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— Olá, bem-vindo!
— Opa. Traga-nos três ales e duas águas com limão para começar!
— Certamente!
— E, hum… é, bolinhos de chuva será suficiente. Para cinco!
— Com certeza! — respondeu intensamente a garçonete, olhando de relance para
o aventureiro com a espada de duas mãos em suas costas e anotando o número
que ele estava fazendo com os dedos.
Qualquer taverna estaria animada no começo da noite, mas na taverna da Guilda
dos Aventureiros, isso era diferente. Havia pessoas relaxando após uma aventura
onde lutaram por suas vidas. Outros poderiam ficar, finalmente, mais à vontade
quando amigos regressavam de muito longe.
Alguns clientes eram aventureiros de longe, começando com uma refeição agora
que chegaram nessa cidade.
A felpubro ou garota-fera garçonete corria de um lugar para outro, ela adorava
essa atmosfera. A sensação de que estava ajudando pessoas a motivava mais do
que seu salário.
Enquanto seu cabelo longo cuidadosamente amarrado balançava como uma
cauda (sua verdadeira cauda estava debaixo da saia), ela gritava para a cozinha:
— Três ales, duas águas com limão e cinco pratos de bolinhos de chuva!
— Pode deixar. Bom, grande pedido… torna tudo mais fácil para mim!
Um rhea rechonchudo de meia-idade se movia constantemente para lá e para cá
pela cozinha pequenina.
Panelas e frigideiras, facas e espetos, conchas e rolos de massa. Ele trabalhava
com o fogo e os utensílios de cozinha como mágica, e a comida estava pronta
sem nenhuma demora.
Um molho levemente doce cobria o frango e peixe dourados em óleo. Eles eram
crocantes e quente por fora, e quando você os mordia, o suco fluía na boca. As
felpubros não eram as únicas cheirando o ar com aroma fragrante.
— Aqui está. Entregue-o!
— Sim, senhor!
Quando se tratava de cozinhar, não havia raça tão talentosa quanto os rheas.
Claro, eu adicionei meu pequeno toque!
Seus pequenos toques além da enorme habilidade do cozinheiro faziam deles,
essencialmente, heróis da comida incomparáveis.
Ela tirou um pouco de ale de um barril, espremeu um limão sobre um pouco da
água e o pedido estava pronto.
Ela sapateava com a refeição em uma bandeja para onde o grupo já estava
sentado à mesa esperando ansiosamente.
Talvez eles não quisessem esperar para ir para casa tirar suas armaduras, pois
cada membro do grupo tinha retirado algum do seu equipamento. Os membros
da linha de frente, todavia mantinham suas espadas onde poderiam pegá-las a
qualquer momento, o que demonstrava sua longa experiência.
— Obrigado por esperarem! Três ales, duas águas com limão e bolinhos de chuva
para cinco!
O guerreiro de armadura leve meio-elfo que era responsável pelas finanças do
grupo deu a ela algumas peças de prata.
— Obrigado. Ah, e vinho tinto para mim.
— Claro, eu sei!
A garçonete pegou as moedas com as mãos carnudas e as colocou no bolso do
avental. Eles deram um pouco mais do que a quantidade da conta, talvez
estivessem incluindo atenciosamente uma gorjeta. Embora era também possível
que ele fosse só um mulherengo.
— Veja, quando se vai a uma taverna, você deveria começar com ale, não é? —
disse uma cavaleira como se não pudesse acreditar no que ouviu. Ela repousou o
queixo nas mãos.
— Lá vai a nossa Senhora Cavaleira dizendo tudo o que quiser de
novo… sempre boa e fiel à Ordem!
— Bem, obviamente. Está até escrito nas Escrituras do Deus Supremo — disse
Cavaleira como se não pudesse acreditar, estufando o peito.
Guerreiro de Armadura Leve pressionou a mão na fonte como se estivesse
evitando uma dor de cabeça e suspirou profundamente.
— Crianças, não cresçam para ser como ela, tudo bem?
— Simssenhor!
— Mas ela parece tão legal quando está toda arrumada, no entanto…
Garoto Batedor ergueu a mão como confirmação, enquanto Druidesa deu um
suspiro perturbado.
Cavaleira estufou as bochechas irritada.
— Do que está falando? Eu sempre pareço legal.
— Gah! Ainda nem tomou um gole e já parece bêbada. — Guerreiro de
Armadura Pesada fez um gesto de “silêncio” como se estivesse repreendendo um
bebê, depois levantou a caneca de ale. — Agora temos que brindar! Voltamos de
uma aventura. Comam e bebam quanto quiser, crianças!
— Uooh! Carne! Carne!
Garoto Batedor e Cavaleira deram um grito de alegria e se jogaram na comida e
bebida. Seus companheiros os observaram com uma pequena irritação, mas se
prepararam para sua própria refeição também.
— Casa finalmente…
— Estamos. Bom, trabalho, hoje?
— Pode apostar! Bom trabalho.
Com um tilintar do sino em cima da porta, os próximos a entrar era um homem
forte e robusto com uma lança, e uma mulher bela e voluptuosa.
Lanceiro e Bruxa se sentaram em seus lugares, com os rostos ruborizados com a
satisfação de um trabalho feito.
— Ei, senhorita! Gostaríamos de fazer um pedido!
— Sim, senhor! Bem-vindos de volta! — Garçonete Felpubro se apressou para
a mesa enquanto Lanceiro levantava a mão languidamente no ar. — O que vão
querer?
— Para mim… Deixe-me, ver. Vinho tinto e, pato, salteado. Pode conseguir,
esses?
— Para mim… Coxa de boi, com osso e bem grelhada. E licor de maçã.
— Ah, maçãs… — murmurou Bruxa, entrecerrando os olhos. Seus lábios se
abriram ligeiramente com o pequeno desejo, mas se fecharam imediatamente
outra vez.
Lanceiro deu de ombros indiferentemente. — Quer um pouco?
— Não, prec…
— Coloque um par de maçãs assadas então. Quero uma também.
— …Hrrrm.
— Pode deixar, já está anotado.
Apesar das aparências, elas podem realmente ser bem bonitas. Essa foi a
impressão que Garçonete Felpubro recebeu de Bruxa, que estava sentada
contraindo os lábios como uma menina.
Ou é porque ele está aqui?
— Diga, senhorita? — disse Lanceiro.
— Sim?
— Garota da Guilda ainda está aqui?
Lá se foi a impressão delas.
Garçonete Felpubro viu sua força a deixando, mas se manteve firme perante
Lanceiro, que estava com uma expressão séria.
Ela empurrou sua franga para o lado e deu um suspiro. Ela tinha certeza de que
Garota da Guilda ainda estava trabalhando. A garçonete sabia muito bem até que
horas ela ficava às vezes.
— …Sim, parece que ela ainda está aqui.
— Simmm!
Bruxa e Garçonete Felpubro observaram sem entusiasmo Lanceiro quando ele
fez um punho e comemorou.
Céus, e quando ele tem uma mulher linda bem ao lado… era um comentário para
se manter consigo mesma.
Era assunto de todos por quem eles se apaixonavam.
E ainda assim, pensar que esse aventureiro “mais forte da fronteira”, alguém cuja
habilidade com a lança poderia deixar os Cavaleiros da Capital envergonhados,
seria assim…
Ele pareceria mais legal se ficasse de boca fechada.
Ela se sentiu um pouco desconfortável ao considerar que, porventura, se
descobrisse a verdadeira razão de todos se tornarem aventureiros, seria uma
desilusão tão grande quanto essa.
Bem, acho que ele é fácil de se fazer amizade, ao menos.
Isso era indubitavelmente melhor do que ser distante, não é? Com esse
pensamento, Garçonete Felpubro correu em direção a cozinha.
— Vinho tinto, pato salteado, coxa de boi com osso bem passada, licor de maçã.
E duas maçãs grelhadas!
— Pode deixar! Leve as bebidas primeiro!
— Simssenhor!
Chef Rhea gritou com uma voz que desmentia seu tamanho diminuto. Garçonete
Felpubro respondeu com um grito para igualar.
Quando ela trouxe as duas bebidas, eles deram um sorriso, um “obrigado” e
entregaram a ela o dinheiro.
— Muito bem, aqui está o nosso “encontro”.
— Sim. Um, brinde.
Como que em harmonia com o elegante tilintar dos copos de Lanceiro e Bruxa,
o sino badalou novamente.
— T-tão cansado…
— Vamos, ande direito! Céus!
Os dois aventureiros novatos entraram, a imagem própria da fadiga e exaustão.
Sacerdotisa Aprendiz praticamente empurrou Guerreiro Novato para o assento,
depois limpou o suor da testa.
— De alguma forma não estou com vontade de comer…
— Bem, que pena! Precisa comer!
Repentinamente, a garota olhou para cima para repreender o garoto, que parecia
pronto para adormecer a qualquer momento.
Seus olhos encontraram os de Garçonete Felpubro, e a garota aventureira corou.
— Ah, d-desculpe. Humm… Uma tigela de mingau de aveia, por favor, e pão
para dois…
— Sim, senhorita!
— Ah, e água!
— Deixa comigo!
Ela foi até a cozinha e retransmitiu o pedido. Chef Rhea ergueu a sobrancelha.
— Muito bem! Leve as coisas com carne grelhada. Hmm, então, onde foi parar
aquele vinagre?
— Eu sei, eu sei. Ah, o vinagre está na prateleira atrás de você.
Quando o chef sorriu e se virou, Garçonete Felpubro apontou para uma das
prateleiras. O chef pegou um pouco de queijo e colocou no prato com o pão,
então balançou a cabeça, satisfeito.
— Está bem, vou levar esses aqui então!
— Faça isso!
Ela deixou o crocante e oleoso prato com Lanceiro e Bruxa, e lhes ofereceu uma
palavra de agradecimento. Então ela caminhou até onde o garoto e a garota
estavam, mas Sacerdotisa Aprendiz pestanejou para ela.
— Hã? Desculpe, nós não pedimos isso…
— Está tudo bem, apenas comam. — Garçonete Felpubro balançou a mão,
apontando para o queijo com o dedo peludo. — De qualquer forma, virá alguém
em breve que não consegue se fartar dessa coisa, e teremos que fazer um novo
pedido. Precisamos esvaziar nosso estoque!
— Obr-obrigada.
— Nem. Obrigada por nos ajudar com isso!
Tendo assim feito uma ronda bem-sucedida em suas mesas, ela foi até a parede
e suspirou.
O barulho animado dos aventureiros na taverna ameaçava se transformar em um
zumbido em seus ouvidos.
Eles estavam se divertindo rindo, gritando e cantando, e após comerem e
beberem, eles retomavam seus divertimentos.
— Hm. — Garçonete Felpubro achava satisfatório apenas ficar ali com os braços
cruzados, os observando.
Então…
— Ahhhh cara, estou cansada! Quero um pouco de comida e quero ir para cama!
— Havia um montão de goblins, não havia?
O sino tocou outra vez, e mais cinco pessoas entraram. Na frente do grupo,
abrindo a porta com um estrondo, estava uma alta-elfa patrulheira. Uma
sacerdotisa da Mãe Terra a seguia.
— Bem, um banquete é habitual depois de uma batalha. Beber, comer, se alegrar
e depois dormir… à sua maneira, essa é uma recordação de nossos inimigos.
— Verdade, mas Corta-barba vai ir caçar mais goblins amanhã, não é? Que
viciado em trabalho…
Depois veio um homem-lagarto com um passo pesado e sólido e um anão
conjurador bem constituído.
E então veio o último deles.
— Sim. — disse francamente o aventureiro quando entrou pela porta. Todo
mundo na taverna olhou para ele.
Amadura de couro suja, um capacete de aparência medíocre, um pequeno escudo
redondo preso no braço, e na sua cintura havia uma espada de tamanho estranho.
— Precisamos de dinheiro — disse Matador de Goblins tranquilamente.
— Sinto muito. Se eu tivesse só um pouco mais de vitalidade…
Assim, Alta-Elfa Arqueira interrompeu como se estivesse cobrindo a
aparentemente decepcionada Sacerdotisa.
— Ei, não se preocupe com isso. Apenas deixe outros aventureiros lidarem com
isso.
— Se não houver goblins, vamos considerar isso.
— Céus, é sempre desse jeito com você. — Alta-Elfa Arqueira olhou para o teto
irritada, balançando as orelhas.
— Olá, bem-vindos!
Garçonete Felpubro seguiu até a entrada, cumprimentando os aventureiros com
um sorriso brilhante.
Havia muitos aventureiros selvagens e rebeldes, mas essas pessoas tinha uma
gentileza nascida da experiência, um deles era ranque Prata.
Então era natural que quisesse servi-los com um sorriso.
— Oh-ho — disse o intermediário deles, Lagarto Sacerdote, revirando os olhos.
— Como vai minha senhora garçonete? Bem, eu anseio solicitar um pouco de
queijo…
Garçonete Felpubro soltou uma risada com seu tom sombrio. Era do
conhecimento geral que esse homem-lagarto se tornara bastante encantado com
queijo em todas as formas.
— E o resto de vocês?
— Humm, vou querer… como era?… aquela coisa fina. Macarrão? Vou querer
isso — disse Alta-Elfa Arqueira.
— Ah, hum, alguma coisa um pouco leve para mim… — murmurou Sacerdotisa.
— Então isso é tudo? — disse Anão Xamã. — Sou o único com um apetite
adequado? Carne, eu disse, carne! E um bom e forte vinho.
— Alguma coisa com carne, sim, senhor! — adentrou Lagarto Sacerdote.
A bainha da saia da garçonete se levantou quando ela se virou para olhar para o
último aventureiro.
— Senhor, nosso especial do dia é lúcio! Pego na cidade da água e grelhado
fresco!
Apenas os ingredientes certos, perfeitamente preparados, e é claro, os talentos do
chef estavam fora de questão. Ela informou tudo isso como um desafio,
estufando seu peito de tamanho médio como se quisesse provocar uma resposta.
— Então, o que vai querer?
Era uma maneira um pouco impertinente de se falar com um cliente, mas ela não
considerava esse homem como um cliente nesse momento.
Ela encarou ele, se recusando a deixá-lo escapar, e ela pensava que podia ver um
olho vermelho dentro do capacete.
— Nada. — disse Matador de Goblins. — Estou bem por hoje.
— O que há com ele? Ele é louco?!
— Bem, não tenho certeza disso…
Garçonete Felpubro interrompeu a resposta do aprendiz da oficina batendo o
punho no balcão.
— Digo, aventureiro deveriam matar dragões, beber vinho e rir como Fua-ha-ha-
ha! Esse é seu trabalho, não é?
— Não posso negar que há alguns assim. — O aprendiz aceitou o argumento da
garota com um sorriso irônico, então enfiou um garfo em alguns peixes em um
prato. O lúcio bem passado começara a esfriar um pouco, mas ainda continuava
gorduroso e delicioso. Havia limão ou algum outro condimento nele, lhe dando
um leve cheiro de cítricos que dava água na boca.
