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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

MILENA ÁVILA DE SOUZA SILVA

O ESTILO GÓTICO: ANÁLISE DA CATEDRAL DE CHARTRES E DA CATEDRAL


DA SÉ

BELO HORIZONTE
2023
1. INTRODUÇÃO

O estilo gótico apresenta grande importância e influência no mundo das artes,


visto que até nos dias atuais ele é usado como inspiração para as mais diversas
intervenções artísticas. O objetivo desta monografia é de introduzir ao contexto
histórico e socioeconômico em que a Europa se encontrava, apresentar
características marcantes do gótico e fazer análises comparativas de duas catedrais,
a Notre-Dame de Chartres e a Catedral da Sé, demonstrando como os aspectos do
estilo acontecem na prática da edificação, tendo em vista que o lapso temporal entre
as duas construções é significativo.
A arquitetura gótica, por mais que tenha um estilo bem definido, sofre
mudanças em suas características conforme a região em que se encontra, sendo
que as descritas e analisadas ao longo deste trabalho podem ser generalizadas para
o território francês dado que a maior parte das catedrais situadas nesta região
apresentam os principais elementos do estilo gótico, dentre elas a Catedral de
Chartres, escolhida para este trabalho por ser uma das pioneiras do estilo, enquanto
a Catedral da Sé foi escolhida por representar uma releitura do gótico, concretizada
após séculos da criação do estilo, além da sua importância cultural na cidade de São
Paulo.
2. O GÓTICO E A IDADE MÉDIA

O marco histórico que inicia o período medieval, caracterizado pelo sistema


feudal, coincide com o fim do Império Romano. Simultaneamente, a igreja se
fortalece e populariza entre os reinos propagando a fé, cobrando e perseguindo os
fiéis. (SCHMITT, 2011). Essa presença e poder influenciará na arquitetura e na arte
do período.
A era medieval pode ser compreendida em dois períodos, a Alta Idade Média
(entre os séculos V e X) e a Baixa Idade Média (Séc. XI e XV). O primeiro período é
marcado pelas condições precárias dos diversos reinos espalhados pela Europa,
devido a invasões de povos inimigos, como os bárbaros. A arte predominante neste
período é a arte românica. (ANDRADE, 2016).
A Baixa Idade Média é marcada pelo enfraquecimento do sistema feudal por
consequência do crescimento do comércio devido a mudanças na Europa, como o
desenvolvimento de tecnologias agrícolas. Neste período, a Europa se via mais
estável quando comparado aos séculos anteriores. (ANDRADE, 2016). A expressão
artística deste período é o gótico, cujo nome possui uma carga pejorativa dada pelos
apreciadores da arte clássica, pois significa ‘feito pelos Godos’, ou bárbaros.
A arte gótica se desenvolveu em um contexto de mudanças sociais e
econômicas, como o crescimento das cidades e o surgimento da burguesia, sendo
marcada principalmente pela influência religiosa da igreja católica em suas
expressões, pois tudo que era produzido era supervisionado por ela, a igreja era
considerada um juiz no qual por ela tudo deveria ser aprovado. As principais obras
se encontravam nas igrejas, pinturas, murais e principalmente a arquitetura, isso se
dá pela intenção de atrair e impressionar os fiéis com o intuito de instigá-los a
frequentar esses locais de adoração. (SCHMITT, 2011).

“Na Europa Medieval, castelos e igrejas começaram a ser


construídos e a arte existiu para servir quase que exclusivamente as
ideias religiosas, que de modo geral, era tratada com respeito e
devidamente cuidada, não sendo diminuída a meras decorações”
(XAVIER, J. 2020 apud. GOMBRICH, 1999).
Então as catedrais criadas no estilo gótico, como destaca Janaína Xavier
citando Freitas (2013, p. 201), são “símbolo de uma revolução religiosa, de uma
mudança de mentalidade e de uma mensagem filosófica enviada, através da pedra
das construções, pela arquitetura”.
Le Goff (1992) compreende que o crescimento populacional na Baixa Idade
Média criou, na arquitetura, uma necessidade de expansão nos espaços devocionais
cristãos com o financiamento da burguesia. Desse modo é possível associar esse
crescimento com a principal característica das catedrais góticas apresentando
construções de tamanho expandido, torres altas e pontiagudas. (ANDRADE, 2016).
Essas características só foram possíveis devido a um modelo de construção de
arcos que será aprofundado posteriormente neste trabalho.

