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Universidade Aberta

Licenciatura Em Ciências Sociais 19/20 – 2.º Ano – 1.º Semestre


Etnografias
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Tema 1
Titulo 41101 Etnografias
Capitulo 1.1 - O método, a escrita e a reflexibilidade
1.2 - Os/as antropólogos/as: testemunhos do terreno
Autor Lúcio Sousa

1. Etnografia e os (as) Antropólogos (as) (Pág. 5 – 10)


1.1 O método, a escrita e a reflexibilidade (Pág. 11 - 48)
1.2 Os/as antropólogos/as: testemunhos do terreno (pág. 49 – 65)

TEMA 1

1. ETNOGRAFIA E OS ANTROPÓLOGOS: Pág. 5 - 10

Etnografia = vocábulos gregos éthnos, «povo» e gráphein, «d/escrever».

Refere-se ao processo de escrita e ao objeto/conhecimento emergente dessa mesma


escrita, apresentando a etnografia em simultâneo como um produto e um processo.

 Como Produto, a etnografia corresponde aos textos elaborados pelos antropólogos


como resultado da sua investigação de terreno.
 Como Processo, a etnografia corresponde ao método associado à fase de trabalho de
campo e observação participante, ao contacto e relação do antropólogo com os sujeitos
de estudo e colaboradores no terreno.

CONCEITOS/TEMAS: Etnografia / Método / Observação participante / Escrita etnográfica /


Reflexibilidade / Integração do antropólogo.

OBJECTIVOS:
 Explicar a emergência da etnografia;
 Entender a sua especificidade enquanto método de investigação;
 Explicitar as diferentes fases do trabalho etnográfico;
 Analisar o processo de escrita como parte constituinte da experiência e saber
antropológico.

Objetivos das 2 primeiras semanas:


 Quando e como emerge a etnografia.
 Qual a especificidade do método?
 Quais as caraterísticas do método etnográfico? [momentos/passos]
 Quem está envolvido no contexto etnográfico? Quem são os atores em presença e como
interagem?
 Como se constitui o ato de escrita como parte do processo etnográfico?
 Em que consiste a reflexibilidade, que lugar tem esta na pesquisa?
No século XIX, a Antropologia (antropos, homem; e logos, discurso), organiza-se como
disciplina científica e institucionaliza-se como ciência. Anteriormente, esta insidia sobre

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a dimensão físico-biológica e pré-histórica, associada à história natural da humanidade
(com o contributo da arqueologia).
Com o evolucionismo, a antropologia adquire uma nova dimensão, direcionando-se
para os aspetos sócio-culturais dos povos/sociedades em estudo (explora os domínios
da linguagem, da organização social, nomeadamente, do parentesco, do religioso, do
político e económico). Articulando-se com a etnografia (etno: povo/etnia; grafia:
descrição) e a etnologia (etno: povo/etnia; logos: discurso), a antropologia integra-se
como uma das etapas da investigação antropológica, que segundo Lévi-Strauss (1996)
corresponde a 3 fases de pesquisa:
 A etnografia corresponde à fase de investigação no terreno, recolhendo os
respetivos dados.
 A etnologia corresponde a uma primeira fase de comparação e síntese dos
dados num âmbito regional
 A antropologia, social/cultural, corresponde à última fase de síntese global.

Durante o séc. XIX, a etnografia revela-se como um meio de recolha de dados e


elementos do terreno em 1.ª mão, e através da comparação/síntese desses mesmos
dados, o objetivo à luz dos evolucionistas era elaborar leis científicas. De acordo com
Sanjek (2004): a etnografia pode ser interpretada em simultâneo como um produto e
como um processo:
 Como produto, corresponde aos estudos e textos elaborados pelos
antropólogos, fruto da investigação no terreno.
 Como processo, aponta para os métodos de investigação antropológica,
utilizados no trabalho de campo e observação participante.

No entanto, em pleno séc. XIX, durante o Iluminismo, a Antropologia divide o objeto de


estudo em povos “primitivos”, distantes do Ocidente, e “civilização”, um conceito que
tende a superiorizar uma civilização e cultura em detrimento de outra, que inferioriza,
com a finalidade de os dominar. Além disso, na concretização das 3 fases de pesquisa
antropológica, que pressupõem a recolha de dados no terreno, a respetiva síntese
comparativa a nível regional e por fim a síntese global dos estudos efetuados.

Na época, a investigação antropológica era na sua maioria, efetuada pelos chamados


antropólogos de “secretária/sofá”, que obtêm a informação de forma indireta,
trabalhando os dados recolhidos no conforto dos gabinetes, assim, o saber
antropológico depende e centra-se na contribuição dos cronistas, viajantes, soldados,
missionários e comerciantes que discutiam, sobre os povos que conheciam nas suas
viagens, relatavam não só verbal, mas também por escrito, o meio e modo como viviam,
cultivavam seus hábitos, normas, características, os seus rituais, a sua linguagem.
Poucos eram os antropólogos que se deslocavam até junto dos povos distantes para
desenvolverem um trabalho de campo mais fidedigno, desenvolvendo instrumentos de
recolha etnográfica e elaborando teorias a seu respeito.

Metodologia qualitativa na antropologia

Etnografia: Consiste na observação direta e na descrição dos factos reais, tais como
eles saem no inquérito do terreno.
O trabalho de campo etnográfico inclui várias técnicas de recolha de informação,
feita através de diversas formas de observação.

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Formas de Observação

Observação e registo: o investigador está mais perto da realidade, atuando no terreno.

A observação é um processo denso e cansativo, para além da capacidade de


observar, é necessária destreza para descrever o objeto de estudo, envolvendo a
anotação prévia das observações e a sua organização por assuntos.
A observação ocorre em todos os ambientes que possibilitem os contactos
sociais, de carácter interpessoal, nos acontecimentos ou receções organizadas. O
investigador retira destas experiências informação sobre os participantes e os
grupos envolvidos pela forma como se relacionam e interagem.
Pode ser feita sem o conhecimento do observado (observação indireta), ou pelo
contrário, através de uma participação ativa no desempenho de papéis auxiliares.

A observação divide-se em duas partes:

Observação participante:

Na perspetiva da etnografia “clássica”: implica um trabalho de campo do


investigador, de observação do Outro, de familiarização com a cultura observada e de
coleta sistemática de dados (Ribeiro 2002:48)

Na perspetiva da etnografia pós moderna: implica um trabalho de campo como


espaço de troca de experiências e de verificação da intercomunicabilidade entre os
modelos culturais dos quais fazem parte o observador e o observado. (Ribeiro 2002:48)

Conclusão: como observador participante, participa na vida coletiva da população,


comunidade, grupo ou organização, requer o seu envolvimento nas atividades e
quotidiano dos sujeitos observados, empatia e diálogo, independentemente das
diferenças culturais, a interação e integração no seio da comunidade, a partilha de
experiências, o registo presencial de todos os acontecimentos, para a obtenção de
dados e conteúdos, necessários a uma investigação prolífera, responsável, pautada
pelo rigor e ética. As duas perspetivas complementam-se e completam-se entre si, mas
requer do observador um “background” a nível emocional para gerir o estudo com
imparcialidade

Observação não participante:


O investigador não interage com o objeto do estudo no momento em que realiza a
observação, não está diretamente envolvido na situação a observar, atuando somente
como observador, logo não poderá ser considerado participante. Apesar de possibilitar
a recolha de dados e informação, menos pormenorizados, sem gerar discussões ou
suspeitas junto dos sujeitos observados, esta técnica reduz a interferência do
observador no observado e permite o uso de instrumentos de registo sem influenciar o
objeto do estudo.