— De qualquer forma, obrigado pelo lanche. Hm, isso é bom. Faz algum tempo
desde que comi peixe.
— Eu só não queria desperdiçar as coisas que esfriaram. Não interprete errado!
— Gosto de como nem sequer está dizendo isso para cobrir seu embaraço ou
algo do gênero.
Quando se tornou parte da rotina diária de Garçonete Felpubro levar um pouco
de comida — na verdade sobras — assim?
Fora tarde da noite, todos os aventureiros tinham ido para suas estalagens, e ela
estava sem seu uniforme limpando a taverna.
Quando se aprontou para ir para casa, ela espiou a oficina, onde o garoto aprendiz
estava sozinho cuidando do fogo.
“O que está fazendo” perguntara ela, e ele respondera: “Não podemos deixar o
fogo abaixar”.
Claro, isso era só uma desculpa; com seus olhos aguçados, ela viu que ele estava
fazendo uma adaga.
Fazia sentido. Ele trabalhou durante o dia, então ele tinha que arranjar tempo
para praticar.
Para Garçonete Felpubro, era uma excelente oportunidade; dar a ele as sobras de
comida parecia a coisa mais lógica a fazer.
— As pessoas que podem comer, deveriam comer.
— Acho que é uma contradição de termos…
— É por isso que me deixa louca quando as pessoas ignoram a minha comida!
— disse Garçonete Felpubro, mostrando sua raiva quando sacudia a cauda
vigorosamente. Não estava claro até que ponto o aprendiz compreendia o gesto
único da felpubro.
— Você entende que isso tem a ver com a minha honra como garçonete? Ou
não? Gostaria de saber se você segue o meu raciocínio!
— Bem… — O aprendiz coçou o rosto com a ponta do dedo de constrangimento.
— …Acho que não gostaria que as armas que faço fossem jogadas em qualquer
lugar por aí.
— Imaginei que não.
— Aquele cara joga as espadas de todas as formas — resmungou o aprendiz. E
as lâminas infelizes nem sequer eram obra do aprendiz (ele ainda não tinha
permissão para expor seu trabalho na loja) mas do seu chefe.
— O chefe diz: “Você é o único que pode ficar verdadeiramente satisfeito com
seu próprio trabalho”.
— Bem, eu quero que aquele esquisito experimente a comida de nossa taverna.
— Não é como se ele não comesse, é?
— É por isso mesmo! — Garçonete Felpubro se inclinou sobre o balcão da
oficina, que foi lustrado. O balcão pressionava os peitos dela, tal como estava, e
o garoto aprendiz desviou os olhos o mais casualmente possível. — Depois de
suas aventuras, ele normalmente não come.
— Eu… eu acho que já ouvi sobre pessoas que não comem antes de irem…
— Ahhh, caramba. Talvez ele não goste de nosso cardápio…
— Isso está realmente te incomodando de repente. — Os olhos do aprendiz
desceram lentamente, e ele os ergueu apressadamente de novo. Suas bochechas
coraram. — Qual é o problema?
— Quero dizer, ele nunca costumava vir à taverna, não é? — disse ela,
aparentemente inconsciente do olhar do garoto. — Há quanto tempo ele está aqui
mesmo?
— Cerca de cinco anos, não é?
— Não sei…
Para Garçonete Felpubro, a questão de saber quando o aventureiro apareceu era
trivial. Se alguém prestasse atenção a essas coisas, ela teria igualmente se
lembrado de quando eles sumiram. Assim que começa se preocupar sobre onde
fulano tinha ido depois de um tempo, você se perde. Era preferível pôr toda sua
energia em acolher as pessoas que estavam aqui agora. Ela aprendeu isso no seu
primeiro ano.
Agora que penso nisso, a recepcionista não começou a se animar cinco anos
atrás?
Garçonete Felpubro estava ali estendida com o peito no balcão, murmurando
“Hmm…”.
O garoto aprendiz tentou evitar olhar para ela, mas de alguma forma continuou
olhando na sua direção. Seus olhos se moviam para direita, depois para esquerda,
de novo e de novo, até que em pouco tempo eles se focaram em um único ponto.
— Oh!
— O quê? — Garçonete Felpubro se ergueu, com as orelhas balançando.
— Não sei se é verdade ou não — disse o garoto aprendiz, balançando a cabeça,
— mas ouvi dizer uma vez que ele gosta de guisado. Carne.
— Guisado de carne, é?
— Correto!
Parada na frente de uma panela grande e borbulhante, Garçonete Felpubro
estufou o peito. Ao lado dela, o chef estava em uma escadinha para olhar a
panela, com os braços cruzados e murmurando “Hmm”.
— Desculpe, velhote. Você está tendo que me ensinar e tudo mais.
— Bem, se você aprender a cozinhar, posso dormir um pouco mais sossegado.
— Ah, pare de denunciar sua idade, velhote.
— Acho que talvez é minha idade falando. Sou como uma manteiga espalhada
demais.
— Quer dizer o seu espírito?
— É como se eu estivesse esticado e puxado. — Com um “com licença”, o chef
pegou uma colherada do guisado e provou. — Hmm, nada mal. Deixe cozinhar
um pouco mais.
— Está beeem!
Essa seria sua chave para a vitória.
O chef olhou para Garçonete Felpubro enquanto ela soltava um “Oba!” a plenos
pulmões e murmurou:
— Mas gostaria de saber o que um aventureiro iria achar disso…
— Hum? — Ela congelou instantaneamente. — Não estava bom?
— Ehh, eu não diria isso. — Ainda que se ele dissesse alguma coisa, nunca
poderia parar. Chef Rhea coçou seu nariz arredondado. — Bem, pense por si
mesma.
— …Céus. Você vai arrepender do dia em que me deu tempo para pensar!
— Har har! Continue.
Garçonete Felpubro olhou para seu chefe com os olhos entreabertos enquanto ele
acenava com a mão, depois ela voltou sua atenção ao caldeirão.
Olhar atentamente para ele não era a forma de descobrir algo, contudo…
— Minha nossa, bem me parecia que cheirava algo bom aqui…
Ela ouviu uma voz familiar e dois tipos de passos. O sino da porta não tinha
tocado. Os recém-chegados vieram de outra parte do edifício.
Garçonete Felpubro colocou a cabeça para fora da cozinha e levantou a mão
alegremente para suas duas colegas.
— Olá! Estou fazendo a comida. O prato do dia… guisado de carne!
— Oh, guisado, isso é ótimo.
— Oooh, guisado de carne!
Elas eram suas colegas, embora estritamente falando, elas eram funcionárias e
ela apenas uma assistente, apesar das três trabalharem na Guilda.
Mas Garçonete Felpubro não dava atenção a essas distinções, nem estava nervosa
com Garota da Guilda e Inspetora.
— Obrigada. Hã? Vocês vieram almoçar? — Ela podia ver quando espiou pela
janela que o sol ultrapassara seu auge e começava a descer. Não era exatamente
o crepúsculo. — Já é bem tarde para isso.
— Nós meio que perdemos…
— Isso não é bom, como esperam manter seu corpo dessa forma?
Ou elas o “perderam” porque…?
Certamente não havia nada errado em deixar seus olhos aguçados se virarem por
um instante para um lugar particular.
— Você está certa. Estou faminta… — disse Garota da Guilda, com a mão na
barriga. Garçonete Felpubro odiava aquele estômago.
Temos que engordá-la.
— Entendi, então, experimentaria um pouco disso? Serviremos isso aos
aventureiros essa noite.
— Claro, se não se importa — disse Garota da Guilda com um sorriso e um
aceno. Depois ela acrescentou: — Ah, mas…
— Hum? — Garçonete Felpubro inclinou a cabeça.
Garota da Guilda disse desajeitadamente: — …Me pergunto o que os
aventureiros vão pensar disso.
— É… Parece meio sangrento.
— Oh…
Agora que elas haviam mencionado isso, ela também pôde entender o que
queriam dizer. O estoque, que incluía tomate, era preto avermelhado; pedaços de
carne borbulhavam para superfície.
Enquanto Garçonete Felpubro ficava ali murmurando consigo mesma, ela sentiu
uma mão minúscula bater nela por trás.
— Quêê!
— Desculpe, senhoritas, por favor, não interfiram em meus ensinamentos.
Era, desnecessário dizer, o chef. O homem de meia-idade que apareceu ao lado
delas bateu com raiva em sua barriga rotunda, e colocou uma expressão severa
no rosto. — Eu esperava ver se essa garota notaria por si mesma.
— Ah, céus, nos perdoe.
Garota da Guilda deixou escapar um pequeno riso e, indicando o guisado, disse:
— Vamos almoçar aqui então. Para se desculpar.
— Então vocês devem… comer bastante! Só o guisado é suficiente?
— Ah, está bem. Vejamos então. Pão e… Pode me trazer um chá preto?
— E muita geleia para acompanhar!
— Com prazer!
Garota da Guilda e Inspetora fizeram seus pedidos; Chef Rhea lhes deu uma
resposta animada e apertou o avental.
— Bem, não fique aí parada… ao trabalho, ao trabalho!
— Ergggg… simsenhor!
Agora não havia nada a se fazer. A comida estava pronta e quem quisesse comer
comeria.
Garçonete Felpubro se apressou com suas tarefas, e no devido tempo, a noite
caiu.
Quando o sol se pôs completamente, aventureiros surgiram na taverna como
sempre.
Previsivelmente, o guisado de carne parecia inesperado, e os compradores
poucos.
Será que eles não queriam isso logo após uma aventura? E mesmo assim servir
guisado de carne logo de manhã parecia…
— …Na verdade, talvez iria funcionar pôr no cardápio do café da manhã.
Ela se ocupou com esses pensamentos otimistas até que finalmente um
aventureiro veio andando com um passo audaz.
Por um segundo, cada olhar na taverna se virou para ele e a conversa parou, mas
rapidamente foi reanimada.
A armadura de couro suja, o capacete de aço medíocre, o pequeno escudo
redondo no braço e a espada de tamanho estranho no quadril.
Ele atravessava o edifício da Guilda, indo para fora. Ele nem sequer olhou na
direção da taverna.
Como se eu fosse deixar você ir embora!
Garçonete Felpubro correu até ficar na frente dele e o fixou com o dedo.
— Senhor, o prato do dia é guisado de carne!
— É?
— O que gostaria de pedir?!
— Nada. — disse Matador de Goblins. — Estou bem por hoje.
— Pensei que disse que ele gostava de guisado de carne!
— Eu disse que foi algo que ouvi dizer.
Era meia-noite.
Em meio à luz fraca do lampião, Garoto Aprendiz parecia bastante satisfeito com
a terrina com guisado de carne que ela trouxera para ele.
Isso não ofendeu exatamente Garçonete Felpubro, mas ela franziu os lábios e
olhou feio para ele mesmo assim.
— Ooh, pedaços de batata. Perfeito.
— …Tem certeza de que não disse isso só porque queria um pouco de guisado
de carne?
— De jeito nenhum. Bem, talvez só um pouquinho. — Garoto Aprendiz deu um
grande sorriso para ela.
A carne bem cozida era tão macia que poderia ser cortada com uma colher. Mas
não estava molenga; ainda parecia o ideal para morder. E os sucos jorravam cada
vez que era mastigado, o óleo e a base da sopa estavam deliciosos, mesmo que
estivessem um pouco frios.
Quanto aos vegetais, ele gostava de massudo e espesso.
— Então, o que anda fazendo?
— Estou recolhendo limalha de quando fizemos a afiação.
Garçonete Felpubro observou ele com interesse genuíno, e ele respondeu
enquanto devolvia a terrina à ela.
Ele varreu um canto da loja de ferraria com uma vassoura, o tempo todo
pensando que isso não era para ele.
— Vocês fizeram bastante, até para facas. — Ele não salientou que algumas
pessoas consideravam espadas nada mais que facas gigantes.
A afiação foi realizada desbastando o metal contra uma pedra de amolar na forma
de uma roda de carroça, então o processo produziu bastante cavaco. Certificar-
se de que foram devidamente limpos era um dos vários trabalhos importantes do
aprendiz.
Além disso, havia também o fato de que misturá-los com certos metais fazia seu
material durar mais. Às vezes, também se utilizava limalhas quando um trabalho
urgente exigia mais suprimentos do que tinham.
O que realmente quero é se apressar e fazer algum artigo de ferraria, no entanto…
Como um aprendiz, ele ainda estava aprendendo. Obviamente, ninguém iria
confiar nele a importantíssima produção de armas e armaduras.
Assim, ele acreditava que simplesmente teria de se dedicar o máximo possível
ao que lhe foi dado para fazer.
Não é como se não entendesse, esse sentimento de ver seus esforços
completamente ignorados.
E se ele exibisse as armas que tivesse feito — no futuro, é claro — e elas fossem
sumariamente ignoradas?
— Quer saber ao menos o porquê, não é? — perguntou ele.
— É, exatamente! Não consigo aceitar dessa forma… aceitação é muito
importante!
— Hummm — murmurou o aprendiz, cruzando os braços. Então ele
repentinamente descruzou e bateu as mãos, exclamando: — Ei, é isso!
— O que foi? Teve uma ideia, Ó futuro mestre ferreiro? Conte-me!
Quando Garçonete Felpubro se inclinou na direção dele, uma fragrância de
algum tipo flutuou do cabelo dela. Era o odor da cozinha, o cheiro herbáceo único
para os Felpubros, sabão, e outra coisa, algo doce. Garoto Aprendiz engoliu em
seco e acenou com as mãos.
— B-basta perguntar! Pergunte a alguém que saiba mais.
— O quê, quer dizer como o velhote na cozinha?
— Não — disse ele. — Quero dizer a garota da fazenda.
— O que é isso? Guisado?
— An-ham!
Era o término da manhã, na porta de serviço atrás da Guilda.
Vaqueira descarregara a mercadoria com um “Hhup!” e agora pestanejava para
Garçonete Felpubro.
Seus seios generosos saltaram quando ela deu um suspiro e limpou o suor da
testa.
Garçonete Felpubro estava bem ciente de que ela mesma estava na média, na
verdade, talvez um pouco mais do que a média; seguramente não menos. Mesmo
assim…
Talvez estejam cheios de leite?
Ela não conseguiu impedir que o pensamento sórdido atravessasse sua cabeça.
De acordo com a fofoca do escritório, Garota da Guilda trabalhava sem parar
para manter sua figura, nesse aspecto, Garçonete Felpubro ainda estava muito
bem.
— Tenho certeza de que você é uma melhor cozinheira do que eu. — Vaqueira
corou e juntou as mãos na frente do peito desajeitadamente. — Só sei fazer coisas
que que se faz em casa…
— Não tem a ver com se é ou não boa em cozinhar. — Garçonete Felpubro se
sentou em um barril com a leveza de uma felina. Ela passou a pena pelo recibo
preso a prancheta que segurava. Os assuntos financeiros era o trabalho dos
funcionários da recepção, mas checar o pedido era trabalho dela.