3. CARACTERÍSTICAS DO ESTILO GÓTICO NAS CATEDRAIS

A arquitetura gótica tinha como principal objetivo evidenciar a superioridade


de Deus diante do homem, sendo assim, as principais características deste estilo
estão relacionadas com a grandeza do catolicismo (GURGEL, s.d), de forma a
evidenciar como o homem é diminuto comparado às divindades.

3.1 SISTEMAS DE ARCOS OGIVAIS E ABÓBADAS.

De origem mesopotâmica, a forma ogival dos arcos foi a principal invenção da


arquitetura na Baixa Idade Média, permitindo a construção de grandes janelas e a
ampliação do espaço na catedral (MACHADO, 2014), visto que a Europa passava
por um crescimento populacional. Para receber o grande número de fiéis, os
arquitetos pensaram na construção de arcos e abóbadas ogivais — cruzamento das
ogivas — que aguentasse o peso das torres sem comprometer a beleza dos salões,
podendo assim aumentar a dimensão das catedrais. O peso do teto é distribuído
para as colunas que exercem força apenas no solo, não para os lados, onde este
modelo de arco possibilita também sua construção com paredes mais finas.
(ANDRADE, 2016). Assim como os arcos ogivais, as abóbadas utilizam uma
distribuição de empuxo semelhante, entretanto, aqui, os arcos estão cruzados,
permitindo ampliar o espaço. O principal estilo de abóbada usada na arte gótica foi a
abóbada de nervuras, que de acordo com Reis, as nervuras possuem o objetivo de
reforçar as interseções dos arcos para suportar as tensões geradas nestes locais.
Figura 1 - Arco ogival
Figura 2 - Abóbada de nervuras

Fonte:
https://www.flickr.com/photos/artesvisuais/243 Fonte:
8194879 https://heloiselaurindo.blogspot.com/2016/07/a
bobada-domo-ou-cupula-quais-as.html

O sistema de abóbadas pode ser de curvatura simples ou cruzada, onde a


simples envolve apenas um arco que segue de forma contínua, distribuindo o peso
em só uma direção, necessitando da construção de apoios resistentes, enquanto a
de curvatura cruzada consiste no cruzamento de dois arcos ou mais, distribuindo o
peso em diversas direções permitindo que as abóbadas fiquem sustentadas apenas
por colunas, ao invés de paredes maciças, ampliando o espaço útil nas catedrais,
sendo assim a mais usada nas grandes naves para comportar o número crescente
de fiéis.
Figura 3 - (A) Abóbada simples (B) Abóbada cruzada

Fonte: REI, pág. 17, 2017

3.2 PLANTA E ESTRUTURA

As plantas das catedrais remetiam a objetos sagrados como as cruzes. Suas


torres eram altas e pontiagudas, demonstrando sua proximidade com o céu e
consequentemente, com Deus. A parte da catedral que ostenta dimensões é a nave
principal, é nela onde se encontram outras duas naves laterais compostas por
abóbadas de nervura (JANSON, 1996) - nervuras constituídas de ferro e cimento. A
fachada é geralmente composta por três portais distintos onde cada um dá acesso
às naves, sendo o portal central a entrada para a nave principal e os dois outros
portais para as naves laterais. (MARSON, s.d)

Figura 4: Plantas do estilo gótico

Fonte: http://arquitetandocomcafe.blogspot.com/2015/02/arquitetura-gotica.html
Figura 5: Três portais da fachada

Fonte: http://arquitetofala.blogspot.com/2011/12/arquitetura-gotica-muito-mais-do-que.html

As paredes eram ornamentadas com vitrais de vidro colorido que iluminavam


todo o espaço ao longo do dia de maneira estratégica. Por exemplo, as rosáceas
que eram posicionadas para a luz entrar e iluminar perfeitamente o altar, onde a
intenção era dar a sensação aos fiéis de que a igreja era um local mágico e sagrado.
Os vitrais contribuem também para o ensino da religião à comunidade, visto que elas
possuíam histórias e doutrinas cristãs. Outro elemento presente nas construções
eram as Gárgulas, cuja função era o de escoamento de água e seu significado
religioso remetia à proteção dos fiéis e da própria catedral.