Antropologia, etnologia e etnografia

São termos que correspondem a diferentes etapas do processo de estudo.

De acordo com o antropólogo Claude Lévi Strauss (1996) há três níveis de


interpretação das culturas:

Etnografia: Fase de investigação no terreno.

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A etnografia estuda e revela os costumes, as crenças e as tradições de uma
sociedade ou povo, de caracter geracional, permitem a continuidade de uma
determinada cultura ou de um sistema social.
“Significa literalmente “escrever sobre os povos” e designa a atividade
antropológica de recolha de informação através da observação participante,
prática que consiste em ficar durante meses num lugar estudando a vida de um
grupo de pessoas ou de uma pequena sociedade.” - Batalha (2005:29)

Etnologia: Comparação e síntese dos dados, num âmbito regional da etnografia.


A etnologia estuda os factos e documentos levantados pela etnografia, buscando
uma apreciação analítica e comparativa das culturas e das civilizações.
“Consiste na interpretação e análise da informação etnográfica. A separação entre
a etnologia e a etnografia não é fácil de estabelecer, pois não só frequentemente
o etnólogo e o etnógrafo são a mesma pessoa como este é sempre guiado por
alguma orientação teórica no seu trabalho de campo.” - Batalha (2005:29)

Antropologia, social ou cultural: Última fase de síntese global, desenvolvendo-se


como um resumo comparativo dos dados provenientes da pesquisa da etnologia e
etnografia.

“Lévi-Strauss escreve: etnografia, etnologia e antropologia não constituem três


disciplinas diferentes, ou três conceções diferentes dos mesmos estudos. São, de fato,
três etapas ou três momentos de uma mesma pesquisa, e a preferência por este ou
aquele destes termos exprime somente uma atenção predominante voltada para um
tipo de pesquisa, que não poderia nunca ser exclusivo dos dois outros”. – Retirado da
Internet

Na realidade, estes três níveis convergem, interagem e complementam-se. Mas, no que


concerne ao processo de investigação, ensina-se aos alunos que este se deve iniciar
com a etnografia, seguindo-se etnologia e, depois, a antropologia.
O processo de investigação não é linear, tendo o investigador de se munir de alguma
flexibilidade, podendo ter de alterar o seu plano inicial de forma a se poder “enquadrar”
na realidade a estudar.

Surgem escolas teóricas que se afastam dos pressupostos evolucionistas, duas delas
representadas por Franz Boas (1852-1942), percursor do Particularismo histórico (uma
forma de difusionismo moderado que assenta no trabalho de campo) e Bronislaw
Malinowski (1884-1942), um dos mentores do Funcionalismo, defende a estadia
prolongada no terreno e introduz a observação participante como método de pesquisa
antropológica. Malinowski desenvolve o seu trabalho de campo nas Ilhas Trobriand,
publicando mais tarde a obra “Os Argonautas do Pacífico Ocidental”, fruto da sua
investigação no terreno, estabelece-se como o produto/modelo do trabalho etnográfico
na antropologia.

PARTICULARISMO HISTÓRICO OU HISTORICISMO: considerado um dos ramos do


Difusionismo, cujo principal representante é Franz Boas, teoria que se opõe ao
evolucionismo e domina a antropologia durante a primeira metade do séc. XX.

Pressupõe que cada cultura tem uma história particular (esta deve ser reconstruída
em factos palpáveis, incluindo os linguísticos, arqueológicos e etnográficos).

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Defende que a difusão de traços culturais pode ter lugar em qualquer direção do
mundo, cada cultura é única devendo ser compreendida pelo observador dentro do
contexto cultural em que ocorre, pelo respeito pelos valores, normas, hábitos,
costumes e modos de vida da população estudada.
A evolução pode acontecer também do mais complexo para o simples.

O relativismo cultural é uma afirmação antropológica universal e a investigação de


determinada sociedade, população ou povo deve basear-se no trabalho de campo, no
terreno do próprio antropólogo.

Franz Boas: Defendeu que não há culturas superiores nem inferiores (relativismo
cultural) e insurgiu-se contra o nazismo. Promoveu a ideia de que os antropólogos
deviam aprender as línguas dos povos estudados, uma mais-valia para conhecer
profundamente a cultura, hábitos e modos de vida dos mesmos. Institui a advogacia na
defesa dos povos ditos “nativos”.

FUNCIONALISMO: Surge no final do século XIX e com ele estabelece-se o modelo


clássico etnográfico, na pesquisa de campo através da observação direta (observação
participante).

Esta corrente tenta fazer uma descrição das instituições de dada sociedade,
esclarecer a sua função social e comprovar a sua cooperação para a construção de
uma sociedade estável e equilibrada.

Funcionalismo Psicológico, fundado e representado por Bronislaw Malinowski,


defende que o funcionamento das instituições culturais operam no sentido dar resposta
às necessidades básicas, físicas e psicológicas dos indivíduos em sociedade. Atribui
importância ao indivíduo.

Malinowski, percursor do funcionalismo, consolida a antropologia como uma disciplina


académica com objeto, método, teorias e estruturas próprias, foi responsável por
sistematizar o método da observação-participante, cuja monografia “Argonautas do
Pacífico Ocidental”, fruto da experiência com as tribos das Ilhas Trobriand, contribuiu
para a fundamentação/consolidação do método etnográfico (define sujeito, método e
objetivo).

 Assume grande importância na antropologia, porquanto, o trabalho de campo


privilegia a estadia prolongada no terreno junto de uma comunidade ou região, e
introduz no método de pesquisa a observação participante.
 Além disso, destaca a aprendizagem da língua local como elemento essencial,
sobretudo em situações de permanência prolongada no terreno e a obtenção dos
dados de forma direta junto dos informantes, observados, ou atores sociais,
interagindo, observando e participando na vida diária dos mesmos (de modo
informal ou formal), recorrendo a técnicas de recolha de informação, como: Registo
de conversações informais / Entrevistas formais a informantes-chave (princípio
essencial da pesquisa antropológica) / Elaboração de mapas da organização da
população, dos recursos naturais, sensos, genealogias / Aplicação de
questionários.

Como se reverte este saber na sociedade da época?

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 E.U.A.: Domina a preocupação de como aplicar os conhecimentos antropológicos na
compreensão e resolução dos problemas inerentes à integração da população nativa
na agenda política americana. Resultando numa série de conflitos entre antropólogos
e políticos, dado que os objectivos dos políticos opunham-se às visões dos
antropólogos e à necessidade de tempo para o estudo dos “nativos”.

 Europa: Há uma relação estreita entre a antropologia e o colonialismo.


