos abriram o mercado brasileiro para bares especializados em coquetéis,
oferecendo opções clássicas e autorais. Esses bares cresceram apoiados em vantagens e
diferenciais competitivos, como:

Selando parcerias com fornecedores e marcas de bebida.

Oferecendo alguma comida diferenciada.

Preço baixos.

A imagem de um bartender como profissional de referência.

3.3 Gelaterias
Pensar em sorveteria no Brasil é pensar em sorvete por quilo, com uma série de coberturas e
confeitos, na casquinha. Víamos esse tipo de sorvete dentro de clubes, em lojas de rua,
shoppings, padarias, escolas, entre outros locais. No início do século, o gelato italiano começou
a ser expressivo em São Paulo, tendência que foi acompanhada nas diferentes regiões do país,
principalmente nas capitais, primeiro aparecendo com algumas marcas exclusivas e, em seguida,
com o desenvolvimento de redes de franquias, sejam elas regionais ou mais amplas.

Hoje em dia, o consumo desse produto é maior que sua modalidade antiga. Lojas enchem
aos domingos, fecham tarde, abrem cedo e se mostram lucrativas. Apesar de seguirem o mesmo
padrão, apresentam uma série de diferenciais competitivos, como casquinhas feitas na hora,
sabores da estação, preços promocionais, entre outros.

Filiar-se a uma rede de franqueados parece ser a melhor opção nesse caso: o sorvete torna-
se competitivo e de qualidade. Pouco é feito em marketing, a divulgação é boca a boca e, para
isso, o produto deve ser de alto padrão, garantindo a fidelização do cliente. Na entrevista
publicada em junho de 2017 na revista Pequenas empresas & grandes negócios, Eduardo
Weisberg, empreendedor na área de sorvetes, aponta para as tendências e as marcas inovadoras
no Brasil:

Continuam sendo os sorvetes premium aqueles diferenciados. Sorvete com foco funcional, por exemplo, é
uma tendência mundial. Trabalhar com frutas do Brasil também é uma ótima oportunidade. Há uma grande
diversificação no mercado. As sorveterias e gelaterias vão muito atrás do lançamento de novos produtos. Nós
estamos cada vez mais recuperar melhor esses lançamentos. Quanto ao negócio, já tivemos um nicho das
iogurterias, das paleterias... Não tem como definir. As gelaterias, por exemplo, são uma tendência, mas que
vão continuar em alta. O brasileiro começou a gostar do gelato e entender que a qualidade do produto é
fundamental. (...) Hoje em dia, o pessoal que está fazendo coisas diferentes dos outros já estão inovando A
tendência é ser diferente. Se você vai em um supermercado, todos os sorvetes são similares. Se diferencia
aquele que faz um produto de altíssima qualidade, produtos distintos ou algum nicho específico. Tem a
Whaka Whaka, com um sorvete à base de água, a Diletto, com um produto mais premium, a Rochinha, com
as frutas. Depende da empresa e de seu foco. Cada um tem que sobressair de uma forma, nosso maior produto
é satisfazer o cliente (DUARTE, 2017).
4 Lazer e turismo
Está se percebendo no mercado uma diferente forma de consumo. Eventos em torno de
alimentos e bebidas surgiram e estão se difundindo pelo mundo inteiro. Esses eventos vão de
simples feiras até grandes realizações, com participação de diferentes empresas do ramo e tendo
como alvo tanto profissionais do ramo como consumidores leigos.

O turismo também se beneficia, uma vez que existem diversas regiões especializadas em
algum produto de consumo, como vinhos, queijos, carnes, pães e outros. Existem estratégias de
movimentação de turistas com base nessas capacidades. Sobre o turismo gastronômico no Brasil,
Marina Rossi Ferreira aponta:

Durante toda a história, o território brasileiro foi palco do encontro entre diversas culturas, da população
nativa indígena às diferentes correntes imigratórias que chegaram ao nosso país. A gastronomia brasileira é
fruto do conjunto da diversidade dessas heranças históricas influenciada por nossa ancestralidade indígena,
africana, portuguesa e de outros fluxos imigratórios, além das variações regionais, influenciadas também
pelas diferenças de clima e geografia. No Brasil, com o fluxo migratório, culturas foram se misturando e
alterando a cultura e a gastronomia, processo que dura até hoje (FERREIRA, 2016, p. 95).

NA PRÁTICA
Apesar de não ser muito reconhecida, existe uma região do estado de São Paulo especializada em vinhos. As
cidade de Vinhedo, Jundiaí e Jaú se uniram e desenvolveram a rota do vinho, com eventos, jantares e, claro,
venda da bebida.

Há também grandes feiras de produtos e tecnologia voltados para a gastronomia, que trazem
para as grandes capitais muitos turistas em busca das novidades do mercado. Seguem
depoimentos coletados na pesquisa de José Dornelas sobre empreendedores de sucesso:

Pura intuição. Quando deu o start, resolvi abrir e sempre achei que daria certo. Já tinha grande experiência no
ramo e uma carteira de clientes. Além disso, amo que faço. (Empreendedor do setor de turismo)

(...)

Na verdade, na avaliação para aquisição do negócio, considerei a localização e vi outras pessoas prosperarem
nos negócios ao lado do restaurante. Eu sabia que muitas pessoas trabalhavam nos escritórios e que isso
garantiria uma clientela cativa no horário de almoço. Não tinha nenhum planejamento prévio e assim assumi
um risco que considerava calculado. (Empreendedor do setor alimentício)

(...)

Sempre procuro saber bem onde pôr os pés, não faço suposições e otimizo ao máximo meus recursos (..) Sou
bom observador e estudo bem o negócio antes de investir. Procuro sempre fazer três perguntas: 1) Quem é
meu cliente?; 2) Por que meu cliente vai comprar meu produto?; 3) Como devo executar o projeto?
(Empreendedor do ramo de turismo) (DORNELAS, 2007, p. 41-42)
Considerações finais
Atualmente, o mercado gastronômico se vê como um atrativo em si, o que abriu portas para
um novo mercado: eventos em torno da alimentação que agregam venda de comidas, palestras,
bebidas, livros, equipamentos, entre outros. Discutir e aprender sobre comida também é um novo
mercado que cresce ano após ano. O mercado está cada vez mais aberto para absorver essas
realidades e tem se mostrado capaz disso. Um olhar atento para as vantagens e os diferenciais do
mercado são essenciais para que consigamos ser competitivos.
Referências
BALESTRIN, Alsones; VERSCHOORE, Jorge. Redes de cooperação empresarial: estratégias
de gestão na nova economia. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2016.

BATEMAN, Thomas S.; SNELL, Scott A. Administração: série A. 2. ed. Porto Alegre:
AMGH, 2012.

DORNELAS, José. Empreendedorismo na prática: mitos e verdades do empreendedor de


sucesso. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.

DUARTE, Débora. Confira as tendências para o mercado de sorvetes. Pequenas empresas &
grandes negócios, Rio de Janeiro, 2017. Disponível em:
<http://revistapegn.globo.com/Administracao-de-empresas/noticia/2017/06/confira-tendencias-
para-o-mercado-de-sorvetes.html>. Acesso em: 12 abr. 2018.

FERREIRA, Marina Rossi. Turismo e gastronomia: cultura, consumo e gestão. Curitiba:


Editora InterSaberes, 2016.

PORTER, Michael E. Competitive advantage: creative and sustaining superior performance.


New York: Free Press, 1985.

ROCHA, Roseani. Outback comemora 15 anos de Brasil. Meio&mensagem, n. 1535.


Disponível em: <http://www.meioemensagem.com.br/home/marketing/2012/11/12/outback-
celebra-15-anos-de-brasil.html>. Acesso em: 23 out. 2017.

STUTZ, Frederick P.; WARF, Barney. The world economy: resources, location, trade and
development. 5. ed. London: Pearson Education Incorporated, 2007.

VASCONCELOS, Flávio C.; CYRINO, Álvaro B. Vantagem competitiva: os modelos teóricos


atuais entre estratégia e teoria organizacional. In: Revista de Administração de Empresa, v. 40, n.
4, 2000. Disponível em: <http://rae.fgv.br/rae/vol40-num4-2000/vantagem-competitiva-modelos-
teoricos-atuais-convergencia-entre-estrategia-teori>. Acesso em: 11 out. 17.
Capítulo 4
Tendências no mercado de alimentação

Observou-se, até então, como a alimentação se desenvolveu na sociedade, como ela se


organiza para seus consumidores e como a relação oferta/demanda influencia a direção do
mercado gastronômico e o consumo alimentício. Este capítulo consiste em uma análise geral
desse caminho e uma perspectiva para os próximos anos, apontando uma possível direção para o
segmento da alimentação e seu consumidor.

Como veremos adiante, o sucesso no mercado gastronômico é estritamente relacionado à


criatividade e à inovação. A capacidade de lidar com as adversidades com inteligência e
sagacidade são importantes características para se tornar um empreendedor de sucesso. No livro
A história secreta da criatividade, Kevin Ashton aponta para os processos fracassados na
criação:

A criação não é um momento de inspiração, e sim uma vida inteira de resistência. As gavetas do mundo estão
cheias de coisas começadas. Esboços inacabados, pedaços de invenções, ideias de produtos incompletos,
cadernos com hipóteses formuladas pela metade, patentes abandonadas, manuscritos parciais. Criar é mais
monotonia do que aventura. É acordar cedo e dormir tarde: longas horas realizando um trabalho que
provavelmente vai fracassar – um processo sem progresso que deve ser repetido diariamente durante anos.
Começar é difícil, mas continuar é ainda mais (ASHTON, 2016, p. 76).

Buscar compreender os caminhos e as perspectivas de determinado mercado tem a ver com


o exercício de percepção, com a sensibilidade de identificar tendências e se aproveitar de
diferentes contextos para desenvolver ideias originais e bem-sucedidas. Não devemos apenas
estudar números e previsões, também é preciso olhar ao redor e compreender os caminhos
desviantes que nossa sociedade percorre.
1 Praticidade e conveniência
Uma tendência perceptível no meio gastronômico é a tentativa de encaixar nossa
alimentação no cotidiano do século XXI, um mundo globalizado, dinâmico e acelerado. De
acordo com Marina Rossi Ferreira, no livro Turismo e gastronomia: cultura, consumo e gestão:

O tempo dedicado ao momento da refeição nos dias atuais não é mais necessariamente isolado e delimitado
(marcando, por exemplo, a interrupção da jornada de trabalho). Se antes tais momentos estimulavam a
sociabilidade familiar, atualmente a maioria das pessoas come quando está na rua, correndo de um
compromisso ao outro, no meio de um passeio, enquanto trabalham, às vezes, sem sequer sair de seu espaço
de trabalho, com olhar constantemente preso a monitores e celulares. Na leitura de alguns autores, o modelo
de consumo alimentar cada vez mais estilizado, individual e independente de eletrodomésticos como o micro-
ondas acabou por alterar o ritual alimentar, que passou a ser um processo impessoal e fragmentado, sem mais
tempo e espaço predeterminados para tal, fazendo com que, aos poucos, as refeições percam sua função
social (FISHLER; CANESQUI; GARCIA; FERNANDEZ-ARMNESTO, 2010 apud FERREIRA, 2016, p.
56).

A informação difundida e o tempo acelerado nos levaram a perceber que os hábitos


alimentares podem afetar nossa vida em curto, médio e longo prazo. Ter controle e conhecimento
sobre o que comemos, hoje em dia, é mais importante do que saciar nossas vontades. O
empreendedor da área pode se aproveitar desse novo ponto de vista para explorar diferentes
estratégias.

Levando-se em conta a democratização das redes e o maior acesso à internet, percebe-se


que a sociedade está cada vez mais atenta com a alimentação. Informações sobre produtos
consumidos, dietas, hábitos alimentares e de cuidado com o corpo são assuntos presentes nas
redes encarados como questões de saúde. Aprender coisas diferentes, postar nas mídias sociais,
discutir assuntos relacionados à alimentação passam a ser comuns em nosso cotidiano. Essas
novas funcionalidades devem ser usadas como saídas para o empresário do ramo:

A internet também permite a melhor disseminação cultural, o que, ao lado de experiências efetivas com
outras nações e costumes, graças a viagens de negócios ou meramente turísticas, promove o conhecimento de
novos modelos alimentícios e nutricionais que passam a influenciar as preferências dos consumidores no dia
a dia. A elevação da renda, tanto no Brasil quanto no mundo, tem possibilitado um maior intercâmbio
cultural, como se pode observar pela elevação do número de desembarques internacionais nos aeroportos de
todo o planeta (BRASIL FOOD TRENDS 2020, 2010).

No prefácio de seu livro Empreendedorismo na prática, José Dornelas aponta para esse
mundo contemporâneo que nos parece cada dia menor e a difusão de informação também
significa aumento da complexidade da competitividade no mercado:
Com o imenso progresso da tecnologia das comunicações o mundo parece hoje menor do que ontem.
Sabemos o que está acontecendo do outro lado do globo de modo instantâneo e com informações completas
como não se conseguia há alguns anos atrás. Uma nova ideia aqui pode já ter sido posta em prática acolá,
implementando algo que se consagrou chamar de “competitividade” e que se apresenta entre nós de forma
intensa e direta. O tremendo impacto da competição pode se medido e sentido como resultado da enorme
dinâmica da troca de riquezas, entre nações e empresas. O resultado disso é que, neste mesmo momento em
que estas frases estão sendo lidas, uns ficam mais ticos e ganham; outros, perdem (DORNELAS, 2007, p.12).

Em relação à praticidade, também é possível otimizar a estrutura de um restaurante para


desenvolver uma oferta de processamento mínimo, ou seja, venda de matéria-prima higienizada,
picada, fatiada, pré-pronta, entre outros. Hoje em dia, essa fatia do mercado existe e pode ser
explorada. Outra opção também é a entrega em domicílio. Antigamente focada em alguns
produtos de fast food, hoje a modalidade já se aplica a diversos restaurantes, supermercados,
empórios e empresas de processamento mínimo. Sobre o assunto, June Payne-Palacio e Monica
Theis argumentam que:

Orçamentos apertados e impactos ecológicos reduzidos cada vez mais são as limitações dentro das quais os
serviços de alimentação internos e comerciais devem operar. Um plano de projeto sensato pode melhorar toda
operação do negócio de alimentação. Estima-se que 50% do tempo de um funcionário em um serviço de
alimentação seja gasto com andanças, conversas, observações e esperas. Se o projeto puder reduzir algum
desses quatro itens, a eficiência será melhorada. Um bom projeto também pode melhorar a produtividade, a
qualidade dos alimentos e os serviços, o conforto e a segurança dos funcionários e o apelo ao cliente
(PAYNE-PALACIO; THEIS, 2012, p. 261).
2 Onde estaremos daqui a 20 anos?
Uma preocupação na qual o ramo de alimentação também se insere é a disposição de
resíduos recicláveis e orgânicos. A maioria dos produtos alimentícios apresenta algum tipo de
descarte. Cascas, sobras, gorduras e embalagens são alguns dos muitos exemplos de resíduos
inevitáveis decorrentes da necessidade humana de alimentação. Parece dramático, mas a
realidade é que simplesmente existir gera uma “pegada” ecológica no mundo. Segundo o
relatório “Estado do mundo”, publicado já em 2004 pelo Worldwatch Institute:

Uma medida do impacto do consumo humano sobre os ecossistemas globais é encontrada no sistema de
contabilidade da “pegada ecológica,” que mede a quantidade de terra produtiva que uma economia requer
para produzir os recursos de que precisa e assimilar seus resíduos (...) A análise das pegadas (cálculos
realizados pelo grupo californiano Redefining Progress) revela que os níveis totais de consumo já haviam
excedido a capacidade ecológica do planeta no final dos anos 70 ou início dos anos 80. Tamanho
superconsumo só é possível por meio da redução dos estoques das reservas naturais, como quando a água de
poço é bombeada a ponto de reduzir os níveis freáticos (WORLDWATCH INSTITUTE, 2004, p. 20).