— Eu sei que pergunto isso sempre, mas tem certeza de que não quer olhar
dentro?
— Meu nariz sabe. Está tudo bem.
Garçonete Felpubro deu uma pequena gargalhada orgulhosa e esticou o peito que
pressionava seu avental. Sabendo, é claro, que nunca poderia
ganhar essa disputa, ela rapidamente balançou a mão para mudar de assunto.
— Como eu disse. Não se trata de se você sabe cozinhar. Há um cara que não
come, e eu tenho andado matutando sobre isso.
— Tem um aventureiro que não come?
— Alguma coisa errada?
— Não… — Vaqueira deu um sorriso conturbado e coçou a bochecha. — …Ele
não tem má intenção.
— Essa é a questão!
— Humm… — Vaqueira parecia um pouco perdida com a insistência de
Garçonete Felpubro. Ela limpou o suor com o braço, depois se sentou em uma
caixa próxima.
Ela começou a balançar as pernas, despreocupadamente, então fixou Garçonete
Felpubro com um olhar.
— É só isso?
Para um humano ou semelhante, o tom dela não teria soado diferente do normal.
Mas nem tanto para Garçonete Felpubro. Suas orelhas aguçadas detectaram o
mínimo estremecimento na voz de Vaqueira.
— É só isso o quê? — Ela inclinou a cabeça, fingindo não notar nada.
— Bem, hum, sabe. — Vaqueira não conseguia dizer bem as palavras, e seus
olhos se moviam de um lado para o outro. Ela respirou fundo. — …Você quer
dar a alguém que goste ou algo assim?
— Ahhh, não, nada disso.
Garçonete Felpubro deu uma risada calorosa e balançou a mão como se tivesse
acabado de ouvir uma piada.
— Não tenho ninguém para cozinhar além dos clientes…
Sua mão parou de se mexer.
Bem, talvez uma pessoa.
Antes que percebesse, sua expressão mudou e ela a cobriu com a mão peluda.
Havia uma pessoa para quem ela sempre dava a comida que fazia.
— …Acho que poderia dar um pouco para aquele cara da oficina.
—…
Vaqueira olhou intensamente para o rosto de Garçonete Felpubro. Seus francos
olhos vermelho-claros pareciam prender a felpubro no lugar.
— O-o que foi…? — perguntou Garçonete Felpubro, mas por um momento,
Vaqueira não disse nada.
— …Bem, certo, então — disse ela indiferentemente depois de um tempo, e
Garçonete Felpubro se viu soltando um suspiro. — Vou te dizer. Você tem algo
para escrever?
— Bem aqui — disse Garçonete Felpubro, virando toda a papelada. Ela segurou
a pena e disse: — Continue. — Vaqueira deu um sorriso impotente.
— Humm, está bem. A forma como se faz é…
E então ela explicou a receita em detalhes.
Guisado, na verdade, era um prato de carne cozida, não uma sopa. Mas a comida
que ela descreveu usava muito leite. Em suma, a impressão que isso fez foi…
— Surpreendentemente… normal?
— Exato — assentiu Vaqueira com um sorriso. — É totalmente normal.
— Digo, é apenas um guisado simples, não é?
— Isso mesmo — disse ela, não deixando o sorriso sumir — Apenas um guisado
normal.
Foi inesperado, para dizer o mínimo.
A garçonete tinha certeza de que havia algo mais… único na receita. Ela esfregou
a têmpora com a parte de trás da pena.
— É algum tipo de receita especial, passada pela sua família por gerações?
— Ha-ha-ha. Acho que sim. — Vaqueira sorriu ligeiramente e pulou da caixa.
Ela bateu as mãos para tirar a poeira, então se alongou, arqueando seus peitos
generosos. — Não foi como se tivesse aprendido de minha mãe… Embora
gostaria de ter.
Garçonete Felpubro inclinou a cabeça com o murmúrio.
— Seus parentes, então?
— Um vizinho. — Vaqueira olhou para o céu azul e semicerrou os olhos. O vento
passou pelo seu cabelo vermelho. — A garota mais velha que vivia ao lado.
— Olá, bem-vindos!
— Opa. Nos traga três ales e duas águas com limão… para começar!
— Certamente!
— E, hum… é, a travessa de batata ao vapor será o suficiente. Para cinco!
— É para já!
A taverna no pôr-do-sol. Garçonete Felpubro abria caminho pelas conversas
diversificadas dos aventureiros.
Era a mesma vivacidade de sempre. Os mesmos rostos. Era maravilhoso.
Mais um dia em que eles poderiam voltar para casa e comer alimentos e bebidas
deliciosos. Apenas isso era o suficiente para motivar todo mundo.
— Pedidos chegando, velhote!
— Pode deixar. Tente não os deixar esfriar… ou cair!
Essa era a resposta favorita de Chef Rhea.
Ela espiou a cozinha, onde uma sopa fervia ruidosamente, uma frigideira
escaldava e uma faca passava velozmente pelos ingredientes.
E claro, o chef estava no meio disso tudo, com seus braços curtos se movendo
incessantemente.
Ele faz bastante coisa com esse corpo pequeno.
Ela nunca se cansava de observá-lo, mesmo que o visse todos os dias.
Quando os pratos saíam, Garçonete Felpubro os empilhava nos braços, olhando
para a panela mais no fundo da cozinha.
— Está certo? Ainda não ferveu?
— Quê? Está me dizendo como cozinhar? Isso é culinária equivalente a uma
criança de cinco anos!
— Está bem, está bem. Era só para confirmar.
Sentindo um sermão chegando, ela ajeitou sua cauda e a saia, e se afastou.
Esse sempre foi o momento favorito de Garçonete Felpubro na taverna.
Ela poderia das as boas-vindas aos aventureiros enquanto chegavam em casa,
vendo seu alívio em voltar.
Também havia aqueles aventureiros que não puderam voltar para casa. Ela tinha
fé de que estava viajando para algum lugar.
O que houve com o aventureiro, e onde, era algo que só o mais valente poderia
dizer…
— …Humm?
As orelhas de Garçonete Felpubro se contraíram subitamente. Elas haviam
captado passos indiferentes, ousados e quase violentos se aproximando.
A armadura de couro suja, o capacete de aço medíocre, o pequeno escudo
redondo no braço e a espada de tamanho estranho no quadril.
E com a aparição de Matador de Goblins, é claro, a taverna ficou em silêncio por
alguns instantes.
— Senhor?!
— …A recepção me disse para não se esquecer de passar na taverna. — O
capacete de aço se inclinou um pouco com o som de surpresa que escapou dela.
— O que foi? Há goblins aparecendo aqui?
— Ah, não! Senhor, por favor, espere aí um momento.
— Está bem.
Deixando o estranho — mas assentindo — homem onde estava, Garçonete
Felpubro correu para a cozinha.
—Oh… Oh-ho! O que foi agora?
— Dê-me um prato, velhote! Só um pequeno!
— Diga isso para a pessoa que os lavou!
— Fui eu!
Ela pegou um prato da prateleira de louças enquanto gritavam um com o outro.
Ela colocou um pouco de guisado nele, depois correu de volta para a taverna para
que pudesse servir ele enquanto ainda estava quente.
— Prove!
— … — Matador de Goblins olhou duvidosamente para o prato que Garçonete
Felpubro colocou na frente dele. — Guisado?
— Isso mesmo!
— Para que eu prove?
— Isso mesmo!
— …Entendi.
Ele pegou o prato relutantemente, mas depois engoliu habilmente através da sua
viseira.
Lá se foi a expectativa de Garçonete Felpubro que ele pudesse tirar o capacete
enquanto comia. Mas…
Matador de Goblins deu um ligeiro “Hmm” surpreso.
As orelhas da garçonete não eram tão boas quanto de um elfo, mas elas não
perderam isso.
Ela tinha conseguido. Um sorriso gracioso surgiu em seu rosto enquanto
perguntava triunfantemente: — O que achou? Muito bom, não é?
— Sim — assentiu Matador de Goblins. — Nada mal.
— Iiiissso!
Ela acabou por erguer o punho para o alto e deu um viva de vitória. Ela nem
sequer se preocupou com os aventureiros que olharam, tentando entender o que
estava acontecendo.
— Sim! Demais! Consegui! — Ela girou, com a bainha de sua saia flutuando,
depois disse alegremente: — Então você vai comer essa noite, não é, senhor?
Qual o seu pedido? Guisado?
— Nada. — disse Matador de Goblins. — Estou bem por hoje.
— O quê?! Por quê?!
Garçonete Felpubro ficou tão surpresa que quase deixou o prato cair, se
esforçando para não o deixar cair. Matador de Goblins disse: — Alguém está
esperando por mim.
Sua voz foi breve, desapaixonada e fria, quase mecânica.
Mas Garçonete Felpubro pestanejou com as palavras. Ela olhou atentamente para
o capacete.
Em sua mente, o olho vermelho olhando de dentro se sobrepôs com outro olho
vermelho mais claro.
Ah…
Então era isso.
— O que foi? — Matador de Goblins inclinou a cabeça questionadoramente para
Garçonete Felpubro, que tinham sorrido de repente.
Ela podia ver agora. Olhando assim, era inconfundível.
— Nada. Só estava pensando, senhor, você não tem má intenção.
— É mesmo? — Matador de Goblins assentiu firmemente e depois disse: — Já
acabou?
— Acho que sim — disse Garçonete Felpubro, ao qual ele previsivelmente
respondeu “Entendi” e se virou. — Nesse caso, eu irei.
— Claro, foi um prazer tê-lo aqui.
— Não sei ao que se refere.
Matador de Goblins balançou a cabeça e andou pela taverna com um passo firme,
mas rápido.
— Ei, Matador de Goblins! Vai matar mais goblins?
— Que tal você lutar com outra coisa uma vez? Tem que caçar algo grande como
eu!
— Ahh, sozinho hoje? Nenhuma sacerdotisa bonitinha ou elfa sexy?
Respondendo “Sim”, “É mesmo?” e coisas assim para as vozes provocadoras ao
seu redor, Matador de Goblins abriu a porta.
E então, deixando apenas o tilintar do sino atrás dele, ele saiu para a cidade, pela
noite afora.
Bem, isso não era bem correto.
Sua aventura acabou, ele estava voltando. Para sua casa.
— Céus. Se era isso que ele estava fazendo, ele poderia ter dito alguma coisa!
Garçonete Felpubro riu, percebendo quão unilateral a competição fora.
Então ela soltou um “Muito bem!” e deu um tapinha na bochecha com as mãos.
A alegria a revigorou, e ela reforçou o laço do avental nas costas, pronta para
trabalhar.
— O prato do dia é guisado que dei meu coração e minha alma! Alguém vai
querer?
Mãos se ergueram. Pessoas gritaram. À medida que cada pedido vinha,
Garçonete Felpubro sorria e os anotava, dizendo “Pode deixar!”.
Mas ela tinha optado por uma panela muito grande para fazer o guisado. Não
havia “talvez” sobre isso: havia certeza de sobra.
E nesse caso…
— Eu só posso fazê-lo comer!
Se ela pudesse fazer a comida que gostava, como gostava e dar a uma pessoa que
ela gostava, seria o bastante.
Garçonete Felpubro se apressou no furor da taverna.
Capítulo 4: De um Ninho de
Goblin Perfeitamente
Comum
Riiing. Ela semicerrou os olhos contente quando tocou seu cajado de monge. O
primeiro vento a sinalizar o fim do verão roçou suas bochechas. A carruagem
sacudia também. Que agradável seria andar ao lado dela na estrada.
Ela voltou a si. Ela quase se esqueceu de que estava no meio de uma missão de
escolta. Como membro do clero, ela achava às vezes que conseguia sentir a
presença dos deuses em momentos como esse.
Apenas algumas nuvens preenchiam o céu. Ao longe, uma sombra negra voava.
Um gavião? Uma águia? Um falcão?
— Aquele pássaro está bem alto, não?
— De fato…
Aquele que falou com ela estava sentado no teto da carruagem.
O patrulheiro com a besta não estava, é claro, lá em cima por diversão. Alguém
precisava manter vigilância. Patrulheiro se mostrara confiável em ficar de olho
no ambiente e não mostrou sinais de deixar sua atenção se perder.
Então a suspeita na voz de Patrulheiro fez com que ela apertasse de imediato as
mãos no seu cajado de monge. Cada um dos outros preparou seus equipamento
também, se preparando contra algo que não podiam ver. O único que não parecia
notar algo era o dono da carruagem, um mercador. Eles o ignoraram quando
perguntou: “Então, o que está acontecendo?”.
Patrulheiro disse em voz baixa: — Não acham que esse pássaro é grande demais?
— Agora que falou nisso…
Aconteceu quando ela tentou ver mais de perto.
Ele estava encurtando a distância até enquanto observava: pele e garras, bico e
asas da cor de cinzas escuras…
— Demônio!
Eles reagiram com a voz do seu companheiro, Patrulheiro, mas estavam
atrasados demais para tomar a iniciativa. No caso dela, criticamente tarde
demais, e o monstro — o demônio de pedra — foi terrivelmente rápido. Não foi
destino ou acaso, mas uma diferença clara nas capacidades que foi sua ruína.
Quando ela pensou Hum?!, seus pés já estavam voando sobre o chão. Ela sacudiu
as pernas, mas não significava nada; ela foi puxada bem para o alto no ar. O chão,
a carruagem, seus amigos, todos ficaram mais distante.
— Ergh… ahh… ou… aahã?!
Ela bateu no monstro com o cajado de monge no seu esforço desesperado para
resistir, ao que ele apertou as garras nos seus ombros e a sacudiu.
Ela olhou para baixo e deu um grito com isso. Ela sentiu a parte inferior do seu
corpo ficar úmida.
— Hrrgh… Eeegh!
Os problemas não pararam por aí. Sua coxa ardia como se fora atingida por uma
pinça quente. Patrulheiro devia ter disparado uma flecha na tentativa de fazer
algo, e o demônio deveria a ter usado como escudo.
Ela olhou para baixo, com a visão turva pelas lágrimas, para ver seu conjurador
entoando alguma coisa.
Pare, pare, pare, pare! Ela agitou desesperadamente seu cajado de monge,
balançando a cabeça em Não, não!
Estivemos enganados! Isso não é um demônio! Isso não é um…!
— Aaaaahhh!
A criatura se esquivava da avalanche de raios, a sacudindo como um chicote. A
flecha em sua coxa se enfiou mais fundo na carne. Ela gritou e tremeu.
Ela não devia ter feito isso.
As garras em seus ombros escorregaram, rasgando a pele, a carne e tirando
sangue.
— Ugh!
Um som escapou dela. A sensação de flutuar. Vento. Vento. Vento. Vento.