Kuper (1996, 2005): A antropologia social britânica resultou de um compromisso
com o projecto colonial inglês e em simultâneo legitimar e consolidar a mesma, na
academia e na sociedade. Surgem divergências entre antropólogos com a política
colonial e respectivas autoridades, pois, promovem a defesa dos “nativos” que
estudavam (eram alvo da indiferença por parte dos administradores coloniais).

 Holanda: O desenvolvimento da antropologia deve-se essencialmente à posse das


“Índias Orientais”.
Boskovic (2008): A antropologia institucionaliza-se no séc. XIX (1830), antecedendo
os outros países europeus. Neste contexto, a etnografia assume um papel relevante
na preparação de futuros funcionários coloniais, n campo das pesquisas e produção
etnográfica, promovendo deste modo, o desenvolvimento da antropologia na
Holanda.

 Portugal: O desenvolvimento da antropologia metropolitana (referente ao poder


central perante o qual responde uma colónia ou província ultramarina) foi limitado e
tardia a sua importância colonial.
Afonso (2006) identifica o desenvolvimento da antropologia em Portugal em etapas.
A primeira, a que denomina proto-antropologia, desde o século XIX até à segunda
Guerra Mundial caracteriza-se pelo domínio da corrente Romântica.
Leal (2000) e Schouten (1998, 2001), caracterizam a antropologia portuguesa como
“etnológica-folclorista”, ou seja, encontrava-se sobre o domínio da tradição
filológica (estudo de uma língua através de textos escritos) e etnológica (analisa as
situações e documentos registrados pela etnografia, descrição das várias etnias ou
da cultura de um povo, interpretando-os a fim de propor uma comparação entre
culturas), que denominaram de “antropologia de construção da nação” (Stocking
1982).

A partir dos anos quarenta e sobretudo por influência de Jorge Dias, desenvolvem-se os
estudos de comunidades e culturas, quer nacionais quer coloniais. A institucionalização
lenta da antropologia só ocorre após a revolução de 1974. É também neste período que
se revela a emergência de uma Antropologia Aplicada em consonância com a
Académica. Isto não quer dizer que a antropologia não tivesse anteriormente uma
dimensão aplicada.

Em Portugal a relação da antropologia e a sua aplicabilidade no domínio colonial ficou


vincada com a relação da Escola Superior Colonial (posteriormente Instituto Superior de
Estudos Ultramarinos, e atualmente Instituto de Ciências Sociais e Políticas) criada em
1906. A existência da Escola não é um caso isolado, ela insere-se no quadro europeu
da época em que surgiram várias escolas com o mesmo propósito.

O Primeiro Congresso Nacional de Antropologia Colonial de 1934 contribuiu e


estabeleceu objetivos através dos seus estudos, na planificação racional de
organização e aproveitamento das colónias. Assim a antropologia colonial institui-se

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formalmente, e os assuntos de que vai ocupar-se revestem, além do seu grande
interesse científico, uma alta importância nacional, para além, de privilegiar a
antropologia física e a classificação das características somáticas das populações
colonizadas. Neste contexto desenvolveram-se várias missões às colónias no sentido
de recolher dados tanto físicos como culturais sobre as suas populações.

No cômputo geral Europeu, os interesses nas populações colonizadas e respetivas


colónias, seguiam os modelos de teorias antropológicas aplicadas no séc. XIX, que
segundo Stocking (1982), assume-se como uma “antropologia de construção do
império”.

A prática antropológica sofre alterações significativas com o fim dos impérios coloniais,
centrando-se nas sociedades ditas “ocidentais” e na sua maioria de origem dos
antropólogos. Surge um novo olhar para o estudo do próprio meio onde se inserem, a
cultura, os valores, os costumes, e em simultâneo, renovados interesses pela esteira
dos outros, nativos e antropólogos. Os vestígios nativos são referidos em âmbito
museológico e para os antropólogos abrem-se os arquivos das pesquisas perpetuadas
ao longo do tempo. Inicia-se uma afluência de “nativos” para as ex-metrópoles, em
contexto de migrações de trabalho ou forçadas por outros motivos, constituindo deste
modo novos campos de investigação antropológica.

Escrita etnográfica:
 Objeto de acérrimos debates e críticas, questionando o contexto e a forma da
sua produção. O antropólogo passa a ser igualmente um objeto.
 Writing Culture (Clifford e Marcus, 1986): um dos 1.ºs textos pós-modernistas
que reúne os textos resultantes de uma conferência realizada em 1984. As
ideias centrais são:
o A antropologia devia deslocar-se do campo da etnografia científica para o
estudo dos próprios textos etnográficos, visando a sua desconstrução (no
caso dos antigos) e a sua elaboração,
o Contextualizar e ponderar face à metanarrativa (ideia da grande teoria),

o A tensão relativa ao papel do antropólogo face às suas lealdades.

Trabalho do Antropólogo

Críticas ao seu trabalho:

1. A escrita Antropológica: é objeto de crítica, se a recolha dos dados é subjetiva


estes não podem ser analisados de forma objetiva. No limite é considerada uma
ficção, e como tal é analisada pelos pós-modernistas.
2. A validade da interpretação: é questionada devido a que, no terreno, o
antropólogo trabalhar com um n.º limitado de informantes, questionando-se então
até que ponto as suas ideias são representativas de toda a comunidade ou
sociedade. A condição pessoal do antropólogo é posta em causa.

3. O trabalho de campo: aponta para uma relação de falta de simetria / equilíbrio de


poder entre o antropólogo e os seus sujeitos de estudo, revelando também as
posições particulares das suas sociedades, que em âmbito colonial posicionam-se

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como dominante e a dominada. O antropólogo deve considerar e avaliar este
contexto que indica uma forma de etnocentrismo.
Houve a necessidade de uma consciencialização das condições e reciprocidade
entre o antropólogo e os informantes, comunidades, colaboradores, bem como,
uma reflexão sobre as políticas estatais, corporativas e académicas a adotar na
produção de material etnográfico.

Etnocentrismo: conceito antropológico que ocorre quando um determinado individuo


ou grupo de pessoas, com os mesmos hábitos, crenças, valores, caráter ético e social,
discrimina, com juízos de valor, outro ou grupo de outros que não comungam do mesmo
modo de viver, pela sua cultura, condição social de diferentes hábitos ou costumes.
Este conceito relega para o Nós superior aos Outros em atitude discriminatória, omite e
esquece o Outro, não respeitando a sua cultura, valores, normas, regras éticas e
morais.

PRINCÍPIOS DE UM MÉTODO:
O que resulta da etnografia enquanto método qualitativo e o que lhe é específico?
No debate deste tema, segundo Stewart (1998, 5-8) os cinco princípios que
caracterizam a pesquisa etnográfica, aludindo de modo resumido são: observação
participante / holismo / contextualização / descrição sociocultural / conexões teoréticas.

1. Observação participante: a peculiaridade essencial remete para o facto do


conhecimento etnográfico resultar de uma experiência pessoal do antropólogo.