Gráfico 1 – Pegada ecológica publicada no relatório Estado do


Mundo 2004
O planeta tem sofrido as consequências da existência humana e estamos cada vez mais
cientes disso. O mercado agora busca empresas sustentáveis, que se desenvolveram buscando
minimizar seu impacto na sociedade. Adotando técnicas de processamento mínimo de alimentos,
um restaurante pode trazer uma facilidade logística para um grupo maior de pessoas. Existem
diferentes maneiras de evitar o desperdício de alimentos e recursos naturais. Desde pequenas
atitudes como oferecer alimentos próximos da data de validade como cortesia nas mesas de um
restaurante, como procedimentos mais complexos, ecológicos e saudáveis. As tendências no
mundo da alimentação caminham para essa tendência do não desperdício, assim como outros
setores de consumo, como moda e hotelaria. Segue um exemplo descrito no livro Gestão de
negócios em alimentação: princípios e práticas, por June Payne-Palacio e Monica Theis, sobre
um modelo de operação de resfriamento de alimentos:

A Universidade de Negócios em Alimentação de Wisconsin-Madison possui um grande restaurante que usa


tecnologia de cocção/congelamento para produzir alimentos fornecidos a outras unidades dentro do sistema
(...) O uso de resfriamento e de congelamento rápidos não é novidade, mas vem se tornando cada vez mais
popular em operações de negócios de alimentação não comerciais de larga escala e grande volume, como de
escolas, faculdades e hospitais. Sua popularidade decorre de inúmeras vantagens que o processo oferece (...)
O benefício mais evidente desse método de produção é a segurança do alimento, pois o produto em
cozimento só fica exposto em uma zona de grande perigo por um período de tempo mínimo. No entanto,
outras vantagens também fazem dele a escolha ideal. Entre os benefícios destacam-se melhor qualidade do
alimento, redução de desperdícios, economia de trabalho, flexibilidade/melhores condições de compra para o
cardápio e sustentabilidade. A qualidade do alimento é melhor porque o método preserva a integridade das
estruturas celulares normais. O desperdício é reduzido porque o alimento resfriado ou congelado pelo método
rápido pode ser armazenado por mais tempo e é só restituído à temperatura normal quando necessário
(PAYNE-PALACIO; THEIS, 2012, p. 332).

Mesmo sendo pouco perceptível, atualmente processos sustentáveis como a reciclagem, a


diminuição de uso de recursos, entre outros, tornaram-se produto de um serviço especializado. O
empreendedor deve levar essa característica em consideração, principalmente, no momento de
adquirir um espaço. Existem possibilidades de aproveitar o espaço de uma maneira inteligente,
aumentar potencialmente a área de venda para outros produtos e serviços, e na área de produção
adequar a destinação de resíduos, embalagens recicláveis, cubas de equipamentos para
higienização de verduras e legumes.

Não acredito que existam maneiras efetivas de prever a situação do mercado nos próximos
anos. Porém, com uma conduta consciente e responsável, o empreendedor pode ajudar a prevenir
desastres ecológicos, esgotamento dos recursos naturais e preservação dos indivíduos como
habitantes do planeta Terra.
3 Alimentação saudável
Como apontado anteriormente, a informação difundida sobre a relevância da alimentação
em nossas vidas afeta diretamente a maneira de consumo. O consumidor enxerga o produto final
e sua procedência. Para empreender, é preciso pensar no futuro, mas isso não é tão simples
quanto parece. A alimentação saudável também deve ser vista como uma jogada comercial, pois
virou tendência e fez com que todo um mercado se adaptasse a suas demandas. Dessa maneira,
existem tendências dentro da alimentação saudável que se transformam ao longo do tempo.

Para esclarecer essa ideia, o açaí é um bom exemplo. Quando teve maior visibilidade na
sociedade, era conhecido como um alimento saudável. Aos poucos, percebeu-se que não era bem
assim, pois o açaí podia, também, ser uma fonte de gordura, em razão da adição de xarope de
açúcar e de guaraná para ser consumido. É interessante observar como esse produto transita entre
esses dois extremos, podendo ser um alimento saudável e também sofrer a adição de açúcares e
outros produtos para ser consumido. Mesmo assim, o açaí é uma maneira de veicular
estabelecimentos de produtos saudáveis e naturais.

Figura 1 – Fruto do açaí e doce de açaí

O livro Administração: série A, citado anteriormente, traz um exemplo de aproveitamento


das tendências na alimentação para desenvolver negócios inovadores envolvendo o açaí. O
trecho está no capítulo “Empreendedorismo”, no qual os autores contam a seguinte história de
uma franquia de lojas de açaí criada nos Estados Unidos:

Dez anos atrás, Ryan Black estava surfando no Brasil quando observou muitos brasileiros devorando enormes
tigelas de uma gosma roxa congelada. Curioso, descobriu que aquilo era feito dos frutos da palmeira açaí, que
são abundantes na área e podem ser transformados em uma bebida parecida com uma raspadinha quando
esmagados, misturados com água e congelados. Como já bem sabem os brasileiros, os frutos contêm
antioxidantes e gorduras ômega benéficas. Refletindo sobre a demanda dos consumidores americanos por
alimentos mais saudáveis, Ryan achou que ele e seu irmão poderiam oferecer um novo sabor que também
seria nutritivo. Os irmãos fundaram a Sambazon para desenvolver e comercializar bebidas congeladas à base
de açaí, mas precisaram educar o público, inclusive restaurantes, lojistas e outros clientes em potencial. “Eles
davam um belo show, indo de loja em loja como se fosse um ato circense”, diz Larry Sidoti, vice-presidente
de desenvolvimento da Juice It Up! Franquia Corp., que aceitou incluir o Sambazon em seu cardápio. A
Sambazon agora tem 100 funcionários e fatura US$ 12 milhões ao ano, com produtos nas prateleiras da
Whole Foods, da Wild Oats e da Jamba Juice (BATEMAN; SNELL, 2012, p. 118).

Conclui-se que, somente atentar em vender comida saudável não é o suficiente. É preciso
enxergar o que o mercado e a sociedade estão propondo como saudável a cada momento.
Atendendo a isso, sempre haverá um direcionamento sobre o que vender.

Na sequência, entramos no aspecto técnico. Nesse momento, o profissional dentro da


cozinha deve ter sensibilidade e conhecimento integrados para o desenvolvimento de cada
produto. Atualmente o mercado pede por um profissional que entenda o alimento, de onde ele
vem, seus passos e processos no mercado e suas consequências no mundo; além disso, um
profissional que compreenda o que a sociedade gosta de comer, aceita isso e é capaz de absorver
referências com base em experiências cotidianas, afirmando que as tendências para o futuro do
mercado. O recrutamento de profissionais da cozinha, se encarado como um trabalho de
vanguarda, é um passo importante para o empreendedor.
4 Perfil do consumidor
Podemos esperar que, nos próximos anos, o consumidor tentará ficar cada vez mais
próximo do que ele de fato deseja consumir. Ele será mais ativo em suas decisões e vontades e
terá mais informações sobre o que pode comer ou não. A exigência por conhecer e entender a
produção será maior, assim, garçons devem estar aptos a explicar não apenas os pratos e
ingredientes, mas também o conceito do restaurante. Para que isso aconteça, o estabelecimento
precisa ter um respaldo de fichas técnicas e informações nutricionais e a equipe deve ser bem
treinada e informada sobre os itens do cardápio.

Considerando-se a quantidade de consumidores que se procura atingir, desenvolve-se cada


vez mais a exigência por serviços personalizados. Procuras por cardápios diet, comida funcional
para atletas, grávidas, idosos, vegetarianos, veganos, entre outros, serão estratégias importantes.

Quando diferentes antecedentes culturais ou étnicos são representados nos clientes de um serviço de
alimentação para o qual o cardápio está sendo planejado, a tarefa de satisfazer a todos pode ser, de fato,
desafiadora. Na sociedade móvel de hoje as pessoas estão conhecendo melhor alimentos étnicos e regionais.
O interesse na culinária tailandesa, etíope, vietnamita e de outras nacionalidades fica evidente com
crescimento dos restaurantes étnicos. Muitas instalações de saúde, escolas, faculdades e serviços de
alimentação semelhantes incluem esses alimentos em seus cardápios para proporcionar variedade e contribuir
para a educação cultural de sua clientela. O planejado de cardápios deve estar consciente de costumes
elementares locais e restrições religiosas. (PAYNE-PALACIO; THEIS, 2012, p. 261).
5 Food design
Para ilustrar a origem e a multiplicidade do termo design, Adriana Melo e Ricardo
Abelheira, no prefácio do livro Design thinking & thinking design, abordam a etnologia da
palavra para posteriormente demonstrar os meios de atuação da área e introduzir o conceito de
design thinking, que será trabalhado nos próximos capítulos. Segundo os autores:

O termo deriva do latim designare, sendo mais tarde adaptado para o inglês como design, que tem uma série
de significados. A palavra design, então, foi traduzida para o espanhol como diseño (que se refere ao design,
ao desígnio ou à especificação), e não como dibujo (que se refere ao desenho ou traçado). Por algum desvio
de tradução, em português ficamos com a expressão ‘desenho industrial’, que não representa a correta
atuação da profissão, visto que popularmente a palavra desenho significa representação, traçado ou ilustração.
Atualmente, o termo desenho industrial está caindo em desuso, sendo substituído pelo termo design, que tem
mais aderência ao significado desejado – projeto (MELO; ABELHEIRA, 2015, p. 18).

O conceito de design como projeto é o ponto de contato entre o produto, o serviço, a marca
e o usuário. A otimização da relação do homem com o produto ou serviço está na forma e na
funcionalidade desenvolvida por um projeto de design. Quando se fala em ‘forma’ no mundo do
design, falamos em uma função, um propósito, uma estratégia, e não somente na forma física
propriamente dita. Ela deve atender a requisitos emocionais, psicológicos, ergonômicos,
técnicos, funcionais e de negócio.

Existem diferentes áreas de atuação para o designer no mercado, assim, é possível atuar no
ramo industrial, no design gráfico, na arte ou no design de interfaces, projetando layouts,
conteúdo audiovisual, design thinking e food designer, área de atuação no desenvolvimento, na
criação e na elaboração de todo o processo de apresentação de pratos, bufês, vitrines, etc. Um
profissional que atua na área do food design pode também exercer atividades que envolvam a
produção, o desenvolvimento de logística e a preparação de alimentos. De acordo com o artigo
publicado pelo site do Instituto de Engenharia da Universidade Mauá, em 2012, ano que a
disciplina food design entrou no currículo do curso de engenharia de alimentos, a tendência é a
capacidade de propor soluções alimentares eficazes em um contexto onde o produto seja
funcional ao tipo de ambiente de consumo e às exigências e demandas do consumidor.

A nova área está mais presente no dia a dia do que se imagina. Ao longo dos anos, a sociedade modificou
seus aspectos antropológicos e sociais e o ato de comer acompanha os costumes como alimentar-se em pé ou
sentado, em casa ou num piquenique, sozinho ou em família e assim por diante. No passado, a humanidade
comia com as mãos e, ao perceber que isso diminuía a validade dos alimentos por causa da contaminação,
tornou-se necessário o uso de utensílios como garfos, facas, hashis e outros (INSTITUTO MAUÁ, 2012).
Existem profissionais que trabalham efetivamente em empresas e bufês de eventos, como
também os que prestam consultorias e serviços terceirizados para qualquer segmento no mercado
que envolva a apresentação de devido alimento. As atividades de um food designer podem ser
atribuídas a chefs de cozinha, portanto nem todo chef tem técnica para ser considerado um food
designer. Atualmente, existem poucos cursos e universidades que oferecem esse tipo de ensino,
as técnicas do food designer não costumam ser aprendidas no mundo acadêmico, são padrões de
apresentação, composição de pratos, entre outros. De acordo com Claudia Facca, coordenadora
do curso de design de produto da Mauá: “O food design alia a forma de pensar do designer
(design thinking) ao processo de desenvolvimento alimentício. É uma nova maneira de olhar o
produto e o contexto em que está inserido, partindo das necessidades dos usuários e dos
problemas que existem hoje” (INSTITUTO MAUÁ, 2012).
6 Tecnologia como investimento
Processos dentro da área de restaurantes muitas vezes são artesanais. Técnicas e tradições
tornaram o profissional da área proficiente em suas tarefas a ponto de nem mesmo considerar
que se pode organizar o ambiente com insumos específicos que diminuem a mão de obra.
Atualmente, existem equipamentos que facilitam a produção de etiquetas, a higienização de
verduras, a embalagem, o porcionamento e o cozimento. Assim, tem-se um novo mercado
baseado em desenvolvimento de tecnologias para facilitar o processo de produção de alimentos.
Devemos nos manter atentos para quais dessas tecnologias podem ser essenciais para nosso
empreendimento.

Figura 2 – Cliente fazendo pedido em tablet

Fora da cozinha também há bastante evolução no âmbito tecnológico. Podemos pedir por
internet, tablets e celulares, pagar por dispositivo remoto, fazer reservas, consultar preços e
comprar cupons promocionais pela internet, são muitas as possibilidades que a tecnologia pode
nos trazer. Devemos nos manter atentos ao desenvolvimento nessa área e acompanhar a difusão
de dispositivos e aplicativos relacionados ao ramo da gastronomia. Há diversos aplicativos
voltados para o consumo do cliente e para melhorar a logística de quem está vendendo. Por
exemplo, empresas especializadas em desenvolver soluções tecnológicas voltadas ao auxílio da
gestão e operação de bares e restaurantes.

Essas empresas desenvolvem programas que sincronizam os pedidos (feitos em


smartphones, tablets ou telas de computadores às impressoras de produção que imprimem os
pedidos na cozinha e/ou bar, como também sincroniza com o sistema de caixa). São as chamadas
“comandas eletrônicas”, que se tornaram grandes facilitadoras da logística e do controle de
pedidos e do caixa dos restaurantes. Em alguns casos, o mesmo sistema que sincroniza o serviço,
a produção e o caixa sincroniza também as informações de contagem e saída dos produtos
estocados, facilitando os pedidos de compras e o controle interno de gasto e desperdício de
alimentos. Nos restaurantes dos quais faço parte, o programa utilizado é o da Altec[1]:
Considerações finais
Para o encerramento do capítulo, é fundamental destacar a importância da versatilidade e da
intuição para o desenvolvimento de um empreendimento de sucesso no ramo gastronômico.
Assim como existe a dificuldade de lidar com necessidades subjetivas dos clientes em relação à
alimentação, também é um desafio lidar com os desejos e as ambições de nossos próprios
colegas de trabalho. Não apenas lidamos com o fator humano como também dependemos de
situações que envolvem a economia, o ecossistema, as questões ambientalistas e de saúde
pública. Portanto, é preciso intuição e criatividade para lidar com fracassos e adversidades. Nas
palavras de Kevin Ashton, “não existem atalhos para a criação. O caminho é feito de muitos
passos – nem retos nem sinuosos, mas como um labirinto” (ASHTON, 2016, p. 76).
Referências
ASHTON, Kevin. A história secreta da criatividade. Rio de Janeiro: Sextante, 2016.