Ahh, estou com medo, me ajude, Deus do Conhecimento, ó Deus, oh Deus…
Infelizmente, tudo isso talvez tenha sido um desejo fervoroso de sua parte, mas
não era uma oração.
Dessa forma, não alcançou os deuses. Sua única noticia positiva era que não
sentiu dor. Ela teve azar até no momento em que atingiu o chão, sem perder a
consciência.
Embora por ela agora ser um pedaço trêmulo de carne arruinada, isso não fazia
diferença.
— Então, qual é o plano?
Uma voz ríspida e masculina soou pela terra devastada fustigada pelo vento. A
lança que ele carregava nas costas e a armadura que usava, o fazia parecer bonito
e corajoso.
Em frente aos olhos de Lanceiro se erguia uma torre branca, brilhando na luz do
meio-dia. As paredes eram feitas de uma pedra branca cintilante; da forma como
alcançava aos céus sem uma única sutura, devia ser marfim. Mas a ideia de que
não havia nenhum elefante assim tão grande deixava poucas dúvidas se esse era
o produto de magia.
— Eu diria que essa coisa tem pelo menos sessenta andares.
— Entrar pela porta da frente pode ser complicado.
A resposta veio de alguém com aparência não menos heroica do que Lanceiro.
Seu corpo musculoso estava armadurado, e em suas costas levava uma espada
larga quase tão grande quanto ele. Guerreiro de Armadura Pesada, famoso na
cidade fronteiriça, estendeu a palma da mão e olhou para cima, semicerrando os
olhos para o topo da torre.
— Oitenta e nove por cento de chance dessa torre ter sido construída por algum
tipo de idiota que a preencheria com monstros e armadilhas.
Aos seus pés havia um cadáver brutalmente deformado; parecia ter caído de uma
grande altura. Eles já haviam pegado a insígnia que estava em seu pescoço,
indicando seu nome, gênero, ranque e classe. Aparentemente, o corpo pertencera
a uma garota, mas se ela havia morrido antes da queda ou por causa dela, eles
não sabiam.
Eles viam outros pontos carmesins ao redor da torre, presumivelmente mais
restos.
— Suponho que algum mágico estranho construiu ela como um esconderijo. Eu
diria que ele se saiu mal.
Guerreiro de Armadura Pesada cutucou levemente o cadáver com a bota. O dono
da torre era um Que-Não-Reza, ele se esquecera como. Essa aventura significava
que seria basicamente um corta-e-massacra, cheio de oponentes monstros.
— Duvido que haja necessidade de termos que enfrentá-lo de frente.
A última pessoa falou com a voz calma e baixa. Era um homem com armadura
de couro suja e um capacete de aço medíocre, com um pequeno escudo redondo
no braço e uma espada de tamanho estranho no quadril. Ele enfiou a mão na
bolsa de itens em sua cintura e começou a procurar pelos equipamentos.
— Podemos escalar a parede.
— Ei, está dizendo com uma corda ou algo assim? Se o gancho soltar no meio
de caminho, nós vamos cair direto!
— Segure um pitão em cada mão e puxe.
Lanceiro deu de ombros, olhando para o pitão que Matador de Goblins pegara.
— Você tem alguma experiência em escalada?
— Um pouco, em montanhas. Penhascos também.
Guerreiro de Armadura Pesada cruzou os braços e grunhiu. Ele estendeu o dedo,
medindo a altura da torre, e estalou a língua.
— A questão é como lutar contra algo que pula em você no caminho. Não precisa
ser um demônio. Uma gárgula seria problema de sobra.
— Gárgula?
— Estátuas de pedra — disse Guerreiro de Armadura Pesada, indicando seu
tamanho aproximado com as mãos. — Asas. Elas voam ao redor do céu.
— Hmm. — Matador de Goblins soltou um grunhido. — Então existem inimigos
como esse também…
— É. Pessoalmente, sou focado em armamento de curta distância, mas… um
usuário de magia certamente facilitaria as coisas aqui agora.
— Não fique todo animado aqui, tá? — Lanceiro olhou para Guerreiro de
Armadura Pesada, que começara a formular uma estratégia com a maior
seriedade, como se não pudesse acreditar no que via.
— E então? Quer abrir caminho até lá, detectar e desarmar armadilhas, procurar
por aí? De certo que não. — Guerreiro de Armadura Pesada suspirou, deslizando
a espada enorme nas costas para repousar entre as omoplatas. — Porque não
temos conjurador, monge e nem ladrão.
Nisso, Lanceiro só pôde ficar em silêncio.
Havia uma gama interminável de lugares para se aventurar no mundo. Ruínas
das batalhas da Era dos Deuses eram numerosas, e ainda mais na fronteira.
Independente se eles seguissem a Ordem ou o Caos, nações floresciam e depois
declinavam, e o ciclo continuava com outra nação surgindo. Em consequência,
encontrar uma ou duas ruínas novas não era nada especial. Mas quando ruínas
apareciam um dia depois de quando não estavam antes, era outra história.
Foi supostamente uma caravana mercante que descobrira a torre de marfim se
erguendo de resíduos. A floresta que estava lá em sua viagem de ida
desaparecera, substituída pela torre branca que os contemplava de cima.
Naturalmente, sua surpresa foi tremenda, mas não tiveram tempo para ficar
olhando, eles foram atacados por criaturas com formas humanas e asas de
morcegos.
Demônios! Aqueles agentes horríveis do Caos! Aqueles Personagens Que-Não-
Rezam!
Os comerciantes fugiram, e por meio da Guilda dos Aventureiros, seus relatórios
foram enviados ao próprio rei. O rei poderia ter enviado o exército para
exterminar a ameaça e o assunto teria sido resolvido. Se as coisas fossem simples
assim.
Mandar o exército exigia homens e dinheiro. Nesse caso, os homens eram
cidadãos normais e o dinheiro eram impostos. Os impostos poderiam subir no
ano seguinte. E parentes, membros da família, amigos e vizinhos poderiam
morrer cumprindo seu dever como soldados. Os cidadãos achavam isso
intolerável e criariam apenas ressentimento.
E também havia o dragão para vigiar que vivia no vulcão e outros problemas
como partidários do Senhor Demônio que ainda ameaçava a área. Enviar o
exército significaria haver menos pessoas para participar nessas outras questões.
E se a torre fosse uma isca, uma distração, e então? Verdade, demônios estavam
se reunindo lá, mesmo assim, era só uma torre no meio de um terreno baldio.
Talvez algum mago doentio tivesse construído. Não podia ser dito ainda se era
uma ameaça para o país ou ao mundo. Não havia razão para os militares se
envolverem.
Poder-se-ia perguntar, então, para que serviam os militares. Estarem prontos
contra uma invasão das forças do Caos, é claro. Na recente batalha culminante
entre o novo herói ranque Platina e o Senhor Demônio, eles estiveram nas linhas
de batalha. As baixas foram elevadas. Muitos morreram, muitos ficaram feridos.
Eles não estavam em condições de ir imediatamente para a próxima escaramuça
ou grande batalha.
Mais do que tudo, uma estratégia simples dizia que tentar enfiar um exército em
uma ruína ou uma caverna era uma boa forma de destruí-lo. Unidades militares
eram feitas para lutar em planície aberta contra unidades inimigas, não para
entrar em espaços fechados que nem mesmo cavalos podiam entrar.
Ruínas e cavernas tinham monstros que ameaçavam as aldeias pioneiras. Como
o exército poderia ser despachado para todos eles de uma só vez? Era
precisamente devido ao rei e os nobres serem um bom rei e bons nobres que não
podiam utilizar suas forças tão levianamente.
— Mas essa questão também não será ignorada.
O jovem rei, visitando sua amiga pela primeira vez em muito tempo, suspirou
profundamente.
O lugar era mesclado de raios solares suaves, cheio de tranquilidade e silêncio
verdadeiro.
A vida vegetal era cuidadosamente tratada, as flores perfumadas. Os pilares
brancos no bosque pareciam ser árvores enormes. O correr de um riacho, que
parecia vir de nenhum lugar em especial, era relaxante aos seus nervos
desgastados.
— O que acha que devo fazer?
— Meu Deus.
Eles estavam em um jardim na parte mais profunda do Templo. Sua sacerdotisa
deu um sorriso elegante e inclinou a cabeça. Seus lindos cabelos dourados
fluíram como mel, caindo sobre seu peito vasto.
— Uma interessante mudança de ideia para alguém que deu as costas quando
estávamos lidando com os goblins.
— Você tem de entender, embora possa ter sido uma tragédia pessoal, em uma
visão geral, era trivial.
O rei falou sucintamente, depois sacudiu a mão como se para afastar as palavras.
A maneira como se acomodou no banco que fora preparado para ele era ao
mesmo tempo rude e ainda assim gracioso. Era isso o que chamavam de realeza?
Ou orientação aristocrática? O que quer que fosse, ele se movia como alguém
que entendia desde o nascimento.
— E alguns goblins podem ser lidados facilmente por um grupo de aventureiros.
— …Sim. Tem razão.
Isso era um simples fato.
Goblins eram perigosos, e se eles o derrotassem, “tragédia” era a palavra exata
para o que se esperava.
Mas goblins continuavam sendo os monstros mais fracos, e eles não eram os
únicos contra os quais a perda significava um destino cruel. Você poderia ser
comido por um dragão, dissolvido por um limo ou feito em pedaços por um
golem…
O que em última análise o aguardava era a mesma coisa que encontraria quando
os goblins tivessem acabado de brincar com você: a morte. Quer fosse devido à
falta de força física, habilidade ou simplesmente azar, não havia futuro para
aqueles que não pudessem derrotar goblins.
— Como Vossa Majestade é muito gentil…
Uma música cômica veio dos lábios entreabertos da mulher:
Uma vez um rei tão gentil e justo
Para tomar da população seus impostos
Água ele deu a um rio furioso
E aos conselhos municipais sempre ajudou
Enfiou os conselheiros na cama
E cada esfomeado alimentou
Ele fez seus soldados mostrarem coragem
E heróis enviou para buracos de goblins:
A Capital logo era uma festa para trolls.
O rei franziu a testa ao ouvir uma música que zombava da nobreza, e ela riu como
uma garota.
— Não é esse o momento de recorrer aos aventureiros, Vossa Majestade?
— Realmente, pode ser…
O rei colocou a mão na testa, a esfregando como que para aliviar um músculo
tenso, e assentiu. Ele pensava que terminaria assim.
O exército não era adequado para caçar monstros. Assim eles dariam status a
esses malandros, dariam recompensas, eles iriam enviar os aventureiros. Era isso
que mantinha o mundo girando. Eles fariam isso de novo agora. Os aventureiros
não eram especialistas em caçar monstros, afinal?
— Os mercadores disseram que foram atacados por demônios, mas não sabemos
ao certo o que foi responsável.
O rei balançou a cabeça como se para frisar que não existiam provas, depois se
acomodou brutamente na sua cadeira.
Mal poderia um rei se sentar em um trono dessa forma. Ele fechou os olhos,
respirando o ar refrescante do jardim à vontade do seu coração.
— Duvido muito que comerciantes possam diferenciar um demônio de uma
gárgula.
— É uma torre de conjurador maligno, não é? — A mulher que era a mestre
desse templo deu uma risada e murmurou “Nossa, que assustador”, como se não
fosse problema dela.
O rei ergueu a cabeça apenas o suficiente para olhar para seus olhos tampados,
mas não deu nenhuma resposta. Era assim que ela iria alfinetá-lo por ignorar o
incidente com goblins. A capacidade para aceitar cordialmente os ressentimentos
de suas políticas era, supunha ele, a marca de um rei. Deixe-os o chamar de
incompetente, se quisessem.
— Isso é certamente mais perigoso que goblins. Mas não é nada comparado aos
Deuses Demônios.
— Verdade, de fato.
— Parece que algum necromante ao sul encontrou uma tumba antiga. — O rei
se recostou bem na cadeira, quase como se estivesse dizendo que o assunto o
entediava. A cadeira fez um rangido. — Um exército dos mortos! Isso não me
dá o luxo para lidar com goblins ou uma torre solitária.
— Heh-heh. Quão cansado você deve estar. — Ao falar, a mulher deixou suas
coxas aparecerem pela bainha do vestido, como se as exibindo.
— Status é uma coisa difícil — murmurou o rei. — Sequer posso encontrar meus
amigos sem um pretexto.
— Tal é a posição — sussurrou a mulher. — Tudo muda, o que você poder ver
e o que não pode.
— Perdi a capacidade de dizer que eu e meus amigos deveriam simplesmente
lidar com isso com nossas espadas, como fazíamos antigamente. — O rei
suspirou, parecendo ponderar sobre uma memória dos tempos passados. — Não
consigo deixar de pensar que as coisas eram mais fáceis quando eu era um único
senhor desafiando labirintos por conta própria.
— Ah, sim, você ficava muito bem, fugindo depois de ser surrado por aquele
atacamato.
— Eu me lembro de um grupo que sofreu um destino terrível quando atacado por
limos.
O tom gracejador deu lugar a um mais contundente. Donzela da Espada soltou
um suspiro silencioso. — Há momentos em que eu também gostaria de deixar a
minha posição e voltar a ser apenas uma garota.
— Até a arcebispa do Deus Supremo se sente assim?
— Sim. — As bochechas da clériga cega tingiu-se de rosa claro, e seus lábios
formaram um sorriso generoso. Ela pôs a mão em seus seios grandes para
impedir de tremer, e com uma voz tão ardente quanto se estivesse confessando
seu amor, ela disse: — Muito mesmo, ultimamente.
— As coisas não saíram da forma que qualquer um de nós esperava. Mas é isso
que faz a vida ser interessante. — Com esse sussurro, o rei fez um espetáculo ao
se erguer da cadeira. — Já é hora de me despedir. Afinal, só vim para pegar
emprestado algumas sacerdotisas da guerra.
— Sim, Vossa Majestade. Estou feliz de termos a oportunidade de conversar.
— Imagino. — O rei deu um leve sorriso que abrangia tanto o amargo quanto o
familiar. — Você parecia ter outra pessoa em mente além de mim.
— Lamento, não posso fazer isso.
Guerreiro de Armadura Pesada olhou para o formulário da missão e balançou a
cabeça com firmeza, embora fosse assinado pelo próprio rei.
— É muito difícil?
— Nem, mas o meu grupo está indisposto no momento. Caso contrário teríamos
pegado.
— Bem, essa é uma situação difícil — murmurou de novo Garota da Guilda,
franzindo a testa para o aparente sombrio Guerreiro de Armadura Pesada.
Em sua mão ela segurava um pedido para investigar as ruínas chamadas
provisoriamente de “Torre do Demônio”.
Recentemente se tornara cada vez mais comum ruínas e labirintos surgirem de
repente. Desde a derrota do Senhor Demônio, seus partidários restantes andavam
fazendo trabalho sombrio por todo o lado. Enquanto os militares se recuperavam,
os conjuradores malignos e semelhantes ficaram menos relutante em ser vistos
pelas pessoas.