2. Holismo (O sistema como um todo determina como se comportam as


partes) (compreender os fenômenos na sua totalidade e globalidade): o
etnógrafo sintetiza observações diferentes para elaborar um constructo (designa
em ciência um conceito teórico não observável diretamente / Construção mental
ou síntese feita a partir da combinação de vários elementos) holístico da
“sociedade” ou “cultura” em estudo.
3. Contextualização: concentrar-se num determinado local permite ao etnógrafo
ligar os diferentes dados de forma compreensiva (permitindo comparações).
4. Descrição sociocultural: a descrição detalhada e análise das relações sociais e
culturais.
5. Conexões teoréticas (teóricas): o papel da teoria antropológica no trabalho
etnográfico é objeto de debate, há quem defenda que não é possível fazer
etnografia sem uma orientação teórica, mas também há quem considere o
contrário.

1.1 O MÉTODO, A ESCRITA E A REFLEXIBILIDADE (Pág. 11 – 48)


Este tema assenta na leitura de dois textos:

Texto 1: Urpi Montoya Uriarte, «O que é fazer etnografia para os antropólogos»,


Ponto Urbe [Online], 11 | 2012, posto online no dia 14 Março 2014.

Texto 2: Cornelia Eckert, Ana Luiza Carvalho da Rocha, Etnografia: Saberes e


Práticas. Iluminuras v. 9, n. 21 (2008)

TEXTO 1
Urpi Montoya Uriarte

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O que é fazer etnografia para os antropólogos
Na etnografia, a teoria, as evidências empíricas e os dados adquiridos estão de tal
forma interligados que se conclui que a Teoria e a Prática são inseparáveis: o fazer
etnográfico (campo) é sempre moldado pela teoria, o que não significa que ele está
submetido a ela, uma vez que por definição, a realidade supera sempre a teoria.
Na perspetiva de Peirano (2008:3): defende que a etnografia, não é apenas uma
metodologia ou uma prática de pesquisa, “mas a própria teoria vivida /.../ No fazer
etnográfico, a teoria está, assim, de maneira óbvia, em ação, emaranhada nas
evidências empíricas e nos nossos dados.”
Quando o pesquisador vai para o campo, está sujeito a alterações à sua teoria pelo
conhecimento das realidades, adquiridas através da prática (a comunidade, grupo,
povo, sociedade, etc. ao serem pesquisados, no campo, o olhar e o escutar do
pesquisador é guiado pela teoria), pois a realidade irá sempre superar a teoria.
A teoria volta a manifestar-se quando o investigador coloca todos os conhecimentos
adquiridos no papel, ou seja, ao voltar e escrever o texto etnográfico, põe em ordem e
traduz os factos vivenciados numa teoria interpretativa.
Segundo Favret-Saada (1990, apud GOLDMAN, 2008), o que caracteriza o antropólogo
é essa peculiar formação para se sentir “afetado” por outras experiências, o que se
traduz num trabalho de campo imbuído de teorias e ao voltar, tornar a reavaliar todo o
processo etnográfico, das informações obtidas, transformá-las e interpretá-las à luz da
autenticidade e veracidade dos factos vivenciados.
Para que o investigador execute um bom trabalho de campo, necessita de se preparar
previamente, fazer um estudo aprofundado do povo que vai estudar e acompanhar, ser
isento de senso comum e sobretudo ter “ vocação” para este tipo de trabalho que exige
da parte dele um “desenraizamento crónico”, ou seja, ”não se sentir em casa em lugar
nenhum”.

A ETNOGRAFIA É UM MÉTODO PRÓPRIO DA ANTROPOLOGIA DO SÉCULO XX

A antropologia do Séc. XIX era especialista no estudo dos ditos “povos primitivos”, na
análise de estudos feitos em documentos elaborados a partir de relatos de viajantes,
missionários, expedições científicas, de funcionários coloniais, entre outros. Estes
antropólogos trabalhavam essencialmente em gabinetes, lendo esse material,
deduzindo e especulando sobre o que eram estes povos, baseando-se estes textos
antropológicos em afirmações e teorias etnocêntricas.
Como uma resposta crítica a este método de estudo surge a antropologia do séc. XX,
com o objetivo de reconstituir a história dos povos e explicar como alguns tinham
evoluído em detrimento de outros.
Os antropólogos começam a integrar as expedições científicas cada vez mais
frequentes na 2.ª metade do séc. XIX, significando sinais de mudança nos
procedimentos antropológicos e consequentemente no fazer etnográfico.

Com o tempo foi-se tornando menos etnocêntrica, acabando por se descobrir a


importância de que para além de se conhecer novos povos e respetivas sociedades, é
necessário também conviver, ouvir e olhar o “outro” numa perspetiva relativista e
contraposição ao etnocentrismo.

Relativismo Cultural: em oposição ao etnocentrismo, releva para uma visão totalmente


neutra sobre a diversidade cultural de um povo, pelo respeito das suas normas, regras,

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costumes e valores, ou seja, falar sobre o relativismo é não julgar as diferentes culturas,
é deixar um pouco de lado a sua cultura, abrindo a mente para conhecer novos
horizontes, novas culturas.

Em 1914 Bronislaw Malinoswski, foi para as ilhas Trobriand, permanecendo mais de 3


anos, vivendo / convivendo com os povos e aprendendo a língua nativa. Em 1922, edita
o livro “Os Argonautas do Pacífico ocidental ”, fruto dessa experiência e com ele
apresenta o “método” etnográfico.
Esta vivência e experiência no terreno fez com que percebesse de modo diferente os
povos em estudo, captando “o ponto de vista do nativo”, de suma importância para uma
visão completa do universo nativo. Para a compreensão deste universo, propõe 3 tipos
de informação: numérica e genealógica, o quotidiano e as interpretações nativas,
denominando estas informações como o esqueleto, o corpo e a alma, sendo todas elas
fundamentais.

A antropologia do séc. XX passou a ter como objeto não os povos primitivos, mas as
sociedades humanas, incluindo os povos desconhecidos e todos aqueles que já faziam
parte da cultura do antropólogo. O discurso sobre o “Outro” deixou de se centrar na
sociedade do pesquisador e passou a ser relativizado com a vivência entre os nativos e
sua visão deles mesmos. O respeito pela alteridade, singularidade de cada sociedade
humana, é mote para pensar a diferença e o antropólogo é aquele que se interessa pelo
“Outro”, uma vez que tenta compreendê-lo no seu meio sócio-cultural, em detrimento da
defesa de uma identidade imbuído num território de certezas, quer ser abrangido pelo
“Outro” e desenraizar-se, procurando na alteridade uma solução e não um problema.
O método etnográfico passa a ser parte integral da antropologia, considerado por
Goldman como “o estudo das experiências humanas a partir de uma experiência
pessoal” (2006, p.167).

A dimensão da alteridade: a capacidade de se colocar no lugar do outro, nas relações


interpessoais (relação com grupos, família, trabalho, lazer, sociedade), numa atitude
ética de diálogo, consideração, de respeito pelas diferenças, e empatia face aos outros.
Logo, a antropologia ensina-nos a nos descentrarmos de nós próprios assim como da
cultura e sociedade em que nos inserimos, dando-nos a possibilidade de olhar para
novos horizontes e alternativas, para aprendermos com os outros e de nos vermos
através dos outros, conhecendo-nos mais profundamente.

