Você está na página 1de 325

AS OR I G E N S : A I N F A N CI A E A M O N TA N H A

H ei s a udad es d e m i m, d outr o q ue f — m e i no !
ui n

( A M i h A lm )
n a a

C r i ad o e m alt os s í t i os d e g r a n i t o ,

Na v i zi n h a n ça agr e s t e d o I n fi n i t o

( A M i h a H i t ór i
« n s a .,
i T Pn i bi d )
err a ro a

Se h ouv e hom e m pr e s o a vida i nt e ira à s r ecord a


çõ es d a i nfânci a e o q ue é m ai s a o es t a do d e g ra ça
, ,

infan til e ss e hom em c ham a s e T e i x e ira d e Pascoa es


,
-
.

A infân c ia sign ifi ca para e l e a vida pura a e t e rn a ,

prom essa q ue s em pr e o acom pan hou e m l u t a vito ,

r i os a com a mort e A infân ci a é um a nuv em com o


. «
,

a v e l h ic e é um a p edra : n uv e m q u e abrang e tudo


'

p edra q ue tud o r e string e a sua form a dura e r ecor


tada ( L i vr o d e M em ór i a s p
» A po e si a para
, .
,

T e i x e ira d e Pascoa es é a infân ci a r ecup erad a o


, ,

Pa raíso o son h o re con qui s t ados D el e p od eríam os


,
.

diz e r o q ue A lb ert B éguin escr ev eu a r esp eito d o


rom ân tico J e an Paul : Mais q ue por qualqu er razão
«
,

J ean Paul am ou o son ho porqu e o tran sportava às


r egiõ e s d a i nfân ci a ; o r egr e sso à can dura d es l um
brada d a prim e ira idad e ficou s e n do a sua r esposta
pr eferid a às an si edad e s do hom em am adur ecido .

0 m inut o em q ue n asc era para a c on sciên ci a fora


para el e a e n trada n a e sfera d o dual ism o on d e h ab ita ,

a am e aça da mort e Mas en amorad o d e un idad e e de


.
,

9
T E I X E I R A D F. P A S C O A E S

in ocência s aud os o d o t em p o e m q ue o mund o er a


,

infin it o cul tiv ou t od os os m eios q ue p erm iti ss em


,

r e stituir l h e h oriz ont es s em l im it e s ban hados por ,

u m a luz pura ( L A m e R om a n t i q ue e t l e R ê ve
'
'
»
,

ed .1 95 6 p J á n o fin al d a e xi st ên ci a nos
, .
,

Ve r s os P ob r es a o d escr e v e r s e com o alma -


«

p en ad a e n t r e gu e à s t em p e stad e s Pasc oa e s acr es »


,

c enta : s obr e e l a e sv oaça Vaga can ção t oda f l ui


«
, ,

d ez d istân cia
, E tér e a graça ,
A m in h a i n f â n ,

( p oem a X X X V ) N ão a p e n as um passad o .

q u e s e r e corda m as u m pr e s e n t e q ue r e ssurg e d il a
, ,

tad o i n tangí v el c om o alg o fora do t em po ; o q ue


, ,

n un ca m orr e o c on trári o d a m ort e ,


.

Nasci a o pôr d o Sol dum d ia d e N ov embro


« - -
.

O meu b erç o o cr e púscul o ( A Minh a «

História i n T er r a P r oi bí d a ) F oi e m A m arant e
»
,
.
,

3 2 d e N o v e m br o d e 1 8 7 7 di a d e Fin ad os quan d o , ,
«

os sin os soluçam badal adas C ircun st ância q ue s er » .

viri a a Pasc oa es para d e t erm in ar l í ricam en t e a causa


r emota d a sua m el ancol ia
A infân ci a d e c orr eu —
.

l h e n o s ol ar d e Pasc o a e s e m ,

G at ao a três q u i l ô me t r os d e A m aran t e e m pl en a
, ,

s erra v erd ej ant e vi rad a a o Ma r ãoz i n h o D e s eu , .

n om e J oaquim P e r eira T e i x e ira d e Vasc onc e l os per ,

t e n c i a a fam íli a nob r e e abastada O pai João P e r e ira .


,

T e i x e ira d e Vasc on c e los f oi d e putad o par d o R ei n o , , ,

pr e sid e nt e d a C âm ara Mun icipal d e A m arant e ,

gov ern ador civil d e Vi s eu e d o P orto Fal ec eu em .

1 92 2 C asara e m 1 8 7 5 c om D C arl ota G u e d e s M on


. .

t e i r o q ue l h e d e ra s e t e fil h os : A ntón i o ( 1 8 7 6
,

J oaqui m o futur o p oeta M i g u e l in a R osa outro


, , ,

A n tón i o ( 1 88 0 Mari a d a G lória q ue tam ,

bém h avi a d e cul tivar a p oesia J oã o q u e s eri a caça , ,

d or d e e l efan t e s e e scrit or fin alm ent e Á lvaro , .

D C a r l ota só havi a d e m orr e r em 1 95 2 onz e m e s e s


.
,

ant es d e T e i x e ira d e Pasc oa es ; assim o p oeta q ue ,

m uit o a amava pôd e s en tir s e um e t erno m e n ino


-
.
,

« O h om em — e scr ev eu — n unca sai das en i ra n h a s


I O
O B R A S C O M P L E T A S

m at ern as a n ão s e r para o túm ul o ( S ão P a u l o


,
» ,

p «Quand o a M ãe 0 pr ec ed eu h á algun s m es e s ,

— t e s t e mu
.
,

el e gritou : É u m m u n d o q u e s e a c a ba ! »

n h a a s obrin h a Mari a J os é filh a d e D M i q uel i n a , .


,

pouco d epoi s da mort e do po eta ( i n Vér t i c e n 1 1 5 , .


º
,

Març o d e
A C asa um d os c en ários d a sua infân ci a m ítica
, ,

ora r eapar ec e tal com o f oi n a m e n t e d o p oe ta or a


, , , ,

p elo con trast e en tr e o passad o e o pr e s en t e p orqu e ,

o pr es ent e de v el h ic e e abandon o ( durant e os an os


e m q ue fic ou d e sabi tada após a m ort e dos avós ) ,

ap en as alud e a o q ue fi nd ou d e stil a a tri st ez a d e s e ,

viv e r no t em po como pr e sa d a m ort e D e qualqu e r


, .

modo pól o d e atracção : estã o l á os obj e ctos fam i


,

l i a r es d e outr ora vagu e iam l á as sombras d os pai s


,

e d os avós O po eta t em n a C asa a s suas raíz e s ;


.

d e scr evê l a é r etom ar p oss e do m ai s íntim o d e si


-
.

N ão s e can sa d e e v ocar d e i n vocar : a m e sa v e l h in h a


,

c om um a j arra q u e e m outro t e m p o t ev e fl or e s ; o
, ,

pi an o v el h in ho n um si lên cio d e n otas m i st eri osas ;


,
« »

as tábuas carun chosas do sobrado ; an tigos can apés


e cad e iras d e pau pr e t o ( Ond e j ulg o aind a v er
-
s en «
,

tadas c on v ersand o
, C ri aturas q u e a M ort e f oi
,

l e van do E q ue h oj e s ão na t e rra ossadas d e e squ e , ,

l eto um v el h o arm ári o um a ch al e ira d e e stan h o , ,

um a n egra pr eg ui ceí r a on d e a a vó fi ava n a roca a , ,

um can t o da lar e ira um a can d ei a d e az e it e em s í n


,
«

cop es d e T udo torn ado v en eráv e l di gn o d e ,

r eligi osa c on t em pl açã o E n ão e squ ec e as im ag e n s .

d a cap el a ( antigas e scul turas D e S an tos a qu em


«

j á r ezaram m e us avós ) ( V el h in has C ousas i n » « »


,

Ter r a P r oi bi d a ) A rran can do ao l i mbo e ss e mun d o


— o m un do j á irr e al d a sua infân ci a do s eu G én e
.

sis Pasc oa e s int egra s e n o t od o a q ue p ert en c e -


.

Voltan do à C asa ob ed ec e a um a l ei in elutáv el A l i


,
.

e nv e l h e c e r e n asc e e can ta : N e sta casa d e m ístic o


,
«

aban dono , Vivo c om o s e foss e o pr ó prio Outono »

( C a n t os I n d eci s os XI I ) E após a mort e a ex em


, .
, ,

I I
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

plo d os pais e d os avós al i e rrará em e sp ectro ,

« Ó v e lha casa d e p ois da m in h a m ort e vagu ear e i n os


,

t eus corr ed o re s n as tuas sal as quan do a sombra e o


D ebruçar — m e—
, ,

silên cio i nvad e m ci n as tuas ,

jan el as ab ertas s em ruído v end o o luar e ncob e rt o


, ,

das h o r as m ortas Vagu ear e i n o t eu j ard im ; e e ntr e


.
,

as s ombras d as árvor e s s er e i um a sombra a ,

( Ver bo E s cu r o p ,
.

O c e n ário da infân ci a alarga s e : em torno d a C asa -

o j ard im a quin ta o cam po a s erra tudo s ol id ário


, , , ,

n a m emóri a do po eta Um a da s fon t es a do A njo .


,

e d o Fauno junto à e scadari a d e e n trada h avia de


, ,

sug e ri r a Pascoa e s a al iança do C ri stian i smo e do


Pagan ismo ] es u s e P ã Outra a dos G olfin hos no
,
.
, ,

j ardi m d ar l he i a a o s ecar um dos s eus gran d es des


,
- -

gost os i n spi rando l h e v ersos m agoados E v ejo a


,
-
. «

antiga fon t e : os dois g ol f i n hos E o n i cho don d e


outr ora Um san to con t em pl ava os passarinhos
V oando à flor d a aurora
, V ej o a nossa » «

ram ada a o l ong o d o quintal : C l austro d e fol has


,

mortas a , ( Qui nta d a Paz i n S emp r e )


« », .

A a vó o avô s ão figuras tut e lar e s d a idad e m ara


,

v i l h os a q ue s e e sfuma n a d istân ci a d os an os : E v ejo «

m in h a A vó a tar efada d esd e o c orar do dia e v ejo a -


,

à noit e an t e um a cruz d e C ri sto ajo e lh ada


,
»

« E v ej o m eu A vô q ue e r a a can dura d e m in h a A vó
m udad a e m fortal eza H om em sim pl e s e fort e q ue
.

n asc e u n a m ai s sim pl e s e fort e n atur eza d e s err a


aust era e ( A S ombra do Passado « »
,

A s S om br a s ) J á d e cab e los brancos o p oeta s en t e a


.
,

e stranh a vol úpia d e vagu ea r com as sombras dos

avós p elos c orr edor e s d a C asa torn ado el e próprio , , ,

quas e irr e al tamb ém D e v e lhos r etrat os a ól eo n a .


,

p enu m bra das par ed es d espr end e s e um sorris o , ,

um a atitud e d e al ma o po eta por sua v ez olh a os , , ,


-

e sorri poi s tamb ém e l e n ão passa d e aparência m au


, ,

r etrat o d e s i m e sm o ond e cin tila à s v ez e s um a l uzi ,

n ha d e m istéri o — um a a p a r i ção
, ,

12
O B R A S C O M P L E T A S

D esd e m e n in o convi ve u com a g e nt e hum i ld e do


cam po r ec eb e ndo um a d upl a l ição : a d o valor da
,

hum ildad e e a d o portugu e sism o q ue e stá n a orig e m


da A r t e d e s er p or t ug u ês Os criad os c on ta vam l he -

h ist ó ri as d e bru x ed os cas os t errív e i s d e l adrõ e s — e


.

o m edo q ue s eri a um dos t em as da sua po e sia i n s


, ,

t a l ou s e l h e n a al m a Se G arr e tt t e v e um a B rígida
q .

para l he abri r a s portas d a im agi n aç ão popul a r a


Pascoa es n ão faltou um a L ucréci a — a cri ad a q ue
,

muitas v ez e s l embra n o L i v r o d e M em óri a s b ai xa e ,

m agra d e ol hos n e gros e sum idos d uas r e pas suj as


, ,

d e cab e l o q ue n un ca l h e embran qu e c eram E n quan to .

fi ava n a roca à l ar e ira c on tava h istóri as d e d efun


, ,

tos Os r efl e x os d as l abar edas av erm e l h avam l he as


.
-

m aç ãs d o rost o ; as cin zas e m poavam l he o cab elo -


.

Par eci a um vulto d an t esco a própri a alm a dos mon ,

t es e nsombrados Ouço l h e a voz n octurn a a e sbo


. « -
,

ça r fantásticas c en as e pe rs on ag e n s n o fum o torv o ,

d a lar e ira A sua voz cri stal i z ava em e sp ectr os vi vos


.

q u e m e ficaram n a m e mória A tua v o z L ucré


ci a ! Ouço —
,

a com o v ejo o t eu corpo d e n inguém


, ,

pouco m ai s q ue a tua blusa e as tuas sai as d o m e sm o


pan o e scuro roubad o às tr e vas ( obra cit p »

Outros criados — a E us ebia a R osa o A ntón io


. .
, ,

, ,

p erpassam em Qui nta d a Paz : Ouço contos d e


« » «

b rux edos ; D e a l m i n ha s a sofr e r n a so l id ão :


O i m agin ar d o Povo a luz d o M e d o , Q ue e m , ,

m im s e f ez n octurn a
, E v ej o o antigo
cri ad o o p a d r e A n t ón i o Q ue fal ava d as b r ux a s
, ,

do d em ón i o D os fran c es e s ( t e rrív e is pe sad e


,

l os l ) E con nosc o brin cava ( S em p r e p » , .

A s i nvasõe s fran c e sas a r esistên ci a h er ó i ca n a


,

pon t e d e A m arant e ainda estavam vivas n a m em ó ri a


,

do povo A ssim o i nt er e ss e de Pascoa es p e l a fi gura


.
,

d e Napol eã o data dos t e m pos d a m e n in ic e « L oi son


o m a n et a p ercorr e E n tr e D ouro —
.
,

, e M in ho e i n cen - -

d eia A m aran t e ( 1 3 d e Maio de q u e l h e r es i s


t i u m as foi qu e im ada D as suas casas fic aram as
, .

13
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

par e d e s d en e gridas ( N a p o l eão p E ram


»
,
. «

aqu e la s b a r r e t i n a s e n orm e s d as gravuras q ue e u ,

avi s tava n o h o r iz on t e da A b ob r eira em criança m al


, , ,

a s cri adas g r itavam : M e n i n os n ão fa ça m ba r u l h o , ,

q ue v ê m a í os F r a n c es es ! ( i bi d em p Numa »
, .

ca r ta ín ti m a in éd ita a L D d e 2 5 d e J un h o d e
, ,
. .
,

1 909 Pasc oa e s r e gista t r adiçõ es fam il iar e s l igad as


,

às i nva s õ e s fran c e sas : Quand o f oi d a gu erra d o s «

Franc e s e s meu B isavô pat ern o er a c om andant e d os


,

D ragõ e s d e C hav e s e v i u d o al t o d a s erra d o Marã o


,

a s ua ca s a ard er ! T in h a sid o in c e nd iada p el os Fran


c es e s assim c om o quas e t oda a Vila D e n ossa casa
, .

s ó e scap ou das ch a m as a cap el a ; e os S ant o s q ue

n el a ain da e xi st em ainda e stã o c ob ert os d e gol p es d e


e spad a s e bai on e tas fe it os p el os s oldad os d e Nap o
,

l e ã o E sta n ossa ca s a q ue os Fran c es e s inc endiara m


.
, ,

fica a três q u i l ô m et r os d a vil a d e Qu e r


d iz er : a figura d e Nap ol e ão pairava n o próprio s ol ar
d e Pa s c o a e s p e l os e stig m as d e i xad os p el as in va
,

s õ es .

Muita s v e z es e m v ers o e pr osa o e scritor e voca


o s p e rfis d e p e ss oas da t e rra — s e r e s gr ot e s c o s e t r á
, ,

g i c os obscur os e t odavi a e span t osos m ític os q ue


, , ,

h ão d e p ov oar a nov el a O E m pec i d o V e m o l os d es


-
.
-

filar e m Quin ta d a Paz como n o B a i l a do com o


« »
, ,

n o L i v r o d e M e m ór i a s : a C ou t a m endiga c en t en á ,

ria curvada s ob o s an o s e a sac ola ; a B a r oa q ue


,
« » ,

fora rica e fel iz d e b oa educaçã o e caíra n a


«
,
»
,

pobr e z a e andava d e p orta e m p orta c om o b r e vi á


, ,

r i o e um guarda chuva n as m ã os d e fun tas d e - «

viúva e sabia d e itar cartas e l er a sin a ; o C i p r i a n o


»
, ,

d oid o e c eg o q ue vadiava só p e l os cam in hos fal ando


, ,

al t o d e cab el o d e sgr e n h ado e s olt o a o v ent o ( Q ue


,
« » «

m ed o m e a D oi d a q ue julgava d esc obrir ,

em t od as as crianças os filh os q ue pe rd e ra ; o D oui m ,

« alto e m agr o taciturn o A m pl a fr ont e im agi


, ,

n osa q ue noi t e fora can tava por ermos cam in h os


»
, , ,

s ob l a m e ia noit e Me ia h ora tinha d ad o . .

I 4
r_ i B R A S C U M P L E T A S

o com o ch inó n a cab eça e um r emorso e n tra


N oz es ,

n had o n a alm a gritand o p el os mon t e s à ch uva e, ,


«

a o frio : Ma t ei ! Q u e i m p or t a ? N i n g u é m v i u ! ; a
»

I s a bel d o P ed r ei r o a d e itar sangu e p e l a b oca ,


«
,

r od ead a d e cri ancin h as e nfezad as e a m ar el as f e itas ,

d e c e ra suj a ; o abad e d e G a t ão José G uilh erm e


»
, ,

q u e dava tudo a o s pobr e s e s e alim en tava d e café


( por d e sl e i x o fil osófico m eti a n a t e rc e ira casa o
«
,

prim e iro b otã o d a s obr e casaca m ai s v e lh a d o q ue o ,

et c et c S er e s q ue ficaram i n tactos i mó
.
, .
,

v e i s n o e spíri to d o po eta com aqu el a vid a im at erial


, ,

e por ass im d iz e r i mun e à s i nj úria s do t em po q u e é

a vida d a r e cordaçã o — a vida autêntica d iri a Pas ,

coa es E ss e m und o d a i nfân cia val e para el e 0 Un i


.
, ,

v ers o i nt eiro .

T ambém r efer e os trabal h os d o cam po e as f estas


a q ue assi stiu d esd e cri ança : a s m a l ha s entoan do « »
,

as r a ça s d o m ato as s eg a s as es fol ha d a s o S ão
« »
, , ,
«

M igu e l das vin dim as ( A Min h a A ld e ia i n S ern » « »


,

pr e p , e o E ntrudo
. e a S e m an a d a Pai x ã o , ,

c om a prociss ão n a vil a a n oit e os p obr e s p en i , ,


«

t ent e s d e t ú n ica bran ca s ob os an d or e s ; e em


»
, , ,

Nov e mbro os fi é i s q ue bat em d e porta e m porta


,

( p . e o Natal e os R e i s c om a m úsi ca d as f es
, ,

t adas os c ân ticos d as raparigas a o D eus M en in o :


,
-

« E um canto r e p entin o Ouv e s e agora m e smo à -


, ,

nossa porta : São ch egados os três R e is A l api


_

nh a de (p A ssim pôd e c on h ec er n a .

inti m idad e a g ent e rústica d e P ortugal sab ed oria , ,

mod o d e s en ti r e costum e s on d e s e e n l açam um a a l e ,

gri a pagã e um a fé cri stã — o cl aro escur o d a S au -

dad e tal como Pascoa e s viri a a d efi n i l a E viv eu os


,
-
.

s eus dram as condo eu s e d a sua p obr eza : O pobr e s


,
-
«

cam pon e s es D uran t e os n egros m e s es


,

« Ó fa l tas d e trabal ho ! I n v erno ! I s ol am ento ! »

( p . M ais tard e em A E r a L u s í a d a h avi a d e , ,

proc l am ar : S into p erf e itam en t e q ue s e a l gum a


«
,

coisa h á d e p ortuguês n a m in ha obra poéti ca foi por ,

I 5
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

t er vi vid o os prim e ir os anos d a m inh a infância no


m e i o d os ca m p on es e s ( p D e fact o e mbora d e » .
,

s en tid o un iv e rsal a sua c on c epção do Mundo mer ,

g u l h a as raíz e s n a t e rra m ã e n a ald e i a e s eu con -


,

t orn o — a s erra d o Marã o o val e d o T âm ega ,


.

E ram muitas a s visitas d a C asa : e ntr e e las as «

pri mas d e Pin h e ir o os Falcõ e s d e Par e d es as m en i , ,

n as d e M e i os a Vi sc on d e ssa d e T a r d i n h a d e a
, ,

D B albin a de B elm ont e s e n h oras d e ald e i a m ui t o


.
, ,

e x ó ticas d e v e stuário e p e n t e ado ( L i v ro d e M em ó »

r i as p ,
D ançavam danças d e roda n a sal a d e
. «
,

vi sitas e nquant o meu t io J acin to t ocava no pi an o


, , ,

um a v e l h a músi ca s entim en tal e antiquada E ra um .

hom e m gordo d e big od es n egr os e fart os com um a


fl or a o p eit o sal picada d e rap e— um a fl or q ue n as
, ,

c eu n a Prim av era d e 1 88 5 e n ão murchou aind a »

( i bi d em ) A s v ez es Joaquim i a c om o a vô a cam i
.
,

n h o d o Out e iro a casa ond e a m ãe viv era ant e s d e


,

casar e h abitada ag ora por uma r e mota D E us é


,
'

« .

bi a c om um p e n t e d e tartaruga n a cab eça e um véu


,

d e s eda n egra ( p ou visitava a casa d e M e i o s


» .
,

a casa d e Par e d es ou a casa d e T a r di n h a d e : L á «

e stá a casa d e T a r d i n h a d e o t e rr e i r o a v e lh a o laia , , ,

à p orta e a cum ee ira a r ecortar s e num fund o v i o


,
-

l eta ondulado e e m p ed ern ido E m v olta pin h eiros


, .
,

e p e n e d os : túmulos e ci pr e st e s D entro o Viscond e .


, ,

trêmulo e e n ca n ec i do um fil ho idiota o e sp ectro , ,

dum a fil ha c om s et e an os e a Vi sc ond essa e n tr e o , ,

d emô n i o da l oucura e o anjo da saudad e ( p » .

P egou s e l h e para s em pr e o m ist o de e span t o e d e


- - « »

« t e rror q ue l h e causou o e sp ectáculo d a V i s con


»

d e ssa c om um ri so d e l oucura e do fil ho id iota aos


, , ,

uivos O e ncontro arr e piant e com os abi smos do


.

O amb i en t e da C asa e da ald eia c edo d esp e rtou


n el e ou contribuiu para d e sp ertar o i n stinto r e l i
, ,

g i os o A noit e r e zava o t erço à l ar e ira com os av ó s


.
, , .

Mai s tard e j á fa l ecido o avô pa te rno i a co i n a a vó


, ,

16
O B R A S C O M P L E T A S

à m issa d om ingo e l a c om um v é u d e s ed a pr e ta
de , ,

el e de e n o rm e gravata
« m ultic ol or n um grand e
bab e ir o en g omad o ( p Na Q uar e sm a n o
» .
,

mont e m ai s al t o d as c ercan ias a pr eg oavam as al m as ,


«

do S en h or ; e assim l ançavam 0 sacr o h orr or p e l as


»

hum ild es ch ou panas : E assi m pr egai s ó fi éi s n a «


, ,

s ol edad e T od a abafad a e m e rm a es cur i d a d e :


,

A l er t a ! A m or t e é c e r t a A e ssa h ora e m tod o s o s ,

lar e s s e r ezavam o raçõ e s ( Os M on t e s i n S em p r e ) « »


,

Já 0 po e ta m e n in o qu e ri
-
a d e sv e ndar O m i stéri o d as
coisas ; fazi a p erguntas a o Viscond e d e T a r di n h a de
« s obr e a e xi stênci a d e D e us e a criaç ão d o Mundo »

( L i v r o d e M em ór i a s pp 7 0 A ch ari a a r e s, .

p osta an os d e p oi s n o grand e l ivro q ue h avi a d e


, ,

a l im e ntar a sua i m agin açã o : C om ec e i a l er a B íb l ia «


,

n e ssa ép oca um l ivr o e n cad ern ad o d e v el h o com


, ,

d e dadas d e e squ el et o n as fol has roídas d o carunch o .

L ia 0 e m voz alta m e dr os o e e n can tad o p orqu e em


-
, , , ,

v olta d e m im surgiam fan tasm as para ,


A d ão
e E va C aim e A b e l M oi sés c om d oi s ch ifr e s n a
, ,

cab eça a m or en i n h a d os C ân ticos D avid S al om ão


, , , ,

Judit e R eb eca J ac ó e 0 s eu s on ho e n ch e ndo d e asas


, ,

brancas 0 I nfi n i t o e a rain h a de S ab á r em ota prin , ,

c esa d a n oit e c on st el ad a d e ,
E a im a
g em d e C ri sto a apar e c e r n os h oriz on t e s d e R om a ,

como 0 anj o do e xt e rmín io ? E as e pístol as d e Paulo ?


E J oã o n a il h a de Patm os ? ( p 1 09 ) Para 0 futuro
,
» .

p oeta p en sad or e mb ora cri stã o h et erod oxo a B íbl i a


-
, ,

havi a de c on st i tuir um a f ont e con stant e d e sug e stõ es


— id e ias im ag en s d ogm as q ue 0 po eta tran sform ará
, ,

em m it os E j á s e adivin h a c om o n o Pasc o a e s dos


.
,

v erd e s an os n asc eu O i nt er e ss e por São Paulo d e


, ,

q ue s eria n o outon o d a vida 0 b i ó gra fo e x eg e ta


-
, , .

L og o d e m uit o p e qu en o r e v e lou J oaquim um f e itio


e stran ho in cl i n ado a o i solam e nt o « e spíri to diri a
el e — acan h ado e con c e n trado am an t e da so l id ão q u e
,

me criou Vagu e ava p e l os m ont es s o zin ho m ara


. »
, ,

vi l ha do por cada n o va d e sc ob e rta El e pr ó prio 0 .

1 7
T E I X E I R A D E I '
A S C O A E S

h avia d e l em b r a r n o s v e r s os d e A Min h a Hi stória


,
« »

( i n T e r r a P r o i b i d a ) : Fu i criança q ue ci sm a e «

bri nca p e l os m on t e s E e n tr e as outras cri anças


m e e nc o nt r ava T r i s t e sil en ci os o ; e tin h a m edo
, ,

D as s om bras d o Ou n a pr os a d o ,

L i v ro d e M e mó r i a s : Vivi a abstraíd o n as m in h as «

m ágo as e al eg r ias e e nt r e tid o n os m eus brinqu ed os


, ,

c om o u m p e qu e n in o D eus a faz er p equ en inos m un


d os e a d e itá l o s a v oar por um a palh e ira m o l hada
-
,

e m água d e sab ã o B r incand o r e al i z ava d e , ,

algu m m od o os m eus d e van e i os i nfan tis : l emb r a n


,

ças inc on s ci e nt es du m a e xistên ci a d ivin a ( p » .

D i v erti a s e c om u m burrit o q u e l he s ofria


-
,

paci e nt e as picardias : E o m eu j e r ic o d e cri ança ?


,
«

L á e stá c om as il harga s e m sangu e e a cab eça e ntr e


,

as p ern as es tacand o ! ( L i v r o d e M em ó r i a s p
,
»
,
.

« E 0 j u m e ntinh o d os m eus t em pos d e c r iança !


V ej o— t e ainda e m c orp o d e l e m brança
,
T e imos o , ,

o r e l h as l ongas a Ol h os q ue tin h am d en
t r o a d or pasmada a
, ( S em p r e p , , .

A pre n d eu a am á l o c om um a t e rnura q u e s e e st e n
-
,

d eu f r a n c i s c a n a m en t e a t odas as cri aturas e d e


, , ,

pr eferência à s m ai s d espr e z adas à s m ai s hum ild e s ,


.

O j u m en t o s eri a um d os m otiv os d a sua po e sia como ,

d a prosa p oética d e Ve r bo E s cu r o ( D a A l egri a e «

da Q u e m el anc oli a 0 e n v olv e e s obre


«

pa s sa d e c aídas or e lh as l on gas pr ofund o s ol h os


, ,

O p obr e an imal trotand o a o l ongo d a ,

Vi a
A lgum as v e z e s f oi c om a famíl ia a R i o B om ,

p ert o d a R égua ond e vivi a um t i o irm ão d o a vô


, ,

pat ern o 0 sr « padr e J oaquim d e R i o B ô E dal i


. » .

f oi à quin ta d a C o rr ed oura e viu surpr e so p e la , , ,

prim e ira v e z u m a l ápid e d e m árm or e e rigid a sobr e


,
«
,

o túmul o dum c ão P erc ebi n e ss e i n stan t e r e v el a


.
,

d or out r as al mas n o Mund o além d e nós ( A B ei r a


, , ,
»

( m i m R el â mpa g o) p N o m undo da sua poe


, .

1 8
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

A id a para a cola s e para a s duas grand e s idad e s d a


es

e xi stên ci a d o p oe ta ; a parti r d e ss e m om e nt o t e ria a ,

ps eu d o vid a d a s c onve n çõe s s ociais e a vida a ut ên


-

tica d o r egr e ss o à infân ci a por obra e graça da ,

m e mória e d a i magin açã o a ma n h ec en t e Ficari a .

r e partid o en tr e d oi s m undos e m luta c on sigo ,

m e sm o .

Prim e iro a e scol a prim ária ; v a i m an h ã c edo n a


, , ,

com pan h ia do avô um ve l ho alto d e suíças brancas


, ,

e o l hos a z ui s L á e stá a casa d e aul a ban c os e m esas


. «
,

d e pin h o e n od oa d a s d e tinta m apas n as par ed e s


, , ,

um a l ousa e n orm e c om algari smos a gi z os cartõ es


, ,

d e J o ã o d e D eus e 0 s e u r e t r at o barbudo n o pri m e iro


,

l i vr o d e l e itura ( p »V ej o a casa d a e sc ol a
. «
,

o pad r e m e str e c o m um a carapuça n a cab e ça e un s


,

ócul os n a p onta d o n ari z O q ue d e m im con


s erv o d e ss e t em p o s ão os d e d os suj o s d e t inta e uma
e stranh e za um e span t o d e d or um a e sp essura es t ú
, ,

pid a com p osta d e t odas as l etras d o alfab eto ( p 8 2 ) » .

D e p ois 0 l ic eu L á ficaram n a ald e ia 0 N il o


, . «
, ,

[ 0 c ão d e q ue tant o g ostava ] e o m eu j um e n to : 0
j um e nto e as suas m an has d e filósofo ; o N il o e 0
s eu f ocin ho d e i n spi r ad o L á ficaram a s m an h ãs d e .

s ol e os passarin h os L á fic ou a v e l h a lar eira com


.
,

a v oz d e L ucrécia e O v e nt o em n oit e s in v e rnosas ,


»

( p. L á ficaram o s avós a d iz er l h e ad eus ,


-
,

« cad a v ez m ai s vag os d a n ebl in a Pasc oa es i a e stu » .

d ar em A m arant e i n stal and o s e numa casa antiga


,
-

o n d e 0 avô pat e rn o fal e c e ra e q u e d e sd e e n tã o ficara

d esabitada N e ssa casa um a gravura es qu ecida sobr e ,

um a có m oda dar l h e i a a r e v elação d o m ar — do m ar


.

- -

e da l onj ura i nd efin ida : a t orr e d o B ugi o 0 T ej o «


, ,

um barc o à v e la a sair a barra en cr e spada d e v e nto , ,

q u e m e d e u n ão s e i q ue id e i a m i st e ri osa d a vastid ã o
d o m ar S e n ti a m e abstract o e long e N ão ti rava
-
.

os olh os d a gravura am ar el ecida e po e ir e nta .

abstracç ão e e st e l ong e ficaram e m m im para s e , ,

p r e » ( p . D ebruça s e à j an ela e adm ira s e -


,
-

20
O B R A S C O M P L E T A S

ver tran s eun t es muit o d ifer en t e s dos cam pô n i os d e


Ga t ão z calçados m ai s b em v e stidos c om outros , ,

m od os e m an e iras d e falar ; as b otas d el e s rang e m


no e m p edrado — s en sação i n édita para 0 rapazin h o
vindo d a ald e ia .

« A trav esso o l argo d e S G o nçal o e e ntro n o an tigo .

cl aus tr o ap oi ado e m arcarias d e gran ito Ouv e s e um .


-

barul h o d e rapaz e s e um a sin eta : d l i m ! d l i m ! d l i m ! »

(p . N est e m e i o acadêm ic o e ruidos o e u er a


«
,

um s er i nv erosím i l N ão sabi a a s l içõ es n em traçar .


,

a capa n em tril h ar as ruas d a vi la O e studan t e


, .

m et e ra s e e m m im com o um i ntrus o ( p
-
»

A capa fog e —
, .

« m e d os ombros um cab e l o h irsut o ,

i nvad e me a t esta en sombrada d e atávi cos m ed os ou


-

espantos N os m eus ouvid o s soam e stas pal avras d e

d es â n i mo z— E m uito acan h ado e n ão


.

p
( 8 7 ) A s s et e h oras d a m an h ã n o I n v e rn o j á e u
. «
, ,

e stava p eran t e um l ivro ab erto e um can d ee ir o d e

pe tr ó l e o q ue e spal h ava no m eu quarto um a luz m ais , ,

trist e q ue a dum a v el a d e c era à cab ec eira dum ,

d efunto M eti a a s m ãos g e l adas n os bol s os e os pés


.

num cob ert o r Ou dorm itava ou l i a m aqui n al m en t e


.

e todo 0 m eu s er s e d e com pun ha e m ab orr ecim e nto :

n uv en s pardas e um v en t o vazio n a cab eça ( pp 8 7 » .

T odas as págin as em q ue r ec orda os t e m pos


do l ic e u s ão baças r e s s uma m con strangim en to e ,

t éd io E m an os m ai s ad ian tad os a l it eratura ( Ber


.
,

nard i m C amõ es ) h avi a d e i n t er e ssá lo ; um ano


,
-
,

porêm ficou r e pr ovad o em P ortuguês Naqu el e s


, .

t em pos Pascoa e s m al sab i a apr en d er n os l i vr os ; l ia


, ,

sim i ntuiti vam en t e n as coisas d a Natur e za e n a


, ,

própri a alm a .

A s quin tas e d om ingos di as f eri ados l e van tava s e , ,


-

d e m an h ãzin h a e ci l o f e l iz a cam i n ho d a s e rra -


, ,
.

«
Q ue alvor oço d e r e ssurr eiçã o ! Q u e l ib erdad e ! »

( p . L ib e rt ava m e d o es t u d a n t i n h o acan h ad o
« -

e macambúz io Fugi a para os m on t e s d e c l a v i n a ao


.
,

ombro com 0 Manu e l C arl os e a sua r a i u n a dos


,

21
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

fr anc e s es e 0 a sua barba à p a s s a


Z é d O l i ve i r a
'
e
-
p i o l l zo e 0 s
,
e u c o c o i ngl ês amarr otad o a tapar l h e ,
-

a calva d e m arfi m ( p A m in h a al egri a n es


» . «

sas m an h ãs d oiradas e g e ladas ! Mas tamb ém »


,

al gu m as v ez e s fugia d e n oit e pa r a a ald e ia P or lá


, . «

andava até a o l u z ir d a e str el a d e alva s obr e uma ,

fraga d o Marão ( p »Ou ac ont ecia l h e assi s ti r


.
-

a um bail e n a e ira q ue durava até a o r om p e r d o Sol


,
.

« R egr e sso à vil a e e ntr o e m casa c om o u m ladrã o .

I n stant e s d ep ois ad orm eç o c om a cab eça pousada


, ,

s obr e um a e str of e d os L u s í a d a s ( p 9 1 ) » .

Num as fé r i as d e Natal um a i da a T ravanca per ,

m it e l he subir a os cu m e s da s erra Fa z a viag e m a


-
.

pé t en d o por c om pan h e ir os o Manu e l C arlos e 0


,

Z é d O l i v ei r a T ravanca fica a s s ent e num p e qu e n o


'
.

patam ar ond e find a a t erra cul tivada e c om eça o


,

e scalvado d a A b obr e ira P erc or r e m um a rua ch e i a . «

d e lam a e p edras s oltas e ntr e cas ebr e s m i s e ráv e is : ,

t ectos d e colm o e par ed e s d e cascal h o ou f ormadas


d um só p en ed o al i n ascid o ; e ch egam a uma v el h a »

c asa escura e bai xa d o avô m at erno de J oaquim


, , ,

« a o l ado dum a e ira don d e s e avi sta quas e t od o 0


,

n ort e d e Portugal ( p E a casa d a L e vad a


» .
,

cuj a sal a d e j an tar t em duas j an el in has q u e d e itam


para a i mag em t e m p estu osa d o Marã o J oaquim
« » .

passa algun s d ias n e ssa casa c on struída entr e c er «

r os d e n egridos roch edos nuv en s d e água e de n e v e


, , ,

e m pl e n a d e s o lação e s ol id ã o ( i bi d e m ) L e vanta s e » .
-

m al d e sp on ta a m an h ã e abal a s o zin h o sob e n ão , , ,

s e can sa d e subir con t em pl a e xtátic o os horiz on t es


,

ind efin id os mont es e val e s f e it os d e n év oa p el a d is


,

tân cia o céu e 0 mun d o d iss olvid os n a m e sm a


,
«

n ebl in a ond e a quim era e a r e al idad e s e casam e é


,

j á i m possív e l d i s tingui las ( p A vi sã o tor-


» .

n a s e visi on ári a j u l ga ouvir v oz e s d e al ém mun do


-
,
-
,

t e m a i lus ã o d e b oiar n o ét e r D e sapar e c e m as fron .

t e i r a s e ntr e o eu e 0 n ão eu a alm a e a Natur e za -


, .

E xp eriência ( dir s e i a : m ística n atural ) d e ci si va


- -
,

22
O B R A S C O M P L E T A S

q ue Pasc oa e s ad ol e sc e n t e r e p e tiu ou r e viv e u muitas


v ez es e d e p oi s a cad a pass o r e p e rcut e n a sua p oe si a
, ,

b em c om o o an e l o d e al tura d e r egiõe s i maculad as , ,

n um a ân sia d e i ma t er i a l i z a ç ão nun ca sati sfeita C on .


,

fund e s e c om a Nat u r e za tran sfo r m ada por s eu


-
, ,

turn o em R e in o E spi r i tual Os s e ntid os t orn am s e


, .
-

-
l h e lugar d e apariçõ e s
« » .

Na v e rdad e s e Pa s c oa e s d e sc en d e do s A vós e d a
,

C asa o n d e viv e u a i nfân cia s e a S audad e 0 mod e l ou


,

d esd e o di a em q u e saiu d a ald e i a c om ra z ã o s e afir ,

ma r á filh o também d a paisag e m das m arg e n s d o


T âm ega d a r egi ã o ond e s e fun d e m d e m od o origi
,

n al o d ol or os o d r a m a t r an sm ontano e 0 bucólic o
«

idíl io m in h ot o — pai sag em o nd e o po e ta julgará


»

v er simb o l i z ada a psiqu e p o rtugu e sa m ist o d e a l e ,

gria e tri st eza d e aust e r idad e e d oçura : Sem e sta


,
«

t erra fun da e fun d o r i o Q u e e r gu e as asas e sob e


e m cl ar o voo ; Se m e st e s e r m o s m ont e s e arvor e
dos E u n ão er a 0 q ue s ou ( A s S om b r a s 2 ed » ,
.
ª
.
,

p . Min h a m an e i ra íntim a d e s er E u s ei q ue
«

r esultou D e st a paisag e m m ística e saud osa ,

E s em pr e a fl or e sc e r Q u e d a sua tri st ez a D eus


criou ( C a n t os I n d eci s os p
»
,
.

C OI M B R A E O ME I O C UL T UR A L

r
S of i , ao v er C o i m b ra , um d ol or i d o
Agra v ou s e , em m e u
-
s er , a a l m a q ue e d oen ça '

( A M i h a H i tó i a
« n s r »,

in T P i bí d )
er r a ro a

C erto di a d e 1 89 5 , di a d e e scur e cid o I n v ern o


« » ,

part i u para C 0 1m b r a . S egun d o d e st e rr o m a i s grav e ,

a i nda q ue 0 pr i m ei r o ,
e q u e só t e rm i n ar i a c om a f or

23
T E I X E I R A D l P A S C O A E S

m atura e m D ir e it o em 1 9 0 1 S em pr e n os tálgic o da ,
.

infân cia d a C a sa e da t erra m ãe d ivaga p el a C oim


,
-
,

bra m edi e val c omo um bárbaro d o N ort e fechad o


« »
,

e t a c i t ur n o
ª
Outr a v ez a s e n saçã o d e e sp e ssura
ª

fr ia a c a b r un h a n t e q u e l he d e i xara 0 l i c eu ; ou pior
, ,

ainda Os l en t e s p erfilam s e às p orta s das aulas


. « -
,

e nquant o os alun os v ão e n trand o faz end o v én ias ,

r e sp e it osas àqu el e s íd ol os tr em en d os ávid os de cól i ,

cas e outr os s acrifíci o s V ed e 0 M or ei r a um e s qu e .


,

l eto en or m e a surgir das tr evas ; o C al i st o d a pri


m e ira d in astia o Pita sac erd otal e r evel h o n ascid o
, , ,

s ob Osíris d o v en tre dum a foca p oe ir en ta


,

E c om o c on trast e fi no e el egant e o M ont en egr o


, , ,

aind a n ov o d a n dy barba G u i s e de s eda e uma


, , , ,

cab eça d e m arfim c om u m a p e nug e m d oirad a n as ,

fon t e s e n a n uca ( L i v r o d e M em ó r i a s p
» P or , .

curi oso parad oxo en quanto o m ed i e v o C al ist o e n si


,

n ava Fi l osofi a d o D i r eit o 0 M on t e n egr o fi n d e , ,

s i ec l e e nsin ava D ir e ito R o man o


, .

E nc ontra um ambi e nt e m e ntal ch e io d e con t r a di


çõ es ond e s e d ebat e m 0 p ositivi smo agnóstico o
, ,

ci e nti sm o e v oluci on i sta 0 id eal ism o étic o d e A nt e ro , ,

q ue r e duz 0 Un iv e rso a c on sciência o fundo p e ssi ,

m i sm o q u e pass ou d e A n t er o a os j ov e n s simb ol istas ,

o s en tim e n t o d e q ue O país e stá m oribundo va gas ,

t endên ci as an árquicas e hum an i tárias o r e publ ica ,

mism o 0 s oci al i smo pr ou dh on i a n o o m arx i sm o o


, , ,

n eog a r r e t t i s m o pr opugn ad o por A lb erto de Ol i


v ei ra A l içã o d e J un qu e i r o c om a sua r el igi osi
.
,

d ad e pant e ísta e pa m ps i q u i s t a c om pl e m e ntar d o ,

« E ra c on c e n trado — es cr e v e Faria e Maia


um e n g ol
fad o n um s on h o V e j o o n os n os s o l o n g o s pa s -
s

s e i os r e cita n d o v er s os fr g me n t à i a m e n t e q ua s e alh e i o à
, a r ,

m i n ha pr e s e n ça ( A M i n h a Ve l h a Pa s ta p
. » , .

Na c on fe r ê n cia E s píri t o L u s ita n o o u o S a ud os i s m o


( P o rt o , Pa s c o a es e vo caria a C oi mb ra d o s eu t e m p o c o mo
um t errív e l f c d es n aci n alizad or q ue difun dia vaga s t eo
« o o o » «

ria s j ur í dic o s o cia i s i m p ortada s d o e s tra n ge ir o


-
, . »

24
O B R A S C O M P L E T A S

rasgo panfl e tári o fora a prim e ira grand e in f l u em


,

cia r ec ebid a por T e i x e ira d e Pa s c oa e s j á n os t em ,

pos d e A m aran t e Junt ou s e l h e a d e A nt e r o com a


- -
.
,

sua frustrada ambiçã o d e A bs olut o a d e J o ã o d e ,

D eus outr o p oe ta d a altura d o i m pal páv el e a de


, , ,

A ntón io N obr e 0 e t e rn o saudos o d a i nfânc ia e pin


,

t or da t e rra p ortugu e sa .

Pasc oa es q ue n ão e sc on d erá a sua si m pati a pe l os


,

an arquistas e u m id e al d e frat ern idad e q ue e xig e


um a d i s tribuiçã o equitativa dos b en s m at eria i s ( s e rá
r epubl ican o e d e m ocrata n ão obstant e o m e io fam i ,

l iar ) c omb in ará n um a singular h et er od oxia o


, , ,

agn ostici sm o e a fé procl am ará 0 d in am i sm o f ecun d o


,

d a inc ert eza v e rá e m tu d o a amb i valênc i a d o s i m


,

e n ão i nt egrará n a sua o scilant e m e tafísica 0 tran s


,

f or mi s m o s egund o 0 qua l 0 Hom e m ( criad o r d e


D eus ; ou sua cri atura ? ) e O t erm o dum proc e ss o de
e S pi r i t ua l i z a ç ão q ue c om eça n a p e dra alm a cat iva ,
« »

( para usarmos a e xpr essão de A n t e ro ) ; e para al ém


d o H om e m pr e ss e n tirá a alm a a qui m era o n ad a , ,

q ue é o I nfin it o A par d isto c om un gará n a r e acção


.
,

a n t i cos m 0 pol i t a tradici on al i sta con c eb e n do a poe


, ,

si a n ão só c omo av en tura m etafísi ca m as ai nda como ,

anunc iaçã o e fon t e dum r e ssurgim en t o pátrio T en .

tará d ecifrar p el a S audad e a alm a p ortugu e sa e


h á d e profetizar n o Ver bo E s cu r o o r egr e sso do
-
, ,

E nc ob ert o o fim d a n oit e lusíad a


,
« » .

Mas C oimbra al ém do f erm ento das id ei as of e


, ,

r ec e a o poeta as fin as sug e stõ e s dum a pai sag em


doc e im pr egnad a d e tradiç ão f e ita d e sorrisos d e
, ,
«

v erdura jun to d e água


,
pai sag e m q ue am aci a a s
» _

ar estas tran smontan as d e Pascoa e s : E d esd e e nt ão «

m in h alm a tran sm ontan a


'
D e sn ud a e agr e st e ao
, ,

v en to d as alturas T orn ara s e m ais bran d a e m ais


,
-

hu m an a ,
Mai s fl or e scida d e íntim as
( A Min h a H i stória in T er r a P r oi bi d a ) E ofe r e
« »
, .

c e l h e os b e n efícios d a am izad e
-
n o c o n vívio c om ,

rapaz e s igual m ent e i nt er essad os por qu estõ e s f i l os ó


25
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

ficas e e stéticas algun s também d e apurada s en si ,

b il idad e P ert e nc e u a u m grup o q u e in t egrava Fausto


.

G u ed e s T e i x e i r a A u gu s t o G il A fon s o L o p e s Vi eira
, , ,

J oã o L úci o A l e xandr e B raga Franci sc o d e Fari a e


, ,

Maia A b e l d e M end onça J oã o D ir e it o E as n oit e s


, , . «

n o J ul iã o ou n a T i a J oaq u in a duas tav ern as e m ,

pl en o Ol im p o ? L á d e ntr o 0 Faust o e 0 G i l c or oa , ,

d os p e las Mu s as à luz duma can d e ia fumar e nta ; e ,

eu n a s ombra es fu m ad o num a ad m iraçã o i n d ef i


, ,

n ida n um ah ! d e , ( L i v r o d e M em ór i a s ,

p 1 35 ) N o C afé L usitan o inund ad o d e e studan t e s


.
, ,

h avi a a m esa d os p oetas : 0 Faust o b eb e fu m a «


, ,

r ecita apai x onad o por t odas as mulh er es O G il


,
.
,

c om o s c ot ov e l o s fin cad os n a p edra m ár m o r e e s m aga -


,

a cara assanh ada e n tr e as m ã os c om o s e os d ent e s ,

l h e d oe ss e m T em un s big od e s d e aram e r et orcid os


.

para cim a e fal a quas e s em pr e a os O Ale


xandr e B raga um A p ol o m od el ad o em c era p e las
, ,

n oit es d e b oé m ia O Hil ári o trigu e ir o e lívid o d e


.
, ,

big od e s n egr os a d oi s m e s e s d a m ort e — um a


,

e str e l a pr e st e s a e xtinguir O J oã o L úci o n a sua ,

prim e ira fas e rad iand o um a luz branca d e


,

( pp 1 2 9 . A voz d o H il ári o p elas n oit e s lua ,

r e ntas : um a r e v e l açã o d os l ong e s d ram átic os d a


alm a um símb olo d o in efáv el
,
.

Pascoa e s f oi ainda sócio fundador d o club e d e


e studan t e s A m i c i t i a juntam ent e c om S i lva P epu ,

l im Fari a e Maia A ugust o d e C erqu e ira e outros


, , .

Na s ed e d o cl ub e ( R d o C orp o d e D eus ) h avi a c on .

f er ên c i a s e d ebat e s A í n os l eu T e i x e ira d e Pas. «

c oa es m ui ta s d as p oe sias d o S em p r e e Franci sco

A l e xan drin o [ d a S i lva ] quas e t odas as q u e vi eram a


c om p or 0 s eu l ivro P a s s a do ( Francisc o de A taíd e »

Machad o d e Fari a e Maia A M i n h a Vel ha P a s t a , ,

p
A cabad o
curs o os d e st err os n a o t erm i n aram
0 , .

A Um v er md a d e tran s m utara Pascoa e s n o d r J oa .

quim T e ix eira d e Vasc onc elos bach ar el e m D i r e ito , ,

26
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

l e s c ê n c i a q uenun ca m ais el e pôd e e squ ec er : D u «

rant e o d ia é u m a l e mbrança d e rapariga d e quinze


,

an os a idad e e m q ue m orr e u tub erculosa Mas n os


,
.
,

m e us s on h os r evi v e é el a m e sm a l oira e bran ca


, , , ,

du m a d el icad e z a d e form as infin itas E stou a vê l a .


-
,

c e r ta n oit e ( er a n os s a criada ) n o antigo corr ed or d e ,

m in h a casa T ra z ia ap e nas a cam isa d e d ormir poi s


.
,

n ão e sp e rava e n c on trar al guém àqu el a h ora E n ca , .

rando c om ig o subiu l h e t od o o pudor à s fac es j á


,
-

rub ori z adas p el a f ebr e N ão p od endo fingir t ent ou .


,

ocul tar — s e n u m s orri s o e nv e rg on had o E n a v e rd ad e .


, ,

0 s e u s orris o ilum in ou a c om pl e tam e n t e r ev e stiu a


-
,
-

dum a au r éol a d ivina como a d ess e anj o q ue passa ,

por nós quand o e mud e c emos d e D e sd e ,

e ntã o apar e c e n os m e u s s on h os
, , aqu el a figura m is ,

t er i os a S int o m e n um p a s s a do p r es en t e junto
-
,

d aqu el a rapariga v estida ap e n as d u m a tún ica d e


l in h o c om 0 cab el o l oir o e m an éis a c er car l h e o
, , ,
-

bran c o rosto afogu e ado ( pp 2 31 » .

E ssa rapari ga m orta a os quinz e an os n ão s erá a


L e on or d e O B a i l a d o e d o L i v r o d e M em ó r i a s ?
« O valor r eal — e scr ev e P a s coa es e stá L eo ,

n or , n a súbita e x pr essã o q ue um a v ez surpr eend i , ,

n a tua fisi on om ia t ão e st r an h a e origin al c omo s e


, ,

h ouv e ss es mudad o r ep en tinam e nt e d e figura ! E ssa


e xpr essã o di ss e m e d e ti -
durant e o s eu r e l âm pago , ,

0 q u e nun ca m e diss eram as tuas pal avras m odos e ,

g e stos F oi um a h ora e m q ue todo o t eu


s e r s e d e sv e n d ou e m q u e el e c on s eguiu rom pe r a
,

n évoa e d e slumbrar m e para -


(p .

N ot e s e q ue o abal o afectiv o r esul t ou da súbita r ev e


-

laç ã o duma al m a e q ue e ssa rapariga d e quin z e anos


, ,

« l oira e branca l og o s e t orn ou p el a m ort e pr e m a


»
, ,

tura l embrança trist e e sí m b ol o d e pur e z a i n a ces s í


,

vel . No L i v r o d e M em ó r i a s fal a s e várias v ez e s dum a -

« L eonor d A l é m '
a l m i n ha tri st e d e vi ol eta a
»
,
« »

d enun ciar s e n os ol h os
-
un s ol h os ond e a t ernura «

r eza a sua m ais ín tim a e l egia ( pp 7 4 A í L eo » .


,

28
O B R A S C O M P L E T A S

nor é « apari ção ou símb olo d a b el eza tran sc e nd en t e :


»

« A m in h a vid a t e m sid o pintar o t eu r e trat o e e n a ,

m orar me d e t od as a s figuras q ue s e par e c e m c on


-

tig o e s ão apa r ência s ilusórias d a tua apariç ã o q ue


,

m e p ers egu e e é a própri a al m a in cri ad a d a B el e za »


( p. E m Ver bo E s cu r o d e n ov o s e alud e à d on ,

z el a m ist eriosa : O Virg e m q u e fl or e sc e st e o m eu


«

passad o ! V ej o t e ai nd a vi r ao m eu e n c on tr o
-
,

n as m an h ã s d a m in h a i nfânci a ( p E m S em .

pr e a com posição E la par ec e s er l he d edicada :


,
« » -

« A m ística M e n in a apar e cid a Passou como ,

visã o m ist eri osa D ei xan d o m e n a al m a aqu el e


,
-
, ,

e span t o Q ue an im a e tran sfigu ra cad a cousa !


