O que é etnografia? Etnografia é a arte e a ciência de descrever um grupo humano – suas instituições, seus comportamentos interpessoais, suas produções materiais e suas crenças (Angrosino, 2009).
Os etnógrafos se ocupam basicamente das
vidas cotidianas rotineiras das pessoas que eles estudam. O que é etnografia? Apesar de ter sido desenvolvida como uma maneira de estudar sociedades de pequena escala, tradicionais e iletradas e de reconstruir suas tradições culturais, a etnografia é praticada hoje em todos os tipos de condições sociais. (Angrosino, 2009) O que é etnografia? Os etnógrafos coletam dados sobre as experiências humanas vividas a fim de discernir padrões previsíveis do que de descrever todas as instâncias imagináveis de interação ou produção. (Angrosino, 2009) O que é etnografia? A etnografia é feita in loco e o etnógrafo é, na medida do possível, alguém que participa subjetivamente nas vidas daqueles que estão sendo estudados, assim como um observador objetivo daquelas vidas (Angrosino, 2009). (...) a etnografia propriamente dita só começa a existir a partir do momento no qual se percebe que o pesquisador mesmo deve efetuar no campo sua própria pesquisa e que esse trabalho de observação direta faz parte da sua pesquisa. (Laplantine, 1994, p. 75) O pesquisador deixa seu gabinete de trabalho para ir compartilhar da intimidade daqueles que deixam de ser considerados informantes a serem questionados e se tornam aqueles que o recebem como hóspede e mestres que o ensinam. O pesquisador aprende, como se fosse um aluno, não apenas a viver entre os outros, mas a viver como eles, a falar sua língua e a pensar nessa língua – a sentir as emoções dos outros a partir de si mesmo. (Laplantine, 1994, p. 76) Pioneiros da etnografia Bronislaw Malinowski Franz Boas Franz Boas (1858-1942) Realizou pesquisas pioneiras, iniciadas no final do século XIX, em particular entre os Kwakiutl e os Chinook da Colúmbia Britânica (Canadá) Franz Boas (1858-1942) Foi ele quem ensinou que tudo deveria ser meticulosamente anotado em campo: desde os materiais constitutivos das casas até as notas das melodias cantadas pelos esquimós – e atentando para o detalhe do detalhe. Franz Boas (1858-1942) • Considera que não existe objeto mais ou menos importante na ciência. As piadas de um contador são tão importantes quanto a mitologia que expressa o patrimônio metafísico de um grupo (Laplantine, 1994, p. 78). • Foi um dos primeiros a nos mostrar a necessidade do acesso à língua nativa, à língua da cultura que se está buscando estudar (Laplantine, 1994, p. 78). Bronislaw Malinowski (1884-1942)
Viveu entre os trobriandeses na Melanésia
Bronislaw Malinowski (1884-1942) “Imagine-se o leitor sozinho, rodeado apenas de seu equipamento, numa praia tropical próxima a uma aldeia nativa, vendo a lancha ou o barco que o trouxe afastar-se no mar até desaparecer de vista. Tendo encontrado um lugar para morar no alojamento de algum homem branco – negociante ou missionário – você nada tem para fazer a não ser iniciar imediatamente seu trabalho etnográfico. Suponhamos, além disso, que você seja apenas um principiante, sem nenhuma experiência, sem roteiro e sem ninguém que o possa auxilia (...) Isso descreve exatamente minha iniciação na pesquisa de campo, no litoral sul da Nova Guiné.” (Malinowski, 1978, p.23) Bronislaw Malinowski (1884-1942) Não foi o primeiro a conduzir uma experiência etnográfica, mas radicalizou essa prática – procurou romper ao máximo durante o campo contatos com o mundo europeu. Ninguém antes dele tinha se esforçado tanto para penetrar intensamente na mentalidade dos outros e em compreendê-los desde dentro. Uma verdadeira busca por uma despersonalização, para entender o que sentem os homens e mulheres que pertencem a outra cultura. Bronislaw Malinowski (1884-1942)
Ele procura reviver nele próprio os sentimentos dos
outros, fazendo da “observação participante” uma participação psicológica do pesquisador. O antropólogo deve “compreender e compartilhar os sentimentos” das pessoas que estuda e tentar “interiorizar suas reações emotivas” (Laplantine, 1994, p. 82). Os pioneiros da pesquisa de campo acreditavam que estavam aderindo a um método consoante com o das ciências naturais, mas o fato de estarem vivendo nas próprias comunidades por eles analisadas introduziu um grau de subjetividade nas suas análises que estava em dissonância com o senso comum do método científico. Método etnográfico • Ele é baseado na pesquisa de campo (conduzido no local onde as pessoas vivem e não em laboratórios onde o pesquisador controla os elementos do comportamento a ser medido ou