O MÉTODO ETNOGRÁFICO

O Método etnográfico pode ser considerado como meio de aproximação das realidades
a que nos propomos estudar e compreender.
“o método etnográfico não se confunde nem se reduz a uma técnica; pode usar
ou servir-se de várias, conforme as circunstâncias de cada pesquisa; ele é
antes um modo de acercamento e apreensão do que um conjunto de
procedimentos.” (MAGNANI, 2002, p.17).

Pode ser dividido em:

1. Método de estudo de caso: estudar um grupo de nativos urbanos de uma


determinada comunidade;
2. Método biográfico: estudo da trajetória familiar e o seu percurso na comunidade;

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3. Método comparativo: quando se estudam vários casos e são alvo de
comparação;
4. Método do urbanismo errante: quando se percorre um local da cidade, de uma
forma lenta e à deriva.

5. Método etnográfico: estudo profundo e pormenorizado de um povo que se quer


compreender, da sua vida quotidiana, costumes sócio-culturais, aprendendo,
trabalhando, interagindo e dialogando com eles.

O método etnográfico pode ser composto por três fases: a formação teórica, o
trabalho de campo e a escrita.
1) Estudo da teoria (formação teórica): recolhendo informações e interpretações
sobre a população em estudo, pode ser considerado como a “bagagem
indispensável para ir a campo”. A “sacada” etnográfica só provém do tempo em
campo e da formação do investigador (este, através da leitura de diversos textos
etnográficos, aprende a ver pessoas, não meros indivíduos, com as suas
particularidades, valores, sabedorias…)
2) Trabalho de campo: viver durante um longo tempo com os “nativos” (rurais,
urbanos, modernos ou tradicionais), conhecer o seu dia-a-dia, os seus
costumes, tradições, a língua, a cultura, em suma, estabelecer relações com as
pessoas. O trabalho de campo antropológico consiste em estabelecer relações
com pessoas, ou seja, os nativos são para o antropólogo pessoas e não
indivíduos abstratos, gente concreta e peculiar, dotada de suas características
próprias.
3) Escrita: trabalho a ser realizado depois das duas primeiras fases, ou seja
documentar o trabalho realizado em campo, ordená-lo de uma forma legível para
que outros o compreendam (para que haja uma correta aliança entre teoria e
prática).
Esta fase é para alguns tão difícil quanto a permanência em campo, pelo facto de
transcrever factos em texto de forma honesta e interessante. Por muita proximidade
que o antropólogo tenha estado com a população em estudo, a escrita é sempre do
antropólogo e este não é um nativo.
“A dificuldade advém da etnografia e a escrita serem duas coisas radicalmente diferentes: a
etnografia é uma experiência, uma experiência do outro para captar e compreender, depois
interpretar, a sua alteridade; a narrativa etnográfica é a transformação dessas experiências totais
em escrita, o que, necessariamente exige um mínimo de coerência e linearidade que não são
próprias da vivência.” (Sousa, 2016-2017:21)

De acordo com Viveiros de Castro (2002): “A voz do antropólogo não é a voz do nativo
porque uma coisa é o que o nativo pensa e outra, o que o antropólogo pensa que o
nativo pensa. O ponto de vista do antropólogo é, o da sua relação com o ponto de vista
do nativo”.
A escrita é tida como uma mistura de autoridade e fragilidade.
Autoridade, advém de quem testemunha e produz o relato,
Fragilidade, proveniente da consciência de que o “presente etnográfico” é uma ilusão,
pois, a escrita que hoje é correta, futuramente será corrigida por outro etnólogo.

O estilo da escrita também tem um papel relevante:

11
O realismo etnográfico: a sua importância reside na descrição dos detalhes, do
quotidiano e principalmente na maneira como é exposta usando sempre o sujeito “eu
estive lá ”, dando a parecer ao leitor que a narrativa é o mais próximo do real.
Marcus e Cushman dividem o realismo etnográfico em dois campos: clássico e
experimental.
 Clássico: abuso de uso da terceira pessoa – “eles fazem”, “eles pensam”,
existindo uma ausência total da pessoa concreta e um tratamento marginal das
condições de trabalho.
 Experimental: o etnógrafo já faz parte do texto, os nativos passam a ter voz,
os pontos de vista quer do nativo ou do pesquisador são distintos, as
condições do trabalho de campo são descritas pormenorizadamente.

A etnografia está intimamente ligada ao nome de Malinoswski, bem como, a reflexão


sobre diferença/distância entre experiência e texto. Esta fase (escrita) aponta para
Bronislaw, definido por Clifford Geertz, como um antropólogo que não conseguiu criar
empatia com os nativos, passando por situações quer físicas ou psicológicas menos
boas, não se adaptando à vida em campo, questionando deste modo como conseguiu
convencer todos sobre o ponto de vista do nativo.
“A resposta seria: pela forma de narrar, o que importa é o modo como se narra
a experiência etnográfica, isto é, a narrativa, a escrita, o estilo.” (Sousa, 2016-
2017: 22)
O diário de Malinoswski nas Ilhas Trobriand é publicado por iniciativa da sua viúva, com
introdução de um discípulo Raimond Firth, onde ele revela … “ódio dos mosquitos e
pulgas, seu desconforto de conviver com porcos e crianças barulhentas, as chantagens
dos nativos para falar, seus desejos sexuais, o descompromisso dos informantes
(chamados de estúpidos, insolentes, atrevidos), a saudade da Europa, das duas
mulheres que amava, etc.”

AS FASES DO TRABALHO DE CAMPO

No trabalho de campo não existem factos etnográficos a serem recolhidos, o


antropólogo parte à descoberta.
Na permanência longa em campo (que não fornece dados), surgem informações a que
se dá o nome de dados (as informações transformam-se em dados no processo
reflexivo, após a sua recolha.
Estas informações começam por ser coletadas pelo antropólogo através do ver e ouvir,
registando-as. Assenta em ouvir o que os povos têm a dizer, dando-lhes a palavra, e
não um ouvir o que o antropólogo deseja. É necessário que exista diálogo, este só é
possível com a relação de observador- participante, onde o pesquisador cria laços e
possibilita a união de “horizontes” de encontro mútuo com ideias, interesses, partilhas
(condição essencial para um verdadeiro diálogo.

Os dois momentos vividos em campo são:


Na primeira fase, existe a coleta de descrições detalhadas, através de perguntas
assertivas, cuidadosamente elaboradas, de modo a que possam ser respondidas pelos
povos em estudo. O antropólogo está sempre munido com um caderno de campo,
anotando tudo e transcrevendo os longos depoimentos.

12
Na segunda fase, após um tempo de permanência com estes povos (uma presença
continuada e atenta), as ideias começam a fazer sentido e as informações recolhidas
tornam-se material importante para a pesquisa, dando -se o nome de “sacada”.