T eu c orp o s on h o e m fl o r d e sabr ochou ;
, ,

F ez s e B e l eza e
-
(p .

E studant e e m C oimbra s ofr e t i m idam e nt e um ,

longo am or pl a t ô n i c o por F M i n spirad ora d o . .


,

S em p r e q ue vivi a n os arr e dor es d e A m aran t e Fran


, .

cisco d e Fari a e Maia ínti m o d e Pascoa e s n e sta ,

época subl in h a q ue n ão obstan t e a t en dên ci a para


, ,

o vago 0 abstracto
, o principal i m pul sor d a su a
,
«

l ira n e sta prim e ira fas e d a sua vida f oi o am or


, ,
»

( A Mi n h a Ve l ha P a s t a p O própri o p oe ta ,
.
,

n o l im iar d o S em p r e d ecl ara q u e os s eus v e rsos ,

s ão fil h os qu eri dos dum n oivad o e spiri tual


« » .

Quand o vagu e ava n a com pan hi a d e Pascoa e s p elas


« en costas rud e s d o Marã o e p e l as ribas d o T âm e ga »
,

Fari a e Mai a con h e c eu em carn e e o sso a m ística «

m en i n a adol e sc en t e a pri nc e sin h a q ue vivi a


»
,
«

e squiva n o s eu sol ar antigo d e l i n h as ari stocráticas ,

ins en sív e l àqu e l e am or q ue divin izan do a s e i m a ,


-
,

t er i a l i z a v a ! E stou a v ê l a b e la e l e gan t e d e l in h as
-
, , ,

fl e xív e i s andar ritm ado d e D eusa n o s eu so l ar


, ,

rom ântic o a o l ado d o po eta e n amorado q ue


, ,

c on t en t e s ó de vê- l a
F a g i u n um voo, como por en ca n t o,
'

Cá d es t e m un d o pa r a os ol hos

29
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

E da e v ocaçã o d e sta c e n a outra me acod e em q ue ,

pa s s ad os an os o v ej o n e st e s m e smo s sítios per cor


, ,

r end o com d e l e it e i n t e l ectual o t eatro d os s eus


, ,

am o r e s e s s e c e nári o das s uas d or e s n a s er e n idad e


, ,

p e r fe ita q ue l h e dava a c onvicçã o d e q ue para os ,

p oe tas 0 a m or s em p oss e e s e m eS per a n ça é o ún ico


,

al im e n t o p er e n e da sua ( pp 7 8 .

E m carta in éd ita d irigida a p e ssoa d e famíl i a ,

d ocum en t o psic ológic o d e m uit o int er e ss e Pascoa es ,

c onfe ssa am ar em silêncio F M h á dois an os s em . .

d e l a e xigir a m enor prova d e afe ct o N ão s erá . «

m in h a um d ia s e eu m orr er ou s e el a n ão quis er
F oi e l a q ue m e d eu algum tal ent o Se os m e us ver .

s os t ê m sid o b e m r e c eb id os p e l o públ ico f oi e l a q ue

m os in spir ou assi m t ão l ind os


Outr o e pisódi o am or o s o ( dum as férias g r and e s ? )
põ e e m f oc o um a E míl ia rapariga d a ald e ia q ue s e , ,

t eri a afe iç oad o a o p oeta E l he d ed icada a c omp osi .


-

ç ã o « A d e us E m íl i,
a ! d a e diç ã o d e T e r»r a P r o i
bi d a C antava trist e s cançõ e s f e itas por e l e ; d eu l h e
.
-

à d e sp edida um l e nç o m ol had o d e l ágri m as ; o p oeta


viv e rá e m C oimbra ( a t erra pr oib ida ) p ensando « »

n el a : P or aqui m eu A m or i r e i viv e ndo D aqu el e


«
, ,

trist e ol h ar q ue tu m e d est e Q uan d o a o l ong e , ,

para m im s e f oi e sc ond endo


, E n tr e um a n évoa , ,

o t eu p e rfil c e l e st e A ssim f oi p e l o m en os n a
. »
, ,

ficçã o p oética .

E algun s an os d e p ois 0 fugaz e n tusiasm o por


, ,

um a ingl e sa e stará n a orig em s egund o c on sta do , ,

po em a S en ho r a d a N oi t e R emon ta a e sta fas e o .

amor e pi s t olar e f r ouxa m en t e c orr e sp ond id o q ue


, ,

o p oe ta d e s p e r t o u n um a adm irad ora casada e d ad a ,

à s l e tras ; a p obr e s enh ora acusa 0 d e s er um fan -


«

ta s m a s em c oraçã o ; m ai s tard e n ão cal ará ciúm e s


»

das i n g l es i n ha s d a E l og o s obr e vém o arr e


b a t a d o amor por outra ingl e sa L eonor B agg e q ue , ,

o po eta d e scobr e n o P ort o num am e rican o »


« »
,
«

v erd ad e ir o coup d e fou d r e ! e d e pois id e ali za ao ,

30
O B R A S C O M P L E T A S

q ue par ec e n a E l eon or d e M a r â n u s N ão e scr e v e ra


,
.

num álbum e m 1 8 9 9 q u e p r e fe ri a as l o i ras ? ( cf


, , .

artig o d e C r i s pi n i an o d a F on s e ca i n E s t r a d a
L a r g a — I ) D eclara o s e u am or e m carta in éd ita d e
.

2 5 d e Março d e 1 9 09 : é m e i m p o ssív e l d e m o rar poru -

mai s t em po e sta c arta q ue l h e d irá c om o s e fo ss e ,

de vi va voz com q ue si m patia l e al dad e e pur e za d e


, ,

s entim en t os eu a a m o ! Nos m e s e s s eguin t e s pr o »


,

cura com d el icad a in si stên ci a c onv e n c e r L D à pr i .


,

m eira vista h esi ta n t e a casar c om e l e ; por causa d e ,

L D e m pr ee n d e u m a vi ag e m a L on d r e s d on d e
. .
,

volta d esc oroç oad o E stava e scri to : ficari a s ol t e i ro


. .

Por sim pl e s acaso ? Ou ant e s por pr e ss e ntir e m e l e e ,

e las q
,
u e a sua v oc aç ã o er a outra ?

A lgun s tr e ch os da obra d e Pasc oa e s r e s s u m a m a


n ostalgi a dum am or r e al izad o a p en a d e t er sid o ,

c ond en ad o a o i s olam e nt o H ouv e in stan t e s em q u e . «

fui a m in h a alm a — d i z a o fa z e r u m bal an ç o d a ,

e xistênc ia T ran sit e i d el a [ a vid a só al m a d a i n f â n


.

cia ] para O e squ e l et o s em h av e r passad o pe l o corpo ,


.

C riança e v e l ho s e m m ocidad e A s m ul h e r e s r ej ei
, .

taram m a e eu p erdi a Ser m oço é t er um a am an t e


- -
.

ou n o iva s er am ad o c om o n a can tiga p o pul ar ! E s er


, ,

am ad o é s er b e lo Sem b el eza n ão h á m ocidad e .


,

e mbo r a h aj a infânci a e v e lh ic e os d oi s e xtr e mos ,


»

( O H om em Un i v e r s a l p Um c om pl e x o d e ,
.

fe aldad e ( con s equênci a d e am or e s frustrad os ? )


volta a m an if estar s e quan d o r ef erindo — -
s e a São ,

Paul o p en sa afin al n e l e própri o : Os f e i os é q ue


,
«

amam S ó am am os q ue n ão p od e m s er am ados ; e
.

o s eu amor é vingança Vingam s e da própri a f ea l .


-

d ad e escond en d o a n um s on h o d e b el ez a ou obra
,
-

d e art e q u e e m n om e d e l e s apar eça


, ( S ão P a u l o ,
»
,

ed p .
, O futuro apó st ol o f eio amoroso
.
,
«
,

d e Natura d e spr e zad o pe l as mul h e r e s t e m d e am ar


, ,

alguém ou al gu m a coisa ( p N o s eu e x em p l ar » .

d e A A l eg r i a a D or e a G r a ça d e L e on ard o C oim
,

bra ( Porto 1 9 1 6 ) Pa sc oa e s marcou com um traço


,

31
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

à m arg em a s eguint e r e fl e xão : P erd e r um a fam íli a «


,

i st o é n ão a c on stituir ( po rqu e a famíli a p ossuíd a


,

j ama is s e p e r d e ) é um d e sfalqu e i rr em edi áv e l n a


pa r t e q ue t om amos da grand e taça d a A l egri a M ãe »

(p
A c e it ou porém 0 d estin o d e sol itári o porqu e
, ,

r e c on h ec e u s er e st e 0 pr eç o d a sua grand e z a d e p oe ta ,

por n atur e za asc e ta e m ístic o d e vas s ad or d e m un ,

d os ocult os c om pan h e ir o d e s ombras


,
S ab e por .

e xp eriên cia própri a q u e o d e s ej o i n satisfe it o n ão «

s e e st e ril iza n ão abdica d a sua força c r iad ora R e pr i


,
.

m ido int en sifica s e at é à e S pi r i t ua l i z a ç ão e g era


,
-
,

outr o s fil h os os s o n h o s e o s fantasmas


» «
( O Ho »

m e m Un i ve r s a l pp 8 9 e , E v e rifica n a acalm i a
.
,

d as ilusõ e s juv en i s q ue 0 q u e el e buscava n as mul h e


,

r es er a pl at o n ica m en t e um arquétipo a B e l ez a
, , ,

im aculada e i m a r c es c í v el : Nunca v i d ian t e d os «


,

m eus ol h os a m ul h e r b em a m ada I s s o q u e m e par e


,
.

ci a el a s ervia ap en as para e u s en tir po r e l a m ai s


saudad es O m urm úri o da água aum e nta a s ed e
. »

( Ve r bo E s cu r o p O q ue e l e buscava e stava
,
.

d en tro d e l e n a alm a an s i osa A pr e s e n ça física


e n sin a — i m p e d e
, .

a co m un h ã o das alm as ; só n a
ausência s e e fectua a v erdad e ira un i ão por obra e ,

graça d a S audad e E d irigind o s e à L eon or d o .


,
-

L i v r o d e M em ó r i a s d ir l h e á : Sou o cam in h o por ,


- -
«

o nd e v e n s a o m un d o ; tu e out r os fantasmas q u e e u

ad or o p oi s n asci para viv e r al ém d a vida ( p


,
» .

T ão e tér e as s e a pr e s e nta m a s figuras f em in in as


n a obra d e Pasc oa e s q u e m al acr ed itamos n a e x is
tênci a d e in spi rad oras d e carn e e oss o ; par e c e m
ant es pu r as vi sõ e s d o e spírit o ou e n tidad e s s i mbó
l i c a s E m B el o é c ert o O past o r id e al sacia n os
.
, ,

l ábi os v oluptuosos das N infas a sua fom e d e amor


— m as tud o s e r eduz a um s on h o um son ho i n t er ,

rom pido quan d o B e l o pe n sa t er J esus a s eu


E m « I dí l i o ( I ed ição d e S em p r e )

» . n a r cí s i ca ,

m ent e a E l e ita c onfund e s e com a A lma : Oh d ia


,
-
«

32
O B R A S C O M P L E T A S
'

e m q ue casar c ontig o ó m in ha E l e ita


eu Me u , ,

am or q ue afin al só tu m e c om pr ee nd e s ! ( p
,
» .

« Min h a A l ma un e a os m eus t e us l ábi os id e ai s Q ue


,

só tu apr en d e st e a s ab e r m e b e ij ar (p A s no -
.

tas s en suais q ue s e d ivi sa m e m S en ho r a d a N oi t e


c onstitu e m um a e xc epç ã o ; e m es m o assi m r e ssalvad a
p e l o fact o d e a am ada s er a M e i a N oit e por m età -
,

fora er m a d onz el a ; a s e n sual idad e d i lui s e e m


« » -

r eligi osidad e n ão s e m um t oqu e d e i rr e v e r ên ci a :


,

« E túm id o d e e str e las 0 s eu p e it o


, Sob o s b e ijos, ,

d e D eus s e va i , E d ivin a s carícia s s en


suais O fa z em bran da m e nt e T e ta s d e
n évoa ! O s e i os e sp ectrais Ond e um M en in o D eu s ,

há de-
( pp 9 N a E l egi a do A m or . « »

( 0 t ão b e l o p oe m a q u e s egund o F e rn and o P e ssoa , ,

« paira acima d o T h e L a s t R i d e T og e t h e r d e B r own


ing com o p oem a m e tafí s ic o d e am or ) a l embran ça »

da amada q u e v oou para os céus l e va O p oeta a s ub l i


mar s e c omungan d o p e l o am or com t od o 0 Un i
-
, , ,

vers o : Viv o a vida infin ita « E t e rn a e s pl en d o , ,

rosa Sou n ebl i n a s ou a ve


. E str e l a céu s e m
, , ,

fim S ó p orqu e um d i a tu
, M u l h er m i st e
, , ,

t iosa P or acas o talv e z


,
Olh ast e pa r a m im E l eo . »

nor e ssa é s ombra etér ea q ue diz a M a r â n us : E u


,
« » «

sou a e t ern a L u z q ue t e f e cunda M eu C riad or e ,

A mant e ! Ó t orva F ont e D ond e m e u Se r e spiritua l ,

( M a r â n u s I ) N ão adm ira poi s q ue n o ,


.
, ,

Ver bo E s c u r o l ucidam e n t e O p oeta c onfirm e : E u «

ador o a mul h er em m im própri o ( p » .


T E I X E I R A D E P A S C O A E

P OE S I A E M E TA F I S I CA

« S ou o em pe c i d o ,
es se h ome m d e o l h os
( M rd
o vi n s , V III )

« O poe t a é um e n v i a d o E l e v e m a o J l i i n d
. r ma

a s s u pe ri o re s P ot e s tad es q ue m i s t e r i os a m en t e pr e

s i d e m a o dra ma da Vi da e l h e d ã o u m s o b r e n a
tu ra l sen t i do »

( O s P oe t as L u s í a da s , p . 14 )

T end o r en un ci ad o casam en t o e às l id e s jud i


ao

ci ai s para q ue n ão fora talh ad o Pasc oa e s e n tr e


, ,

g ou s e por in t e iro à s ua ob r a id e ntific ou s e c om e l a


- -
, ,

a sua bi ografi a pass ou a s er prática m en t e a i n c es


san t e cri ação l it erári a qu er d iz er c on t em plar c on
, , ,

g e m in ar cantar E m A N os s a F o m e e scr e v eu c om
, .
,

i ron ia d e r ess e ntid o : qu e m s oub er d a m in h a vid a


«

m a c a mb úz i a e s ol i tári a d e bach ar e l m a n q u é e pr e
t e ns o cam ponês q u e m al agu enta o p e so d uma
e n xad a ( ridícul a atitud e ! ) com pr een d e rá a m inha

sim patia p el as Musas Mas l og o acr e sc e nt ou : E las


. » «

am am os m ágic os os m aluc os e os r eb eld e s t odos


, ,

e ss e s q u e m o stram um a car e ta d if e r e nt e das car e tas

e m q ue o Vulg o s e r e trata ( pp 9 1 0 ) Na v erdad e


» .
-
,

aqu e las frustraçõ es foram m en os a causa q ue o r esul


tad o d a i m p eri o sa v ocaçã o d o p oe ta por n atur eza ,

e n sim e sm ad o f ech ad o n o m und o subj e ctiv o en a


, ,

m orad o d e A b s olut o A s Musas tê l o iam e l e it o por


.
- -

q ue tamb ém e l e pe rt e n ci a ao n úm e r o d os
d os r eb eld e s a q ue a voz corr e nt e cha m a
,

C edo s e anun ci ou n el e a c on s c i ên c i
h om e m incumbid o dum a m i ssã o tran sc end ente .

« O poe ta é um p obre d oid o e rrand o s e m pr e al ém , ,


.

34
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

c oraçã o q ue a s si m i l ou o Un iv ers o e o r e stitu i a os


h om en s m a i s pe rfe i to m a i s d i v m o ( O s P oe t a s ,
»

Lus ía da s p ,
.

N a p oe si a r eal i z a s e a passag em d o n ív e l das -

puras e m oçõ es e i ntu i çõ e s a o n ív e l dum p e nsam e n t o


a in da e m oci on al i ntuit iv o e m q u e t od avia aqu el e s
, ,

d ad os pr i már i os s e t orn am c on sc i ent e s e d e c ert o


m od o s ão el aborad os organ i z ad os p ela i nt el igên cia ,
.

D o indiv i dual 0 p oe ta d a e stirp e d e Pasc oa e s er g ue ª


_
l

a o g e ral d o particul ar a o un iv e rsal


,
E ntr e o int e . «

l ectual e o e m otivo h á um a d i f er ença d e n i t i d ez »


( O H om em Un i ve r s a l p O p en sam e nto poé , .

tico v a i s e pois e sb oçand o d ef i n i nd o emb ora s endo


-
, , , , ,

poétic o n ão ati nj a n un ca um a p erf e ita cl aridad e ; o


,

« v erbo q ue o e xprim e é n e c e ssári am en t e um v e r b o


» «

e scur o »A l i ás quan t o m ai s pr ecis o m e n os v erda


.
, ,

d e iro m ais afastad o d a f ont e viva q ue p erm it e a


,

a pr ee n são d o d ivi no E n a v a g u i d a de da D istânci a .

q u e s e vi sl umbra 0 A b s olut o Na luz n o s om n a . «


, ,

fl or n o q ue m edi to e p en s o
,
H á o qu e r q ue é ,

d e vag o e tér e o i n atingív e l


, ( Ca n t os I n d ec i s os
,
»
,

C V I I I ) E m O H om em Un i v er s a l 0 aut or d escr e v e
.

a form ação d a sua id e ia p oética : g erada em m im « » «


, ,

como fil h a ou d a m e sm a carn e d o m eu s er


,

O m eu p en sam en t o s ou eu próprio ( p 2 4 ) O s en » . «

t i m e n t o faz s e p e n sam e n to
-
a e m oção é a m esm a ,

substânc i a d a c on sc i ên c i a a arg i l a d o s eu p erfil , .

E é por ím p et os e m otivos q ue a con sciênci a s e i lu


m in a e d esv en da a s i m esm a ( p Proc ed e m e » .

d ian t e o con h eci m e nt o d o in stan tân eo o r e l âm pag o


«
,

d a intuição ( p » .

L írico T e i x e ira d e Pasc oa e s canta i ng en u a m en t e


,

i m pr e ssõ es e s tad os d e al m a coisas im agin árias : os


, ,

« lugar e s sant os d a m f â n c ra a m ontan ha a font e


»
, , ,

um a ov el h a um pin h ei ro a n évoa q ue sob e d o rio


, , ,

a al egr i a d a m an h ã a tr i st eza d o cr e púscul o a sau


, ,

d ad e dum vago amor a pi edad e a hum ildad e « vul , , ,


O B R A S C O M P L E T A S

tos de al ma c om p e rfi s de cam pon e s e s pobr e s e


»
,

vi ú vas 0 v ent o e a chuva o luar e as sombras os


, , ,

fugaze s pr e ss e n ti m ent os do in e fáv e l o amor q ue s e ,

e st en d e à Natur e z a in t e ira D issol v e o m und o e m .

alma e m el od i a J á p orém n as p oe sias d a pri m e ira.


, ,

fas e d esp on ta o c on g em i n a d or i nt errogad or d a ,

e sfing e Olh ava pr o i nfin i t o abs ort o só e sq ue


. «
, ,

— l e m os n os E m br i õ es ( P ort o l ivr o ,

d e e str e i a d o po e ta ( p e a inda : Qu ero m ed ir . «

a noit e d o I nfin it o ( p 2 9 ) A qui s e afirm am poi s


'

.
, ,

co m o sinai s d u m a p ers on al idad e 0 v ez o c ont e m ,

p l a t i vo d e fal
,
a só e a i nqui e taç ão m e tafísica
-
,
.

A in satisfaçã o e at é o asc o do r e al a fuga para , , ,

« a e sfe ra d o M istéri o caract eri z am O pastor d e » ,

B el o ( 1 8 9 6 D o tri st e s on h ador o ol h ar pro «

fund o F oi p el o céu e m busca d e al vorada s Q ue


, ,

nunca pôd e achar c á n est e ( 2 part e .


ª
,

p .

Na prim e i ra ediçã o d e S em p r e d e 1 8 9 8 a c e n , ,

tua s e ain da m ai s o p en d or m et afísic o d a obra pas


-

c oa i s i a n a c om o d e s e n v o lvim e n to d algun s t e m a s
,

típic os O p oeta d ia l oga c om a s s ombras : O som


. «

bras q ue dur a n te ã noit em e fal ai s, Q uando p en so


f ' '

e n ão s ei porqu e a e st e mun d o vi m ! Ó V ós “

Q ual é o
_

q e a m in h a Noit e im e n sa povoai s
u
_
,

corpo q ue vos pr oj e cta jun t oa m i m Mi nh as


S ombra s p 29 ) I n t e rro ga qu e r d esv end ar 0
»
, .
,

ocu l t o; por outr o l ado a Noit e gan h a um s entid o ,

simból ico e st á sim ultân eam ent e f ora e d e n tro d e l e


, ,

com o suc ed e com a v oz quim érica do v e n t o « »

( p . e ntr e a alm a d o p oe ta e o m un d o tod o h á

uma s ecr eta i nti mi dad e ( p


« D epr e c i a n d o o » .
_ _ _

r eal d a aparên ci a _ « 0 S on h o
aQ ui m r a:
g »
_ _ , _

« S an ta m en tira só tu fost e cri ad ora ! ( p ,


» .

« A cr edita i até n o q ue n ão E e ss e im po ssív e l ,

e ss e n ada (p I d e i a fulcral n o .

pe nsam e nto d e Pasc oa e s ond e a R e al id ad e q ue ,

37
T E I X E I R A D E P A S C O A E S
" "- ! Sx
'

º
Í i l à.
"
" “
. 1 -
a . «

im porta absoluta e t erna é a q ue r esul ta dum m ero


, , ,

act o d e fé : D eus v i v e porqu e o cri amos e m nós " '

L onga m e nt e ob s i d i a n t eme n t e a t é a o úl timo al e nto


, , ,

Pasc oa es h á d e r eelab orar os s eus t em as apro


-
,

fundar pr e ci sar e v oltar a e scl a r e c er a sua fi l os o


,
«

fia ou c onc e pçã o i n tuitiva d o Un i v erso ; n em c on


»

s e guiu e vi tar algum as v ez e s ( el e q ue a r d or os a men t e ,

c ombat eu o d efin ido o e stático o m um ificad o a pon , , ,

tand o o p erig o da sub ord in açã o d o cri ador à cria


tura ) o pr osaís m o d e c e rtas id e ias d e masiad o e sta
b e l ec i d a s f o r m ul adas ou o aut o m atism o d e símb ol os
, ,

c onv en ci on ai s com o j á s e v e rifica e m J es us e P ã


,

on d e e x pr e s s a m en t e s e pr e c on iza a al i anç a

d o Pagan ism o e d o C r i s t i a n i s m0 — o q u e s e rá um a
— _
_

d a? trav e s m e stras da d outrin a saud osista um a das ,

suas bas e s d igam os p edagógicas : H ão de subir


, ,
« -

ao m e sm o altar J e sus e A s Ninfas b eij arão


o s anj os d o S e n h or Mari a h á d e ch am ar a Vén us .
-

sua i r m ã E O t r onco dum a c ruz ainda h ei d e vê lo - -

em fl or ! ( p » .

J e sus e N infas e Mari a e


T ronc o e Pa sc oa e s t e nd e a v er o Un ive rso
r e partido e m f orças an tin ô m icas e m t e n sã o d i a l éc ,

t ica e e xpl ora or a t õr i a men t e o j ogo d e pol aridad es


, _
,

N ão me ac ta a o b s e rvaçã o d e I l í di o
par ec e p o i s , , ex
S ard oe ira aliá s u m d os m e l h or es i n térpr e t es d e Pa s c oa es
, ,

s ob r e o caráct e r s n s orial e l o cal da s ua i n s pir açã o n es ta


e

ép oca : O p en s a m e n to d p oe ta e s tá ai n da vo ltad o para o


« o
m un d e t e ri or ; as raízes da s ua i n s pira ç ã o pr e n d e m s e por
o x -
,

e n q ua n t à s c i s a s s i m pl e s da n at ur eza e à s s u a s m u da n
o, o

ç a s cíclica s ; e o p o e ta q u e aca b ará c o m o um d os gra n d e s ,

m e tr e s d
s liri mo p o rt ug uê s c me ça c o m o q ualq ue r vat e
o s o

i n ex p e ri e n t e p e l o s e n ca n t s da Maria d e E n tr e D our o—
, ,

, oe -

N I i nho M a r i a s da m i n h a t e rra
: T oda s v ós s a b e i s u rd i r
D u m c e r t o l i n h o u ma t e i a O n d e t od os vã o ca i r ( Pa s coa es
—Um poe t a d e s e m pr e pp 1 2
»

D e c e rt o ta mb é m s e
, .
,

o b s e rva n o Pa s c o ae s pri n cipia n t e e s t e lad s up e rfici a l d e o ,

ti n ta s b uc ó lica s graci os m adrigal e s c f lcl ó ric ; m a s o


, o, o, o o

q ue i m pr e s s i o n a é j á n os pri m e ir os li vr o s a r e v e la ç ã o d um
, ,

poe ta vi s i on ári o d e v o caçã r e ligi os a e en tid o c ó s m ic


, o s o .

38
C O M P L E T A S

am e n tal é a d o par vi d a e ex i s t ên
a q ue p od e m r e d uz ir s e o s par e s

a D eu s S a t ã ( ou p eca d o) , a p a ri ,

a co r p o es p on t a n ei d a d e a r t i f í ci o , ,

ve l h i c e s er i e d a d e r i s o ( a s e ri e dad e é d a
,
-

al m a o ri so d o c or p o d o e squ e l et o q ue torn a o
, , ,

H om e m gr ot e sc o ) l i be r d a d e n eces s i d a d e d ú vi d a ,
-
,

-
cer t ez a t ol er â n ci a i n t ol e r â n c i a ;
, ou aind a ( e stas
-

po laridad e s m ul ti plicam s e n o p en sam ent o d e Pas -

coa es ) i n t ui ção r a z ã o c r i a ç ã o c r í t i c a t r a d i ç ã o pr o
, ,
_
r es s o c a m p o ci da d e T ud o o q ue é ingénu o si m
g
-
,
.
,

pl es e sp ontân eo c om o na s cr i an ças p ert enc e a o


, , ,

da vida . V iv e r é um
t rn o r e ssurgir p e s o
« e e ,

bruto q u e s e e v oa radiant e
i m pon d er a l i z a ,

E xistir é s er abrangi do p elo e spaço vi v er é abran


_
_
,

g er o t e m p o ( S ão P aul o 2 »e d p A a u s ên ,
.
ª
.
, .
_

a li a s e o y ag o o i m agin ári o o son h o


g —
-
, , _ ,

inf i n it o , 6 et e rno ; â p r es ença o fi n it o o s u per f i


_ _ , _ _

ci al ,
o ef êm
o _
e r o o s en s or i al , _ .

N esta c on c e pç ã o d a d in âm i ca d o Un iv erso c on ,

c e pç ão q u e prov o ca um a t e rm in o logia pe cul iar a , __

mor t e n o s ent i d o vulg ar é sinón im o d e v i d a por


, _ ,

q ue a m ort e li be rta o H om e m d o corpo t orn a o pura


-
_ _ ,

l embrança pr e s en ça sub j ect i va q ue s e v a i at en uand o


,

até ao an i q ui l a mento d efi n itiv o ; l ogo p orque é ,

ausên ci a p er m it e a qu el a un i ão t ot a l só d e al ma s
, , ,

c om o v i m os s egund o Pasc oa e s a p re s ença , ,

corpó re a im p ed e Um poet a fran cês d e hoj e ! ve s ,

Bon n ef ojf partil h a o m e sm o h orr o r ao c ong e l ad o à


, ,

vid a p etrificada o m e sm o an s e i o d e lib ertação p e lo


,

ima g i n ário : I l t e fa udr a fran ch ir l a m ort p our q ue


«
, _

tu v i v e s E plus pur e prése nce e s t un sang


,

r é pa n di i P or sua v ez a m o r t e n a ac e ç ão pas
.

p , ,

c oa i s i a n a acom pan h a nos e m todos os i n stan t e s


, ,

e n ão ap e n as porqu e som os contín ua m udan ça ,

l ogo suc essã o de m ort e s ( e d e r en asc im e n tos ) ,

39
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

m as p or qu e v i d a e m o r t e qu e r d ize r um prin , ,

cípi o d in â m ic o f e c u nd o criad or e um princ ípi o


, , ,

d e i n é r ci a e spi r it u al ou d e int e l e ctual i z aç ã o d e


, ,

d e s s or a m en t o d e m e can izaç ã o c on stan t e m e n t e s e


, ,

d i g l a d i a m e m nós E m c e rt o s e n tid o d os dois


.
,

e l e m e nt o s q ue n a d efin ição d e Pasc oa e s c on sti


, ,

tu e m a saudad e — a e sp eran ça e a l embran ça


o pri m e ir o é d in â m ic o v i d a o s e gund o é e stá
, ,

tic o m o r t e E stas c on sid eraçõ e s ap e sar d e e squ e


, .
,

m á t i c a s ajudarã o a c om pr een d e r 0 s e guin t e t r e


,

c h o d e O s P oe t a s L u s í a d a s q u e por s e u turn o as ,

i lustra : O h om e m ( q ue é am or c r iad o l embrança


«
,

ou m ort e ) qu er a m ar para s er vida e sp eran ça e ,

am or c r iad or A m ort e em nós qu er s er vida


.
, ,
.

O e squ e l e t o caricatura em m ár m or e d a alm a pr e


, ,

t en d e fugir a o car u n ch o q u e o rói n a t erra e s on ha


um as asas q u e o el ev e m tran sfigurad o n a luz i mor
tal A s in i s tra caricat u ra d e sg ost osa d o s eu ri so
.
,

( e ssa al e g r i a fóssil m il en á r ia caída outr ora d o


, ,

Sol q u e é m áscara ac e sa d e S atã ) v e st e a s eri e dad e


,

d o am or Qu em sal va o m undo d o s eu n ada é


o c oraçã o d o h om e m q u e s endo m ortal qu e r amar , ,

e t e rn am e n t e E st e qu e r e r i nfin it o e xaltad o n um a
.

f r ági l c r iatura ; e sta lu z e t ern a a ard e r n um a l â m


pada d e barr o qu ebrad iç o es ta in saciáv e l s ed e febri l
dum a água q ue n ão e xi s t e ; e sta an si edad e d e D eus
n um p equ e n in o v e r m e d a t e rra — e i s 0 m ilagr e e a
tragédi a : o m ai s d ol or oso e i n e xpl icáv e l d a Vi da ,

m as também a sua grand eza e xtraordi n ária »

(a
E mb ora p er f e ita c oerênci a e sta vi são a n t i t é
s em ,

tica dos asp ect os ofe r e cid os p el o Un i v ers o organ iza


-
s e n um si s t e m a p e ss oal E assim q u e po r e x em plo
.
, ,

o r i s o o ridíc u l o s e ass o ci am n orm al m e n t e a o e squ e


,

l e t o ( a cav e ira r i ) e à c r ítica ( E st ou a cair n a «

crítica ou a t orn a r m e ridícul o i n G u er r a ]un


-
»
,

q ue i r a p , E a id e ia d e D e us e voca n e c e ssária
.

m ent e a i d e i a d e infân ci a ( p orqu e D eus é um «

40
O B R A S C O M P L E T A )
m e n ino ain da ! E s e E l e en v el h ec er pe rd erá o St
, , .

O úl tim o sorriso d a sua lu z e a s árv or e s nunca m ai s ,

d arão flor i n L i vr o d e M em ó r i a s pp 44
»
, Em , .

torno d os c on c e itos c e ntrai s d e v i d a e m o r t e con s


t el am s e d et erm in ad os sí m b ol os h abituais : o qu en t e
-
,

a f ebr e por oposiç ão a o fri o ; o fog o o v en t o a


, , ,

n uv em a fl or por o p osiçã o a o r och e d o a o s oss os


, , , ,

a o m árm or e et c ( S om os t e rn ura e p edra e squ e


, . «
,

l eto e alm a i bi d p 1 34 ; a i nfânci a é um a n uv e m


»
, .
, . «
,

com o a v el h ic e é um a p e d ra i bi d p D um » , .
, .

l ado tud o quan t o é v ol átil i m pal páv e l vi v o fértil ; , , ,

do o utro o q ue é p e sado g e l ado in ert e e stéri l


, , , ,
.

Mas va l erá a p en a d em orar n os um p ouco m ais -

n a an ál is e d algum as an ti no m i as sal i en tand o ev i ,

d en t e s afin idad e s e n tr e 0 p en sam e n t o d e Pascoa es


e o d e Un amun o ( m ais por e spon tân e a con v ergên ci a

q ue por i nfluên ci a con quanto e s ta últim a n ão d eva ,

e xclui r s e como h i pót e s e )


-
D i stin guin do c om o Un a .
,

muno en tr e o sup erfi ci al e o e ss en cial e n tr e o


, ,

passag ei ro e 0 e t ern o o po eta d e M a r â n us pr ocura , ,

com a varin h a m ágica d a I m agin ação ( n o s e nti do


rom ântic o h ug ues c o d e faculdad e i ntuiti va ) ver
, , ,

para al ém d as aparênci as apr ee n d er 0 e scon did o , .

E ora s e qu e i xa d a surd e z d os d e us es ( A h por « » «


,

m ai s povoad o d e figuras O m un d o é s e m pr e a ,

m e sm a sol id ã o A qu e l a e státua e m p e dra d a I l u


,

s ão,
M on stru osa pr e s en ça d e N inguém i n E l e » ,

g i as p 1 74 ;
, . S ó d e scubr o m e nt iras d a V e rdad e »
«
,

i n Ca n t os I n d eci s os X C I V ) ora fal a d e slumbrado , , ,

d e s ú b itas r e v e l açõ e s : E m c e rtas gran d e s horas «

e spantadas Num a i d e l uz as c ousas s e r ev e


, ,

( O P o br e T ol o p H ouv e um i n stant e , . «

em q u e a s p e dras e os m on t e s m e falaram E fiqu e i .

a s er es s e i n s t a n t e ( O H om em Un i ver s a l p »
, .

A mb os Pasc oa e s e Un amun o s e m o stram


e mp e n h ados n um con h e cim e nt o on t ológico do Ho

me m um c on h ec im e n t o q ue v á at é às raíz e s d o s er
, .

No Hom em para doxo vivo tud o afinal s e e n l aça


, ,

41
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

e e nfr e nta ; s e é el e 0 Un iv erso c on sci ent e por « »


,

igu al s e po d e d iz e r q u e 0 Un iv ers o é a sua c on s


ciênci a tud o n asc e e m or r e c om a sua c on sciênci a ;
,

qualqu e r r e al idad e q ue n ão s ej a c on sciênc i a n ão


passa d e aparência d e fe nóm e n o va z i o ou i lus ã o
,
« » .

A vida é s onho d i z Un amun o r e p e tind o C ald e r on


, , .

« T ud o é fantasm a — a s s e v e ra Pasc oa e s H á 5 6 .

nuv en s n uv e n s d e v oz e s n uv e n s d e alm as d e a f l i
, , ,

çõ e s e d e tragédias ! Nuv en s e m ai s n uv en s apa ,

r ên c i a s e m a i s aparên cias ! E u m r e l âm pag o d ivin o

q u e a s tr e spassa a i n stant
,
ân e a A pariç ã o q u e surg e
e n os l ança por t e rra d e slu m brad os ! ( O B a i l a do
,
» ,

pp 6 5
. Mas c om o obs e rva Unamun o s e nd o a
, ,

n ossa c on sciên cia fin ita p e r ecív el também el a n ão


passa d e aparên cia — v erdad e t errív e l j á pr oferida
, ,

por Sh a k eS pea r e : s om os f e it os d a m atéri a d os


«

s on h o s nós própri os ilusã o também D ebal d e l uta


»
,
.

m os c om 0 n ad a d e q ue s om o s f e it os d ebald e n os ,

i n v en tam os e fingimos o mund o O h om em a o


« » . «
,

m orr er apaga c om o últim o s u spir o o m un d o e m


, , ,

q u e viv e u (
» Ve r bo E s c u r o p , .

I nd ividual i sta e str e m e e xig e n t e d e aut e nticidad e


, ,

Pasc oa es r e pudi a a p e r s on a a p ers onag e m s ocial ,

q u e os out r os n os l evam a r e pr e s e ntar a m áscara ,

e m q u e n os a n q u i l os a m os subm iss os a os cód igos e ,

às e tiqu e tas ; p e lo c on t r ári o f og e d o r eban h o i s ola , ,

-
se,
cultiva em si a i nfânci a a pl en a origin alidad e , ,

a pl en a l ib erd ad e de e S pí r i t o ; d á s e à c ont e m pl ação -


,

ol h a para d e ntr o d e si Mas q ue d e sc obr e d entr o d e


.

si ? A l ém de i m ag e n s v á c ua s alg o d e im pal páv e l ,

q ue n ão c on s egu e a pr ee nd e r Ol h o m eu próprio s er . «
,

com o qu e m o l ha O fun d o d e u m abis m o C om


d emón i os pai rand o em n e gr os v oos afl itos ( E l e
,
»

g ia s p, . Qu em és tu
« Meu vult o h um an i ,

z ad o e m q ue me sint o E stran h o a m im vi v e r ?
, ,
»

( O P o b r e T ol o p ,
.E q ue v e m o s nós d e nós ?
«

I lusória im ag em num e sp e lho E l e mbram o n os d e la .


-
,

quand o m uit o L e mbram o n os d e ss e vago fan tasma


.
-

42
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

D iz e r q ue a m até r ia é mat erial e 0 e spírito e spiri


tual n ão é fal s o ; m as é m ai s v erd ad e d iz er q ue a
m até r i a é e spiritual e o e S pí r i t o m at erial ( A N ova »

P oes i a P o r t ug u es a p , P ortant o um a vi são in


.
,

t eg ra d or a q ue r eduz o d iv ers o a o u n o sup e ra e


, ,

c om pl eta e m Pascoa es a visã o dual ista das polari


, ,

dad e s : 0 s i m c ontém o n ão e vic e v ersa ( c on fe


« ,
-
»

rên ci a P r o P a z p , .

V ol t em os a dois e x em plos j á e nunciados : o d a


r el açã o t em po — e t e rn idad e e o d a r e laç ã o D e us Ho -

m e m Pasc o a e s s ent e d e m od o b em vivo o d e slizar


.

i n elutáv e l d o t em p o : e xpri m e per c uc i en t emen t e 0


contrast e e n tr e a i lus ã o d e p erm anên cia produto ,

dum a atitud e pro sp ectiva e 0 s en tim e nto da fugaci


,

d ad e d e rivado dum a atitud e r et r 0 5 pec t i va : O d ia


,
«

d e h oj e n ão t em e j á passou ! E l e q ue f oi ,

d e p edra s obr e nós v ol atil izou s e : é o di a d e ont e m


,
-
.

Seu vulto cru e l e mbrand ec eu : os m inut os q ue 0


form aram p erd eram s e un s n os outr os ; d esapar ec e
-

ram tod os n o i ncênd io d o E o d ia d e


o nt e m é t ão d istan t e com o o prim e iro d i a d a i n f â n

ci a ! E um di a q ue nunca ( O B a i l a do ,

p . A s pal avras d o p oeta p en sador traduz e m -

aqui d e m od o adm iráv e l a in c essan t e r edução do


concr e t o a o abstract o ; d o tan gíve l à vid a at enuada ,

e sfum ada ,
d a m emóri a ; d a e xistênci a à n ão ex i s t ên -

ci a a q u e el e ch am a vi d a .

O pr es e nt e é a l i nh a i m agin ári a q ue s e para 0 pas


sad o ( i lusã o da m emória ) d o futuro ( i lusão d a con
j e ct ur a ) N e ss e s doi s m un d os d e irr eal idad e vi ve
.

Pascoa es ; n inguém m ais afastad o do ap eg o à s eu


s a ç ão im e di ata q u e d ita o c a r p e d i e m Mas como .
,

p ond er ou Un amun o o e t ern o e 0 t em poral e stã o


, ,

para o H om e m e str e itam ent e e n laçados s endo


, , ,

c om o s ão duas d im en sõ e s da e xistên cia concr e ta


, .

O an el o d e e t ern idad e é t ão e ss encial n o Hom em


c om o o s er n o t e m p o O própri o t em p oral — es c l a
. «

r ec e Fran ç oi s M ey e r a o faz er a e x eg es e do p en sa
,

44
O B R A S C O M P L E T A S

m e nt o de Un am un o l ong e d e con sti tuir d e s e n


volvim ent o passivo d um a r e al idad e j á c on c l usa é , ,

or s eu turn o e m part e a o m e n o s a f on t e viva e


p , ,

criad ora d o et ern o A id e i a d a pr ee m inênci a


lógica e on t ológica d o e t e rn o s ob r e o t e m p oral c ed e
0 lugar a um a r e l a ção r e cípr oca e m q u e tant o u m

c om o o utr o t erm o c on stitu e m igu al m e n t e o s er d o


outro A r el aç ã o e ntr e o e t e rn o e o t e m p o r al n ão
é p oi s d e m od o n e n hu m em Un amun o a d e d oi s
, , , ,

pl anos d o s er m as a d e duas d im e n sõ e s c on t r a di t ó
,

rias e n ec e ss ari am en t e un idas e m sua m e sm a c on


tradiç ão ( L a O n t ol og í a d e M i g u el d e Un a m un o
» ,

trad eS pa n h ol a Madrid 1 96 2 pp 5 5 e
.
,
Ora
, ,
.
,

em T e i x e ira d e Pascoa e s ta m b ém s e r e v el a o s enti,

m ent o do q ue Un a m un o ch am a a h arm on i a s em pr e «

i n f i e r i d o e t e rn o o s e n ti m e n t o d e q ue o e t ern o
»
,

br ota con tin uam e nt e d o t em p oral ou 0 i nv ers o :


« O t e m p o c orr e através d a E t ern idad e ou ant es a , ,

E t er n id ad e agita s e e é o t em p o O t e m po r e p ousa e
-
.

éa A E t ern idad e é 0 t e m p o a d or me
cido O t em po é a E t e rn idad e vi va c om in úm eras
.
,

v i s a g e n s tumultuosas r e pr es e ntan d o a sua

( O B a i l a do p , O m ar é a E t ern idad e a on d a
. «
,

é a h ora A on da r egr e ssa à i n tim idad e calm a


do m ar A h ora fun d e s e outra vez n a E t ern idad e -
, ,

A E t e rn idad e é a s ombra d o t em p o — o t em p o
.

e stagn ad o e m a b i s m á t i c a s fun duras E o t e m po é .

E t ern idad e viva a E t e rn i dad e em acç ão dram ática


,

e corpór e a ( i bi d p
» .
, .

Paral el am e n t e D eus e 0 H om em s ão i n t er d epen


,

d ent es : D i os y e l h ombr e
« d iz Un am un o se
hac en D ios s e hac e 0 s e r ev el a e n
el hombr e y el h ombr e s e h ac e e n D i os D eus
,
. »

t em um a e xistên ci a i m an e n t e n o H om e m é um a ,

proj ecçã o d o an elo hum an o d e ab soluto Quan t o


mai s hum an o m ai s d ivin o — p en sa por s eu t urn o
.

Pascoa e s : Paul o hum an iz ou D eus abs olutam e nt e


« .

A força de s er h om em é q ue J esus alcança a d ivin


T E I X E I R A D E P A S C O A E S

d ad e é q ue D e us é D eus ( S ão P a u l o
,
ed
» ,
.
,

p . D e u s e xi st e p orqu e o H om e m acr e dita n el e ,

é um C r iad o r fil h o d a C riatura A c r editai at é num a . «

i lu s ã o ,
E n e l a e n c on tra r e i s a r e al idad e A cr e .

d itai e m D e us e l og o D eus S e rá pr e s e nt e e vivo , ,

l á n os c éus ( C a n t os I n d ec i s os CIX ) Mas Pas


» , .

c oa e s h esita e ntr e d ua s alt e r n ativas : n ão ob ed ec e


o H o m e m a f orças oculta s ? N ão s e rá e s ta vid a car

n al um arr e m e d o d a Vida abs oluta c om o o t e m po ,

u m fil h o d a E t e rn idad e e os h om en s s om bras pla ,

t ô n ica s d e a r quéti p os ? A vida e spiritual al im e n ta s e -

d a d úvida S om os um et e rn o c onfl ito duas pala


. « ,

vr a s e m c onfl it o : s i m e n ão ( S ã o P a u lo p » ,
.

A filo s ofi a pa s c oa i s i a n a da saudad e ofe r e c e n os -

m ai s um a fac e ta d e st e p e n sam e nt o simul tân e am en t e


d il e m átic o e t ot a l i z a n t e T om a c om o p on t o d e par
.

t id a um a l onga e xp eriênci a p ess oal c oin cid e nt e c om


a d efiniçã o d e D uart e Nun e s de L e ã o q ue c on ,

sid e rava a saudad e um m i st o d e l embrança e


d e s ej o O d es ej o é a pa r t e s en sual e al egr e da S au
. «

d ad e e a l e m b r a n ça r e pr e s e nta a sua fac e e spiri


,

tual e d ol orida p orqu e a l em bran ça in clui a a u s ên


,

cia d u m a c ou s a ou dum s er am ad o q ue adquir e pr e


s ença e spiritual e m n ós A d or e spiri tual iza o .

d e s ej o e o d e s ej o por sua v ez m at eri al iza a dor


, .

L embrança e d es ej o c onfun d em s e p e n etram s e -


,
-

m utuam en t e an im ad os da m e sm a força vital e assi


,

m i l a dor a e pr eci pitam s e d e p oi s num s entim ento


,
-

n ov o q ue é a S audad e ( A r t e d e S er P or t ug u ês »
,

ed pp 9 8
.
, P e l a força d i n a m i z a d or a d a e sp e
.

rança ( ou d e s ej o ) c on tida n a saudad e a l embrança ,

De f act o, m u it o c d e o e m Pa s c a e s
o (e paral e la m e n t e
, , e m
C rr i a
o e de O l iv e ira )
pri m e u m a
se ex q ue viv ê n cia s a ud o s a
um p e n s a m e n t o p oé tic o vai e la b ora n d o E s s e u m d os m ti . o

v os d e i n t e r e s s e d o p oe ma B e l o ( Co i m bra 1 8 96 ) a í s e l ê por , ,

e x e m pl o : A sa udad e al e grava e
« o É q ue el a
faz a d or e o praze r C om o a mes m a l uz faz a n oit e e 0
,

(p .

46
O B R A S C O M P L E T A S

d o passad o c on v e rt e s e e m l e mbranç a do Futur o - « »


,

a n oit e am an h ec e o fim t orn a s e c om eç o a m ort e ,


-
,

vida : Sou e m futur o o t e m po q ue pass ou


«
, Em , ,

m im o an tig o t em p o é n o va i dad e
, i n »

S em p r e p , E e ntr e as e r m a s L embranças a
. «
,

s orri r P e rc e bia s e o vul t o d a E sp e rança


, E ra
-
.

a i mag e m d as c ousas q ue h ão de v i r A d ivi n a -


,

l embran ça d o Futu r o ( M a r â n u s X V I I R e v e la »
,
«

ç ão C ult iva i a infância A proxim ai vos


« .
-

d a vid a an t eri or i st o é d a m ort e Se c on s egu ird e s


, , .

atingi l a ir ei s a o própri o s e i o d o Futur o ( Ve r bo


-
,
»

E s cu r o pp 1 2 2
,
O p en sam en to d e Pasc oa e s
.

( e n ist o s e s ingulari z a e m r e l açã o a Un amun o )


irradi a c onfi ança um optim ism o c r i a dor ª
O e spi
,
ºª
.

rit o subtrai s e a o e nv el h ec e r à m o r t e ( no s en tid o


-
,

atrás i ndi cad o ) p orqu e n el e s obr eviv e a infân ci a e


a prim av era s e r en ova : Pa s coa e s d ivi sa a E sp eran ça «

imp el id a p el a L e mbrança n o s eu ím p eto criad or ;


a n évoa e scura rasgan d o os s e i os d ond e salta o pri
m eir o rai o pri m av eril ( O s P oe t a s L u s í a d a s » ,

p . Viv er é um e t ern o r essurgir p e so brut o


«
,

q u e s e i m pon d er a l i z a e v oa radi an t e ( S ão P a u lo ,
» ,

p . A v oz d o poeta é um a voz g en es í a c a : Sou «

tudo 0 q ue h á d e s er tud o o q ue h á d e e xi stir So u


-
,
-

tud o o q ue um a alm a em ê xtas e pr ess e n t e Sou , ,

a voz do Futuro e ssa v oz q ue h á de o uvir T ud o ,


-

o q u e son h a e viv e o q u e e str e m ec e e ,

( J es us e P ã p Pascoa e s v en era em J un qu e iro


, .

As afi n idad e s en tr e Un a m un o e Pa s co a es atrá s en un


c i a d a s ap en a s t e rã o o m érit o d e s ug e s tõ e s para u m e s t u d o ,

ai n da po r faze r d a s r e laçõ es i n t e l e ct uai s e n tr e o s d o i s e s cri


,

tor es A t r g i c i d a d e e r m a d e Un a m un o é m uit o at en uada


. a ,

em Pa s c o a es p e la m e la n co lia e l eg í a c a e p e l o pti m i s m o
, o

tr a n s c en d en t e ; o p oe ta p ort ug uê s e vad e s e fr e q uen t em en t e -

para o s e u r e i n o d e fa n ta s m a s a n t eg o a n d o a v o l u pt uo s idade ,
z

d o n ão s e r ; e o s e u p e n s a m e n t o c om b i n a e l em e n t o s h e t e r o
-

g ê n eo s S o br e a s dif e r en ç a s e n tr e Un a m un o e Pa s c oa e s c f
. .

J oaq ui m d e C arvalh o i n pr efáci o d o E pi s t ol á ri o I bé ri co e


, ,

Os car Lo p e s i n E s t ra da L a rg a I pp 5 8 5 9
, , , .
-
.

47
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

a O r a ção L u z o m ilag r e d oi r ad o e a ma n hec en t e


,
«

d a n ossa p oe sia ; e o c e rt o é q ue l he prol onga a


»

m e n sag e m d e e s p e ran ça O m e s m o optim i sm o an i ma .

0 R eg r es s o a o P a r a í s o o nd e o D e us i nfan t e i n ici a
,
« »

u m a n ova er a d e vid a viva e n atural e ond e A d ã o


« »
, ,

por o bra e g r aça d a S audad e r e cup e ra o Paraís o a , ,

vida pu r a il i m i tada d a i nfância


, , .

A a mbiçã o d e ab r ang e r e m sín t e s e os c ontrári os


é u m a d a s c on s tan t e s d o p en s am e n t o d e Pa s c oa es .

S i tuan d o s e e m ati tud e h et e rod oxa pa r a al ém d o


-

B em e d o Mal ac e ita os c om o p r incí pi o s e ss en c iai s


,
-

d o Un iv e r s o d o m e s m o m od o q ue a I r on i a e a T ra
,

g é d i a a D úvida e a Fé 0 Pagan ism o e o C r i s t i a


, ,

n i s m o o D e s e j o e a L e m b r ança — e l e m e nt os c on sti
,

t ut i v os d o T od o e m p e rm an e nt e e f e cund a t e n sã o
,
.

E s ta atitud e q u e j á claram e nt e s e r e v e l a e m R e
,

g r es s o a o P a r a í s o c on tinua a e xp r im ir s e nos e scri


-
,

t os d a úl ti m a fas e : dra m a e c om édi a infern o e «


,

paraís o é tud o u m E a ssi m e sta m os n o céu e n o


,
.

i nfe r n o a o m es m o t e m p o c om o e stam os n a T e rra


, ,

e n a L ua n o Pr e s e nt e e n o Passad o
, ( dum a c on f e »

rência i n édita s obr e J oã o L úci o datada d e Mai o


, , ,

de
D os t e xt o s a d uz i d os r essalta ainda o c aráct e r pr o
b l e m á t i co , antid og m ático , d e st e p ensam ento Pas .

c oa e s n ão v eio tra z er n os soluçõ es m as i nqui e tação


-
, .

A m i ssã o q u e assu m i u f oi a d e arran car n os à e st e -

r i l i d a d e d as c e rt e z as p ortant o à m ort e d o e spírito


, ,

c omo e l e a en t e ndia E spr e ita e m Pasc oa e s 0 demó


. «

ni o » d a ir on i a q ue 0 l eva a prop or n os um a ver -


«

dad e para l og o a s egui r n o l a apr e s en tar com o falsa


» -
.