Figura 6: Rosácea

Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ros%C3%A1cea_%28arquitetura%29
Figura 7: Gárgulas

Fonte: https://www.flickr.com/photos/hiltonlebarbenchon/40070425385

Para concretizar os ideais da arquitetura (vitrais, paredes finas e dimensões)


foi criado um sistema na qual a estrutura fosse sustentada no lado externo. A
solução foi a criação de arcobotantes e contrafortes, que difundiam o estresse
gerado pelos elementos constituintes da estrutura superior para evitar que ela
cedesse. O estresse gerado pelo teto deveria ser aliviado pelos arcobotantes que o
descarregam nos contrafortes, suportando maiores tensões que os outros tipos de
sistemas. (REIS, 2017)
Figura 8: Arcobotante e contraforte

Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Arquitetura_g%C3%B3tica
4. CATEDRAL DE CHARTRES
4.1 HISTÓRIA

Localizada na cidade de Chartres, a catedral gótica foi erguida para servir de


guarda para a túnica da Virgem Maria (MARSON, s.d) e sua construção foi iniciada
no século XII. No começo da edificação, a igreja sofreu um incêndio onde grande
parte de sua construção original foi perdida (MARTINS, 2016). Sua construção se
concretizou com a ajuda dos mais diversos cidadãos da cidade, camponeses, clero e
nobreza, contribuindo com doações a fim de se livrarem dos pecados, indicando
assim que esta igreja pertence a todos os moradores da cidade. (MARSON, s.d). Ao
longo dos anos ela sofreu poucos danos, sobreviveu a guerras, manifestações
contra ao catolicismo, etc. (MARTINS, 2016).
Sendo a primeira a utilizar as técnicas do estilo gótico, como arcobotantes e
abóbadas com nervuras, a Catedral de Chartres é considerada a pioneira do estilo,
inspirando construções importantes ao longo dos anos. Ademais, ela é um dos
monumentos com o patrimônio mais conservado e antigo que representa a arte
gótica.
Tombada como patrimônio mundial pela UNESCO, a catedral é um importante
destino para os peregrinos na cidade de Chartres, por sua conexão simbólica com o
divino. Sua presença atrai turistas de todos os lugares sendo essencial na economia
local (UNESCO, s.d).

4.2 ARQUITETURA
4.2.1 A planta

Em harmonia com as características do estilo gótico, a planta da catedral é


uma representação da cruz latina, possuindo três naves: uma central, a maior entre
as três, e duas laterais. De acordo com Elias Junior (2005):
“A planta da própria igreja faz uma alusão ao corpo do Cristo
crucificado: a entrada representa os pés; o caminhar, pela nave
principal, em direção do altar as pernas e o tronco, cujos braços se
constituem pelo transepto e a cabeceira iluminada pelos vitrais, cuja
direção é alinhada para o leste (direção de Jerusalém e do nascer do
Sol) constitui a cabeça do Salvador.”
Figura 9: Planta da catedral de Chartres

Fonte: https://arteazucarera.wordpress.com/2016/01/11/catedral-de-chartres-planta-y-alzado/

4.2.2 As torres e a fachada

Um detalhe evidente na catedral é a assimetria das torres centrais, onde uma


possui as características próprias do estilo gótico e a outra condiz com o estilo
românico, devido a sua construção se dar sobre uma igreja românica (NERY, 2013).
A torre sul, também chamada de velha torre sineira, possui cerca de 105 metros e
sua forma octogonal e robusta lembram edifícios românicos. Já a torre norte ou nova
torre sineira, conta com cerca de 113 metros, sendo maior que a torre românica e
possui ornamentos feitos em pedra que remete a um enorme rendilhado.
Figura 10: Fachada da catedral de Chartres

Fonte: https://richardnilsen.com/2012/11/21/chartres-and-mont-saint-michel/

Sua fachada é composta por três portais que carregam acima de si estátuas
representando três passagens bíblicas diferentes. Segundo Xavier, essa parte é
nomeada de tímpano e os acontecimentos retratados nos mesmos correspondem a
três momentos importantes na jornada de cristo:

“[...] a entrada de Cristo no mundo por meio da Encarnação (portal à


direita); sua partida com a Ascensão ao completar seu ministério
terrestre (portal à esquerda); e sua Segunda Vinda ao final dos
Tempos (portal central).” (XAVIER, 2020).