BALESTRIN, Alsones; VERSCHOORE, Jorge. Redes de cooperação empresarial: estratégias


de gestão na nova economia. 2. ed. São Paulo: Bookman, 2016.

BALLERINI, Franthiesco. Jornalismo cultural no século 21. São Paulo: Summus, 2015.

BATEMAN, Thomas S., SNELL, Scott A. Administração: série A. 2. ed. Porto Alegre: AMGH,
2012.

DORNELAS, José. Empreendedorismo na prática. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.

FERREIRA, Marina Rossi. Turismo e gastronomia: cultura, consumo e gestão. Curitiba:


Editora InterSaberes, 2016.

INSTITUTO MAUÁ DE TECNOLOGIA. Food design: a tendência que já virou disciplina


eletiva para os alunos do Instituto Mauá de Tecnologia. Instituto de Engenharia, 2012.
Disponível em:
<https://www.ie.org.br/site/universidades/exibe/id_sessao/66/id_universidade/4/id_noticia/558/F
ood-Design,-a-tend%C3%AAncia-que-j%C3%A1-virou-disciplina-eletiva-para-os-alunos-do-
Instituto-Mau%C3%A1-de-Tecnologia>. Acesso em: 8 nov. 2017.

MELO, Adriana; ABELHEIRA, Ricardo. Design thinking & thinking design: metodologia,
ferramentas e reflexões sobre o tema. São Paulo: Novatec, 2015.

PAYNE-PALACIO, June; THEIS, Monica. Gestão de negócios em alimentação: princípios e


práticas. 12. ed. Barueri: Manole, 2012.

PROJETO BRASIL FOOD TRENDS 2020. Brasil Food Trends 2020. São Paulo: Fiesp Ital,
2010.

WORLDWATCH INSTITUTE. Estado do mundo: estado de consumo e o consumo


sustentável. Tradução de: Henry Mallett e Célia Mallett. Salvador: UmaEd., 2004. 326 p.
[1] A empresa Altec tem como objetivo o food service, proporcionando ferramentas vitais e
modelos gerenciais consolidados para operação, gestão e eficiência nos processos decisórios de
negócios.
Capítulo 5
Modelos de negócios

Nos capítulos anteriores, discutimos como a alimentação se configura na sociedade, as


variadas formas de comportamento de cada consumidor e como isso afeta direta e indiretamente
o contexto de mercado da cultura gastronômica. Por meio de tais discussões, é possível especular
sobre a direção que o mercado e seus consumidores podem seguir no futuro.

De maneira geral, o ramo da gastronomia comporta uma atividade complexa de considerar


todos os fatores envolvidos ao mesmo tempo e de forma intercalada. Isso pode nos confundir e
gerar esforços e investimentos mal direcionados. Neste capítulo, discutiremos, de maneira mais
detalhada, como proceder com autonomia e independência dentro dos canais operadores. Assim,
direcionamos nossos esforços com objetivos bem delimitados e específicos.

Neste capítulo serão apresentadas duas formas de negócio no ramo da alimentação: o


negócio próprio ou franqueado. Ambos os moldes requerem do empreendedor muita atenção,
cuidado e pesquisa. Saber administrar as ferramentas de mercado, independentemente do formato
do negócio, ter uma mente aberta, criativa e um bom conhecimento sobre o mercado em que
estamos inseridos são os fatores que levam ao sucesso em uma empreitada. Independentemente
do seu molde, o importante é saber usufruir das possibilidades e transformar as adversidades que
se encontram em nossos caminhos.

No livro A história secreta da criatividade, o pesquisador britânico Kevin Ashton defende a


criatividade como resultado de muito trabalho. Desmascarando a ideia de mito, Ashton
fundamenta sua argumentação com base na história e na ciência social. Segundo o autor,
qualquer coisa que criemos – que façamos com um propósito – é uma ferramenta. Mas, como ele
mesmo aponta, não há nada de excepcional em uma espécie que usa ferramentas, uma vez que
diversas outras espécies também fazem uso delas e, como visto no primeiro capítulo, a dialética
pé-mão-cérebro-instrumento se desenvolveu durante nosso processo de hominização e nos
conduziu à nossa atual complexidade cerebral e evolução como sociedade. Assim, nossa
capacidade de modificar coisas é o gatilho que transforma o mundo:
Então chegou o momento mais importante da história humana: o dia em que um membro da espécie olhou
para uma ferramenta e pensou: “Eu posso melhorar isso.” Os descendentes desse indivíduo são chamados de
Homo sapiens sapiens. São os nossos ancestrais. Somos nós. O que a raça humana criou foi a própria criação
(...) O que torna a nossa espécie dominante é a inovação. O que existe de especial em nós não é o tamanho do
cérebro, a fala ou o fato de usarmos ferramentas. É que cada um de nós, a seu modo, é impelido a melhorar as
coisas. Ocupamos o nicho evolucionário do novo. O nicho do novo não é propriedade de uns poucos
privilegiados. É o que nos torna humanos (ASHTON, 2016, p. 29).
1 Operação e gestão
1.1 Canais operadores
A área de alimentos e bebidas (A&B) não evidencia todos os seus desdobramentos para
quem a observa de fora, seja como consumidor ou como profissional iniciante. Esse mercado é
segmentado por diferentes tipos de operação, independentes ou organizadas em redes de
alimentação. Segundo o portal “Alimentação fora do lar”, encontramos no mercado os seguintes
tipos de canal operacional: padarias, fast food, delivery, quick service, bares e restaurantes,
lanchonetes, hotéis, vending, restaurantes de empresas e refeições coletivas, catering, saúde e
hospitais, governamentais/merenda escolar. Resumidamente, o setor de alimentos e bebidas é
dividido nos setores institucional e comercial.

Institucional: formado por restaurantes e soluções de serviços de alimentação para os


segmentos: indústria, empresas, saúde (hospitais e clínicas, entre outros), educação (escolas,
faculdades e merenda escolar), entretenimento (estádios esportivos, arenas de shows e
eventos) e atendimento em locais remotos (usinas, mineração, plataformas de petróleo, etc.),
bem como alimentação para setores governamentais como o exército. Aqui podemos incluir
ainda os serviços de alimentação e logística para aviação, denominado catering aéreo.

Comercial: formado por restaurantes, lanchonetes e bares, hotéis, padarias e lojas de


conveniência e rotisseries, vending machines e delivery. O segmento de restaurantes e
lanchonetes é normalmente dividido pelo tipo de serviço, menu e valor para os
consumidores, entre modelo de serviço limitado (fast food, cafeterias, restaurantes por quilo
e self-service) e serviço completo (casual dining, restaurantes à la carte tradicionais,
restaurantes de alta gastronomia). É bastante comum esses estabelecimentos serem
classificados de acordo com o tema de seu cardápio, como pizzarias, churrascarias, comida
italiana, entre outros.

Portanto, o sistema de food service é composto pelas seguintes indústrias: alimentos e


bebidas, higiene e limpeza, equipamentos, móveis e utensílios, distribuidores e operadores
logísticos e prestadores de serviços para o setor: cooperativas, consultorias, agências, arquitetura
e tecnologia. Também encontramos no mercado empresas especializadas em consultorias de
gestão ambiental, assim como empresas responsáveis por coleta e reciclagem de lixo, coleta de
óleo, entre outros resíduos que, muitas vezes, retornam em forma de produtos de limpeza ou
mesmo dinheiro.

1.2 Perfis de operação e gestão


A temática abordada neste tópico apontará com mais detalhes essas diferentes realidades em
que podemos atuar dentro de um empreendimento na área gastronômica: serão analisados os
chamados canais operadores e sugeridos diferentes modus operandi para desenvolver e/ou
manter um empreendimento. Serão demonstrados, item a item, como o sucesso da empreitada
depende do conjunto de fatores que podem ou não ser encarados individualmente, mas, na
prática, aparecem no resultado.

Em relação ao operador comercial, é preciso sempre ter em mente que um empreendimento


em A&B é um comércio. Como cliente e comensal, deve-se observar a oferta de alimentos como
um serviço, sem levar em conta o que ocorre por trás da sua comercialização. Será discutido que
a forma como a área gastronômica tem se desenvolvido atualmente e o caminho que ela seguirá
no futuro nos permite tomar diversas atitudes dentro do canal operador comercial.

Diversos fatores contribuíram para o desenvolvimento da figura do chef celebridade. Redes


sociais, programas de televisão, sites, livros, entre outros começaram a trazer a imagem do chef
antes da imagem de sua comida. A contratação de um chef pela sua fama, sem levar em
consideração a comida que ele prepara, pode ser uma saída para um empreendimento. Porém,
vale a pena manter os olhos abertos para a maneira como esse profissional gerencia e organiza
sua cozinha. Muitas vezes, vale mais se apoiar em sua figura do que efetivamente em seu
trabalho. Segundo a autora Marina Rossi Ferreira, no já citado livro Turismo e gastronomia:

O aumento do interesse pelo tema gastronomia também se relaciona à elevação dos chefs ao status de
celebridades, que passaram dos restaurantes para as colunas em revistas, promoções de eventos
gastronômicos, livros e programas de televisão. Entre eles, podemos citar Gordon Ramsay, Jamie Oliver,
Ferran Adrià, Claude Troisgros e o brasileiro Alex Atala, cujo restaurante figura entre os 10 melhores do
mundo, de acordo com a premiação “The World’s 50 Best Restaurants”, promovida pela revista inglesa
Restaurant (FERREIRA, 2016, p. 60).

Alimentação saudável: Marina Rossi aponta também as seguintes tendências de mercado


de alimentação comercial em relação à saúde e ao bem-estar: produtos benéficos ao desempenho
físico e mental, produtos para dietas específicas e alergias alimentares, produtos com aditivos e
ingredientes naturais, alimentos com alto valor nutritivo agregado (funcionais), produtos
orgânicos e produtos minimamente processados.
Figura 1 – Alimentos minimamente processados

Aqui nos deparamos com um grande potencial de exploração comercial. A informação e a


busca por uma vida mais agradável são tendências a serem exploradas tanto quanto uma
estratégia comercial para desenvolvimento de produto, cardápios e serviços.

Serviços personalizados: como discutido em capítulos anteriores, a alimentação é um


hábito pessoal difícil de ser alterado. Apoiado nisso, o serviço personalizado pode surgir como
uma boa estratégia comercial. Segundo Marcelo Traldi Fonseca, no livro Tecnologias gerenciais
de restaurantes:

O serviço deve estar adequado ao conceito do restaurante. O cliente de um restaurante tradicional procura um
tipo de serviço condizente com aquele ambiente. Um barman free-style, apesar de ser extremamente
interessante, nesse caso não é adequado. Além disso, o serviço deve ser eficiente e organizado (FONSECA,
2014, p. 3).

Sustentabilidade: são várias as atitudes para se tomar, dentro de um restaurante, que


aumentem a sustentabilidade. Um diálogo franco entre administradores e colaboradores pode
causar impactos positivos nas tomadas de atitude em direção ao consumo consciente de diversos
insumos. Essa realidade nos traz algo mais próximo de um nicho comercial bastante importante
na atualidade, a questão da sustentabilidade. Tomando-o como estratégia, podemos oferecer um
diferencial competitivo significativo para um empreendimento. Marina Rossi Ferreira também
aponta as tendências nesse ramo: empresas com programas avaliados e certificados de
responsabilidade socioambiental, produtos de baixo impacto ambiental, associados ao bem-estar
animal, embalagens recicláveis e recicladas, certificações e selos ambientais e processos com
utilização de fontes renováveis.

Figura 2 – Cascas de batata: versáteis e nutritivas

NA PRÁTICA
O restaurante Bio, do renomado chef Alex Atala, apoia-se no uso completo dos produtos, sem nenhum
desperdício. Encontramos para vender até mesmo porções de casca de legumes, além de um cardápio totalmente
pensado para que nada seja descartado.

Operador social: aqui, encontra-se mais uma oportunidade que poderia ser mais bem
aproveitada na área da gastronomia. Muitas vezes, as pessoas que trabalharão nos
estabelecimentos de A&B não são instruídas corretamente ou com a atenção necessária para
exercer suas tarefas como empregado. Muitos são os casos nos quais o funcionário nem mesmo
tem ensino fundamental ou médio completo. Uma tentativa de recrutar e educar os funcionários
de maneira estratégica é uma boa saída para o desenvolvimento de um negócio duradouro.
Quando se abre um negócio do tipo, geralmente há poucos recursos para investir em treinamento,
porém, com coordenação e boa orientação, conseguimos evoluir de diferentes maneiras dentro
dessa realidade.

Os recursos humanos implicam não só a contratação de pessoas com os perfis adequados para as funções,
mas também treinamento, qualificação e definição de tarefas e objetivos comuns. A gerência deve saber quais
são as medidas corretivas necessárias, lembrando sempre que essas pessoas devem ser respeitadas e que, por
vezes, um erro do funcionário é decorrência de um aspecto que não havia sido planejado ou previsto. Assim,
essas medidas devem levar em consideração os objetivos a serem alcançados (FONSECA, 2014, p. 5).

Ao identificar tais características da mão de obra disponível no mercado da alimentação no


Brasil, percebe-se que investir na educação e na instrução dos funcionários significa investir no
próprio negócio. Investir no capital humano é o grande segredo para o bom funcionamento de
uma empresa e a formação de uma equipe fiel, bem orientada e instruída, que, com tais
características, contribuirá para o desenvolvimento, o crescimento e a consolidação da empresa
no mercado.

PARA SABER MAIS


O projeto social “Gastromotiva” é responsável pela capacitação básica de profissionais para a área. Vale a pena
pesquisá-lo na internet.

Figura 3 – Escola de gastronomia

Operador empresarial: o empreendimento gastronômico, por muito tempo, foi


desenvolvido por pessoas especializadas, chefes de cozinha, mestres de salão, chefes de bar e
sommeliers, que desenvolviam a empresa de acordo com sua própria visão. O século passado e,
principalmente, o atual veem um aumento de profissionais de diversas áreas corporativas
entrando no ramo de A&B. Com isso, o setor recebeu uma infinidade de ferramentas de
desenvolvimento empresarial e de recursos que trouxeram novos olhares para esse operador.
Dentro do aspecto empresarial, podemos considerar treinamento de recursos humanos,
parcerias com empresas, consultorias, estratégias e prospecção de negócios, entre outros.
Fonseca (2014) discorre sobre o assunto:

Treinamento, motivação, reconhecimento, incentivo, abertura, respeito e disciplina são fatores que não
podem e não devem faltar no relacionamento entre gerência e equipe. Cordialidade, respeito,
profissionalismo e eficiência são fatores fundamentais na relação entre clientes e equipe. Começando com
esses aspectos pequenos, porém vitais, podem-se equalizar recursos e atingir os dois principais objetivos de
um restaurante: satisfazer os clientes e obter lucros. Muitas pessoas estão envolvidas nesse processo. Assim,
ao gerir pessoas, deve-se direcionar corretamente as energias. Pode-se ampliar um pouco esse conceito de
gerência definindo-a como a capacidade de alocar recursos para atingir objetivos. Falando-se de restaurantes,
estes existem para gerar lucros aos investidores. Seus produtos são serviço e alimentação (incluem-se as
bebidas), com os quais geram-se os lucros (FONSECA, 2014, p. 2).
2 A hora de abrir um negócio
2.1 Negócio próprio ou franquia
Um dos primeiros questionamentos em relação a empreender na área de alimentação e
bebidas é sobre criar algo próprio ou abrir uma franquia. É uma pergunta importante, que vai
direcionar o esforço e o investimento do empreendedor. Como será exposto a seguir, as
vantagens e as desvantagens são relativas, principalmente se levarmos em consideração com o
que e como queremos trabalhar.