H om e m d e v ocaçã o r el igi osa a sua cr ença a l i men ,

ta s e d e dúvida : c r ê e m D e us porqu e é absurdo crê


-
,

em D e us p orqu e E l e n ão e xi st e A i d o p e n sam e nto . «

q ue s e m ostra d efin id o ! T orn a s e e stéri l e me s


-

D ef i n i t i v o qu e r d iz e r e squ el e to ( Ver bo »

E s cu r o p ,
. Um a d efin iç ão t e rm inan t e é s em
«

p r e fal sa ( O H »o m e m U n i v e r s a l p 0 andar , . «

48
O B R A S C O M P L E T A S

é tudo : princ ípi o e fi m A qu estã o é and ar e n ão .

parar ; subi r o m ont e q ue s ob e a n ossa fr e n t e n i m , ,

bad o da an un ciaçã o d um D eus e m p e rpétu o n asci


m ent o ( S ão P a u l o p
» T odas a s v e rdad e s , . « »

( aforismos axi om as ) q u e Pasc oa e s pr ocl am a e m


, ,

pr osa e v e rs o c om a s e gurança dum i lum in ado n ão


,

passam afin al d e m om e n tos dum pr oc e ss o d i a l éc


, ,

tic o s em fim p e r p et uum m obi l e O q ue r e al m e n t e


, .

im porta é pr ocurar n ão e n con trar in t err ogar n ão , , ,

r e sp ond e r E o d in am i sm o d o p e n sam e nt o d r a má
.

tico d e Un amun o q ue atrai e subjuga 0 p oe ta das


Som bra s : A fé ap o iada n a in c ert eza ! H á l á vi são
«

mais dram ática d e D e us ? ! C om o 0 s eu e spíri to


é um céu d e t e m p e stad e ocultan do e en t r emos t r a n do
D eus : e n t r em os t r a n d o—
o à n o ssa d úvid a ocultando o ,
-

à n ossa Fé ( carta d e Pasc oa e s a Un amun o d e


» ,

F ev e r eir o de
C omo n ão s ou filós ofo n ão vou pronun ciar me ,
-

s obr e a val idad e fil osófi ca d a m etafísica d e Pasc oa e s


e d e i xar e i a o utr o s a tar efa d e a in s eri r n a l in h a evo

l ut i v a da fil os ofi a e ur op e i a A s s im pl e s opin iõ e s .

s ão várias L am en tam un s q ue o asc e ta do Marão


.

n ão t e n h a r e p ousado o e spírito in qui eto n as cer


t ez a s d o cat olici sm o D i z e m outros q ue o p e n sa .

m ento d e Pasc oa es s ofr e do al h e am ento d as r eal i


dad es d o div ó rci o e n tr e i n tuiç ão p oética e e spírit o
,

ci entífico e n tr e e sp ecul aç ã o e acç ão E c on sid e


, .

ram n o su pe rad o Hav erá qu e m o acus e d e t er j ogad o


-
.

com abstracçõ es vazias d e s entid o com o L ib erdad e ,

ou E t ern idad e e d e t er substituíd o raciocín i o s


, por
pal avras subl im es O própri o po eta r econ h ec e
« » .
,

aliás as m irag en s da pal avra e os p erigos d a em


,

br i a g u ez v erbal : A busamos d o v erbo com o do «


,

álc ool ou d e tudo q ue n os e xcita os n ervos e l ison


j ei a 0 pa l adar C om q ue praz e r e xasp eram os a .

fogu eira ! ( O Hom em Un i ver s a l p


» L ida , . «

mos s empr e com pal avras ou vazias d e s e n tid o ou ,

ch eias d um s entid o i gn oto ( p O q ue p orém » .


, ,

49
T H 7
.

E I R A D E P A S C O A E S

s e n ão p od e n e gar a o p e n sam e nt o pa s c oa i s i a no ind e ,

p end e nt e m e nt e d u m a ad e sã o in t e ira ou parcia l é a ,

gran d e z a d a aut en tici dad e a força p oética a altura , ,

das pr eocupaçõe s Se as suas visõ e s s ão quim éricas


.
,

Pasc oa e s profe ss ou t od a a vida a Qui m era com uma


fid e l idad e ass om br osa m arca dum a e xc e pc i on al qua
,

l idad e hum an a E n carn o u d e m od o ún ic o n a h istória


.

d a l it eratura p ortugu e sa o id eal rom ântic o d o p oeta


m en sag e ir o d o d ivin o pr ofeta g ui a das alm as , ,
.

Q u em s en ã o e l e pod e ri a diz er c om pr ofunda s eri e


,

d ad e : M edr os o e al v or oçad o v ou andan do


« Nas ,

alturas fan tásticas d o céu ? »

O SE N TI D O N A C I O N A L : O S A UD O S I S M O

Mas só t ão n a q uela S e rra


f i co u , en ,

A V i rg e m da S a u dad e ; a G l ó r i a a G ra ça , ,

0 m í s t i c o E s pl e n d o r da n os s a t e rra ,

S ua F l or eva n g é l i c a e d i v i na .

(M â X V III ) ar n us,

A c onjun tura n acion al nos prim eir os t e m pos da ,

R e públ ica e a f orm aç ã o em 1 9 1 1 d a s oci ed ad e


, , ,

« R e n asc e nça P ortugu e sa » an im ada do pro pó si to de ,

r e s tituir a os P ortugu e s es a c on sciênci a d os s eus


valor e s origin ais e d e p r om ov e r um r essurgim e nt o
n aci on al d eram O p or tun i dad e a Pasc oa es para d e
,

s e n vo l v er um d os asp e ct o s e ss e n ciai s d o s eu p ensa

m ento poétic o : a fil os ofia d a S audad e Pascoa e s


« » .
,

q ue d i r igi u l i t er â r i a m e n t e a r e vi sta A Ág u i a e ntr e


191 2 e 1916 e ntr e g ou s e co m e n tusiasm o a uma
,
-

c am panh a d e i ncita m ento e d outri naçã o através d e


artigos d e c onfe rên cias O E s p í r i t o L u s i t a n o ou o
,

S a u dos i s mo O G é n i o P o r t ug uês A E r a L us í a da )
, ,

e d e l ivr os ( A r l e d e S e r P o r t ug uês O s P oe t a s ,
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

t ór i a s p essoai s os po etas atrás r eferidos A fon s o


, ,

D ua r t e e out r os P or e xt e n sã o d o c onc e it o con tari a


.
,

c o m um filós ofo p oe ta L eon ard o C o i m bra e com


-
, ,

u m pin t or p oe ta -
A n tón i o C arn e ir o Mas c omo j á
, .
,

obs e rv e i n outr o lugar t e rm os c om o S audosism o ou ,


«

N eo S ebasti an i s m o só parcial m en t e d e scr e v e m o


-

movi m e n to Para al ém d a visã o do mund o pro


» .

pr i a m en t e saud osi sta q ue s e e xpri m e por e x em pl o , ,

e m M a r ãn u s e q u e n e m t od o s aqu e l e s po etas par


,

til ham por igu al O q ue apr oxi m a de T e i x eira d e ,

Pascoa e s um C orr e ia d e Ol iv eira ou um L op es


Vi e ira é 0 s ere m parti cipan t e s d um N eo R om an -

t i s m o q u e s e fi li a e m G arr e tt e m A n tón io N obr e , ,

n o Jun qu e ir o da P á t r i a d e O s S i m p l es e das O r a ,

çõ es , e r ej e ita d um m od o g eral os fe rm e n t os
, ,

c os m op ol itas m od ern o s dum C e sári o V erd e dum


,
« »
, ,

Nobr e dum E ugén io d e C astro ou dum C am ilo


,

P e ssan ha .

« Firm e s n o s eu n acion al i sm o l it erári o e n o s eu


e spiritual ism o os h om e n s d e A Ág u i a crê em n a
,

l it eratura c om o ag ent e d e engran d e cim e nt o pátrio ,

e sp e ram c om fé j u v e n il pr ocl a m am a e xistência ,

dum a al m a n acion al r e mon tam à s orig en s para a ,

faz e r e m r eviv er pr ocuram r en ová l a e t orn á l a c ons


,
- -

ci en t e São h om e n s d e intuição e af ect o m ais e x pa n


.
,

s i v os q u e r efl e x ivos O q ue di stingu e e st e N eo R 0


.
-

m a n t i s mo d o n oss o prim e i ro R om an tism o é por um ,

l ad o c erto m i stici sm o pant e ísta ou pa m ps i q ui s t a


,

q ue d á à p oe si a um s e ntid o cósm ic o : e nt e nd e s e a
-

po esia com o av en tura e spiritual busca s e a ass ocia ,


-

ç ão d a p oesia e d a fil os ofi a ou p e l o m enos d e c e rta


fil osofi a i n tuit iva ; Pasc oa es e L eonard o C oimbra
d ão s e as m ã os P or outr o l ad o n ão obstant e o con
-
.
,

s er v a n t i s m o d as f orm as p oéticas incluind o o l éxic o , ,

a sin tax e a v ersificaçã o e c erto p endor oratóri o


, ,

( t ão l ong e d os m od ern istas d o O r pheu l ) os cha ,

m a d os saudos istas m o s tram um a singular capaci


d ad e para esfumar o c on cr e t o in sinuan d o a osmos e ,

52
O B R A S C O M P L E T A S

do r eal e do i magi n ad o ab ol ind o fron t e iras e ntr e o ,

o bj e cti vo e o subj e ctivo ; usam d e l inguag e m m ai s

fl uida m ai s subti l q ue a d os pri m e ir os r om ânticos ;


,

algo apr ov e itaram cl ar o e stá d a e xp eriên ci a pós , ,

- r om ân tica ( O S aud osi sm o e os s eus val or e s ind i


» «

vi d u a i s i n E s t r a da L a rg a — I p
»
, , .

E Pa s c oa e s f oi ain da m ai s l ong e : l ig ou a o Sa udo


sism o um corp o de i d e ias p e ssoai s — r e l igi osas p olí ,

ticas — q ue e m c ert os cas os só m ui t o r em otam e nt e


, ,

s e pr e nd e m à saudad e D efe n d eu por e x e m plo a .


, ,

criação dum a igr ej a lu s itan a autón om a ad equada ,

à n atur eza particular d a r eligi osidad e portugu e sa ,

q u e p or
,
saudosa s e ri a a o m e sm o t e m
,
po pagã e

cristã vist o a saudad e c ont er um el em ento cri stã o


— a l e mbrança — e um e l e m ent o pagã o — o d e s ejo
,

Pr econ iz ou u m E stad o p ortuguê s c on stituído por


três f a m í l i a s — a rural a urban a ( burgu esa ) e a
« ii

o p e rári a — q u e t eri am os s e us r e pr e s e n tan t e s e l e i


,

tos A famíl i a rural p ert e n c eri a o cul t o d a tradiç ã o


. «

h istóri ca l it erária artíst ica e r eligiosa firm ando


, , ,

as pri mordiai s qual idad e s da R aça q u e el a d ef en ,

d eria das e stran h as i nfluên cias fàcilm en t e r ec ebid as


p elas p opulaçõ e s urb an as ( A r t e d e S e r P o r t ug u ês »
,

ed p .
,
A fam í li a urban a r e pr es en ta j á um a
. «

força d e transform açã o r e v oluci on ária q ue a fa m i , ,

l i a op e r á r i a ( t e rc e ir o e stad o ) e n carn a v erdad e ira


m ent e » Pascoa e s a dvog ou ai nda um a orga
nizaç ão m un ici pal i sta : Os Mun icípios d e v e m s er 0 «

ponto d e c on tact o entr e a Famíl i a e a P átria dim a ,

nan do o E st a do d ir ectam e nt e d aqu e l e s s em os t erri ,

v ei s i nt erm ed iári os q u e têm o n om e d e partidos ,

facçõe s cl i ent e las et c ( i bi d pp 5 9


, , N a fas e
. » .
, .

d e m e n tor da R en asc e nça Portugu esa « com o s e » ,

vê , Pascoa e s o con t em pl ativo 0 son h ad or arvo


, , ,

r ou s e e m doutrin ário voltad o para a acção


-
Mas .

n ão er a re alm en t e f e it o para e stas l id es ; e o c erto é


q ue a pur eza d a sua p oe sia algo s ofr e u com a i n t er
f er ên c i a do saudosi sm o e n quanto s ist em a d e id e i as .

53
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

O SE N TI D O H UMA N O

Q ui s e ra a rd e r e m l ouco s e nt i men t o
P ara a q ue ce r os n u s e os d es gra ça d os .

S er u m l ua r d e v a g a e n ca n t a me n t o
E a l u m i a r os tra n s v i ad os .

(V r P b X X X III )
e s os o r es ,

Na con c e pção d e Pascoa e s a p oesia l ogo 0 p en sa , ,

m e nto po ético in clui um s en tido local n aci on al


, , ,

e um s e ntid o un iv ersal A po e si a t end e a un ir tod os


.

os hom e n s por l aç os d e frat ern id ad e ; o po eta sup e


rior i st o é r eligi oso pr ega a h arm on ia e o amor
, , , .

« A cim a d a po e sia amorosa e patriótica a p oe sia ,

r el igi osa cri a a un idad e das Pátrias e m D eus a sua ,

con c ord ân ci a frat ern a num id e al cada vez mai s b el o


e pe r f e ito ( O s P oe t a s L u s í a d a s p
» A té a , .

« fil os ofia d a S aud ad e d e stin ando s e prim ord ial


»
,
-

m e nt e a os P ortu g ue s e s t e m u m al can c e un ive r ,

sal e op erad o p el a S audad e O R en asc i m e n t o na


, ,

c ion al e st e R e n asc im e nt o crê Pasc oa e s ilum inará


, , ,

0 mund o in t e iro : o gén io português a c e nd e rá


« so ,

b r e a t e rra um a Vid a n ova


, ( 0 G ên i o P o r t ug uês » ,

p .

Por t em p eram en to ou vocaçã o Pasc oa e s é muit o ,

m ai s um s ol itário q ue um h om e m c onvive nt e P r e .

f er e a com pan h ia d as árvor e s e das s om bras : Para «

q u e f oi S e n h or q ue a o m un d o v i m
, , Se e u n asci ,

para am ar un icam ent e A mais s eq ui n h a flor do


m eu j ard i m E o bailado d as s ombras n o poe nt e ? ,
»

( n t os I n d ec i s os X XI I I ) C omo o doid o v e nto


C a , . « »
,

o s eu c oraçã o só am a o q ue h á d e vi r e o q ue pas
« -

sou I bi d X X I V ) ; à pr es ença ant epõ e a ausência


» .
,
.

R econ h e c e com p en a q ue l h e falta cal or humano ,

capacidad e de e n tr ega : O am or à sol id ão é anti «

54
O B R A S C O M P L E T A S

-
hum an o Mas ai de nós q ue viv e m os n a sol id ã o
.
, , ,

como a s voz e s s e ouv e m n o silên cio ( O Hom em »

Un i ver s a l p 1 37 ) T e m d e ob e d ec e r à l e i do h om e m
, .

sup eri or an arqui sta ou anti s ocial por n atur eza :


,
« » -

« C ad a h om e m m oral m e n t e é u n o e abs oluto ; m as


, ,

t em d e c on viv e r d e at e n uar a sua p ers on al idad e


,

A con vi vência só é p ossív e l e n tr e p e ss oas r e du


zi da s a um a pr e s e nça n egativa ou oc a q ue c ed a ,

c on stant e m e nt e D aí o vazi o da s oci edad e i m e n s o


.
, ,

fantasm a c om po st o d e i n úm e r os d efunt os Um .

h om e m sup eri or é an ti s oc ial ou crim i n os o O s eu -


.

d estin o é o cárc e r e e o d e s ert o ( I bi d p » .


, .

N ão d i ss era H eg e l q ue cad a c on sc iênci a ambic ion a


a m ort e do ou t r o ? E g ocên tric o Pasc oa e s f echou s e ,
-

n a t ebaid a d e G a t ão e só d e t em p os a t e m pos d es
,

ce u às gran d e s urb e s .

T odavi a o l ad o cri stã o e até fran ciscan o d a sua


, , ,

d el icad a s e n sibi l id ad e l eva o a in t er essar s e p e l as - -

dor es e i njust iças d o m und o Se virm os b em h á .


,

um a c on stan t e soci al n a sua obra — e e st e é um


asp ecto q ue in ci pi ent e j á n os prim e ir os v ersos
, ,

gan h a r e l e vo e m J es u s e P ã S in to a c ó l era «

id eal d os gran d e s in dign ados E um cl arã o d e fur o r


s obr e os m eus ol hos t orv os ! A os m e us ouvidos
vêm grit os d e d es e sp er o E a Justiça a gritar , ,

so zi n h a por m i m passa ! ( pp 30
,
E sta fac eta » .

social t orn a s e a prin cipal c aract erística d e P a r a a


-

L uz o q u e pr ováv e lm e nt e s e d e v e a o fact o

d e Pascoa e s e scr ev e r s ob a i m pr e ssã o r ec e nt e d o


suicíd io d o i rm ã o A n t ô n i o q ue s e j ulg ou p ers eguid o ,

por d efen d er i d ei as avançadas J á n ão s e trata a pe .

n as d e afirm açõ es ab stractas m as ant e s n o P a r a a , ,

L uz d e quadr o s e sb oços p e rfi s q u e n os apr e s e n


, , ,

tam con cr etam en t e as vítim as d a i njustiça social


M e n diga «A F ábrica Um a Som
»
,
« »
,
«

A atm osfera é d e m i séria citadin a b aça con , ,

55
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

f r a n g e dor a O t om faz n os
.
-
l embrar A A l m a N ova
d e G ui lh erm e d e A z e v ed o :

A m i n ha M us a a g o ra é s o m b r i a m u l h e r ,
Q ue, fa m i n t a e d es c a l ça , e u vej o em q u a l q u er p a r te .

Q ue ro en con t r a r n a n o i t e a l uz do a l v o r e'ce r
E n u n s fa r r a p os d e m e n d i g o u m a o b r a d a r t e .

C ontud o a cada pass o


,
princi palm en t e n a s e
, e

gunda part e d a c ol e ctân e a abr e cam in h o a t en dên ,

cia do po eta para e sfum ar o c on cr e to associar a ,

figura hum an a a os e l e m ent o s d a Natur eza d iluir a ,

ind ign aç ã o e m s on h o e ê xtas e N os l ábi o s d e ssa


-
.

Musa ouv e s e o m urm úri o d as f ont e s e a voz d o


-

S et e E s tr e l o D e p oi s d e a e n co ntrar o p oeta evo


-
.
,

l a s e m isticam ent e n as alturas : T od o o m eu c orpo


-
, ,
«

fog e e m fum o p el o e spaç o


, ,
T oda a m in h alm a ,
'

eu v ej o a d e sfaz e r s e e m luz ! (p
-
A v ocaçã o » .

m ística d e Pasc oae s o s eu o ptim is m o m etafísic o ,

acaba m por l e var a m el h or : Q u e eu viva n o A b s o «

lut o e n o q ue n ão t em fim ! ( p Um n ovo » . «

A p ol o vai t ocar a n ova E n a águ a q u e s e


b eb e e n o ar q ue s e r e spira Nas nuv en s ond e d orm e ,

a cl ara luz d os C éus Palpita um n ovo am or m ur


, ,

m ura um nov o ( p A vida é um a . «

h ar m on i a abs oluta i nfin ita S ão o h om em e a


, ,

p ed r a 0 m e sm o cant o e tér eo ( p E a cidad e .


,

c om a urgênci a d os s eus pr o bl e m as e sbat e s e n a ,


-

d istân cia .

N ão vol ta a e n c on trar — s e n outros l ivr os o ódio «

r ed e n t or q ue l at ej a e m P a r a a L uz E n contra s e
» .
-
,

p oré m um a si m pati a un i v ersal um am or q ue s e


, ,

e st e nd e frat e rn o a t odas as criatu r a s


, ,
abraçand o os ,

p obr e s e os t r i s t e s d o m e sm o m od o q ue as árv or es ,

a s p edras hum i ld es e a s e str elas A m or d e n atu .

r eza r eligiosa rad icado num profundo r esp e ito


,

56
O B R A S C O M P L E T A S

p el o m istéri o de tod as as alm as P erpassam v ul .

t os d e cam pon e s e s : G e n t e d a m in h a ald e ia n o tra «


,

Magr os vultos curvad os s obr e a


( S em p r e pp 2 0 ,
Vult os d e e m igrant es tr on
.
,
«

cos d es a r r a i g a d os p e lo v e n to Vult o s d e m en dig os : » .

« O v e lh o o órfã o a , Magros p e rfis d e


,

d or à fom e e à chuva
,
S obr e a t erra m orta ,
»

(p . A Pr e c e d a Vi d a E t é r e a é um r e pe tid o
« »

ap el o a o am or : A lm a s gém eas d a m in h a am a i as «
,

crian cin h a s Nas ruas a e sm olar e n f ez a d i n h a s


, , .

A lmas gém eas d a m in h a e n tra i com tod o o ,

amor Nos n egr os an tr o s trágic os da d or I dên . »

tic os m otiv os in spiram outras p oe si as E n os e scri .


,

t os e m prosa d a úl tim a fas e os princípi o s d e justiça , ,

im p eri os os c om o ditam e s q ue s ão d a c on sciênci a ,

adquir e m e xpr e ss ã o in ci s iva : P ão e l ib e rdad e ! «

Quand o V oltair e bapti zou e m Pari s um fil h o de , ,

Fran k l in pous ou a m ão d ir e ita n a cab eça d o rapaz


, ,

e di ss e : G od a n d l i be r t y E squ e c eu s e d o pão E f oi .
-
.

o e rr o d a R e v oluç ã o fran c e sa e ss e e rro d e q ue sofr e ,

ainda a Hum an idad e ( D u a s Con fer ên ci a s em d efes a »

da P a z p , C om par e c e n o p oe t a a con sciên ci a


.

d os t oi ev s k i a n a d e q u e cada u m é s ol idári o com t odos


e r e sp on sáv e l p e los d e m ai s : Ofend e r um hom e m é «

of en d e r a Hum an id ad e B asta a m i séri a dum d es .

g r a ça d o para q u e todos n ó s s ej amos m i s e ráv e i s »

( G u er r a J u n q u ei r o p Mai s um a v ez agora n o,
.
,

t err en o pol ítico Pasc oa e s t e nta a sínt e s e dos an ta


,

g on i s mos : Ser a n a r c o comun ista ou c ri stão pagão


« - -

é d efen d e r a j ustiça e spiritual e a ec onóm ica o d i ,

r eito à l ib erd ad e d e p e n sar em voz al ta e ao pão


nosso d e c a da d i a ( A M i n ha C a r t i l ha p
'

» .
,

« Vivam os e nfim n o F a ça s e a l uz ! e no A m a i vos


, ,
- -

u n s a os ou t r os ! Faça s e a luz é o grito d o an ar -

qui sta A m ai vos un s a os outr os é o d os c omun i s


.
-

tas ( p
» . O pe n sador m an tém s e fi el a o po eta -

porqu e a m en sag e m d e st e com o el e a con c eb e e , ,

um ap elo à frat ern id ad e à un i ão d e t odos para o ,

57
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

be m para a vida d o e S pi r i t o O r feu t ocan d o a


e . «
,

l ira am an sava as fe ras Q ue a d ivin a Harm on ia


,
.

an i m e a s almas q ue pr e sid e m a o d e stin o d os P ov os ,

e todas as alm as para q ue t odas s e r ec on h eçam


,

c om o irm ãs ( G u e r r a J un q ue i r o p
» ,
.

4 E S TE TI CA D : ! P OE SI A

O s ol n ão v ê a l uz ,

E ã ab
n o s q ue t e m pe f u me o v i o e
e r l ta .

E a im
, ss co mo o S e n h o n ã o con h ec eu r a c r uz
I g ra t no r
n e d e v e s os e o poe a t
( C on t os I n d ec i s os , I I )

A e stética Pasc oa e s d ec orr e d o culto do v i vo


de ,

s i n ô n i m o d o criad or do e sp ontân eo q ue e stá n o , ,

c e rn e d a sua m e tafísica E a e st ética r om ântica do .

po eta in spirad o q u e p oss e ss o d o d ivin o n ão pr e ci sa


, ,

d e buscar palavras p orqu e e l as v êm a o s eu e nc on ,

t r o N O s P oe t a s L u s í a d a s a o d iss ertar s obr e poe


'
.
,

si a culta e po e si a e sp on tân ea d á cl ar o e stá a pr e , , ,

c e dên ci a a e sta últim a : A o l ad o da po esia «

e sp on tân e a e im p e rf e ita apar ec e a po e si a culta e ,

p e r fe ita opond o o e quilíbri o e státic o d as suas formas


,

à fuga d es ord en ada e cri ado r a d a v erd ad e ira in spira


ç ão q u e é u m a f orça d a Natur e z a vi sando um fi m
, ,

sobr e n atural ( p S egund o e st e pri sm a o p oem a


» .
,

é um dom ; 0 aut or um a e spéci e d e m ed i u m q ue , ,

e scr e v e sob d itad o ao s opr o d e D eus e m com u


,
« »
,

n h ão com 0 T odo un iv ersal ; n ão ob ed e c e a l e i s e xt er

nas ,p r é e stab el ecida s é o q ue t em para d iz er q ue


-
,

d et er m in a a for m a ad e quada : A em oçã o p oética ao «


,

c on d e n sar s e e m c o r p o v erbal e l a própri a o afeiç oa e


-
,

l h e i m pri m e a m e did a e o r i tm o A id e i a e a palavra .

n asc em d o e s pírit o do P oeta num m e smo j act o em ,

58
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

s eria trabal hada n ão d e fora para d en tr o m as in t e


, ,

r i or m e n t e até s e atingir p el os m e i o s m ais sim pl e s


,

a mai s fort e e xpr e ssividad e : A alm a d ev e apar ec e r «


,

n a obra d e art e s em in t erm ed iá r ios n e m d isfarc e s


, ,

e diz e r s o m en t e e stas p e qu e na s fras e s e m q u e e l a s e

cond en sa N ão m e r efir o à lógica a o n úm er o à


.
, ,

m ed ida a os m ol d e s cl á s sicos ; m as a o própri o e spi


,

rit o i nt en sifican d o s e até c onqui star a m á xi m a vid a


-

d entro d o m en or corp o — a form a ac e sa e cri stal in a »

( Ve r bo E s c u r o p Se a p oe si a d o aut or d A s
'
.
,

S om b r a s n ão rar o s e apr e s en ta brumosa ind eci sa o , ,

facto d ev e s e à índ ol e n octurn a da i n s piraçã o q u e


-
,

n ão a o m od o d e c o m un icar i s en t o e m grand e part e , , ,

d as subt il ezas da e sc ola simb ol ista .

P or 1 9 1 2 quand o j á pub l i c a r á um a d e z e n a d e
,

l ivr os d e p oe sia c om eç ou T d e Pasc oa e s a acal e ntar


,
.

o pr oj ect o d e r efund ir a sua obra frut o mu itas , ,

v ez e s dum a e sp ontan e idad e n ão vigiada A con s c i ên


, .

ci a d e sofr e r d e p ouca art e ( para usarmos a


« »

e xpr e ssã o d e F e rn an d o P e ss oa ) m an if esta s e por -


,

e x e m pl o n a carta a B oavida Portugal d e S et embr o


,

d ess e a n o : O meu p en s a m en t o p oé t i co d e s en vol


«

v en s e e m m i m c om tal rapid e z q u e
-
para n ão l h e ,

ficar atrás tiv e de o e xt eriorizar em l ivr os e scritos


,

à pr es s a C om pr een d e s e p ortan to a n ec e ssidad e d e


.
-
, ,

c orrigir e ap erfeiç oar a m in h a ( I n q ué r i to


L i t er á r i o p , N o a n o s eguint e comun icava a
.
,

Un amuno : E u and o ag ora a r efaz er a m in h a obra


«

q ue f oi e scrita à pr e ssa D e r e st o ag ora si n to me


-
.
,

s en h or d a m in ha e xpr ess ã o D esn e c e ssário s eria . » ,

portant o q ue L eon ard o C oimbra e m 1 9 1 7 l h e


, , ,

r ecom en dass e a r evisã o d os l ivr os d e p oe si a em


n ovas e diçõ e s r e visão al i ás fáci l — acr e sc e ntava
,
«

p ois a B el eza e stá atingida e r ev el ada h á talv ez só ,

r e p etiç ã o e pr ol i x i d a d e a suprim ir ( carta in éd ita ) » .

N e ssa d ata j á Pascoa e s m et era ombr os à gran d e


,

tar efa E m 1 9 1 5 d era a lum e a


. e d ição do S em
,

pr e r efaz en do por com pl e t o a


, e dição d e 1 9 0 2 e , ,

60
O B R A S C O M P L E T A S

e m 191 7 publ icou em e d ição também tota l m e n t e ,

r efundida a col e ctân e a Te r r a P r oi bi d a T rata s e


, .
-
,

práticam en t e d e obras n ovas e mbora p ersistam os


, ,

t em as a atm osfera afectiva e as trav es m e stras d o


,

p en sam en t o poétic o São e m n ú m e r o m uito r eduzido .

as c om p osiçõ es i n s ertas n a 1 e d içã o d e qualqu e r .


ª

d e ssas c ol ectân e as q ue s e con s ervam emb ora m od i ,

ficadas n a ed iç ã o d efin it iva


,
.

P ortant o s e Pascoa e s n a prim e ira fas e d a sua


, ,

carr ei ra d e p oeta c om efe it o s eguiu um a e stética


,

d e e spon tan e idad e v e i o a r econ h e c er os pr ejuízos


,

q u e daí r e sultaram e d e cid iu l an çar s e e m r e p e tidas -


,

r efun diçõ e s a n ec e ssári a l uta p el a e xpr e ssão


,
« » .

E q u e n em s em pr e as palavra s q ue vêm so l ícitas , ,

a o e ncontro d o po e ta d iz e m fi el m e n t e o q u e pa l pita

n a sua al m a Mai s um a v ez a r eal idad e s e apr es e nta


.

dúplic e S erã o as pal avras d ivin as p orqu e o Ve rbo


.
,
«

é D eus ( G u er r a J u n q u ei r o p
» S erá o n om e , .

dum s er o próprio s er m iracul osam en t e t r a n s f un


«

did o para son ora i m ag em cri stal i n a ( R eg r es s o a o »

P a ra í s o p , Ou t amb ém as pal avras atraiçoam


.
,

como Pascoa e s d es en gan ado par ec e r econ h e c er ?


, ,

« E xprim im os o q u e i m ag i n am os p en sar i sto é o q ue , ,

p ensam o s fal an d o n ão o q ue pe n samos em silên cio


, .

Mas n ão e xprim imos o n oss o p e n sam ent o v e rda


d eiro e ss e q ue n os f og e d as pal avras e s e p erd e n o
,

infin ito d a n ossa int im idad e ( O Hom em Un i ver s a l » ,

p .

CR I TÉ R I O D A P R E S E N TE E DI ! Ã O (E , A P R OP Ó
s zr o : os

E sta
diç ão corre spon d e ao propó sito d e torn a r
e

ac essív el n um cor p us ú n i co a obra poét i ca d e Ter


, ,

x ei r a de Pascoa e s A p en as f i cam e xc l uídos o l i vro d e


.

61
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

e stre ia E m br i õ es q ue e scrito n os v erd e s an os o


, , , ,

aut or com b on s m otivos r e pud i ou e a sua c ol abora


a — P or do i s
,

ç ã o e m P r of e c i P oe t a s pan
fl e t o em v e rs o c ontra a I nglat e rra saíd o anón im o ,

m as d e vid o à s p en as d e Pasc oa e s e d e A fon s o Lo p es


Vi e ira F oram também e l i m i nadas c om po siçõe s poé
.

ticas dadas a lum e e m A F l or do Tâ m eg a a partir ,

d e 1 89 5 .

F oi , c om efe it o , n e ss e j ornal d e A maran t e ( n 4 37 ,


º
.

A n o I X , d e 2 1 d e A bri l d e 1 8 9 5 ) q ue o po e ta v i u
e m l etra r edonda os s eu s prim e i r os v ers os L ê —
s e aí .
,

n a s ecçã o R ug e R ug e : T en h am paciên cia srs


« -
» «
,
.

incógn it o s por n em s em pr e p od e r em s er o uvid os


, , , .

A grad e c e m os a sua ocul ta vi sita q ue mu it o n os t em


auxil iad o m as só d ep ois de aval ia r m os as a pr ox i
,

m açõ e s d a v erd ad e é q ue as faz emos rugir D e stas .


,

r ec eb em os um m im o dum m od e stí s si m o a c a d êmi co


d o n oss o L ic eu um a e sp e rança d a n ossa qu e rida
,

A m aran t e E i l o :
.
-

F U UR OT S PES
( Ao A RTI S T A
J os é C O EL H O n os S A NT O S )

E x i s t e a i n d a u ma L uz c á n es t e m u n d o,
N es t e p â n t a n o es cu r o, es v er d ea da ,
N es t e oc ea n o d e d o r q u e n ão t em f un do .

N es t a r a i v a f e r oz d u m con d en a d o,
N es t a l á g r i m a i n fe l i z q u e o bom J es u s
D e r r a m ou l á n o c é u , ,

D e i x a n d o o a s s i m c a i r , como u ma l a n ça
-

D u m s ol d a d o q u e ex p i r a m or i bu n d o
N o es p a ço i n f i n i t o d a es per a n ça .

62
O B R A S C O M P L E T A S

N es t e m on t u r o t e t r i co e m e d on ho
'

N es t e en or m e cov i l d hi poc r i s w
'

O n d e a v e r d a d e ex i s t e com o u m

N es t e t úm u l o t r i s t e e s a n g u i n á r i o ,

O n d e r e be n t a a f l o r d a p od r i d ão ,

O n d e c a mi n h a o « ví c i o

E s s a L uz q u e i l u m i n a a s ol i d ã o ,

E s s e fa c ho r ep l e t o d es pl en d or ,
'

E s s a fog u e i r a en or m e d u m vu l cão

E q ue ,
h o r a e m es m o n um m om en t o,
num a

A Ve r d a d e e 0 B e l o e a A l eg r i a ,
E x p i r a m s em um ú n i co l m t o
a e n !

T EI X EIR A DE P A SCO A E S

C om o r e c eb emos m ais duas vi s itas i n titulad as


P e r fi s l oca i s — q u i n t i l ha s t oa d e scr ev en d o com ,

graça e v erdad e algun s c aval h e ir os q u e m er ec e m a


e stim a ( s e é q u e s ão os q ue nós d e cifrámos ) C on .

tin n e q ue t em o s a h on ra d e os r e c eb er de l uva e
,

gravata n o fech o d e sta s e cçã o


,
. »

E sta c om p osição b astan t e fr ouxa c om o s e vê e


, , ,

r e passada dum p essi m i s m o conv en cion al q ue é um a ,

das m arcas d a prim e ira fas e d o p oeta s eri a incluída ,

n os E m br i õ es O n om e l it erári o — T e i xe ira d e
.

P a s coa es — estava ach ad o E ntr e tanto A F l or d o .


,

Tâ m eg a iri a publ ican d o e m suc e ssiv o s n úm e r o s


, ,

al ém d os tai s P e rfi s l oca i s ( v ers os d e g a z et i l h a b em ,

hum orados d e caricatura am áv e l ) algum as outras


, ,

c omp osiçõ es c om o A M ort e d o R ud e Pr ol e tári o


,
«

O C air da N oit e q ue fi co u i nc om pl eta e Co nfi s


»
, ,
«

s ão» s on e to e pigram átic o d irigido a o Papa ( n 4 4 7


, .
º'

e No n 4 5 8 d e 1 5 d e Se t e mbro d e 1 8 9 5 o
.
º
, ,

r edact or de R ug e R ug e anun cia para br e v e a


« -
»

63
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

pub l icação d e E m br i ões de T e i x e ira d e Pasc oa e s ,

«
q u e h á c e rca d u m a n o s e t e m apl icad o a o e stud o d a

poe sia m os t r and o t er c ent el h a p oética i n spirado um


, ,

p ouc o n a e s c ol a r e al ista A p oe si a A F M » . « . . n
,

i n s erta n o n 4 6 4 de 2 7 de Outubr o e xprim e o


.
º
, ,

d e s e sp ero d o aut or r ecém ch egad o a C oi m bra por


,
-
,

e star l ong e d a mul h e r am ada : E «

p e l a noit e L on g e d o m urmúri o
d um a fon t e pura A m atar cá d e ntr o um ch orar
, , ,

s e m fim ! »O n 4 7 1 d e 1 5 de D e z em bro c ontém


.
º
, ,

um po e ma e m pr osa — F r a s es B í bl i c a s ( a o meu «

A lb e rt o C astro ) por T e i x eira d e P a s c oa es


» datado
d e C oimbra 5 1 2 9 5 e tran scrit o dum j ornal c on i m
,
- -
,

b r i g en s e T rata s e d e i mitação joc osa d a e sc ol a e st e


-

t i ci s t a—
.

d ecad en ti sta q ue s e f orm ara em t orn o d e


E ugén io d e C astro : T u Flor id eal és o Ét e r «
, ,

d ivi n o q ue ench e o vácu o ond e agon i z a o m eu C ora


ç ão C adáv e r ! É s a força q u e im p e l e e st e d efunt o
-
,

c om o a e l e ctricidad e a c oxa dum a Os t e us


d oi s Ol hos — dois farrapos d A z ul pingados d e '

R osa e C rav o — s ão o Ori ent e f el iz ond e v a i n as


,

c en do o Sol da m in h a E sp erança e t c Fi n alm e nt e .


,

o n 4 7 3 d A F l or d o T â m eg a d e 2 9 d e D ez e mbro
.
º '
, ,

traz um l ongo artigo n ão assin ad o de crítica às , ,

p oesias d e E m br i õ es S e gundo o c rítico Pascoa e s .


,

p ert e n c e ao n ú m ero dos p oetas q u e só ating em a


b el eza num e stado d e tran s e c om a alm a agitada
'

«
,

por um a vi ol e n ta e moção q ue d e sp ert e vivam e n t e as


faculd ad es sup erior e s P oetas q ue criam dum j act o » . .

« D o subl im e a o grot e sco vai só um pass o E i s o .

inc onv en i en t e supr e m o d e sta form a d e e spírit o a ,

ún ica v erdad e iram e nt e g en ial e criadora E após . »


,

e num e rar d ef e it os d e sculpáv e i s n um l ivro d e e str e ia


, ,

c om o algun s v e rs os m en os trabal had os


« c ert os », «

e pít e t os p ouc o próp r i os al gumas i mag e n s i n con »


,
«

g r uen t e s » o articuli sta t e rm in a por um e logi o d e


,

conjunt o q ue en vo lv e um a d e scriçã o sum ária d e


,

E m b r i õ es : N ão c ar e c e o l e it or d o pr egã o d a crítica
«

04
O B R A S C O M P L E T A S

pa n eg í r i c a para s en tir o suaví s si m o ar om a d as b ucó


l i c a s e spirai s q u e s e e v ol a m das suas A UR O R A S ; para
d escobrir o d e licad o s en tim e nt o r epassad o d e sau ,

d ad e s c ortad o d e d esfal ecim en t os q ue por ej a n as


, ,

suas M ELAN C O L I AS ; para s e c o m ov e r p e r ant e a t or


tura m oral dum a al m a batid a p el as incl em en t e s raj a
das d a D úvida n as IN C ER TE Z AS e m p olgad a p el a
, ,

garra adun ca d a D e scr e nça n a P ÁS C O A e n os B S C O M


BR O S N ão h á c oraçã o d e h om e m h on e st o q ue n ão
.

r ep ercuta un í s s on o o brad o d e sin c e ra ind ign açã o


, , ,

q u e o p oe ta l e vanta n a ENJ E I TADA c o nt r a o d e sam ,

paro das crianças ou q ue ach e i m er eci das as pun ,

g ent es iron ias c om q ue castiga a falta d e caridad e


dos E g oístas . »

A prim e ira c om p osiçã o d e E m br i õ es ( P ort o T i po ,

grafi a I ndustrial 1 8 9 5 ; n om e c om pl e to d o autor :


,

J oaquim P T e i x ei ra d e Pasc oa es V ) i n titul a s e


. .
-

« E ras d o Passado ; s ão j á m em órias d a i nfân ci a d os


»
,

t em pos em q u e a s e cul ar cri ada l h e contava h i s t ó


« »

rias d e m on stros e fan tasm as e em q ue o autor ,

brincava p elas estradas m un id o dum bacam art e ,

« feito d e can a e pau E à p oe si a d a i nfân ci a pr e n » .

d e s e o am or d a t erra m ãe d e sc obrin do s e por outro


- -
,
-
,

l ad o o g osto d e m ed itar absorto n a sol id ão d a


, ,
« »
,

noit e — tud o t e mas j á caract e rístic os d o autor .

Se Pasc oae s e m fas e p ost eri or pr ocurava d es


, ,

t r ui r todos os e x e m pl ar e s d e E m br i õ es n ão d e s e ,

j ava tamb ém q u e s e d ivulgass e o fact o d e t er col a


borad o c om L ºpes Vi e ira n o opúscul o P r ofeci a ata ,

q ue viol en t o à I n gl at erra por ocasi ã o d a gu e rra dos


B oers S egundo c on ta Á lvar o B ord alo ( i n A d ita
. «

m ento a um a fi c ha bi bl i og r á fi ca G a z et a M u s i ca l e »

d e t od a s a s A r t es a n o I X 2 s eri e n 99 Jun h o
, , .
ª
,
.
º
,

de Pasco a e s p e diu — l h e q u e n ão r e v e l ass e o


« crim e c om e tid o n a j u v e n tud e e por iss o a e spéci e
»
,

n ão v e i o ci tad a n a r e f e r ida f i c h a bi b l i o r á f i c a C or
g . «

r espon d e nd o a um i m pul s o d e m om en t o e t r aduzin d o


uma r e acçã o q u e t in h a m u i t o d e e m ot iv o o s n oss os ,

65
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

d o is j ove n s p oetas — e scr e v e n e ss e A d itam e n t o « »

Á lvar o B ordal o pr eci pitam s e n a c onfe cçã o d a obra -

e,
acto c ontínu o n a s ua im pr essã o m a s uma vez
, , ,

c on cluíd o o trabal h o d a ti p ografia r ec on sid erand o , ,

s e n ão n a atitud e d e r e v olta c on tra o viol e nto e

i nj ust o agr e ss or dum p ov o pacífic o p e l o m e n os n o ,

d e sm ed id o duma e xp r e ssã o e xc e s s ivam e nt e h ip er


bô l i c a e a q u e i nclusivam e n t e faltaria por v e z e s
, , , ,

o ti m br e d o v e rdad e i r o m e tal r e s olv e r a m n ão l ançar


,

n o m e rcad o n e m d e qualqu e r m an e ira pôr a cir


,

cul ar a obra r e cém im p r e s s a N o q ue t oca a Pasc oa es


-
.
,

e sta r e s oluçã o f o i qua s e r ig orosam e nt e m ant ida ; com

r e sp e it o a A fon s o L ºpes Vi e ira ignoro — o mas s e , , ,

e l e d ist r ibuiu algun s e x e m pl ar e s d ev e m t er sido ,

p ouquíssim os dada a ign orância p od e diz er s e g eral


, ,
-
,

e m q u e a obra fic ou at é h á p ouc o t e m p o . »

O o púscul o t em d oz e págin as ; n ão traz n em os


n om e s d os aut or e s n em in dicaçõ es d e data e l ocal d e
im pr e ssã o C om pr een d e quatr o po em as : A P r of e
. «

cia »
, A I rland a
« A Í n dia e E pitáfi o q ue s e lê
»
,
« » «

n o túmulo o nd e j az a I ngl at erra P e ns o c om Á lvar o » .


,

B ord al o q u e os m ais vi ol e nt os e d e m ai or rasg o


,

o 2 e o 4 — s e d e v e m atribuir a Pasc oa e s E is um
.
º
.
º
.

tr ech o do últi mo :
Há p
u m s e u l c r o a g o ra en t r e a s on d a s d o ma r ,
O n d e o n a u t a q u e p a s s a es ca r r a
E s t e ep i t á fi o n eg r o a l i for a m g r a va r ,
N um a p ed r a m a l d i t a , os p ovos e a s n a çõ es :

E d e n t r o d es t a i n fa m e s ep u l t u r a ,
j
su a e

Q u e é u m a i l h a a ba n d o na d a s e m n i ng u é m , ,

O n d e r ep o us a o pó d a r a ça m a i s i m p u r a
Q u e , s en d o m e r e t r i z d i z i a q u e e r a
,

Q u e es pa l l za ra n o m u n d o a c i v i l i z a ção,
Q u a n d o e l a s ó r ou bo u, m a t ou i n c e nd i ou ! ,

A q u i fa z a I ng l a t e r r a , e m es t e r co, e m p od r i d ã o, .

Q ue u m r a i o d e v i ng a n ça u m d i a fu l mi no u l
, ,

óó
T E I X E I R A D E P A
.
S C O A E

ain da n a pr e s ent e ediç ão em endas m an uscritas f ei


tas p el o aut or e m e x em plar e s s eus das chamada
«Obras C om pl etas » .

A bibl i ografia ( Obras e e studos d e e s obr e Pas


coa e s ) c on stará d o últim o vol um e d a pr e s e n t e e d i

ç ão .

A n tes t e r m inar e sta I ntr oduçã o qu e r o e x pr i


de ,

m ir O meu viv o agrad eci m en t o à E x Fam íli a .

T e i x e ira d e Pasc oa e s e m e sp ecial à irm ã d o poeta


,

D Mari a da G lóri a T e i x e ira d e Vasc on c e l os d o C ar


.

va l ha l e a o s obrin h o
,
S r J oã o P er e i ra T e i x e ira
, .

Vasc on c el os j á p el as facil idad es q ue m e c onc ed er


,

para a con sul ta d o e spól i o d o e scrit or e uti lização d


e diçõ e s raras j á por algun s d ad os biográfic os q ue
,

g en tilm ent e me comun icaram .

Li s bo a Ja ne ir o
,
de 1 96 5 .

DO PRAD O C O EL HO
TÁ B U A C R ONO L Ó G IC A

18 7 7 Na s c e m A m ara n t e a 2 d e N o v e mb r J oaq ui m P e r e ira


e ,
o,

T i x e ira d e V a s c o n c e l os ( T e i eira d e Pa s c oa e s ) filh o d e


e x ,

Jo ã P er e ira T e i x e ira d e V a s c on c e l o s pr opri e tári o r ural e


o ,

h o m em p ú b l ico A s ua i n fâ n cia v a i d e co rr er n o so lar d e


.

P a s c oa e s ( e m G a t ã a tr ê s q u i l ô met r os d e A m ara n t e )
o, .

1 89 3 — A l un o do lice u de A m ara n t e, es cr e v e os pri m e ir o s


ens ai os lit e rári o s .

1 895 —E m 2 1 d e A bril c ome ça a c olab orar n o j or n al A F l or


,

d o Tâ m e g a c om po e s ia s lírica s e s atírica s P u blica a pri .

m eira c ol ct â n e a d e v e r s os E m b ri õ es ( a n un ciada m A F l or
e , e

d o Tâ m eg a a 1 5 d e S e t e mb r o e criticada e m artig o d o
m es m o j or n al a 2 9 d e D e ze m br o ) V a i para C o i mb ra fr e .

q uen tar o ú lti m o a n o do lic eu M rr e l h e a av ó pat er n a . o -


,

D Mi g ue li n a A m ália
. .

1 896 —Matric u la s e n a Fac u ldad e d e D ir e it o


-
Ser ã o s e us c om .

pa n h e i r os e m C o i m bra Fa us t o G ue d e s T e i x e ira A ug us t o ,

G i l Jo ã o L ú ci o A fon s o L p e s V i e ira Fra n ci s c o d e A ta í d e


, , o ,

Machado d e Fari a e Maia A be l de M e n d on ça Jo ã o D ir ei t o , , ,

et c P ubl ica é cl o ga B e l o ( 1 part e )


. .
ª
.

1 8 9 7 — P ubl ica a écl o ga B e l o ( 2 part e ) .


ª
.

1 898 — A m o r plat ô n ic o p e la pri n cipal i n s pirad ora d e S e m pr e .

P ublica S em pr e ( pri m e ira gra n d e c o l ec tâ n ea e m q ue j á ,

s e afir m a u m a p er s on alidade o rigi n al ) e o poem e t o Á M i


n ha A l m a .

1 899 — P ublica a se g un da gra n d e c ol e ct â n e a T e rra ,


P r oi b ída .

B t t a s an e faci i l t daa na p ar t e l
b i b i og r áf i c a , p e l o l— — l v
t r ab a h o d e A ar o
Bor d a o : l F i cha s o B i bli g ,

r á f i ca s da « G az et a do B i b l i o/i t o» I T eí x eí r a
de P a s c oa es , P o o, 1 9 5 0 rt .

69
T E I X E I R A D E . P A S C O A
xgoo — É tal v e z d es t e a no a Profec i a — P or d ots P oet a s pa n ,

fl e t o q ue s ai u a n ó n i m o , da a ut oria d e Pa s c oa es e d e A fon s o
Lo p es V i e ira .

1 90 1 _ T rmi a e c ur s d D ir it o ( i n f r m açã o fi n a l 1 1 val o


n O o e e o :

r es ; m e r e ci m e n t o lit erári : bo m ) P ub li ca o poe me t o o .

Á V e n t u ra E m J ulh o f az c o m Faria e Maia s e u c om pa


.
, ,

n h e i r o e m C o i m b ra u m a viag e m a os A ç or e s ( S Mig uel )


,
. .

R e gr e s s a a A m ara n t e n d e vai erc er a adv cacia , o ex o .

1 90 2 — P ub lica a 2 .
ª
e diçã o d e S e mp re , m uit o r e fun dida e

a ume n tada .

1 90 3 — P ubl ica J es us plar d es ta obra q ue e Pã . N um e x em ,

p ert e n c e u a o po ta l ê s e a s e g ui n t e n o ta m a n us crita a
e ,
-
,

lápi s Be m s e i q u e os m eu s v e r s s p uca i m pr e s s ã o t ê m
: « o o

ca us ad o até h j e M s p orq ue ve j n e l e s u m rai o d e V er


o . a o

d ad c on ti n uar e i e m b ra e s q u e cid o e s ó i n h
e, c uidar
, o z o,

d ela c m t d o a m o r ( i n édit o ) E m 2 8 d e J un h o O ir m ã o
, o o o » .
,

A n t ó n i t e n d p erdid p e la s eg un da v ez 0 pri m eiro a n o


o, o o

d e D ir e it o O q ue atrib u i a u m a p er s eg uiçã
, p o lítica d o o

pr ofes s or s u icida s e ,
-
.

—P ub lica Pa ra a L u d dicad o à m e m ó ria d ir m ã


1 90 4 z, e o o

A t ó i V i a S ala m a ca n d e trava r la çõ e c m Un
n n o . a n , o e s o a

mu q u l h e é apr
n o, tad po E ugé i d C a s tr
e e s en o r n o e o .

r goó — V a i adv ogar para P rt o n d e abr e e s crit óri o n a o o ,


o

R ua d a s T aipa s T rava r e laçõ es c om Le o n ard .C oi m bra o ,

q ue s e l h e dirig e n a Praça da B atal ha n o P o rt o : V i l og o ,


«

q ue ti n ha A lg u é m dia n t e d e m i m e ficá mo s a m ig os para , ,

s e m pre D á a l ume Vi da E t er ea O ir m ã o Joã o va i para


. » .

a Á f rica P ort ug ue s a o n d e ga n hará fa m a c o mo caçad r d ,


o e

e l e fa n t e s e s ó r e gr e s s ará e m
, 9 25 1 .

1 90 7 — P ublica a e diçã o de As S om b ra s e l og i os a men t e


,

criticada por Un a m u n o q ue ouvira n o , s o lar d e Pa s c oa es ,

da b ca d o p e ta a l e it ura d o origi n al
o o , .

1 908 —Um a ad m irad ra i icia o n co m Pa s coa es l on ga cor r es pon


d ê n cia a m or o a s . Só mu i to s a n os d e p oi s virã o a en c on trar s e - .

1 909 — P a s c 0 a e s p ub lica a da N oi t e i n s pirad o por uma S e n h or


i n gl e s a M a s apai on a —
,

. s e po r o utra i n gl e s a ( L eo n o r D a g g e )
x

q u e e n c on tra n o P o rt o n u m a m rica n o e q u e s e rá a ,
« e » ,

E l o n r d M a râ n us E m fi n s d e 1 909 l e vad o p e l o n o vo
e o e .
,

a m or q ue o d o m i n a o p oe ta d e s l oca s e a L on dr es ,
-
.

70
O B R A S C O M P L E T A S
xoxo —I icia s a p ub lica çã da r vi ta A Á g ui a
n -
e dir c e o e s , so b

ç ão d e Á l var Pi t Pa c a e c la b ra
n s s o n n ú m er o (de
. o o o o o

r d e D e z mb r )
e m c artig O lavrad r s oes c as e ir os ;
o o o « o »

e s cr e v e a Un a m u n a p edir l h e c la bo ração para a n o va o -


o

r e vi s ta C o n trai n e s ta é p oca um a d o e n ça d e i n t e s ti n os q ue
.

o há d e ap oq ue n tar d ura n t e vári s a n o s


.
-
o .

19 1 1 —P a s c j uiz s ub s tit ut o e m A mara n t e P ub l ica Ma â


oa es é . r

n us l n go po e m a i mb ó lic o Te m j á gra n d e pr e s tígi e n tr e


, o s . o

os n o v o s qu v ê e m n e l e u m pr o fe ta E n c o n tra s e n o
,
e « » .
-

P ort o c o m P h il ea s L eb es g ue A 2 7 d e A g s t r e aliza s e . o o, -

n o C h o u pa l d e C o i m b ra u m a r e u n iã o e m q ue participa m
Pa s c o a e s Jai m e C rt e s ã L e on ard o C o i mbra Á l var o Pi n t
,
o o, , o

e A ug u s t o C a s i m ir o ; n e la s e la n ça m a s ba s e s d um a s oci e
dad e c ult ural a R e n a s c e n ç a P ort ug ue s a q ue t e m por
,
« » ,

f i m r e s tit u ir P o rt ugal à c on s ci ê n cia d s s e us val o re s e s pi


« o

rit uai s pr ó pri o s » .