CONCLUSÃO:
O fazer etnográfico consiste em vários pontos fulcrais, que em consonância produzem
um equilíbrio e harmonia entre eles:
 Não é somente ir ao campo, dar a palavra aos nativos ou ter um espírito
etnográfico.
 Pressupõe uma vocação de desenraizamento, de uma formação para olhar o
mundo de forma descentrada, uma preparação teórica para compreender o
“campo” em estudo.
 Aventurar-se, entregar-se e arriscar-se no universo a desvendar, prolongar-se no
tempo em campo, interagindo, dialogando com as populações ou pessoas que
tenta compreender.
 Escutar e dar a devida importância às palavras e dizeres dessas pessoas.
 Encontrar uma ordem nas coisas, para à posteriori ordenar esses dados
mediante uma escrita realista, polifônica e intersubjetiva (capacidade do
pesquisador de se relacionar com o sujeito/objeto de estudo).
 Etnografia para o antropólogo não significa propriedade, mas sim uma afirmação
da sua complexidade. O facto de outras ciências sociais poderem apropriar-se
deste método transcende a antropologia e o próprio investigador. Estas recorrem
a certas técnicas de pesquisas que são exclusivas e peculiares ao método de
pesquisa qualitativa.

TEXTO 2

Etnografia: Saberes e Práticas

Método etnográfico? Técnicas de pesquisa etnográfica?

O método etnográfico é um método qualitativo e específico da pesquisa antropológica,


no qual se apoia o antropólogo na sua inter-relação entre pesquisado e sujeito
estudado, interagindo entre si.

Composto por:
 Técnicas e procedimentos de coletas de dados associados ao trabalho de
campo e à vivência do pesquisador no grupo social que pretende estudar.
 O pesquisador através da inter-relação e interação entre ele e o sujeito estudado
recorre às técnicas de pesquisa como: observação direta, conversas informais e
formais, e de entrevistas diretas e indiretas, entre outros.

A pesquisa é constituída pelo olhar (ver) e escutar (ouvir), sendo fundamental, o


distanciamento do pesquisador da sua cultura de origem, para que se possa integrar e
participar ativamente no meio social que pretende observar e investigar.
De início, a Antropologia, na preparação prévia para o trabalho de campo, passa por
diversas etapas, como:

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 A construção do próprio tema e objeto de pesquisa, passando pela adoção de
certos aspetos teórico-conceituais do próprio campo disciplinar e suas áreas de
conhecimento (Antropologia rural, Antropologia urbana, etc.)

A observação direta
Observação direta: técnica usada para investigar os saberes e observar as práticas
sociais, bem como, reconhecer as ações e as representações coletivas na vida dos
grupos humanos, comunidades, instituições, etc.
O pesquisador tem a necessidade de se envolver no meio social, absorvendo os
contrastes sociais, culturais, e históricos, imiscuir-se na vida social, e pesquisar os
valores éticos e morais, os costumes e códigos de emoções, intenções e motivações
que orientam uma dada sociedade.

Saídas exploratórias: as primeiras inserções no universo desconhecido têm o objetivo


de olhar atentamente para o espaço que o rodeia e tudo o que acontece. A curiosidade
dá lugar a questões sobre como a realidade social é construída.
O pesquisador terá sempre a tendência de comparar o que lhe é conhecido com o que
está agora a descobrir, tendo também a noção de que mesmo ele está a ser objeto de
estudo (o investigador é o observador e em simultâneo o observado). Cabe ao
pesquisador conquistar a confiança do grupo que está a estudar, construindo o pilar
para a Interação e inter-relação, consideradas como condições da pesquisa.

Observação participante: após o consentimento do grupo a ser estudado, o


pesquisador passa a fazer parte integrante e a participar do quotidiano do grupo.
Estudando e pesquisando a vida social, os valores éticos e morais, as emoções,
intenções e motivações de uma dada sociedade.

Mais uma vez se afirma que o antropólogo, não se pode transformar em nativo, mas
tem uma necessidade de conhecer mais do que a sua própria cultura.

O trabalho de conhecer
Para obter este conhecimento, é fulcral a prática do olhar o OUTRO, como uma
alteridade, para que o pesquisador possa conhecê-lo, acabando ele próprio também
por se conhecer um pouco melhor, vencendo obstáculos epistemológicos (entraves à
aprendizagem, para que a construção do espírito científico se efetive) impregnados de
uma cultura científica (necessidade de justificar o que vê através do senso comum).
O pesquisador ao deslocar-se para o trabalho em campo, tem de estar preparado para
novos desafios e emoções, devendo abster-se do conceito de que a realidade é
mensurável ou visível, numa atitude individual.
A pesquisa passa pela aprovação de um projeto e pela orientação de um
professor/pesquisador ou antropólogo.
Para a realização do trabalho em campo, existe sempre a negociação entre ambas as
partes e quando o pesquisador se desloca, será acompanhado por alguém do grupo
alvo de estudo que o acompanha e apresenta aos restantes elementos do grupo social
– interlocutor principal ou padrinho/madrinha de iniciação.

Nem sempre os estudos são feitos a povos nativos, o antropólogo americano William
Foote Whyte (2005), realizou um trabalho de campo nas ruas da cidade, esta
aproximação foi mediada por um trabalhador que conhecia o chefe do grupo de jovens

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que ele pretendia estudar, através dos quais irá conhecer uma intensa rede de relações
no bairro.

A dimensão da alteridade: a capacidade de se colocar no lugar do outro, nas relações


interpessoais (relação com grupos, família, trabalho, lazer, sociedade), numa atitude
ética de diálogo, consideração, de respeito pelas diferenças, e empatia face aos outros.
Logo, a antropologia ensina-nos a nos descentrarmos de nós próprios assim como da
cultura e sociedade em que nos inserimos, dando-nos a possibilidade de olhar para
novos horizontes e alternativas, para aprendermos com os outros e de nos
conhecermos um pouco melhor através das experiências com os outros.
A enculturação: processo comum a todas as culturas através do qual o indivíduo
aprende a língua e cultura do meio no qual está inserido, adquirindo valores e
comportamentos que são tidos como apropriados ou necessários naquela cultura.
A aplicação por parte dos antropólogos: de conhecimentos, métodos, técnicas,
sensibilidades e olhares para melhor compreender e lidar com o mundo, de uma forma
essencialmente indutiva e interpretativa.
Uma dimensão fora do contexto académico: a antropologia também emprega os
conhecimentos, teóricos e metodológicos na resolução de questões práticas.

Escuta atenta
Implica a permanência do pesquisador no terreno, conquistar a confiança do grupo e
para poder participar ativamente nas conversas, aprende a língua nativa, com o tempo
passa a reconhecer os sotaques, as gírias, os gestos, as etiquetas e performances
inerentes ao grupo e permitem revelar as suas orientações simbólicas e traduzir os
valores com que se regem para “pensar”, “olhar” o mundo
Escutar o outro não é tarefa fácil para o pesquisador, exige da parte deste uma mútua
aprendizagem, a conquista da confiança ao realizar as entrevistas e estar atento a cada
experiência observada, superando, assim as dificuldades existentes pelo
desconhecimento.

O universo de pesquisa, o contexto estudado


O pesquisador tem que previamente estruturar o seu projeto de modo a que possa
responder a questões fulcrais, tais como, as dificuldades ou impedimentos que irá
encontrar para o desempenho da sua pesquisa.
O grupo tem que saber quais as intenções do pesquisador, e só com a disponibilidade e
cumplicidade destes a pesquisa tem continuidade.
O pesquisador através de um estudo prévio de outros estudos que foram realizados
anteriormente, realiza a sua matriz tendo em atenção que um dia o seu trabalho,
também será alvo de estudo para outros.