Como parte da Guilda, seria mentira dizer que Garota da Guilda não queria
designar todas as missões disponíveis. Mas mesmo com uma recompensa de
dezenas de peças de ouro por pedido, havia cem ou duzentas para serem
resolvidas. Ela percebeu que o tesouro nacional era basicamente ilimitado e não
conseguia pensar em nada mais indulgente do que isso.
— Estaríamos contra demônios, certo?
Podendo ouvir ou não o suspiro de seu peito bem formado, Guerreiro de
Armadura Pesada deu mais uma boa olhada na folha de missão. Com o dedo
envolto de uma luva simples, ele traçou lentamente as letras dançando na página,
então formou um punho.
— Sem ao menos um conjurador e um batedor… ranques Prata, ainda por cima…
— Um grupo de três?
— Esse seria o mínimo. Se possível, eu gostaria especificamente tanto de um
mago quanto um clérigo comigo e dois outros na linha de frente, e esse batedor.
Seis no total.
Hum, hum, hum. Garota da Guilda pensou nisso com uma expressão séria no
rosto, com os papéis em sua mão farfalhando enquanto os virava
descuidadamente.
Fichas de Aventura.
Elas gravavam como cada capacidade do aventureiro crescera com cada aventura
que passavam. Não seria exagero dizer que, de certo modo, esse maço de papel
eram as próprias vidas dos aventureiros. A pilha continha um monte de novatos,
magos e clérigos, batedores e guerreiros. Mas quando chegava naqueles que
formavam os ranques superiores, o número caia drasticamente. Um dos seus
problemas era que havia bem poucos veteranos de ranque médio.
Não temos ninguém que se encaixe perfeitamente nessa descrição.
Garota da Guilda olhou para os aventureiros que faziam do edifício tão vivo.
Claro que eles deviam ser capazes, mas também tinha de ser pessoas decentes.
Afinal de contas, o recrutador de missão dessa vez era o próprio rei. A Guilda
não precisava de alguém que só saia para provar alguma coisa. Eles poderiam ser
um pouco egoístas ou ambiciosos, mas tinha que entender o que realmente estava
em jogo…
— Se apenas houvesse alguém que tivesse todas essas qualidades e pudesse
equilibrar o uso de magia com batalha…
— Pode deixar! Estou bem aqui!
Foi como um sonho. Quando seu desejo havia acabado de se perder, alguém
respondeu entusiasticamente.
Ele veio correndo alegremente até o balcão, carregando sua lança, como se
tivesse esperado por esse momento a vida toda. Assim que Garota da Guilda
percebeu quem era, ela disse “Ah!” e trouxe um sorriso ao rosto. — Agora que
penso nisso, me lembro de você ter aprendido um pouco de magia.
— Um aventureiro tem que estar pronto para todas as situações possíveis! —
Lanceiro assentia ansiosamente e confiante, e não pareceu notar Guerreiro de
Armadura Pesada exclamando “Aggh” e batendo na própria testa, um gesto fácil
de se entender.
Independentemente disso, Garota da Guilda sabia muito bem que Lanceiro
trabalhava com Bruxa.
— Ham-ham, o seu… grupo está de acordo com isso?
— Ah, claro. Acabamos de voltar de um de nossos “encontros”. Acho que vou
deixá-la descansar.
…Ele tem certeza disso?
Garota da Guilda olhou sobre os ombros de Lanceiro e viu Bruxa atrás dele,
descansando no banco. Bruxa lhe ofereceu um sorriso elusivo.
Essa é a atitude mais problemática de todas.
Mexendo com as tranças com uma das mãos, Garota da Guilda soltou um leve
suspiro perturbado. Da perspectiva de Bruxa, Garota da Guilda era uma rival
amorosa. Mas isso era negócios… certo?
Hmm. Não posso deixar minha vida pessoal se envolver com meu trabalho.
— Está bem, de momento, vocês dois… tudo bem?
— Claro, não me importo. Eu posso confiar… bem, tenho confiança nesse cara.
— Apesar de ele parecer se atrapalhar um pouco com as palavras, Guerreiro de
Armadura Pesada assentiu. — Mas ainda não é o bastante.
Lanceiro surrupiou o papel da missão de Guerreiro de Armadura Pesada com um
“Me deixe ver isso” e inclinou a cabeça. — Como não somos o suficiente? —
disse ele.
— Quero um batedor, pelo menos.
— Não há muitos batedores talentosos por aí. E quanto aquele garoto do seu
grupo?
— Não quero envolvê-lo em uma luta com demônios — disse seriamente
Guerreiro de Armadura Pesada. — Eu não poderia carregar essa
responsabilidade. — Ele encarou Lanceiro. — Não preciso necessariamente de
alguém com alinhamento bom, mas quero pelo menos um neutro.
Em alinhamento, “bom” e “mau” não tem exatamente o seu significado literal,
mas sobretudo descrevia se alguém era alocêntrico ou um egocêntrico, se
preferiam lutar ou não. Batedores e ladrões estavam por si mesmos e eram
dispostos a agir. Era algo que valia pensar se você não quisesse ter de se
preocupar com seu compatriota agindo contra o personagem quando o momento
crucial viesse.
— Então o que você precisa é…
Alguém que era um batedor e poderia ficar na linha de frente. Capaz, bem como
respeitável. Alguém que pudesse manter seus negócios e vida pessoal separados.
Cujo alinhamento era, se não bom, ao menos neutro. E alguém que estaria
susceptível a tomar essa missão.
— Sim! Consigo pensar em um!
Quando Garota da Guilda bateu as mãos e saltou do seu lugar, Lanceiro lhe deu
um olhar duvidoso. O breve momento que esse olhar sondou seu peito não passou
despercebido, mas no momento Garota da Guilda não se importava.
— Hã? Existe realmente alguém assim?
— Posso garantir que ele é habilidoso, de qualquer forma. — Ela chegou mesmo
a lhe dar um sorriso e uma piscadela, depois marchou muito bem-disposta. Ela
parecia impressionante, seus sapatos faziam barulho enquanto andava com o
papel apertado no peito. Ela ia para o banco em um canto da área de espera da
Guilda. O lugar onde ele sempre se sentava. Ela achou ficar um pouco
emocionada só de ver o capacete de aço se virar em direção a ela quando reparou
que vinha.
E então ele perguntou, com uma voz baixa e desapaixonada:
— …Goblins?
— Tenho que admitir, não pensei que fosse aceitar.
— Porque não havia missões de goblincídio.
Assim, os três aventureiros se encontravam na frente da torre. Lanceiro e
Matador de Goblins, com Guerreiro de Armadura Pesada como líder.
Um grupo composto de um guerreiro humano, um segundo guerreiro humano e
um terceiro guerreiro humano. Isso traria um sorriso irônico a qualquer rosto.
Embora esses tipos de grupos não fossem incomuns, por pura necessidade.
— E precisava de dinheiro.
— Principalmente por extermínio de goblins, presumo? — riu Lanceiro.
Mas Matador de Goblins respondeu “não” e balançou a cabeça. — Não por isso.
Mas é urgente.
— Dependendo de quanto precisa, posso te emprestar um pouco — disse
Guerreiro de Armadura Pesada, sem tirar os olhos da torre na frente deles. —
Acho que você não morreria.
— Agradeço, mas não, obrigado.
— Você que sabe. — Guerreiro de Armadura Pesada respondeu com um aceno
e Matador de Goblins começou a vasculhar sua bolsa de itens. A primeira coisa
que sua procura resultou foi um monte de pitões e um martelo pequeno.
— E eu já tenho uma dívida para pagar.
— Dívida? Que seja! — Lanceiro franziu a testa e estalou a língua irritado. —
Somos aventureiros! Terminaremos essa missão, considere essa dívida paga.
— Entendi.
— De qualquer modo, você literalmente só tratou comigo uma única bebida
depois daquilo. Você ainda me deve!
— Isso é o oposto do que acabou de dizer — disse Guerreiro de Armadura Pesada
exasperado, mal ouvindo os dois.
Matador de Goblins retirou um rolo de corda e pôs no ombro.
— Eu prometi te recompensar com uma bebida. E eu fiz.
— Hrrrgh! — Lanceiro não teve qualquer resposta para a réplica de Matador de
Goblins. Guerreiro de Armadura Pesada teve de se esforçar para segurar um
sorriso.
Resmungando furiosamente “hrmph, hrmph” e estalando a língua, Lanceiro deu
a parede algumas batidas experimentais. — …E-enfim, essa parede parece
terrivelmente sólida. Tem certeza de que conseguirá fixar seu equipamento de
escalada nela?
Havia algum truque para funcionar, mas os outros dois também não se sentiriam
atraídos com isso. A torre fora criada em uma ou duas noites. Obviamente não
era feita de materiais normais.
— Aqui, me dê eles.
— Claro. — Matador de Goblins passou os pitões e o martelo para a mão
estendida.
Guerreiro de Armadura Pesada os pegou, dando a um dos ganchos um bom golpe
com o martelo, depois ele grunhiu:
— É. É bastante duro.
A parede da torre reluzente nem sequer arranhou.
De repente, Guerreiro de Armadura Pesada começou a remover suas luvas e
braceletes. Ele enfiou o equipamento em sua mochila e trocou por uma garrafa
cheia de um líquido vermelho. Ele sacou a rolha e tomou. Provavelmente uma
poção de força. Ele guardou o frasco vazio, depois pegou uma espada de uma
mão e um anel com um rubi brilhante.
— Hum! Um anel com um encantamento de impulso físico? — disse Lanceiro
com interesse.
Não era surpresa que Guerreiro de Armadura Pesada tinha uma espada mágica.
Armas mágicas eram raras, mas poderia se esperar de um ranque Prata ter pelo
menos uma delas.
— Normalmente uso minhas Braçadeiras do Mestre de Armas Excepcional e
minhas luvas mágicas, então não preciso disso com frequência. — Guerreiro de
Armadura Pesada pôs a espada em sua cintura e segurou o pitão com a mão que
estava o anel. Dessa vez ele grunhiu “hmph!” e o levou contra a parede.
— Dê uma olhada, Matador de Goblins. Isso é equipamento de primeira classe
para você.
Por que está se gabando? Guerreiro de Armadura Pesada parecia querer
perguntar.
Lanceiro o ignorou. — Por que você não mantem uma ou duas espadas
encantadas consigo? Não quer parecer legal?
— Não tenho interesse em espadas mágicas, mas tenho um anel.
— Ah, é?
— Ele permite respirar debaixo d’água — disse Matador de Goblins brevemente.
— Mesmo que os goblins roubassem, não faria mal.
— Para que eles iriam querer isso? Espera um pouco… você supõe que será
roubado?
Lanceiro estava pressionando suas têmporas, mas o capacete de aço assentiu e
disse: — É claro. Mas não iria caber no dedo de um goblin.
— Você devia aprender que não importa o que diga a essa cara, é tudo inútil. —
Guerreiro de Armadura Pesada estava mostrando um sorriso enquanto agarrava
o pitão e se erguia. — Ei, vocês dois vão me pagar pela poção, não é? Nós
dividimos a recompensa em três partes, menos o custo.
E então, se segurando no lugar com apenas um dos braços, ele pegou outro pitão
e continuou escalando. Ele não estava exatamente velocíssimo, mas parecia
muito bem. Ele estava, afinal, de armadura completa e carregando uma espada
larga nas costas. Isso não exigia pouca força física.
— Sem problema.
— Sim, claro.
Matador de Goblins respondeu com espontaneidade, e Lanceiro não manifestou
qualquer objeção particular. A maioria dos aventureiros sabia manter qualquer
disputa sobre a recompensa na taverna. Não importava quão valioso fosse um
item, se você guardasse ao custo de sua vida.
Matador de Goblins agarrou os pitões e começou a subir após Guerreiro de
Armadura Pesada, enquanto atrás dele Lanceiro deu um estalo com a língua. —
Então eu sou o traseiro, hum?
Matador de Goblins parou no meio da escalada, olhando para trás com uma das
mãos ainda no pitão.
— Prefere passar na minha frente?
— Tanque primeiro, batedor depois. Mas tudo bem, então vamos continuar
subindo.
— Entendi.
Ele agarrou, subiu, agarrou o pitão seguinte, colocou o pé sobre o anterior e assim
ele ficou outro nível acima. O que restava era simplesmente repetir o processo.
Sem olhar para cima, sem olhar para baixo. Observando cautelosamente apenas
à esquerda e à direita.
Todos eram aventureiros relativamente experientes, e tinham pontos de apoio
para as mãos e pés. Se eles estivessem muito preocupados com o vento, que
ficava mais forte quanto mais subiam, não poderiam ter contemplado a escalada
da parede externa.
O problema era que o vento não era a única coisa que poderia machucá-los.
Matador de Goblins, verificando a esquerda e a direita como seu batedor, gritou:
— Ei. — Ele continuou: — A oeste. Três deles. Alados. Não goblins.
— Então nos encontraram… Que cor são?
— Cinza.
— Sabia — disse Guerreiro de Armadura Pesada, assentindo com a resposta. —
Eles são gárgulas, sem dúvida.
— Gárgulas… Humm — suspirou Matador de Goblins. — Então é assim que
são.
— Há uma chance de eles serem demônios de pedra. Perto de oitenta e noventa
por cento, é.
Elas eram demônios alados tão escuros quanto as cinzas no canto de uma lareira.
Ou assim poderia se pensar à primeira vista. Tais eram os monstros de pedra,
gárgulas. Uma vez destinadas a vigiar lugares sagrados, gárgulas, também eram
agora Que-Não-Rezam. Possivelmente era os seus corpos terríveis e distorcidos
que tinham, ao longo dos anos, conduzido elas ao Caos.
Uma pessoa não pensaria que um pouco de bater de asas poderia manter uma
estátua no ar, mas essas criaturas podiam voar. Ainda assim eram feitas de pedra,
as tornando inimigos temíveis.
— Nunca viu mesmo uma? Elas aparecem em ruínas às vezes.
— Algumas vezes. — Matador de Goblins virou lentamente a cabeça de um lado
ao outro. — Mas não sabia que eram gárgulas.
— Seja como for, elas descem rápido. — O sorriso de Lanceiro foi tão feroz
quanto o de um tubarão. Os monstros voavam agora — literalmente — em seu
campo de visão.
Elas estavam rodopiando preguiçosamente ao redor do topo da torre,
provavelmente a vigiando. Agora elas estavam descendo em pânico,
provavelmente elas não esperavam que alguém tentasse escalar a parede. Elas
não estavam longe, mas os aventureiros não pareciam muito assustados ou
mostravam qualquer sinal de estar ficando.
— Não é verdade o que dizem, que gárgulas não suportam a luz do sol. —
Lanceiro olhou para elas, ajeitando seus pés para encontrar o equilíbrio nos
pitões. — Se elas te apanharem, você terá problemas.