19 r 2 —A 1 d e Ja n e iro s a i o n ú m e r o da s e g un da s éri e da
,

r e vi s ta A Á g ui a t r n ada ó rgã da R en a s c e n ça Po rt u , o o «

g ues a e dirigida por T i e ira d e Pa s c o a e s ( n a part e lit e


» e x

rá i a )
r A n t ó n i o C ar n e iro ( n a part e artí s tica ) e J os é d e
,

Magal hã e s ( n o s e ct r ci en tífi c o ) O n o v m o vi m en t o é al vo o . o

d e crítica s e m r e s p os ta s a o i n q uérit o lit erári o e fe ctivad o


por B o avida P ort ugal n o j r n al R epú b l i ca Pa s c o a e s p u o .

b l i ca O p oe m a al e g ó ric o R e gr es s o a o P ara í s o e O v o l um e
E l eg i a s i n s pirad o p e la m o rt e d um s obri n h
, ai n da cria n ç a o, ,

filh o da ir m ã M i q u el i n a ; o pr od u t o da v en da d e s t e v ol ume
d es ti n a s e à s ub s criçã o n aci on al a favo r d e G o m es Le al
-
.

P ublica ta mb é m a c n f er ê n cia O E s pír i t o L us i t a n o ou o o

S a ud os i s m o i n t e grada n o pla n o d e acçã o c u lt ural da R e


, «

n a s c e n ça P o rt u g u es a » .

1913 —P aba n d on a a carr ei ra j udicial e fi x a s e em


a s c oa es -

G a t ão n o s o lar d e q ue t i r ou o s e u n om e d e p oe ta C h e ga
, .

a faz er di lig ê n cia s para ob t e r c o l oca ção em L i s bo a m a s ,

n ão para adv ogar p orq ue a ex p e ri ê n ci a q ue f ez n ada


,
«

d e u e n ão s a b e n ada d e l e i s
» «
( carta a Á l var o Pi n t o d e »

3 d e D ez e m b r o ) P ub lica O D oi d o e a M or t e e o utra con


.

s a ud os i s ta O G en i o P or t u g u ês na s ua ex pr es
'

f er ê n ci a «

S en ti n d o—
»
,

s ã o f i l os óf i c a poé t i c a e r e l i g i os a
, s e ag ora s e n h o r .

da ex pr es s ã o e m p e n ha s e e m r e fun dir a s ua ob ra q ue foi


,
-
, ,

a pri n cípi o e s crita à pr es s a ( ca rta a Un a m un o ) Na s c e


,
« » .

a s ob ri n ha Maria Jo sé filha d e D M i q uel i n a ,


. .

1914 —P ublica r Ve bo E s cu ro ( r e fl ex õ es afor i s mos ) , e A E ra


L us í ada c f r cia ( on e ê n ) . P o lé m ica n a s co l un a s d e A ui aÁg

71
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

co m A t ó i Sé rgi
n n o o, q ue afa s tará da R e n a s c en ça
se « P or
t ug ue s a » . M rr e o um c un h ad d P e ta o m arid o o o , o de
D . M i q uel i n a .

19 15 — P ub lica a P or t ug u ês e M i s s C a ve ll ( s epa
A te d e r ser

rata d n o Á g uia 2 éri e ) Pr j e c ta n d um a


.
º
48 d e A , .
ª
s . o o

e diçã d e o ra C pl e ta s dá a l um e a 3 e diçã d e
« Ob s om » ,
.
ª
o

S e m pre i n t e ira m e n t e r f u n dida


, e .

1 9 1 6 —P a s co s aba n d n a a dir e cçã o l it erária d e A Á g ui a


ae o .

P ub lica A B e ira ( n um R e l â m pag o) .

19 17 —L di ç ã o d e T e rra P roi b ida i n t e ira m en t e r efun dida


ª
e ,
.

1 9 8 —É
1 ap urad o para o ficial m ilicia no ( carta a Un a mun o

d e 5 d e F e v e r e ir o ) E m J un h o por c on vi t e d e E ugé n i o
.
,

d Or s e m n o m e d o I n s tit u t d e E s t ud i s C atala n s pr o f er e
'
,

e m B arc e l on a n e t e I n s tit u t o c o n fer ê n cia s s obr e a poe s ia


,
s ,

p rt ug ue s a C on vi v e c om F e r n a n d o M a r i s t a n y ( trad ut r d a s
o . o

s ua s p o e s ia s ) C apd e vi lla J ão C r e el l s E n riq ue Jardi


, , o x , ,

A n dré R h od es Pa ul Tur ul l e t c , ,
.

1 9 9 — P ublica
1 s b tít ul O s P oe t a s L us í ada s a s c on fe
, o o o ,

r ê n c i a s pr o f e rida s n o a n o a n t e ri o r e m B arc e l o n a .

1 9 20 — S e g un da s e diçõ e s
ra s M a â n u s e A rt e d e d e A s S om b ,
r

s e r P o rt ug uê s A 1 3 d J ulh o p ublica n o j r n al d e B arc e e o

l n a L a Va n g ua r d i a O artig C arta s d e Po rt ugal —Sa u


.
,

o o «

dad e y q u ij o ti s m o n d e a f ir m a A s a udade é p rt ug ue s a
», o : « o

c m o é gal ega e catalã D á ta m bé m a l um e E l eg i a da


o . »

S o l i dã o .

192 1 — P ub lica
B a i l d ( m mó ria r fl õ ) O C a t os a o e s e e ex es e n
I d in Jai m C rt ã d i id t da R a c ç a
e c s os . e o es o, ss en e « en s en »,

f u da m R a u l Pr ça C â m ara R i a S ara N va
n , co oe n e e s, e o .

A N a T rr ( C r u h a ) i r um caricat u a d P a c a
os e a o n ns e e a r e s o es

p Á l var C b r ir
or m a l g da
o po ta c ui n m é
e e o, co e en : « e o o e
m o i t o fa m iliar n a s t e rra s gal l e ga s , o n d e se lle co n s id e ra
c o mo m es tr e e i r m ao m ao r d e t o do s » .

192 2 — M o rr e a Ja n e ir, pai d e Pa s c oa es J oão P e r e ira


3 de o, o ,

Te i ira d e a c c e l os q ue f oi pr e s ide n te da C â mara


xe V s on ,

M un icipal d Am ara n t e d e p u tad o g v e r n ad or ci vi l d e


e , , o

V i s eu e d Po rto par d o R e i n o Pa s c oa e s pla n e ia vi s itar


o , .

a G aliza e n u m a carta a o p e ta j á No ri ega V ar e la o


, o ,

a n t e vê a r ezar j un t o d t ú m u l o d e R s alia d e C a s tr P a s o o o .

c a e s p ub lica C nf e r ê n c i a e A C ar i da d e ( c n f e r ê n cia s f e i
o o o .

t as a pri m e ira n G ê m i o R cr eati vo d os E m pr egad os d o


, o r e

C m érci d A m ara n t e a s e g un da n t eatro d e M a g a r l d e )


o o e , o r .

72
O B R A S C O M P L E T A S

1 92 3 —P a s c oa es ( e l e it o em 12 de A b ri l ) e O s eu í ti m a mig
n o o

R a u l B ra dã i gr a m n a A cad e m ia d s
n o n n es ss e s a C i ê cia d L i
b oa N . r e s p e ctiv o par e c er s ub s crit por
o o n s ,
o J ú l i D a ta ,

D avid Lo p es e H e n riq ue Lo p es d e M n d o n ça ( r elat or ) e ,

a f ir m a se q u Pa s c a s é d e raça e c e l s a d e p oe ta s q u
-
e o e « x e

t e m c o mo r e m t s a n t e pa s s ad os H e s í od e
o o L ucré ci o e o ,

c u j a s upr e m a r e pr e s en taçã n s a u r ra s d R o m a n ti s m o o, a o o ,

p rv en t ura S h e l l e y V a i a Madrid e m Mai faze r um a


o » .
,
o,

c n fe r ê n cia n a R es id ê n cia d e E s t uda n t e s P ub l ica a


o ed i .

d S e m pr e a d e T e rra Pr o i b i d a a d R e gr es s o ª
ç ã o e 3 , 2 e .
ª
, .

a o Pa ra í s o D á a l um e ta m b é m A N os s a F om e 1 fa s ci
.
, .
º

c ul o d um a p ub lica ç ã o m e n s a l q ue n ão ch e ga a pr s s eg uir o .

1 9 24 —S a E l e i a d o A mo
e m a g r O P ob r e T ol o J es us C i s t o
,
e r

p
e m L i s b oa ( e ç a es cri ta
de c olab ora çã o com R a ul B ra n dã o ,

e ma l e eb r c ida p l p ú l ic
e o b o) .

1 925 — S a em S o n e t os ( c o m pilaçã o d e s o n e t os j á p ublicad o s


em vária s c l ct o e âne a s ) L ond r es o p oe m a dra m átic o D Ca r ,
.

t os e Câ n t i c os . A
p ub lica s e A Un i v e rs i dad e
30 de Ag t os o , -
,

n ú m e r o ú n ic d e h m en ag em a Pa s c o a es o n d e c o labo ra m
o o , ,

e m pr o s a e v e r s o R i b era R o vira F M a r i s t a ny Ph i lea s


, , .
,

Le b es g ue A V illar P n te Jos é C a s t e llvi Mar eo G ar ea


, . o , , ,

Jai m e C orte s ã o L eo n ard C oi m bra e t c , o ,


.

1 928 —S ai L i r o d e M e mó ri a s
o v .

1 2
9 9 — E m carta R a u l B ra dã i cit a Pa s c a a ac e itar
,
n o n o es o
c vit e q ue l h e dirigir m para vi itar a G aliza E m S et m
on a s . e

bro R a ul B ra dã e A t ó i C ar ir pa m alg um n o n n o ne o s sa

te m p o n o s olar d e Pa s c oa e s — fr e q u en tad o aliá s e m vária s


,

, ,

é p oca s por e s t es e utr o s a m ig os e ad m i rad or es c om o


, o ,

Un a mu n o A Co rr e ia d e O l iv e ira L eon ard o C o i m bra Mári


, .
, , o

B e irã o E ug en i o d Or s N ori ega V ar e la Phil ea s Leb es g ue


,
'
, , ,

A lbe r t T h e le n ( trad u t r par a al e m ã o d e vária s ob ra s d e o

Pa s c oa es ) e t c , .

1 g 3o —A 1 de S t br o
ã o d e h om en ag em a o po e ta n o
e em , s es s
I n s ti t ut o H i s t ó ri c o d o Mi n h o É o rado r L eon ard o C o i m bra . .

E n tr e a a s s i s t ê n cia R a ul B ra n dã o T e l egra ma s d o Mi n i s tr o
, .

da I n s tr uçã o Pr o f C o rd e iro R a m os da R e al A cad em ia


, .
,

G al ega d o S em i n ári d e E s t ud os G al eg os t c
, o , e .

1 931 —P a s c0a es pa s s ar alg un s a n os e m L i s bo a E s tá e m


va i .

c ur s o a p ublicaçã o d a s s ua s Obra s C om pl e ta s d e q ue é « » ,

d ep os itária a L i vraria B ertra n d E m carta d e 1 3 d e F e ve .

r ei r o F P es s oa agrad e c e a Pa s c oa e s a oferta d os s e i s pri


, .

m ei ro s v o l um e s .

73
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

1 9 34— P ubl ica a pri me ira bi ogr afia S ão Pa ul o q ue s e rá tra , ,

d u i d a e m h la n d ê s ( 4 e diçõ e s )
z al e m ã o ( 2 e diçõe s ) e
o ,

h ú n gar o .

1 9 35 Sa i P a i n el .

1 9 36 — S ai S . J e ró n i mo e a T rovoad a , q ue se rá trad uzid o e m


ho la n d ê s e al e m ã o .

1 937 — S ai O H o me m Un i v e rs a l , e m q ue Pa s c oa es c on d ens a
e es clar e ce o s eu p e n s a men t o m e t a fí s i co .

1 940 — No va bi ogr afia Na pol eã o , , q ue se rá trad uzida e m es pa


n ho l e al e m ã o .

194 2 — P a s c oa e s da a l um e O P e n i t e nt e ( s obr e C a m il o ) e
D upl Pa o s s ei o ( r e la t os d e viag e m en tr e m e ad s d e r e fl e , o

x õe s ) .

1 94 5 —N va b i gra f ia0 o ,
Sa n t o A g os t i n h o .

1 949 — P ublica Ve r s os P ob r es .

1 95 o — S a em O E m pec i d o, no v e la , e as c o n fer ê n cia s O D ra ma


J u n q u ei ro e P r ó P a z ( es ta ú lt i m a
] u n q u e i r i a n o, G u e a rr
pr om vida p e la A s s ciaçã F e m i n i n a P ort ug u es a para a
o o o

Paz e pr fe rida n o P ort e m 1 d e J un h o ; p ub licada j un


o o ,

ta m e n t e c om a d e Maria L a m a s e m D ua s con fe r ê n c i a s em ,

d ef es a da pa z ) .

1 95 1 —A Març o o p o vo d e A m ara n t e pr es ta h om en a
31 d e ,

g e m a — h om en ag em a q ue s e a s s o cia m m u i t os
P a s c oa es
e s cri t o r es p o rt ug u e s es I n a ug u ra s e um a e p os içã o b ibli o.
-
x

gráfica e n um s ara u li t erári o e artí s tic I lídi o S ard oe ira


, o,

di s s erta s br e Pa s c oa e s um p oe ta d e s e mpr e A 1 2 d e
o « ,
» .

Mai o h m en ag e m da A cad e m ia d e C o i m b ra c o m d e s c e r
, o ,

ra m e n t e m C i mb ra d u m a lápida N e s a h m en ag em
o, o ,
. s o

i n t e gra s e a p ub licaçã d e A T e i x e ira d e Pa s coa es vo l ume


-
o .
,

o n d e fig ura m p oe m a s d e V i t o ri n o N em é s i o S eb a s tiã o da ,

G a m a S ophia d e M e ll o B r eyn e r A n dr es e n P edr o H omem


, ,

d e M el Jo s é R égi Jos é G me s F err eira A n t ón i o Cor


o, o, o ,

r e ia d e O liv e ira Mári B e irã Mig ue l T orga E ugé n i o d e


, o o, ,

A n drad e Natércia Fr e ir e J org e d e L i m a N ori ega V ar e la


, , , ,

et c . e j u ízo s crític os d e He r n â n i C idad e


, J s é Mari n h o , o ,

S a n t A n a D i n i s i o Jai m e C rt e s ã o J d o Prad o C oe lh o
'
o , o ,
.
,

Joã o d e B arr os e t c Pa s c a es dá a l um e D oi s j or n a l i s ta s
, . o ,

A os E s t u da n t es d e C o i mb ra e C a l vá r i o ( s on e t o i n édit o ) .

74
E L O

[ I .

e d i çã o : 18 96 ]
A os M E U S i m s m oo s r o s s
M ÁRI O N E G R Ã M NTERR S O O O O
A L BER T B A RR S C AS TR
O O O

Em p en h asc os o e s ol itári o mont e ,

A ss e ntad o n o ch ão B e l o e sprai ava


,

A luz d o s eu ol har p e lo hori zont e .

Junto a s eus pés a água murmurava


S uavíss i m o can t o d e bran dura ,

Q u e n os bran cos arr oi os s e e spal h ava .

E ra e st e r egat o fr e scura de
D o tosco mon t e a ún i ca h arm on i a ,

Qual estr ela s ô z m h a em no rt e


, ,

B el o am ava a gran d e m e l odi a


Q ue ac orda a sorr i r quando a alv orad a
, ,

Me r g ul h a em luz a brusca p e n ed i a
- .

E q ue ch oqu e d a luz e st on t eada


o ,

C ontra o mund o pr oduz um s om ,


t ão brand o
Q ue só o ouv e a alm a
V oava m para o céu e m d oc e ban d o , ,

T r i st e s susp i r o s d o s eu p e i t o am an t e ,

Q ue i a m d e l on g e a B e l o i nda ac e nand o
, ,
.

S or r i a e e n t r i st e ci a n um i n stan t e ,

C om o s e l h e t ocass e a o m e sm o t e m p o
, ,

O c r e pú s c
'
lo da tard e e do l evant e .

79
T E I X E I R A D E P A S C O E

Q uantas v ez e s d izia : — A mo 0 t orm e nt o


Ond e a m in h alm a p el o b e m an s ei a
'
,

Num pal pitar e nfraqu e cid o e


G ost o d e v er q uand o
a lu z
Se acas o eu a m o a vast i d ã o do mar ,

E quand o ol h o outr o m ar

T e n h o n a m in ha vida trilhar de
Sendas d es pi n h os q ue n inguém calcava :
'

Q u i m por t a a n oit e s e h e i d e t er luar ?


'
-

B e l o ch orava m uita ch o r ava .

E a o m ol har em pran t o a sua m ão


, ,

F og o vi ol en t o O p ei t o l he e scaldava !
T in h a por c om pan h e i r o um v e lh o c ão
Q ue j am ai s qui s s eu d on o aban d on a r ,

E mbora l h e faltass e o m ag r o pão .

B e l o od iava o mund o c om
E n o s eu l ábi o um ri s o d al egri a
, ,
'

Le mbrava à tard e a luz cr epuscul ar


, , .

Seu c onfid en t e et e rn o , O c ão g em ia
Se V i ss e o a m o acabrun h ad o e tr i st e ,

C omo pál i da fl or ,
ao ca i r do

S agrad o o c om pan h e ir o q u e pe rsist e


E m s egu i r s eu am i g o n a d e sd ita ,

C om o s o r r i s o q ue a um a d or
B e l o ol h ava a abóbada i nfin ita ,

Co
'
o d e s esp er o a ân sia a agon ia
, , ,

De tr i st e n á ufrag o q u e a t e r r a fita !
Julgava s e -
E dia a d ia , ,

O b r i l h o q ue s eu s o lh o s es m altava ,

Qual fum o a o v en t o pa r a o céu ,

80
O
'
B R A S C O M P L E T A S

C om can to azul apasc e n tava


o s eu

Um r eb an ho d e son hos va poro s os


Q ue o s eu m ei g o ol har acal e n tava .

Q ue l i ndos can tos ! S eus l ábi os s e quiosos


Já t
n ão i nh am o V i ço d o

S ua cor fug i a e m son s

D e sd e o t em po d a vida q ue é ri son h o ,

P ercorr e a sol i d ão e os v erd e s prados ,

C omo um pastor d e s t r el a s e d e son h o


'
.

T in h a a id ad e dos jov e n s n am orados ,

Q ue adorn am d os s e us l áb i os a fr e scura
C om pér ol as d os lír i o s orval h ados .

S ua l oira cab e l e ira l i sa e pura ,

E m n i á g a r a s c ai d e s ol d oirado ,

N os s eus ombros qual luz


,
e m sombra e scura .

Usa t ú n ica j á d e pan o


E ajud a o a saltar e ss e s val ados
-

O vigoroso pau d o s eu caj ado .

C om a fac e e os olhos m ar ej ad os
D e doc e s l ágr i m as q ue a o s ol d o amor
Par ec em astr os d e br i l h ar can sados ,

B el o p ercorri a guiad o p el a
, D or ,
O n egr o mun do q ue a os pés calcava ,

E ond e e scarrava tod o o s eu ran cor


N inguém o com pr eend i a n em
E qu em n o am ass e ap e n as um só di a,

E i s o q ue e l e no m un do

A saudad e o al egrava e

É q ue faz a dor e o praze r


e l a ,

C omo a m esm a luz faz a n ort e e 0

81
T E I X E I R A D E P A S C O A E

Q uand o n oj o ol h ava o s eu sofr e r


c om ,

D o l ind o s on h o al u m i ava a i m ag em
C om a luz baça dum susp i r o a

N e sta t em pe stu osa e l onga viage m ,

B e l o V i u O m on t e ond e a s ord ão pran t ei a


C om o qu e m v ê n o céu um a m i rag em !

C om auxíl io da lu z d a lua ch e ia
0 ,

S ub i u d e pr e ssa a en c os ta a o s e u clarã o ,

C om o atraíd o por cant o d e s e r ei a .

D e st e m od o alcançou a sol id ã o
Ond e nós o e nc ontram os a cantar ,

Co o l har a l uz dum a canção


'
o s eu ,
.

B e l o c on sum i a h oras a
T alv ez d al i s eu cant o m ag oad o
A traíss e 0 ét er q u e n os faz
El e qu eri a adorm ec er can sad o ;
T alv e z p ra n ão t orn ar a d e sp ertar
'
,

N e ss e alto mont e dum s on h ar do i rad o


,
.

Q uan d o B el o e stava a m e ditar ,

E m c i m a dum a r ocha e s c a vei r a d a ,

Ouv i u n a ar ei a um lír i o
E a o v er d o l íri o a fac e d e scarnada
, ,

D i ss e : « A tua s ort e fl or é i gual à m i n ha ;


, ,

C antas d e n ort e e c h oras


C om o tu vi v e s flor aqui , ,
s õz i n h a ,

Ma i s bran da e d oc e d o q ue o própr i o arm i n ho ,

N e ssa orfand ad e tr i st e d a v ez m h a '

Q ue noit e à b eira dum cam in ho


vi u , de , ,

N egro ladrão roubar à s e scon d i das , ,

S ua l i nda m ãe q ue l he aqu e c i a o n i n ho !
T E I X E I R A D E P A S C O A S

E j unto ao lago m i l av e s a voar


, , ,

De l indíss i mas cor s v a r i eg a d a s '


,

D e safi avam as N i nfas a cantar . .

E ra a e scolh a das Ni nfas


A v es e fl or s d i sputavam assim
'

A s suas m ei gas e t ern as b em— amadas .

B elo torcia s e n um an si ar s em fi m
-
,

A o v er estátuas d a mor m i st er i osas '


, ,

D esv el ar e m sorr i ndo o s eu m arfi m ;


, ,

A s suas p e rn as n iv eas vaporosas , ,

B raços d e n ev e e lua q ue n um in stant e ,

S um iam s e n as águas e s pum os a s


-
u

T ud o o q ue B el o ol hava er a bri l han t e .

É q ue n os basta D eus um só sorrir , ,

P ra q ue
'
tud o n os t e n h a amor con stan t e !
B elo doirava os l ados do
E n e l e vi a um trono de fulg or ,

A ur eol ad o d es t r el a s a
'

E as Ninfas cob erta s d es pl en d or


,
'
,

C am in h aram p ra B elo ao s om d e cantos


'
, ,

Num e ston t eam ent o de furor !


O pobr e am an t e v en do tai s e ncantos, ,

Ébri o d a mor d e g oz o e d e d el ír i o
'
, ,

S olta n a fac e a água d e s e us


B elo s entiu s e num s egundo
-

E n a g on i a dum e t erno b ei j o
,
'
,

D e ssa agon i a c an ta o s eu
A sombra fal sa e i rón ica do p ejo
D e sfe z —
s e logo n e ss e m ar de gozo
, ,

P erant e o sol t errív el d o D es ejo !


84
O B R A S C O M P L E T A S

B elo achava a l e gre e v e nturoso


-
se ,

Naqu e l e s braços d i d ea l brancura '


,

Quan do sugava e m l ábi o voluptuoso


, ,

E ss e l ico r d e mel e d a m a r g ur a '

Q ue d á m i l V i das q ue só duram h oras ,

Q ue acord a a lua num a n ºi t e


A l uz d oirada suave d as aur oras
e

B el o e as N i nfas l ançaram —
,

s e n a s águas ,

C an tand o a o v en to mi l cançõ e s sonoras !


, ,

O s on h ad or b eb i a as claras águas
D ess e l ago d a mor a s e d es s ên c i a s
' '
,

Ond e l avava as suas fund as m ágoas .

Havi a n o lago m i l f os for e s cên c i a s


Q ue davam ton s e stran h os id eai s , ,

Na s m i m osas e brancas sal i ên cias ,

N ess e s mon t es de m el e d e cri stai s ,

D e su i cíd i os ód i os e V i nganças
, ,

S ob um a n uv em d es q ueCi dos '

A boa alm a cult iva as rosas


E nossas fl or e s m an dam s e em susp i ros -
,

Q ue n el e s v ão as n ossas
B el o s en ti a praz er e s m artíri o s e

Nas prat eadas brum as d o s eu s on h o ,

F e ito d e n uv e n s bran cas e de lír i os .

Uma d a S N i n f a s c om ol h ar ri s on ho
'

, ,

L ançou l h e um b ei j o em brasa en c a n des ce n t e


-
, ,

Que s eu l áb i o torn ou c om o um m edron ho .

E o d es ejo em form a d e s erp ent e


, ,

Tr i turava l h e o pe i to com ardor


-
,

A o s eduz i r a flor m a i s i noc ent e .

85
T E I X E I R A D E P A S C O A E

B e lo ch eirava a rosa do
Ol hou p ra 5 1 e V i u s e todo orn ado
'

,
-

D e l i ndos coraçõ e s f ei tos

No se u p e it o d oent e am ar elad o
, ,

On d e lutaram fur i osos m ar e s ,

Pal p i ta o coraç ão m eio


B el o j ulgou subir ss e s ar e s
por e ,

Num a n uv em d ul císsim a d e luz ,

S oprad a p el a v oz d e m i l can tar es !

Quand o p en sava e star j á c om J esus ,

F e r e l he a V i sta um ra i o al ucin ado :


-

E ra do d i a a i m p ert i n ent e

E str em ec eu lh ou sobr e ssaltado


. o .

E V i u O c ão
q u e a s e us pés d orm ia
Um son o sol to l ev e e ,

T i n h a d orm ido
N isto B el o pe n sava d esp eitad o ,

E a i d ei a do son ho o

B el o doid o ol ha o m on t e e s c a v ei r a d o
, ,
. .

Q ue sur pr e sa s ent iu o son hador ,

A o ver o líri o q ue l h e t e v e amor


B at er as asas para o céu

C oi m br a 2 - ó - oó .
E L O

M edi ta çoes

( 11 P A R T E)

[ l .
ª
e d i çã o : 18 97 ]
A os ME U S A MI O S G

A L BERT E D U A RD P L Á ID
O O C O
C A MI L D A S I L VEIR A
O
J SE COELH
O SA N T S O D os O

B l e o,d ep oi s d e d e s c e r a m on ta n ha e n co n tra — s e n um f or
.

m os o val e V ê a s o v e l ha s q ue e s m alta m a t e z car r e g ada da


.

mo n ta n ha c om o n ac o s mo v e di ços d e p ura n e v e q ue o s ol
,

d um dia ard e n t e é i n ca paz d e d e rr e t e r O c é u az u l e m b ri a


.

g a o O s il ê n ci o al on ga l h e a al m a n uma m e di ta ç ã o i n d e ci sa
- -
.
,

c omo um clarã o a o l on g e n o ori en t e q ue a g en t e n ão s ab e


, , ,

s e é u ma fog ue ira l o n gí n q ua s e a s pri m e ira s ti n ta s da a ur o ra


,

d um n o v o 5 0 1 q ue o i n fi n it o acabe d e fe c un dar B e l o m e di ta : .

Q ue paz e q ue soss eg o n e ss e s val e s


D i stan t e s d a A t é par e c e
Q ue n ós al i p erd emos n ossos
E t ão doc e e ssa paz q ue ad orm ec e
é
Os n ossos p ei t os d e lutar can sad os
C om o m urm ú r i o d e do i rada m ess e ,

Q ue j ulgamos qu e brar n es s e s val ados , ,

C om var i n h as d e fadas vaporosas ,

O v éu azu l de son hos


A l i n asc em os lírios e as r osas ,

No doc e mel d e i díl i co n ºi va do


C om as brancas e puras
Quan do ao l on g e surg e o céu d o irado
D os l ábios cor de rosa d o Or i ent e
- -
,

C omo choroso b ei j o p e rfum ado ,

89
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

D e i xa —
n os p e ito om n i p ot ent e
v er , no ,

O azul d o c éu a lua e s ma ec i d a ,

C om o p éro l a em lag o
E , d e st e m und o a alm a d e spr e ndida ,

E m vez d e a viv e r an t e s s on har


L agrimosa l uz d a m in ha
E sta vid a ? Q ue s erv e e st e l idar ?
E tu O m ar q ue andas l iqu efe i t o
, ,

N a infin ita n o it e a s oluçar


Para quê ? s erv e O im p erfe it o ?
D e q ue
N ão s ei o fim dum a e str e l in h a a ard er ,

N e m para quê pal pita e st e m eu

E n ão s e p od e às v e z es esqu ec er
, ,

L e mbrança al egr e f ei ta d e s ol po st o
,
-
,

N uven z m h a d e dor e d e pra z e r .

E s entimos um pál id o d e sg ost o ,

Se p en sam os n os d ias d ec orrid os


A ver a l inh a d e son h ado

D e q ue s erv e m os d ias b em vividos


E as mort es se a s v e ntura s
S ão com o 5 6 15 e m tr evas
D e q ue n os s erv e am ar as Virg en s Puras ,

D e q ue n os s erv e a luz d as alv oradas ,

D e q ue s erv e ch orar l ágr i mas duras ,

Se d es ej os s ão l indas m anadas
os

D e ov e l h i n has q ue v ão n a s ol ed ad e , ,

B uscar e m v ão as e rva s or va l h a d a s ?
, ,

P ra q u e n os d est e D e us a
'
, ,

L oucas a s piraçõ e s q ue s e rv e m só
,

P ra n os d ei xa r n o p ei t o um a saudad e !
'

QO
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

E utra flor d e pal id ez tr e m ent e


o , ,

Qu eri a q ue um o l har s e hum ed ec e ss e


E l h e r e gass e 0 idíl ic o

C om b e ij o um l íri o em pal id ec e
um ,

C om o s e n o s eu cál i c e d e n ata
Um l i ndíss i m o d i a am an h e c e s s e !

N os arv or e d os brancos da cascata ,


D e fl or e s id ea i s san t os d e s ej os
A l i v ão sucu m b i r e m a i s d e
D as pétalas guardam d oc e s b e ijos
A s ab el h as q ue v oam n a flor e sta ,

Num d e slumbrad o frêm it o '


d h a r pej os ,

I nd o e sc ond er am or dum a gi esta


o

E m r e d om as d e m e l e d e fr e scor ,

Ond e um a pa s t or i n h a d orm e a
E ol hand o as ab el has n um a fl or
, ,

B el o s ent i u n um acl arar sagrado


, ,

R eb entar n o s e u p ei t o um n ovo

Q uand o c err o o d i a ilum in ad o


do ,

E m d o rr o apot eos e v a i sub i ndo


'

, ,

C omo um c alvár i o um D eus aure o l ad o ,

J á a ab el ha sábi a n os r osais zumbind o


, ,

A nda e m busca d o s eu d oc e al i m e nt o ,

Q ue em c á l i x d o i ro va i a aurora
'

, ,

C h eg o a am aldiçoar e ss e torm e nto


Q u e as flag e l a e m ata — a g e ad a dura

Q ue põ e facas d e m ármor e n o v ento !


P el as n oi t e s s ó fe itas d e n egrura
N e ss es b ei j os d e luz v ão i n ve rnar ,

Quando o a r r ºi o de cól era

92
O B R A S C O M P L E T A S

E scond em s e as ab elh as a ch orar , ,

D os s eus b e ij os doirados n a paz m an sa ,

T é quand o o s ol c om e c e d e rai ar . .

Na ing e nuidad e bran ca d e cri ança ,

A l i passam o i nv ern o r eun idas ,

T end o um a luz sóm en t e e um a e sp erança .

B e lo m edita : « A s l ágri m as v e rtidas


A n t es foss em l avar com o s eu sal
E m O i r o as vossas alm as e scul p i das .

Bem m el h or q ue chorá l as p elo Mal ; -

P orqu e assi m só fa z e m l a ma ça i s
No pó dum a al m a à n ossa d e sigua l !
«

C omo e u v os mo ab el has
a id eais !
,

Vou m andar -
v os m eu ch oro
em al i m e nto ,

E e m l i c or d e dor m eus fr i os a i s

E m vós e xist e todo o s entim e n to ,

T odo o amor tod a a l uz tod a a virtud e


, , ,

O qu er q ue é u
q e faz morr er o t em po !
A m ar com o am ais tamb ém e u pud e .

T amb ém ch or ei nos braç os dum a cruz


E tom ei por um d i a a n ort e

Se n ão vos amo 6 fil h as d e J e sus ? !


,

S o rs vós q u e h av ei s d e dar me em n oit e -


,

Na fri eza d a m ort e a ú ltim a luz ,

N esta m e ditaç ã o dum a A lm a i nfi nda ,

O son h ad or l e mbrou s e com d el íri o -


, ,

D outra al m a q ue n a sua viv e ai nda !


D uas alm as tão un id as n um m artírio ,

Q ue um a n a o utra j á s e vão p e rd e ndo ,

C omo um a ab el h a a d e sma i ar e m l ír i o

93
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

A sua al ma er a fog o e m luz m orr e n d o ,

A stro c eg o d e l uz e d e l oucura
Q ue p el o céu a s o r t e v a i c orr e nd o
, , ,

E m busca d e ss e L íri o d e brancura


Q ue um i n stan t e só m e nt e e m t oda a V i da
L he am ac i ou d
'
ar mi nho a s ort e
E sua alm a qua l fol ha d e spr e ndid a
,

D o s eu corp o — arbust o m uito fin o


P e lo v en to do am or i a p erdida ,

N a uf r a g a n do n e ss e Ét er c ristal in o
Q ue e mbal sam a o ar d o n oss o son ho ,

Q ue nos escond e o id e al

Lá ve m i n v ern o búzio e triston ho


o

D e l am ac enta capa a v oar a o v en to ,

Mol h and o a cara p ra ac ordar dum '

E as ab el h as ,
squ eci m ent o
n o s eu e ,

Vê em s e
-
p obre s porqu e al gum m alvado
L h es f or roubar d e no rt e o al i m ento !
, ,

N em a fom e re sp eita o q ue é
O q ue d e sp e d e um rai o d e tri st eza
Na fac e d e J esus
T é n as c elas chora a p obr eza
d e mel
Um choro — q ue é um can t o d e
D or i d a v oz d e qu em à tard e , ,

Faz em me r ec ordar essas colm e ias


-
,

Ond e m ilh ar s d a b el h a s s e r e ú n em
' '
,

Un s pe qu en i nos cér ebros d e

94
O B R A S C O M P L E T A S

H om en s q ue t od o o f e l e m si r e sum e m
, ,

V ão r oubar as ab e l has n os s eus n i n hos ,

Q ue d ód i o at é o p e d r egul h o fun d e m !
'

Hav e nd o al m as brancas c om o os l in h os ,

A l m as h á q ue v os D eus p erm ita


Q ue a pós a m ort e gr i t e m n os cam i n h os !
, ,

E q uea a l m a q ue tomb a n a d e sdi ta


D e c olm e i as e m i ndo a vid a ,

A h oras m ortas n os val ados ,

P e l o povo e sta l en da é b em sabida ;


E alguém d iss e q u e l e nd a n ão h avi a
Sem v erdad e e m s eu fund o h av er

Nasc e u n a l m a d e B el o um a a l egri a
'

T ão rud e e e xc epc i on al a o p en sar n i sto


, ,

Q ue n em urz e a n asc er d e
Quan to at é al i s eus ol hos tin h am vis t o
E ra ban al e S ó c om amor
Podia ol h ar a pal id ez d um C rist o .

E a sua a l m a em s on hos d es pl en dor


,
'
,

D escobr i u um a fr e sca pa s t or i n h a ,

Q ue and ara o d i a em busca dum


T E I X E I R A D E P A S C O A E S

«A n t e s m in h alm a an dass e assim bran quin ha


'
, ,

S eus l i ndos s on hos a guardar n os m on t e s


D o q ue n os val e s a chorar s õz m h a

A n t es m in h alma à luz d as cl aras fon t es


'
, ,

A l i b eb ess e as l i n das alvoradas ,

Q ue hum ed e c em d a mor os
'

E ao fri o tri st e das pai xõ e s g elad as


, ,

B el o d h or r or tr e m i a e d e d e sg ost o
'

C om o qu em s ob e as roch as escarpadas !

O ol har q ue da pastora e nfe ita o rosto


, ,

C on t empl ava o d e B e l o suspi rado


D uas lu ze s saídas dum s ol — p osto
l embrar um l íri o d esm aiad o
F ez l he
-

Q ue outr ora V i ra em mont e sol i tár i o ,

E l he fug i ra a r i r pr õ céu d Oi r a d o !
, ,

B ran qu ej ava l h e um son h o i magin ári o


-
,

C om o a o l ong e por e n tr e as ol i v ei ras


, , ,

A cal bran ca d e hum i ld e cam pan ár i o !


B R A S C O M P L E T A S

«A n t e s m in h alm a andass e n as l ad e iras


'
,

C omo um p obr e arr i m ad o a o s eu bord ão ,

A ouv i r pastora tua s can çõ e s


, ,

E u s e i q ue tu n ão és um a ilus ã o ;
Q ue és v e rdad e ira c om o o s ol q ue ,

N ão costum a m en tir o

E u acr e d it o n e ssa tua


D o t eu r ost o n a hú m id a fr e scura ,

C om o as t en r i n h a s fol h as dum a

Há m uito q ue s on h e i tua alm a pur a :


Um a s on h ada n OI t e m i s t r i os a '

Q ue o l uar n ão d ei xa s er e scura
rosto eu vi em noit e
T eu ,

E em n egra V i são tu m e s orr i st e


, ,

Um s orr i so d a c or d a m urch a
Não s ei n ão
um coraçã o r esist e
s ei se

A o ch oqu e d e p oét i c o s o rr i so ,

A d esm a i ar d e d or e m l áb i o tr i st e !

Na m in h a alm a c h ov e j á
E sin t o m e do ent e a o v er fin ar
-

A d esm a i a d a e str e l a dum

97
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

E fic o tri st e c om o o d e smaiar


,

Do s e acas o n os achamos

E m pa i sag e m d es e rta à b ei ra ,

E nós d oi s a T ri st eza e e u an damos


, , ,

C om o d oi s pob r ez m h os s em cal or
Por cam i n h os q ue nós n unca tr i lh amos .

A trist eza é sin al d e grand e d or


Só c om força pal pita o c oraçã o ,

Quand o m ovid o a lágrimas


De r e st o tud o é n ul o tud o é , v ão :
Pó q ue o v ent o faz e o v ent o
S ó a T r i st eza n ão e x 1$ t e em

C omo d oe nça mortal alguém h erd eq ue ,

H erd e i e sta al m a pálid a e ch orosa


Q ue o meu pe ito em br e v e fará , ,

E q ue mb eb i m in h al m a lacrim osa
e
'

N o l ic or d a tua alm a tran spar e nt e



,

Q u e o utro sabor l h e d eu : f é la
D e dura q ue in c on sci e nt e
e l a er a e

D eu l h e e sta
-
luz e suav i dad e san ta
Q ue a os p en h asc os d á o
E v er e m i m out r a l m a é o q ue
m
'
me
J ulgo t er duas alma s r eun i das ,

E e ss e p eso d o i r o m e
'

C om o dar luz a duas vid as


h ei d e
-
,

Se o m eu p e it o ch am a n ão pr oduz :
D á só cal or d e brasas

C om o sust e n tar t ão gran d e cruz


he i de
-
,

Se a m i n h a e spin h a dobra para o ch ão ,

C om o qu e m só a l i en con tra

98
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

D o tri st e s on h ad or
ol ha r profundo o

Foi p el o céu em busca d a l vor a d a s


, ,
'

Q ue nunca pôd e ach ar c á n e st e


E ram tantas as l ágr im as chorad as
e

Q ue n o s eu p e it o m agr o j á n asciam
A lgas d a mor d as l ágrim as
'

C om o v e l h os q ue ce m anos vivi am
Há de V i v e r a d or d entro e m s eu p ei to
-

C ontan do —
,

l h e os praz e r e s q ue

A borr e ci a tud o o é i mp erf e ito : q ue


O coraç ã o q ue em s e u p e it o d oen t e
, ,

E ra qual m orto num fun er eo l e it o

E B el o al m a d oir o r e luz e nt e
,
'

C h orava tan to c om o a s m adrugadas


C om et ern as saudad e s d o
E l as s ob e m céu aur eoladas
no , ,

P e lo s opro d e pál ida bonança ,

D ei xand o as fl or e stas or v a l h a da s ,

C omo s e a aurora foss e um a cri ança


Q ue a o passar d a V i da e ss e l evant e
, ,

E m l ágr i m as pe rd ess e a
B e l o and ava num son h ar con stan t e
, ,

P or ss es val es a e sc orr er l uar


e ,

E m busca s e m pr e s em parar um i n stant e


, ,

D aqui l o q ue n ão v i u o s eu

E q ue e l e tan to e cu j o am or
Por m u i tíss i m a ve z o f ez

C horar ? N ão s e i q u e s e rv e e st e fr e sc or ,
Se a s flor e s d e m ágoa q u e e m nós cr e sc em
Nas l ágr i m as s e t oucam d e v erdor ?
I OO
O B R A S C O M P L E T A S

Os br a s i dos das m ágoas aqu ec e m


Os orval h os d o pran to como e scolhos
,

Q ue ao cal or d e c e rta águ a


A l ágri m a jam ai s qu eim a os
E para e l a s e r pura h á d e m orr er
-

D en tro d a alm a s e m ch egar a os

A a l m a é um a fon t e ou str e l a a ard e r :


e

Ou s e ca ou m ol h a e nt ão a n ossa
S eca a pr i m ei ro pr ã faz er n asce r !
-

Como às m on tan h as faz v e l h o pastor


Qu ei m ando a s n o i nv ern o p ra n o E st i o
-
,
'

Se achar em cob ertas de ve rd or ,

A ssim a alm a d á calor e frio


C om q ue m ata ou cri a um
E n asc en t e u
q e aum en ta ou s e ca um

E q ue el a nos l ev e a o Firm am e n t o ,

E m l evada d e l ágrim as salgadas ,

A v er s e ach am os e ssas al voradas

C om q ue son ha o n oss o

C oi m br a — Ou t u br o de 96 .
A EL A ,
O M E NT M A I S SA NT O
MO O
D A MIN H A AL M A .

E m toda a part e eu v ej o a l uz do meu m i stéri o


Q ue s e m pr e m e p ers egu e n e sta n oit e rud e
T an t o m e fa z c hora r a cruz dum c e m itéri o
Com o essa l ouca aurora q u e m e d á saúd e !

E m t oda a part e eu v ej o a luz q ue m e alum i a ,

A luz q u e m e n asc e u n o t em p o em q ue eu
Qui s p en etra r n a n oit e a v er s e i nd a e n contrava
A e ssência subti l d ond e n os n asc e O d ia

Quan do acas o me v ej o e m e spírito sózin h o


, , ,

C om outr o q u e eu c on h eç o e q ue eu só s ei am ar ,

He i saudad e s d e m i m d outr o q u e fu i — m e n in o
, ,

Q ue um d ia m e d i ss e ad eus p ra n un ca m ai s voltar !
'

H á muito q ue apr en d i o am or q ue por ti te n ho


Foi D eus q ue m o e n sin ou a r och a a urz e e o céu
, ,

[ doirado ,

E a rocha e a urz e e o céu l an çaram me e st e l e n h o -


,

A os m eus ombros q ue só por t i t e n ho a rrastado


,

P orti q ue és o meu san gu e S im E mbora a carn e


. .

D um a para a outra possa h av er grand e s s in ai s ,

Qua l l uz q ue noutra l uz a m e sm a luz e n ca rn e ,

Num abraç o sóm en t e D eus as põe iguai s !


1 05
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

Fui procurar a o m undo a força d est e amor


E ap en as o t oqu e i n asc e ram m e d oi s
, ,
-

E m al os i a a abri r fiqu e i n a cruz d a


, ,

E e n tã o é q ue n asc e u a cruz d os t eus abraç os !

E eu j á fui fel iz al e gre e s ati sfeit o


q ue , ,

Q ue tiv e n o m eu l ábi o o can t o du m a aurora


E q ue tr oux e u m n in h o d e lu z d e n tr o d o p eit o
Quas e m e n ão con h eço e sin t o me outro ag ora -

L embro me -
fui s e p en s o em ti n a
d o q ue
O q u e é viç oso e l oir o o v e lh o l embra
A t i c om par o e u e s ta alm a j á p e rdida :
F oi l oira como tu f oi assi m loira e l in da !
,

Se t e a mo é
tu és d est a alm a a fi el
q ue
V ej o q ue v olta o meu passad o a o v er t e -

E tu és um a e str el a a ond e ch ega a im ag em


D e tudo o q ue a o luar e u m ed it e i
, ,

Se ol h ass e o q ue fui j á n ão me
eu

A p e n as tu 0 q ue e u fu i m e vi est e
E c om o s e acaso a n oi t e viss e o d ia
, ,

Se e m m istério m e vi ss e eu pun h a ,
-
me a chorar !
E tu és para m i m o q ue é para a avózin h a
A s c on tas por ond e e l a a pr end eu a
L e mbras me a tard e tri st e e m q ue m in h a m adrin ha
-
,

P e l a pr i m ei ra vez , me ens m ou a
Se outras m ul h er e s a mo E str e la da Manh ã , ,

O m eu amor por t i apaga outros


É um am or d e m ãe d e a vô d e a vô d e f l ore s
, , , ,

D ed ic o t e o amor q ue t en h o a m in h a irm ã
-
.

N ão buscar em t i a b el eza s e m fim


v ou .

Nunca v i t eu ol h ar n em t eu cab elo l oiro ,

E s e eu faç o d e t i algum a e str e l a d oiro


,
'
,

E q ue m in h alm a l ouca quis son h ar t e assim !


'
-

[ 06
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

B e nd ita s ej as tu alm a q ue n asc e st e


, ó
P ra arran car e s da cam pa um morto com o e u
'

E a tún ica d a m ort e q ue o m eu corpo v est e


A t erra er a t ão m á q ue n unca m a
Só tu s oprast e a luz à s epul tura m in ha ,

S ó tu purificast e o s m eus qu eridos


A m in h a p odridã o torn ast e a muito pura -

E fiz est e me e rgu er as m in h as m ã os i n er me s l


-

Vou guard ar a m in h a l m a e a m i nh a f l i c i da d e
' '

N o cofr e d o t eu ol har ond e eu m e p oss o


T u b em sab e s q ue n e sta louc a m ocidad e
E u t en ho m uito m edo d e a p od e r
A mo t e c omo um a i q ue va i fora d o p eito
-
,

C om o tud o o q ue faz fugin do , ,

T anto t e s e i am ar n e st e m und o i m p e rfe ito


Q u e p ra t e v er passava a V i da s em t e v er
'

, , !

A mo t e muito quan do a tard e s e i nc end e i a


-

E voltas pr õ po ent e o t eu p erfi l m ag oado ,

C om e st e olhar q u e n ão v ê n ada o q ue o rod ei a


Na escurid ã o q ue faz a s ombra do

E u s em pr e p e n s o e m t i R ain h a P oema
, d o m eu ,

Quan do atrav esso trist e um a noit e s em fim


E m e apar ec e e m son h o o grand e d i ad em a
, ,

Q ue c erc a d e e spl e ndor t eu rost o d e m arfim .

De ti v ej o s õmen t e ap en as o
P ra t e a lcançar a f orm a é p equ en o e st e
'

Que m m e falou d e ti f oi o meu coraç ão


Q ue e u só n ão t e pod ia assi m ad ivin har !
T u fost e para m im a m ai s sagrada
E nun ca m ais pr õ m un d o o m eu ol har
J unt o d e t i a o vê l o eu s into uma v e r tig em
,
-
, ,

C om o s e dum a e str e la olh ass e c á p ra bai xo ! '

1 08
O B R A S C O M P L E T A S

Se a vid a f ez a luz , s e a l uz fez o luar ,


Se f oi D eu s q ue cri ou o céu , O m a r e a t e rra ,

D en tro e m m eu p e ito , q ue trabalh a s em parar ,


E u cri e i para t i tod o o a m or q ue el a e nc e rra
0 mul h e r 6 mul h e r q ue eu he i —
, d e e te rn izar !
,

D e i xa q ue só por ti e u sofra
D e ix a m eu p e it o em ais m eu cér e bro d e m e n t e
, ,

Mul h er da m in h a V ida ai d e i xa m e ch orar !


,
-

E tu és para m im as lágrim as q ue eu

Quand o t e v ej o eu r ez o ou c om eço a
E s in t o m e can sad o e str e l a q u e eu ador o
-
, ,

D e tant o p e l a luz andar a batal h ar . .

D e p ois q ue t e am e i tamb ém por m im s e nt i


E st e e squisit o am or d e n ão an dar
E v ejo b em q ue toda a vida q ue vivi ,

T oda e sta luta f oi p ra m e e n con trar con tig o !


'

Se D eus me n asc e r n esta con tínua gu e rra


f ez
E me f ez para s em pre andar atrás d a L uz ,

C omo e ss e C ri st o q ue por n ó s d e s ce u a t erra ,

T ambém por ti n a V ida h ei d e sub ir à cruz !


, ,
-

De ti qu ero só m en t e a tua frági l vid a .

Não qu ero o t eu amor ; qu ero pod er amar .

A livi a me tu a V ida j á p erdida


-

Com e sta gran d e d or d e t e pod er d e i xar !

D ei xar O q ue s e ri a eu n o mun do trist e


-
te? !
Sem ti ! Um vagabund o a os e n c on trõ e s d a s orte ,

Um d esgraçad o um p obr e d e p ed ir q ue e xi st e
,

Un icam ent e só para e ncon trar a m ort e !


,

D e ixar Nunca ! Q ue al ém d e sta h á outra vi da !


-
te?
Para al ém d e st e so l aind a outro so l e xi st e
Para a l ém duma ar ei a outra ar ei a pe rdid a ,

A l ém dum a alm a tri st e h á outra b em m ai s tri st e !

1 09
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

Ol ha : quand o eu ch orava a sós p e las h erdad es , ,

E p equ e n it o i a v er o s ol rom p er ;
uand o e u r e zava s em pre a o t oqu e d as T rindad e s
q u e sabia j á q u e havias d e n asc e r !

E u fui pr ofe ta A nun ci e i t e a V id a


o t eu .
-
.

O t eu n om e eu pr egu e i b em an t es d e o ouvi r .

E u t in h a um a n o só e e sta al m a en tri st e cid a


Ouvia d en tro em si c om o um s entido a
, ,

E u tin h a um a no E quand o a rir bri ncava


, , ,

C om o m eu l oir o irm ã o q ue D eus j á t e m n o céu ,

Se acas o pr õ Ori e nt e os ol hos l evan tava


Pr evia ,
ao long e um s ol q u e havi a d e s er me u !
,

E com o és l in da e l oira el e assim f oi também ,

A ss im m in h alm a f oi à l uz d e ssa
'

E n tão é q u e t e V i n a d oirad a e sp erança


,

D a bênção q ue me dava à tard e m in h a , ,

E d e p ois eu parti D e i x ei tudo .

A s av e s e as flor s : tudo a ch orar por


ª

D e i x e i s e m pr e m ol hada a t e rra d o cam i nh o


Q ue i a tril hando à t oa s em sab er um fim
, , .

E s e lvag e m f e roz m i nad o p ela fom e


, ,

T e n h o i n sul tad o D eus e tudo quan t o


T e n h o n a grand e d or q u e s e m pre m e con s om e
, ,

G ast o p ra a al im e n tar a m in h a al m a trist e !


'

T e n h o e stragad o n e sta vid a m uita aurora !


A lu z cal co a a os pés como um a c oisa
-

A s n oit e s d e l uar eu d e ito as todas f ora ; -

D o meu p eito arranqu ei a e str el a d a man h ã !


A ssim vagu e e i n o m un d o l oucam en t e
eu , , ,

E m l ágrim as m atand o a lu z d o m eu ol har ,

A té q ue m e surgist e um d ia fin alm e nt e , , ,

Meu A rc o d a A l ian ça pa r a m e sa l var ! ,


SE MPR E
18 9 8 ; 2.
ª
e d i çã o : 1902; e d i çã o
ed i çã o : 1923; e d i çã o ,

« O bras C o m p l e ta s » s d
,
/ ]
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

Para quê ? D e q ue s erv e o q ue é im p e rf e it o ?


Não s ei o fim d um a e str e lin h a a ard er ,

N em para q ue pal pita e st e me u p e ito .

rosto v i em n oit e t e n ebrosa


T eu .

E em n e gra V i sã o tu me s orr i st e
, ,

E ve r , m
e m im , o utra alm a é o q ue m e

E nós dois a tri st eza


, e eu ,

E m torno d a m in h alm a s em pr e e xist e


'

O cl arão dum

A l é m d a s d u a s c i t a d a s é c l og a s , p u bl i q ue i , s ei s ou
s e t e m es es a n t es d o S e m pr e , u m a p oes i a i n t i t u

l a d a A m in h a A lm a , d a q u a l t r a n s c r ev er e i t a m bé m
a l g u n s v er s os r eve l a d or es :

E m toda a part e v ejo a luz do me u m ist é rio


eu .

Qu i s p en etrar n a n ºi t e a ver s e a i nda e ncontrava


A e ssência subtil d on d e n os n asc e o di a

1 16
O B R A S C O M P L E T A S

Quand o acaso me v ej o , e m
'
spirito só zin ho
, ,

Hei saudad e s d e m im doutro q ue fui


, m en i n o
Q ue um d i a d i ss e ad eus p ra n un ca m a i s
'

C om o s e, porv entura a noit e viss e o d ia


, ,

Se , em m i stér i o m e V i ss e eu pun h a me a
, ,
-

V ejo q ue volta o m eu passad o a o v er t e agora -


.

E tu és um a e str el a aon d e ch e ga a i m ag e m
D e tudo o q ue a o luar eu m edit e i outrora
, , .

Eu s ei n sin ast e a ri r e a chorar


q ue me e ,

Q ue fiz e st e d e
m i m o m eu pior am ig o .

E a m in h a s ol id ã o d e s e jas m a r oubar -
,

Q ue s em pr e q ue e st ou só en con tr o me con tig o


, ,
-
.