Para alguém fora da área, tornar-se um franqueado pode ser a melhor alternativa, uma vez
que, por não conhecer a área e não saber como operá-la, o empresário terá maior tranquilidade.
Quando se opta por abrir uma franquia, a empresa matriz fornece treinamento, estrutura,
padronização, mercado, parcerias e outras vantagens. Com uma pequena noção de administração
de recursos, sejam financeiros, estruturais e humanos, o investidor consegue conduzir uma
franquia.

Quando investe em uma franquia, o empreendedor adquire todo o know-how de uma empresa que oferece
apoio gerencial em caso de dificuldades e a possibilidade de criação de promoções e divulgação coletiva (de
âmbito regional, estadual, nacional e internacional, dependendo da franquia). Além disso, o futuro gestor
investe em um estabelecimento que possui uma marca já estabelecida perante o mercado. No entanto, é
preciso levar em consideração que essa modalidade de empreendimento restringe a liberdade na tomada de
decisões do empreendedor, afinal, tudo já está predefinido, o que inclui a escolha de receitas, além da fachada
e da decoração do salão. Deve-se seguir obrigatoriamente os mesmos padrões e moldes das demais unidades
da rede franqueada. Além disso, só se pode utilizar os serviços de fornecedores autorizados. Ao optar por
esse tipo de estabelecimento, é preciso que o empreendedor leia atentamente o contrato de franchising
(franqueamento), em especial os itens acerca dos repasses mensais (que pode ser um valor fixo ou
porcentagem da movimentação do estabelecimento), a máster franqueada (FERREIRA, 2016, p. 132).

Por outro lado, a franquia será sempre limitada. Não haverá muitas opções para desenvolver
novos produtos, promoções e estratégias de gerenciamento, ou seja, os mesmos fatores que
contribuem para a facilidade da empreitada também serão limitadores. Sugerimos que o
empreendedor não fique preso a essas condições. Tendo um capital inicial para investir em uma
franquia e, ao perceber que essa franquia obteve sucesso, as lições e os recursos frutos dessa
experiência podem abrir portas e ideias para o desenvolvimento de um negócio próprio.

Ao comparar o empreendimento em um negócio próprio ou a aquisição de uma franquia,

o poder de barganha de um empreendimento autônomo com fornecedores é menor (visto o volume de


compras de uma franquia em relação ao de um único estabelecimento, por exemplo), o que também acaba por
influenciar nos custos e, consequentemente, no valor de venda dos serviços. Apesar desses aspectos, esse tipo
de empreendimento garante maior liberdade de escolha sobre os detalhes do estabelecimento, desde o nome
do local até aspectos como o tipo de decoração, os itens do cardápio, os fornecedores, a média dos preços de
venda etc., além de autonomia na tomada de decisões gerenciais e de planejamento em todas as etapas do
projeto (concepção e administração do local em funcionamento (FERREIRA, 2016, p. 132).

Por meio dessa discussão, pode-se perceber que o negócio próprio pode ter vantagens e
desvantagens. No caso de um empreendimento autônomo, ganha mais quem tiver experiência na
área, seja do ponto de vista prático ou comercial. Empreender fora da franquia é empreender em
novidade. Nesse momento, devemos colocar em prática todos os aspectos discutidos
anteriormente. Manter-se antenado com a situação do mercado é essencial. Porém, sempre
cairemos no fato de que é essencial conhecermos o empreendimento gastronômico em sua
totalidade para, dessa maneira, não virarmos refém de funcionários.

É importante reiterar a ideia de que um negócio fora de uma franquia é mais maleável, pois
nele se pode tomar atitudes baseadas no conhecimento do público frequentador e realizar ajustes
para aumentar as vendas e o consumo como um todo. Uma alternativa para quem não quer ser
franqueado e também não é da área é buscar sociedades. Os negócios em A&B normalmente
constituem sociedades de pessoas que têm um plano de negócios com outras que têm capital para
investimento. Tomando-se os devidos cuidados, essa solução pode ser a melhor para começar a
investir dentro do ramo.

2.2 Criatividade, trabalho e sucesso no negócio próprio


Criar um negócio propriamente seu, inicialmente, soa ser um trabalho muito subjetivo e
arriscado, no entanto, a criação faz parte da nossa existência, está na nossa evolução, tudo a
nossa volta pode ser transformado em uma ferramenta que opere a nosso favor. Novamente
citando Kevin Ashton em A história secreta da criatividade, é importante desmistificar a ideia de
criatividade como algo que se evoca, de acordo com o autor:

O mito da criatividade implica que poucos indivíduos podem ser criativos, que qualquer criador bem-
sucedido experimentará grandes clarões de ideias e que criar tem mais a ver com magia do que com trabalho.
Poucos e raros possuem o que é necessário, e para eles a coisa é fácil. Os esforços criativos de qualquer outra
pessoa são condenados (ASHTON, 2016, p. 15).

Com a própria experiência no desenvolvimento de um microchip de identificação por meio


de radiofrequência, Ashton criou um “sistema de armazenamento”, patenteado, que economizava
dinheiro e memória conectando-se à internet e armazenando dados. Suas pesquisas se tornaram
internacionais e foram financiadas por grandes institutos de pesquisa de tecnologia. Em 2003,
sua expressão “internet of things” foi incluída no dicionário Oxford, que a definiu como “uma
proposta de desenvolvimento da internet em que os objetos cotidianos têm uma conectividade
com a rede, permitindo que enviem e recebam dados”. Baseado nessa primeira experiência de
criação bem-sucedida, Ashton afirma que:

Nada nessa experiência lembrava as histórias sobre ‘criatividade’ que eu lera nos livros. Não havia
acontecido magia, tampouco clarões de inspiração – apenas dezenas de milhares de horas de trabalho.
Construir a internet das coisas foi um processo lento e difícil, assolado por política, infestado de erros,
desconectado de estratégias e planos grandiosos. Aprendi a ter sucesso aprendendo a fracassar. Aprendi a
esperar o conflito. Aprendi a não ficar surpreso com a adversidade, e sim me preparar para ela (ASHTON,
2016, p. 17).

Por meio de exemplos citados no prefácio do livro, ele conclui:

Vistas em conjunto, essas histórias revelam um padrão de como os seres humanos fazem coisas novas, um
padrão que é ao mesmo tempo encorajador e desafiador. A parte encorajadora é que todo mundo pode criar, e
podemos demonstrar isso de modo bastante conclusivo. A parte desafiadora é que não existe momento de
criação mágico. Os criadores passam quase todo o tempo perseverando, apesar da dúvida, do fracasso, do
ridículo e da rejeição, até conseguirem realizar algo novo e útil. Não existem truques, atalhos ou esquemas
para se tornar criativo de uma hora para a outra. O processo é comum, ainda que o resultado não seja. Criar
não é magia; é trabalho (ASHTON, 2016, p. 18).
Considerações finais
Novamente, reforça-se a importância em abrir os olhos para todos os aspectos do mercado.
Os canais operadores são diferentes ferramentas que, tomadas especificamente, podem contribuir
para o sucesso. Profissionais diversificados e polivalentes podem trazer soluções, alternativas e
estratégias diferentes para problemas comuns. Porém, outra lição deixada por este capítulo é que
o planejamento é um fator indispensável para que as ideias e os projetos inovadores se tornem
empreendimentos bem-sucedidos, tanto quanto a inovação e a criatividade. Não apenas o
planejamento financeiro, mas estratégias e soluções desenvolvidas com base no olhar e na
atenção do empreendedor sobre seu negócio.

O mito aqui é de que se acredita que não há nenhum tipo de planejamento. Há, de fato, um controle
financeiro mínimo e um planejamento de custos e despesas, que por si só já contribui para o desenvolvimento
do negócio. O que ocorre em muitos negócios sem planejamento algum é que vão à falência devido à falta de
planejamento financeiro por parte do empreendedor, e não necessariamente porque não tinham uma estratégia
bem definida (DORNELAS, 2007, p. 43).

Com base no pensamento dos autores José Dornelas e Kevin Ashton, é possível concluir
que planejamento estratégico, conhecimento do mercado, pesquisa e recrutamento de equipes
qualificadas são fatores que influenciam o direcionamento de um negócio tanto como se
aproveitar de diferentes circunstâncias e oportunidades, arriscar, inovar e criar podem levar a
empreitada ao sucesso ou ao fracasso. Isso depende da maneira que o empreendedor se aproveita
das ferramentas que tem em suas mãos para vencer e se posicionar no mercado e, para isso, é
preciso muito trabalho, persistência e coragem.
Referências
ASHTON, Kevin. A história secreta da criatividade. Tradução de: Alves Calado. Rio de
Janeiro: Sextante, 2016.

DORNELAS, José. Empreendedorismo na prática: mitos e verdades do empreendedor de


sucesso. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.

FERREIRA, Marina Rossi. Turismo e gastronomia: cultura, consumo e gestão.Curitiba:


Editora InterSaberes, 2016.

FONSECA, Marcelo Traldi. Tecnologias gerenciais de restaurantes. São Paulo: Editora Senac,
2014.

PORTAL ALIMENTAÇÃO FORA DO LAR. Quais são os canais da alimentação fora do lar
(food service). Disponível em: <http://alimentacaoforadolar.com.br/canais-de-comercializacao>.
Acesso em: 9 nov. 2017.
Capítulo 6
Ferramentas para o empreendedorismo:
Canvas e design thinking

Nos primeiros capítulos, foram abordadas informações sobre como o mercado gastronômico
se configura. Foram analisados os significados atribuídos à alimentação na sociedade em que
vivemos, discutidas as expectativas do consumidor, avaliados nichos de mercado, oportunidades
e como sempre podemos inovar em diferentes circunstâncias. Além disso, foram expostos
conceitos de competitividade que auxiliam nossa conduta e tomada de decisões frente às
adversidades que encontramos no mercado. Explicitando a diferença entre atuação nas franquias
e negócios individuais, foram introduzidas reflexões sobre como podemos nos posicionar dentro
das diferentes opções no mercado alimentício, considerando sempre os canais operadores que
temos à nossa disposição.

Neste capítulo, serão apresentadas metodologias conhecidas no mercado por otimizar os


processos de criação e execução de negócios inovadores e otimizados. Serão introduzidos
aspectos da metodologia Canvas de desenvolvimento de empreendimentos, assim como o
pensamento estratégico de mercado e design thinking, o termo e a modalidade de design que visa
ao funcionalismo. O conceito de design thinking será exposto e exemplificado de acordo com a
área do mercado gastronômico.
1 Definição e conceitos da metodologia Canvas
Um modelo de negócios descreve a lógica de criação, entrega e captura de valor por parte de uma
organização (OSTERWALDER; PIGNEUR, 2011, p. 14).

De acordo com a metodologia Canvas, todo e qualquer negócio pode ser esquematizado e
organizado de maneira estratégica para que se possa analisar seus potenciais, objetivos,
vantagens e desvantagens. A metodologia Canvas se encaixa nesse objetivo de facilitar a
discussão e a apresentação da situação do negócio para todos os envolvidos, colaborando, assim,
com mais agilidade durante os processos de formatação de um empreendimento.

A metodologia se apoia em um mapa interativo (figura 1) que pode ser preenchido de


maneira lúdica e menos formal. O mapa é uma ferramenta visível que pode ser compreendida por
todos os envolvidos no processo, possibilitando discussões e interações mais ricas e
diversificadas. A seguir, será abordado cada segmento do quadro e como ele pode ser
preenchido, considerando as perguntas que devemos responder em cada aspecto de acordo com a
empreitada em questão. Segue como deve ser feito o direcionamento dos blocos:

1. Como? (parceiros, atividades-chave e recursos-chave)

2. O quê? (proposta de valor)

3. Para quem? (relação com clientes, canais de venda, segmentação de clientes)

4. Quanto? (estrutura de custos e fontes de rendimento)

Figura 1 – Quadro de Canvas


1. Parcerias:

Quem são nossos parceiros?

Que recursos e serviços oferecem?

Como criar acordos benéficos?

Como suprir alguma falha no sistema?

2. Atividades:

Quais são nossas atividades principais?

Quais são nossos canais de comercialização?

Qual será nossa política de relacionamento com consumidores?

3. Recursos:

Quais recursos nossa empreitada demanda?

De que necessitamos para desenvolver nossos canais de comercialização?

Quais são os recursos necessários para nos relacionarmos com os clientes?

4. Proposições de valor:

Que valor entregamos aos nossos consumidores?


Que uso nossos produtos têm para o consumidor?

Que grupo de produtos estamos oferecendo para que grupo de consumidores?

5. Clientes:

Para quem criamos nossos valores comerciáveis?

Quem são nossos clientes mais importantes?

6. Canais:

Que canais usaremos para atingir nossos clientes?

Como estamos os atingindo agora?

Nossos canais são ou podem ser integrados?

Quais dos nossos canais têm oferecido melhores resultados?

Quanto estamos gastando com cada um deles? O gasto está valendo a pena?

7. Relacionamento com clientes:

Como será nosso relacionamento com os clientes?

Que tipo de relacionamento já estabelecemos?

Nossos clientes interagem com nosso modelo de negócios (canais, produtos, valores,
etc.)?

Qual o custo dessas atividades?

8. Custos:

Quais recursos são os mais caros?

Quais recursos são os mais baratos?

Quais atividades são as mais caras?

Quais atividades são as mais baratas?

Quais são os principais custos inerentes a nossas atividades?

9. Fluxo de receita:

Quanto nossos clientes estão dispostos a pagar?


Com o que eles gastam atualmente?

Como eles pretendem pagar?

Como eles pretendem consumir?

Os itens 1, 2 e 3 se referem à infraestrutura, ou seja, recursos financeiros, humanos, físicos,


intelectuais, relacionais, entre outros.

O item 4 refere-se ao tipo de produto e/ou serviço que será oferecido. Nele, destaca-se o
diferencial da empresa frente à concorrência.

Os itens 5, 6 e 7 se referem aos clientes e como nos relacionaremos com eles.

Os itens 8 e 9 dizem respeito às finanças, aos meios utilizados para comercialização e suas
influências no projeto geral.

PARA SABER MAIS


O Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) é um órgão social que busca auxiliar o
desenvolvimento e promover práticas de gestão e empreendedorismo. Vale a pena consultar o site!

O método de Canvas analisa alguns aspectos separadamente, mas que, em conjunto,


compõem um negócio. Veremos a seguir como os itens se relacionam e como o quadro deve ser
utilizado.
2 Desenvolvimento estratégico
Cada um dos itens apresentados na seção anterior diz respeito a um aspecto de negócio
interligado. Agora discutiremos um pouco sobre como os itens do modelo de Canvas podem
interagir entre si a partir de um desenvolvimento estratégico.