Figura 11: Três portas frontais de Chartres

Fonte: http://ai.stanford.edu/~latombe/mountain/photo/france/france-chartres.htm
Sendo a pioneira do estilo, a catedral de Chartres foi a primeira a conduzir
todo o sistema de empuxo utilizando os arcobotantes e contrafortes possibilitando
que o interior fosse ampliado e as paredes fossem menos robustas. Visto do lado
externo, esses elementos remetem a um esqueleto, demonstrando tanto o poder,
quanto a graciosidade da igreja.

Figura 12: Arcobotantes e contrafortes de Chartres

Fonte: https://epilaarte2.blogspot.com/2014/01/catedral-de-chartres.html

4.2.3 Vitrais

Eles são os elementos mais antigos da catedral, pois não foram destruídos no
incêndio no início da construção e não foram danificados posteriormente.
Constituindo cerca de 176 janelas e 2600m², os vitrais da catedral são a coleção
mais importante da França e atraem os olhares de todos dentro da basílica.
(ÉDITIONS LAROUSSE). As figuras retratadas são bem diversas, representando os
signos do zodíaco, Noé, Jesus e Maria, entre outros. De acordo com Tayla Marson,
eles também simbolizam diferentes classes sociais, como a nobreza e pequenos
artesãos, com o intuito de evidenciar que a igreja abriga a todos, independente da
posição social.
De acordo com o centre des monuments nationaux (Centro de Monumentos
Nacionais), o vitral mais famoso da catedral possui estilo românico e representa a
Nossa senhora da Bela Verrière. Seu reconhecimento é graças aos artesãos que
alteraram a constituição do vidro criando de um tom de azul único na arte, que
recebeu o nome de azul de Chartres.

Figura 13: Vitral de Nossa Senhora De La Bela Verrière

Fonte: https://epilaarte2.blogspot.com/2014/01/catedral-de-chartres.html
Figura 14: Detalhe de um do vitrais da catedral

Fonte: https://fr.wikipedia.org/wiki/Vitraux_de_Chartres

4.2.4 Estrutura interna

Chegando ao máximo de 64 metros de largura, graças à construção dos


contrafortes, o interior da catedral esbanja espaço para incríveis obras de arte.
Conforme o site Cathédrale a estrutura interna conta com a presença de arcos
ogivais e abóbadas de nervuras. Os arcos são encontrados nas laterais da basílica
chegando a uma altura de aproximadamente 36m e são eles que abrigam a maioria
dos vitrais da catedral onde suas colunas conduzem o olhar para cima aumentando
a sensação de verticalidade. As abóbadas foram construídas com o plano Balrog,
isto é, uma pedra angular é o ponto de união de quatro arcos diagonais, enquanto o
interior de cada módulo dispõe de uma forma retangular.
Figura 15: Abóbadas de nervura, Catedral de Chartres.

Fonte: https://www.parisconnection.fr/product/private-chartres-cathedral/

Figura 16: Arcos ogivais de Chartres

Fonte: https://epilaarte2.blogspot.com/2014/01/catedral-de-chartres.html
4.2.5 Labirinto

Encontrado no centro da nave central, o labirinto possui em torno de 13


metros de diâmetro e seu caminho chega a 262 metros. É um elemento de
decoração e foi encomendado para compor os ornamentos da basílica. De acordo
com Débora Martins (2017), o labirinto é feito de mármore negro e calcário
Barchéres, sua parte central é composta de cobre onde foi gravada uma
representação da batalha entre Teseu e o Minotauro.
Possui grande significado religioso aos peregrinos e frequentadores da igreja.
A tradição convida os credores a cruzar o labirinto (do início ao centro, seguindo
para o final) de joelhos como forma de penitência.

Figura 17: Labirinto

Fonte: https://artsandculture.google.com/asset/the-labyrinth-chartres-cathedral/agHRAEoLfkfYrw

4.2.6 O coro

O principal ornamento visto é o grupo escultórico que compõem a torre do


coro litúrgico nas paredes da catedral, onde sua função é separar o coro do restante
da igreja. Segundo a UNESCO, chegando a 100 metros de comprimento e 6 de
altura, o coro foi entalhado em três pedras distintas, mas que harmonizam entre si.
Assim como os vitrais, o coro também descreve um conto bíblico que neste caso,
representa a história de Maria e Jesus.
“A primeira cena representa Joaquim e Ana, pais de Maria,
guardando seus rebanhos. Os seguintes retomam episódios da
Bíblia, como a Anunciação, a Natividade ou a Ressurreição .
Finalmente, o último narra à coroação de Maria.” (CATHÉDRALE,
TOURS ET TRÉSOR DE CHARTRES, tradução nossa)