De ti eu v ej o ap e n a s o
,

P ra t e al cançar a f orm a é fr ouxa a l uz


'
do

E tu és para m i m as l ágrim as q ue eu

D epois q ue t e am ei tamb ém por m im s ent i


,

E st e esqu i sito am or d e n ão an dar

11 7
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

]á r
n es t es v e s os , a n te r i o r es
à p u bl i ca ção d o Sem
pr e s e en c on t r a d es en h a d o o v u l t o d a m i n ha

i n s p i r a ção, i s t o é , a s en s i bi l i d a d e a o en i g m a d a s C ou
s a s , a a t i t u d e i n q u i e t a , i n t er r og a d o r a d a a l m a , o

i n s t i n t o da Sa u da d e .

O S e m pr e e os l i v r os q u e s e l h e s eg u i r a m fo r a m
es c r i t os d u r a n t e a f e br e d e c r i a r A on d a l evou m e
.
-

n o s eu í m pe t o A g o r a p e n s o d om i n ó l a e a d a p t á l a à s
.
- -

fo r m a s d o m eu es p í r i t o .

Ei s a o r i g em d a n ova ed i ç ão d a s m i n ha s ob a s r .

A s m od i f i ca çõ es q u e s of r e r a m a s p oes i a s d o pr e
s e n t e vol u m e em n a d a l h es a l t e r a r a m a es s ê n c i a es p i

r i t u a l pr i i n i t i v a O s t r ês ou q u a t r o c a n t os p r i n c i
.

p a i s q u e d ef i n em o m eu t emp e r a m e n t o ( Numa
cav ern a e scura L á A s m in h as sombras ! ltim o
, , ,

can to ,
ed i ç ão) c on s e r v a m i n t a c t os o s eu s en t i d o

o r i g i n á r i o d e q u e d i m a n a t od a a m i n ha o b r a p os t e

r i or .

N o p r i m ei r o ca n t o c i t e n o q u a r t o h á o p r es s en
.

t i m en t o d u m n ovo R e i n o E s p i r i t u a l r ev e l a d o n a s ,

S ombra s ( « Som br a d a Vi d a » ) e, s o br e t u do n o ,

Ma r â n u s .

N o s eg u n do, h á o d r a m a d o s e r q u e s e a u s en t a
d e s i p r óp r i o e s e d i l u i n a s Cou s a s — o ve r d a d ei r o
d r a m a d o A m or d es en vol v i d o n o J e sus e Pã
,

fa l a ) e n a s S ombras ( « A S om br a d o
N o t e r cei r o, a p a r ece j á a m i n ha v i s ão es p ec t r a l
d os s er es e d a s cous a s r efúg i o c a ót i c o d o es p íri t o,
,

on d e el e s on ha u m a n ov a R ea l i d a d e .

E m ou t r a s p oes i a s , c om o n a T ard e d e Outubro ,


n a s q u e s e r ef e r em à m i n ha a l d e i a e n o Ultimo

can t o , s en t e s e o a m or s a u dos o d a N a t u r ez a a n i ma da
-

em D eu s e n o h om em , a
q u e m a i s t a r d e c ha m e i pan
t eísm o saud osista , e a q ue ou t r os con hecen d o o ,

1 18
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

Q u a n t o à fo r m a d ei a q u a s e t od a s
,
as p oes i a s o

m et r o l i v r e em q u e for a m c omp os t a s a l gu ma s da
e da ed i ção , c om o or ex e m
p pl o

O santinh a d a sua d ev oçã o ,

E rvas q ue el a qu e im a p elo S Joã o .


,

C omo s oi s f e l iz e s !
Ó av e s q ue el a va i ouvi r cantar ,

Ó pl an tas q ue n asc e is j un t o da casa d E l a ! '

E str e l a q ue m ai s p erto e stás d o s eu ol har ,

Á guas d o Mar q ue um dia j á pud eram vê l a


, ,
-
,

C omo s ois f el iz e s ,

C omo eu sou fe l iz !

F el icidad e ! F el icidad e
Q ue eu alcan c e i
A o tran sform ar e m cr e nça e fé toda a saudad e
D um i lusóri o m und o q u e e u sonh ei .

F e l icidad e F el icidad e !
Es n o meu coração .

E m tudo e m tudo e xi st e E t ern idad e


, ,

N um a l ágrim a e xist e a n ossa R e d e n ção !

C om es t a s l i g ei r a s n ot a s , o l ei t or a q u em , p orv en
t u r a , i n t er es s a r o m eu p en s a m en t o p oé t i co faci l
m en t e o p od er á c om p r een d er e a com p a n ha r d es d e a
s ua es pon t â n ea g é n es e a té à s E l egias e V erbo
E scuro .
O B R A S C O M P L E T A S

Num a cav ern a e scura ,

A b erta em roch a dura ,

G an h am form as fan tásticas as


E e m vagas atitud e s m i st eri osas
, ,

D ançam ignotas sombras n as pare d e s ,


.

T amb ém n o m eu e S pí r i t o profund o ,

I ntim a grut a múr m ur a d e s ed e s ,

T udo o q ue e l e criara e tudo quan to


D e scobr e o n osso ol h ar ,

A e str e l a d e al va a p edra do meu lar


, ,

A S audad e q ue é a m ãe do n osso can to


E a e t ern a l uz do m un do ,

T om a form as e stran h as s em s en tid o


, ,

Q ue n unca
E v en do as d e ntro em m im s urpreend ido
-
, , ,

E u tiv e m ed o d elas e grite i


, .
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

G rit e i L ogo o m eu can t o


. m i stério de
Se fez m ortal n asc en d o E m ed o e tér eo
, .
,

D el ír i o d e alma i n qu i eta ad oraçã o


,
.

Na m ai s hum il d e e pál ida can çã o ,

A n da D eus a s on har a noit e e a luz do d ia !


A ssi m n a m in h a human a e cósm ica e l egia ,

Q ue s e p ercut e A l ém ,

A través d o s eu ritm o escur o v ej o alguém ,

S ou e u n a m in h a d or pr e s ent e e vi vo
, , .

O can t o j á n o e spaço fugitiv o


, , ,

C on tig o em d ivin dad e v a i m e u s er ;


, ,

E sobr e a t erra a sós m e aflijo e m e con sum o


, , .

Intim am ent e s ou lon gín qua e str ela a ard er


E o meu vult o por fora é t od o cinza e fum o
, ,
.

Ó ve rsos q ue s oi s m ísti cas tri st ezas


E an si edad e s q ue em n évoa s e p e rd eram !
, ,

D eus es n o voss o Ol impo h á l ágrim as ac esas


, ,

E m uitos sói s q ue n unca

A zu l profundo ,

E tér eo rosto ,

D on d e cai s em d e scan so in de fin idam ent e , ,

A l ágrim a d o Mun d o ,

R ev eland o quim éri c o d e sgost o


D e D eus q u e a o t e rm in ar o t e mplo d a Natura
, ,

S urpr es o d e r e p en t e
, ,

Viu d entro d el e a própri a s e pultura !


, ,
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

PO ETA

Quand o a prim e ira l ágri m a aflorou


N os m eus o l h os d ivin a cl ari dad e
,

A m in h a pátria ald e i a alum iou


D um a l uz tri st e q ue er a j á saudad e
, .

Hum ild e s p obr e s c ousas com o eu s ou


, ,

D or ac e sa n a vossa
S ou e m futur o o t em p o q ue pass ou ;
, ,

E m m im o antigo t e m po é n ova idad e


, .

Sou fraga da m on tan ha n évoa astral , ,

Quim érica figura m atin al ,

I m ag em d e alm a em te rra m od elada .

Sou o h om em d e s i m esm o fugitivo ;


Fan tasm a a d el i rar m i stér i o vivo , ,

A l oucura d e D eus o son h o e o n ada , .

1 . C
P oe ta E m epí g af e : E n a m i n ha j a n e la a me
: O r

di tar Havia e m t oda a d or q ue m e falava Um a o u tr a



,

v oz q ue e u n un ca ou vi falar (I e diçã o ) 8 C : C laridad e ª

—4 5 CD : A f l or a p e dra a n év a al u m i ou D um a r em ota
. .

-
o

vaga h um a n idad e — 1 CD : A l u da v os s a tri s t e e s


.
, ,

e z
—104 2 CD : Sou a br um a d T â m e ga apa
. .

. o

ga n do A s fig uras e a s al m a s r e v e la n d o E rg ue n d o v u lt os
—14 C : Mi s téri o — 1 5 CD : A Sa u
,

d e a n j o s s obr e a . .

dad e fala n d o à s ua t erra .

124
O B R A S C O M P L E T A S

UM A VOZ

E u ouço m i st e ri osa can tar v oz ,

Na n oit e q ue m e b e ij a o c oraçã o ,

E t em um riso m ort o d e luar


Para a n octurn a e trist e s olid ã o .

E u ouço afogad o em comoçã o


-
t e, ,

Quas e n év oa turb and o o azul do ar , .

Q ue s obr en atural r ecordação


D e s ejas tu em m im r essuscitar ?, ,

Mi st eriosa voz e n t ern ecida ,

N os m eus ouv i dos s e mpr e m ur m ur os a ,

D os m eus ouv i d os s em pr e i n c om pr een d i da ;

E ssênci a dos m eus v ersos dolor osa ,

Na m i n h a própr i a alm a ad orm e c i da ,

Mas cantan do d e s p e rta em cad a cousa , , .

1 . A BC Mi s t e ri os a V oz —2 A B Mi s t eri os a vo o uço c a n
: . : z

tar C : E u ouç o m i s t eri o s a V oz ca n ta r — 3 A P e l a No it e . :

er m a d o m eu B : P ela n oit e e r m a d o m e u c oraçã o


—4 4 —
.

5 A B : Tão s u av e pa s s a p e l o az u l d o ar
. C omo um rai ,
o

d e l uz e u m a ora ç ã o A B : Q u e h i s t ó ria s c o n tará s li n da


.
,

c a nçã o Q u e v en s a o m eu o uvid o m ur m urar ? O q ue é


q u e diz e s ? Q u e r e c o rda ç ã o C E u o u ç o —
t e p e rdida e m c om o ,

çã o, Q ua s e n é v o a t ur b a n d o o az ul d o Q ue s obr en a
t ural r e c ordaçã o — 10 A BD : Mi s t eri os a voz d es c on h e cida
,

C : Mi s t eri os a V oz d es c on h ecida —1 1 C S em pr e a os m eus


. ,

o uvid os m u r m ur os a —1 2 A B : i n c om pr ee n di da —1 3 1 5 A B
, .

-
, .
, ,

É s alg um a ca n ç ã o d a m i n ha vida Q ue p or ca n tar m i , ,

n h al ma d e s c ui d o s a P or e s ta n o it e f oi d ei x ar
'

16 0 A : Cºi mb r a , 18 9 8 .

1 25
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

TARD E DE OU T ONO

A A NT ÓNI O C A R N EIR O ,

P IN T O R D A AL M A E D A P A I SA G EM

S ai o d e casa Outubr o Fria tard e


. . .

E is m e através dum e r m o pin h e iral


-
.

O s ol j á m oribund o ch ora
, , e ard e
G ot ej am sangu e as árvor es d o val

S eus d en egrid os ram os ,


t ão sguios
e ,

P e rd e m s e n o céu rox o e
-
vap or os o .

E c ausa m e profun d os c a l ef r i os
-

O v e nt o n um ataqu e d e n erv os o
, .

Ó fulm in ad os tron cos folhag e m se m ,

E rgu e nd o n egr os braç os n a am pl id ão ! ,

S úpl icas d ol or osas d a pai sag em ,

A s form as m ai s s e cr e tas d a

T udo torn a i n d efin id o im e n so


se , .

Um s on h o ou m ort e as c ousas e n volv eu .

O r i o tolda o e spaç o ; é bran c o inc enso .

D e sc e à t e rra e m p enumbra e dor O céu


, ,
.

2-8 . C : Em pígra fe : 0
eNat ur eza q ualq ue r c ous a ex i s t e
,

D e i n ti m o pe it o e a t ua E s s ê n cia
e n tr e o m e u Se m e .

di t o s e ca n t o s e es t ou tri s t e E u s i n t o d en tr o e m m i m
e diçã o ) —
, , , , ,

tu a ex i s t ê n cia ! ( D a 1 3 C D : bra ço s n a .

126
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

M E DITA N D O

A D M I G U E L DE
. Un a muno

Q uan tas v ez es vou só por um cam i nho adiant e


, , ,

A m editar n as cousas .

E m edi tand o eu t orno m e di stant e


,
-

D as suas a parências m entirosas .

M editar é subir àqu ela altura ,

Ond e a gota d e orval h o é um astro q ue alum i a ;


E ond e é p erfe ita e m ística al egria
A h um an a d e sv en tura .

P or i ss o eu a mo tan t o
,

A s h oras d e saudad e em q ue m edito ,

E julg o ouvi r m ist eri o so cant o


E m e p erturba a sombra d o I nfin it o .

Ouço um a voz d iz er em m i m : eu s ou,

E sin t o q u e e ssa v oz n ão é só m in h a ; eu sinto


Q ue d im an a d e tud o o q ue m e c erca e t em
E rm o p erfil n as tr e vas i ndi stinto
, , .

Sou infin ito a m or qui m érica pr es ença


,
.

A os m eus ol h os bai xando a l uz d o luar , ,

E m chor o s e cond e n sa ;
,

E v ej o a t erra e o céu c om o através d o m ar


, .

Na diçã o e m e p í grafe : D es v en dar d e s c obrir ir


e ,
«
, ,

ter o nde es tá D eus É o v erdad e ir o f i m d o c ora ç ã o


É um a es trada a tr ilhar a va s ti dã o d o s cé us
C omo fora m outrora a s on da s d o oc ea no ( D a 2 . .
ll

1 28
O B R A S C O M P L E T A S

E tran st orn am s e as cousas q u e par ec em


-

D estr oços n aufragad os .

S eus cºrp os an oit e c e m


E ficam s e n a sombra a ol har pasm ado s
-
, , ,
.

S e m pr e q ue ch or o ,
o brancº n ev oe iro
A s árvor e s apaga .

O me u ri s o fl or e sc e um e rm o out e i r o
E o m eu cant o, d e m ont e e m m on t e , se pr ºpa g a .

Q ue e stran h a sim pati a


Me pr end e à s pºbr e s c ousas da Natura l
A m in h a d or can tandº é luz ; m in h a al egri a
I nc en d ei a a n octurn a sºmbra e scura .

E v ejo a i n tim idad e o l aç o ocult o , ,

Q ue as alm as t odas casa ;


M eu coraç ã o e rgu en do ,
e m sºn h os , 0 s eu vult o
E p edra n uv em asa
, , .

H oras em q ue m edito e m e d i sp ers o ,

P ºr tudo quanto e xi st e .

E m m im s e e xt in gu e o di a dº Un iv erso
,

E prin cipi a em m im a sua noi t e triste


, , .
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

T ex t o da 2 .
ª
e d i ção

No alt o d um m on t e
S em s ab e r p o rq u e f u i ali parar ,

M uito a n t e s q u e os b e ij o s d o h oriz on t e
Fize s s e m o c é u pálid o c orar ,

I a s ºzi n h o e tri s t e ,

A b a n d º n ad o a m eu tri s t e
o

V ia m m e os o lh os o q u e n ão e x i s t e
-
,

M a s n ada via m : er a d e
E eu e e u ch o r e i .

Q ua n ta s al m a s d e L á vê m V i s itar
A n os s a l
'
ma ; eu b em s ei

Q ue a s tro s e m s egr ed o v ê m ao
os , ,

V e lh o cipre s t e vo u i n t e rro gar ,

S e m e n t e n d e r o q ue e l e m e
Q ua n ta s lágri m a s vê m a o meu ol h ar
C a í da s n ã s e i d on d e !
o

O m eu pálid o r o s t o V ê m mo lhar
D or es alh eia s lágri m a s ,

C h ora m p e l os m e us o lh os o l uar ,

O s ri os e a s
E u s e i v os s o d es ti n o ,

B ra n ca s n u v e n s d o c é u o n da s d mar , o .

O claro c é u d e s t r el a s cri s tal i n o


'
,

M e u tra n s par e n t e
Q ua n ta s l i n da s q ui m era s
A par ec em n o azul a ,

E u s e i o u vir o ca n t º d a s es f e ra s ;
É o m ur m úr i o d un s olh o s a
O d o c e o lhar d o s cé u s ,

Q ue s ó t e m p e s tad e faz t ur b a r l
Co mo e u d es c ub ro t ua al ma 6 D e us , ,

A tr avé s d es s e
1 30
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

T ud o o q ue e xist e ,

A quém e al ém d º n oss o o l har ,

B ailava n o m eu ch or o .

Q ue é chorar ?
E v e r o s oll ágrim a d e our o
, ,

P e l a fac e d e D eus a d esl i z ar ,


.

E ver o m und o
A c on c entrar
O s eu nocturn o e S pí r i t o pr ofund o
E m g ota d e águ a e d or q ue v a i t ombar ;
S ubir talv ez n o azul d os céus ,

B at e r as asas para D eus ,

E eu c hor e i . .

Quantas c ousas d e L á n os vêm falar


E E u s ei
Q ue os astr os e m s egr ed o v êm a o mar
, , .

O l ágrim as d e l ºn ge a m urmurar ,

Ó l ágrim as e stran has !


C horam p e los m eus ol hºs o luar
, , ,

Os riºs e a s m ontan h as .

A t rn a
e e D or
F e z , em m im , o s eu n in ho : ouç o -
a cantar
D e ramo e m ram o , e f l or em
A n da a criar .

Sº zin ho p el os
, e rmos d ivagava
, ,

E squ ecid o a ,

O cr e púscul o a s roch as an im ava ,

E t in h am n e gro ol har .

E, súbit o e nc ontr ei m e aband on ad o


,
-
,

L ong e d e m im a errar , .

D e m edos l ívidos c ercad o ,

C omo um fantasma a o luar , .

1 32
B R A S C O M P L E T A S

E n tã o pus me a cham ar
,
-

P or m im q ue e stava a s ó s
, .

E julgu e i p erc eb e r hum an a voz ,

Vinda n o h ál it o d º ar .

Mas er a um A i p erdid o ,

E t e rn o d a Natura s em s en tid o
, , .

E n o m eu s er b e m fund o p en etrou ;
, ,

E al i ficºu ,

S em pr e a c antar ,

A s ol id ão a l uz cr e puscular
, ,

S i lên ci os d e alm a a sombra o , ,

E é m in h a pr ec e ocu l ta o meu s e gr e do ,
.
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

M I NH A ALD E I A

A0 V I S NDE DE
CO V I LA M OUR A

T e rra d a m inh a infância ! O pátri a so l id ã o !


Q ue a m in h a in spiraç ão
S ej a um p ouc o d e sºl para os t e us m on t e s
E um ri sº d e água a m ai s n as tuas fºnt e s
, .

A m in h a ald e ia !
E rm o lugar q u e e xi st e
Pe rd id o n e st e
,

Ond e o silênci o as al m a s arr efec e ;


E o clarã o d o po ent e m oribun do
É m ai s doirad o e tri st e ,

E l embra e n orm e e l ívida can d e ia ,

Nas m ã os dum n egro e sp ectrº q ue


A l d ei a da pri m e ira n o it e scura
e .

Prim e ira t erra q ue o luar b e ij ou ,

Q uan do o R i o n o val e s e e mbr e n hou


, , ,

Quand o o Mar㺠subiu a grand e altura ,

E m c err o s dum a e s f í n g i c a escultura ,

Q ue o fºgº d os r el âm pag os

Em e pígrafe n a
,
e diçã o :
« A g ora a m o t e m ai s 6 m i
-
,

n h a li n da ald e ia
, Na ag on ia d oirada e tri s t e d o arvor e d o ,

Q ua n d o à tard e apar e c e en or m e a l ua ch e ia E e m t oda


a Nat ur eza há um í n ti m o s e gr ed o ( D a 1 .
a

1 34
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

A n tig os p obr e z in h os ,

Fin cad os a o
E q ue tri st e za — ol h ai —a d ºs c eguin hos
Q ue andam à l uz d o d ia em pl en a e scu r id ão !
, ,

Q uan tºs an os l h e s p esa m s obr e a f r ont e ,

S uj a d e pó rug osa
, ,

E os q u e a s ort e e nj eit ou !
O al e ij ado a V iúva a cri ança abandon ada
, , ,

V e l h in h as a r ez ar n a sua vºz de fºnt e


,

Q ue j á s e c ou .

Ó pºbr e s cam pon e s es ,

D urant e o s n egr os m e s e s !
C houpan as a cair d e sc onj un tadas t e lhas
, ,

D e i xand o tr e spas s ar o z imbr o e o v e n t o ,

E m noit e s v elh as .

Ó faltas de trabal h o ! I n v e rn o ! I solam en to !

E a t e rrív el s ecura p el o e sti o, ,

Quand o m ostra o e squ el etº e m p edra e ar e ia , ,

E n a f ebr e infe rn al ac e sa q ue as c on som e , ,

A s fon t es pingam l agrim as d e d or ,

G otas d e sangu e e svaíd o j á s em cor , ,

E mug e m os b oi s c om fom e .

B al dios d e spovoados d e arvor e dos .

T e rras d e Pºrtugal q u e d ão r och e d os ,

A urz e a i n v ej a o ódio
, ,
poucº
R e ss equidos e l ívidos m an in hos ,

On d e pastam r eban h os e sp ectrai s !

Ó m on t e s
M e ndig os d esgraçad os ,

C om f eridas sangrand o a o s ol po ent e ; ,


-

V e stidos q ue m iséri a sim pl e sm ent e


D e farrap os d e t oj o e sburacados .

1 36
O B R A S C O M P L E T A S

Ó casas se n inguém
m ,

D os q ue foram por e ss e m ar além ,

A b e rta s ao v en t o n ºrt e
A l ar e ira a pagada a cin z a ,
a mort e !
Outras a bran qu ej ar n o m e i o d e col in as
, , ,

E ntr e pin h ai s a ,

A lgum as s ão fan tásticas ruín a s


Ou t em pl os d o A ban don o .

D entrº dºs s eus s alõ es é s em pr e outon o ; ,

N el e s vagam à n oi t e apariçõ e s d e
, ,

C as ebr e s t e nd o l og o ,
ao pé da porta ,

A p equ e n in a h orta ,

O e irad o o al p en dr e a m e d a a sombra d a fi gu ei ra ;
, , ,

E n o e str e ito p ostigo s e m vidraça ,

S orri — tão v erd e —a a l f á d eg a a qu em


,

Q ue b em q ue ch e i ra !
É um p e rfum e V iç os o d e al egri a ;
Vê —s e n el e o r e trat o a cor e s d a Ma r i a
, , ,

A cot ovia o rou xin ol ;


,

Pri m e ir o voo d os passarin hos ,

Prim e ira flor à b ei ra d os cam i n ho s


, ,

Com o el e e n c e rra o a m a n h e c en t e
I dili o cam p e sin o :
O am or carn al b rutal m as i noc en t e
, , ,

O antigo am or dos d e us e s q ue é d ivin o , .

G e n t e d a m i n h a ald e i a n o ,

E rm as fron t e s b an h adas em suor ;


G otas d e água e p oe ira an gust ioso ,

A lm as pr e sas à t erra p el o am or !

Magr os vultos curvad os sobr e a en xada ,

Pr oj ectand o n as l ei va s fum egan t e s


, ,

S ua sombra d e g estos e sforçada , .

I 37
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

E gr and e s boi s pacat os e ofegan t e s


os , ,

Puxam o férr eo arad o r e volv en d o ,

A s e ntran h as d o s ol o .

E tu ,
D el f i n a ,

Vai s à fr en t e a sorri r olh os azuis vol v end o


, ,

A o t e u M a n el q u e al egr e d e satin a ;
, , ,

E d e v er t e n ão s ent e º arad o q u e l h e
'

-
, ,

Hom en s q ue trabal hais n a m inh a ald e ia


'

, ,

C om o as árv or e s vós s ois d a Natur e za ,


.

E s e v os falta um di a o cald o para a c e ia


, ,

E t end e s d e e m igrar ,

T r onc os d es a r r a i g a d os p el o v e n to ,

L evais t erra p egada a o c oraçã o


E partis a c horar .

Q ue sofrim ento ,

Ó Pátr i a ,
v er cr esc er a tua s ol i d ã o !
O mês d e A g ost o ! O céu vibrant e d e zumbid os !
S uf ocant e cal or v e nt os ,

Ó m a l h a s e n toand o ! E str ond o surd o e


R oça s d e m at o ,

E s fol ha d a s can çõ e s visõ e s d o fim d o


, ,

D oc e s m an h ãs fr e scura d e água , .

E stagn açõ e s d e luz e m tard e s ,

R e l âm pagos T e m p estad e .

S ap os cantand o G e m e n as suas almas


, , ,

C omº um r e m ot o e sp ectro a F e al dad e ,


.

S et embr o d a A bund ância .

V el h ic e q ue par e c e n ºva infância .

S ão Migu e l das vind i m as s ol d ivi n o , ,

N egr os frut os d o n éctar pur pur i n o .

O sangu e viv o e m flºr , ,

Pintando as m angas da cam isa ao l avrad or


1 38
T E I X E I R A D E P A S C O A 8

Na luz cr e puscular .

O n o r t e agr est e i nflam a


O céu r ox o das tard e s m i st eri osas
E e ngr ossa a V ºz do
E a m ão d a Pal id e z qui m érica d erram a , ,

Um doirado m ºrtal n as brumas l acrim osas .

I m en sa e vaga fl or a s ol idã o ,

C r e sc e n o m eu j ardi m
, .

A s rºsas m urch am n a r os e ira v e rd e ;


T ombam e m cinza d e alm a q ue s e
Outon o ºut on o ó m árti r e staçã o
, , ,

Pr ofe cia d o Fim


A l d e ia da b ei r i n h a d e O
P e scadºr es l ançan d o a l in h a o an zol c om ,

A través d a n ebl in a º l áct eo véu d e fri o ,

R asgad o p el o s ol .

A z e n h as v el h as mós d e p edra dura ;


,

A çud e s b or b ot õ es d e e S pu m a a cair ;
,

G rup os d e árv or e s m aciçºs d e v erdura ,

C e rcados d e água a rir , .

O T âm ega bai xin ho e tran spar en t e ,

Sob copados
A o d ecl in ar o d ia és pálida corr e n t e, ,

Ond e trist e flutua a sombra d os


, ,

Ó T âm ega d os p egos t en ebrosos


D a bran ca n évºa arr efe cida ,

D ºs soturnos q ue i x u m e s clam oroso s ,

Na n oit e
R iº d a m in h a
P e lo chuv os o i nv e rno m aré ch e ia ,

D as l ágrim as pr ofun das d o


T u és 6 R i o a d or d a grand e S e rra ;
, ,

O s eu dram a d e fragas e de t erra ,

E svaíd o em água t orva d e pai xã o !

1 40
O B R A S C O M P L E T A S

Nº e sti o és a tri ste za a o luar q ue n asc e


, , ,

D aqu el a m ºn tan h osa S ºl e d a d e :


A l ágrim a ba ixin h a d e saudad e
Q ue l he e sc orr e d a fac e .

A s s im a d ºr e stran ha ,

Q ue m in a e rói por d e n t r o a lúgu br e m on tan h a


—E sfing e de ºl hºs t ri st e s a ch orar
, , ,

E n c ontra o s e u al ívi o e m pl e n o m ar .

O m ar vivº das on das al ivi a


O m ar m ort o d e brum a e p en ed ia .

E os rud e s m on tanh e s e s pad ec en d o ,

A d or d a t erra m ãe ,

F oram d os al tos pín car os d e sc e n d o ,

S e guin d o o v erd e r i o vagar os o ,

E ssa e strad a d e l ágrim as


E al cançaram o m ar ; e p e l o m a r al ém , ,

L og o s e av en turaram n um saud os o
, ,

A v en tur e iro s on h o n av egan t e .

Min ha ald e i a n o i n v ern o ,

E e ss e t eu ar g eladº e s em pit e rn o !
P obr ezin has choupan a s ,

D e com ovidas form as quas e h um an as


S ofr e m n ão s ei q ue trágico d e sg ost o
Q ue si lên ciº n os m on t e s c on c entrados !
O frio coal ha e m ton s esbran quiçados
, ,

Nos va l es a o s ol
,

Minh a ald e i a n o E ntrudo A s m áscaras v erm el has .

D ançam e m gritaria
, .

F i g ur a çõ es m acabras de an im ai s !
R i sos d e tin ta n ova em fe i as caras v elh as .

Mort as carica t uras d a A l egri a ,

C r epúsculo das d oidas Sa t ur n a i s !


Ó m in h a ald e ia n a s em an a da Pai x ã o !
E t ér eo lut o pairan do
S obr e as cousas e o nosso

14 1
T E I X E I R A D E P A S C O A S

Um v é u d e dor
O r ost o a o s ol
A v e s cantand o m ai s bai xin h o a m ed o
, , ,

Fl or e s an oit e c end o a sua cor ,

F on t e s m anand o e m ín tim o s egr ed o .

A ta r d e ,
luar
ve m o E q ue t o c o u
D e l ívid o palor o corp o d e J e sus
E a somb r a d e Mari a d e s e n h ou ,

S obr e as ur z e s e a fraga a os pés da C ruz , .

A C ei a , o Ho r t o ,
O ] u l g a m en t o,

P e dr o ch oran d o arr e p e nd id o ,

Mari a e º s eu tr e m e nd o s ofrim e n tº ,

T odas e s s as dram áticas i m age n s ,

J á d el i d a s n o t em p o d ec orrido
, ,

T urvam d e m isticism o as alm as e as pai sag en s . .

E a pr ocissão n a vil a à Os fog a r é us


,

E d e tún ica bran ca os p obre s p e n it en t e s


, , ,

Sob os and or e s a a r rastar corr e nt e s


, ,

D e férr eos s on s e n ch e n d o a l adri lh ada


G r ossas n uv e n s ab r in d o s e n os céus -
, ,

D e i xam d e sc e r a o mun d o a luz d a lua .

E a o luar apar ec e a im ag e m d º S e n hor ,

E m al ta cruz
Oh q ue e xpr e ssã o fantástica d e dor
T ran sfigurada
E n os l ábios d e C ri sto o luar murmura
, ,

Pa l avras d e pi e dad e .

E a c or oa d e e spi nh os e mbrand ec e
E ci l a um a auréola ap e na s d e t ern ur a :
-

D ivin a cl aridad e
Q ue as r e ss equidas m ágoas h um ed ec e
O grand e im ag e m s obre o and or n a pont e !
, ,

C orpo ban hadº e m sangu e e l uz d o


B raçºs d a cruz cin g i nd o a n ºi t e n um abraço ; ,

42
T E I X E I R A D E P A S C O A

E, às pºrtas e spal h ad o o rosm an in hº e vola ,

U m m ístico p erfum e d e oraçã o .

V e lhºs trabal had or e s ,

P or qu e m s ofr e u J e sus ,

E m ã e s acal en tand o os filh os n º r egaç o , ,

E sp e ra m o
E aj oel h and o c om S éria d e vºçãº
, ,

B e ij am os pés d a C ruz .

E n o lúcid o e sp el h o da pai sag em


R e fl ect e s e num s on h o a bran ca i mag e m
-
, ,

D e C rist o Q u e m i st ério !
O sol q ue n asc e o d e sp ertar do v entº
, ,

O S sºldad os brutais d o gran d e I m péri o


C aídos por t erra n um d e slumbram e nt o !,

Madal en a num g e st o e nl ouqu ecid o


, ,

G ritand o : eu v i a D eu s .

A l c l u i a s d e amºr subind o al ém d os céus ,

E o m ilagr e d e mun d o e m mundo


, ,

Noit e d e S J o ã o ! C ascatas e folgu edos


.
,

E n tr e sagrad os arv or edos ,

C ºm o
R apaz e s e donz e las ,

Ond e a al egri a mora ,

E m ranchos d e lirant e s ,

Le vam ram os e n orm e s v e rd ej ant e s , ,

C an tand o à l uz e t ern a d as
,

E , emN ov embr o os F i é i s p ed ind o à n ossa po


,

O v e l ho o órfã o a
, ,

Magr os p erfi s d e d ºr à f om e e à chuva , ,

S obr e a t erra m orta .

L á v ão e m e rm os grup os p obr e zin h os


, ,

E r e zam oraçõ e s m ais trist es q ue a s d o


A lgun s s ão al e ij ados e c eguin hos
De

1 44
O B R A S C O M P L E T A S

A lém n o pr e sbitéri o
, ,

D e scobr e s e p equ e n o c e m itéri o


-
,

N eg ro d e g en t e hum i ld e q ue
Pi edosas flor es ,

D e m ac e radas cor e s ,

A l egram vagam en t e aqu e l a nódoa escura ,

E pºusam sobr e as
Um as v el h in h as com a cruz tombada
, , ,

C h eias d e cinza anón im a ,

E stas d e t erra fr esca a bran qu eja r s ão n ovas ;


, , ,

T êm a efígi e d o m ortº in tacta e pe rfum ada ;


A o pé das outras — v ed e — ah quas e q ue têm vida ! ,

E a noit e d e Natal ?
O l ua s obr e um torv o pi n l i ei r a l ,

Ond e soluça e g em e o fri o n ort e ,

C ºm o ant e v en dº o dram a dº C alvário !


N est e cam in h º antigo e sol itário
, ,

C avalga a fe ia
E os r och e dos d os mont e s
D iz em q ue v ão b eb e r n os ri os e n as fon t es .

E h á fi guras d e lívi da aparên cia ,

Palpitan do n a e tér e a e baça tran sparência ,

Q ue s e p erturba e mostra um gén io agre st e .

S㺠d efun t os qu ebran d o o s eu r e pºuso e te rno ,

A s ombra dum
N egros m ochos c r oc i t a m
E as e rm as cousas brutas r e ssuscitam ,

N esta noit e fantástica d e

O R ei s da m in h a i nfân ci a ! Q ue saudad e !
E m torn o do me u l ar ,

Voz es d e alm as divi n a ,

L á fora sobr e a t e rra a n ev e fri a


, ,

E l ú cido
E o v el ho tronco a ard er e a cr epitar
, ,

Par ec e r estituir e m ch am as d e al e gr ia
, ,

Todo o ca l or e l uz q ue r ec ebe u d o

1 45
T E I X E I R A D l P A S C O A E S

D e t ão lím pid o o e spaç o r espland ec e !


E a m úsica s e l vag e m d a s fes t a d a s
E n toa a o l ong o branc o d as e stradas
, ,

P õ e tum ul t os d e s om n o ar mudº q ue e str e m e c e .

B and os d e virg e n s p e l a nºit e m or ta


, ,

C antam a o D eus
E um can t o r e p entin o
Ouviu s e ag ora m e sm o à n os s a p orta :
-
, ,

S 㺠ch egad os ºs trê R e i s s

A l apin h a de
E l á part em d e p oi s por e ssa n oi t e
, ,

E º s e u cantar é tri st e j á ,

A ld e i a d a m in ha
C ousas b el as d el i d a s n a d ist ân cia !
O prim e iras m an h ãs ! C r epúsculos d e outr ora !
A v e s d o m eu passad o ! O lírios j á d isp ers os !
V el h os d ia s d e s ol ! Q ue s er e is vós ag ora ? ,

T al v e z s ej ais — qu em sab e ? — a s om bra d os m eus


[ v ers os .

Ó m inh a an tiga ald e ia f e ita im ag e m !


,

Q uim érica paisag em ,

Q u e s e e sfum a n os l ong e s d o m eu
E é a m e sm a q ue e u avisto à lu z do d ia
D e sd obran do —
, ,

s e e m n év o a e t ern a s em p e r d e r,

Se us c on t orn os e c or e s d e h arm on ia .

Ó paisag e m d a m in h a intim idad e ,

Q ue d en tr o e m m im eu trag o em t erra e céus


, , ,

T al cºm o troux e º mund o e m outros t e m pos D eus


, , ,

A nt es d e o m od elar e m s ombra e claridad e .


T E I X E I R A D E P A S C O A

Ve r s ão d ef i n i t i va

C om o h oj e é ódi o o q u e ont e m foi am or !


C om º é t 㺠frágil tud o quant o e xi st e !
A al egria n asc end o fica tri st e
, , ,

T omband o a l uz s e p e rd e e m n egra c ºr
, .

Q ue é f e ito cºraçã o d o q u e s enti st e ?


, ,

S erá d or por acas o a tua d or ?


, ,

A cri atura hum an a a t erra a flor , ,

S ão e sp ectr os dum s er q ue n ão e xist e .

No si lêncio do m und o ch oro e grit o ,


.

S ºu a i nj úri a d o pó q u e º v e n to l e va ,

C ontra a sombra d e D eus e d o I nfini t o .

De luto a n oit e v est e a i m en sid ad e :


,

E n egra m ald ição q ue vem d a tr e va


C ontra ti s em pit ern a claridad e
,
.

C faz s e tri t e D põ e tri t e —8 CD A c


4. e- s s :

u ch or —1 2
: -
s :

l a fl r —1 0 CD
.
, ,

a t rra
e , o so , o , CD . : e o .

t ud o oq ue D us f i n fi n it
e ez o .

1 48
O B R A S C O M P L E T A S

AO SO L P OR

E u can t o n o A T ri s t e za
R ecord a me l o ngínqua aspi raçã o
-
,

Na qual pr e ssinto a i m ag e m d a B e l eza


Q ue º s m e us o l h o s um d i a , ,

A pai sag em n a so mbra s on h a , , e

Seu vultº é
fan tástica vis ã o
de .

D ir s e á q ue a e m p e d ern id a Natur eza


- -

T em l ágrim as a ard e r n o c oraç ã o .

E can tº a m in h a m ágoa ; V ºu
E vou saud os o e pál id o f i c an do
, ,

Ma i s d i stant e d e mi m , m a i s para
N esta m el an c ol ia q ue é ch orar ,

Se m l ágr i m as e u V i v o a m ed i tar
,

No q ue me a t erra o céu al gu ém ? , ,

1 A :S br um r cha a
o e l pô a o o so -
r B : Sobr e u ma r ocha ao
—Q A S i n t m m ui t tri t
.
,

so l pô r
-
: o- ta tri s t eza B : Si n
e o s e e es

t o—
.

m e m u it o tri s t e e e s ta tr i s t eza CD : E u ca n t o n o c r epú s


E a T ri s t eza — 4 A N um p en t e a l uzir e s tr e la ac es a
,

B : O n d e pr e s s i n t o a i m ag em da B e l eza —5 A : Na s cida d o
.
, ,

s eu ú lti m o clarã o AB : E em êx ta s e aj oe lhada


N a s o m b ra vaga id e al d um a vi s ã o — 8 A :
, ,

es t a l m a r eza
'
.
, , ,

So mbra a q ue e l a a º r ezar s e s e n t e pr e s a B : C omo a o n a s


, , ,

cer d o So l a Nat u r eza CD : D ir s e á q ue a b r uta e e s c ura


Nat ure za —9 A : O s º m b ra a q uem n ºs liga um a o raçã o !
- -
,

8 : C o m o a o n a s c e r d o a m o r u m c oraçã o —1 0 A B : E e l a
.

. .

vai a r ezar C : E r ezo a m i n ha m ág oa vou ,

D : E u r ez o a m i n ha m ág o a v ou ca n ta n d o
1 1 A B : E s e m pr e m ai s e s cra va v a i fica n d o — 14 A B C e u
.
,

fi co —16 B : C o i mbra 1 89 8
. , . :

. .
,

149
T E I X E I R A D E P A S C O A E

E tr n m oç a s , um a e x i s
e as

D a s o utra s b em dif e r e n t e .

S e e la s ri e m , a n da tri s t e
E
s e m pr e l on g e da g en t e .

A m ística M en in a apar e cida ,

Q ue para s er am ad a é q ue n asc eu ;
A F l or q ue d ei t ou ra i z n a m i n h a V i d a ,

Um d ia ( e stran ho d i a ! ) acont e c eu
Passar por m im t ão frági l e formosa
, ,

A i m ag e m do s eu vul to à luz d o céu , .

Pass ou com o visão m i st eriosa


, ,

D e i xan do m e n a alma aqu el e e spant o


-
, ,

Q ue an i m a e tran sfi gura cad a cousa !


Vag o t e rrºr d ivin o m e do e n cant o
, , ,

Q ue por i gn oto amor s e cond en sou


, ,

N a i m p erfei çã o V i v en t e d o meu can t o !


T eu corpo , sºn h o e m flor d esabrochou ;
,

F ez s e B el eza e
-
d el icad a
R osa q ue , ao v ento e à chuva d esbotou ! ,

Ó m inh a e t ern a l ita b em amada !


, e e

Virg e m d o amor p erf e ito D ivindad e ,

Q ue ap en as pºd e s er i m agin ad a !
15 0
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

AL EM DE M I M

Quando o s ol é um s orri so d esfaz e ndo


A e scurid ã o s oturn a ,

N os m eus ol hºs também am an h ec endo


, ,

E b eij o ac e s o a lágrim a
E quand o a n oit e e sp e ctr o d e ºutr o m undo
, ,

Por sobr e a t erra d e sc e ,

T odo o m eu s er — t ão pál id o — arr efec e


E s e torn a s em m arg e n s e s e m
A ssi m a m i n h a vi da é o fi m das C ousas ,

Seu e stran ho e fantástico d estin º !


A s s erras f r a g a r os a s
E o sol astr o d ivino
, ,

P erd em s e n º m eu corpº em
-

M eu ign oto m ar ;
E nlouqu e cida e státua d e saud ad e ,

A sºn h ar e ntr e n uv en s e a
, ,

Q ue e xi st e al ém d e m im ?
S ilên ci o fri a tr e va s ol idã o ;
, ,

Um vago A zul s em fim ,

A sombra d a futura
O I! I? A S hl P L IE
'

T A S

A L MA

Ao L E O N A RD O C OI M BRA

E m tud o ch ora
Um e spírito tri st e an oit ecid a ,

A ur ora ,

S uavi z an d o em b eb e n d o em s on h o
, e vida
A p edra a água a fl or a n oit e
, , ,

A lm a divi n a do en ça e spiritual
, ,

Qu ebran d o as fºrças brutas d a Natur a


J á sobr en atural
A l m a Orig e m F on t e ;
, ,

O V erbo cri ad or . .

S ºmbra cri stal i zand o em e rm o m on t e ,

Névoa d e luz cai nd o em b á t eg a s d e


E a il im i tada l in h a q ue l im i ta
A fac e d º m eu s er ,

T ão frági l e i nfin ita ,

T 㺠pe sada d e mort es e a viv er !

A lm a vºz do S ilên cio


, ,
no d es erto ;
Fi gura d e J esus ,

Vi são do céu ab e rto ;


Mordida d e r el âm pagos a C ruz !

153
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

A lm a s ombra
, de am or e n év oa de tri s t ez a ,

T urbando o s
Prolongam en t o id e al da Natur eza ,

C on tinuaçã o d a criatura e m D eus .

A l m a sagrad o fum o da l ar e ira


,

A braçado a o cr e púscul o
Fl ech a d e s ol b eb e nd o a l ágrim a pri m e ira ,

E sp ectr o d e n ebl in a arri pi ad o e fri o

A l m a d e líri o a ard er t error


, ,

Mã os d e s ombra pintan d o apariçõ es ,


no ar ;
F a n t á s t i c o e squ el et o
Q ue d e i xa atrás d e si p egadas d e
, ,

A lm a can t o
,
M och o en e v oand o
do ,

D e l e mbran ça r e mota os m eus ouvidos ,

Na m ud ez s epulcral d as h ora s m ortas quand o ,

R e ssuscitam e m m im os Mºrt os
, ,

E as i m ag e n s d as cousas j á passadas
R od e i am m eu e spírit o saudos o ,

E têm g est os e v oz e s apagadas


E um riso

A l m a ! R essurr e iç ão !
D ram ática d esci da sobr e a
A l m a d a m ort e s ol da n oit e apariç ã o
, ,

D a l ua al ém d a
,

A lm a r e mota Vi rg e m e sp ectral
, ,

De jo el hos num calvário


,

D i sp ers o e m fri as tr e vas sobr e º qual


,

Se ergu e um tºsc o m ad e ir o sol i tário .

A l ma s ombra do L imbo con c eb en d o


,

L on gín qua e str e l a


B e ij o dºs A nj os nupcial d esc e nd o ,

D uran t e o s on o a os lábios da dºnz e la


,
.

I 54
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

QU E M S O I S V OS ?

Ao P I N A DE M O R A I S

V ej o s ombras d e n ºit e vagu eando


, , ,

Nas d istâncias b r um osas p erpassando ,

C onfusa e vagam e nt e con v ersan d o


Q u e m sºi s vós qu em soi s vós sombras e rran t e s ?
, ,

V ej o as n a luz d o s ol a m a n h ecen t e
-
,

N a can d ura d a front e ad ol esc en t e ;


V ej o—as passar n o ar
Qu em s oi s vós qu e m sois vós sombras erran t e s ?
, ,

V ej o as b ail ar n os d oid os burburi nh o s


-
,

V ej o as pairar n o voo d os passarin h os


-
,

Man ch ar a t erra bran ca d os


Q u em soi s vós qu e m soi s vós sombras erran t es ?
, ,

V ej o as passar al ém d os h orizon t e s
-
,

A ndam à luz d o luar em e rm os mont es


, , ,

Ouço as cantar no e scur o ao pé das


-
,

Q u em soi s vós qu em sois vós sombras errant es ?


, ,

V ej o as po usar n a fr on t e q ue m edita
-
,

V ej o as ard er n a cham a q ue cr e pita


-
,

Ouço as r ez ar n a t em p estad e
-

Qu em soi s vós qu e m soi s vós sombras


, , e rrant es ?
15 6
O B R A S C O M P L E T A S

Vej o s ombras nos astros p erpassar ,

Vejo as corr e r n a luz do t eu olh ar


-
,

Ouço as em t eus sorri sos


-

Qu em soi s vós qu em s oi s vós sombras


, , e rran t es ?
V ej º vagas pr e s enças m i st eri osas ,

R e p en ti n as i m ag e n s fabul osas,

A lmas d e D e us passan d o p e las


A l mas d e D eus e spíritos e rran t e s
, .
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

A S C OU S A S

Ó T âm ega nºit e és n év oa etér ea


, de , ,

B at e ndo bran cas asas .

Num grand e am or t e abrasas


E s onh as alcançar a l uz sidér ea !
Mas v a i s e a n oit e e as tua s asa s d e sc e m ;
-
,

Frouxas em pal id ec e m ;
,

Fund em s e n o t eu s ei o ; e por d esgraça


-
, ,

São q uei x um es d e dor água q ue passa , .

Sºz in h a fºnt e ,
ao Em q ue d el íri o
De ch or o tu murmuras ,

E scul pi nd o n a t erra a m adre ssi lva o l íri o


, , , ,

E sb oçando n o ar viços os ton s v erduras


, , ,
.

A t ard in h a ,

Se o t eu cantar é luar a tua água é c ham a ,


.

O cant o por m ai s al to é luz bai xin h a


, ,

E o n osso c orp o é a s ombra d e qu e m am a .

Ó n uve n s d e struind o
A m entira das f ormas e das c or e s !
O torr e nt e s d e l ágrim as d el ind o .

A al egri a d e D e us c orp orizada em fl or e s !


O árv or e s cism ando n o aband ono ,

A ouvir o rou xinºl !


C r av ej adas d e r i s os quand o o s ol ,

D i S S l pa a n év oa a fria s ombra
, ,
o s on o .

15 8
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

V AG O

AO C A R LO S R A M O S

De olhos n o A l ém Fico a ouvi r


,

O si lênci o q ue v a i d as al mas para o céu


E par e c e avivar a e str e la q ue a s orrir , ,

A o fun d o d o m eu s er asa d e luz d e sc eu , , .

E entr e n ebl inas v ej o ,

E xtátic o e squ ecido


, ,

Form as vagas ap en as em d e s ejo


, ,

T e n tando c on quistar um corpº d efinido .

D ir s e á q ue d el as n asc e a e scurid ão
- -

Q u e o n osso cºraç ã o
A mortal hou
E astr os n uv e ns aurora tudo ensombra
, , , .

C ad a aparênci a i n ert e q ue e u avi sto


E i m ag e m q u e a L embrança e ndur ec eu fi xou , .

E v ej o e m cad a c ousa o t eu sudári o ó C risto


, , , ,

I m pr e ss o a ti ntas l úgubr e s d e sombra .

N a t erc e ira ediçã d e dicat ó ria e c om a e p í grafe


o, s em
« Na l uz n o s om n a c or e e m t ud o q ua n t o p en s o H á o q ue r
, ,

q ue é d e vag o e tér e o, , E n e s t e vago q ue e n ch e


t ud o q ua n t o e i s t e xÉ on d e ha b ita o D eus e m q ue m i
,

n h a l ma
'
S a udad e q ue m e t or n a il um i n ad o e tri s t e
E q ue m e faz ch orar s em e u s ab er ( D a 2 ed i .
ª

160
O B R A S C O M P L E T A S

E m m i st eriosº e spí r ito vi v e nt e ,

A s form as vãs p e n e tro ;


E com el as m e cas o e as t ocº i n tim am ent e ,

E a sua s ombra b e ij a o m e u e sp e ct r o .

E e ss e b e ijo infin itº m e r ev e la


A D ivindad e ,

A figura l ib erta d a S aud ad e ,

Q ue me apar e c e e fal a
.
,

R e tratad a n os e rm os h ori z o n t e s
E d entro em m im b e m l ong e a con c eb e r
, , ,

P e rfi s d e e str ela ,

L ágrim as d e oi r o a ard e r ,
.

E a par e c e n a d or q ue a lua e xal a ,

D or s em n om e a ch orar n a s ol id ã o d os
,

A d or ind efi n ida ,

E m q ue todo m e e n l e v o e m e difun d o ,

P el o c éu e p elo mund o
,
_

E m mort e e vida .

E em quim érica i m ag em tran sform ad o


, ,

A ndo através d a n oit e q ue m urmura .

O meu c orp o bai xou à t erra in an im ad o ;


Pôs —
, ,

s e e m pé sobr e a t e rra a m in h a sºmbra escura


, , .
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

A M I NH A V I DA

AO A F O N S O D U A RTE

Na m in h a ald e ia V ive r ecol hida


, ,

E ntr e s on h os fantástic os d iv e rsos, ,

E sta l uz d e alm a out r ora am an h e cida


, ,

Q ue f ez m orr e nd o a n oit e d os m eus v e rsºs


, ,
.

Na r eligiºsa tard e c omºvida ,

Se v ej º os astr o s p e l o A zul d isp e rsºs


, , ,

Muitas l ágrim as tri st e s d e fugida


, ,

Vêm c on st e l ar m e us ºlhos d e Un iv ersos .

E u vivo n e st es m ont e s sol itários ,

Q ue são d e l ong e e sp e ctros d e C alvár i os


, , ,

D i stânc i as d ond e sob e e tére a

Vivº cantand o a dor m ist e riosa


Q ue am ortal ha e m S i lênc i o cada cºusa
, ,

E q ue m eu fr i o r ost o e m pal i d ec e .
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

QU I N TA D A PAZ !

A G U E R R A JU N QUE IR O

Ó casa d e m eus Pa is ! V e lh in ho pard i eiro ,

Na e n costa d e um out e ir o ,

Ond e a o s ol enc ob ertº d a L embrança


, ,

D ivaga o m eu fan tasm a d e criança :


O anj o q ue s obr e viv e à criatura
E l h e v e la d e pºi s d a mort e a s epul tura ;
, ,

E e m s eu n ºm e apar ec e a D eus m ai s i noc e nt e


,

D o q ue fora ,

A n t es d e t er vi vi do a vida p ecadora
E
A n tiga c asa j a tril hada
D o andar do O sal as q ue o luar ,

A través d a j an e l a , Q ue tri st e za
R emota e cºng elada .

S ilêncio ! E i l a ba i xan do a m urmurar


-
, ,

A osm eus o l h os q ue s ão cist ernas d e águ a


Num a hóstia d e luz assi m comun go a m ort e ;
,

A D e usa e scura q ue s e v est e


E m branco fulg or c e l est e ,

Quand o sopra à n oitin h a o v e ntº nort e


, ,
.

P o em a º
m u it o m odificad d e e diçã o para e dição N a
.

e di ção, em e pígraf e : «Ó m i n ha a n tiga O n d e vi v e


c o mig o o es p e ctr o d o (Da

1 64
() B R A S C O M P L E T A E

E a l uz d o l uar n ch endo a an tiga sa l ae

D e pa l id ez — sorri so q ue f i c ou
,

G el ad o n um a b oc a de cav e ira
D á novo cºl orido e quas e V ida e fal a
A v el h in h os r etratos d e fam íl i a ,

Ond e pousou
A asa d o t e m po ab erta e m sombra e
A lgun s traduz em ain da v el has dor e s
D esp ertas e m ,

T rist ezas afliçõ e s en l evos d a t ern ura


, , ,

Or g ul h os ri sos d e al m a
, V ed e ,

Q ue trágica i r on i a ! A vida e t ern a a cor e s !


Vid a póstum a a ó l e o n a moldura
Q ue en egr e c e em quadrado o bran c o da par e d e
, , .

Q ue p obr ezin h a a n ossa et e rn id a d e ,

N est e m un d o im p erfe ito ,

E m q ue tudo s e e xtingu e e s e r e nova !


T rist e i mag em d e tin ta q ue s e apaga ,

N o e scur o e n a
E é c om º nód oa vaga ,

C omo a cin za d um corpo j á d e sfe itº , ,

No fun do dum a

E entra o fri o l uar p el a j an el a ; ,

E n a vidraça ,

C inti l ando ,

B rinca dºid a d e luz r emota e str el a


, ,

Que fen d e u d e al to a b ai xo a n oit e prºcurandº


, , ,

Meus ol d eram nova graça


h os , q ue l h e
'

L á f ora a sombra n egra dum a cruz


,

E rgu e—se al ém dos céus


,
.