2.1 Custos, valores, consumidores e recursos


Um dos pontos a serem considerados dentro de uma empresa é se ela pretende focar sua
atividade em custos reduzidos ou em criação de valores. Essa diferença relaciona os aspectos de
custo e valor do quadro. Aqui, podemos considerar uma empresa que foca em diminuir custos> e
preços, produzindo grandes quantidades, e outra que relaciona produção pequena, produto com
alto valor agregado e alto preço. Além disso, essa realidade também dialoga com duas partes do
quadro: a primeira referente a segmentos de consumidores, ou seja, quais nichos e públicos
buscamos, e a segunda que diz sobre os recursos que estão à nossa disposição.

NA PRÁTICA
Uma comparação entre o restaurante Gero, da rede Fasano, e as unidades da rede Viena: no primeiro, temos um
salão pequeno, menu à la carte, preços altos e produtos com bastante valor agregado; no segundo, vemos salões
enormes, serviço de bufê por peso, preço baixo e pouco valor agregado.

Figura 2 – Montagem de prato com alto valor


Figura 3 – Bufê de autosserviço

2.2 Canais, segmentos e relacionamento com o cliente


Neste tópico, é possível observar outra relação entre aspectos da figura 1. A maneira como
desenvolvemos nossos canais operadores está ligada ao que queremos manter com o cliente e ao
público que queremos atingir. Continuando o exemplo anterior, um restaurante que se utiliza do
autosserviço para se relacionar com o cliente também terá um canal diferente para atuar com seu
produto, o que influencia diretamente o segmento de clientes que busca atingir.

2.3 Valores, parcerias e recursos


Um empreendedor do ramo gastronômico deve ter noção do valor que seu produto pode
atingir. Nesse caso, as parcerias nos permitem manter os custos sob controle e lançar mão de
recursos para deixar o produto diferenciado.

NA PRÁTICA
Existe no mercado uma procura crescente por restaurantes que fabricam seus próprios produtos. Oferecer
alimentos curados, envelhecidos, defumados, bem fatiados, no próprio estabelecimento, torna o produto
diferenciado, resultando em um aumento de preço. Por outro lado, essas ações exigem também um aumento de
recursos disponíveis e acesso à matéria-prima diferenciada.

O pensamento estratégico, apoiado no quadro de Canvas (figura 1), não é algo desenvolvido
como um caminho, mas uma avaliação e constante reavaliação da situação do empreendimento
em si. Ou seja, esse recurso não se mantém estático, e sim em constante mudança e evolução,
considerando a importância do aspecto crítico e analítico dos envolvidos.
3 A ideia de inovação com base no design
thinking
O design thinking[1] é tido como uma diretriz inovadora para atuar no mercado,
distanciando-se do design de produtos e aproximando-se da realidade de negócios. Aparece
como uma área estratégica da empresa, responsável pela manutenção do serviço e pelas relações
de troca de uma empresa, apoiando-se em alguns pontos-chave que serão discutidos a seguir:

A capacidade de empatia, ou seja, de se colocar no lugar do outro, nesse caso, do


consumidor, entendendo sua realidade e sua situação.

A colaboração, que leva em consideração o conceito de inteligência coletiva, em que a


relação entre recursos humanos promove melhores soluções para problemas, crises, opções
e tomadas de decisão.

A experimentação, que diz respeito às tentativas de solução que nos permitem diminuir
riscos, erros e desperdícios.

Quando tais pilares do design thinking são colocados em prática, os processos se dão da
seguinte maneira:

A primeira etapa é a imersão. Segundo os autores, a fase de imersão tem o objetivo de


compreender profundamente as necessidades dos clientes. Praticando a empatia, compreendemos
situações que não nos pertencem: “essa habilidade nos ajuda a compreender situações ou reações
dos outros, colocando-nos em situações idênticas (...) Para adquirir empatia é necessário
observar, engajar e mergulhar” (MELO; ABELHEIRA, 2015, p. 37).

A cocriação, atividade vinculada ao pilar da colaboração, é a fase de ideação, quando o


objetivo é levantar o maior número de ideias possível de diferentes fontes disciplinares.

E a prototipação, fase que tem como objetivo testar diferentes maneiras de extrair as ideias
mais viáveis e confirmar as mais impactantes, identifica oportunidades priorizadas para o
desenvolvimento futuro.

NA PRÁTICA
Quando inaugurei o bar Negroni, em São Paulo, eu e meus sócios optamos por um serviço que oferecesse pizzas
individuais que podiam também ser divididas em pequenos pedaços. Aos poucos, percebemos a necessidade de
oferecer outros produtos e experimentamos um a um, até incluirmos mais de 10 entradas e/ou porções diferentes
no cardápio. Nesse processo, não tivemos desperdício, pois produzimos pouco e experimentamos um produto por
vez para analisar sua aceitação. A apresentação de um novo cardápio só apareceu depois de alguns meses.

O objetivo da experimentação é reduzir riscos. Apesar de nos valermos de muitas informações para que os
serviços sejam perfeitamente desenhados, não estamos livres de erros. Experimentar para verificar se o
público adere ou não a um determinado produto ou serviço é imprescindível. Os testes e protótipos devem
acompanhar o processo desde o início, o mais cedo possível. A proposta é criar e experimentar
repetidamente. Assim os primeiros erros são eliminados no início e menos recursos são empregados em
soluções equivocadas (MELO; ABELHEIRA, 2015, p. 36).

De acordo com o design thinking, inovação é algo que surge de novo e que tem valor
econômico positivo, resultando em aumento de valor, diminuição de custos, melhora da relação
entre clientes, entre outros.

PARA SABER MAIS


O design thinking é uma proposta funcionalista que segue as tendências do estilo Bauhaus, também voltado para
arquitetura e criação de bens de consumo.
Considerações finais
A metodologia Canvas e as ferramentas do design thinking nos permitem um tipo de
gerenciamento de recursos e objetivos de forma dinâmica e até lúdica. Utilizando seus recursos,
conseguimos ter uma noção mais aprofundada do nosso empreendimento e de como ele se situa
dentro do mercado. Essas técnicas também evidenciam nosso potencial competitivo e como
podemos trabalhar nossa empresa para que ela aproveite todo o potencial e também consiga criar
novas frentes de competitividade.
Referências
MELO, Adriana; ABELHEIRA, Ricardo. Design thinking & thinking design: metodologia,
ferramentas e reflexões sobre o tema. São Paulo: Novatec, 2015.

OSTERWALDER, Alexander; PIGNEUR, Yves. Business model generation: inovação em


modelos de negócios – um manual para visionários, inovadores e revolucionários. Rio de
Janeiro: Alta Books, 2011.
[1] Melo e Abelheira (2015, p. 29) explicam: “A expressão design thinking é encontrada pela
primeira vez em um artigo de Richard Buchanan ‘Wicked problems in design thinking’, ou,
numa tradução livre ‘Problemas complexos em design thinking’. Em 1995, a escola alemã Koln
International School of Design (KISD) lança o primeiro curso de design de serviços. Em 1999,
Rolf Faste, professor de Stanford, definiu e popularizou o conceito de design thinking como uma
forma de ação criativa. O termo foi adaptado à administração por David M. Kelley, colega de
Rolf Faste em Stanford e fundador da IDEO, empresa de consultoria de design de produtos
norte-americana que, apesar de não ter inventado o termo, foi uma das primeiras formadoras de
opinião sobre o tema. Tim Brown, seu CEO, tornou-se seu evangelizador.
Capítulo 7
Perfil do empreendedor e atitudes
empreendedoras

O mercado está sempre preparado para receber diferentes tipos de negócios e


empreendimentos. Perceber a situação econômica, as tendências de consumo e as oportunidades
competitivas, como aprendemos até aqui, é essencial para desenvolver um negócio que possua
ou crie sua demanda, se sustente, funcione e não seja mais uma fonte de desgaste pessoal.

Neste capítulo discutiremos o outro lado, o do empreendedor, como ele se comporta e seus
perfis, para que isso também seja considerado ao iniciar um empreendimento.
1 Tipos de empreendedores, habilidades e o seu
papel na criação de novos negócios
Como visto anteriormente, no mundo contemporâneo, lidamos com o ritmo acelerado do dia
a dia e a difusão das informações torna o mercado mais competitivo e exigente. Por meio de
entrevistas e pesquisas sobre empresários e empreitadas de sucesso, o professor José Dornelas,
em seu livro Empreendedorismo na prática, procura generalizar métodos e processos que
materializam as iniciativas que geram riquezas e oportunidades aos empreendimentos.

Dornelas consolida regras básicas e práticas para ajudar aqueles que, nas palavras de Ozires
Silva, “desejando correr riscos, tentam criar seu próprio espaço nos amplos espaços abertos pelas
modernas sociedades implantadas nos países, desde o início da idade moderna” (SILVA, 2007,
p. 11).

Sobre as vantagens competitivas, por meio de dados de pesquisas e depoimentos, Silva


demonstra como “saímos na frente” se considerado fator humano, educação de qualidade,
preparação e motivação:

De sua cabeça saem ideias de êxito ou caminhos que levam ao sucesso. Daí a importante necessidade da
educação e do treinamento dos povos, em quantidade e em qualidade. O poder avassalador do conhecimento
tem sido decantado, de todos os modos e por todos. Surge, no entanto, a frustração de que, a despeito de tudo
o que se procurou fazer ou materializar no setor do ensino, sempre tem sido insuficiente. Realmente, se isso
efetivamente se constitui em um problema, sem dúvida, ao mesmo tempo, abre espaço para enormes
oportunidades (SILVA, 2007, p. 11).

Sobre a atual situação do mundo, num ponto de vista econômico e social, o autor ainda
aponta de maneira otimista sua perspectiva em relação ao mercado e ao futuro do planeta:

A partir de anos recentes tem sido possível identificar transformações realmente espetaculares e que já estão
moldando o futuro. Nos países mais desenvolvidos, novas tecnologias trouxeram grande aumento da
produtividade e determinaram altos valores de crescimento absoluto. Tudo indica que a evolução do
conhecimento humano vai continuar a dar dramáticas contribuições ao crescimento e ao progresso econômico
de regiões extensas e de suas populações. Países como o nosso, populoso e de grandes dimensões
geográficas, não podem ficar à margem desse processo, que pode ser considerado de mudanças realmente
alucinantes. Muito ao contrário, temos as melhores condições de superar outras nações menos aquinhoadas.

Temos de confiar que podemos enfrentar o desafio e participar desse cenário estimulante e provocante.
Dizem os chineses que o melhor momento para se buscar as oportunidades é durante as crises. Assim, nesse
início de novo século, as nações mais desenvolvidas estão forjando trajetórias baseadas nos avanços da
cultura, da ciência e da tecnologia, mostrando com clareza que o desenvolvimento vem da liberdade para
empreender e do crescimento do cidadão. (SILVA, 2007, p. 14)
Assim como a relevância da educação, da instrução e da preparação dos nossos
trabalhadores e cidadãos, não devemos esquecer de encarar o mercado, o ambiente e os sujeitos
como produtores e consumidores como um todo. Deve-se pensar em pegada ecológica e
consciência social quando somos colocados na posição de empreendedor. Dornelas aponta para o
artigo “Quem é o empreendedor?”, de William Gartner, no qual o autor traça um perfil
psicológico do empreendedor, cujo temperamento cria organizações e as leva ao sucesso. Na
leitura de Dornelas, isso não tem muita relação com características psicológicas, “mas com o ato
de agir na gestão de uma empresa e seu envolvimento com o ambiente corporativo”
(DORNELAS, 2007, p. 21).

Segundo o autor, a tarefa de classificar o que é um empreendedor ou quem é um


empreendedor não é recente: “há muita semelhança nos resultados de vários estudos e algumas
características empreendedoras são mencionadas na maioria deles, como é o caso de “busca de
realização” e “assumir riscos”, que atualmente são consideradas “características íntimas dos
empreendedores” (DORNELAS, 2007, p. 21), conforme se vê no gráfico 1 a seguir:

Gráfico 1 – Disponibilidade para correr riscos

Fonte: adaptado de Dornelas (2007, p. 22).

É possível perceber que não existe muita variação em relação às características do


empreendedor, pois há “várias definições sobre o que é ser empreendedor, e isso dificulta criar
rótulos para poder identificá-los” (DORNELAS, 2007, p. 23). Entre as características dos
empreendedores de sucesso citadas pelo autor, observamos algumas delas no quadro 1 a seguir:

Quadro 1 – Características dos empreendedores de sucesso


GRUPO DE CARACTERÍSTICAS RELACIONADAS À REALIZAÇÃO

Busca de oportunidades e iniciativa


Correr riscos calculados
Exigir qualidade e eficiência
Persistência
Comprometimento

GRUPO DE CARACTERÍSTICAS RELACIONADAS AO PLANEJAMENTO

Busca de informações
Estabelecimento de metas
Planejamento e monitoramento sistemático

GRUPO DE CARACTERÍSTICAS RELACIONADAS AO PODER

Persuasão e rede de contatos


Independência e autoconfiança

Fonte: adaptado de Dornelas (2007, p. 24-25).

Entendo que o empreendedor apresenta em suas características todos os tipos aqui citados,
em menor ou maior intensidade. Para exemplificar contarei um pouco da minha história:

Minha primeira experiência como empreendedor foi aos 12 anos. Iniciei cuidando de carros
em uma feira livre, na rua em que morava, e depois de algum tempo comecei a fazer amizade
com as pessoas que iam à feira fazer compras, carregando os carrinhos de compra pela feira para
meus clientes. Na feira, fiz amizade com os feirantes, que me convidaram a ajudar a montar as
barracas. Durante a montagem das barracas, percebi que todos iniciavam o trabalho com fome,
não haviam se alimentado antes de ir ao trabalho e esperavam ansiosamente a abertura de uma
padaria próxima. Então, pensei: “Posso vender sanduíches para os feirantes durante a montagem
das barracas”. Foi o que fiz: preparava sanduíches de frango e atum e vendia no sistema “fiado”,
ou seja, ia marcando em um caderno o consumo de cada cliente e depois recebia o pagamento,
uma vez por mês.

Aos 14 anos, comecei a organizar festinhas para amigos na garagem de casa. Decorava o
espaço e tocava música para as pessoas dançarem. Havia cobrança de entrada nesses bailes. Os
bailes cresceram e viraram festas em grandes casas no bairro do Morumbi. Em apenas 3 anos, as
festas reuniam cerca de 3 mil pessoas, já em formato próximo ao de casas noturnas, com
cobrança de entrada e venda de comidas e bebidas. Um modelo muito parecido com o que
encontramos hoje na cena da música eletrônica de São Paulo: festas autônomas e independentes
que acontecem em locações inusitadas e representam liberdade e resistência na cultura
underground da cidade.

Em uma reunião para buscar patrocinadores para essas festas, conheci um restaurante que
contratava jovens para trabalhar como garçons, me interessei pela ideia e fui atrás de uma vaga.
Consegui o trabalho quando já estava com 18 anos. Nesse lugar, percebi minha facilidade para
assumir a liderança da equipe e, em menos de um ano, de forma quase que natural, fui
promovido a gerente do restaurante.

Então, descobri o que queria fazer da minha vida: trabalhar com alimentos e bebidas. Logo
identifiquei que, para poder sobreviver no ramo e alcançar meus objetivos pessoais, precisaria
empreender. Naquela época, década de 1990, o mercado não oferecia muitas oportunidades em
cargos altos e bem remunerados.