Segurando-se firmemente com o braço esquerdo com escudo, Matador de
Goblins sacou sua espada segurando inversamente. — Se conseguir manter
debaixo de você, você não vai morrer mesmo que caia no chão. Apesar de que
você ficaria longe da batalha nesse ponto.
— Talvez, se pudesse lançar Controle sobre todas elas. E isso se elas não cairem
em um golpe, certo? — Guerreiro de Armadura Pesada pegou sua espada de uma
mão, que emitia um ligeiro brilho branco, a aura da magia. Ele segurou com a
boca a corda decorativa que pendia da empunhadura, então apertou firmemente
ao redor do pulso. — Não sei quanto a vocês, mas estou tranquilo só com uma
mão.
— Dizem que o choque de magias vem antes do choque das armas. Arrgh. Esses
marombas. — Lanceiro entrecerrou os olhos e tocou seu brinco — um catalisador
mágico — com uma das mãos. Matador de Goblins olhou para o que Lanceiro
estava fazendo, então balançou a cabeça.
— Estou pensando em algo.
— Eu também — disse Guerreiro de Armadura Pesada.
— Calem a boca, já entendi! Não consigo me concentrar aqui embaixo!
— GARGLEGARGLEGARGLE!!
Com um berro indistinto não muito diferente de gargarejar, os monstros
demoníacos voaram até eles. Mas Lanceiro, sem pressa ou alarido, disse algumas
palavras de verdadeiro poder com a capacidade de remodelar as leis da realidade.
— Hora… semel… silento! Fique em silêncio, tempo!
Naquele instante, o vento parou.
O fluxo da atmosfera cessou; o som de longe pausou, estagnou, parou. As
palavras de Lanceiro preencheram o mundo, dobrando suas leis, e tudo empacou.
Essa era a magia Retardar.
— GARGLEGARG?! GARGLEGARG!!
— GARGLEGARGLEGAR!!
As gárgulas batiam e batiam as asas, mas não podiam gerar qualquer poder, assim
elas não puderam ficar no ar. A gravidade tomou conta das três criaturas, e em
questão de segundos elas caíram várias dezenas de andares, virando pó ao
atingirem o chão. E nenhuma estátua de pedra, uma vez destruída, poderia voltar
a vida.
— Quê, já foram? Elas não eram tão difíceis.
— Suponho que cair dessa altura geralmente levará à morte.
Guerreiro de Armadura Pesada contraiu os lábios, desapontado, e Matador de
Goblins deslizou sua espada de volta para a bainha. Os dois retomaram
rapidamente a escalada, mas Lanceiro lhes lançou um olhar inequivocamente
descontente.
— Puxa, uma magia como essa, e nem sequer juntaram uma palavra de elogio?
— Foi uma boa estratégia — retornou a resposta casual de Matador de Goblins.
— Vou usá-la qualquer dia.
— O quê, em goblins?
— Que mais?
Essa conversa fez Lanceiro balançar a cabeça com um abatimento profundo.
Levar os goblins para algum lugar bem alto e então jogá-los? Não parecia ser
algo que aventureiros mais sérios contemplariam. E pensar que ele estava sendo
creditado pela ideia… Dá um tempo!
— Mais importante: quantas magias ainda tem? — As palavras de Guerreiro de
Armadura Pesada trouxeram Lanceiro de volta a si.
Ele agarrou um pitão para se firmar, quase tarde demais e falou “mais uma”.
Doía nele admitir, mas um fato era um fato. — Essa não é a minha classe
principal, lembrem-se.
— Está bem, se formos atacados de novo na subida, voltaremos para baixo e
descansaremos por uma noite. Então mudaremos para um ataque de frente.
A decisão de Guerreiro de Armadura Pesada foi rápida e clara. Atacar a base
inimiga com suas magias esgotadas ou depois de restauradas? Não importava de
como você visse, essa última oferecia uma oportunidade melhor de
sobrevivência.
Lanceiro compreendia isso, e ele sorriu. — Mesmo que estivéssemos prestes a
tocar o céu?
— Se estivermos lá, então é diferente — respondeu Guerreiro de Armadura
Pesada, mostrando os dentes enquanto ria da pergunta despreocupada de
Lanceiro.
— Você é o líder. — Matador de Goblins concordou discretamente. — Seguirei
suas ordens.
— Ótimo. Nesse caso, vamos indo. — Guerreiro de Armadura Pesada estendeu
a mão para mais pitões; Matador de Goblins procurou na bolsa e pegou outro
monte. Ele mantinha bastante com ele porque eram uma ferramenta muito útil, e
graças a isso parecia que provavelmente estava fora de questão eles ficarem sem
para alcançar o cume.
— Seja como for, acho que eles sabem que estamos aqui. Vamos garantir que
eles nos deem uma boas-vindas.
— Certo.
Matador de Goblins deu a sua resposta curta e olhou para o homem na sua frente.
A espada larga enorme nas costas de Guerreiro de Armadura Pesada tremia como
um chocalho. Com um tom imensamente severo e sério, Matador de Goblins
disse: — Não deixe isso cair em mim.
— Ah, fica quieto.
Lanceiro gargalhou sem qualquer malícia e Guerreiro de Armadura Pesada
continuou taciturno a exercitar seus músculos.
O objetivo deles, o topo da torre, não estava longe.
O cume da torre apresentava uma cena quase que indescritível.
Era um espaço aberto com uma depressão como uma tigela redonda, com o
exterior rodeado de pilares. O telhado era uma cúpula curvada, como se um globo
enorme estivesse descendo no espaço. No teto estava um mapa estelar, mas os
seus riscos selvagens não refletiam quaisquer constelações que os aventureiros
conheciam.
O chão e os pilares eram brancos puro, com o céu azul espreitando entre as
colunas. E ainda assim, havia uma opressão esmagadora. Quando Guerreiro de
Armadura Pesada se ergueu pela borda, ele olhou para as constelações e fez um
chiado descontente.
— Isso é com certeza trabalho do Caos. Vamos, e não podemos deixar que nada
nos cause problemas mais tarde.
Ele estendeu a mão enquanto falava, segurando uma luva de couro. Ele ajudou
Matador de Goblins subir, e esse deu uma olhada no ambiente.
— A escalada foi mais fácil do que eu esperava.
— Provavelmente porque somos três caras. — Guerreiro de Armadura Pesada
retirou o anel do dedo e pôs de volta na bolsa de itens. Ele rapidamente o
substituiu por luvas e braçadeiras, e agarrou a espada em suas costas. — Não
gostaria de ter algumas crianças fazendo essa escalada.
— Cara, isso é verdade. — A resposta veio de Lanceiro, que hesitou, franzindo
a testa para a luva de couro que pairava a sua frente. A luva simples e pouco
sofisticada pegou a mão de Lanceiro, puxando o último membro do grupo para
o telhado. — Não gostaria de deixá-la fazer isso. Raios, ela provavelmente não
conseguiria. Sabe, grandes demais.
O comentário grosseiro soou estranhamente inofensivo vindo de Lanceiro,
embora talvez fosse graças a sua personalidade. Guerreiro de Armadura Pesada
lhe lançou um olhar duvidoso enquanto ele fazia um gesto vulgar com as duas
mãos na frente do peito.
— Entendo o que está dizendo — disse Matador de Goblins, com outro aceno
reservado. — Não iria querer cansar a sua retaguarda. E a minha é sensível.
— É isso o que te preocupa? — Lanceiro suspirou profundamente. — Você não
tem outro disco? Os corpos das mulheres devem ser louvados! Bustos! Quadris!
Bundas!
— Qual é o sentido em elogiá-los?
— Amarão você por isso, e ficará popular entre as mulheres!
— Entendi.
Matador de Goblins falhou em levar a conversa mais longe, em vez disso sacou
a espada. Ele verificou a alça do seu escudo, depois girou o pulso direito,
juntamente com a arma na mão. Guerreiro de Armadura Pesada olhou para ele.
— Não usou força demais?
— Estou bem.
— Ótimo. — Guerreiro de Armadura Pesada bateu suavemente no ombro de
Matador de Goblins. — E você?
— Não sou tão frágil quanto isso — sorriu Lanceiro, pegando a lança com as
duas mãos e aplicando uma estocada lúdica.
Para o líder, mostrar que entendia como cada membro estava era uma forma
importante de aliviar qualquer ansiedade por parte do grupo.
E mais ainda antes de uma batalha culminante. Guerreiro de Armadura Pesada
manteve a ponta de sua espada larga em um único ponto do terraço. Ele passou
a língua nos lábios para umedecê-los.
— Vamos começar.
E então, o inimigo estava lá.
Uma sombra agitada no meio do telhado, no fundo da depressão em forma de
tigela. Escuridão se juntou à sombra agitada e crescente. Finalmente, ela formou
um sobretudo antigo, a figura tremulava como uma miragem.
— Mortais tolos…!
A voz rangeu como um galho seco, um som que um humano muito
provavelmente não poderia fazer.
A figura estava torta e distorcida e parecia como se estivesse em um pântano.
Em seus dedos salientes, segurava um cajado que parecia tão velho quanto suas
mãos. Abaixo do casaco, uma chama espiritual queimava. O homem, a imagem
indiscutível de um mago do mal, cuspiu aos aventureiros detestáveis:
— Como detesto quem interfere com meus pla…!
Mas ele foi cortado antes de poder terminar.
Uma espada.
Uma espada tosca e de produção em massa com um tamanho estranho atravessou
o ar e perfurou o peito do mago. Ele gorgolejou, depois caiu no chão agarrando
a garganta.
— Ei, ei, você poderia pelo menos deixá-lo terminar. Não?
— Não há necessidade de termos que confrontá-lo de frente.
Foi Matador de Goblins. De pé ao lado de Lanceiro sorridente, o homem que
lançara a espada pelo ar balançou o capacete de aço de um lado para outro. — E
parecia que ele não era um adversário sério.
De fato.
O mago colapsou com um baque. Enquanto observavam, a espada em seu peito
definhou. Ela se transformou em ferrugem antes que pudessem piscar. Uma mão
esquelética a alcançou, agarrou e a despedaçou.
— O ritual… já está… completo! — berrou ele enquanto arrancava a lâmina
dizimada. Estava bem claro que essa pessoa era um Personagem Que-Não-Reza.
Guerreiro de Armadura Pesada estava com sua espada larga em prontidão e deu
uma olhadela para Matador de Goblins.
— Talvez o apunhalar no peito não foi o melhor plano?
— É mais ou menos a altura da cabeça de um goblin.
Matador de Goblins sacara uma adaga e tomou uma postura baixa.
O fogo espiritual tremeluzia nos olhos do mago enquanto ele avançava.
— Não posso ser morto por aqueles que possuem palavras!
— Vocês o ouviram — disse Lanceiro, quase como se estivesse abafando um
bocejo. — O que vamos fazer?
— Ele disse que não pode ser morto, mas não disse que não pode morrer.
Guerreiro de Armadura Pesada sorriu tanto quanto tinha sorrido quando derrotou
sua primeira barata gigante. Ele assentiu da mesmo forma que Matador de
Goblins fazia quando confrontado por um goblin.
— Então, só há uma coisa a fazer.
Sem qualquer sinal para com o outro, o grupo entrou em formação e se preparou
para a batalha.
O mago começou a gritar verdadeiras palavras sem qualquer hesitação, dobrando
o espaço. Com duas ou três palavras ele invocou uma magia, e o que apareceu
— talvez de se esperar — foram demônios cinzas de pedra. Eles aguardavam
fielmente atrás do seu mestre, e então, com um movimento do seu cajado, eles
se lançaram nos aventureiros.
— Bárbaros malcriados! Cedam perante minha enorme inteligência!
Mas os homens que estavam contra ele eram todos guerreiros e tinham alcançado
o ranque Prata. O trabalho pesado e a perseverança que conduzira a habilidade
de Guerreiro de Armadura Pesada com a espada não era de se desprezar.
— Você esqueceu de “geniais”!
Guerreiro de Armadura Pesada rangeu enquanto avançava para encontrar os
monstros e pará-los da esquerda, direita e meio.
— GARGLEGARGLEGA!!
— GARGLE!! GARGLEGA!!
Quando uma estátua descuidada entrou no seu alcance, ele aproveitou a
oportunidade e a destruiu.
Ele fez uma pose intimidadora. Esse era um homem que não precisava mais do
que uma espada e seu próprio corpo. Seria preciso mais do que números para
intimidá-lo. Com cada brandir de sua espada, poeira tracejava pelo ar como um
estandarte.
— Então morra como bárbaros que são! — gritou o mago, ainda empunhando
seu cajado em segurança atrás das gárgulas.
— Tonitrus… oriens…! Ascenda, trovão!
Invocado pelas palavras de verdadeiro poder, magia começou a jorrar no local.
Não havia vento, contudo, os aventureiros foram atingidos por uma força
avassaladora como uma tempestade iminente.
— “Raio”?! — gritou Lanceiro. Ele viu o que estava acontecendo e ficou atento
pela sua chance. — Eu poderia usar Contramagia… Não, nunca funcionaria!
Sinto muito, rapazes, não consigo fazer isso!
Mas isso vinha, em parte, do reconhecimento de que seu oponente era um usuário
de magia muito mais talentoso do que ele.
— Está bem — assentiu Guerreiro de Armadura Pesada, distribuindo ordens a
um ritmo alucinante enquanto abatia mais uma gárgula. — Tampem a boca!
— Tampem a boca — repetiu Matador de Goblins. Sua adaga já não estava na
mão; ele já estava revirando sua bolsa de itens.
Ele pegou o ovo e lançou em um único movimento. Guerreiro de Armadura
Pesada levantou a gola do casaco.
O ovo fez uma bela parábola no ar, mas o mago o golpeou como uma mosca e
pisou em cima.
— Muito esperto, seu……?!
Instantaneamente, uma névoa vermelha flutuou do seu pé… pó mineral e
pedaços de casca. Uma dor paralisante afligiu sua boca, nariz e olhos. Ele não
conseguia respirar nem falar. Ou, é claro, entoar magia. O mago pressionou as
mãos no rosto e caiu para trás com um grito mudo.
O pó era um gás lacrimogêneo, incluindo cápsico e outros ingredientes. Por mais
avançado que alguém poderia ser em magia, desde que tivesse olhos, nariz e
boca, era difícil de evitar.
— Agora… você… é meu!
Lanceiro não perdeu tempo; ele avançou rapidamente pelo local como uma
flecha de um arco. As gárgulas, encurraladas pelo Guerreiro de Armadura
Pesada, não eram nada para ele. Ele foi direto para o mago, tocando a mão em
seu brinco.
— Aranea… facio… ligator! Aranha, venha e prenda!
— ?!