C ada mun do h á d e t er o s eu C a l vári o D eus


-
.

Vê c orr er n o I nfin ito o sangu e d e


, ,

C alvários cruz es l ágrim as s em conta !


, ,

T rag édias sobr e as quai s o s ol d e sp onta


, ,

1 65
T E I X E I R A D E P A S C O A E

C omo um san gr en to coração !


A m esm a v oz d es oladora
O m esm o D eus im plora ,

Na m esm a s em pit ern a solid ão !

P ercorro as grand e s sal as Q ue al egria . . .

V el h in ha d e outro t em pº aqui r epºusa


, , "

S in to a n e sta p enumbra in t eriºr


Q u e n os cantºs s e e sc on d e a o ver a luz
, , , do
E m in h a fac e b e ij a d e amºrosa !
E em m ág oas tran sc en d e nt e s ,

Se e svai a m in h a

E rmo vagºe ,

N estas sal as fan tásticas ,

E enquanto a m in h a i mag e m s e dilui


, ,

Outras tomam ao pé d e m im vulto p erfe i to


, , .

M eu s er hum ano a D eus e m s on hos r esti tui , ,

A d or a carn e o sangu e d e q ue é fe itº


, , , .

E sp ectros nublosos ,

R emotºs A sc end e n t es ,

E m erg em n a p enumbra q ue fl utua ,

T oda e mb ebida e m lua .

E r od e i am m e tri st es m i st eriosos
-
, , .

N el es me p erc o
d ifund o e me
Sou eu s ou e u e rran do e m outr o mundo
, , , ,

L ong e d a m i n h a idad e

E tud o para m im é trágica saudad e


, ,
.

O d i a n asc e e D a j an ela ,

V ejo fum os subin d o n a d istância ; ,

B ois r egr e ssando à c ort e ;


S ombras d o Fim a n t evi s õ es d a m ort e
, ,

O pôr d o s ol pri m eira e str ela


Se pul cro d e oiro — Ol h ai — d a m in ha i nfância
, ,

1 66
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

E n a l ar e ira ,
,

E u pon h º m e a
-

E v ej º ard e r quim érica


O fum o turva º ar .

V el h in ha s a fiar n a r oca junt o a o lum e , ,

F a úl a s m orta s ,

M och os piand o o v en t o e o s eu qu e i xum e


, ,

R é s t ea d e lua as t e l h as

Ouç o c ont os d e brux ed os ;


D e a l m i n h a s a s ofr er n a sol id ã o :
O i m agin ar d o P o vo a luz do M ed o , ,

Q u e e
,
m m im s e
,
f e z n octurn a

E v ej o o an tigº cri ad o o p a d r e A n t ón i o
,

Q ue fal ava das b r ux a s d o d e món i o , ,

D ºs F r a n c es es ( t e rrív e is p e sad e los


E c onn osc o brin cava Q ue al egria ! .

E a o sºl d a n ossa infância até s orri a


, ,

A n e v e d os s eus
E v ej o as v e l h as V ejº a I nês
C ºn t a r —
m e a sua h i stóri a .

D izia e r e p etia : er a u m a
Puxava tant o j á p el a m em ória !
E a E u s é bi o a m ais r em ota criatura
,

D e q ue m e I mag e m d iluíd a
Na d istân cia l á ond e a m in h a vida
,

E c om o n o it e e scura
E v ej o a ti a E m i l i a n o t e rr ei ro
, ,

Vinda d e long e n as a n d i l h a s e o
, ,

S eus ol h os d e al eg r ia um ar tri g u e iro, ,

Seu s of r im ent o d e al m a d isfarçado !


E v ej o a C on t a q ue p ed ia e sm ola
, ,

J á quas e c en t e n ári a ,

C urvad a s ob os an o s e a sacola ,

Passar a o pôr d o s ol n a estrada sol itária


, ,
.

1 68
O B R A S C O M P L E T A S

E B a r oa , de lut o .

Er a a tri st ez a ,

Um vul t o d e l uar m an chand o a e scurid ã o .

A inda h ºj e e scut o
S eus g e m i d os d e ag our o e d e
D e pºrta e m p orta and ava e l a q ue f ora, ,

R ica e fe l i z d e b oa ed ucaçã o
, .

T razi a um b r ev i á r i o e um guard a chuva -


,

Nas m agras m ãºs d efuntas d e viúva ,

E tin h a aind a un s mod os d e s en h ora .

E a D oi d a q ue fic ou s º zin h a n e st e m und o , ,

Julgand o v er em t odas as cri anças


, ,

Os fil hºs q u e
E em nós fitandº um n egr o ol h ar pr ofundo ,

E num a voz turbada d e l e mbran ças


Q ue o t em p o emud ec e u ,

A fl ita murmurava : m eu s a mor es ,

Meu s m en i n os ! M i n ha s f l or es
E o Ci p r i a n o o d oid o q ue fal ava
, ,

A l ém dº
A s v ez es com furor g e sticulava
, , ,

C ab el o d e sg r en h ad o e so l t o a o
E fal an d o l á i a a s ó s p e los cam in h os
, , , , ,

C h eios d e s ol e d e oraçõ e s d e
Q ue m ed o m e fazi a !
t err or s e cr e t o i gn oto e n canto , ,

Se à n ossa porta a o cair d a t ard e el e ba tia


, , ,

A ndrajºso em cab e lo ºl h os d e f ebr e e


, ,

E o D a vi m alto e m agro taciturn o


, , ,

A mpla front e im aginosa ,

T ão páli do a can tar


,

O m ed o an tigº à n oit e m ist eri osa ,

Naqu ela voz d e e scuro s om soturn o


Que pun h a s ombras n o ar :

J á s ob l a m ei a n oit e
M ei a hora tin h a
1 69
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

E o N oz es p e lo in v e rn o à chuva e a º friº
, , ,

C om a alm a abstracta e o h ábit o ench arcad o


E a l onga cab el eira g ot ejan t e .

O s eu hú m idº a sp ect o r ec ordava


O g ên i o antig o e tri st e d e algu m r i o ,

L ong e d a Fábul a e xilad o e ,

Pr e s o a um v el ho r em ors o d ivagava , ,

P e l os mon t es pr egandº o s eu
,

E A q u el a q u e d e po i s d e m orta apar e cia ,

A o luar e m e rm º
,

E n tr e as m oças d a m in h a fr egu e si a ,

F oi a e t ern a b el eza e m vulto


N o d i a e m q ue m orr eu ,

A o n asc e r d a alvorada a n ºi t e ceu , .

T ran st orn aram s e as c ousas ;


-

E av ezin has voando p e saro sas , ,

N os ramos s e e sc ond iam ;


Os altºs pín caros tr em i am ,

A s fºn t e s d avam ai s ;
T in h am g e stos d e sombra e m ed o os pi n h ei r a i s .

Nºcturn o cor r edor ,

O v e n to e m fúri a
E spal hava n o e spaço a trágica lamúria
, ,

D a sua

E h á qu e m v ej a também n a sua cova , ,

C e r tas n oit e s p ousar m i st eri osa


,

E a sua f orm osura d e d onz e la ,

S e m pr e nºva ,

A lum iand o o c orp o e m q ue fulgira .

É o som a ard er — ol h ai ! — da m in h a l ira ,

A qu ec e nd o l he a e t ern a
-
e fria c ama .

A dor sagrad a dequ e m am a ,

Por m ilagr e d e D eus


apaga ac en d e—
,

Se n o mundo s e n ºs se,

E tud o et ern o .

A branca r osa murch a p el o in v e rn o , ,

1 70
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

E , d esd e e ntão ,
E vag o e s pe ctro rran t e à luz d a
e ,

Um a V º z n a pr ofunda s ol id ão ,

Um zéfir o q ue os ram os e str em ec e ,

A lm a d e spid a e nua
Q ue a os d efun t os e a os viv os
A m inh a infância !
C laridad es m i st er i os as ,

R ecordaçõ e s saud osas


T om am figura — v ed e !
,

na
Qu e m m e e spr e ita m ºstrando e tér e a graça
, ,

D e n tr e as sombras das árvor e s v el h in has ?


Q u e m m e fal a n º v ent o q ue p erpassa ?
Qu em m e sºrri n o al v or das m a n h ãz i n h a s ?
E el a a doc e im ag e m
,

C on c ebid a n as brum as d a
S on h os q u e a t erra e xal a n o i nfin it o ;
Os m eu s s on hºs d e outrora
Q ue s ão n a tard e pál ida q ue ch ora
, ,

D i an t e d e m im fantasm as d e gran ito !


,

És tu ó m in h a i mag em prim itiva !


,

É s tu pr es en ça vi va
,

D e ígn eas c or e s .

M eu s er origin al r essurg e e s e alum ia


E s e v e st e d e fl or e s ,

C om o a C ruz n a m an h ã d a al el uia !
,

A ur ora ! i nfân ci a ! ri sº !
Visã o d o
Prim eira idad e !
Min h a saudad e !
M eu c oração em l ágri mas d i sp erso
, , ,

Na tua an gústia o cºrpº d o Un iv ers o


,

A n da a e xpiar talv e z algum p ecadº ;


O p ecad o d e s er ,

O p ecad o de am ar e pad ec er ;
1 72
O B R A S C O M P L E T A S

O cri m e i mper doa dº


D a m ís era e subl im e criatura
Q ue s end o cri ad ora e xc ed e a Natur eza
, , ,

E t e m n os ol h os um a l uz ac e sa
, ,

Q ue t e r e v e la D eus t eu própri o sofrim en to


, , ,

A tua hum an a e vi ! cari catura


D e mort e e e squ e cim e n t o .

A i d o m eu c or ação ,

I nqui e to e d ébil s ob ,
o p es o
De tr em en da e xpiaç ã o !
E n a n oit e profun da grit o e
, ,

E feb r il d el iran do v ej o e nfi m


, ,

Q ue a m in h a p r ec e é a m esm a n oit e n egra


Q ue s e e nt e rn e c e e al e gra ,

E v ejo — h orror ' — q u e n ada s ºu e m m im !


E eu s ou ! E eu s ou ,

N e ss e in stan t e em q ue vivo e j á passou ,

N 㺠ap e n as qu e m sºfr e m as a dºr , ,

A d or d e D eus ,

S entin do s e fan tasm a l á n ºs céus !


-
,

D ivin a aspiraç ã o i n a t i n g i d a ,

I r r ea l i z a d o amor ,

B aldado e sforço trágic o da vid a !

I nfânci a mês , O anj o q ue n os v e l a


de ,

Sob o ri sº l on g ínquo dum a e str el a ,

O túmul o b atid o d o n or d es t e ,

C h eio d e t erra e tudº quan tº am amos ,

Ond e e scuro e s on âmbul o cipr est e


Faz d es en hos d e s ombra c om os ,

Ó m in h a i nfân cia ,

Q ue l e mbras n a fan tástica d i stân ci a


, ,

Um a al egri a al ém t em po d e sm aiada
, , ,

D e r e p en t e fi cast e fulm i n ada


,

Por um estran ho m ed o ,

1 73
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

A pariç ã o d ivin a ,

Q ue n um pál ido g e stº


, de s e gr ed o ,

A m urm urar ,

De p en umbras ac e sas se i lum in a ,

E m m im para e u ,

V ejº o Passado r eviv e r ,

Porqu e e m m eu c oraçãº
T ud o é r e ssurr e içã o ,

A m an h e c e r .

E v ej o aqu e l as alm as e sp e ran d o ,

D oidas d e luz s eu p r óprio ,

Nas n uv e n s j á d escubr o as f on t e s m arulh and o


E a bri sa para m im é j á tumul t o e v e ntº
, , .

S aiº d º v el h o lar e scur o d e aban don o .

C á f ora o céu azul d á n ova graça


,

A s árv or e s d e spidas p el o Out on o ,

A0 passarin h o fl or e tér e a, q ue

A vi s㺠asc e nd eu a os ol hos e xt e r i or e s ;


I n cid e sobr e asp ecto s d a pai sag e m ;
D e i x ou a tran sc end ent e e vaga i m ag em
P el a fºrm a gravada a s ol im pr e ssa a cor es , .

E viva cl aridad e
Q ue d e altº as cousas tri st e s alum ia
, , ,

D issi pa a n évoa d e al m a q ue e n vºlvi a


Meu s er quas e fantasm a d e saudad e
, .

E v ej o a antiga fon t e : os d ois g ol f i n h os


E º n i c ho dond e outr ora
Um san t o cºn t em pl ava os passarin hºs
V oand o à flor d a aurºra
, .

E n as fr e stas antigas d a par e d e


, ,

A h a r m on i os a e l ím pid a fr escura
Q ue n os d e S per t a a s ed e ,

P ousava e m al egrias de
1 74
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

C an ecas a e sc orr e r d e m ão e m m ãº, ,

G uardam ain da e m l íquidº ch e ir os o


, ,

E rubr o a cr e pi tar t od o e spum os o


, , ,

A al egria o barul h o a bulli s a


, , ,

V e d e o M a n el
E nfe itand o o ch apéu com ram os d e pap el ,

Fi ncad o n o
Ve d e a M a r i a a ard e r e m V i va s c or es ;
L enço am ar e l o saia a z ul e n o c orp et e
, , ,

R i e m v e rm e l has flor es .

E n o m e i o d o adr o
, ,

A l t eand o o t om ruid os o d e st e quadr o ,

Picada d o cal or d a m osca p ers eguida


, ,

A ba n d a toca a os quatr o
E n o cobr e d os brutos i n strum en t os
A luz dº s ol faísca en ra iv ecida ! ,

E d e pºi s ,
no L a d á r i o c om o é l ind o ,

O fog o e m l ágrimas nº ar ! ,

L ágri m as infern ai s gritan d o e r ef ul g i n d º ,

P el a fac e d a n oit e a
A gora m e sm o agora , ,

Z un in do um fach o d e o ir o asc end e va i t ão al to !


, ,

E r eb en ta a e stoirar n um a e xpl os ã o d e e str el as


, ,

V e rd es azuis v e rm el has e amar el as !


, ,

T r e spassa a n oit e r ep entin a aur ora ,

L um inoso sobr e ssalt o !


E um dram a f e it o e m luz
N o c en ário pintadº a sombra d o I nfin it o
, ,

E m n e gra cruz
D e d or ,
O fogo antigo d eus m orr e num grit o
, , ,

S angrando c or !

V ej o a carval h a n ova d a A v el ed a ,

O c a r r ei r i n h o q ue pºr el a passa ,

R i scando a branco o e scuro

1 76
B R A S C O M P L E T A S

E ,
bai x o o al p e ndr e o e irado a m eda
e m , , , ,

O s o! um pas sar i n ho q ue e svoaça


,

Um a am pl i d ão ab erta s obr e o v a l
V ejº os gran d es s obr e ir os com ram ag e m ,

D e bronz e im óv e is quas e a o d oidº v e n tº


,

Q ue en ch e d e voz e s m ortas a pai sag e m .

E e ntr e e l es n um s e cr e t o i s olam e n t o
, ,

Jun t o a um a cruz d e p edra avi st o a C a p el i n ha , ,

Q uan d o j á i n d eci sºs d a n oi tin ha


, ,

E rm os vultos s eguiam p e l a e strada ,

A sacol a n as m ãºs e a os o mbr os um a


E v ej o o Cr a s t o Va l d I n fa n t e O u t ei r o
,
' '
, ,

A ca s a d a s a l m i n h a s a ,

L abar edas d e Q ue b r a s ei r º !
Q ue afl itas m ãos e rguidas
A r ezar !
S ilhu etas abraçadas e lambidas
P el as ch am as dº f og o e xpiad or .

Outras al mas e xtáticas , ,

A custa d e oraçõ es r ezadas com fervor , ,

J á n ão sofriam .

R e v el açõ e s e scuras d o I nfi n i to ,

I ngén uos cultos pri m iti vos d o m eu Povo !


A h como tu eu cr e i o e m e com ovo !
, ,

E u cr e io sim n as alm as ; acr ed ito


, ,

Na dor s obr e viv end o e n º p e cado ,

D epoi s d a vid a p erdoado ,

E m virtud e das n ossas oraçõ es ,

Quando e m nós a E sp eran ça in abal áv el r eza


, , ,

Muit o emb ora g elad a d e trist eza ,

C rucificad a e m n e gras afl içõ es !


Vej o P a r e d es e o s eu grupo d e pin h e iros ;
L uzes ,
B oco, A r g a vi ça e R oci ão, out e iro s ,
T ão s ó s , q ue o p ovo t em e ,
Se , às h oras do si lên ciº o v e nto ,

1 77
T E I X E I R A D E P A S C O A E E

Ali ,
apar ec e à luz d o luar
n ºs , ,

O q ue sºm os n o A l ém : o nºss o i magin ar ,

Q ue o fri o m ed o
C ond e n sa e e scul p e e m form as d e
G r and e s vul t os d e sºmbra m i st e riºs os ,

Fantásti c os e stran h os an imais


, ,

E r m as luz e s n as tr e vas flutuant es


, , ,

L obis om en s tr otand o a o longo dºs pi n hai s


E d os cam i n h os t e m e r os os .

B ruxas dançando e rin d o e m v olta d o d iab o


, , ,

C om asas d e m orc eg o e pés d e cabra e rabo


E n a front e c o r nuda un s ol h os
, ,

Fan tasm as d e h om en s a cavar a t erra :


O d ram a d o trabal h o j á e sp ectral
E
A n t evi sõ es Fim sin ai s d e p est e e
do ,

Voz e s d e alm as faland o n a ,

_
T oda e ssa vida ign ota q u e s e alumbra
Na noit e q ue D eus f ez e D eus
E l ogo s e e vapora ,

Q uan d o as T ri ndad e s da m an h ã rad iand o aurºra , ,

E spalh am nódoas brancas p el o

V ej o a ca s a d e Mei os ,

P e rto dº r i o d esl izand o , ,

Murmurando
Fluidas cor es :
O cl ar o v erd e t en r º m argin al ,

O azul o v erd e escur o d o pin hal


,
-
,

O v erd e d os c e n t e io s ,

O oir o d o s ol em cham as de e spl e nd or e s .

E ao vê l a n a d istância
-
, ,

E voco s eu passad o d e al egria ,

Quas e d e sfe it o em n uv e n s de inc ert eza


E d e m el anc ol ia .

1 78
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

F i g ur a çoe s d e c or pos fal ecid os ,

E m po e i ra j á p erd id os ,

Q ue e m m atéri a d e sºmbra r essuscitam


, , ,

E nquan t o n as ram ag e n s d o ci pr e st e
, ,

B atidas d o n or d es t e ,

Os m oc hos fún ebr e s

E xi st e al i o D e sc e nd e n t e ,

O cu l p a d o q ue d oida h e rança fulm in ou ;


'

A ver g ô n t e a e m d el írio e trágica e d em e nt e


Q ue ficou . .

Q uas e lºuca também ,

A pobr e m ãe ,

E n tr e as p en umbras roxas d a n oitinha ,

P e l os m ont es pass e ia a rir s º zin ha


, , , ,

Um riso d e svairad o e abrasador ,

Q ue n os p erm it e ver
A própri a d or al egr e d e s er d or
, ,

A e xal tação d a d or s en tindo s e viv er !,


-

A nd a s em pr e d e luto A sua m ágoa .


,

E is 0 v e st id o e t ern o q u e e l a usa ;
E t em n a fac e l ívida e c onfusa
, ,

N egros o l h o s d e febr e ch e iºs , de


E d entro d el e s bri lh a
, ,

Um círi o alum ian d o


E r e v e lan d o
A mort e dum a

R ecord o E st ou a V ê- la ,

Num di a d e
Olh os azuis — t ão branca os lábios a sorrir . .

E r a a graça o V iç oso en c a n t
,

B ondad e e m flor al ma cri st ã l íri o do va l


, ,
'
,

S an ta I sab el d os p obr e s d e p ed ir .

1 80
O B R A S C O M P L E T A S

De r e p en t e i ncl inou a front e emur ch ec i d a


, ,

F eita de n e v e pura !
Q ue m om ento ,

A qu el e em q ue s eus pai s doid os de s ofrim ento , ,

B ai xaram ain da e m V ida


, ,

A s epultura !
Ó dram ática ald e ia aban d onº ! de
Fam íl ias q ue s e e xtingu em ! V el h a s casas ,

Ond e º v ento s e qu ei xa e pa i ram sombras d e asas ,

P el o
E ao l ad o o an tigo
, , folh as d e erva ,

C an t ei ros e pass e iºs i n vad in d o .

A fon t e s ecº m árm ºr e n ã o chora


, , .

E aqui e al ém abrindº
, , ,

E rm a saudosa fl or q ue ain da c ons erva


,

O arºm a d o passado a cºr d e outr ora , .

Pard i ei ros ruín as n um


,

Mortas l am úrias d e
E um son ho antig o a S on h o en cob ertº ,

Fantasm a d e saudad e .

A njo d e brum a a voar ,

C om as asas tol dan do o azul d os


A nj o q ue vem d o m ar ,

S onh o e ncob erto D eus . .

Ó sítios d e alm a alum i ados do m eu can to !


,

S ítios q ue eu a mo tantº !
S ois t ão vivos d a m i n h a comoç ão ,

Q ue ch ego a im agin ar q ue a v ossa t erra


J á o m eu corpo en c erra
E q ue j á sou fantasm a a errar n a , ,

O b erç o do me u s er !
O m on t es s ol itári os ,

L eg end ários .

A ltar e s para m i m com l ágrim as a ard e r


, ,

E a im ag em d o S en hor n o dia d a Pai x ão , .

181
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

Ó l embranças ! M em ó rias !
Ó sombras i lusórias !
Vultos d e n ev oe ir o
Q ue t ão s a ud os a me n t e p ovoai s
O val e o erm o out e iro
, ,

D ºnd e sob e a o luar a r eza d os


E nt e ndo —
, ,

vos a fala

E sc ura q u e s e e xala
, ,

N º céu ºnd e vivi quand o er a


, ,

Um ec o do outr o Mun d o a p ercutir s e al é m ; -


,

Um can t o d e S ilênci o j á d ivino , ,

u e só ouv e qu e m ama o p oe ta e m ai s n i n g uém ! ,

el e q ue m e i n S pi r a .

S e ntind o o l ogo vibra a m in h a lira


-
,

A os v e ntos dº Mi stéri o .

A infin ita canç ã o p erc orr e o e spaç o e tér eo !


D eus com ovidº t orn a s e m ai s tri st e ;
, ,
-

O s eup erfil ch e i o d e n uv en s r elam p eja


, , ,

A sua voz prºfund a e côncava tr ov ej a


, ,

E é fe ita a sua cruz de tud o quan to

A m emóri a é tamb ém castig o R ecordar .

E a m ort e e scura e o q ue el a nos rºub ou


v er .

E ouvir qu e im ad o em s ed e murmurar
, ,

A font e q ue
T E I X E I R A D E P A S C O A E h

Mont e s d a m in h a ald e ia à l uz cr e puscular , .

I m ag e n s ind isti ntas ,

Murm úri os e s e gr ed os ,

Tr ist e zas a
B r a n c ur a s d e n e bl ina r o xas ti ntas , ,

A pariçõ e s e
C inza d e o iro e l il á s o v e n to ,

Uma saudad e vaga ,

Um a auréola d istant e q ue s e apaga ,

Pr e ss en ti m entos vã os da n egra

M on t es d a m in h a a ld e ia ,

E rm os ch eiºs d e graça à luz da lua ch ei a


, ,

Q u e s obr e e l es n um g e st o aér e º e spal h a


, , ,

L ágri mas d e alva e fria


A s ombra s e e xtasi a o v en t o cism a , ,

A bsorto me cºn c e n tr o e vºu and an d o


, , ,

P ºr e ss e t e m pº al ém d o ,

C om o é r e m ota e v e l ha a n ossa idad e !


C om o a r ec ordaç ã o d om in a o esqu eci m en to !
A h d e sd e quan d o
,

Viv em os ? C om o eu sin t o a m in ha vida ,

Na prim itiva n oit e j á ac endida , ,

J á pr ofunda arraigada n a m emória


, ,

R adiand o a luz d o amor :


O am or o e t ern o s ol an t eri or
,

A o sol q ue é a sua i mag e m tran sit ó ri a


,
.

Ó pín caros s oturnos ,

A s horas e sp ectrai s !
s ombra e d e rumor n octurnºs
C a r v a l h i d os d e ,

M och os piand o aos ,

B l oc os d e p e s o e tr e va d e n s os m ont e s , ,

L ongínqu os h oriz ont e s .

T érr e as ondas abrin d o em branca e spuma


E pétalas d e brum a .

1 84
O B R A S C O M P L E T A S

Nas suas form as paradas ,

C intila em bril ho e scur o a pal pitant e


, ,

F l uid ez de tran sparên cia m a r ul h a n t e


D e quan do foram vivas e

Ó m on t e s d o ori e n t e ,

C ob e rtos d e oiro e flor es ,

R ev er d ec i d os ,
Com ov e l h as pastan do a o s ol q ue , d e c on t ent e ,
Soa n a rud e fran ta d os past or e s !
V erd es fol h as m ord idas d e zumbidos ,
S on s d e água cain do , al an do s e em fr e scura ; -

A rd endo em po eira os áridos cami n h os ,


Ond e a s ombra a r ezar dos p obr ezi n hos
Par ec e f e it a dum a cinza escura !

O sol am igº !
O Sºl d a e ira !
O sol país pin tan do a
d o m eu ,

O s ol b eb en do a s l ágrim as da chuva ,

D oirand o o trig o ,

Marcando as l argas horas d a can s eira


E do trabal ho .

Mantº d e S Martin ho ! O sol d os n us !


.

Sol m en ino a s orri r n o c oraç ã o do orva l ho ,

S ol po en t e pr egado n um a cruz !
-

Sol das cigarras S ºl d i vin o d o m eu s er


, ,

O s ºl d a cotovia ,

Nas p edrin has d o ch ão a

O s ol ,
m áscara e t ern a d a A l egri a !

Mont e s d a m in h a t e rra ;
D egraus q ue v ão fin dar n o gran d e t e m plo a s erra ,

Ond e jaz um silên ci o do ºutro m undo ,

E tão profundº ,

1 85
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

Q ue a g ent e ouv e pairar n a qui e tação , do v en t o ,

E ss eíntim o d i álog o e n tr e nós


E º n ºsso p en sam e nt o
E assim s e cria a A par i ç ã o a V ºz , .

M ont e s q ue s oi s meu tri st e c oraçã o ,

Ond e m orr eu cantand o um , ,

F r a g ue dos d e alm a e m ê xtas e subind o ;


, ,

S on âmbulos pastºr e s fin cad os n o b ordã o ;


Ove l has s obr e os píncar os bal ind o
, , ,

Fi tand o º pôr d o Sol


M ont e s d a m inh a N o m ais alt o ,

E rguid o em rºch a dura ,

A pr egoavam as al m as d o S en h o r ,

P e l a Q ua r es ma e scura
Q ue e stran h a v oz f un ér ea e s obr e hum an a -
,

L ançando o sobr e ssaltº ,

O sacro h orror ,

Na sol itári a e m ís era c h oupan a !


E a ssi m pr egais ó fiéis n a s ol e dad e
, , ,

T oda abafada e m e rm a e s c ur i d a d e :
A l er t a ! A m o r t e é ce r ta !
E c s d a qu ebrada : A l e r t a ! A l er t a !
os e o

E o silênci o e m fantástic o alv or oç o


, ,

D e súbito acordado , ,

Orava n o céu r em ot o e c on st elad o :


A ve M a r i a
-
P a d r e N os s o .

E em cad a l ar humild e — q ue tri st eza !


,

R ezavam oraçõ e s ,

C riaturas d e outras e ras : p obr e z in hos ,

P ast or e s lavrador e s j á v e l h in hos ;


,

Vultos fe itos d e s ombra e d e m agr eza


E de
L á fora o e scur o o m ed o os cã es
, , ,

S ilênc i os q ue s e faz e m a i s do v en t o , ,

S ombras d e árvor es bul i ndo .

1 86
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

O G ÉN I O D O M E U LAR

A A L BER T O D E AR A! J O

V ej o um a S ombra escura
Q ue s em p r e q ue e stou só jun to d e m im m urmura
, , , .

E fujº e t en ho
,

E s e ol ho para trás s eu vult o d e s egr edo


, ,

E rgu e s e n o ar saudoso q ue e ntrist ec e


-
.

Ond e qu er q ue e u e st ej a a S ºmbra me apar ec e ;


,

E b eij a o me u e spírito en cantad o ,

Quas e e ncarn ad o
És tu s ombra d ivi na essênci a d o meu dia
, , ,

O s ol r e cordaçã o q ue m e alumi a
-

E v a i o m eu esp ectro d e s en h ando ,

E apagando
M eu c orpº q ue s e p erd e e m s ol id ãº
E s e torna in vi sív el coraçã o .

E j a mudad o em po e ira ,

Fria cinza d a l ar eira


Q ue o v e nto e spal h a n o ar
, ,

Ouv e um a Voz can tar


A p er f e ita can ção a r eza i n c on c eb i da
,

Q ue é a própri a fon t e origin al da Vida ;


A n évoa d º Pri ncípi o a S ombra e sc ura
,

Q ue s e m pre q u e e st ou só j unto de m im m urm ura


, , ,

1 88
O B R A S C O M P L E T A S

A O S PO ETA S MO RT O S !

Po etas q ue r epousai s ,

A sºmbra dum a cruz ,

D ebai xo do i nfin ito e squ e cim en to


E das l ágri m as do

S ant os s e pulcros m ármor e s , ,

S obr e os quais ,

E m caract er e s d e ti nta e scura e dolorosa ,

A s fun erárias árvor e s


E scr e v e m ao luar d o Outon o e d e J esus
, ,

A d ivin a can ção m i st e rios a


Q ue e mud e cida d en tr o e m V ós fi c ou
, , ,

E ao t ú mul o bai xou .

P ublicad o p e la I v ez n a 4 ediçã o c om es ta s varia n t es :


.
ª
.
ª
,

S ep ulcr os on d e P oe ta s r ep ous a i s
, , , ,

D eb ai o d º i n fi n it º es q ueci m en t o
x

E d a s lágri m a s d o
S agrad os m ár mo r es
S obr e os q uai s ,

E m caract er e s d e s o m bra d o l or os a ,

A S fune rária s árvo r es


E s cr e v em a o l uar d o Ou t on o e d e J es us
, ,

A di vi n a ca n ç ã o m i s t e ri os a
Q ue d en tr o em v ó s fi c ou emud eci da
, , ,

D ura n t e a v os s a
E n um cal vári o e t er n o é s emp i t er n a cr uz !
, ,

1 89
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

I NVO CA ÇÃ O !

Aº E D U A R D O M AL T A

Ó n oit e vem daí ! P e rc orr e o m eu cam in ho !


,

Vês e st e l ouco e rran t e ? E nv olv e o n o t eu m an to -


,

E scur o e pobr e z in ho ,

On d e e m s egr e do e xist e i lum in ad o can to


, , .

C om o n ão h ei d e amar a n oi t e d olºrida
-

E o s il ênci o q ue abrang e o e r m o céu pr ofundo ,

Se é tamb ém um a n o it e a m i n h a tri st e vid a


Q ue anda a pairar tal v ez por s obr e u m outro
[ mundº ?

P ubl ica d o p ela 1 .


ª
ve z n a 4 .
ª
e di çã o .

ª
. D p br l uc
: o e o o ? Env l v —
o e o no teu ma n t o , 5 . D Na:

bra n da es c uridã o azu l d o t e u cari n h o , Va r m s :


. . T d o o b or
dad o a lu m a s n gr o e p br ezi n h o
z, e o ,

1 90
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

A i t e é para m i m um a es tra n ha al v orada


no ,

N uv e m fi lha da L u q ue é um gra n d e m a r s e m
,
z,

E s e d ei x a e s ta T e rra e m tr e va s s e p ultada
, ,

Q ue dia q ue e pl e n d r n ã é para o utr o


,
s o o

N i t e t u é s a l u d m un d q ue e u ha b it o
o ,
z o o

I n d e fi n id o m un d o a s i m c om o um clarã o , s ,

Q ue n um a m o r p erc º rr e e s e az u l i n f i n it o
, , s

Q ue e i s t e para alé m da n o s a A s piraçã


x s o .

d t ud t e r m i n a é q ue e l e pri n cipia ;
On e o

O es pa ço é um s e u li m it e a l uz o s o m a , , ,

E vag c m o a a l m a e tér e a da har m on ia


o o

Q ue s e ex ala d o s e i º i mat erial da

So m bra i o S º l d o m un d o m i s t eri os o
s, vó s so s ,

O n d e m i n h al m a V i v e a s ua e t e r n idad e ;
'

E e mb ora s ej a para o s o utr o s n ub el ºs ( s i c)


, , o ,

É es s e So l a v erdad e ira C laridad e !


S i o s i n fi n it A m r O p ur o o lhar d e D e us
o o o , ,

O S m bra s q ue d u ra n t e a n o it e m e apar e ce i s !
o

V ó s s o i s a L uz q u e e i s t e alé m da l uz d os cé us x

E d o n d e t oda s vós e s tr e la s , ,

C oi mb ra , 1 898 .

Ve rs ão d ef i ni t i va

Aº A NT ÓN I O C ORR E I A DE O L I V EI R A

V ou através d a nºit e
— E ss e i nf i n it o e n egr o coraçã o
D e fantástica V i rg e m dol orosa .

2 . C : —6 CD . :

1 92
O B R A S C O M P L E T A S

T em m orta s v oz e s d e al m a a s ol id ã o ;
E xalam n a p e nu m bra os v e rd e s ram os
, ,

Vag os s ilên c i os d e ínt i m a oraç ã o .

O q ue e m nós vai m orr e nd o o q u e s on ha m o s


. , , , I o

Vest e d e branda m ág oa a t erra


S omos tudo o q ue tr i st e s c on t e m pl am º s , , .

B ranc o m árm or e
fluid o a luz d a lua ,

E o s egr edo das c ousas v e rbº e scur o ,

Q ue n º céu alto e pál i do flutua , , .

E s º zin hº a bi s m á t i c o pr ocur o
, ,

D ar e m pal avra h um an a e r ev e l ada


, ,

O q ue , e m nubl oso e S pí r i t o, murmur o .

E a m in h a l ábiºs d e sp ertada
v oz , n os ,

P õ e s e a cantar al ém d o e nt e n d i m e nt o ;
-
,

Ébr i o d e alm a s eu canto n ão d i z n ada


,
.

O B e l eza s em fi m ! D e slumbram ent o !


Mas s em ol h os q u e a v ej am ; e n l ouqu ec e
E l embra as n ºssas l ágrim as ao v e n to !

Quan ta vida in corpó r e a n os e m p ec é !


Quantas vo z e s de n º i t e por nós ch am am
, ,
!

E qu a n to d i a à n ºi t e é q u e am an h ec e !

Sou c omo a lua e os d oidos q ue Só am am


O nºcturn o cr epúscul o i nc en did o
D e al m as s em n om e q ue n os e rm os clam am ! , , 30

8 C Mu
ra m a o l uar os v erd e s ra m o s D : E m an a m
: r mu

o s v e rd e s ra m o s —12
. ,
, ,

a o l uar C : q ue n o E r m o c on t em o

.
, , ,

m r m c t m pla m 1 1 CD : D i
'

p l a o s D : o q u e n o e o on e os

em voz h u m a n a — 1 8
. .
, ,

zer CD : O q u e em n ubl o s o e s pírit o


mur mur o 2 3 C D : v e ja m ; arr e fe c e —24 CD : l em bra d oi
, .

da s lágri ma s —30 CD : q ue n os e r mos cla m a m !


. . .

1 93
T E I X E I R A D E P A S C O A !

V e d e a sºmbra d o mundo e scur ecido ;


A v e l h i c e d as c ousas q u e p erd e ram
O s ol a rosa V i va o c ol or i d o
, ,
.

Nuv e n s n e gras d o t em po arr efec e ram


Se u c oraçã o d e fo go rad i and o ,

Man h ãs q ue para s empr e an oi t e c e ram


, , .

E m undº e s cur o vi v e lastim and o


o ,

A qu e l a an tiga idad e e m fl o r ac e sa , ,

Q ue e m m eus ol h os é l ágrim a cantan d o


, ,

O espírit o d ivi n o da T rist eza .

31 . C : 34 . C
lágri m a s d o
: As t em
36 . CD Ma hã : n s q ue para em pr e a n oit e c era m
s .

1 94
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

D iz ei qu em s oi s fan tasm as d e outras V idas,

Q u e rod e ais m eu s er ?
S er e i s al mas e stran has e pe rdidas , ,

Qu e d e sc e st e s c omo e u à t e rra
,
s e m sab e r ?
, ,

O s ombras m ist eriosas ,

S er e i s a e t e rn a fac e int eri or


D as e rm as cousas ,

Q u e o silên ci o d e sv en d a à m in h a d or ?
Ou s er ei s p orv e n tura
, ,

P obr e s A nj os q ue º s ol abandºn ou ,

R e duzin do os a pál ida fi gura -

Q u e ,
e m sua m e sm a tr e va a n ºit e m ºd e l o u ?
,

D ivin a cl aridad e
F eita p e numbra m orta à fl or dº meu olhar ? ,

D eus e m fantasm a ignoto d e saudad e


, ,

E scur e c endo a t erra e m v ez d e a alum iar ?


'

S er ei s fºra m im n a s ol idão
,
de , ,

Vidas d a m in h a vida ?
L e mbran ças d º m eu tri st e cºraçãº
C an tand o al ém d os céus , ,

N a luz e spiritual am an h ecida ,

Na luz q ue d á r e l evo et ern o e vi vº a D eus ?

18 C Fa ta
: n sm as C S mbra — 25 CD
22 il ê ci
: o s . : o s n o

? — 2 1 CD
. .

re v e l a m i n ha d or C rp d A j q u a L u : o os e n os e z

aba n do n ou — 2 9
.

,s a . CD u pr ó pria tr va a
: it m d e ,
no e o e

l ou ? 30 CD : C laridad e
.

1 96
O B R A S C O M P L E T A S

O m un do em fri a tr e va s epultad o
E n um s ilên ci º amortal h ado !
Oh q ue d e s erta e scuri d ão !
N egra e r em ot a abóbad a m arm ó r e a ,

I ncrustada d e l ágri m as e ri sos :


Pºn t os d e luz m arcando i nfe rn os paraísos , .

E m c im a o ri so e t ern o d a I l us ão ;
E m ba i xo a e t ern a L ágr i m a i lusór i a .

C ada e str el a
N os r ev e l a
C riaturas paisag en s q ue a l um i a
, ,

A l uz quas e i nvisív e l do s eu di a
, , .

D i stan t es
Fulguraçõ e s astrai s murm úr ios cin ti l ant es ,

D o ígn eo v erbº d e D eus in d efin id o , ,

D e sc e m d o Vago e t ér eo ;
E gan h am n o m eu s er e spi ritua l s en ti do
, ,

E s ão v ersos d e amor e d e m i stér iº .

1 . C: Em e í
p gr a f e : V i v e ,
d en tr o d e m i m a al m a da ,

Nat ur eza ; C om ig o ca n t a e r i c om ig o ch ora e r eza E s o



,

n h a o q ue e u ( D a 2 e di ç ã o ) 2 C : s e p u ltad o ª

—3 C : —4 CD : Oh q u e n egra Sºl i d ão !
. . ,

CD : 0 n oit e e s c ur a ab ó bada 6 C : ri s os ; —1 1 C : Mi s t e
«
. .

5
r i os a m e n t e n o s — 1 6
. . .
,

CD : d e D eu s q u i m éric o e p erdid o
.
, ,

18 CD : E t om a m n o
.
, .

1 97
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

Poss ess o d e saudad e e m torn o a m im cºnt em plo , , 20

Vult os d º meu
E a noit e é gran d e t e m pl o ,

Num aband on o trágic o à s ,

E um silê nci o d e mort e


Pare c e i n t errogar as c ousas : pi n h ei r a i s ,

R och ed os q ue o luar fund e o v e nto nºrt e ,

M ordid o d e

Paira em tudº um a v ºz
, ,

E e ssa voz q u e é p e numbra


,

E j á fºi luz e vida ,

O meu i nqui e t o e spírit o d eslumbra ,

Para q ue el a traduza a D eus n um a oraç ã o , ,

A d or d a
E D eus s en tin d o a ouvind o a c om amor
,
-
,
-
, ,

Há —d e tamb ém s entir a própri a


Porqu e ai n as p obr e s c ºusas
, , ,

Muito emb ora e m fant asma D eus e xist e , .

N ºs s eus ol h os o s ol e o m undo tri st e,

São l ágrim as saudosas

O dram a de e xistir ! Mi stério ! A l t o s egr edo !

21 CD : —22 C é er m t empl : o o,
—28
. .

C aba d
: nl ú g ub r e à s
on o 25 CD : E m m eu
i n t e rr o ga — 2 8
, .

s er, C Paira e m t ud o um a V oz q ue e mud e


.
, ,

Um c â n tico apagad E m n é v oa o,

M or ta vi s ã o d o —D : Paira em t ud o um a V oz em u
— 2 9 C : E o s il ê n ci o d a s c o u s as q u e — 8 0 C :
, ,

—31 C : O m e u s a ud os o es pírit o — 32 CD Para q u e e l e


. .
,

trad uza — 35 C : s en tir ta m bé m


. .

. C : N os s e us o lh os ,

o m un d o o s ol a n oit e tr i s t e
, , L em b ra m lágri m a s s a n do
L ágri m a s c uj a e s f e ra de pi edad e B r umo s a da ,

di s t â n cia , R e fl ect e o v ul t o e m fl or da s ua i n fâ n cia E di


D : N os s e us o lh os o s ol e o m un d o tri s t e S ão lá
,

gri m a s E s f e ra s d e pi e dad e S us p en s as n a di s
E n e la s s e r e fl ect e a s ua i n fâ n cia E
1 98
T E I X E I R A D E P A S C O A E

O ADA M A ST O R

A R A UL B R A ND Ã O

Partir ! D iz e r ad eus à ta r d e s obr e um , ,

Vi sõ es dº oc e an o e d a
G e nt e apr e ssada turbam ulta ,

S ire n e s a chorar ,

A braç os b e ij o s
, ,

Mã os pál idas c om l en ç os ,

S audad es tr em ul and o ,

N o a z ul d o

V ou n av egando A s d errad e iras


"

T e rras d a m in h a i nfância ,

I n d ecisas e r oxas c ordilh e iras


E scond e m —
,

s e d e tod o n a d istância
, ,
.

O meu País d e e t ern o Outºno !


R uín as pi nh ais s ol pôr sºmbras do q ue passou
, ,
-
, .

A tua A rt e n a v i l trist ez a s e apag ou


E morr e m os t eus D eus e s n º abandonº ! ,

Q ue n egra s ort e !
Ó m i n h a Pátri a ó túni ca d e C risto ,

J ogad a e es farrapada !

Na 3 .
ª
e diçã o ,
e m e pígraf e : « Vi n º v º cé
s us co m n ov

e s p e ra n ça s .
( Da 1 .
ª

2 00
O B R A S C O M P L E T A S

E rmº d a P e n itên cia ond e e u avi st o ,

A e S pe r a nça a gr i tar d e s e sp e rada , ,

L utand o com a m ort e !

A d eus ó m in h a ald e i a ! E rm o lugar b e n dit o


,
.

R osas d o meu j a r d im orval h o s m atin ai s ; ,

L ua ch eia t ão alta n o i nfin it o


, , ,

E par ec e t ocar a ram a dºs pin h ai s .

S ol itárias ch oupan as da p obr eza


Q ue sois al ém um a estr el in h a ac e sa
, , ,

A porta d a l ar e ira ,

Quas e ab erta m ostran dº as cham as d a fogu e ira


, .

F on t e s can tan d o em v ers os d e água um n ovo am or


, , .

A Ca p e l i n h a a e strada a o sol vin h e d os ;


, ,

O L a d á r i o e scul pid o e m íngr em e s r och ed os ,

A e str e l a d o past or :
L ágri m a d e o irº e d e s ilên cio a ard e r , ,

Na agon i a cristã d o entard ec er .

A d eus m in h a j an el a ol hand o a
,

O montan h osa s ol edad e ,

Na qual vagu e i o em sombra d e saud ad e , ,

E m fantasm a d e v e n to n év oa e t e rra , .

A h s em pr e q u e e stou l ong e m e tran smud o


, ,

N e ss e t eu s er e n orm e e em p e d ern id o .

Sou tudo o q ue a mo e vivo e m m im p e rd id o , , ,

Pºrqu e ai m in h a pr e s ença abrang e tud o !


, ,

E ou ço a l usíadas cantar
v oz d os ,

Nos h oriz on t e s fl uidos d e água e espum a ,

Ond e v emos às v ez e s p erpassar


, ,

O e sp ectr o d e N eptun o a d e s en h ar s e em brum a -


.

Ó voz das D esc ob ertas q ue m urmuras ,

B ai xin ho n os m e us v ersos
,
.

Vagas r egiõ es d o e spírito às ,

P enumbras de Un iv e rsos .

2 01
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

E ouvi nd o a
,
do A tl ân tico e do v en t o
v oz ,

J ulg o ouvi r os L u s í a d a s q ue s ão
Outr o pr ofund o Oc e an o ,

E m on das d e t ão alto s e n tim en t o ,

Q ue d e ram vid a e t e rn a a º coraçã o


D e st e Pov o m aríti mo e s erran o .

C amõ e s alm a d as ondas am or osa


,

E t e m p estuosa ,

A r ezar a m an h ã d e n ev oe ir o ,

A l uz original

C amõ e s al m a sagrada
, e uni v ersal .

A mºr pr i m ei ro !
P él ag o de saudad e ab i sm o
, de harm on i a .

Sºl -
Nosso , e e t rn o Pa i do nosso d ia !

E m ed itand o
E através d o meu sºnh o n av egando
, ,

Para as b an das doiradas do Nasc ent e ,

D e scubro d e r e p e nt e
, ,

S e lvag en s arvor edos rum orosos ,

País es m aravil h os os
E outr os m ai s l ong e a inda ,

L á on d e a t erra finda
E pri nci pi a a e str el a m atutin a
E a R egi ão

Ó m eu son ho e ncob erto d a A v en tura !


V e rtig e m d º R emoto d es v a i r a n t e !
T error d o A bi sm o ! T e ntação d a A l tura !
Nocturn o v en t o a l um i a n t e ,

A c ord and o a po e ira a c inza d o Passado, ,

I n suflan d o l h e um h ál ito inflamado


-

Q ue ac enda d e ntr o d e la, ,

C omo fe cunda luz d e n ova estr ela !

2 02
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

O m ar s e r en o ê xtas e d e água
, ,

Ó l ágrim a i nfin ita comungand o


A altura d o O v e rd e coraçã o ,

S uav e m e nt e d e e n cºntr o à t e rra


,

G aivotas pousai s
q ue
Nas rºch as on d e º m ar im pri m e os s eus fur or es
, .

S on hos d e espum a fl or e sc end o os l it orais ,

T r e me l uz i n do cor e s .

A m an h ã d e sp ontava rad i osa , ,

Quandº e stran h a Vi s㺠m ist eri osa ,

A nt e m im s obr e as ondas s e
, ,

E o m ar e m v olta d e la al v or oçado
, ,

Mar brav o d a A l eg r i a
F er v eu r ed em oi n h ou
, ,

C om o s e à lu z d o A m or h ouv e ss e dado
E ssa e str e la fan tástica d o dia !

Num a voz cr e púscul o e d e e n can t o


de ,

Q ue o ar n ão tran sm i tia m as s º m e nt e ,

O si lênci o q u e pr en d e i n tim am ent e


N oss o e spírit o tri st e àqu el e can tº
S e pult o e vi vº e m cada c ousa obscura ;
Num a voz de cr e púscul º murmura :

Fui a s ombra dº m ed o ;
«

E ss e m e d on h o vul t o q ue o luar
E sboça n o arvor edo
, ,

Q uan do o p erfi l dº v en t o é d e g elar ;


E n as e n cruzil hadas d os cam i n hos
, ,

Há d emô n i os e d oid os
E os hom en s e ntr e l ívid os t e rr or e s
, ,

A braçam n egra d or d esc on h ecida ,

D ºr m ºrta e r e ssurgida ,

A qu ela d or fantasm a d e outras dor e s


,
.

2 04
O B R A S C O M P L E T A S

A m in h a A pariç ã o ,

Os n autas assustava ,

Quan dº e m f r a g ued os saibro e scurid ão


, , , ,

S in i s trº prom ontóri o as ondas p en etrava ;


,

E o m eu r ouc o bram id o r e tumbava ,

Por t oda a n e pt un i n a s ol id ã o .

E u dan t e s fui a
, ,

M in h a s ombra d ep oi s am an h e c eu ;
, ,

T ingiu s e d e o iro e r osa ; e j á s e el e va


-
,

Na luz d o

C hor ei d e l i m eus ossos f r a g a r os os


, ,

R ec on struin d o e m carn e d e b e l eza ,

M eus gran d e s m embr os t en ebrosos ;


Min h as fe içõ es d e t erra e d e

Sou a alm a d º trágicº G igan t e ;


E ss e t e rror d o an tig o n av e gan t e ,

R ev e lada e m p erf e ita cl aridad e .

Eu s ou o A d am ast or em al m a de saudad e . »

E r e p e n tin a arag e m
Murmurava s egr edos d e paisag em ;
D e s e n h ava a o passar a s form as fin as
, ,

D e r emota s mon tan h as e cam pin as ,

N o m eu prºfundo ouvido i nt erior ,

Q ue por um eco vagº e in d efin idº


, ,

R e con stitui o out e ir o e o val e em flor ,

On d e el e s e s entiu

V e nt o da i n spiração ,

Q ue m e traz e s d e al ém s on h os d e encan to ;
, ,

Pr e s en ças d e luar e viva cºm oção :


A m atéri a saudosa d o meu can tº !

20
5
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

T ambém n as e rm as tard e s e m
, q ue r ezo ,

Eu n a m i nh a pr e c e V ou com el a
v ou . .

Muit o e mb ora m eu corp o a o mund o e st ej a pr e s o ,

E u vou até p ousar n a m ai s l on gínqua e str ela .

P or ond e nós andam os s e m sab e r !


,

Q uantas v e z e s o n ossº própri o s e r


Há d e e nc on trar e tér e as c r iaturas
-

E h á d e ficar a ol har a ol har c o m o às e scuras !


-
, ,

E m c e rtas h oras ,

R e ssurg e m v e l ha s aur oras ,

D e ntr o d e nós .

E m m im q ue e stran h o e spírito d e lira !


,

A m i nh a s omb r a é a s ombra dum a l ira !


E o si lê nci o d e D eus paira n a m in ha voz !

S ulqu e i m ar an tig o da
o

E ssa i nfin ita m ág oa


C aída outrora e m ondas d e água
, ,

D o céu
Q ue s ofri m e n t o nunca vi sto
A d or brutal e norm e d a Natura
, ,

Q ue d ivi n a s e f ez n o c oraç ão d e C ri st o !
E sob e e m n evº e iro e tudo tran sfigura
A sombra dº
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

L o ng e d e
m im d a t e rra e m ai s d o céu pr ofund o
, ,

Ouço as c ousas can tar s eu fún eb r e


C omo o e sp e ctr o d e D eus ens ombra o mund o ,

A s h ºras d o s ol p osto !
-

Ó saudad e d e D eu s ! D or cósm ica ! T ri st eza !


Ó m ág oa i nd efin ida ,

N a qual s e p erd e além d a m in h a vi da


, ,

E sta pr es en ça morta q u e m e p esa !

L ong e d e tud o s ou quim é r ica


,

A própri a C ri aç ão ,

E m corpo d e silêncio e sol id ã o


E o s eu fan tasm a e t ern o — a
O B R A S C O M P L E T A S

A O C RE P ! SC U L O

Ao F A U S T O G U E DE S TE IX E I R A

Ó trist e s l áb i os m e us r e zai r ezai !


, ,

E a h ora sim d o E n igm a E i s o m om en to


, ,
.

D a e xtr em a un çã o da E tud o va i
C om e l a E só n ºs fica o p en sam e n t o !
.

P e l a flor q ue m urch ou n o esqu e ci m en tº ;


P e l a asa q ue s e e l e va e l og o cai ;
P el o sºl p e l as n uve n s p e l o v en tº
, , ,

O trist e s l áb ios m eus r e zai , r ezai !


,

R eza i por tud o quan tº a morte l e va ,

Nas h oras do l or i das e m q ue a tr eva


,

Mostra s eu n egrº vul to q ue


E si nt o , m im um vago horror profundo
e m , ,

Um a tr i st eza j á d e f i m d o mund o ,

C om o s e n un ca m a i s houv ess e
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

A D O R E O M ED O

Q uando s º zin ho noit e m orta r ez o


, , ,

E a m in h a voz d os m ed os m e d efe nd e ,

E a tudo à t e rra e ao céu me sin to pr e s o


, , ,

Vejo q u e a d or é a força q ue n os pr end e .

E n l ºuq uec i do d ealm a canto e r e zo


, .

A flig e m e º s ilên cio Qu e m n o e n t e nd e ?


-
.

A sombra me s uf oca E n egro p e so ;


.

E e m fum o do m eu c orp o s e d e spr e nd e


, , .

Ó n ºit e trist e nºit e q ue apavora


, ,

G ol p e ad a d e e str el as a ,

D esnort ead o o v en t o clam a e chora !


,

E qu e m Qu em sºu ? Na n oit e
s ou eu ?
— O m edo à m ºrt e c erta q ue h á d e V i r -

E a d or d e s er h um an a cr i atura .
T E I X E I R A D E P A S C O A ]

T raz ,
l h os d e f e br e aqu e l e e spantº
n os o ,

D e qu e m ousass e ver a mort e rºsto a rost o ! ,

E m tud o j ulga vê l a : -

N o v oo dum passari n h o ,

Na cav e ira a surgir d a fac e dum v el h in h o


E na n oit e q ue e spr eita a rir por um a , ,

Para m im afin al eu sou a Vida


, ,
.