observado). • É personalizado (conduzido por pesquisadores que, no dia a dia, estão face a face com as pessoas que estão estudando e que, assim, são tanto participantes quanto observadores das vidas em estudo). Método etnográfico • É multifatorial (conduzido pelo uso de duas ou mais técnicas de coleta de dados – os quais podem ser de natureza qualitativa ou quantitativa – para triangular uma conclusão, que pode ser considerada fortalecida pelas múltiplas vias com que foi alcançada). • Ele requer um compromisso de longo prazo, ou seja, é conduzido por pesquisadores que pretendem interagir com as pessoas que eles estão estudando durante um longo período de tempo (embora o tempo exato possa variarde algumas semanas a um ano ou mais). Método etnográfico • É indutivo (conduzido de modo a usar um acúmulo descritivo de detalhe para construir modelos gerais ou teorias explicativas, e não para testar hipóteses derivadas de teorias ou modelos existentes). • É dialógico (conduzido por pesquisadores cujas conclusões e interpretações podem ser discutidas pelos informantes na medida em que elas vão se formando). Método etnográfico • É holístico (conduzido para revelar o retrato mais completo possível do grupo em estudo). (Angrosino, 2009)
O antropólogo anota suas observações em um
diário de campo, faz entrevistas, colhe depoimentos, faz registros visuais (fotografias ou vídeos), conforme seus interesses de pesquisa e o grupo com quem está estudando. O que o etnógrafo enfrenta, de fato [...] é uma multiplicidade de estruturas conceptuais complexas, muitas delas sobrepostas ou amarradas umas às outras, que são simultaneamente estranhas, irregulares e inexplícitas, e que ele tem que, de alguma forma, primeiro apreender e depois apresentar. E isso é verdade em todos os níveis de atividade do seu trabalho de campo, mesmo o mais rotineiro: entrevistar informantes, observar rituais, deduzir os termos de parentesco, traçar linhas de propriedade, fazer o censo doméstico… escrever seu diário. Fazer a etnografia é como tentar ler (no sentido de “construir uma leitura de”) um manuscrito estranho, desbotado, cheio de elipses, incoerências, emendas suspeitas e comentários tendenciosos, escrito não com os sinais convencionais do som, mas com exemplos transitórios de comportamento modelado. (GEERTZ, 2008, p.7) “A etnografia é, antes de mais nada, a reconstrução da experiência do pesquisador em campo, experiência guiada pela sua disposição de entender parte de um universo empírico por ele selecionado. A experiência da pesquisa de campo é para o pesquisador algo transformador, que o transforma, porque o atinge por completo, uma experiência sobre a qual é frequentemente difícil falar. No campo todos os nossos sentidos são estimulados: passamos a conviver com cheiros que não nos são familiares, nosso paladar se vê frente a comidas que nunca havíamos experimentado, dormimos em horários muito diferentes e em espaços a que não estamos acostumados; tomar banho no rio ou fora do chuveiro pode ser uma experiência inédita para muitos, diga-se o mesmo com relação a todas as nossas necessidades; a experiência corporal, mesmo no contato com outras pessoas é muito diversa da que conhecíamos.” (NOVAES, 2014) Etnografia no meio urbano Utilizam-se estes mesmos métodos clássicos, desenvolvidos no estudo de sociedades tribais, para estudar a vida e a cultura urbana. Etnografia no meio urbano Para Roberto DaMatta (1987), trata-se de: transformar o exótico em familiar e o familiar em exótico Etnografia no meio urbano “o que sempre vemos e encontramos pode ser familiar, mas não é necessariamente conhecido e o que não vemos e encontramos pode ser exótico, mas até certo ponto conhecido.” (Gilberto Velho, 1978) Fontes • ANGROSINO, Michael. Etnografia e observação participante. Porto Alegre: Artmed, 2009. • DAMATTA, Roberto. Relativizando: uma introdução à antropologia social. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 1987. • GEERTZ, Clifford. Uma descrição densa: por uma teoria interpretativa da cultura. In: A Interpretação das Culturas. 1ed., 13reimpr., Rio de Janeiro: LTC, 2008, p.3-21 • NOVAES, Sylvia Caiuby. O silêncio eloquente das imagens fotográficas e sua importância na etnografia. Cadernos de Arte e Antropologia [Online], Vol. 3, No 2 | 2014. Disponível em: http://cadernosaa.revues.org/245. Acesso em: 01 Outubro 2014. • LAPLANTINE, François. Aprender antropologia. 8. ed. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1994. • VELHO, Gilberto. Observando o Familiar. In: Edson de Oliveira Nunes (Org.). A aventura Sociológica. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.