Comecei a juntar dinheiro e adquirir experiência trabalhando em diferentes restaurantes e


bares, às vezes em dois ou três ao mesmo tempo. Após 10 anos de muito trabalho, me senti
confiante para empreender, mas ainda me faltava o conhecimento teórico. Foi então que, aos 28
anos, consegui uma bolsa de estudo para cursar gastronomia no Senac, pelo Programa
Universidade Para Todos (Prouni) do governo federal, que financia cursos superiores para alunos
de baixa renda. Durante o curso, eu observava meus colegas de sala em busca de possíveis sócios
que pudessem encarar a empreitada de abrir um restaurante em São Paulo. Eles deveriam
apresentar habilidades e características complementares à minha para a formação de um time de
sucesso. Ao final do curso, convidei dois colegas de sala: um que tinha como ponto forte a
facilidade para cozinhar e apresentar receitas deliciosas, e outro que apresentava facilidade em se
relacionar com a equipe de uma cozinha. E eu, com minha experiência de, até então, 11 anos
atuando na área, me especializei em serviço e tinha uma grande carteira de clientes. Eles
aceitaram.

Concluímos o curso e logo em seguida inauguramos o Nou, em 2008, restaurante situado no


Baixo Pinheiros, São Paulo. Foi um sucesso desde o início e logo fomos reconhecidos por
oferecer uma boa relação custo/benefício. Planejamos focar apenas nesse negócio por 7 anos, até
que ele estivesse consolidado no mercado. Depois desse período, partimos para um novo projeto
e inauguramos o Mano, em 2015, uma sanduicheria situada no mesmo bairro.

Por meio do reconhecimento adquirido, resolvi partir para um novo projeto, planejado desde
o início com o objetivo de captar investidores para financiar o negócio, já que os negócios
anteriores foram financiados com nossos recursos.

Para isso, busquei ajuda acadêmica novamente e me formei em pós-gradução de gestão de


negócios de alimentação também pelo Senac. Foi durante esse curso que elaborei o plano de
negócios que serviu de guia para essa empreitada. Surgiu então o Negroni, um bar de
coquetelaria situado no mesmo bairro de Pinheiros e aberto em 2016, totalmente financiado por
investidores. No ano de 2017, inaugurei outro bar, o Estepe, no mesmo bairro, voltado para um
público jovem e informal.

Assim tenho construído minha história profissional, que me fez perceber as diferentes
características de um empreendedor.

Resumindo, o que se percebe é que, em qualquer definição de empreendedor, encontramos


os seguintes aspectos:

Iniciativa para criar um novo negócio e paixão pelo que faz.

Utilização dos recursos disponíveis de forma criativa, transformando o ambiente social e


econômico onde vive.

Coragem para assumir os riscos e a possibilidade de fracassar.

Para Dornelas, “o empreendedor é aquele que faz acontecer, se antecipa aos fatos e tem uma
visão futura da organização” (DORNELAS, 2007, p. 27). Veja os diferentes perfis de
empreendedor citados por José Dornelas e suas respectivas dinâmicas e características:

1.1 Empreendedor nato (mitológico)


Na definição de José Dornelas, o empreendedor nato é o tipo mais conhecido e aclamado.
Eles têm histórias brilhantes e, em alguns casos, construíram seu império de forma repentina.
Segundo o autor, começaram a trabalhar muito jovens e por isso adquiriram suas habilidades de
negociação. Dornelas aponta que os empreendedores natos, no Brasil e na América em geral,
costumam ser imigrantes ou descendentes de imigrantes. Um grande exemplo de empresário nato
imigrante no Brasil é Francisco Matarazzo, que chegou em 1881, fugindo da crise na Itália, e
trouxe consigo uma tonelada de banha de porco como capital inicial. Sua mercadoria foi perdida
no mar. Francisco Matarazzo morreu com um patrimônio hoje estipulado em 20 bilhões de
dólares. O empresário começou como vendedor de rua e abriu uma loja de secos e molhados em
Sorocaba, interior de São Paulo. Comprou porcos e produziu a própria banha, de acordo com o
historiador Rafael Pomim, citado na matéria “Francesco Matarazzo foi de mascate a 5º
empresário mais rico do mundo”:

Obstinado com a ideia de ganhar dinheiro no Brasil, Matarazzo sempre esteve à frente de seu tempo. Inquieto
e visionário, buscava conhecer as necessidades do seu público-alvo, diversificar os negócios, entender o
contexto de seu entorno e do país. Pomim destaca que o pensamento desse empresário era que “uma coisa
puxa a outra”, ou seja, ele produzia tudo o que suas empresas precisavam e aproveitava tudo. Em Jaguariaíva,
havia um frigorífero de carne de porco. Além da carne que era vendida, os restos do animal serviam para a
fabricação de outros produtos, como sabão, banha, adubo, botões e até pincéis feitos com o pelo do animal.
“Ele fabricava até a lata e o rótulo para seus produtos”. Se o Matarazzo percebesse a necessidade de algo, ele
não buscava um fornecedor – abria uma fábrica para produzi-lo (PORTAL TERRA, 2014).

1.2 Empreendedor que aprende (inesperado)


O perfil do empreendedor inesperado é de um profissional que se deparou com uma
oportunidade e decidiu abandonar suas atividades para se dedicar ao negócio próprio.

É o clássico caso de quando a oportunidade bate à porta. O empreendedor inesperado nunca pensou em se
tornar empreendedor: o momento de disparo ou de tomada de decisão ocorre quando alguém o convida para
fazer parte de uma sociedade ou ainda quando ele próprio percebe que pode criar um negócio (...). Antes de
se tornar empreendedor, acreditava que não gostava de assumir riscos. Tem de se aprender a lidar com as
novas situações e se envolver em todas as atividades de um negócio próprio. Quem está pensando em uma
alternativa à aposentadoria muitas vezes se encaixa nesse tipo” (DORNELAS, 2007, p. 28).

Nesse perfil de empreendedor inesperado, identifico meus sócios: um deles ocupava um


cargo de destaque em uma instituição do mercado financeiro, e outro integrava uma reconhecida
banda de música. A princípio, ingressaram no curso de gastronomia por curiosidade e, sem
nenhuma experiência na área, se arriscaram a investir em um negócio associados a um
profissional experiente que carregava consigo uma bagagem de mais de dez anos.

1.3 Empreendedor serial (criar novos negócios)


O empreendedor serial é aquele apaixonado não apenas pelas empresas que cria, mas principalmente pelo ato
de empreender. É uma pessoa que não se contenta em criar um negócio e ficar à frente dele até que se torne
uma grande corporação. Como geralmente é uma pessoa dinâmica, prefere os desafios e a adrenalina
envolvidos na criação de algo novo a assumir uma postura de executivo que lidera grandes equipes.
Normalmente está atento a tudo o que ocorre ao seu redor e adora conversar com as pessoas,participar de
eventos, associações, fazer networking. Para esse tipo de empreendedor, a expressão “tempo é dinheiro” cai
como uma luva (DORNELAS, 2007, p. 29).
Entre as características do empreendedor serial, encontramos habilidades como montar
equipes, motivar o time e captar recursos para dar início a um negócio. Me identifico com esse
perfil, pois realizo no meu dia a dia o trabalho de reunir profissionais de diferentes habilidades a
fim de formar equipes de sucesso em montar novos negócios com características próprias, que é
o que me motiva a realizar novos projetos.

1.4 Empreendedor corporativo


Devido à necessidade de as grandes organizações se renovarem e se reinventarem, o
empreendedor corporativo está cada dia mais em evidência. São executivos competentes, com
grande capacidade gerencial e conhecimento de ferramentas administrativas.

Trabalham de olho nos resultados para crescer no mundo corporativo. Assumem riscos e têm o desafio de
lidar com a falta de autonomia, já que nunca terão o caminho 100% livre para agir. Isso faz com que
desenvolvam estratégias avançadas de negociação. São hábeis comunicadores e vendedores de ideias.
Desenvolvem seu networking dentro e fora da organização. Convencem as pessoas a fazerem parte de seu
time, mas sabem reconhecer o empenho da equipe. Sabem se autopromover e são ambiciosos. Não se
contentam em ganhar o que ganham e adoram planos com metas ousadas e recompensas variáveis. Se saírem
da corporação para criar o próprio negócio, podem ter problemas no início, já que estão acostumados com as
regalias e o acesso a recursos do mundo corporativo (DORNELAS, 2007, p. 29).

1.5 Empreendedor social


A missão de vida do empreendedor social é construir um mundo melhor para as pessoas.
Costuma estar envolvido em causas humanitárias com comprometimento singular. Tem o desejo
de mudar o mundo criando oportunidades para aqueles que não têm acesso a elas. Basicamente,
possuem as mesmas características que os demais empreendedores, mas se diferenciam ao
encarar seus projetos e resultados voltados para os outros, e não para si.

Figura 1 – Serviço social


Os empreendedores sociais são um fenômeno mundial e, principalmente em países em
desenvolvimento como o Brasil, têm um papel social extremamente importante, já que por meio
de suas ações e das organizações que criam preenchem lacunas deixadas pelo poder público
(DORNELAS, 2007, p. 30).

NA PRÁTICA
O Instituto Chefs Especiais é uma ONG que oferece para jovens com síndrome de Down o ensino de técnicas
gastronômicas e informações sobre alimentos. Ele produz eventos, como hamburgadas, além de conduzir um café
na região dos Jardins, em São Paulo. Com a ajuda de diferentes personalidades da área, a ONG conquistou
diversos prêmios por iniciativas inclusivas.

1.6 Empreendedor por necessidade


O empreendedor por necessidade cria o próprio negócio porque não tem outra alternativa:

Geralmente não tem acesso ao mercado de trabalho ou foi demitido. Não resta outra opção a não ser trabalhar
por conta própria. Geralmente se envolve em negócios informais, desenvolvendo tarefas simples, prestando
serviços e conseguindo como resultado pouco retorno financeiro. É um grande problema social para os países
em desenvolvimento, pois, apesar de ter iniciativa, trabalhar arduamente e buscar de todas as formas a sua
subsistência e a dos seus familiares, não contribui para o desenvolvimento econômico. Na verdade, os
empreendedores por necessidade são vítimas do modelo capitalista atual, pois não têm acesso a recursos, à
educação e às mínimas condições para empreender de maneira estruturada. Suas iniciativas empreendedoras
são simples, pouco inovadoras, geralmente não contribuem com impostos e outras taxas, e acabam por inflar
as estatísticas empreendedoras de países em desenvolvimento, como o Brasil (DORNELAS, 2007, p. 30-31).

Esse tipo de empreendedor está presente em cada canto das grandes cidades. São pessoas
que, na dificuldade de encontrar emprego, desenvolvem atividades no mercado informal, como
os vendedores de balas em transporte público.

1.7 Empreendedor herdeiro (sucessão familiar)


O desafio do empreendedor herdeiro está em multiplicar o patrimônio familiar, o que tem
sido cada dia mais difícil, pois é um tipo de empreendedor que aprendeu muito cedo a seguir os
passos da família sem ter abertura para experimentar e inovar. Alguns conseguem mudar as
regras do jogo, outros são mais conservadores (ou de famílias mais conservadoras) e não alteram
o que tem dado certo. São esses extremos que nos mostram as variações para o perfil do
empreendedor herdeiro.

O empreendedor herdeiro recebe logo cedo a missão de levar à frente o legado de sua família. Empresas
familiares fazem parte da estrutura empresarial de todos os países, e muitos impérios foram construídos nos
últimos anos por famílias empreendedoras, que mostram habilidade de passar o bastão a cada nova geração.
Mais recentemente, porém, tem ocorrido a chamada profissionalização da gestão de empresas familiares, por
meio da contratação de executivos de mercado para a administração da empresa e para a criação de uma
estrutura de governança corporativa, com os herdeiros opinando no conselho de administração e não
necessariamente assumindo cargos executivos na empresa (DORNELAS, 2007, p. 31).

Torna-se importante o apoio de consultores especializados para a formação desses


empreendedores e a continuidade do negócio de forma competitiva.

1.8 Empreendedor “normal” (planejado)


Esse tipo de empreendedor é o mais completo, do ponto de vista da definição do termo,
porém, analisando apenas empreendedores bem-sucedidos, percebeu-se que o planejamento,
mesmo sendo uma atividade comum nesse universo específico, não se encaixa nessa categoria.

Toda teoria sobre o empreendedor de sucesso sempre apresenta o planejamento como uma das mais
importantes atividades desenvolvidas pelos empreendedores. E isso tem sido comprovado nos últimos anos,
já que o planejamento aumenta a probabilidade de um negócio ser bem sucedido e, em consequência, leva
mais empreendedores a usarem essa técnica para garantir melhores resultados. O empreendedor que “faz a
lição de casa, que busca minimizar riscos, que se preocupa com os próximos passos do negócio, que tem uma
visão de futuro clara e que trabalha em função de metas é o empreendedor aqui definido como normal ou
planejado” (DORNELAS, 2007, p. 32).

A apresentação desses perfis é uma ferramenta de análise tão válida quanto as que
trouxemos nos capítulos anteriores. Entender vantagens e desvantagens em cada tipo de
empreendedor permite que direcionemos nossos investimentos e energia de maneira positiva.
Além disso, nos ajuda a decidir melhor os tipos de parcerias e sociedades.
2 Empreendedorismo social: intenção, contexto e
desafios
O empreendedorismo social apresenta um grande crescimento nos tempos atuais. A ideia
dessa modalidade surge como uma tentativa de suprir as faltas que o sistema público não
consegue sanar. Os primeiros exemplos desse tipo de empreendimento datam da primeira metade
do século XX. Aqui é importante levar as ferramentas de gestão, de tecnologia e de inovação
para consolidar uma empreitada que não foca em produção de lucros e riquezas.

NA PRÁTICA
Florence Nightingale foi uma enfermeira que, durante a Segunda Guerra Mundial, desenvolveu um primitivo
sistema de empreendedorismo social que ajudava feridos de guerra. Seus exemplos de inovação aparecem na área
de biomedicina, estatística e enfermagem.

Figura 2 – Florence Nightingale


O empreendedorismo social é uma atitude de desenvolvimento voltada para reduzir a
desigualdade tentando sanar algum problema. Isso é feito tentando aproveitar o uso do capital
social, como trabalho voluntário, doações e parcerias. Esse tipo de empreendimento atinge as
pessoas em situação desprivilegiada, afirmando uma nova conduta social. Por ser uma área
intimamente ligada à necessidade humana de se alimentar, a gastronomia tem uma relação íntima
com o empreendedorismo social.
3 Atitudes inovadoras, realizáveis e sustentáveis
Quando tomamos o mercado gastronômico, conseguimos encontrar relações dentro de
nossos empreendimentos que chamam atenção por participar de uma maneira importante dentro
de um sistema de funcionamento. Quando consideramos inovações com direcionamento
sustentável, isso fica ainda mais evidente.

O mercado de alimentos tem, em diferentes níveis de complexidade, uma relação próxima


com a sustentabilidade, e suas inovações, muitas vezes, caminham para esse sentido, como
vimos, por exemplo, no caso do empreendedorismo social e sua importância dentro da área de
alimentos. A sustentabilidade, então, direcionará diferentes inovações na tentativa de oferecer
alimentos com menores custos e impacto ambiental.
Considerações finais
No decorrer do capítulo foram apresentados diferentes perfis de empreendedor e suas
características. São apenas classificações desenvolvidas a partir de pesquisas e coleta de dados
do Sebrae. Vale considerar as individualidades de cada sujeito além das classificações apontadas
anteriormente. As variáveis que definem o sucesso de uma empreitada são incertas e dependem
muito do posicionamento dos associados.