Figura 18: O coro

Fonte:
https://www.istockphoto.com/br/foto/cenas-de-pedra-esculpidas-dentro-da-catedral-de-chartres-gm954
060440-260468616
5. CATEDRAL DA SÉ, SÃO PAULO.
5.1 HISTÓRIA

Localizada na região central de São Paulo, na Praça da Sé, a Catedral teve


sua história iniciada em 1591. Seu primeiro projeto foi construído pelo Cacique
Tibiriçá, tornando-a uma das primeiras igrejas da cidade. Os materiais usados na
construção são chamados de taipa de pilão (SANTOS, 2014) ou pau-a-pique
(RAMIREZ, 2014) que consiste em uma mistura de barro e palha socado,
frequentemente usado na cultura indígena brasileira. (RIBEIRO, s.d). No ano de
1741, o templo foi demolido por estar quase em estado de ruínas (RAMIREZ, 2014).
A nova versão construída apresentava características do estilo barroco e em 1911
seria demolida novamente para abrigar a catedral atual, projetada pelo arquiteto
Maximilian Emil Hehl (1861-1916), (SANTOS, 2014). Apesar de possuir elementos
de épocas diversas, como uma cúpula renascentista, o estilo predominante era o
neogótico, influenciado pelo gótico clássico europeu.
A inauguração oficial da Nova Catedral ocorreu em 1954, ainda em
construção, faltando somente as torres frontais, que seriam finalizadas
posteriormente em 1967. Durante uma baixa econômica no Brasil, a igreja se viu
abandonada, sofrendo diversos impactos ambientais, acelerando sua deterioração.
Em 1999 ela é fechada para reforma e em 2002 é reinaugurada novamente.
Além de sua importância religiosa, a catedral foi casa de alguns eventos
sociais. Durante a Ditadura Militar, ela se mostrou abrigo para a oposição,
oferecendo local para manifestações, denunciando crimes, etc. (RIBEIRO, s.d) Em
1984, ocorreu o ato a favor das Diretas Já e outras manifestações a favor da
democracia no país. (RAMIREZ, 2014)

5.2 ARQUITETURA
5.2.1 Planta

Apesar de menos evidente, a planta baixa da catedral da Sé ainda possui o


formato de cruz latina. Nela são vistas um total de 5 naves onde todas possuem
abóbadas ogivais, possuindo uma largura de cerca de 46 metros e 111 metros de
comprimento. Os materiais usados na sua edificação foram aproximadamente 800
toneladas de mármore juntamente com granito maciço. (SANTOS, 2014)
Figura 19: Planta da catedral

Fonte: https://vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/02.022/2186

5.2.2 Fachada, Contrafortes e arcobotantes.

Sua fachada é composta por duas torres de 92 metros de altura (SANTOS,


2014). Diferentemente da catedral de Chartres, ela possui apenas um portal de
acesso às naves centrais e laterais. De acordo com Sergio Brisola (2021), o portal é
composto por um arco ogival, o tímpano é ornamentado com representações da flora
brasileira, o centro exibe o simbolismo da paixão de cristo e seu entorno apresenta
algumas rosáceas (figura 27), já as partes laterais do portal contam com esculturas
de profetas evangelistas.

Figura 20: Frente da catedral da Sé

Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Catedral_Metropolitana_de_S%C3%A3o_Paulo
Ao longo de toda sua estrutura externa são encontrados contrafortes e
arcobotantes, evidenciando ainda mais o pertencimento da catedral ao estilo gótico.
Eles permitem uma maior elevação das abóbadas, transferindo o peso do teto aos
arcobotantes e distribuindo pelos contrafortes (RAMIREZ, 2010).