A “teia de aranha” pegou facilmente o mago agoniado. A chama espiritual do
mago estremeceu, e no momento que aconteceu, a ponta de uma lança perfurou
seu coração.
O sangue que jorrou era preto-azulado. Lanceiro rapidamente deu um chute no
corpo envolto de seda para soltar sua arma e pulou para trás.
Nem era preciso dizer que, como ele havia declarado antes, o mago não mostrou
nenhum sinal de perder a vida com isso. Com sangue negro-azulado escorrendo
de sua boca, ele tentou abrir bem os lábios o suficiente para dizer outra magia.
— Ah, cala a boca.
Lanceiro enrolou o final da teia de aranha na ponta de sua lança e a usou como
uma mordaça. Ele deu de ombros para o mago, que parecia indisposto a desistir,
com sua chama espiritual cintilando com intenção assassina.
— Parece que você não estava brincando quando disse que não podia ser morto.
— Não tem que se preocupar com um mago que não consegue falar — disse
Guerreiro de Armadura Pesada. — Mas é um pouco chato — murmurou ele
enquanto esmagava a última das gárgulas com sua espada larga.
Tudo o que restava era encontrar a fonte de poder do mago, que tinha de estar
em algum lugar da torre, e destruí-la.
Mas, enquanto o mago estivesse vivo, era provável que as armadilhas e os
monstros não parariam de aparecer.
— Humm — grunhiu Guerreiro de Armadura Pesada. Ao lado dele, Matador de
Goblins mantinha sua adaga orientada ao seu cativo, sempre vigilante. Então seu
capacete inclinou um pouco, como se tivesse acabado de pensar em algo.
— Por que não o jogamos?
—…
—…
Guerreiro de Armadura Pesada e Lanceiro trocaram um olhar. Eles assentiram e
depois riram como crianças desobedientes.
— É isso.
— Vamos fazer isso.
O mago, tentando falar com a mordaça na boca, foi arrastado até a beira da torre
e então chutado firmemente pelas costas. A gravidade não teve palavras, mesmo
assim o arrastou para baixo, e logo ele conhecera o mesmo destino dos
aventureiros anteriores.
Em outras palavras, ele morreu facilmente.
— Queria saber por que ele construiu essa torre, no entanto — comentou em voz
alta Lanceiro, espiando de lado para a mancha escura-azulada se propagando no
chão abaixo. Seu tipo geralmente se estabelecia quer na ponta de uma torre ou
nos locais mais profundos de um labirinto subterrâneo. — Poderia ter sido mais
problemático matá-lo se ele estivesse no subsolo.
— Talvez ele tivesse uma ajuda dos deuses ou algo assim — disse Guerreiro de
Armadura Pesada francamente, devolvendo sua espada às costas. Ele ainda
estava observando seu ambiente com cuidado, talvez porque o perigo de
armadilhas e inimigos remanescentes não tivesse diminuído. — Vamos lá, vamos
encontrar o saque. O chefe está morto. Se não nos apressarmos, essa torre pode
desaparecer.
— Ah, sim, é verdade! Uma aventura tem que ter um tesouro!
Lanceiro partiu correndo, com sua alegria lhe dando coragem. Guerreiro de
Armadura Pesada nem sequer considerou detê-lo. Atitude e ações estavam
separadas. Tal como manter a guarda e não ficar nervoso eram coisas diferentes.
— Ele é muito bom nisso.
— Sim. — Matador de Goblins assentiu, pegando a espada arruinada de
ferrugem e estalou a língua enquanto a jogava fora. — Há muitas coisas que eu
poderia aprender dele.
— Não sei dizer se está brincando ou não.
Enquanto Guerreiro de Armadura Pesada considerava se ria, ele e Matador de
Goblins partiram na busca. Eles estavam procurando por saque, baús, efeitos;
qualquer coisa desse tipo. Para um aventureiro, não havia alegria maior.
Em pouco tempo, eles descobriram um baú de estoque de carvalho vermelho em
um canto do terraço.
— Essa não é a minha classe principal. Não esperem muito — avisou a eles
Matador de Goblins, depois se ajoelhou diante do baú. Ele olhou em sua bolsa
de itens e pegou várias ferramentas especializadas. Primeiro, ele pegou uma lima
parecida com uma lâmina fina e a moveu sob a tampa do baú, procurando algo.
Ele confirmou que não havia armadilhas, então segurou um espelho perto do
buraco da fechadura e olhou para dentro.
Agora era a hora do arame. Matador de Goblins se preparou para abrir a
fechadura.
— Ei, Matador de Goblins. Pense sobre isso: você não apanhou um único vilão
hoje. — Lanceiro sorriu enquanto observava o fazer de Matador de Goblins sobre
seus ombros. — Significando…
— O quê?
— Que eu venci!
— Sim — Matador de Goblins não fez qualquer esforço para refutar, apenas
concordou. — De verdade.
Lanceiro levou seu punho ao alto com um “Simmm!” comemorativo. Guerreiro
de Armadura Pesada olhou para o céu.
— Porque não eram goblins.
Na sua euforia, Lanceiro pareceu não escutar o murmúrio, mas Guerreiro de
Armadura Pesada certamente o ouviu.
Por fim, a fechadura abriu com um clique, e Matador de Goblins expirou:
— É um pouco tarde para mencionar isso, mas provavelmente vai haver alvoroço
quando voltarmos.
— Hã? …Ah, sua garota elfa? — Guerreiro de Armadura Pesada pensou na
estourada e masculina elfa do grupo de Matador de Goblins.
Acho que meio que deixamos ela de fora.
— Acho que vou ter mais problemas ainda — disse Lanceiro. — Mas não se
preocupe. É tradição ter pouca emoção enquanto se divide o saque e bebe um
pouco de vinho.
— …Se bem me lembro, dissemos que haveria três partes, menos para as
despesas.
— Sim — disse Matador de Goblins — creio que sim. — Depois ele acrescentou
com uma voz desapaixonada: — Tesouro, hein? Nada mal.
Guerreiro de Armadura Pesada colocou uma mão amiga em seu ombro. Matador
de Goblins aceitou em silêncio. A tampa do baú rangeu quando ele a levantou.
Capítulo 7: Da Segunda Vez Que
os Planos do Necromante Foram
Frustrados
— Fwaaaah!
Quando a heroína acordou com o sol da manhã, em uma cama na pousada, ela
esticou os braços vigorosamente. O céu do lado de fora estava azul, e ela se sentia
enérgica, forte e pronta para sair.
— Certo! Hoje é mais um dia para dar tudo de mim!
Ela se energizou com um tapa rápido em cada bochecha, então usou essa energia
para se levantar da cama.
Isso era importante, porque a luz calorosa do sol estava tão confortável que a
fazia querer voltar para debaixo das cobertas. Mas seria bastante indulgente
desperdiçar um dia tão bonito por dormir demais.
Ela se vestiu rapidamente. Seu corpo ainda era jovem, mas tinha as curvas de
uma mulher amadurecendo. Pensando em que estava por vir mais tarde naquele
dia, ela se assegurou de usar sua armadura. Por último, ela pegou a espada
encantada, sua fiel companheira, e ela estava pronta. Era preciso se equipar tanto
com armas quanto armaduras, ou não havia sentido.
— Bom diiiia, pessoal!
Ela abriu a porta e correu pelo corredor, indo agilmente do átrio até o primeiro
andar.
Por sorte, em razão de estar cedo, não havia muitas pessoas ainda na taverna. A
única pessoa ao vê-la quando ela chegou silenciosamente foi uma garçonete de
olhos grandes no turno da manhã.
Mestre da Espada — seu companheiro, que já havia levantado e comido mais
cedo o café da manhã — deu um suspiro pouco surpreso. — …Olhe para você,
toda animada e disposta depois de uma noite de sono. O que você é, uma criança?
— Hã? Isso não é normal? — Heroína se sentou de frente para Mestre da Espada
com sua cabeça inclinada, balançando as pernas. Ela logo pegou um pouco de
pão do cesto no meio da mesa, passando um pouco de manteiga e enfiando na
boca.
Hmm, delicioso!
— Oh, vou pedir… Vejamos. Eu quero salsicha e ovo frito!
— S-sim, madame. Agora mesmo!
— Ah, e pão! Com bastante manteiga!
A garçonete observou em transe esse comportamento audacioso, depois correu
para a cozinha.
— Hum? O nosso terceiro ainda está dormindo?
— As coisas duraram até tarde da noite passada.
Mestre da Espada bateu na mão de Heroína, que estava estendendo a mão para
outro pedaço de pão, e olhou para os quartos no segundo andar. Ele parecia
preocupado com Sábia, que não havia acordado ainda.
— Bem, havia um monte deles!
— E o nosso grupo não tem a capacidade de usar Dissipar.
Isso significava que não podiam retornar fantasmas e mortos-vivos à terra. Em
consequência, eles tiveram que cortar a cabeça do exército de Necromante,
literalmente. Se o rei não tivesse pegado o grosso das forças inimigas, teria sido
muito difícil.
— Seria tão bom se eu pudesse simplesmente limpar o caminho todo até o
horizonte com um golpe!
— Pare com isso. Se pudesse fazer isso, seria terrivelmente perigoso.
— Acha?
Enquanto ela murmurava “Sério…?” e balançava as pernas, Heroína passava
sinceramente a impressão de uma garotinha. Mestre da Espada achou difícil de
acreditar que ela era a heroína, no melhor sentido. Tudo o que ele fazia era
manejar uma espada, mas ele queria ajudá-la se pudesse.
— Ah, ei, eu tive um sonho estranho.
— Um sonho?
— É. Os deuses, sabe? Eles estavam como: Vá para aquela cidade.
Mestre da Espada parou por um momento quando ela disse isso. Ele não tinha
conhecimento de tais magias ou segredos divinos. Sua compreensão se estendia
à “mate isso, apunhale aquilo”.
— …Isso é um Oráculo, uma ajuda.
A voz suave veio de cima.
Uma garota com um sobretudo segurando um cajado desceu pelas escadas,
esfregando os olhos. Sábia, uma das maiores conjuradoras desse mundo.
— Bom dia! — Heroína acenou para ela, e Sábia respondeu com um aceno de
cabeça. Ela puxou uma cadeira e se sentou. Heroína entrecerrou os olhos de
felicidade com a visão familiar dos três ao redor da mesa.
— …Que tipo de cidade?
— Hmm. Será que eles estavam tendo um festival? Havia essa… espécie de luz
esquisita.
— Isso é tudo?
— E havia essa grande tempestade, tipo bruah! Talvez tivesse sido um gigante?
— …Eu tenho um palpite.
Sábia murmurou uma ou duas palavras para criar uma magia e retirou um velino
arredondado do nada. Mestre da Espada não tinha ideia do que estava
acontecendo, mas ela ocasionalmente fazia coisas assim. Esticado na mesa,
acabou por ser um mapa da fronteira. Sábia apontou para um certo lugar com a
ponta do seu cajado.
— …Aqui.
— Muuuuito bem!
Heroína formou um punho justo quando a garçonete chegou com sua comida,
dizendo “desculpe pela demora”.
— Quer alguma coisa? — perguntou Mestre da Espada, e Sábia respondeu
sucintamente:
— Um omelete.
Heroína riu enquanto ela colocava molho de tomate generosamente em seu ovo
frito.
— Acho que já sabemos onde a nossa próxima aventura será!
Era certo: aventuras ocorriam por todo o lado nesse mundo.
Capítulo 8: Do Dia Sossegado
de Uma Elfa
— Hrrm…?
O sol estava bem alto no céu quando seus raios entraram pela janela e atingiram
os olhos de Alta-Elfa Arqueira. Ela estava nua, enrolada na cama sob um único
cobertor, e assim ela enfiou o rosto no travesseiro em uma breve demonstração
de resistência. Mas a luz do sol era terrivelmente brilhante, não podendo ser
derrotada simplesmente por cobrir o rosto.
Rapidamente cedendo, a elfa bocejou com um gato — fwaah — e fez um bom
alongamento em seu corpo magro.
— Faah… oooh… já é de manhã?
O sol estava alto demais para a manhã. Era quase meio-dia.
Alta-Elfa Arqueira, esfregando os olhos e olhando pela janela, se sentou de
pernas cruzadas na cama.
— Ooo…
Ela esfregava o cabelo desgrenhado enquanto murmurava palavras sem sentido.
Como se recordava, ela tinha o dia de folga. Ao menos, se ninguém veio acordá-
la, isso significava que não havia aventura.
Aquele Orcbolg… ele fora sozinho, todo goblins, goblins como sempre.
Ela não tinha realmente certeza sobre o incidente recente. Ela não conseguia
acreditar em uma batalha com um mago maligno no topo de uma torre.
Seja como for, isso de certo é diferente da floresta.
No mínimo, o fato de que podia dormir até ao meio-dia a fazia feliz por ter
deixado a floresta.
Ela bocejou outra vez, então começou a coçar sua barriga e umbigo
saudavelmente firmes. O comportamento dos alto-elfos era conhecido pelo seu
requinte, mas havia limites.
Alta-Elfa Arqueira esticou as pernas em direção ao chão, que estava tão
bagunçado de itens e pertences que quase não havia nenhum lugar para colocar
os pés. As pontas de seus pés encontraram seu amado arco grande. Ela reatou a
corda frouxa, depois a puxou com delicadeza para checar. Ela deveria mudá-la
mais cedo ou mais tarde.
— Hmm, tinha certeza de que estava por aqui… Ah, aí está você.
Ela se estendeu pela cama e esticou os braços para o chão.
Ela pegou uma pequena aranha do tamanho da ponta de um dedo. Ela estivera
perambulando em cima de suas perneiras no chão.
Alta-Elfa Arqueira tocou seu dedo esbelto na traseira da aranha e deu um puxão,
e um fio prateado atravessou o ar. Ela estava literalmente tecendo seda. E não
seda de aranha grudenta, mas de simples aranhas amáveis usadas por elas para
se caminhar. Ela fez isso duas ou três vezes, até que tivesse o comprimento de
fio que queria, ao que suas orelhas balançaram.
— Isso basta, eu acho. Obrigada!
Ela soltou a aranha e começou a torcer o fio. A seda de aranha era leve, mas mais
forte que fio de aço de mesma espessura. O material perfeito para uma corda de
arco. Passado um tempo, a elfa enrolou as cordas. Ela as passou para lá e para cá
pelos dedos, de uma extremidade à outra.
Convencida de que não havia problemas, ela balançou as orelhas de satisfação.
— Lá vamos nós.
Ela enrolou a corda com uma volta e saltou da cama ao chão. Sendo cuidadosa
para não pisar nos livros emprestados e brinquedos que comprou, mas não
reconhecia realmente, ela se esforçou para chegar à sala.
Ela agarrou seu traje de caçadora, o colando descuidadamente.
