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História da educação

A educação na baixa idade média


1. A Igreja

As escolas régias, instituídas por Lotário na Itália e exigidas pelos bispos na


França, desaparecem totalmente, enquanto as escolas paroquiais, episcopais e
cenobiais sobrevivem letargicamente. A própria palavra schola significa,
nesta época, lugar de reunião, mais do que o lugar onde se estuda.

Mas no reflorecimento geral da vida social também os mosteiros se


renovam e se renovam as Regulae (regras), repropondo o problema da
instrução dos monges e, especialmente, dos oblatos (escola de meninos). A
Recula cluniacensis dedica muita atenção à cerimônia com que os oblatos
deviam ser recebidos no mosteiro, estabelecendo rigorosamente a fórmula para o
pedido de ingresso e a relativa liturgia.

“Eu, irmão _____, ofereço a Deus e aos seus santos apóstolos Pedro e Paulo este
menino de nome _____, fazendo as vezes de seus pais, com uma oferenda na
mão e uma petição, após ter colocado a sua mão na pala do altar. Em nome dos
santos cujas relíquias repousam aqui, em nome do monsenhor o abade aqui
presente, eu declaro perante as testemunhas que ele ficará na Regra de modo
que, a partir deste dia, não lhes será mais permitido subtrair-se à autoridade dela;
até mais, saiba que deve observar as disposições desta mesma Regra com
fidelidade cada vez maior e, junto com os outros, servir ao Senhor com coração
alegre. E a fim de que esta petição fique confirmada, eu a subscrevi por minha
mão e a submeti às testemunhas para que elas também a assinem” (P. L.
CXLIX, III, 8).

Estes jovens monges possuim a assídua vigilância dos probatissimi seniores a


quem eram confiados.

Quanto às escolas do clero secular, originalmente o mestre era o bispo, mas


logo esta tarefa foi por eles transferida para um scholaticus ou magischola.
Este foi um cargo cuja dignidade cresceu com o tempo, taanto que o
magischola acabou assumindo na Igreja funções mais elevadas,
transmitindo, através de uma espécie de investidura, a função de ensinar a
um seu substituto, o proscholus.
Foi, de fato, um fenômeno característico desta época feudal a difusão do
costume de o magischola vender a autorização de ensinar, a licentia docendi,
e, consequentemente, do costume de cobrar o ensinamento dado aos alunos.
Esta é a escola de uma sociedade e de uma Igreja feudais, ainda que a venda da
ciência já prenuncie o surgir de uma sociedade laica de tipo novo.

Após o ano 1000, com a interrupção das últimas incursões de novos


bárbaros, com a progressiva reabertura do tráfego no Mediterrâneo, com a
reconciliação do poder papal e imperial, com o surgimento dos novos
centros urbanos, verifica-se também um grande despertar de toda atividade
cultural e educativa.

A crise do império carolíngio levara a uma nova situação: a fonte, agora


imperial, do direito escolar passara de fato à Igreja, como também passa
para ela o controle político, anteriormente do império, sobre as escolas
eclesiásticas. Além disso, a Igreja foi abrindo suas escolas episcopais e
paroquiais também aos leigos, dando-lhes ao mesmo tempo instrução
religiosa e literária.

Já em 1079, Gregório VII reconfirmava aos bispos a obrigação de fazer


ensinar em suas igrejas as artes liberais(G. M., I, 70). Mas nessa evolução,
que envolve também os mosteiros, cuidava-se para não confundir os
ensinamentos religiosos com os das ciências naturais e mundanas, que vinham
se afirmando cada vez mais.

No Concílio Lateranense, convocado por Alexandre III, ao reafimar esta


obrigação impondo não somente às igrejas como também aos mosteiros o
dever de estender o ensino aos leigos pobres. Além disso, ele denunciava os
casos de simonia escolástica, isto é, a venda da licentia docenti, e os
obstáculos contra quem quisesse livremente ensinar, e ordenava que o
magischola não se permitisse impedir nenhum clérigo capacitado de ensinar
aos outros. São decisões significativas, que libertam os mestres de qualquer
submissão feudal e qualquer suborno simoníaco.

Em 1215, o novo Concílio Lateranense, convocado pelo papa Inocêncio III,


reafirma este comprimisso e decide que toda igreja metropolitana tenha o ensino
da teologia.

Em 1219, Honório III estabelece que caso a renda dos mestres da teologia
sejam insuficientes que esteja garantida renda a eles durante cinco anos,
também no caso de deixarem o ensino na busca por aperfeiçoamento dos
seus estudo.