Foi apontada também a importância do posicionamento do empreendedor dentro daquilo


que ele busca e a capacidade de realização que, muitas vezes, vai além do que lhe traz prazer.
Compreender a nós mesmos é essencial para entender nosso lugar dentro do mercado, nossas
falhas e nossos potenciais. É preciso lembrar que nosso desenvolvimento como humanos anda de
mãos dadas com os avanços sociais e filantrópicos.
Referências
DORNELAS, José. O empreendedorismo na prática: mitos e verdades do empreendedor de
sucesso. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.

OSTERWALDER, Alexander; PIGNEUR, Yves. Business model generation: inovação em


modelos de negócios – um manual para visionários, inovadores e revolucionários. Rio de
Janeiro: Alta Books, 2011.

PORTAL TERRA. Francesco Matarazzo foi de mascate a 5º empresário mais rico do


mundo. Disponível em: <https://www.terra.com.br/economia/vida-de-empresario/francesco-
matarazzo-foi-de-mascate-a-5-mais-rico-do-
mundo,883785290daa7410VgnVCM10000098cceb0aRCRD.html>. Acesso em: 8 dez. 2017.

SILVA, Ozires. Prefácio. In: DORNELAS, José. Empreendedorismo na prática: mitos e


verdades do empreendedor de sucesso. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.
Capítulo 8
Gestão empreendedora, inovação e
criatividade

Neste capítulo final, serão discutidos os temas abordados no decorrer do curso e como eles
se relacionam na teoria e na prática. É possível perceber, ao longo dos capítulos, a relevância da
criatividade e da inovação quando se fala em empreendedorismo no ramo gastronômico. Além
disso, analisamos os diferentes modelos de negócio e como lidamos com a competitividade em
vários aspectos. No decorrer do curso, abordamos desde a compreensão da alimentação em
sociedade como recurso evolutivo até a possibilidade de criar um negócio próprio ou abrir uma
franquia.

Serão discutidas as diferentes atividades empreendedoras e o destaque da criatividade no


mercado. Neste capítulo, serão exibidos estudos de caso de pequenos e médios negócios, e um
pouco mais da minha experiência profissional.
1 Empreendedorismo a partir da gestão da
inovação
O livro de José Dornelas, Empreendedorismo na prática, apresenta um levantamento de
diversas características encontradas nos empreendedores de sucesso. Como visto no capítulo
anterior, a inovação, a estratégia e a abertura para assumir riscos são os fatores que mais
aparecem nos levantamentos realizados pelo Sebrae. Quando o autor fala sobre empreender em
negócios com pouco capital, o tema inovação também aparece com força no texto. Segundo
Dornelas, um bom exemplo de como conseguimos captar investimento para uma empreitada é o
projeto RHAE do Ministério da Ciência e Tecnologia e ligado ao CNPq. O projeto oferece bolsas
para micro e pequenas empresas inovadoras pagarem seus funcionários envolvidos em pesquisa e
desenvolvimento, como se o governo pagasse o salário dos funcionários mais qualificados para
trabalhar em uma empresa não estadual.

O resultado de nosso estudo ratifica uma estatística mundial sobre os empreendedores de que, na maioria dos
casos, o recurso inicial para começar o negócio é proveniente do próprio empreendedor (de suas economias
pessoais, fundo de garantia, heranças etc.)(...) Isso leva à sugestão de que o empreendedor deve desenvolver
melhor sua rede de contatos caso não faça parte da categoria dos que possuem um recurso inicial mínimo ou
buscar alternativas, como as apresentadas a seguir. A falta de recursos sempre foi e parece que continuará a
ser uma das principais reclamações dos empreendedores quando pretendem criar um negócio.
Especificamente no caso do Brasil, as taxas de juros e restrição de acesso ao crédito dificultam ainda mais a
capitalização dos negócios. Mas há alternativas que estão crescendo nos últimos anos, até a ‘fundo perdido’
(recursos não reembolsáveis, ou seja, não são financiamento) para o empreendedor estruturar e desenvolver
sua empresa. Nosso estudo mostra que menos de 4% dos empreendedores entrevistados usufruíram dessa
fonte de recurso.

A principal premissa para acessar esse tipo de recurso é que os projetos devem focar em inovação, ou seja,
apresentar um diferencial que crie barreira de entrada para os competidores e permita à empresa crescer
rapidamente. As linhas existentes geralmente são provenientes de agências governamentais estaduais e do
governo federal, sendo destinadas para capacitação de pessoal, pesquisa e desenvolvimento, acesso ao
mercado e outras finalidades. De todas as linhas, as mais atraentes são as destinadas a empresas inovadoras e
que não exigem contrapartida significativa. Isso já é um diferencial considerável, haja vista que, para a
maioria dos empreendedores, conseguir dinheiro em bancos significa oferecer alguma garantia real como
contrapartida (DORNELAS, 2007, p. 53).

Dessa maneira, é possível afirmar que, por meio da criatividade, conseguimos não apenas
desenvolver produtos e modelos de negócio inovadores como podemos também captar
investimentos e recursos externos por meio de parcerias e projetos de financiamento do governo
ou de grandes empresas como bancos e fornecedores de alimentos. Sobre como exercitar nossa
mente criativa e evitar que nos deixemos levar pelo “seguro”, “comum” e “confortável”:
Curiosamente, em Stanford há uma disciplina dentro do mestrado em inovação que trabalha técnicas para
potencializar a criatividade. Isto é útil para os diversos profissionais que querem arriscar abordagens mais
criativas, mas têm receio de não serem capazes. O programa é dirigido por Bill Burnett. David Kelley
também dá uma palestra (TED Talks) na qual revela sua nova missão: resgatar a confiança criativa que as
pessoas tinham quando criança, e a perderam (MELO; ABELHEIRA, 2015, p. 88).

Os autores se baseiam na neourociência para apontar fatores encontrados por trás do


processo criativo, dando dicas de como exercitar o cérebro para estimular a criatividade:

A primeira constatação é que, como resultado de um processo evolutivo, nosso cérebro roda em um modo de
“poupar energia” na maior parte do tempo. Ele opera em um nível de consumo entre 30 e 60 watts. Para
provocar o nosso cérebro para fora da zona de conforto, precisamos questionar os ‘esquemas’ que temos.
Estes ‘esquemas’ são inerentes ao ser humano, e é por meio deles que codificamos as coisas. O problema é
que estes padrões nos limitam a explorar o nosso próprio potencial, pois acreditamos neles de corpo e alma.
Os psicólogos concluíram que não enxergamos exatamente o que miramos, mas sim o que esperamos
enxergar.

Voltando a ‘como ser criativo’, descobriram que as pessoas criativas apresentam algumas características.
Tendem a ser mais visuais; tendem a ser mais sensíveis (por exemplo, com respostas táteis mais
exacerbadas); apresentam alta resposta social e são naturalmente mais empáticas (nada a ver com extroversão
necessariamente, mas são excelentes observadoras). Agora, o principal é: ELAS NÃO TÊM MEDO DE
NOVIDADES! O interessante é que esta característica não é dominante, justamente por ser contrária à
preservação da espécie. Ao se deparar com algo estranho, um reflexo racional do ser humano é se proteger.
Mas a pessoa criativa também é curiosa e, por não ter medo de experimentar, aceita o novo. Ao se deparar
com algo estranho, a pessoa criativa o toma nas mãos, pensando “nossa, o que será isto?”. A luz do perigo
não acende. Então, a conclusão é a seguinte: criatividade é um comportamento cerebral de alta energia que
não é normal para a maioria das pessoas. A boa notícia é que a criatividade pode ser trabalhada (MELO;
ABELHEIRA, 2015, p. 89).

Vou contar um processo criativo que surgiu a partir de um gosto pessoal. Há uns 20 anos
conheci o coquetel negroni, um clássico italiano pouco conhecido no Brasil até então. Me
interessei pela história dele e percebi que poderia elaborar um negócio a partir desse coquetel,
conceituando o espaço e sua arquitetura, o cardápio de comidas e bebidas, a música e o que mais
envolve a criação do conceito de um novo negócio.

Deixei um esboço registrado para o momento que surgisse uma oportunidade. Passaram-se
18 anos e recebi o convite para alugar um imóvel bem localizado na região de Pinheiros, em São
Paulo, e logo pensei ser este o local ideal para o Negroni bar.

Primeiro, elaborei um plano de negócios para entender a viabilidade do negócio, constituir o


conceito do bar e, por meio de um estudo do entorno, identificar quais produtos oferecer. Depois,
com o estudo realizado e finalizado, montei uma apresentação com o intuito de captar
investidores para realizar o negócio e ofereci para algumas pessoas com a intenção de
diversificar os investimentos. Não foi fácil, mas, após o convite para alugar o imóvel, consegui
captar o valor necessário.

Uma boa ideia e um estudo detalhado de viabilidade, associado à experiência de mercado,


me propiciaram abrir um novo negócio com recursos de terceiros. Para isso, é essencial estar
antenado não só sobre a situação atual do mercado, mas também sobre suas tendências. O
mercado em geral, inclusive o de alimentos e bebidas, se move de acordo com tendências. Elas
surgem, inicialmente, como uma novidade que, ao ser bem recebida pelo público, encontra
propulsão tanto no aspecto comercial como no publicitário, o que atinge o público e o faz
consumir em larga escala.

Devemos procurar onde surgem essas tendências para que estejamos sempre um passo à
frente.
2 Boas práticas de gestão empresarial para a
competitividade
Como foi afirmado ao longo do livro e neste último capítulo, a inovação e a criatividade,
aliadas ao comportamento estratégico do empreendedor, são os fatores mais importantes para o
desenvolvimento de um negócio de sucesso no mercado de alimentação e bebidas. Como visto
no capítulo anterior, a coragem para assumir riscos é uma característica comum entre os
empreendedores de sucesso. No entanto, como o levantamento realizado foi feito com
empreendedores que obtiveram sucesso, devemos também considerar os empreendedores que
assumiram riscos, mas não obtiveram sucesso, e reavaliar o que pode ser modificado para evitar
situações semelhantes.

Ashton (2015) apresenta uma suposta carta escrita por Mozart sobre o seu processo criativo,
como se sinfonias, concertos e óperas lhe viessem inteiros à mente quando ele estava sozinho e
bem-humorado, como se não precisasse de ferramentas para compor. A carta era forjada,
obviamente, e como aponta o autor:

As verdadeiras cartas de Mozart – para o pai, a irmã e outras pessoas – revelam seu verdadeiro processo de
criação. Ele era excepcionalmente talentoso, mas não compunha por magia. Esboçava suas composições,
revisava-as e às vezes ficava empacado. Não conseguia trabalhar sem um piano ou um cravo. Punha o
trabalho todo de lado e voltava a ele mais tarde. Avaliava a teoria e a qualidade enquanto escrevia; pensava
muito sobre ritmo, melodia e harmonia. Ainda que o talento e toda uma vida de prática o tornassem rápido e
fluente, seu trabalho consistia nisso: trabalho (ASHTON, 2015, p. 14).

Com as experiências que observamos à nossa volta, principalmente quando trabalhamos


com pessoas que vivem de criação, percebemos que tudo é resultado de muito trabalho e
pesquisa. Algo até pode ser feito por acaso, desde que como resultado de um longo processo que
envolve tanto resultados positivos como negativos, até que se alcance o esperado ou mesmo o
supere. Sobre o mito da genialidade, Ashton aponta que:

Os gênios têm momentos dramáticos de percepção quando obras e teorias grandiosas nascem inteiras.
Poemas são escritos em sonhos. Sinfonias são compostas completas. São feitas descobertas na ciência com
gritos: “Eureca!”. Empresas são construídas como num passe de mágica. Algo não existe e, então, passa a
existir. Não vemos a estrada que vai do nada ao novo, e talvez não queiramos ver. A arte deve ser magia
nebulosa, e não suor e esforço. Embota o brilho pensar que toda equação elegante, toda pintura bela e toda
máquina brilhante nasce do esforço e do erro, origina-se de impulsos equivocados e fracassos. É sedutor
concluir que a grande inovação chega até nós por milagre por meio do gênio. Daí o mito (ASTHON, 2015, p.
14).
Considerando o mercado de alimentação e bebidas, ao se falar em práticas de um
empreendedor inovador, logo pensamos em planejamento e brainstorming. Melo e Abelheira
(2015) apresentam o brainstorming como principal ferramenta da cocriação. Como comentado ao
longo do livro, nunca fazemos nada sozinhos. Dependemos de sócios, investidores, fornecedores,
equipe e consumidores. Em tradução literal para o português, “a tempestade de ideias” tem como
objetivo principal capturar muitas ideias de maneira rápida e bruta. Entre os elementos apontados
por eles para um brainstorming eficiente, encontra-se o ambiente onde acontecem as reuniões:

É necessário ter espaço e uma grande mesa ou uma área comum, onde as pessoas possam se sentir próximas,
ver todos e ouvir a todos. Áreas verticais livres (quadros brancos, paredes, vidros) são importantes para
receber ideias (...) O astral de um brainstorming é um comando de guerra preparando uma operação de
invasão, mas sem a hierarquia. Não é baderna, estão todos direcionados ao mesmo objetivo, e há algumas
regras básicas de conduta (MELO; ABELHEIRA, 2015, p. 82).

Outros fatores essenciais para um brainstorming eficiente são confiança, ou seja, as pessoas
precisam estar à vontade e, para isso, precisam ser conhecidas, para que não tenham medo de se
expressar livremente. “Por esse motivo, equipes que praticam brainstorming juntas tendem a
ficar cada vez melhor como equipe, pois há descontração; e sucessos passados constroem
credibilidade para desafios futuros” (MELO; ABELHEIRA, 2015, p. 82). O tempo de duração
das sessões de brainstorming também é importante. Segundo os autores, não deve passar de uma
hora. Além disso, as ideias e os resultados que aparecerem durante as sessões devem ser
registrados de 15 em 15 minutos.

A multidisciplinaridade dos membros da equipe também é um fator crucial para a


produtividade de uma sessão de brainstorming: “Se todos pensarem parecido, não haverá muito
sentido em fazer um brainstorming, pois os modelos mentais serão semelhantes. Os pontos
distintos são a riqueza do coletivo.” (MELO; ABELHEIRA, 2015, p. 82). A disciplina é outro
ponto, pois o brainstorming não pode ser tomado pela bagunça, deve ser uma reunião focada.
Pode, no entanto, ser barulhento, ter música, elementos em vídeo e objetos que as pessoas
possam manipular enquanto pensam. Principalmente, é importante obedecer as “regras de ouro”:

Um tópico por vez! (MELO; ABELHEIRA, 2015, p. 83).

Mantenha o foco! (p. 83).

Encoraje ideias inusitadas! (p. 83).

É proibido julgar! “Vai ter uma hora para isso. Cuidado com a sua linguagem corporal ou
com os seus resmungos. Eles podem ser igualmente desestimulantes e minar a energia do
time” (p. 84).

Construa sobre as ideias dos outros! “Não há nada mais nobre e revigorante para uma
equipe do que uma boa ideia refinada em conjunto, em que se adiciona tempero ou uma boa
distorcida. Bom para quem sugere, bom para o moral da própria equipe” (p. 84).

Busque quantidade! (p. 84).