O exercício da escrita e a ipseidade


Ipseidade: O que faz com que um ser seja ele próprio e não outro (o caráter particular,
individual, único de um ser, que o distingue de todos os outros)

Registo escrito: notas, diários ou relatos das experiências observadas ou escutadas no


quotidiano da investigação. É este registo que serve de ponto de partida para que
outros investigadores iniciem os seus projetos.

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Com a escrita, os investigadores criam narrativas onde recriam a sua vivência com
outros povos e fazem-no de tal modo que conseguem dar vida aos seus escritos.
Acabando por existir pontos em comum entre o método etnográfico e o romance,
aproximando-se da Antropologia da Literatura.

Entre o investigador e o grupo acaba por existir uma dualidade de conhecimento o “ EU e


o OUTRO ”, começando pela desconfiança e preconceito, posteriormente irá resultar
numa aprendizagem e experiência única.

Margareth Mead (1979), num artigo diz que uma das características da antropologia é
ser uma disciplina de palavras, “… que a prática etnográfica traduz-se na memorização de
acontecimentos orais complexos (cerimónias, conversas, relatos, comentários, interações
verbais, etc.), que necessitam ser registados, classificados, correlacionados, comparados, e logo
após, retomados pelo etnólogo na forma de estudos monográficos, através do uso de conceitos
teóricos e metodológicos do seu campo disciplinar e não do próprio “nativo”. (Sousa, 2016-
2017:35)

A prática etnográfica é alvo de críticas e debates: questionam a restituição


etnológica, ou seja, devolver ao grupo pesquisado as informações e dados coletados
pelo etnógrafo, durante a sua estadia e investigação no terreno. Os antropólogos
americanos foram os que mais contribuíram para a mudança neste contexto,
reivindicando o estabelecimento de uma Antropologia Pós-Moderna. São abordadas
questões como:
 A da autoridade etnográfica dos escritos dos antropólogos e do lugar que ocupa
como autor, no momento de revelar à comunidade científica dos antropólogos as
suas interpretações da cultura do “Outro”.
 A produção dos escritos monográficos (trabalhos de investigação científica sobre
os conhecimentos existentes) apresentam dados, situações acontecimentos da
vida quotidiana do “nativo”, cuja natureza é diferente dos dados obtidos no
trabalho de campo.

Conhecer a trajetória da antropologia como campo de ideias disciplinares

Bronislaw Malinowski e Franz Boas foram os pais fundadores do método qualitativo


etnográfico, ao explorarem a distância que separava as suas sociedades daquelas que
eles investigaram.
As obras “Os argonautas do pacífico ocidental ” e “A alma primitiva”, são exemplos de
como a experiência de alteridade interfere na elaboração da experiência etnográfica (no
estudo de campo), tão necessária à formação do antropólogo, mesmo nos dias de hoje.

“Se um homem embarca em uma expedição decidido a provar certas hipóteses e


se mostra incapaz de modificar sem cessar seus pontos de vistas e de
abandoná-los em razão de testemunhos, inútil de dizer que seu trabalho não terá
valor algum”. (Malinowski, 1976, p. 65)

A antropologia destes dois mestres foi responsável por uma revolução epistemológica,
no campo das ciências sociais:
 Pela forma como a pesquisa etnográfica era realizada, tendo como fundamento o
trabalho de campo junto das sociedades ditas primitivas, que provocou ao longo

16
do séc. XX, um novo vigor na produção do conhecimento e na metodologia
aplicada na investigação antropológica nas sociedades modernas, ditas
complexas.

Nos anos 30 um grupo de sociólogos da Escola de Chicago desenvolveu um método e


conceitos pertinentes para tratar do fenómeno urbano e industrial. Com as suas
descobertas da compreensão da sociedade moderna, amplificaram os efeitos das
questões no campo de pesquisa em ciências sociais.

Após as crises dos anos 30, cientistas sociais começaram a participar em instituições
públicas ou privadas, tendo como ação o trabalho com jovens ou indivíduos que viviam
em situações de crise social. Conseguindo efetuar a passagem da participação para a
observação das situações vividas pelos grupos, numa tentativa de reuni-los no interior
de um mesmo procedimento metodológico.

Pierre Bourdieu (1999): outra forma de produzir conhecimento em ciências sociais é a


rutura epistemológica.

Aprender a etnografia lendo etnografias


Para que tal aprendizagem se dê, há a necessidade de ler bons trabalhos de técnica de
pesquisa etnográfica, os diários, crónicas de viagens, relatos de campo, entre outros,
associados ao estudo sistemático de abordagens teóricas. Tomando consciência do
que foi a vivência do pesquisador com o grupo pesquisado, os rituais, cerimónias,
conflitos, as relações e interações… Este aprendiz de pesquisador, ao ler os relatos
começa a formular as suas próprias questões.

As implicações de ser um etnógrafo: a vigilância epistemológica


O método etnográfico é definido pelas técnicas de entrevista e observação
participante, dando origem a que por vezes o investigador devido à sua preocupação,
transforme a estrutura de uma entrevista num questionário, originando um
distanciamento do entrevistado, o que pode em antropologia levar o pesquisador a um
desencontro etnográfico, ou até ao desinteresse por parte do grupo.
Mesmo que existam dias mais produtivos do que outros, se existirem relações de
reciprocidades, há sempre um resultado positivo, transformando-se as entrevistas, em
entrevistas livres e trocas de conhecimento.
Importante é a escrita do diário, trabalho que deve ser sempre realizado pelo
antropólogo, para que nada seja esquecido, quer sejam as práticas, as vivências, as
emoções, os medos, os preconceitos … são anotações diárias do que ele vê e ouve
entre o grupo com quem compartilha o seu dia.
Posteriormente este diário será o ponto de partida para a sua própria avaliação em
campo.

Caderno de notas: caderno onde o antropólogo regista os dados, gráficos, anotações


do convívio diário e da observação do grupo e que dará origem ao Diário de campo.
Ambos servem para transpor os relatos orais e poderão ser usados por alguns
pesquisadores, no estudo de dialetos diferentes entre o povo estudado.

17
A tendência monográfica e a grafia da luz
Monográfica - trata só de um assunto.

A escrita dos artigos relacionados com o estudo etnográfico é ponto fulcral do trabalho
do pesquisador, os trabalhos monográficos, os ensaios, as teses e dissertações, têm
sido importantes para que seja reconhecido pelo mundo académico. Com a
modernidade dos tempos, estes trabalhos escritos começaram a ser alvo de tendências
mais atuais, tais como recorrer aos recursos audiovisuais, como o caso da adoção da
máquina fotográfica pelo Malinowski, Margaret Mead e Gregoire Bates.

Etnografia e as novas tecnologias


Com a fotografia e o cinema, deixou de existir apenas a possibilidade de tomar
conhecimento através dos registos de trabalho de campo. Passou a existir um novo
conceito de escrita etnográfica - uma Antropologia do cyberspace. Tem originado uma
maior reflexão em torno do processo do que era a representação etnográfica e a
desmaterialização dos escritos etnográficos no âmbito das ciências sociais.