Figura 21: Arcobotantes e contraforte

Fonte:
https://3dwarehouse.sketchup.com/model/4f00282f4a7d878881c6df5b677bb577/Catedral-da
-S%C3%A9-Se-Cathedral-S%C3%A3o-Paulo-Brazil?hl=pt-br&login=true

5.2.3 Vitrais
Diferentemente da catedral de Chartres, os vitrais da Sé não são tão
reconhecidos, entretanto, marcam presença com sua beleza. Somam cerca de 750
metros quadrados e foram trazidos da Itália. Conforme Marcos Santos, eles
representam passagens bíblicas, importantes personagens religiosos do país e
alguns narram um pouco da história do Brasil na visão religiosa.
“[...] a parte mais alta, a imagem de Nossa Senhora da Esperança,
companhia de Pedro Álvares Cabral na descoberta do País.
Também retrata a primeira missa no Brasil, as cerimônias de
fundação de São Paulo, do Rio de Janeiro e de Salvador, a
exploração do rio Amazonas pelos franciscanos, a chegada dos
beneditinos, carmelitase capuchinhos.” (SANTOS, 2014)

5.2.4 Abóbadas e arcos

As abóbadas nervuradas, que compõem a parte superior da catedral, são em


sua maioria quadripartidas, sendo apenas duas com cinco planos. Os segmentos de
abóbadas nervuradas são quebrados pela cúpula renascentista que dispõe de uma
forma octogonal, destoando do restante da igreja. (RAMIREZ, 2010). De acordo com
Karen Ramirez, os arcos ogivais da basílica, ao invés de retangulares, possuem
forma trapezoidal, sendo poucos deles retangulares de fato. Eles são elevados por
pilares, cumprindo a função de abrir um vão nas paredes e “completar sua
geometria”.
Figura 22: Abóbada de nervura.

Fonte: https://saopauloantiga.com.br/a-fauna-brasileira-na-catedral-da-se/
Figura 23: Arcos ogivais

Fonte:
https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/3/3144/tde-23112010-102807/publico/Tese_Karen_Niccoli_
Ramirez.pdf

Figura 24: Cúpula renascentista

Fonte: https://ndidini.com.br/obras/catedral-da-se-cobre-patinado/
5.2.5 Adornos da catedral

Os elementos de decoração da igreja provêm principalmente da Itália e da


própria cidade de São Paulo. Nas naves laterais se encontram mosaicos italianos,
possuindo cores brilhantes e partes douradas feitas em ouro. (SANTOS, 2014). Os
altares e seus constituintes são, em sua maioria, cravados em mármore Carrara. A
basílica detém também em seu acervo um órgão vindo de Milão, de acordo com
Santos;
“É o maior órgão de tubos da América do Sul. Sua inauguração
ocorreu em 25 de novembro de 1954, doado pela companhia
Antárctica. [...] Possui cerca de 10 mil tubos sonoros e 124 registros,
sendo 112 os registros reais. Cada teclado possui, prontas, cinco
combinações sonoras fixas e seis combinações manualmente
ajustáveis.”

Figura 25: Mosaico

Fonte: https://www.descubrasampa.com.br/2021/03/mosaico-de-sao-paulo-catedral-da-se.html
Figura 26: Órgão original

Fonte:
https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2022/03/danificado-orgao-original-da-catedral-da-se-completa
-20-anos-sem-uso.shtml

5.2.5.1 A decoração inspirada na cultura Brasileira

Independente da inspiração gótica europeia, a catedral da Sé não deixa de


homenagear seu país. Seu acervo conta com distintos elementos ornamentais que
remetem à bela cultura brasileira, que serão apresentados a seguir (RAMIREZ,
2010). A parte superior das colunas, chamados de capitéis, simboliza objetos
comuns no círculo brasileiro, como alguns animais da fauna (CUNHA, s.d.). Outros
elementos importantes representados são o milho e o café, recursos essenciais para
o crescimento de São Paulo (SANTOS, 2014).
Figura 27: Esculturas da flora e de Jesus, no tímpano da catedral da Sé.

Fonte catedral da sé - Google maps

Figura 28: Capitais representando a fauna brasileira

Fonte: https://www.facebook.com/photo/?fbid=1673546926178725&set=a.804283469771746
6. CONCLUSÃO
Conclui-se que o estilo gótico, apesar de variável, possui seus elementos
marcantes e fundamentais que caracterizam seu reconhecimento. A essência do
gótico marca presença desde a planta baixa até os ornamentos de decoração. A
catedral de Chartres está imersa no estilo em vários aspectos, sendo a primeira a
utilizar algumas técnicas, contudo ainda apresenta elementos que não condizem
com o gótico. As duas catedrais se diferem principalmente devido à cultura e época
na qual estão inseridas, e no caso da catedral brasileira isso se torna evidente por se
tratar de períodos e costumes totalmente distintos.
Dito isso, é evidente como o estilo marca presença nas duas catedrais
mesmo apresentando desvios na sua concepção.
REFERÊNCIAS

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