Se à l uz d º d i a os ol hos fe ch o o m und o ,

É todº
O pºbr e criatur a fal ecida ,

A º t eu g e lad o túm ulo prºfundo


B a ixou d e sfe ita e m so m bra a E t e rn idad e !
, ,

S obre ssal tado inqui et o ch or o


, , e ci sm o ,

A luz das
A lma n o t eu n a ufrági o o
, , q ue tu l evas
C ontig o para o A bi sm o !
,

N est e sºmbrio val e a sós d ivago , , ,

A tard e e n o clarã o d a m adrugada ,

E a m i n h a d or fantasm a a d or e xtasiada ,

E long e ; aqu e l a d or
Q ue am pl ia a sua n oit e e m pl e n o vagº ,

D o nosso c oraç ão ,

E é s ilên cio d ivin º e m


A dºr º san t o e spírito d o am or
, ,

A m ãe d a human a criatura
E da
A d or s em n om e e t ern am ent e , ,

A d or origi n al a d or e ssên cia ;


,

A l ágrim a ond e D eus e stá pr e s en te ,

P orqu e ch ora n º m un do a sua


, ,

A dºr q ue vai da t erra para os céus .

E os tr i st e s v ão cºm el a em sºmbra
, , de a n s red

A d or saudad e
, ,

2 12
B R A S C O M P L E T A S

A MO R SA U D O S O

D ivag o l á, por fora .

S i lêncio Um luar
E mb eb e s e n a sºmbra ; e um pássaro
-
a can tar , ,

J á t em nos ol h os de alm a a l uz da aurora


, , .

A paisag em é ap en as um e sboço ,

Um r e ssurgir d e
E místi c o alvoroç º
A gita os arvor ed os c om brandura , ,

D eS per t a v e l has dor e s ;


E pe lo outon º r essuscita as fl ore s
, ,

D o m eu j ard im
E tºm a vulto hum an o ao pé d e m i m , .

E e l a o ignoto e n cant o ;
,

A virg e m pura ,

A vi rg e m q ue n o mundo me e m peceu ;
, ,

D on z el a apar e cida n o meu


E el a a m ist eriosa criatura
,

Que para m i m
E sp ectro d e mul h e r ,

A n oiva e t ern a e m orta d o m eu s er !


A qu e l a q ue me b eij a e m e d e slumbra !
E, m
e s eus braços de f ogo e de p e numbra ,

Na 3 ed i ç ã o e m ep í gr afe : E m t udo em t udo ex i s t e


.
ª
,
« , ,

1 E t e rn idad e N um a lágr im a e x i s t e a n os s a R e d en ç ã o
,
.

A cr editai a té n o q ue n ão há E e s s e i m po s s í v e l e s s e n ada
, ,

É o m es mo q u e che gar a D eus O q ue


: us ta ch egar a D eus s e D e us é ,
A cr editai ! A cr editai !
(D a

2 13
T E I X E I R A D E P A S C O A E

A rr ebata meu d oid o c oração ,

Q ue ch ora e gri ta e canta e s e e xtasia ,

E s ob e ao r e in o e tér eo d a T rist eza ,

L á on d e finda a luz d a C riaç ã o


,

E a noit e d o I nfin it o pri nci pia .

E e l a a S ombra
,
e e t rn a de b el eza
R el igiosa !
Mºstran d o a bran ca front e e spl end orosa ,

A l ém d os
Na l uz q ue el a d i man a é q ue apar ec e D eus .

D eus stá n as cousas do Un iv ers o


n ão e .

A o e ncarn ar a id e ia m orr e E m cada v e rs o


, .
,

R e pousa o po eta
R e zada é j á fan tasm a ín tim a pr ec e ;
,

A d or q u e s e cond e n sa e m l ágrim a arr efec e


, , ,

E a C riação é D eus j á m ort o e s e pultad o .

D eus viv e D eus e xist e


, ,

N ão em sua obra human a errada e trist e , ,

Mas em r e motº vulto d e l embran ça


E de

D e us V i v e n a S audad e comº outrora , ,

A n t e s d e con c eb er a nº i t e e a luz d a

A saudad e d e D eus é o próprio D eus ,

D espon tando n a azu l f l uid ez dos céus ,

Fa l ando à n ossa d ºr
E a o nosso
E D eus human izado é D eus J e sus , ,

Pr egado n um a cruz !
A dor e mo assim n um grand e altar
-
lo ,

D e t e rra portugu e sa .

É pr e ciso r ez ar can tar e trabal har ;


,

T er esta força d e alm a e de c ert eza


!

2 14
TE R R A P R O I BI D A
e d i çã o : 18 99 ; e d i çã o : 19 17 ; e d i ça o
1923; ed i çã o , in
'
« O bras C o m p l e ta s» s /d ]
,
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

Q ue m ágoa d al ém do mundo
'

T ud o e n s ombra !
A paisag em q ue e r a i n ert e
, ,

Se li qu efaz e con v e rt e
Num m ar pr ofund o
D e sombra .

Quando a tard e v em d os céus ,

R ez e m os e n t㺠a D eus
A n ossa m elan col ia :
E st e vag o s en t im e ntº
D e abandºn o e s ofrim e n t o
Q ue º n oss o s e r
E tºdo e n e voad o ci sma
, , ,

E n º s eu n ada s e
, ,

Na tri st ez a da paisag em ,

E l e v em os n ossa im ag e m

R ez e mºs a mort e e a vida ,

R e z em os a n ºssa d or :
E sta p enumbra q ue cr e sc e ,

D en tro d e nós e e scur e c e ,

T odo o m undo em ,

E com o r e zam as font es ,

P elos m ont es ,

O s eu rosário s em fim
D e c ontas d e água ,

R ez e m os a n ºssa
D e us h á d e vê la
- -

E sofrê l a ;
-

C om D eus s er e mos
O B R A S C O M P L E T A S

AD E U S

Partir ! Parti r ! E a força d º d e stin o ,

A qu ela sºmbra n egra atrás d e ,

Um ad eus m e p ers e gu e d e m e n in o ;
Para diz er ad eu s ao m und o v i m .

S ou s em pit e rn o ad e us ! V ou me
-
e ncarn an d o
Nas form as dº m eu própriº
D esgr en h adas figuras sol uçan do , ,

D i z em s e ad eus n os long e s d o meu


-
, s er !

A d e us ! O carro fog e O so l d esm ai a.

Um g est o um l enç o tr e mul ando a o


, ,

D epoi s a tard e agr e st e q ue s e e spraia


, ,

Num a onda d e n egr o s ent im ent o .

E v ej o confund ir a m in h a ald ei a
-
se

C ºm as nuv en s al ém d os
,

D el a m e fal a a trist e lua c h e ia ,

Q ue em s eu al vºr n eg r ej a m erm os mon t e s


, ,
.

E v ej o o t eu p e rfi l i maculado ,

C omo e sculpidº em branda e et ér e a mág oa ; '

De suav e e d i stant e é j á sagrado


, ,

A n t e os m e us ol h o s d e alm a rasos , de água .

221
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

Nos t eus c am pos divagas a cism ar , , ,

C an tan d o aqu e l a trágica e l egia


D e qu e m s ºz in ho à n oit e n o s eu lar
, , ,

Vê s ombras fog o e xtin to cinza


, ,

E a s av es i n oc en t es q ue a t ern ura
,

V e st e de e tér e as asas p elo e spaç o , ,

Ouvin d o os t eus can tar e s d e am argura ,

Mºrtas virão cai r n o t e u r egaç o


, .

Eu v ej o t e
-
, A m in h a d or
L e mbra a i mag e m viv e nt e d o t eu r ost o .

Sofre r é s er c on tig o e t ern a F l or, ,

Q ue d e s t e vida e t e rn a a o m eu d e sgºst o .

A g ora viv er e i t ud o quan t o


de
E m ai s q u e tua angél ica pr e s e nça ;
I sso q u e n o t eu s er é j á m e u can t o
, ,

E e m l ágrim a divin a s e c on d en sa .

P or aqui meu A m or i r e i vi v e n do
, ,

D a sombra q ue t eu vult o e m m im d e i x ou , , ,

Q uan t o t e d iss e ad eus e o s ol morr endº


N os t e us olh os — t ão n egr os — s e
, ,

Viv er e i d um a e t ern a D e sp edida ,

P or e ss e m und o a o D eus dará d a s ort e ;


,
-

L ong e d e t i q u e és a m i n h a vida
, ,

P ert o d e m i m q ue s ou a m in h a m ort e !
,
T E I X E I R A D E P A S C O A E

E si nt o m e afºgar
-

Na lágrim a q ue s ou ,

T od a ac e sa por d entrº
, ,

A r efl ectir e str e la


E m q ue t eu c oraçã o
Outr ora s e abras ou ,

Quan d o sºmbra s e fez


T eu vult o d e d onz ela .

C on tigo vai m in h a l m a '

can ta e ,

Se às horas da tardin ha
, ,

E sv oaça e m pal id ez ,

C an tiga d e saudad e
E long e q ue um a vez
, ,

M e ficou s epultada
E m orta n a ,
B R A S C O M P L l
I
l
'

CA NÇÃ O TR I STE

M e lan cºl ia .

Vul to e sparso de mul h e r


A nda n a m in h a al egria
, ,

A pad e c er .

D onz e l a da m in h a
P e rfi l d e flor
Ou d e l ágri m a sºrri n d o
S orri so q ue n ão é d el a ,

Mas d um a e str el a .

S orri so e tér eo cain do


D e ssa fan tást ica a ltura ,

On d e ergu e a fr ont e n ub l osa ,

D e en c ontro à L uz in cri ada ,

A noit e e scura .

Ó T rist eza b em am ada !


R oxo l íriº branc a rosa
, ,

S e m pr e me l embro d e t i ;
D essas hºras q u e vivi
A sombra d a tua graça ,

Q ue e svoaça
L á n a t erra em q u e d e scan sa
Meu cadáv er d e cri ança ;
Fri a cam pa d e ab an don o
Q ue e u vi sito m editand o
,

2 25
T E I X E I R A D E P A S C O A E

E soluçando ,

Nas tard es r oxas d e outon o ,

A O v en t o friº e g em ent e ,

Q ue s opra as cin z as d o po e nt e .

Ó T ri st eza , q ue és pr es e nça
M á r m or d esfe it o e m luar ;
'

N év oa astral q ue s e con d e n sa
E m bran ca e státua c om V ida , ,

N ess e A l ém ,

D ond e n os v em
A I n spiraçã o a can tar , .

D oc e e m ística T rist eza


Q ue , por m im bai xin ho r e za,

E q ue
E , suspirand o, d e l ev e ,

Faz vibrar a m i n h a l ira


Q ue s e d isp e rsa n o céu ;
E é nuv e m q ue e scur e c eu
D e e m si traz e r
, ,

T ant o r e l âm pago a ard er


E tanta n ev e !

O T ri st e za m ai s q ue tri st e !
Meu s ol

L embran ça d um B e m q ue e xi st e ,

N ão s ei

A qu el a V oz q u e r e sp ond e
A o m eu d e s ej o ;
E ss e i n f i n d o e e tér eº
-
B e ijº
Q ue paira s obr e o t eu

Meu d e s ej o : b orbºl e ta
E rm a e pr e ta ,

A l m a tri st e d e
E m d i as n egr os de chuva ,

226
T E I X E I R A D E P A S C O A E

E ntr e os quai s branco , de m edo ,

Me p e rd i !
E pus m e e ntão a cantar
-
,

N e sta e rm a n oit e q ue s ºu ,

Mas n ão a poss o d or m i r .

Sem sab er para on d e v ºu ,

A n do por m im a ch am ar
E and o a fugir
A n d o p e rd id o n a b rum a
D os t eus N em m e v ejo !
Morro d e im ortal d es ej o !
Sou pr e s e nça q ue s e e sfum a
Ou c orp o q u e a t erra c om e ,

E n quanto a bri sa out on al ,

Fri o h ál it o m ortal ,

S e m e i a m ágoas s em n om e ,

G em i dos n egr os d e ag ouro ,

S on s f i n ados brônz eo chorº


, .

N os t eus son hos vou s on han do , .

Sou im ag em d esl izando ,

A fl or dum rio profundo .

S ºu i m ag em r efl ectida
N e st e mundo .

Pr ocur o o corpo d ivino


Q ue me e nvia ; a r eal idad e
Q u e e m m im s e f ez ilusão
, , ,

S ºmbra e rrant e do D estino .

Prºcurº aqu el a E sp eran ça


Q ue j á trist e e arr efe cida
, ,

M od elou m eu c oração
E m m atéria d e saudad e
E d e l embrança .

N os m eus s on h os t e pr ocur o , ,

C om o qu e m va i p elo e scur o , ,

A tact ear a tr em e r
,
.

228
) B R A S C O M P L E T A S

Só e m ti e ncºntrari a
A qu e l a antiga al e gri a
Ve rdad eira ;
A luz prim e i ra .

Qu em t e pud e ra pr e nd e r
Num d oido abraçº !
E d orm ir n o t eu
Qu em t e b eijara e ssa fac e ,

Q uand o o s ol can tan do n asc e ,

D al ém dºs m ont e s ;
'

E f ei to hum i ld e s orri sº
, ,

I lum in a um paraíso ,

D en tro dº choro d as fon t es .

O T rist ez a ,quis e ra
b em
V er t eu vul t o d el icad o
A o p é d e m im ;
C om o outrora ,

Nas m an h ãs dº m eu Passado ,

Vi a an dar no meu jardi m


, ,

A Prim av era ,

D e m ãos d adas com a A urora .

V em , T ri st eza é j á ta rd e
, q ue .

O p oen t e é um círio q u e ard e ,

E n tr e pin hais .

S ob e o fum o d os casais ;
E os tºqu e s d e A v e Mari a -

D oiram d e m el an col i a
Os long e s d a m i n h a m ágoa ,

B rum os o s quai s lon g e s d e água


,
.

V em a m im ! Qu ero t e ve r -
,

E mbora s ej a m orr e r
P ousar m eus l áb ios n ºs t eus .

V em a m im q ue a m in h a vid a
,

E m t i s erá r en ascida ,

L á n os c éus .

229
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

UM D O S M E U S D IA S

D i a trist e d e i nv ern o Q ue amargura .

A d e sta claridad e fri a e b aça !


A os m eus o l hos as cºusas d e sfi gura ;
N ão h á l inh a g en ti l q ue n ão d e sfaça .

A tran sparênci a azul d o céu tortura


E a c or l il ás dos mon t e s am e aça ;
D esbota o m im o t e nro d a v erdura
E a cada fl or l h e d e sp e a e tér ea graça .

E rm o po eta doido v e nto


d e g ên i o, o

Vai r ec i tando v ersos d esva i rados ,

De e stran h a d or e i gnoto s e n t i m e nto ,

A s árvor es da t erra aos e scarpados ,

R och e dos fantást i c o torm ento


q ue ,

P el os m ont e s d ei xou p etr i f i cad os


,
.

2 A : Q ue a m arg ura — 3 A : A d ta es l uz d o s ol
pálida e b a ç a l —õ A : d es fa ç a l —B : O cl ar o azul BC
. .

A
O m e ig o az u l —1 A :
. .

B : a m ea ç a ; C : E a c or d os
m on t es a m e aça ; 8 —
.

9 A : E s s a d or i d a c or d e d e s v e n t ur a Q ue
— 1 0 A : E s se
.

u m r o o v é u p or
x s o br e o
:

m un d o
P o e ta d e gé n i o o l ouc o v en t o — 12 A : d e es tra n h o s en ti
.

m e n t o ! —1 3 A A S árv o r e s q u e e l e d e s p e e a os e s carpa
.
,

d o s —1 5 A : P e l os m on t e s d e i x º u
.
,

.
, B C : P e l os
m o n t es d e ix ou p e trificad os .
T E I X E I R A D E P A S C O A E

ME U C O RA ÇÃO

Na t erra um a s em en t e p equ en in a
,

A br e aº s ol em sorrisos d e v e rdura
, , .

E o rubr o raio ac e s o q u e fulm in a


R asga o s e iº d a nuv e m q u e é t ern ura .

Ao longo d e e rm a e pálida c ol in a ,

Um doc e fi o d e água anda à pr ocur a


D e algum a rosa angélica e d ivin a ,

A bandon ada e morta d e s ecura .

Meu fºrt e c oraç㺠também n asc eu


Para cr i ar can tan do um n ov o c éu
, , .

N i n guém l h e e nt en d e a m íst i ca h armon i a !


L embra r e mota e str e l a d e sm aiada
Q ue m a l s e V ê n a abóbad a azul ada
, ,

Mas para um outr o m und o é grand e


, , di a .
O B R A S C O M P L E T A

A M I NH A H IST Ó R IA

As DUAS

( 1 8 7 7 - 1 90 1 )

Á rvor e s da m in h a ald ei a ,

E u qu ero v os c ontar a m in h a Históri a


-
,

Quan d o v em d o Marã o a lua ch ei a


D e fria luz m arm ó r e a .

Só v ó s e n t en d er e i s aqu e l e ºut on o ;
E scuro s e n ti m en tº
De dor e d e ab and ono ,

Q ue ch ora n º m eu can to ,

C omo chora também n a voz d o


D or q ue suspi ra i n édit os s egr e dos ;
A d or q ue traz a noit e n o s eu pranto
, ,

A s n uv e n s e os p e n edºs .

A dor m ist eri osa ,

E ss e l uto fant ásticº e s em fi m


Q u e m in h al m a v e stiu d en tro d e m im
'

, ,

Na t erra e spl e n dor osa .

E m Nov embro n asci por um a tard e tri st e


, ,

Quand o os sin os soluçam bad a l adas ;


E l ú gubr e s m ul h er es d e soladas ,

2 33
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

C ºm pi edosas m ã os e spal h am fl ore s


, ,

S obr e a e stéri l p oe ira q ue ainda e xist e


D e s onh os e d e am or e s ;
C i n z as d e al m as p e r d idas j á n o A lém ;
C in zas d e ód i os q ue foram vivo lum e ,

C inzas d e A nj os sub ind o n um p erfum e , ,

C inzas d e d e n in guém !

Nasci n o d ia e l e ito d a S audad e ,

Quandº o vult o e sp e ctral d a E t ern idad e ,

D i ant e d e nós quim éric o s e el e va


, , ,

C om e str e l as a rir n a m áscara d e tr e va .

E t em g est os abs ortos


Para os bran cos s e pul cros p en sat ivos ,

Ond e a tri st eza em l ágri m as d os vivos


, ,

B eij a a al egri a toda em fl or d os mort os


, , .

Nasci n aqu e la tard e angusti osa e cal m a , ,

To rva d e nuv en s e silênci os d e alm a ,

Quand o h á pál idas fac e s q ue s e mol ham ;


E h á l íri os vi ol etas bran cas rosas
, ,

Q ue sobr e o e scurº tumular das l ºus a s


, ,

A c huva s e d esfol h am
, .

E n os l ívid os m árm or e s m ºl hados


Se e mb eb e d e água a sºmb r a do ci pr e st e ;
E n as ondas g e m e nt e s d o n or d es t e
A n da um fum o d e círi os apagados .

N asci ao pôr d o s ol dum d i a d e Nov embrº .

O meu b erço º cr epúscul o e mbalou


E até par e c e às v ez e s q ue me l embrº
, , ,

P orqu e essa tard e trist e em m im ficºu , , .

E m m im ,
em im l uz i n vi sív el ard e
m , ,

O s ol ag on i z an t e d essa tard e
E do i ra a i nd a os píncar os d a

2 34
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

Mís era e v elh a s ombra p ers egu ida


P e l o prim e iro s ol d a m in h a vida
Q u e v a i p e d ir asilº à s p obr e s cºusa s :

M ortas r ec ord açõ es m ist e riºsas


D a passag e m d e D eus pºr e st e mund o .

E t e rn am e n t e enfe r m o
Fiqu e i s ºz in hº e pál idº n e st e e rm o
, ,

De e scurºs b oc os l ívid os pin h ai s ;


,

M ont e s c om o r e trat o a san gu e d o s ol p osto ; -

L e i r i n h a s s ecas p e l o mês d e A g ost o


, ,

E m agr os b ois q u e m ug e m ;
E ol iv e iras com idas d e f errug em
E rgu e m n a tard e os braç os e sp ectrais
, , ,

E xtáticas d e

Fu i cri ança q u e o líriº c ondoíd o

D a própria sºmbra e m fl or ;
Um anj o ouvind o a n egra T e ntaç ão ,

V end o s eu friº corpº e m ur c h ec i d º ,

C om as asas d e luz m anch adas d e p enumbra ,

D ifundir s e n a tr e va q u e o d e slumbra
-

E s er em v olta d e l e hum an a sol idã o


, , .

E d a m in h a i nocência bran co altar , ,

J á m e v i a fan tásticº e d isp ers o .

E ra a cri ança d a altura dº s eu b erç o


, ,

A fundura dº túmul o a e spr e itar .

Eu er ao c ond enadº
B em ant e s d o p e cad o :
O an t e r em orso e stran ho d e viv er
-
,

Porqu e o supr e m o c r im e é n a v e rdad e s er , ,


!
D ar um n ovº s e n tid o à s form as d ol or osas ;
E d ar a cada l ágri m a um s orris o
, , ,

E um a n ova oraçã o às al mas


Ser o g r itº d o d ia d o Juíz o !

2 36
O B R A S C O M P L E T A S

E e n tr e as outras cri anças me e ncontrava


T ri st e s il e n c i oso ; e t i n h a m ed º
,

D as sºmbras d o arvor e d o ,

A gitadas n um ín tim o rum or ,

E d a lua e sp e ctral e m s eu p er fi l m inguant e


E d o m e u c oraçã o p r e c oc e e d el irant e , ,

Q ue er a fora d e m im A lguém q u e m e
, ,

A lguém q ue e m c ertas h oras m e apar ec e ;


, ,

E n um g est o sombri o q u e arr efec e


, ,

E spal h a n o meu r ost o a pal id ez in qui eta


, , ,

Q ue é r e m orso fatal n º p e cadºr


E q ue é d ivin a in spiraç ão n o Po eta .

A s l ástim as dº v e n t o ,

Fol has murch as d oirand o o n ºssº i s ol am e nto ,

Os v e l hos p obr ez in h os ,

C harc os d e lod o a o lºngo dos cam in h os


, ,

A r efl e cti r os céus ,

C om o d entrº d e nós eS pl en d e à s v e z es D eus


, , , , .

Ma n h ãz i n h a s d e n évoa m i st e ri osas , ,

Quan do d esbotam n o j ard im as rosas , ,

E h á cor e s m ortas ris os apagados ,

E ramºs
O fri o i nv ern o
B rum os o cor d e cinza s e m pit ern o
, ,
.

A s r e zas jun t o a o l ar ,

A m e i a n oit e em l ágrim as d esfe ita ;


-

Min h a A vó j á v e l h in h a e t r êmul a a fi ar
, , ,

Os cri adºs d a casa conv ersan do ,

Históri as d e l adrõ e s d e bruxas quan do , ,

O m edo e scuro lívido e n octurn o , ,

P ºr um a frin ch a d o postigo ,

E ébrios d e s ombra os cã e s vad ios l at e m


, ,

A os d oid os v ent os n um cl amor ,

E a l uz pi e dosa e tri st e d a can d e ia ,

Q ue faz sin ais à arag e m p en etran t e ,

S ono l enta d e fumo bruxul e i a , .

2 37
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

E n egras asas bat em


N os vidr os das
E d ep oi s um silên ciº inqui e tant e .

E ra a n oit e d e lut o a e rrar n a sol id ão , , ,

Q ue m e vin h a p ed ir pousada a o coração ,

E n e l e me d e ix ou r ev e laçõ es
, , ,

O luar a luz d o d ia
, ,

O t em p o q ue passou ,

O T âm ega o Marã o v oz e s can tan d o o A mºr


, , ,

E i s a e stran h a m atéri a q ue f orm ou


Meu s er q ue f oi d e p ed ra ant e a A l egria , ,

C era n as m ã os da D or
, .

C h eg ou fim a i dad e
, por , ,

E m q ue o prim e iro ad e us n os e n tri st e c e .

O anjo d a n ossa i nfânci a d esfal e c e ,

E r e n asc emos log o da saudad e .

A ban d on e i e ntão a m i n h a ald e i a


, , ,

E os s eus m o nt e s d e e n can tos e brux edos ;


S e us e rmos arv or ed os
De cor e s outon ais ,

A l ua ch e i a ,

M en digas a r ez ar n a l uz d a tard e, ,

E rãs a c o axar e m águas m ortas


E um silên ci o a cair da ram a d os
A s l av ouras e m Mai o os cam p os d e ,

E d on z e l as q u e s ão estátuas d a t ern ura ,

E f e s tas a o S e n h o r cançõ e s d e roux in ol


, ,

E passarin h os flºr e s m an h ãs d e sºl !


, ,

P r im e ir o ad e us s em fim !
Nasc eu me n e ss e di a a s ombra q ue pr oj ect o ;
-

E st e vult o n octurno d e e squ e l et o


Q ue p e l a v ez prim e ira n os abraça
, , ,

E n os d e strói assim
O in efáv el e ncant o o m im o a e tér ea graça !
, ,

2 38
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

Mug e m trist ezas d e alma .

A f ebr e d e V iv e r arr efec end o acal ma


, , .

E os d e s ej os d a carn e e n san g u en tados


, ,

E rgu e m pál idas m ã os e r ezam n a p enumbra .

A lua surg e muit o


, Q ue aurora
Os píncar os d e slumbra
E os pi n h ei r a i s
E a i mag e m d a M e n in a e M oça t ão s º zin h a , ,

A cl aridad e r oxa d a tardin ha ,

A par e c e n os
Olh a e m V ol ta d e si põ e s e a , e chora -
.

M en in a q ue e nc ontr e i n a t erra à luz d o céu


, , .

R el âm pag o q ue tudo e scur e c eu !


Fl or m urcha n um i n stant e em pl en a prim avera !
, ,

F 101 m urch a à l uz dos círios !


,

Flor s e pultada em r osa s cravos l íri os , , ,

Fri a d e o l h os fe ch ad os c or d e c era !
, ,

A lm a d a m i n h a al m a
Ó Mort e q ue ficast e a s er a m in h a vida !

Para C oimbra parti d epois em c ert o


, ,

D e e scur e cid o in v ern o ,

D oen t e d e saudad e e d e
E n um a p obr e zi n h a s e pul t ura
, ,

D e i x e i m agoad a rosa d e t ernura ,

A d e sfol h ar s e n um ad e us
-

E m m im j á d e spontava
, , e m rm o sºnh o abso r to
e ,

E st e e sp ectro q ue sºu e m e p erm it e ver ,

E m vida , à luz d o sºl , o q u e h ei d e -


s er ,

E m sombra à l uz
, do luar d e p oi s , de m orto .

Em m im qu em s e comove e canta num d e líri o


, , ,

Na pal id e z d as m ãos traz endº um roxo l íri o


, ,

A trança d e spr e ndida e sobr e o bran c o r osto


, ,

Mais sombras e oraçõ es q ue as h oras dº sol post o ? -

240
O B R A S C O M P L E T A S

A h qu e m r ez a c om igo à tard e
, e me ab enç oa ?
Qu e m me fal a d e am or e m e p erd oa ?
Qu e m é q ue n ºs m e us s on h os m e r ev e l a
Mist e ri osa e str e l a :
Al egr i a d e luz q ue me tr e spassa
E d e ntr o e m m i m ac end e e tér e a graça
, , ,

Um rasto d e oraç ã o por D e us o uvida


Um luar q u e m e b e ij a a al m a a d or ni eci da ?
,

n os m e us ol hos põ e un s ol h os d e pi ed ad e ?
,

A m or E sp ectr o D ivindad e !
, ,

C ri ado e m a l tos síti os gran itº de ,

Na vizin h ança agr e st e do I nfin ito ,

D emor e i m e b em tri st e a c on t e m plar


-
, ,

Uma v el h a cidad e e m m á r mor tu m ul ar


,
'

Num a pa isag em doc e e an êm ica e sb oçando ,

S orri sos d e v e rdura jun to d e ,

O m ai s é med i ev a e té r e a M ág oa,

E m c ol orid os cam pos


Ora subind o em íngr em e s c ol i n as
, ,

Q ue têm g e st os v e l h in h os d e ruína s ,

E rm os pin h ai s saud os os .

Ora d e sc e n dº em val e s pen u mb r os os


, ,

E l egias d e
E fil h o dum a E str e la 0 R i o l eg end ári o
, , ,

N o cr e púsculo e nf e rm o é l íqui d o sud ári o ,

C om a e fígi e dram ática d os c éus .

E em todo vago amb i en t e à luz d a aur ora


º , ,

Na sombra d a tardin h a ,

E vivo com o outrora


, ,

O fan tasm a de I nês v e stida d e R ain h a .

S ºbr e o Mond e go e as m arg en s flor e scidas ,

E n évoa q ue f l utu a .

D e noi t e à l uz da l ua
, ,

Nos e rm os o l iv e dos ,

É zé fi r o a ba te n do as asas fa l ecidas
-

24 1
T E I X E I R A D E P A S C O A E

Vu l to e svaíd o em múr mur os


E sp ectro d e sgr e n h ado ,

E m g e m idos d e l ouc o s enti m en to ,

Nas ruínas à c huva dum c on v en to


, , ,

J á quas e subt errad o


E n as tard e s deOutubro ,

Quand o o pº ent e m ac erado e rubro


, ,

N os s algu e iros d o r i o ,

P õ e gan gr en as d e m ort e e rºxos ton s d e frio ,

— Vê s e o e n t erro d e I nês fantástico passar !


-
, ,

D uas fil as s em fim d e luz e s am ar e las ,

E ºs s inos q ue h á n o m undo a os v en t os a d obrar


, , ,

E e n tr e o l uto do povo o chºro d as donz el as !


, ,

C oi mbra é a l enda o luar a , ,

A tri st e za m ed i eva a s ombra d os pin hai s ;


,

O can t o past ori l C amõ e s a sºl id ã o


, , ,

A e l egi a da t erra em m i st erios os


,

E J oão d e D eus e A n t ero :


O infin ito m im o e o gran d e d es e s pe ro !
C oimbra é a nossa Mágoa ,

E m r el evos d e argil a e font es d e água


E c h oupos tão v elh in hos q ue um a v ez , ,

N a sua infân cia e m flor viram passar I nês !


,

E a paisag e m n oviça tri st e d a S audad e


e ,

S an ta I sab e l d o outono e rm a paisage m do e nt e , .

D e ol hos v e rd e s n o céu m ostran do ao sol po ent e, ,


-
,

R oxas m ac eraçõ es d a sua d ivindad e ;


Um a fr e irin h a m ística a r ezar ,

No s eu h ábito bran co d e
R e za o Passad o e xtático e profundo
, ,

O Padr e Nosso todo pod eroso -


,

Q ue an im a dum s entido h armon ioso


, ,

A s n ovas t entaçõ es q ue t em o m undo .


T E I X E I R A D E P A S C O A E S

C omo se acas o I nês o esp ectro do


, , t eu vulto ,

Para m i m tran s m igrass e por


, ,

Q ue e l e murmura ºculto , ,

N o m eu
E figura a surgir d a m in h a c omoç㺠,

C omo da n év oa o R e i S ebasti ã o ;
A d ivin a saudad e q ue n asc eu
C ºm igº ; e noit e e d ia
E s e m pr e me ac om pan h a .

Virg e m d e ol h os azuis q ue fal ec eu


E apar e c e e m luar n os v e rs os d a E l eg i a
, , .

A e sposa d e M a r â nu s n a Mon tan ha , .

A P e rf e ição o L íri o a Virgindad e ;


, ,

A m ística D onz e l a fabulosa ;


Quim érica R osa ,

Fl or sobr en atural d a m in ha Sºl ed ad e .

O meu amor pri m e iro


Q ue m e em pece ;
T al v ez o m eu D e s ej º s em
d estin o
Q ue s e f ez pr ofe ssand o e tér e a Pr ec e ;
, ,

E é h oj e a m in h a s ombra d e s olt e i ro ,

C om o fºi m eu sorri s o d e m e n i nº .

A tua d or I nês é irm ã das font e s ;


, ,

E n os ermos cr e púsculos soluça ,

E n o e scuro dos
E s obr e as almas trist e s s e
, ,

E m ata a s ed e à s rosas p el o e stio ; ,

D á e s mol i n h a s d e água a o p obr ezin h o R i o,


Q uand o n o out on o as árvor e s s e qu e i xam
A º v en to d e sabrido
E s e s ent em por d en tro em p ed ern i r
, ,
.

M on d ego v el ho h erói l us í a d a caíd o


,

N os m eus v ersos ta mbém pºb r i n h os d e pe d ir


, ,

D e j oe l hºs orand o às po rtas q ue s e fe ch am


,
.

2 44
O B R A S C O M P L E T A

Pai sag e m d e C o imbra etér ea M ág oa ,

E m im o d e Paisag e m ,

E m ti pous e i os ol h os rasºs d e água


, ,

T ão saud osos d A lgu ém q ue n ão e x i st e


'

E q ue eu j ama is n a vida e squ e c e re i !


, ,

Vivi contig o n um idíl io tri st e ;


,

,

Ficou em m im choran d o a tua i m ag e m


, ,

D e poi s q ue t e
N est e s d ias d e cinza e friº c á d o N o r t e , ,

Q ue o vul to do Marã o e nt e n ebr e c e m ai s


.

T e u pá l idº p e rfi l a r e c e ar a m ort e


, ,

D iz a o m eu cºraçã o palavras outon ais . .

R eza v e l h in h os c ontos i ndi stin tos ;


H er oísm os am or e s d e p erd iç ão ;
,

O cad áv e r d e I nês D P edrº d e svai rad o ; , .

C rim e s q ue o T e m p o abs ol v e e dra m as quas e e xtin t os ,

R ecord açõe s m an chand o º luar da sol idã o ,

Á gua v e l ha a cair d as n uv e n s d o
0 C oimbra m e di eval ,

T oda e rigid a e m sºmbras e sp ectral , ,

C om a ntigas m uralhas d e d efe sa ,

I gr ej as on d e paira a trágica tri st e za


D e m armór e os s e pul cr os e squ ecid os ;
C om t orr e s q ue s ão g e stos d e n e gridos
D um s e m pit ern o ad e us
E arr ed or e s d e i nfin da suavidad e ,

F ul g i n do a luz o viço a mocidad e


, ,

Q ue por vi a d º s ol l h es v em d e D eus
, ,
.

Mas tu n ão és o meu passad o n ão ! ,

Porqu e o Passadº é infân cia fl or e scida ,

Prim av eri l r ec ordaç ão


D um t em p o an t erior à n ossa
T em po l ib erto e puro d e sl izan dº ,
.

Te m pº q ue os A nj os H or as d e o irº ,

C oroadas d e fl or e s e bai lan do ,

E m volta d e outro sol i mºrr edoi r o .

2 45
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

CA NÇ Ã O D A M I NH A S OM B R A

Ó m in ha S in al
D e q ue , ev erdad e e u e xist o
m ,

N esta pr es ença carn al ,

Por qu em m orr eu J e sus C ri st o .

E m ti , m e p erco e d ifund o
E abraço tudo o q ue e xi st e .

O meu fan tasm a t ão tri st e


Q ue andas a errar p el o m und o !
,

S obr e as form as s pe ctrai s


e

D o t eu vul to an oit e cid o ,

P e sa o castig o infl igid o


A os n ossos pri m e iros Pai s .

Mi n h a sombra fost e luz


,

E t orn arás a i nd a a s er ,

Se por t i n ovo J e sus


Vi er à t erra pad ec er .
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

E a can d e ia az e it e e m sín c op es d e
de
No tronº da cap el a a i m ag em d e J esus
,

A o l ívido clarã o d a c e ra q ue s e e spal ha ,

T ão lacrim o s o e fri o sobr e nós , ,

E n os bordados bran c os d a toalha ,

B r un i n do o ouro v el h o das m oldura s ,

R e alçan d o n um d es m ai o antigas e s cul tu r a s


, ,

D e S an t os a qu e m j á r ezaram m eus avó s .

C ousas q ue a m in ha m ág oa con sagr ou


E q u e o luar i n un da d e outra m ágoa ,

S ois o Passado : um m un d o q ue ficou


S ubm erso n os m eus ol h os ch e ios d e água .

C ºmo e u adoro a vossa c om pan h ia ,

O v elh in h as i mag en s q u e a m emóri a


D i vi n iza ! Vós s oi s tamb ém a m in ha h istória .

A l h e ad o e m vós
, ,

E m vós a m in h a angústi a s e e xtasi a


,

E s e m od e l a e m form as r epousadas ,

M armór e as l ivr e s d e al m a l ua r i z a d a s
, , ,

C omo n a C ruz d epoi s d e m orto J esus C ri st o


, , .

A h tudo quan to eu s ou d e vós dim ana


, !
A vossa d or e m m i m é dor hum an a ;
, ,

E e m m i m susp i ra e chora
, , .

P or isso , m in h a al d e ia , eu viv o e n tr egu e a ti ;


N º t eu s ei o adorm eço com o outrora ,
N o p equ e n i n o b e rç o e m q ue n asc 1 .

E u viv o en tr egu e às árvor e s dos mont e s ;


A o luar q ue v em da S e rra e gan h a n ova lu z
Nº m úr mur o cri stal das tuas claras fºn t e s ,

Q uan d o as sombras n o ch ã o fa z em sin ai s da cruz


, ,
.

E u viv o e n tr egu e à s fl or es da tua pi edad e ,

Quand o a m i n h a saudad e
( Virg em n ubl osa e tri st e q ue s e esfu m a

2 48
O B R A S C O M P L E T A S

Nos l on g e s d o meu s er )
T ão branca e d el i cad a as va i co l h e r , ,

Nas tard es outona i s com fr i as m ãos d e brum a


,
.

A qui vi v o S º zin h o e as n uv e n s q ue
C r e púsculos d e d or mel a n cºl i a s , ,

A pagadas al egrias ,

Mort e s d a m in h a vida q ue me
Quim éricas figuras q ue m e falam !
Outras ol ham a t erra e l ívidas s e
, , ,

Outras têm para m im c om o um sorri so


, , ,

Outras l embram º v en to s ol itári o


,

R ezando à m in h a porta as con tas dum ros ári º


, ,

Q ue s ão tºdas a s l ágrim as do i n v erno !


Viv e r e n tr e fan tasm as q ue d e líci a ! ,

H á l ábiºs virgin ai s p ousan d o m e n o rºst o -


.

Seu contact o e sp e ctral é d e íntim a caríci a ,

E nviada por D eus a o m eu D e sg osto ;


Um d esg osto q ue an im a as v el h as cousas
E as noit es d olorosas ;
E d á pr e s e nça viva j á carn al , ,

A tua a pariç ão ;
A qu el a S ombra et ér e a e sobr e n atura l
Q ue d e i xast e a o pa r t ir n a m in h a sol id ã o
, ,
.

A os t e us pé d e luar e u r e zo e m e com ovo, ,

E a l uz d o am an h ec e r t em um d oirado n ov o .

E a s árvor e s s ão m ais b elas .

Q ue s on ho as di vi n iza e tran sfi gura !


Q ue e spíri to i l um in a a sua im ag em !
Q ue al e gri a d e D eus ci nti l a n as e str elas !
Q ue m ag oado véu d e m ística t e rnura
E ncobr e ao pôr do s ol a fac e d a pai sage m !
, ,

D ir s e á q u e n e l a paira um d olori do en cant o


- -
,

Q ue t odº m e d e slumbra e faz sofr e r ,

Porqu e és tu n e st e s S ítios a vi ve r
, , ,

C om o e m s egr edo vi v es n o m eu canto


, ,
.

249
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

CA NÇÃO OU T ON AL

O mund o ficºu a escuras .

B ail am dºidos burburin hos ,

E m vol ta das s epulturas .

O v ento p el os cam i n h os
, ,

S opra e cºrr e d escon t e nt e


E m altrata os pobr ezin h os .

E qual suspiro tr e m ent e


, ,

Varr e a t erra q ue é n o out onº


, ,

Um cadáv er a i nda qu e nt e .

E um ar trist e aband on o
de
P elos out ei ros s e e spal ha ,

C h ei ºs d e c i nza e d e sono .

E a n os s a l ma s e agasal ha
'
,

E m nós s e e scond e a tr em er
, , ,

Quando a aurora j á gr i salh a


, ,

T ão m agrin h a a env el h ec er
, ,

D en tr e as brum a s lacr i mosa s ,

Q ue pe n a t em d e n asce r !
A ndam vºz e s d ol orosas
Nas ram ag en s d o arvore do ,

E ch oram todas as cousas .

25 0
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

P AI SAGE M D O M E U D ESTERR O

Ó m in h a t erra ! E xíl io ! S ol edad e !


C ont em pla t e e m m eus olhos a S audad e
-
, , ,

Quan dº o p oent e d istan t e s e inc en d eia ;


, ,

E d o outr o l ad o n asc e a lua ch e ia


, , ,

E o m och o pia e g em e o v ento n ort e


, ,

E comº q ue s entimos vi r a m ort e !

O r ecan t os escur os do arvor ed o !


A sas q ue fog em trémul as d e m e do !
,

O cam pon e s e s r egr e ssan do a o lar ,

J á fantasm as n a luz cr epuscular !


,

B oi s q ue voltam à c ort e ,

R eban h os n o cam in h o e stropiando


, ,
.

Pobr e zin h as em busca d e pousada


, ,

V ão d e s acol a às costas p el a e strada


, , .

O fumo das lar e iras n o ar s e e l e va , ,

E tom a n egro vulto a fri a tr e va .

E v ejo a d e sgastar a m in h a i mag e m


-
,

E fal eço n as sombras d a pai sage m .

Sou l ívid a pr e s e nça q u e s e e sfum a ,

E m l ong e s s e pul crai s d e ch oro e brum a .

E s ºpr a um fin o e al ado v en t o agr est e


Q ue traz m urmúri os erm os d e c ipr est e ,

S ombras n uas d e túmulos e cruz e s


E o pôr d o sol e m m oribund as l uz e s .

S ob e a n évoa fantástica d o rio


, , ,

25 2
O B R A S C O M P L E T A S

E os l írios a xpi rar num arr e pio


,
e , ,

M ostram a l in da fac e emur c h ec i da ,

C om o tu n o fin al d a tua vida


, ,

Quan do d a n egra c ova t e ab e iravas


E m ai s s eq ui n h a e pál id a ficavas !

Morr est e e o s ol d e outr ora s e a pagou


, .

O m un d o é outro e º céu tamb ém m ud ou !


V ej o passar agora g e nt e e stran h a
E outra lua d e spon ta d a m ontan h a
Outr os v e l h in h os V ão d e pºrta em porta , .

S ó tu me v e n s fal ar d epºi s d e m orta ! ,

S ó tu viv e s ain da para m im .

Vagu e ias alt a n ºit e em m eu j ard im


, ,

On d e a sombra das arv or e s m ai s d en sa , ,

R ealça a luz q ue d á tua pr es e n ça .

H á c ertos sítios de al m a con sagrados


E d a tua l e mbrança alum iad os .

E al i q ue v ou r ezar as m in h as pr e c e s ,

Q uan d o em h oras d e s on ho m e apar ec e s


, ,

E t e n s n a trança a flºr d a virgin dad e ,

E és toda graça alv o luar saudad e , , .

Viv er e i a can tar —


t e m eu amor ! ,

S er e i contigº jun t o do S en h or
, .

E os ai s q ue voam p elº c éu d i sp ersos


, ,

S erã o a s ombra e t ern a d os m eus v ersos .


T E I X E I R A D E P A S C O A E S

ID I L I O

C onform e v a i cr e sc e nd o
A n oit e s obr e m im ,

Mai s próxim a e r e al
E a tua
Os t eus olh os de s ombra
E m rostº d e m arfim ,

T ua voz num murm ú ri o


, o ração .

Ó Virg e m da T ri st ez a ,

Ouço t e os
-

I m pr e ssº n a m in h alm a
,
'
,

O talh e dºs t eus


Ve n s d e
, L á v en s ,

S ºrrind o dar me um b e ijo


,
-
,

C om un s l áb i os q ue a t e rra d esfez .

T e u con tacto e sp ectral


D e S ombra e n am orada
A foga m e em silênci o
-

E l ívid o
E a m in h a vida fi ca ,

E xtática e ab ismada ,

Num a fun dura l úgubr e de amor .


T E I X E I R A D E P A S C O A E S

V e i o d e água q ue murmura ,

S on s d e prata e d e fr e scura ,

Pu r as ond as cr i stal i nas .

Ó erm os v ers os subind o ,

E m fraga e Oraçõ e s
Q ue fºram e m p ed ern ind o
E s e ficaram carpindo ,

A o v e nt o das sol idõ e s .

V e rsºs brancos d e
Mãºs d e n e v e a os céus erguidas ,

C ºm e xtático f e rv or ,

E e m blºc os d e e t ern o al v or
E t ern am ent e e scul pidas .

V e rs os duros q ue a tardin ha
A faga am im a suaviza
, , ,

Quan do h um ild e pa s t or i n h a
R ec ol h e o gad o s º zin h a
, ,

E a luz é j á i nd eci sa .

R ºxos v ers os outon ais


D a e l egia d a
B rumosas v oz e s m ortais
Q ue n os m eus olh os cantai s
, ,

E me e mbalais d esd e a infância


, .

Marã o profun da el egi a


,

Q ue sin t o vibrar e m m im !
V e rsºs nus d e c or sombria ;
,

C or d e t e rra e p en e dia ,

D um a tri st eza s em fim .


R A S C U M B L E A

C A NÇ ÃO MO L H ADA

G otas d e s om m olhad o
C a em l á fo ra
, ,

Num ruíd o
E o silên ci o g e l ad o
D a n oit e q ue ch ora
S obr e tud o o q ue e xi s t e.

E a m in h a m ág oa
Naqu e l as g otas d e água
Par ec e en carn ar .

Vag o n a sombra
S ou mort o s em s e pultura
E s ou n uv e m a
T I X E I R A D E P A S C O A E .

C A NÇÃ O T E MP E S T UO S A

Vai º v en to a c l a mor a r ,

Na n oi t e e scura ,

E n v e l h ecida .

E vai c o r r e n d o à pr ocura
,

D e al m a s q u e o saibam cantar
E l h e dê e m e t ern a vida !

O v e ntº m aré s om bria


, ,

E m ondas d e ch or o e bruma ,

E m tum ult os d e
G rand e s s on s d iluvianos ,

V oz e s form ando ºc ean os .

G ri t o im e n so q u e s e e sfum a
E ench e a t erra d e clam or es
E
D e us vai l e vad o n º v en t o !
E s e n t i m e nto
E n louqu ec i d o
N a fri a noit e d e mág oa ,

E fantasm a ind efin idº ,

A e sc orr e r água
T e m n a fr ont e d e svairada
, ,

Un s ol h os q ue
E t e m g est os q ue n eg r ej a m ,

Na s ombra t oda mol hada !


25 8
T E I X E I R A D E P A S C O A E

E tumul tua e voz ei a ,

Na pr ofund a es c ur i d a de !
Maré ch ei a
D e saudad e ,

S obr e as e str e l as
D B R A S C O M P L E T A S

D OS MEUS

A tard in h a ,

T od a pr eto um ar h um i ld e vin h a
de , ,

Vi sitar D eus sab e q ue trabal h os


A pobr e pad e c eu ,

A través d e ss es íngr e m e s atalhos ,

E scavados d a ch uva ,

E dº v entº q ue passa a ,

S ol t eira a qu em o t em po escur o d eu
O l uto d a vi úva ,

S em pr e sº zin h a e tri st e pass e ava ; ,

E c om d i scre ta m ág oa n os fa l ava ,

Num a voz a sum i r s e a r egr e ssar -


,

A º s ilên cio profund o


Q ue d e i xa atrás d e S i qu e m part e d e st e m und o
, , .

Ou se ficava e xtática son h ando


, , ,

C om l ágrim as n os ol h os

E d e sci a a o j ardi m a v er as
E via a n ossa casa e os arr edor e s ,

C om o qu e m tri st e e lúgubr e m e mora


C ousas figuras m ortas n a
,

261
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

A l i viv eu outr ora ,

Na brum osa m an h ã d a m inh a i nfância .

E o s eu vult o d e s ombra e d e abandon o ,

Nas á l ea s do j ard im ,

D ir s e ia q ue ch am ava p e l o outon º
- -
.

A noit e vin h a e nfim , ,

T en d o a l ua n º p ei to um branco lír i º ,

E el a , apr e ssada , e n tã o d i z i a,
-
n os ad eus .

L á i a n º cr e púsculo d e s ert o ,

C om a mºrt e j á próx i m a e c om D eu s .

R e zar tirar a o c orp o e dar a os p obr e zin h os


,

E nch e r d e r osas d e ca m éli as l írios , , ,

O bran c o altar d a Virg em D ol or osa ,

Quand o o d esmai o fún ebr e dos círios


P õ e m edºs a voar n a igr ej a
A n dar p el os cam in h os ,

S em pr e s º zin h a e s éria ,

C om p ej o d e tri l har a t e rra ab ençoada .

E para as brutas p edra s s er t e rnura .

Ser pi edad e bon dad e am or e l uz


, , ,

E n os s eu s ol hos t er crucificada
, ,

T oda a i m ag e m d e d or e d e
Ser um a s om bra hum an a d e J e sus .

Ser por f ora a v el h ic e a f e aldad e e scura ;


, , ,

P or d entr o um l íri o m ísticº d o val e ;


,

Olh ai º q ue el a f oi n a vida tran sit ó ri a ; ,

E i s a sua m emóri a ,

G ravada n est e l ivr o s epulcral .

Num dos úl tim os d ias d est e i nv ern º ,

Quand o o s ol m ºribun d o os pi n h ei r a i s abrasa


E a os pºbr e s d e p edir g el am as m ãºs e ºs pés ,

C h egou m ais p en sativa a n ossa casa ,

T r az en d o j á n o rosto aqu e l a pal id ez


, ,

E m q ue alv o r ec e o gran d e ad e us e t erno !

2 62
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

CA NÇ Ã O DO L U SC O FU SC O

V em d a s erra a m adrugada .

Vê s e l he o cºrp o i n d e ci so
- -

S ombra d e r o sas cºrºada ,

N um

E a h ora cr e puscular ,

Q uando a e str ela m atutina ,

F l or d ivina,

Va i m urch ar .

Quand o a m in h al ma d e sp erta
'

E fantástica vagu eia


, , ,

A luz d e v el h a can d eia ,

Na fri a casa d es erta .

E h á p e numbras osci l andº ,

D e s en h ando ,

Nas par ed es e n o t ecto ,

G e st os vag os d e
É a n ossa própria figura ,

A n asc er d a n oit e e scu r a ,

D e s i m edr osa tr e m endº


, ,

A n t e o m i stéri o pr ofu nd o
D o s e u vult o apar e c e nd o ,

S ºbr e o

2 64
O B R A S C U M P L E

E as alm a s e str e m unh adas ,

Q ue s e l e van tam m ai s c ed o ,

Passam n as e rm as e stradas
, ,

Frior en tas ,

N e v oen tas ,

Num S ilênci o q ue faz m ed o .

Um as , n xad a a o ºmbr o ;
v ão de e

E v ão outras s em d es tinº , ,

E span tadas n um assºmbr o


,

Q ue é d ivi n o !

E ºutras acord adas


v ão

P or cuidados q ue l h e s b at e m
E as d eitam fora d a cama ,

Quan dº os cã e s ui vam e l at em
A s n egras ho r as paradas .

E q ue sofr e d e ntro d e las


, ,

Nossa S en h ora d as D or e s
Q ue t e m fi l hos a qu e m am a
E n ada t em q ue l h e s d ar ,

T e n do anj i n h ºs a can tar ,

T e ndº e str elas ,

T e nd o fl or e s .

Passam trist e s peg ur ei r os .

S ob e m íngr e m e s out eir os ,

Q ue d ecl ivam sobr e o ri o .

S altan do de p e n h a em p en h a ,

E ntoam n octurn os cantos .

E a o s ºpr o d o v ento frio


, ,

A conch egam os s eus m antos


De es t a m en h a .

N os cam in h os s ol itári os ,

Passam pobr e s c en t en ári os ,

Fi n cad os a o s eu bºrd ão ,

D e ol hos caíd os n o

2 65
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

R ostºs t em p o con som e ;


q ue o

Máscaras v el hi n has d o uso ,

M od el adas p ela fom e ,

C om r a i v or !
R e ss e cas m úm ias dºr de ,

Na baça fluid ez cinz en ta ,

Pardac e nta ,

D o ar

E n ospín caros da s erra ,

Vagam en t e ,

D oirada luz s e
E v a i cr e sc e r s obr e a t e rra
, ,

T ão crim in osa e inoc e nt e !

E ostri st es d os p obr ezin h os


V㺠r ezandº : A v e Ma r i a ! -

A m en ,

E os q u e vê e m pºucº tr op eçam
Na s ombra d os ram os nus ,

Q ue atrav e ssam
Os cam inh os .

E rabujam tr op eçand o, ,

C on tra o c orpo q ue fraqu e j a


E ºs vai d e i xand o ,


E a n ºit e do et ern o S ono
Q ue d e ntrº d e l es
, ,

Passa a D oidin ha ,

Frias sombras d el irant e s ,

T urvam l h e ºs g e sto s d istan t e s


-

E r e v oltam l h e º cab el o !
-

E n os s eus l ábios d e g e l o ,

Q ue d es cor a m ,
T em ri sos doidos q ue ch ora m !
2 66
T E I X E I R A D E P A S C O A E

E árvo r e s d a s ol id ã o
as ,

D e spidas s e m agasalhº
, ,

T êm g e st os n egr os n o ar ;
E n a s l ágrim as d o ºrval h o
, ,

H á ri s o s m ort os q ue V ão
R e ssusci tar .
O B R A S C O M P L E T A S

CA NÇÃ O L UA R E N T A

V em d o Marão alta s erra , ,

O l uar d a m in h a t erra .