Após a leitura dos 2 textos:


Devemos conseguir responder
1. Quando e como emerge a etnografia

2. Qual a especificidade do método?

3. Quais as características do método etnográfico? [momentos/passos]

4. Quem está envolvido no contexto etnográfico? Quem são os atores em presença e


como interagem? Como se constitui o ato de escrita como parte do processo
etnográfico?
5. Em que consiste a reflexibilidade, que lugar tem esta na pesquisa?
Conclusões:
 Os fundamentos da prática etnográfica como método qualitativo da antropologia define
o papel que o pesquisador assume da área das ciências sociais, no que concerne, à
sua investigação da vida social, imbuído no conhecimento do Outro e de si mesmo,
sobretudo durante a 2.ª metade do séc. XX em particular quando o objeto/sujeito de
estudo altera das sociedades ditas primitivas, para as sociedades modernas
complexas (por norma pertencentes ao próprio antropólogo).

 O papel do etnógrafo perante o objeto e as pessoas, comunidade, sociedade por ele


pesquisadas, no seu grau de envolvência, no seu modo de participar na vida social e
quotidiana dos mesmos, que ao longo do tempo e do espaço tende a transformar-se,
revela-se na própria delimitação do trabalho de campo e de acordo com o lugar que
ocupa o pesquisador relativamente ao universo etnografado.

 Em antropologia, o etnógrafo debate-se com a comunidade científica dos seus pares,


uma vez que se levanta a questão deste dissimular certos aspetos que caracterizam a
sua vida social e cultural, como: a profissão, objetivos, intenções, etc., dentro do grupo
ou comunidade estudada, despoletando dúvidas de ordem ético-moral (tendem a

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rejeitar a ideia de que os antropólogos escondem as suas verdadeiras intenções em
campo).

 A etnografia é fundamental para a construção de conhecimento nas ciências sociais,


pois, é esta abertura ao universo das interações sociais e culturais que unem o
pesquisador às culturas e sociedades por ele pesquisadas, surgindo questões
relacionadas com o evitar que o antropólogo se torne ele mesmo na figura do nativo
ou de transformar os “nativos” na imagem do antropólogo, com o perigo de quebrar a
confiança e cumplicidade estabelecida com o grupo social que investiga e assim,
comprometer a natureza dos dados obtidos.

 A rutura com os obstáculos epistemológicos, como o senso comum, são também uma
questão que provoca divergências e dúvidas, no seio dos cientistas sociais, a partir do
momento em que se pensar que no conhecimento empírico, estão presentes as
próprias experiências do antropólogo, conhecimentos, informações e conceitos
teóricos adquiridos ao logo da sua vida social e cultural e vivências do quotidiano.

 Um dos grandes desafios do método e prática etnográfica reside na compreensão e


interpretação das transformações das realidades sociais a partir do seu interior, no
tempo e no espaço., tal como, na produção e construção do conhecimento científico
abrange, envolve e analisa todo o percurso das realidades da vida social/cultural dos
seres humanos.

 Assim, o trabalho de etnógrafo rege-se pela observação participante, pela entrevista


não-diretiva (informal), pelo Diário de campo, pela técnica de descrição etnográfica,
etc…, colocando ao cientista social, o antropólogo uma premissa de ampliar as
possibilidades de reconhecimento e identificação das várias formas de participação e
construção da vida social.

1.2 OS/AS ANTROPÓLOGOS/AS: TESTEMUNHOS DO TERRENO (PÁG. 49–65)


No final deste capítulo deverá:
 Entender o processo pessoal de confronto com a alteridade.
 Analisar como o trabalho de campo se constitui como fonte de produção
etnográfica.
 Perspetivar a postura reflexiva dos antropólogos.

Neste texto deverá analisar e escrever:

Descortinar as condições pessoais de produção etnográfica.


Identificar dificuldades e limitações, experiências face há imprevisibilidade do
trabalho de campo.
Analisar o processo de reflexibilidade do investigador perante o contexto da
pesquisa e o seu papel.

PALAVRAS-CHAVE: estrangeiro, etnografia, trabalho de campo, imprevisibilidade, China.

TEXTO 3
“Ser laowai: o estrangeiro antropólogo e o estrangeiro para os migrantes
chineses entre Portugal e a China”

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 Ser laowai é uma forma particular de ser estrangeiro, constituída a partir de
processos históricos, políticos, sociais e culturais específicos.
 O sentido mais forte do termo laowai deve ser procurado, principalmente, na
relação dos chineses com a modernidade ocidental e suas facetas de ambivalência,
de fascínio e de aversão.
 Em suma, podemos dizer que a humilhação da China perante os poderes
ocidentais no século XIX constitui uma importante componente da aversão dos
chineses em relação aos ocidentais, mas, paradoxalmente, o sentimento de
inferioridade infligido foi também catalisador de fascínio.
 O ocidentalismo de que fala Chen Xiaomei é reflexo de uma ideia do “ocidental”
como estrangeiro distante, mas aqui oscilando entre a ameaça e o ideal a alcançar.
 É neste contexto de ocidentalismo, de um forte sentimento de inferiorização e de
discriminação dos chineses pelos “ocidentais”, e de grande segregação entre estas
duas categorias de pessoas, que surge o termo laowai – uma categoria
classificatória que ainda hoje convoca a carga de uma história de perceções e
práticas discriminatórias e desiguais entre chineses e estrangeiros.
 Ser laowai implicava não apenas que eu poderia ser uma potencial ameaça, mas
também ser considerada muito diferente no meu modo de vida, moralidade e visão
do mundo.
 Como referem Sarró e Lima (2006: 18), a partilha do quotidiano com as populações
que se estuda é um dos eixos definidores do trabalho de campo, tanto em terrenos
metropolitanos como na etnografia clássica. Assim, ao adaptar a minha forma de
estar no terreno à forma de estar na vida dos meus interlocutores, eu acabei por
partilhar com eles o seu quotidiano, ter a oportunidade de fazer observação
participante e, com o tempo, de conversar com eles também sobre assuntos que
me interessavam.

RESUMO

 No terreno, o etnógrafo quase sempre tem de lidar com o facto de ser visto como
um estranho pelas pessoas com quem interage, mas, em contextos etnográficos
chineses, um etnógrafo não chinês pode experimentar uma forma particular da
condição de estranho encerrada na ideia de laowai, uma categoria nativa de
estrangeiro.
 A partir de experiências etnográficas com chineses na China e em Lisboa, este
artigo reflete sobre as condições de produção de conhecimento etnográfico em
terrenos chineses, descrevendo e discutindo o modo como a categoria
de laowai, emergente num contexto social, político e histórico específico, envolve
o etnógrafo numa complexa teia de relações que o colocam de modo
ambivalente e simultaneamente em posições de distância e de proximidade.
 Esta situação remete para o modo como a categoria de laowai, historicamente
imbuída numa relação de poder de tipo racial e colonial, se articula com a noção
de guanxi  (contactos sociais privilegiados) e também de mianzi (face) (Yang
1994) entre os chineses, e que resultam em formas de acumulação de prestígio
social. Porém, a análise da importância das guanxi e da mianzi no trabalho de
campo está para além do âmbito deste artigo.

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