Seja visual! “A expressão do brainstorming é visual, mas, para ter quantidade no tempo
disponível, quanto mais cru, melhor. Bonequinhos de pauzinho, histórias em quadrinhos,
esquemas, diagramas, tudo é válido” (p. 84).

Pense centrado no usuário! “Não se esqueça que é para ele que trabalhamos. É em volta do
ser humano e das relações afetivas com seu entorno que se constrói valor no mundo
material” (p. 84).

As ferramentas citadas servem de guia para como, na elaboração de um novo negócio, uma
equipe com habilidades e ideias distintas e com o mesmo objetivo pode, organizando seu
processo criativo, realizar um trabalho consistente, a fim de facilitar o estudo dos detalhes de seu
futuro negócio.

Um novo pensamento que permeia a gestão no século XXI é uma reavaliação do paradigma
piramidal de gestão e liderança. Ou seja, inverte-se a pirâmide e, com isso, a importância da
opinião de quem está na “linha de frente” do negócio surge com maior relevância. O que o gestor
deve ter em mente é que o contato com o cliente, por meio dos produtos vendidos, será sempre
com o setor da empresa que está na linha de produção, e não o contrário.

Por mais que tenhamos um gestor que se relaciona com os clientes, que vai até a mesa
conversar, pedir a opinião das pessoas, não podemos considerar essa relação mais importante do
que a pessoa que produz a comida. Mesmo que não haja o contato pessoal, a relação entre
produto e cliente está estabelecida por meio de quem produz. Outro exemplo é referente à pessoa
que recebe os pratos sujos. Algo que costuma ser ignorado, mas é bastante importante: as
pessoas que limpam os pratos sabem como eles voltam do cliente e são uma das linhas de frente
da observação de resultados. Ao saber como os pratos voltam da mesa, sabemos se a comida foi
satisfatória tanto em sabor e qualidade como em quantidades e proporções. Essas informações
são essenciais para que esbocemos o perfil do cliente e do produto servido.
3 Atividades empreendedoras e capacidade
criativa
O empreendedorismo, como dito em capítulos anteriores, não só diz respeito a uma vontade
ou uma opção profissional, ele é de fato um estilo de vida e uma maneira diferente de garantir
nosso sustento. No Brasil, temos uma taxa de 15% dos cidadãos entre 18 e 64 anos de idade em
atividade empreendedora, ou seja, negócios com menos de 42 meses de existência (GLOBAL
ENTREPRENEURSHIP, 2016). Ainda que em momento de crise, estamos em uma fase
econômica cujo leque de atividades e produtos é amplo e está em crescimento. Assim, como
alternativa para atividades que se tornam obsoletas e que, por consequência, geram desemprego,
o brasileiro tem buscado alternativas de empreendimentos para garantir seu sustento.

Evidentemente, só a necessidade de empreender não é suficiente. É crucial ter a capacidade


de criar uma opção e, dentro dela, um negócio viável , pois é nesse espaço que entra a
capacidade criativa. Ela envolve perceber um espaço no mercado e dentro dele criar de maneira
bem-sucedida. Um exemplo bom são as food bikes, empreendimentos de gastronomia itinerante
que usa bicicletas. No ano de 2014, surgiram vários desses empreendimentos, em razão de seu
baixo custo inicial, da facilidade de diversificação e da tendência do mercado em promover essa
modalidade, porém poucos duraram. O mercado mudou, a prefeitura diminuiu as permissões
para essas empresas funcionarem, as opções e as oportunidades diminuíram muito e a maioria
acabou falindo. Algumas foram capazes de se reinventar e isso ocorreu de diversas maneiras.
Algumas abriram lojas físicas, outras se especializaram em catering, fazendo até mesmo
casamentos, etc. Nessa segunda modalidade, a comida itinerante deixou de aparecer na rua,
porém tornou-se uma opção fácil para produção de diversos eventos, tirando a responsabilidade
da alimentação dos realizadores do evento, que não se preocupam nem com a estrutura para a
produção. Pegar a oportunidade de transformar a comida de rua em uma empresa de catering é
um ótimo exemplo de gestão criativa e de sintonia com o mercado.
4 Estudo de casos: empreendedorismo em
pequenos e médios negócios
Para abertura de meu primeiro negócio, o restaurante Nou, cumpri todas as etapas aqui
descritas, adaptando-as para minha realidade e do ambiente onde me encontrava. Formei um
grupo de sócios com habilidades distintas e complementares, definimos a melhor maneira de nos
organizar no processo de elaboração do negócio. Para não perder o foco e identificar as boas
ideias, elaboramos um plano de negócios detalhado, que nos possibilitou, durante esse processo,
corrigir o necessário e ter uma ferramenta que nos guiasse durante as diferentes etapas da
abertura do negócio, além de identificar sua viabilidade. Depois de quase 10 anos, o plano de
negócios continua sendo uma importante ferramenta para as decisões futuras do restaurante. A
cada ano, reavaliamos o que foi planejado, ajustando o necessário de acordo com o mercado, sem
perder a identidade e sem tirar o foco do que se pretende alcançar.

Após essa primeira experiência, adotei a mesma metodologia na abertura de novos


negócios, e hoje são outros três: o Mano Sanduíches, o Negroni bar e o Estepe bar, como foram
apresentados anteriormente. Boas ideias, planejamento, organização, disciplina e vontade de
empreender são necessários para realizar negócios de sucesso. Fique atento a esses pontos.

Um dos principais pontos em que me apoiei para o desenvolvimento desses três lugares
citados foi trabalhar com pessoas jovens com quem já trabalhara em empreendimentos prévios.
Ou seja, boa parte dos funcionários do Mano Sanduíches vieram do restaurante Nou. O gerente e
o chefe de bar do Estepe vieram do Negroni Bar. Essas pessoas não só já vieram capacitadas para
o trabalho, como também trouxeram a bagagem de como lidar com os clientes da região e da
faixa etária específica, além de já conhecerem a maneira como eu trabalho e gerencio meus
negócios.

Eles são minha linha de frente para lidar com os clientes, e ouvir e respeitar suas ideias e
opiniões foram essenciais para o desenvolvimento do projeto empreendedor. Portanto, em vez de
investir em uma empresa de consultoria, dei chance para pessoas adaptadas ao mercado, com
“jogo de cintura”, boas relações pessoais e que, acima de tudo, sabiam o que iriam vender. Isso
foi fundamental para que déssemos um passo ousado, mas seguro. Que nos permitiu, em vez de
reconquistar o sucesso, dar um passo com sucesso mais garantido e estável.
Considerações finais
O empreendedorismo na área gastronômica é complexo como em todas as áreas. Analisar os
fatores envolvidos, como área, mercado, região, especialidade e tipo de empreendimento, é uma
tarefa fundamental. Em seguida, entender o tipo de empreendedor que somos e como
pretendemos nos encaixar dentro de uma empresa é peça-chave para ter um desenvolvimento
produtivo.

Além disso, tenha sempre em mente a importância de criar um padrão de qualidade, de


serviço, gastos e custos organizados, para que assim seja possível alcançar uma realidade
competitiva, dentro do grupo que se pretende empreender.
Referências
ASHTON, Kevin. A história secreta da criatividade. São Paulo: Sextante, 2015.

DORNELAS, José. O empreendedorismo na prática: mitos e verdades do empreendedor de


sucesso. Rio de Janeiro: Elsevier Brasil, 2013.

GRECO, Simara Maria de Souza Silveira (Coord.). Global Entrepreneurship Monitor.


Empreendedorismo no Brasil: 2016. Curitiba: IBQP, 2017. 208 p. Disponível em:
<http://www.bibliotecas.sebrae.com.br/chronus/ARQUIVOS_CHRONUS/bds/bds.nsf/941a51dd
04d5e55430088db11a262802/$File/7592.pdf>. Acesso em: 14 fev. 2018.

MELO, Adriana; ABELHEIRA, Ricardo. Design thinking & thinking design: metodologia,
ferramentas e reflexões sobre o tema. São Paulo: Novatec, 2015.
Sobre o autor

Paulo Sousa é pós-graduado em Gestão de Negócios de Alimentação e tecnólogo em


Gastronomia. Atua em diversas áreas de negócios de alimentos e bebidas, desde a idealização do
negócio e o estudo de viabilidade até a implantação, o serviço, a cozinha e a gestão. Atualmente,
é sócio-fundador, gestor administrativo e operacional do restaurante Nou, aberto em 2008, Mano
Sanduíches, aberto em 2015, e dos bares Negroni, aberto em 2016, e Estepe, aberto em 2017.

Há 20 vinte anos, atua no segmento em variadas funções, como garçom, bartender,


cozinheiro, maître, gerente e consultor, nos restaurantes Piola, Le Tan Tan, Capim Santo,
Piranha, Ritz, entre outros.
Administração Regional do Senac no Estado de São Paulo
Presidente do Conselho Regional
Abram Szajman

Diretor do Departamento Regional


Luiz Francisco de A. Salgado

Superintendente Universitário e de Desenvolvimento


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Todos os direitos desta edição reservados à
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Jeane Passos de Souza - CRB 8ª/6189)

Sousa, Paulo
Contextualização, inovação e competitividade para negócios em alimentação /
Paulo Sousa. – São Paulo : Editora Senac São Paulo, 2020. (Série Universitária)
Bibliografia.
e-ISBN 978-85-396-2426-3 (ePub/2020)
e-ISBN 978-85-396-2427-0 (PDF/2020)
1. Gastronomia 2. Negócios em alimentação 3. Modelos de negócios 4. Food
Service 5. Food Design. I. Título. II. Série.

18-011u CDD – 641.4


BISAC HEA048000
CKB101000
BUS043000
DES007020

Índice para catálogo sistemático


1. Gastronomia : Negócios em alimentação 641.4
MODAGASTRONOMIATURISMODESIGN
TECNOLOGIAEDUCAÇÃOARTESHOTE
LARIACIÊNCIASHUMANASFOTOGRAF
IACOMUNICAÇÃOARQUITETURAGES
TÃOMEIOAMBIENTESAÚDE
Planejamento e operação em mídias sociais
Bortoleto, Renata
9788539627547
146 páginas

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A Série Universitária foi desenvolvida pelo Senac São Paulo com o intuito de preparar
profissionais para o mercado de trabalho. Os títulos abrangem diversas áreas, abordando desde
conhecimentos teóricos e práticos adequados às exigências profissionais até a formação ética e
sólida. O livro Planejamento e operação em mídias sociais traça um panorama sobre os possíveis
ganhos das marcas e de seus públicos no território das mídias sociais, não só do ponto de vista do
negócio, mas sobretudo do relacionamento e da troca de experiências de valor. Nesse sentido,
apresenta caminhos para a criação e distribuição de conteúdos nas redes sociais diante da
implementação de um processo específico para esse fim. Por meio do estudo de ferramentas e de
casos de mercado, convidamos os leitores a pensarem sobre como traduzir os valores, o universo
e a visão de mundo de suas empresas em uma escolha coerente das plataformas sociais e dos
temas a serem desenvolvidos, integrando-os, ainda, aos canais já existentes. Dessa maneira,
buscamos mostrar formas mais atuais de produção de sentido, engajamento e aproximação de
seguidores e consumidores.

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Nutrição aplicada e alimentação saudável
Martins, Beatriz Tenuta
9788539622733
360 páginas

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As informações contidas neste livro constituem o essencial de uma área básica do conhecimento
humano: a nutrição, compreendendo a dietética como um de seus ramos mais delicados. E saber
nutrir é papel essencial de todo profissional dedicado à saúde. O livro está dividido em quatro
grandes grupos, ou assuntos importantes para o estudante ou profissional da área: Nutrição e
saúde pública; Nutrição aplicada à área clínica; Alimentação coletiva e Estudo experimental dos
alimentos. Assim, aborda os princípios que envolvem a nutrição humana e os aspectos
específicos que devem ser considerados nos diferentes estágios da vida, como também traz
conceitos relativos à avaliação nutricional, à saúde pública e à alimentação saudável. Ao tratar da
nutrição ligada à área clínica, considera os aspectos relativos à fisiopatologia e à dietoterapia,
além de questões que implicam higiene e segurança alimentar. As técnicas dietéticas e a gestão
em alimentação coletiva aprofundam o tema, sem deixar de suscitar questões relativas à
gastronomia, ao estudo dos alimentos e ao desenvolvimento de novos produtos. Publicação do
Senac São Paulo destinada a alunos, professores e profissionais da área da saúde relacionada à
nutrição e dietética.

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Comida de bebê
Lobo, Rita
9788539614493
168 páginas

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Como é esperto esse seu bebê: nem fez um ano e já vai melhorar a alimentação da casa toda. Não
acredita? Está tudo aqui, nas páginas de Comida de Bebê: uma introdução à comida de verdade.
Com apoio de médicos e nutricionistas, Rita Lobo traz as respostas para as dúvidas mais comuns
da fase de introdução alimentar e, de quebra, ainda ensina a família a comer com mais saúde,
mais sabor e muito mais prazer. Venha descobrir como o pê-efe, o prato feito, essa grande
instituição brasileira, vai virar o pê-efinho do bebê.

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Cozinha a quatro mãos
Lobo, Rita
9788539624546
168 páginas

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Se o casal decidiu cozinhar, já deu o passo mais importante para manter uma alimentação
saudável. Rita Lobo apresenta receitas para jantares rápidos e também ensina a planejar o almoço
do dia a dia (pê-efe), a marmita para levar para o trabalho, o brunch para receber os familiares e
ideias de happy hour para os amigos. E todos os cardápios vêm com plano de ataque – um guia
com instruções detalhadas para que cada refeição seja preparada a quatro mãos, em menos tempo
e sem pesar para ninguém. Você vai encontrar dicas para elaborar a lista de compras, orientações
para armazenar os alimentos e escolher utensílios e muitos truques para economizar. Cozinhar
vai virar programa a dois!

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O que tem na geladeira?
Lobo, Rita
9788539626205
352 páginas

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Como é que eu transformo a compra da feira em refeições variadas e saborosas todo santo dia?
Este livro tem a resposta. Rita Lobo ensina sua fórmula de criar receitas e apresenta mais de 200
opções para variar o cardápio. Em O que tem na geladeira?, que é baseado na série de mesmo
nome do canal Panelinha no YouTube, você vai descobrir que preparar comida saudável de
verdade é mais simples do que parece. O livro é dividido em 30 capítulos, cada um dedicado a
um alimento da abóbora ao tomate, passando pela cebola, escarola, milho, repolho, entre outros.
E você vai aprender os melhores cortes, técnicas de cozimento e combinações de sabor para
esses alimentos. Além das preparações com hortaliças, raízes e legumes, o livro apresenta
também opções de receitas com carnes para compor o cardápio. Tem filé de pescada frita, tagine
de peixe, coxa de frango assada, peito de frango grelhado, bisteca grelhada, lombo de porco,
costelinha, kafta de carne, bife de contrafilé e muito mais. Nas mais de 200 receitas, bem
variadas, você encontra opções de entradas, pratos principais, muitos acompanhamentos e até
alguns bolos, como o de cenoura, de mandioca, de pamonha, e sobremesas, como o doce de
abóbora, o curau e um incrível sorvete de cenoura indiano, o kulfi. Para Rita Lobo, cozinhar é
como ler e escrever: todo mundo deveria saber. Mas ninguém nasce sabendo! Este livro vai dar
uma mãozinha nesse processo de aprendizagem.

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