Ora ve a L ua n ova
m ,

Q ue é um p e rfi l
D e d onz e la
Nas cl aras n oit e s d e A bril ,

E m n é voa d e a l m a surgida
'

A nd a a e rrar
E a suspirar ,

E m v ol ta da sua

Ora v em a L ua
R osto e norm e
E lum inos o ,

Num s orri so m i st e ri oso ,

P or sobr e a ald e i a
Q ue
V em d o Marão alta s erra , ,

O luar d a m in h a t erra .
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

CA NÇÃ O SA U D O SA

A S audad e bat er
v em ,

V em b at e r à m i n h a porta ,

Quan do o luar é d e l ágri m as


E a t erra par ec e m orta .

E a S audad e bat e bat e , ,

C om tal carin h º e bran dura ,

Q ue n em a aurºra bat end o


A p orta da noit e e scura !

Mas eu ouço t e -
,

E o si lênciº é t ão pr ofundo !
Ouç o v oz e s c horos d e al ma
, ,

Q u e n inguém ºuv e n o m undº ! ,

Mi st eriosas I m ag en s
Passam por m im a
, ,

B em e nt e n do o q ue e l as diz em ,

B em o quis era con tar !

Ma s tragédi a
q ue e mud eço .

C ai o d e m i m s obr e 0 Nada !
, ,

Sou a m in ha própri a sºmbra ,

N ão s ei ond e proj ectada !

2 70
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

A ESTRELA D O P A ST O R

Vén us sorris o e l ágri ma d e d or


, ,

Na r ou x i d ão brum osa d a
T u j á n ão és a e str el a d o past or
D e ss e t em p o v el h in h o q ue er a infânci a .

Porqu e Virgí li o nunca m ai s cantou


Os pri m eir o s alvor e s d a S audad e
E aqu e l a tard e tri st e q ue ficou ,

D oirada a s ºl n a n egra A n tiguidad e


,
.

D oc e Vi rgíl io d a pri m e ira m ágoa !


Prim e i ro a i ! das c ousas t ão ,

Prim e iros ol hos d e alm a rasos d e água ,

Prim e ira sombra hum an a a e rrar n o m undo !


,

Virgí l io meu d ivino A n t epassad o !


,

C horam por t i as T udo ch ora


O t eu saud oso eS pí r i t o e n sombrado
Na m ística vi são d e nova aurora .

Vénus chora por ti ao s ol poe nt e


, ,
-
.

A dor t irou l h e o e ncanto em q ue vi v e u


-
.

D eusa q ue foi do A m or é sim p l e sm ent e


,

Nódoa d e t erra a m acul ar o céu .

2 72
O B R A S C O M P L E T A S

Te m m ontan has , cid ad e s gran d e s m ar es ; ,

Ó di o s , pa i xõe s a
p e st e a fºm e a gu erra !
, , ,

E po etas q ue h ão de ergu e r os s e us can tar e s


-
,

V e nd o n a e scurid 㺠bri lh ar a Te rra !


, ,

O m undo q ue e u h ab itº ! E stran h o signo !


Fras e d e D e us em l e tras i nfern ai s !
Quantos h om en s afl it os e sp ectrai s , ,

T e h ão d e i n t e rrogar s obr e o d e stin o ? !


-

Porqu e e st e m un d o en vi a aos ºutr os m un dºs ,

Na s en sív e l m ud ez das n oit e s calmas ,

R ezas e scuras c ân tic os pr ofun d os


, ,

A sua sombra i m en sa torva de al m as !

S e rás ó T e rra a os ol hos d e outra D or


, , ,

D ivin a e str e la a rir noutro Ori e n t e


, , ,

S obr e o b erço infan ti l d e outr o S e n hor


Q u e
, n outra cruz m o rr e u por o utra ,g e nt e ?

Q uan tas dor es e angústi as t e procuram ,

D e d i stan t e s plan etas


Por i sso à n oit e h á voz e s q ue m urmuram
, ,

E r emotos S ilên ci os mur mur o s os

S ão j á farrap os de Um g e sto m ort o


E gritºs q ue s e A i s p erdid os !
T ragéd ias abi sm adas suore s n um Horto , ,

Man ch an do em n évºa os long e s d esm ed idos !

O m un do a tua im ag e m vai subind o


,

E as al tur as qui m ér icas ating e .

E v ejo sºbr e os astros in cidin dº


, ,

O t eu per fi l d e p e dra mud a E sfing e ! ,

2 73
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

Va i n o v erd e luar e m q ue fulgura s


T ua i mag e m d e argila e s en tim e n t o ,

T oda f ebri l e viva d e figuras ,

T oda pintada d e árv or e s a o v e nt o ! ,

E a m in h a ald e ia o m eu j ard i m
va i , ,

E v a i m eu pobr e s e r q ue s e

Vai n as asa s d a luz q ue d e sc e à T erra


E r efractada corr e 0 A zul s em fim !

E outros s e r e s A spiraçõ e s
Q ue s e cruzam n o e spaç o e
A n si e dad e s e sºn h os q u e alv or ec e m
Nas fri as e n octurn as sol idõ es .

I nfin itas d istân cias ! Vácu o i m en so !


A tr e va ! O fri o ! Horr or ! S ilên ci o e norm e !
O abism o q ue d evora quan to eu p en s o ,

A n oit e s em pit ern a q ue D eus d orm e !

E , n ess e n egr o A b ism o q ue faz m ed o ,

A m i n h a im ag em d oida a voar
, , ,

E j ulga ouvir pal avras d e s egr e do ,

E os acord es astrai s d e e tér ea L ira .

Quando º s ol morr e em e rm o pi nh eiral


, ,

Ouç o n um son hº m ístic o d e e n can t o


, ,

A branda v oz d e i nd efin idº can to ,

Q u e paira abstracta n o clarã o fin al


, , .

S ois cantan d o m eus irm ãos d A l ém !


vós , ,
'

P oe tas d e outra S audad e e Pr ofecia ,

E n l ea d os e m outra S im pati a
E m e l indr os os d e outr o luar tamb é m .

2 74
T E I E I R A D E P A S C O A E

CA NÇÃO M ED R O SA

Na noit e lívida o Med o ,

V e m b at er à m i nh a pºrta ,

C omo um s egr e do
D a E sfing e m orta .

R on da n as longas e strad as ,

Nas bran cas e n cruzil hadas ;


Nos sombrios pi n h e i r a i s ,

On d e a o v ent o ,

Viol ento ,

H á m i l sombras murm urand o


E d ançand o
E rm as d anças e sp ectrai s !
E todo s e e xal ta e al egra !
D oido ri n a n oit e n egra
, , ,

E d oid o e svoaça
, , ,

Quando c ing e ,

Num d es ej o m ai s ac esº
Q ue um a e str ela ,

A lma s ºzin h a q ue passa


E d e s úbi to cong el a
, , ,

S ob o p es o
D os t eus o l hos m ud a E sfing e !
,

E q ue a sua formosura
D e bran cura
T ão i nt e nsa ,

2 76
B R A S C O M P L E T A S

E m fri o m á r mor cond e n sa '

T udo quant o r e c eb er
A i nfl uênci a d es va i r a n t e ,

Fulm in an t e ,

D o s eu vul t o
Quas e oculto ,

E m n egra m áscara a ard e r !

O M edo paira n os rios ,

P on do torvos n e vo e iros
E arr e pi os
Nos salgu e ir os ,

C h e iºs d e g e stos parados ,

C ºn g e lados .

E n as águ as s e d ebruça
E n os açud e s soluça
T ão altº q ue a —
,

, n oit e m orta
R e ssuscita !
E t od a afl ita
, ,

S obre a paisag em absorta


E xal a um frio g e m ido
E m ai s l ívida par e c e
E m ai s e scura ,

Quand o ao v entº d o Marã o


, ,

A n octurn a s ol id ão ,

P etrificand o e mud ec e ,
.

E a s fol h as tê m um ruíd o
D e s ecura .

V en to d e febr e e d esgraça ,

Q ue p erpassa ,

Voan d o i nc ert o
, ,

Num qu ei xum e ,

E o fantasm a d o D e s erto ,

C om asas n egra s d e lum e ,

R e qu eimando
A s fol hag en s vi r i d en t e s
E tr em e n t es ,

Q ue s e torc em cr e pi ta ndo ,
.

2 77
T E I X E I R A D E P A S C O A E

E, n as águas d º rio
a o v er , ,

A sua i m ag e m ,

O M edo brancº d e m ed o
, ,

E um e sp ectr o e m d e s vari o !
Va i c or r e nd o ,

P e l as s ombras d a paisag em ,

Vivas d e al m a e d e s e gr ed o ,

E str em ec e ndo .

E a lua a o vê l o pa s s ar
,
-
,

T e m m ai s l ívid o pal or ,
S obr e silên ci o das cousas
o .

Mudas font e s d e t error , ,

D ir s e á q u e v ão g el ar
- -

S ó as av es t e n e br osas
S oltam pi os ag our e ir os ,

N os pi nh e iros
M eus i rm ãºs d a
E sofr endo como e u , ,

R em ota dºr e sp e ctral ,

Q ue s e e spal ha p el o val e
E m p e numbras d e e m oç 㺠,

E é a nºit e q ue v em d o céu .

O M e d o p erc orr e a a l d e ia .

S e us v e stid os s ão luar ;
O s eu r ost o é lua ch e i a
D e m emóri a .

E ntr e os ram os d o arvor edo ,

E spr e ita o M e do ,

Quando a lua m er en cór í a


A nd a a e spi ar

Na e diçã d a O b r as C m pl e ta s : Má s cara d oida c


o s « o » « ,

r e n do A d o pto u s e aq u i a V aria n t e m a n us crita d um ex emp


» .
-

daq ue la e diçã o p e rt e n c en t e a o a ut o r .

2 78
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

C om oslh os e spantad os
o

E os cab elºs e riçados !


A n t e o M e dº a n ossa im ag em
,

E qual i mag e m vazia ,

D e s en hada e m t e rra fria ,

C om o a s s ombras d a paisag em .

A parênci a d e pr e s ença ,

I lusã o q ue s e c on d en sa ,

N évoa ap en as
A i a saud ad e da vida
, ,

N ão a vi da é q ue sup orta
,

A n os s a l ma quas e
'

D ivi n a e pobr e can d e ia ,

Q ue s em pr e a ard er
, ,

B ru xul eia ,

T ão long e n º n osso s er !
,

Ond e el e é j á i nvi sív el


E a nós própri os

O M edº é o vul to d isform e


D a n egra n oit e
E a m e sm a n o it e afi nal , ,

T umultu osa d e vi sõ es ,

S obr e a paisag e m q ue
A n oit e o e stran ho c en ári o ,

Ond e o M ed o l eg endáriº
I nc end e ia apariçõ e s ;
P e rs on ag en s m ist eriosas
D e ssa T ragédi a infin ita ,

E m q ue g em e ch ora e grita ,

T ud o o q ue é sombra i lusória
A d e spr e nd e r s e d as cousas
-
,

Sob a lua m er en cór í a .

E i s a T ragéd i a m ai or !
P orqu e e xpr i m e a e t ern a D or
E xc ed i da im ag i n ada
, ,

2 80
B R A S C O M P L E T A S

D º s eu l e it o t r a s b or d a d a ,

A e vaporar s e n o -

— O e sp ectr o d a Vi rg em M ãe -

A nt e sp ectro d e J e sus
o e ,

P r eg a d º s obr e um a cruz
Q ue abran g e ss e n um abraç o , ,

T odº o e S pa ço !

Ó D or emsombra d e dor !
A lm a d o M ed o ! T e rr or !
L uz d o
R am o d e
S ºmbra n egra a d im an ar
D um bran c o m ármºr e .

E tér e a bri sa
S uspirand o .

M ochos pian d o
E scura
E ssa mul h er i nd e ci sa
Q ue s e entr e vê n a tardin ha , ,

E t 㺠pál ida cam in h a


, ,

Para
O m arul ho l iqu efe ito
D o r i º n as hºras m ortas
, ,

A s on h ar altº e m s eu l e ito ,
.

O v ento b at en dº às pºrta s
D ºs casai s ;
—T ud o é pr e s enç a d o M e do
E a in da m ais
, ,

E sta an gústia d e s egr e do


Q ue d e
,
lon g e nos e n s o mbra ; ,

E tão l ívida m urmura


, ,

N a n oit e q ue n os criou
E e m nós
, ,

V el h a sombra
Q ue para d e ntr o proj ecta
, ,

A cri atura .

2 81
T E I X E I R A D E P A S C O A E

E d epois l he sob e a o r ost o ;


E é vulto d e a sa i nqui e ta ,

Vago r emorsº d esgostº ,

D e viv e r a im p e rf e içã o
D a C riação .

O M ed o antigº e soturno !
E rm o Fan tasm a nocturno !
M edº antigo ! O Natur eza !
E sp ectr o i m e n s o
D e tri st eza
E d e m artíriº ,

Por sºbr e as alm as susp en s o ! ,

E u r e c ordo aqu el e i n stant e ,

E m q ue num vºo d es v a i r a n t e
, ,

P e los céus ,

L evast e junto d e D eus


, ,

O s er hum an o em d el íri o !

C omo f erid o dum rai o ,

E ss e ri so ab e rto a f og o
C a iu l ogo
Num d esmai o .

Ma s d e r ep en t e ac ord ou
, , ,

E n tr e as tr e va s prim itivas !
E rgu eu as m ãos afliti va s
E gr itou

Prim e irº grito d ivin o


Sem d e sti n o ,

D e n évoa em n év oa ,

Prim e ira r eza alvorando ,

Pri m e ir o s ol a rai ar .

D eus e nfim a d e sp ertar


, ,

D aqu el e son o pr ofun d o


E m q ue e l e son h ara o m undº .

E son hou a luz d o d ia ,

N o can to da cotovia ;

2 82
T E I x E I R A D E P A S C O A E S

C ada alm a t em s eu
A qu e l e ín tim o s egr e d o ,

Ou d e al egria ou d e dor ,
Q ue el a m e sm a , d olorid a ,
Vai

M ed o angél ic o sorrindº
Nun s l áb i os d i z e nd o : a mo r !
,

A pr i m ei ra v ez n a V i da ,
.

M e d o e m l ágri mas

M e do ao t eu c orpo d ivin o ,

Q ue n um clarão r e p ent in º
, ,

M e d e slumbra !
E fugind o m e s ó v ej o
,
-
,

E ss e rastro d e p en umbra ,

Q ue e sfum a atrás d o t eu vul t o


, ,

O m eu d e s ejº .

M ed o à fl or q ue d e sabrocha ,

C om tão m elin drosa graça ,

Q ue um só m om e nto q ue passa ,

A d e i xa s eq ui n h a e r oxa !

O m edo à s ombra do
I m ag em fri a a dorm ir
Um fri o sono .

M edo às folhas a cair


E m ch arc os d e água ,

Ond e p ousa aqu el a m ágoa


L ºn g í n q ua do céu azu l
E as n uv en s vind as do sul ,

Q ue S ão l e mbranças d o m ar .

O m ed o à Mort e a r ezar !
2 84
O B R A S C O M P L E T A S

Med o aom i s téri o pr ofund o


Q ue e n ch e d e tr e vas o m und o

E t e m al tas di m e n sõe s ,

Q ue a g e nte n ão pºd e vê las ! -

E é n egr o céu c on st e lad o


De ais , gri tºs e oraçõe s
de
Q ue D e us con v e rt e em e str e las !

C ad a al m a t em s eu

O s egr edo
s eu

Q ue D eus l h e d i ss e ,
ao na s c e r ,

Para el a o n ão

É a Palavra m i st eri osa


Q ue fari a e t e rn a luz ,

Na e scurid ão d a Natura .

Mas n em a d iss e J e sus


N e m S ibi l a fabul osa
E só b ai xi n ho m urmura ,

Ou n a l ágri m a prim e ira


Ou d errad e ir a .

D i l a o pri m e irº vagid o


-

E o d errad e iro
T I X E I R A D E P A S C O A E S

A M I NH A A L M A

Q uan d o n a tard e tri st e


,

E pál ida i magino ,

Ser m in h a aqu el a d or
Q ue os val e s mac e r on ,

Hei saudad e s d e m i m ,

D e outro q ue fu i m en i n º
Q ue um a v ez d i s s e ad eu s
, ,

E nunca m ai s
Se r e c ordo o Passad o ,

E m n év oas j á d esfe itº ,

A lguém q ue m e faz p e na ,

E m m im soluça e chora , .

E u q ue j á fui f eli z ,

C on t e nt e e sati sfe ito ,

Quas e me n ão c on h eç o
E sin to me outr o ag ora !
-
,

T ud o e inc ert o e vári o


'

E tudo s e tran sform a .

T udo s e gu e n a vida , ,

Um m ist eriºso
O m ai s b el o p erfi l
É ap en as um a form a ,

A 0 v e n tº e à luz dº Sol
A m od e l ar —
,

s e em

N 㺠h á di a meu D eus , ,

Sem tr e vas q ue al vore ça ! ,

2 86
T E I X E I R A D E P A S C O A E

E nc ontr o me contig o !-

A mo t e ,
-
c omo a t erra
A d ora o mê s d e Maiº .

C om º ad or a um roch ed o
O m usg o e m fl or q ue o v e st e ;
C om o a cruz dum s epulcr o
O d oc e e b om d e smai o ,

E m q ue e l a c ai s e ntind o ,

A s ombra d o ci pr e st e
A m o t e quand o a tard e
-
, ,

E m o iro s e inc en d e ia
, ,

E v oltas para o Ocaso


O t eu p erfi l
E al ém s obr e o Marão
, ,

A trist e lua ch e i a
D á vaga tran sparência
A n oit e d o Passadº .

A m o t e ainda m ais
-
,

R ainh a dº meu Po e m a ,

Quando o silêncio inun da


A s á l ea s d o j ardim ,

E me apare c e a o l ong e , ,

O grand e d iad em a
Q u e c e rca d e e spl e n d or
T eu r osto d e m arfim .

E , porm i lagr e Olh ai ! ,

D e s ú bit o m e e span to !,

Q ue r e p en tin a luz
T ºdo o m eu s er t r e S pa s s a !
E pousa e m m eu ouvido
, ,

E tér e a voz d e e ncan to ,

E o t eu vult o d e flor
E um z éf iro q ue passa . .

És tu és tu és tu !
, ,

E u s ei q ue tu e xist e s ,

Q ue a aurora e o meu d es ejo


E nfe i ta m tua front e .

2 88
B R A S C O M P L E T

Q ue os t eu s ol h os azui s
B e ij am m e us ol hos tri st e s ,

C e gºs a tact e ar , ,

Na s om b r a d o h ori z on t e .

Quand o ch orava outr ora , ,

A sós p el as h e r dad e s
,

E i a ver dum out e i ro , ,

O s ol am an h ec er ;
E e n can tado r e zava
, , ,

A o t oqu e d as T ri ndad e s ,

E q ue e u sabi a j á
Q ue ti n h as d e n asc e r !
E u fui o t e u pr ofe ta .

A n unci e i t e a vi da -
,

N e ss e t e mp o em q ue t ud º
E lím pid o s or r i r .

E r a t ão n ºv o ain da ,

E e s t a l m a d ol orida
'

Ouvia d e ntro em si, ,

C om o um s en tid o a

Parti part i d e p oi s
, , ,

P or e ss e m undº f ora .

E m l ágrim as por m im
D e i x e i a m in h a
E m m im a luz d esmai a ; ,

E m m im o ri s o chºra ; ,

E é m ística saudad e
A n év oa d a D i st ân cia .

P ers e gu i do n 㺠s ei
P or q u e m a u gén iº obscur o ,

A n d e i d e t e rra em t e rra
, ,

A chuva a o s ol a o v e n t o , ,
.

G oz e i com a m arg or
, ,

E ss e praz e r i mpuro
Q ue pºr d e n tr o m acul a
, ,

O n oss o p en sam e nt o .

2 89
T E I X E I R A D E P A S C O A E

Mas tu vi est e ,

D o Ol im po d e sc e nd e st e ,

Num a infin ita luz


Q u e tud o alum i ou .

T u q ue és alm a s º m e nt e
, ,

E m c orp o m e e m pe c e s t e
, .

F os t e vi va e m ortal
C ri atura c om o e u s ou
,
.

E m s íti o s d e e l e gia ,

A tard e t ão s º zinh o s
, ,

D e scubr o o t e u p e rfi l
D e e tér e a Virg e m M ãe -
.

E n os t eus ol h os v ão
B at er o s passarin h os ,

J ulgand o q ue h á m ais céu


A inda para
,

E a tua s omb r a am o r , ,

E um a t e r nura i m e n sa ,

Q ue s e e S pa l h a atravé s ,

D as p ob r e z inh as c ousas .

E a o d i vin º luar
,

Q u e d á tua pr e s ença ,

L ágrimas n o m eu rost o
, ,

A cºrdam lum in osas .

E l ouco d e an si e dad e ,
,

E m f ebr e d e d elíri o ,

T e nt e i tua b e l eza ,

A fi m d e s er am ad o !
M ostr e i t e a m in h a alma
-
,

E ss e e rm o e p obr e l íriº
A o v entº e p e las m ãos
D o Out on o j á
N e st e mund o ºn d e pai r a,

Um s onh o m ist eriosº


E a saudad e d o s ol ,

A luz do s ol flutua
Vi st e meu vult o — e sp e ctro
, ,

2 90
T E I X E I R A D E P A S C O A E

CA NÇ Ã O MON Ó T ON A

Monoton ia .

Se m pr e a im ag e m das cºusa s q ue n os
A m e sm a c or v e r m e lh a d a A l egri a ,

O m esm o c l a r º e scur o d a T ri st ez a
-
.

Sem pr e ,
m e sm o c orpº a m e s m a d oença : a vida !
no ,

S em p r e a m e sm a e l e gia e m sílabas d e m ág oa ,

S em pr e o m e sm o p erfil d e s erra e m p ed ern ida ,

On d e o inv erno a ch orar d e s en h a e sp ectros d e água


, , .

B ºcas s e m pr e d e téd i o a e nv e n e nar o mundº


Um a n oit e p erpétua e mud ecid a e
,

N egr o p eg o d e l ágri m as pr ofund o ,

E stagn açã o da D or e m erm os long e s d e


,

A m e móri a e m plan íci e e stéri l e d e s erta .

Ouvir duran t e o dia o choro dum a


, ,

S e m pr e a m esm a j an e l a e t e rnam e nt e ab erta


, ,

S obr e o m e smo
N os ol h os s em pr e a m e sma ind ef in ida imag e m
,

S e m pr e a m e sm a ros e ira a flor e sc e r por


S em pre o m e smº s ilên ci o em fºrm as d e pai sag em ; ,

A v e s em pr e a cantar m an h ã d e s ol s em fi m !
,

Um p erpétuo s orriso à fl or do m e sm o
,

Num gél id o cristal a m e sm a fac e


,

Sob um e t e rn o s ol p osto
-
,

E t ern a pl an íci e m orta . .

2 92
O B R A S C O M P L E T A S

E m son s d e e spuma e n év oa t rn a voz do Mar


,
a e e ,

A m orr er a V i v e r n os ar e ai s
,
d e além . .

Um e t ern o s epulcr o à luz d e e t ern o


,

A m e sm a vid a em nós vivid a por


, ,

C on stant e cal m a r ia e t e rn o m ar
,

E st e íntim o A l en t ej o e m q ue s e p erd e a g e n t e . .

E m n osso própri o s er o T e m pº d e sm ai ado


,

m esm o o m e smo º m e sm o em n ós p e rpétua


, , , ,

[ m e nt e !
T E I X E I R A D E P A S C O A

CA NÇ ÃO D os TR I STES

T rist e s bich in h os nocturnos


Passam a V i d a — c oi tados !
N e ss es b uracos s oturn os ,

A b afad os

S aud osa fl or es ma ece


Na l ei ra s eq u i n h a e
Q ue d e usa e nferm a
E m ti fal ec e ?

E a b orbol e ta viúva ,

Q u e t em asas a g oi r en t a s ,

Nas tardas horas c in z entas


De friº e chuva !

E as al mas n egras d e p e n as ,

S obr e a t erra q ue s e
Q ue S ilên ci o ! Ouv e s e ap ena s -

C air a fol h a .

E a vºz do sapo en c ob erta ,

R em ota ,
e sp e ctral s ºzin ha
, ,

Na c or l i l ás da n oitin h a

2 94
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

A S M I NH A S HO RA S

Horas dedúvid a cru e l e d e t ortura ,

Q ue s e abraçam a m im g e ladas a , ,

E l e vam n o s eu p eit o i m pr e ssa a ti nta e scura


, ,

A e fígi e dºl or osa e hum an a d o m e u s er .

H oras e m q ue o Passadº o erm o º s ol itáriº , , ,

N os visita e n os fal a e m v oz d e cinza e


E i l o su r gin d o al ém m ai s alv o q ue u m sud ári o
-
, , ,

E com o Ham l e t traz n as m ã os um a cav e ira


, , , , .

H oras em q ue n os p e sa a v el h a e d oida h e rança ,

O r em orso v el h in h º em luta contra nós .

E somos p e qu e n in a e l ívida cri ança ,

E ntr e e sp ectr os h osti s d e trágic os avós !


M om e nt os d e saudad e e t ern a quand o tudº ,

V olv e para o m eu rosto um vago r osto aus en t e .

Quan d o em al m a d espida e cºraçã o d e snud o


, ,

E u an do a o v e n to fri o e ch orº i nti m am e nt e .

E lºg o m e d isp e rso em f orm as e sp ectrai s .

Sou a parênci a v ã d a D or q u e m e c on s om e .

Sou alguém q ue a s i m e s m º e xcl ama : n un c a m a i s !


E súbit o s e vê fan tástic o e s em n om e
, ,
.

D ias m ort os d e I nv ern º ºs céus


E rm a t e rra a o luar cad áv e r in s e pult o
,
.

N eg r a n oit e m ol hada e lúgubr e g e m end o , ,

Q ue e m n os s º c o raçã o par ec e t om ar vul to .

2 96
O B R A S C O M P L E T A S

H ora s d e ind ife r e nça e i n ert e calm ari a ,

I s e n t a s d e p r a z e r d e ang ú stias fom e e s e d e


, , ,

E m q ue sou d e m i m própri o a m áscara va z ia


, , ,

M eu r e trat o pintad o a s ombra n a par ed e , .

H oras fal sas de c or e m pard os ton s d e m ágoa ,

E m q ue d e tudo tud o a ssim n os d e spr end e mos


, , ,

C om o a água a d e i xar e m n évoa a própri a


E a d or d e n ão s ofr e r a d or m ai or s ofr e m os !
, ,

H oras em q ue aban d on o as r e giõ e s


T rist e d es en can tado e xpºsto à s t em p e sta d e s
, , ,

Sob a tr e va a ch ov er dum céu tºdº em ruín as , ,

On d e pairam — q ue h orr or — d efun tas D i vin dad e s !


Sou a l ástim a e t ern a ! A h um an a v oz sangrando ,

Sem um eco d e am or q u e a o long e a r e p e rcuta ! , ,

Voz n um d e s ert o i m e n s o e n e gr o suplicand o !


, ,

S em pit ern a ºraç ã o q u e n e n hum D eus e scuta !

Mºm en t os d e av en tura ím p et o s sobr e ,

Ó viag en s n o m ar ! O praias d o N asc ent e !


E g os tavam d e olh ar m e us ol h os lusitanos
Á gua e céu água e céu in d efi n idam en t e !
, ,

D e s ej e i afrontar os grand e s t e m porai s !


Num r el âm pagº v er o t eu p erfi l ó Mort e ! ,

V er as on das bai lar em l oucas s a t ur n a i s ,

T er por ún ic o am par o a frági l m ão d a S ort e !


H oras em q u e s on h e i n as ruín as m ed itar ; , ,

N e ss e s t em pl os d e p e dra e s ombra à l uz d a L ua , ,

Ond e algum v el h o D eus pobr e fantasm a a er r ar , ,

P ára j unt o d e nós e é fri a e státua


, ,

E s on h e i vagu e ar saud oso e sol itáriº


, ,

Sob um luar n ascido e m m ont e s d a


V er e m s ombra e sp e ctral o dram a d o C al vário
, ,

E a r e pr e s e ntaç ão fan tástica d a C e i a !


V er Marta S alom é n as tr e vas da P ai xão !
, ,

E aos pés da cruz tºmb ado o corpo d e Maria


, , , .

V er à n ublosa luz d e íntim a in vocaç ão


, ,

O q ue v i u Madal en a à cl ara l uz d o ,

2 97
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

Ser nóm ada ! Viv er erran t e ! Q ue av en tura


N ess es d e s ert os d a Á s i a ! E u v ej o d e n trº e m m im , ,

Pl an íci e s d e arid e z e xt en sas de brancura ;


E rm o s q ue a S e d e alºnga e m ar e ai s s em fi m !
E d e s ej e i pe rd e r me e n t r e as fl or e sta s virg e n s !
-

Ser h om em prim iti v o e m luta c ontra as f eras !


,

E c e rcado a tr em e r d e pál idas v ertig e n s


, , ,

Me us ºlh o s s e pulta r n a b oca das crat e ras !


O n egr o e d oid o e n can t o e m nós a ri r a rir !, , ,

D ir s e á q ue n os d e slumb r a ard e nt e l abar ed a !


- -

Q ue praz er n ão s e ria ó m e us irm ã os s entir


, ,

Num ab ism o s em fun dº u m a p erpétua qu ed a !


Mom ent os d e d e líri o e d e d e svairam en to ,

D e grand e s s en saçõ e s q u e s e apagavam logo !


M om e nt os em q ue fui m ai s louco d o q ue o v en to ,

Faz end o à m in h a vida o q ue e l e faz ao f og o


, , .

O trágic o d estin o ! Hºrr or ! Fatal idad e !


A l m as q ue and am d e d ia e n oit e e mbri agadas
, , ,

S e n sív e i s para al ém d a S e n sibil idad e


E vivas para al ém das c ousas an imadas !
A i d e nós ! A i d e nós ! V ed e q ue e s t ran ha sort e !
C air cair cair s em d e scan sar j am ais
, , ,
.

E e ss e e spaç o q ue vai d o n asci m en to à m ºrt e


E a h ora em q ue º pr ofun dº A bi smo con t em plais !
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

H ora s e m q ue m e e xalt o e e l e v o i ntimam ent e .

N os m eus ol h os um a s tr o ac ord a : uma oraçã o


, ,

Um a lágrim a pura à lu z d o s ol tr e me nt e
, , ,

Um a g ota d e orval h o e m brasa n a a m pl id ã o , , .

H o r as e m q ue m e e n l eva o m a r ul h ar d a s font e s .

A d or da água afl ora e m m im o s d e v e r dura ,


.

Man h ãs d e A bril d oirand o os p obr ezin h os m ont es


, ,

E sb oçam o p e rfil sagrad o da T e rnu r a .

Hºra s e m q u e m eu s er subi nd o al ém d a Vida , ,

Mostra a sua fi gura a o l ong e e spl end o r osa ;


, ,

A qui n a t e rra obscura é f e i a e d ol orosa


, , ,

E l á cri stal ac e so e pé r ºla i n c e n d i d a !


,

Horas e m q ue a V e rdad e à s alm as s e


H oras d e E t ern idad e e graça r ep en tin a ,

Quand o ouç o murmurar a m ais l ongín qua e str e l a


E o S ilên ci o e m q ue d e sc e aº mundo a voz d ivina , , .

Hºras em q ue um a f ont e hum ild e q ue ch orava , , ,

D e u form as d e ha r m on ia a o m eu pri m e iro can t o .

D os m e us l ábi os n ascid o e m pl e nº céu pa irava , , ,

C aóti co d e s ombra e d e n octurn o e span tº !


H oras e m q ue s ofr end o a D ivindad e i m plorº ;
, ,

E sinto n o m eu p e it o o cºraçã o afli to !


, ,

E h á S erafin s bail and o a o s om d a L ira d e our o ,

Q ue a g en t e vê bri lhar à n oit e n o , ,

H oras vi vas d e luz d e am or e d e e sp erança


,

Q ue i n f l or a m a o passar a s b ordas d os
, ,

E fico e xtasiad o a ouvir c om º e m cri ança , ,

A al egri a d o sºl can tar nºs pas s arin h os !


H oras d e oir o em q ue s ou igr ej a alum iada .

Í ntim a al e luia e tére a m e


S urg e d al ém d a s e rra a D e usa d a alv orada
,
'

, ,

E o s eu p e rfil l á fora alv ej a n a p enumbra


, , .

H oras q u e s ão irm ãs d a H ora d errad e ira ,

E m q ue a t e rra n os abr e o s e i o t odo e m flºr .

E alcançamos e nfi m pr e s e nça v e rdad e ira


, ,

E s om o s nós enfim dian t e d o S e n h or


, ,
.
S C O M P L E T A S

C A N ! Ã O HUMI L D E

B ri sa d e A bri l
T od a p erfum e ,

E té r eo Num e
C on tig o vai !

P edri n h a hum i ld e
N o ch ão p erd ida ,

D o s ol f e rida
É s um a e str el a .

N egra ram ag em ,

O céu tocan do ,

Vai s e pi n tan do
-

D e azu l c e l e st e .

G ota d e orvalh o
T r em el uz i n do ,
T e n s o sol rin d o ,

D e n tr o d e t i !

Hum ild es c ousas


Q u e n ingu ém ol h a :
R am in h o ou fol h a
Ou grã o d e ar e i a ,

30 1
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

T en d es ncant o
o e

Mai s q ue d ivin o
Q ue D e us m e n in o
A ch ou n a
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

A h d ec erto e xi st e e m
, , n ós

A v e zin h a m atutin a
Q ue s olta cantand o a , ,
v oz ,

Ao al ém
v er

D esp on tar a L uz d ivin a


Q ue os n oss os olh os n ão

E sa canç ã o r evoa n d o
es , ,

Fica vibrando ecoand o , ,

E m toda a n ossa alm a q ue se e spanta


E tamb ém canta !

E stran h a cousa
E t ern am e n t e ,

A al egr i a m ist e ri os a
Q ue e m nós s e faz
, , , de r e p en t e !
E s oln asc e
q ue
E e scond e a fac e
E quim érico fulgura
, , ,

S obr e as n egras pai sag en s d a Natura .

A l egri a tu és a pr e c e ;
,

A voz q ue sob e e aman h ec e ,

A l ém d os
A urora d e al ém aur ora
Q ue d oira a front e d e D eus ,

Quand o el e ch ora ,

P eran t e a n ossa m is éria ,

On d e a sua L uz e tér e a ,

D ecaind o s e c ond e n sa
,

Num fan tasm a d e pr e s ença ;


S ombra d e son h os futuros
E d e son hos j á p e rdidos ;
E d e d e s ej os obscur os ,

Mal n ascid os

30 4
O B R A S C O M P L E T A S

E u t e ab en ç oo al egri a ! ,

A l m a e c orp o d a e sp e rança !
B em q ui s era b e ij ar o t eu p erfil ,

Q ue t em un s ol hos gran d e s d e crian ça


E m ai s fl or e s e s ol q ue o m ês d e A bri l !
T u bat es para entrar às n ossas p ortas
, , ,

C om d e d o s d on d e e sc orr e a luz d o di a .

E tud o s e d e slu m bra


E can tand o atrav e ssas d e r e p e nt e
, , , ,

A noit e d o m eu s er ch e i a d e e str el as m ortas


,
.

Na e diçã o d a s Ob ra s Co mpl e ta s : Bem q ui s era b e i j ar o


« » «

S e g ui u s e a q ui a c orr ecçã o m a n us cri ta d o a ut o r n um


-

ex e m plar daq ue la e di ç ã o .

305
T E I X E I R A D E P A S C O A E

EM OR A ! Ã O

As á r v or n s in aram m e a r ezar
'
s e -
,

Quand o à n oitin ha O z éf iro m urm ura ;


, ,

E s e vê n a s ra m ag e n s p erpassar
, ,

N ão s e i q u e r e p e ntin a e t r êm ul a

Ó á r v or e s ecul ar ,

C h e i a d e an os e p e r dõ e s ,

O s t e us ra m o s e s palham oraçõ e s
E fa z e m cru z e s n o ar , .

R e z am Prim av eras
A ve -

O s l íri o s a d e sm aiar
, .

Flutua n a p enumbra o can to das E sf eras


, , .

São l ágrim as nun s ol hos a cantar ,

Ó n octurn a am pl id ão q u e me s e duz e s
E on d e m e p e r c o a ci sm ar ,
.

O céu n um ch or o m urm ur o de luz e s


Ou n um suspir o vag o d e

A ndam r e zas s em d e stin o ,

P e lo I nfin it o a v oar ,
.

R e z am p e rfu m e s d e alm a as rosas sobr e , o altar ,

A Virg e m M ãe q ue t e m n os braços o M e n in o .

30 6
T E I X E I R A D E P A S C O A E

D O R ET É R E A

A dor e spiritual ,

A e tér e a d or
Virg em q u e e n xuga os pés
S an g r e nt os do S e nhor
Noit e santa q ue v em ,

R ezando con st e lada


, ,

C ur ar c om m ãos d e s ombra
, ,

A s ch agas d o s ol pôr -
.

A nós ac e nd e
d or q u e e m
Um íntim o luar .

D or s ofrida q ue l e mbra
A s ombra i rr e al da C ruz .

A m ágoa q ue s e vê
N o orval h o cinti lar ;
Fri os suor e s da n oit e ,

A braços com a luz .

A d or q ue n os embala ,

E m s on hos d e s egr edo ,

E e m n osso coraçã o
, ,

R eza por n ó s bai xi nh o


,
.

A d or pi e dosa a d or ,

Q ue n os m ag oa a m ed o .

à s lágri mas d iz
D or q ue
T ombai d e vagarin ho .

30 8
O B R A S C O M P L E T A S

A dor q ue v e st e e an ima
Os e rm o s pi n h e i r a i s ,

T ão l ívid os d a L ua
E d o cantar do m och o .

A d or q ue traz c on sig o
Os d ias outon ai s ,

E sobr e m i m d e sfol ha ,

A tard e um l íri o r o xo
, .

A d or q ue éa própria e ssência
Ocult a d a A l egria ;
D el icad eza d e al m a
E r e spl end or e tér eo ,

Q ue e n torna n o s ilên ci o
, ,

A s tin tas d a h arm on ia ,

E rasga o véu q u e e scond e


A im ag em d o Mi st ério .

A dor pr e ss e n tim e n to
,

Obscur o d e outra
R ecôn dito pal pit e
A d e sp ert ar em nós ; ,

C onfidênci as d e D eus
E m l ín gua n un ca ouvida
E q ue par e c e s er
A n ossa própri a v oz .

A dor q ue n os e l e va
A o m i st erios o
A d ivin a m atéri a
A stral dum a oraç ã o .

A dor q ue t em pr e s ença
E a d or —
al guém ;
S ombra d e D eus t al v e z , ,

Em n oss o c oraç ã o .

30 9
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

A d or e m q ue se vê ,

De súbi to raiar ,

O c ântico prim eir o


A O s ol d os passarin h os ,

Quand o fa z s ed e ouvi r
A s font e s murmura r ,

E o e rm o en s om b r a ainda
O bran c o d os cam in h os .

D or m at ernal r ezando
E m long e s d e an si edad e ,

Um a pr ec e d ivin a
A alum iar os céus .

D or ac e sa e m an an d o ,

E t e rn a claridad e
E q ue é o mun do a subir ,

L ib erto para D eus


,
.

A Virg e m M ãe d a D or
Q ue b eij a as outras d or e s
E as e mb ala n o s e i o ,

A fi m d e ador m ecê las -


.

A d or p enumbra azul
,

C rivada d e e spl e n d or e s
D or silên cio caind o
-
,

A noit e das estr el as


, .

D or m igrada em m im
e ,

Fal an do à s e rm as cousas
Q u e e str em ec e m viv e nd o , ,

A s h oras d o s ol p osto '


-
.

E s ão al mas d a L uz
Sorrind o m i lagrosas , ,

Nas l ágrim as q ue v êm
M ol har meu fri o r ost o .

31 0
E I X E I R A D R P A S C O A E S

CA N ! Ã O F ! N EB R E

Q ue m i st e rios o r ecort e
E ss e d a n ossa figu ra ,

N a al egria ou n a am argu ra ,

Mas sobr etud o n a m ort e !


, ,

E d efun to r e m orso d escan sa q ue


N os braços t ambém mortos do
Ó l ívi d o esqu el e to cong elad o
D o am or e d a l e mbrança !
T ombada cruz .

S in istra flor d e poi s q ue emur ch ec eu !


C írio q ue outr ora alum iou ]es u s
C era in e rt e d e m áscara vazia ,

C on t en t e d e fan tástica al egri a


Q ue é o sorri so d a D or q ue ad orm e c e u .

Máscara morta ! G élida pr e s ença ,

Nas tuas e rmas form as s e cond e n sa ,

O silênc io out on al e pálid o d as árvor e s ,

O s ilênci o e m r e l e vo e l ivid e z d os m árm or e s ,

E O silên ci o d ivin o e m ai s prof un d o


E m q ue as estr el as bri lh am sobr e o ,

T odos rmos vul tos d a n oitin h a


os e

Na m ística paisag e m p obr e zinh a ,

Ond e a Hum ildad e s e e xtasi a em flor ,

São c om o e s b oç os i nfant is d a D or .

31 2
O B R A S C O M P L E T A S

Mas aí o nosso rosto


, , ,

A argi l a m ai s tri l had a e m ais cavada ,

D e m a is con stan t e s l ágrim as r egada ,

E a e státua j á p erf e ita d o D e sgost o !


D e ss e an tigo d e sgost o m i st e ri os o
Q ue d e e str el as orval h a a es c u r i d a d e
E em n osso O l har é s ombra d e saudad e ,

T ão m el indrosa e frági l a sorri r ! ,

E em n osso coraçã o é líri o a abri r


, , ,

T rémulo ,

A dolori da graça ,

O e n can t o q ue é d ivi no porqu e passa


E no e spl e n dor c el e st e q ue el e e n c erra
, ,

É m ácul a d e t erra .

Pobr e e hum an o p e rfi l q ue s e a pagou !


A mar e las f eiçõe s q ue
B arro e nj e i tando as form a s q ue l he d eram ,

N in ho q ue um a a ve et ern a aband onou !

Ó m áscara d e g e lo e pal id e z !
T rágico busto e m l uar e
Olh os p ostos n a n oit e do I nfin ito ,

B oca e stagn ada e m fún ebr e m ud ez ,

Outrora n um a voz em oraç ão


,

E ac e sa n o r e l âm pago dum grito !

Ó D or e mbran ca estátua glaci al !


Ó l ágrim a fin al ,

I gn ota c h ama ,

C in til ando
V e l h as r e cord açõ es ,

A lm as d e avós i m ag en s e xpr essõ e s


, , ,

P erant e a nossa mort e ,

São vult os d e ss e E sp ectr o q ue e m nós , ,

31 3
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

E , e m n ó s , d e s ej a e
qu er ,

E d e t ão l ong e e t ão
m udado vem ,

Q ue é pr e s ença ilusória d e n in guém ,

S ombra prim o r di al d o n oss o

Q ue m ist erios o r e cort e ,

E ss e
da n ossa figura ,

Na al egri a ou n a am argura ,

Mas s obr etud o n a m ort e !


, ,
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

O m edo o outon o o l ua r
, , ,

D anç am com ig o às v ez es , ,

Nas n oi t e s d os frios m e s e s
Q ue d ão ai s d e a r r i pi a r !

Vi nd e a os m e us braços donz el as ! ,

Os m eus b e ijos s ão e str el as


D e qu e im ar !
É p edra meu coração
D e tan to am ar !
M eu s l áb ios s ão de p edra a rir e scuridã o ;
M eus ol h os doi s burac os a espr e itar
, .

A d or o tan t o as alm as q ue as con sumo !


,

A i d e m im ! A i d e m im ! A fac e q ue eu b ei j ar
E l og o nódoa d e fumo ,

A v oar !

O meu d e s ej o é sombra q ue d evora ;


P e rfi l d e lua n ova em a ço a , ,

N em todo o san gu e d a A urora


É capaz d e o saciar !

Vi nd e a m im ! Vin d e a m im ! Oh q ue l oucura ! ,

D onz el as qu ero am ar !
,

Vin d e s en tir a trágica t e rnura


D e st e s braç os m ai s fort es q ue os d o m ar !
Vin d e n el e s gozar O e spasmo d a ag on i a ,

E ss e d oi do pra z e r ac e so a cr epitar
, , ,

A té n os c on v e rt e r e m cinza fria !

Ó r os a s, q uem ês d e Maio
O

E spal ha ,
c om r e l âm pag os n o ar ! ,

C r a vos d e f og o a abri r a s d á l i a s num d e sm aio ;


,

Vi ol e t a s q u e d e n oit e os m ort os v ão ch eirar !


, ,
O B R A S C O M P L E T A S

E as p er pé t u a s s c q ui n h a s de n asc e nça ,

Nas j arras dum


C a m é l i a s ond e a n e v e s e c ond e n sa ,

T ão a l vas q ue as m acul a o n osso ol har


, .

E os g oi vos como círi os a alum i ar


, ,

O e te rno E squ ecim e nto !


Ó flor es q ue viv e i s à sombra tumu l ar , ,

E ao cai r d a tard e pe rfum ai s o v en to !


, ,

B em m e q u er es e str ela s q u e d ão l uz
- -
, ,

A çucen a s d a Virg e m a r e zar ;


Ma r t í r i os d escr ev en do o d ram a d e J esus ,

L í r i os bran cos b enz en d o a n egra t erra a o ,

O flor es sou a mort e e m f orm as vaporosas


, ,

C av e ira d iluída e m luz cr e puscu l ar


Meu e squ el et o , e m n uv en s lacrimosas ,

A n d a a voar a ,

Eu o outon o 6 flor e s !
s ou ,

D ou vos b e ijos e abraç os d e m atar !


-

No t ú m u l o do Ocaso i lum i n ado a dor es , ,

I r ei s a s epu l tar .

C om o fan tasm as a çout a dos ,

A s nuv en s corr em a ,

E j á cr e sc e n o e spaço a d el irar
, , ,

A m ú sica do i n v e rn o e m fri os son s m ol h ados .

A noit e aí vem tri l hand o o A zul ,

A i n ão tard a a
,

E u s ou a Mort e a S ombra o et er no Fri o , ,

E tud o a m in h a fouc e va i c e ifar .

Ó al egr e s passari n hos


D oidos d e so l a gorj e ar ! ,

Ou d e scan san do e m trémulos ram in h os


Q ue v ergam de t ern ura s em qu ebrar , .

31 7
T E I X E I R A D E P A S C O A E S

A l m in has q ue a b el a A ur o r a
T an t o g osta d e alum i ar ,

E d e qu e m D eus s e e nam ora ,

Quand o e m A bril l evan ta a p e dra tumular


, ,
.

Fugi fugi
, m i m ! T ud o d e m i m t em m edo !
de
Sou a v e d e rapi na a croc itar !
,

A minh a voz c ong e la a s ombra d o arvor e d o ;


,

T omba em floc os d e n e v e o ch or o d o luar .

Fugi fugi d e m im !
,

Voai ! V oai ! V oai ! I d e pousar


Nos astr os n in h os d e oir o em m ístic o j ard im
, ,

Ond e a l uz v ossa irm ã v e st e asas para v oar !


, ,

O p oetas n um a afliçã o
, ,

Num a loucura d e al m a a i nt errogar ,

A pétr e a e sfing e q u e n ão qu e r falar


E d e tr e vas i nun da a C riaç ã o !

Vós q ue s ois um a noit e d e slumbrada ,

S obr e os m ai s altos mont e s a ,

E às alm as d ai s a form a consagrada ,

E m q ue e l as v ão e nfim s e n tir viv e r s on h ar !


, , , ,

I ntérpr et es de D e us Po e tas
mund o a errar
, ,
no ,
. o .

Figuraçõ es carn ai s d o m i st erioso A m or


Vult os d o D ram a e t ern o e m e r m os a cantar , ,

E as P e ss oas santíss i m as d a D or !
V ó s t od os q ue h abitais com igo intim am en t e ,

E m e tratais por tu e m v os s o c onv e rsar ;


,

E vind e s para m i m s orrind o al egr e m en t e


,

C obri r m e us oss os n us d e rosas d e t oucar !


Vós q ue fost e s O e sp e ctro d a D esgraça ,

E O fan tasm a d a F om e a uivar à lua a uivar ! ,

E a s ombra d o T rabal h o a m end igar ,

D e itan d o un s O l h os m ort os a qu em passa .

31 8
E I X E I R A D E P A S C O A E S

HO RA F I N A L

A í vem a Se n t e -
se

E um S i lênc i o str e las apar ec e


de e .

Qu em é qu em é meu D eus q ue em pa l id ec e
, , ,

E s e c obr e d e Ci nzas n o meu s er ? ,

A lma q ue s e d e spr e nd e num a


Q ue suav e e d ivin o e ntard ec er !
C om o s eri a b om as s im
Morr er c om o a pai sag em d esfal ec e
, .

M orr e r quas e a sorrir d evagari n ho


, ,
.

E star a i nda no m un d o pob r ez m ho


E j á pa i rar son h ando al ém dos céus
, ,
.

M orr er cair n os braços da t ern ura ;


,

Morr er fug i r e nfi m a mort e e scura


, , , ,

S erm os e nfi m n a et ern a paz d e D eus !


, ,
ÍN D I CE

P ág i na

I ntrodução
As ri g e ns a i nfâ n ci a e a m on ta n h a
o :

C o i m br a e o mei o cu l t u ra l
O pr i n c í pi o fe mi n i n o

P oe s i a e m e ta fí s i ca
O s e n t id o n a ci on al: o s a ud os i s m o

O s e ntid o h uma n o

A e s t é t i ca da po e s i a

C i t é r i o da pr es e n t e e d i ção ( e a pr opó s i t o
r , :

j uve n i l i a )
« »

T ábua C r onológica

B e l o — M ed i t a çõ es
A Min h a A lm a
S e m pr e
T e rra Proib ida
ç ão ,
P a c oa
s es e mu i to ma i s um so l :

tário q ue um ho m e m co n v i ve n te .

In d i i d ual i ta
v t r e m e i ge t e d e
s es e ,
x n

r p u d i a a p e rso age m e n

s o c i al q u e os o u tro no l va m a e p e s s e r r

sen tar a m á s cara e m q e o s a q u i


, u n n

l os m o ;
a s e a co t e m p l aç ã o
-
s n ,

O l h a p ara d e tro d e i M nq ue des s . as

c o b r e d tro d e s ? A lé m d e i m ag s
en u en

v á c ua algo d i m p al p áv e l q u e ão
s, e ,
n

c o s eg u e a p re e d r
n n e .

To da i a
« o lad v c r i s t ã o e a té
, o ,

f ra c i ca n d a s u d e l i cada s e n i b i l i
n s o, a s

dad e l e va o a i t ere s s ar — p e la s d ore s


-
n se

e i n j u s t i ça d m u d o Se v i r m o s b m
s o n . e ,

h á u m a c o n s ta t e o c a ! a u a n s : n s

um a i m p a t i a u i e r al u m a mor q u e
S n v s ,

s e es te d fra t e r o a t oda s a s cr i a
n e, n ,

t ura s a b raça d o os po bre s e o tr i


,
n s s

t e d o m e s m o m o d o q u e s árvo r s a s
s a e ,

p edra s h u m i ld es e a s s tre la s A mor e .

de a t ure a r e l i g i o a rad i cad o n u m


n z s ,

p ro f u d o r e s p e i t o pe l o m i s tér i o d e
n

t oda s s l m s a a a .

L o ga m e t e o b s i d i a n t e m e t e a té
« n n ,
n ,

a o ú lt i m o al e t o P a s c oa e s há —
n d e ee ,
r

la borar os s e u s t e m a s,

a s u a f i l os of i a o u c o c e p çã o i t u i
« » n n

t i va d o U i v e rs o Toda s a s v e rda
n «

de s» q u e P a c oa es p ro cla m a e m p ro s a
s ,

e v e rs o co m a s e g u ra ça d u m i l u m i
,
n

n ad o ão pa s a m a fi al d e m o m e
,
n s ,
n ,
n

t os d u m p ro c e s s o d i aléct i c o s e m f m i .

Se a s s u a s v i õ es s ão q u i m ér i ca s
« s ,

P a s c oa e s pro f e s o u t od a a v i da a Q u i s

m e ra c o m u ma f i d e l i d ad e a s s o m b ros a ,

m arca d u m a e c e p c o a l q u al i da d e x i n

N ão v i o tra e r o s s ol u e z -
n «

çõ e s ma s i q u i e taçã o
» ,
« n » .
O 2 .
º
l me d e s t a e d i ção
vo u

ma g i s t r a l c o nc e b i d a pe l o P ro f
, .

D r J ac i nt o d o P R A D O C O E
.

L HO c o mpr e e nd e r á c o nfo r me
, ,

o c r i t é r i o c ro no l ó g i c o ad o p
t a d o pa r a e s t a s é r i e :

A V E N T UR A

J ES U S E P Ã
PA R A A L UZ

V I D A ETÉR EA

A pub l i c a r b r e ve me n t e

I m pr e s c i n d í ve i s
na b i b l i o t e ca d o
ho me m c ul t o , as

O b r a s C o m pl e
t as d o me s t re do
« s a u d o s i s mo »
T EI X EI R A
D E PA SC O A ES

uma das ma i s
l
a t as f i g ur a s da
no ssa l i t e r a t ur a.

Você também pode gostar