4. A universidade e a escola vistas por dentro

Para termos uma ideia de como se realizavam os estudos universitários é preciso


ler algum depoimento direto dos mestres. Odofredo, discípulo dos discípulos
de Irnério e professor de direito em Bolonia desde 1228, assim apresenta
aos estudantes o programa de seu curso:

“Quanto ao método de ensino, seguirei o método observado pelo doutores


antigos e modernos e particularmente pelo meu mestre; o método é o seguinte:
primeiro, dar-vos-ei um resumo de cada título antes de proceder à análise literal
do texto; segundo, farei uma exposição a mais clara e explícita possível do teor
de cada fragmento incluído no título; terceiro, farei a leitura do texto com o
objetivo de emendá-lo; quarto, repetirei brevemente o conteúdo da norma;
quinto, esclarecerei as aparentes contradições, acrescentando alguns princípios
gerais de direito (extraídos do próprio texto), chamado comumente Brocardica,
como também as distinções e os problemas sutis e úteis decorrentes da norma,
com suas respectivas soluções, dentro dos limites da capacidade que a Divina
Providência me concederá. Se alguma lei merecer, em virtude de sua
importância e dificuldade, uma repetitio, essa repetição será feita à noite. As
disputationes realizar-se-ão pelo menos duas vezes por ano: uma vez antes do
Natal e uma vez antes da Páscoa, se estais de acordo”.

Podemos imaginar um exame universitário daquela época, tão semelhante ao


dos nossos dias: um interrogatório, em que se pede uma definição e se responde
de acordo com o verbo do mestre. E, como hoje, também naquela época os
estudantes às vezes recorriam aos mais extraordinários truques, o que é
confirmado por uma bula de Bento XII, que:

“sanciona a sentença de extracomunhão contra aqueles que, para obter


benefícios, mandam outros em seu lugar para sustentaro de exame de literatura,
e aqueles que em lugar de outro sustentam o mensionado exame, ficam sem os
benefícios de que gozam...” (Bull. Rom., Bem. XII, 5 de dezembro de 1339).

O que se ensinava nas escolas medievais de nível inferior? Quais os métodos


e os conteúdos? Os textos da época nos revelam que ainda estão em vigor
antiquíssimo procedimentos didáticos.
“As crianças inicialmente aprendem a,b,c, em seguida, a pronunciar as
sílabas (sillabicare) e a ler e, enfim, a entender o sentido de cada parte do
discurso” (G. M., II, 172).

Grande parte do ensino se efetuava em forma catequética, isto é, em forma de


diálogo entre mestre e discípulo (naturalmente em latim).

Naturalmente, pelo menos na escola cenobial, que era de tempo integral,


não faltavam também momentos de distração e de jogos. Um contrato
firmado em 1272 entre o cabido da igreja de São Evásio, em Monferrato, e
os guardas nos dá um elenco curioso dessas diversões:

“Os guardas têm a obrigação de vigiar as crianças para que não subam sobre os
telhados para pegar passarrinhos, cegonhas, corvos ou outros pássaros... e para
que não perturbem brincando com paus e pedras...” (G. M., II, 99).

E para estas transgressões, como para as deficiências no estudo, o remédio


de sempre estava pronto; Ratério escrevia:

“Corrija os erros, não somente com palavras, mas também com chicotadas” (G.
M., II, 97).

O ensino sucessivo introdizia às artes liberais do trívio e do quadrívio e, em


seguida, à universidade. Este ensino, além de aperfeiçoar a “preparação
formal”, fornecia uma “instrução concreta”. Seu fundamento era a
gramática, que nestes séculos começa a deixar a forma catequética de
pergunta e resposta, típica da escola carolíngia, e inventa novas formas
como sua codificação em versos (como fizeram alguns doutores ultra-Alpes)
e, em seguida, na Itália, a forma mais antiga de tratado.

5. Utopias escolásticas

Também as utopias têm seu lugar na história, pelo menos na consciência dos
homens. No século XII, Ugo de São Vitor, no De vanitate mundi, projetará a
atividade de uma escola ideal:

“Vejo uma escola de pessoas que estudam. É uma multidão de pessoas de


diversas idades – crianças, adolescentes, jovens, anciãos – e de diversas
ocupações. Alguns aprendem a dobrar a língua até então inculta, a formar novos
sinais e a emitir vozes insólitas. Outros, inicialmente escutando, estudam para
conhecer as flexões, as derivações e a composição das palavras, e, em seguida,
confrontando-se reciprocamente e sempre repetindo, tentam decorá-las. Outros
de estilo na mão escrevem nas tabuinhas de cera. Outros, com mão hábil que
guia a pena, desenham de vários modos e com várias cores figuras nos
pergaminhos. Outros ainda, através de um estilo mais profundo e férvido,
desafiam-se reciprocamente em discussões, como parece, sobre questões
graves... Vejo também alguns fazendo cálculos. Outros, percutindo um nervo
tenso sobre um lenho, produzem melodias de sons diversos. Outros explicam
descrisões e formas de medidas. Outros descrevem claramente, por meio de
instrumentos, o percurso e a posição dos astros e a rotação do céu. Outros
tratam da natureza dos povos estrangeiros e das constituições dos homens, e das
propriedades e das virtudes de todas as coisas” (in Op. II, 123).

Outra utopia, onde Boncompagno de Signa, mestre da Ars dictandi, sonha


com o edifício escolástico perfeito.

“O edifício para a instrução escolar seja construído em lugar livre e de ar puro.


Fique longe da frequência de mulheres, do clamor da praça, do barulho dos
cavalos, da passagem de barcos, do latido dos cães, de rumores nocivos, do
sibilo dos carros e do fedor. [...] não tenham imagens ou pinturas, a não ser
aquelas que sirvam de subsídio mnemônico paraas ciências nas quais se
exercitam as mentes. [...]” (G. M., II, 190-91).

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