Hoje era seu dia de folga. Ela não precisava de seu casaco nem nada. Ainda que
uma espada curta pudesse ser conveniente…
Ela era magra e elegante; ela tinha uma pele tão branca que era quase translucida
e pouca carne extra em seus ossos. Combinado com seu peito plano, ela tinha a
beleza de uma estátua.
Em beleza, ao menos, os elfos da floresta não se contentavam com o segundo
lugar competindo com qualquer outra raça. Talvez a razão pela qual se
escondiam sob roupas eram porque viam seu próprio tom claro como
simplesmente normal.
— ~♪
Assobiando desafinada, Alta-Elfa Arqueira entrelaçou seu cabelo. Ela afastou de
lado gentilmente seus cabelos soltos de seus ombros e bochechas, e quando ela
se virou para trás, seu quarto bagunçado lhe saudou.
De certa forma, o caos era compreensível no quarto de um aventureiro. Mas era
difícil de acreditar que esse era o quarto de uma jovem mulher e ainda elfa.
Equipamentos estavam jogados ao redor, roupas descartadas caídas por toda a
parte e pratos vazios amontoados descuidadamente. Romances de aventuras e
livros de teatro estavam abertos, enquanto brinquedos comprados nos festivais
do templo estavam espalhados. Seria mais fácil acreditar que esse era um quarto
de criança.
Como é que tantas coisas cabiam em tal espaço relativamente pequeno? Era um
grande enigma que mesmo os elfos, com todos os seus conhecimentos, não
poderiam desvendar.
— Hmm — Alta-Elfa Arqueira cruzou os braços com seriedade e examinou o
quarto, então moveu suas orelhas para cima e para baixo e assentiu como se
estivesse de acordo com algo. — É melhor eu lavar algumas roupas.
***
Ela adicionou raspas de sabão juntamente com suas roupas em um balde cheio
de água do poço, depois colocou seus pés.
— Oooh… A água do subsolo é fria, não é?
Seu corpo e suas orelhas estremeceram, e ela começou a pisar em suas roupas.
Ela estava certa: ela nunca poderia imaginar isso em sua casa na floresta. Lá,
seria uma simples questão de colocar suas roupas no rio e pedir que as ondinas
ou espíritos da água lavarem para você. As tarefas domésticas eram deixadas
para os duendes. O mundo humano era terrivelmente incômodo, pensou ela.
Mas deixando isso de lado, ela gostava de pisotear, basicamente brincando na
água.
Atrás da Guilda havia um poço que também servia como um lugar para lavar
roupa.
A luz quente do sol da manhã que já se foi, se espalhava. Ao longe, ela podia
ouvir crianças correndo e donas de casa conversando. Os preparativos do almoço
deviam estar em curso, pois um aroma tentador flutuava da cozinha da taverna.
Alta-Elfa Arqueira adorava essa hora. De alguma forma tinha um cheiro
diferente das manhãs, noites e dias habituais da cidade de quando ela partia em
uma aventura. Ela não sabia exatamente que cheiro era, e ela podia estar
imaginando isso. Ela achava uma curiosidade saudável muito positiva em si e
nos outros, mas algumas coisas não deveriam ser muito minuciosamente
investigadas.
— Bwaaah…
Ela deu um bom bocejo. Não importava o quanto você dormia, em dias como
esses nunca era o bastante. Entretanto, os elfos tinham todo o tempo do mundo.
Desperdiçar um pouco disso não faria nenhum mal.
É uma pena, no entanto.
Coisas interessantes, coisas que chamavam sua atenção; se ela tirasse os olhos
delas só por um instante, de repente elas desapareceriam.
Alta-Elfa Arqueira continuou pisoteando as roupas ao lavar, dando outro grande
bocejo e saindo de cima do balde. Então ela espremeu suas roupas bem
pisoteadas e as balançou para a esquerda e para a direita com um paf.
— Muitas coisas interessantes em que pensar, de fato.
Como o cheiro delicado do sabão. A brisa que ela podia sentir através de sua
roupa molhada. A luz do sol.
Apreciando todas essas coisas, Alta-Elfa Arqueira pendurou suas roupas no varal
da área de lavar. Ela se lembrou muito bem de quando as pendurou
descuidadamente e ficaram amarrotadas, então se assegurou de colocá-las o mais
justo possível. Por alguma razão, era incomodo quando eram apanhadas pelo
vento e voavam no chão, então ela as prendeu firmemente com pregadores.
— Feito e feito!
Ela pendurou a última roupa cuidadosamente, depois balançou satisfeita suas
orelhas. Ela limpou a testa, embora não estivesse suada, pôs as mãos na cintura
e olhou para as roupas. As roupas balançavam com o vento como a bandeira de
um exército no topo de uma fortaleza conquistada.
— Lavando roupas? Se não é uma trabalhadora…
Alta-Elfa Arqueira se virou para a voz atrás de si com uma fungada orgulhosa.
Em geral, elfos sabiam quem vinha sem olhar. Mas até mesmo eles podiam ser
surpreendidos às vezes. Para toda regra há exceções.
— Oh, Garota da Guilda. Como vai?
— Estou tirando o dia de folga, então só estava andando.
A recepcionista usava roupas normais. Foi um pouco chocante, já que Alta-Elfa
Arqueira estava tão acostumada a vê-la com seu uniforme, mas claro, até Garota
da Guilda tinha outras roupas. Como qualquer um.
Ela usava um vestido de verão claro. Não tinha mangas, o que mostrava os
adoráveis traços dos seus braços desde os ombros até suas unhas feitas
cuidadosamente. Ele combinava bem nela e provavelmente permitia uma brisa
refrescante passar levemente. Seu corpo bem-formado era presumivelmente o
resultado dos seus esforços feito todos os dias. Poderia ser chamado
tranquilamente de ideal.
— Ele faz você parecer uma sílfide, de certa forma.
Garota da Guilda sorriu, agradecida com isso. — Eu comprei porque era para ser
a última moda na Capital.
Então era isso. Alta-Elfa Arqueira assentiu. Sem dúvida parecia uma boa roupa
para passear. Contudo, a moda humana mudava em um ritmo tão frenético que
ela achava difícil de acompanhar…
Me pergunto como eles aparecem com tantas coisas em um único ano.
Uma coisa era certa: o mundo humano nunca ficava chato.
— Mas o que está fazendo na Guilda?
Era seu dia de folga. Garota da Guilda evitou, de repente, os olhos da Alta-Elfa
Arqueira com a pergunta inocente. Seu olhar se moveu de um lugar para outro.
— …Só porque… Pensei em talvez me assegurar de que nossos aventureiros
tivessem voltado bem para casa.
— Hum! — Alta-Elfa Arqueira riu, sem refletir profundamente sobre essa
resposta. — Isso que é dedicação!
— Bem, sabe como é… — disse Garota da Guilda ambiguamente. — Então,
como está indo, lavando a roupa?
— Contemple o fruto do meu trabalho. — Alta-Elfa Arqueira estufou
orgulhosamente seu pequeno peito. — O que me diz?
Não era como se ela tivesse usado uma habilidade especial. Era apenas roupas
para lavar. Não era algo para se gabar, mas Garota da Guilda sorriu mesmo assim.
— Você já ficou bem acostumada em fazer isso, não é? — comentou ela.
— Acho que sim. Consigo lidar com isso muito facilmente — respondeu Alta-
Elfa Arqueira.
— Oh… Nenhuma roupa íntima?
—?
Garota da Guilda ficou com as tranças sacudindo enquanto inclinava confusa a
cabeça
Alta-Elfa Arqueira respondeu prontamente: — Não tenho nenhuma.
— Ah, está dizendo que essa já é a segunda vez que lava?
— Não — respondeu ela balançando enfaticamente a cabeça. Por que ela não
entendeu? — Eu não tenho nenhuma.
— …Pensei que todas escolhemos algumas juntas há algum tempo.
— Eu meio que as enterrei…
—…
Garota da Guilda colocou a mão na testa e olhou para o chão apenas o tempo
suficiente para Alta-Elfa Arqueira ficar ligeiramente desconfiada. E quando
Garota da Guilda olhou de novo para cima…
— Vamos comprar algumas então… Sim, vamos fazer isso.
Havia aquele sorriso estampado.
— Hã? Mas… Sinceramente, pode ser meio chato…
— Vamos.
E para o aventureiro recusar uma oferta de uma empregada da Guilda era
simplesmente impossível.
***
— Arrgh… Ei, tenho mesmo que vestir isso?
— Sim, tem!
Alta-Elfa Arqueira colocou a cabeça do lado de fora do provador só para se
deparar com o dedo de Garota da Guilda em seu rosto.
Garota da Guilda pegara a elfa pela gola e arrastou-a até a loja da cidade.
Essa poderia ser uma área subdesenvolvida na fronteira, mas mesmo aqui havia
um alfaiate.
— Apesar de que, se tratando da moda mais recente na Capital, você teria mais
sorte nessa loja.
Pode não se comparar a cidade da água, mas mais itens passavam por aqui.
Assim Garota da Guilda disse e estufou seu peito bem-formado, mas Alta-Elfa
Arqueira não entendeu. A moda mudava com uma velocidade tão ofuscante, que
talvez apenas os humanos pudessem acompanhar.
— E mais — disse Garota da Guilda balançando seu dedo — a aparência é
importante para os aventureiros.
— É?
— Se os aventureiros de níveis alto não se destacam, isso diminui a qualidade
geral de todos os nossos aventureiros.
Aventureiros eram conhecidos por uma impressão particular, como: rufiões com
armas e armaduras. O Estado pode ter estabelecido à Guilda a ajuda para
controlar os aventureiros, mas a opinião pública não era tão gentil. Não existia a
necessidade de roupas extravagantes, mas uma aparência bem-cuidada era
importante.
Não era por Alta-Elfa Arqueira não entender a lógica. Ela entendia, e ainda
assim…
— É? — disse ela com uma sacudida descontente com as orelhas. — Tente dizer
isso a ele.
— Acha que ele iria ouvir? — ripostou Garota da Guilda com um sorriso largo.
— …Não — disse Alta-Elfa Arqueira, voltando emburrada ao provador. Em suas
mãos estava uma lingerie fina e sem mangas, que ia até a barriga.
— Mas tenho altas expectativas em ti, sabe.
— Altas expectativas?
— Elfos tem naturalmente uma pele tão bonita… vocês provavelmente nem
precisam se cuidar.
— Não tenho certeza disso…
Não obstante, Alta-Elfa Arqueira fez um grunhido evasivo e se apertou na roupa
íntima. Ela não conseguia se acostumar com a sensação de que ficava presa ao
seu peito liso.
— Eu prometi ajudar a nossa amiguinha a escolher algumas roupas íntimas
também. — Só por um momento, Garota da Guilda pareceu dar uma olhadela
por trás de seu sorriso tenso. — Somos todas garotas, certo? Vocês podem ser
aventureiras, e equipamentos devem ser mais importantes que a moda, mas… —
As orelhas de Alta-Elfa Arqueira captaram as últimas palavras quando ela
murmurou: — Mas somos todas garotas, certo?
Não havia nada crítico ou repreensivo em seu tom. Talvez ela não estivesse em
posição para fazer tal coisa. Alta-Elfa Arqueira não sabia. Mas mesmo que não
entendesse, ela sabia que Garota da Guilda estava tomando conta delas do jeito
dela.
Ela é uma boa pessoa. Eu acho.
— Mesmo assim…
Seja como for. Roupa íntima ajuda a absorver suor e coisas assim, mas…
Ela agarrara uma única peça de roupa fina, um triângulo ao contrário. A cor da
parte superior e inferior, é claro, combinavam.
…Não acho que essa coisa possa servir muito.
Ela segurou a coisa em sua mão, a esticando e examinando enquanto dizia: —
Por que vestiria isso?
— Como assim, por quê?
— Digo, não é como se alguém fosse ver. Para quem você iria mostrar?
Ela podia sentir Garota da Guilda se enrijecendo do outro lado da cortina do
provador.
— Hum? — disse Alta-Elfa Arqueira, surpresa, com a cabeça
inclinada. Aparentemente ela perguntara uma coisa que não deveria.
— É-é meio que uma preparação para… para quando chegar a hora de mostrar
para alguém. Roupa íntima é o último trunfo de uma garota — disse Garota da
Guilda enquanto continuava gentil como sempre.
— É isso mesmo? — perguntou Alta-Elfa Arqueira sem pensar, ao que Garota
da Guilda disse rapidamente:
— Sim, é.
Hmm…
Era difícil para ela imaginar que tal peça de roupa fina e de aparência duvidosa
fosse tudo isso.
Talvez Garota da Guilda pudesse sentir Alta-Elfa Arqueira refletindo sobre isso,
pois ela murmurou: — Ah, bem. Não precisa se forçar a comprar isso agora ou
qualquer coisa assim, mas devia pensar nisso.
— Claro, eu irei.
Alta-Elfa Arqueira arrancou as roupas que estivera provando sem qualquer
arrependimento. Então ela pegou suas próprias roupas, que estavam espalhadas
no chão, e as vestiu o mais rápido que podia. Do outro lado da cortina, ela pôde
ouvir Garota da Guilda exclamar “Q-quê?” quando a lingerie veio voando.
— Se você colocar roupas por cima delas e depois tentar se mover, parece que
elas ficam meio que… esponjosas e barulhentas. — Alta-Elfa Arqueira saiu do
provador, de volta ao seu traje habitual, e olhou nos olhos de Garota da Guilda.
Ela estava pegando as roupas que a elfa havia arremessado no chão. Alta-Elfa
Arqueira sorriu sem malícia, como um gato. — Prefiro fazer algo divertido. Ei,
quer jogar um jogo?
***
— Um jogo de mesa?
— Correto. Eu descobri há pouco tempo.
Assim elas chegaram à taverna da Guilda algum tempo depois.
Garçonete Felpubro lhes deu uma pequena saudação, e Alta-Elfa Arqueira puxou
a cadeira de uma das mesas.
Garota da Guilda trazia uma caixa comprida e achatada, envolto em um pano cor
de cobre. Ela abriu a janela e soprou um pouco de poeira. Na tampa havia o
padrão como uma cobra sinuosa.
— Você move peões, rola dados e age como um aventureiro… Ao menos, acho
que é assim que funciona.
— Então… você finge ser um aventureiro?
— Mais ou menos.
Quando elas abriram a tampa da caixa, encontraram vários livros velhos de
velino, juntamente com um grupo de peões e dados enfiados cuidadosamente.
Alta-Elfa Arqueira pegou um dos bonecos na mão e examinou. Ele tinha uma
base circular: um cavaleiro usando armadura azul de placa. Talvez fosse feito de
metal, pois pesava. Esse boneco segurava um estandarte com um símbolo ômega,
brandia uma boa lâmina de aço e gritava pelo fim do Caos. Um paladino, sem
dúvida.
— Isso é um belo artesanato.
— Há um monte de cenários também. Desde salvar o mundo, e bem, matar
goblins.
Alta-Elfa Arqueira riu com as palavras matar goblins. Suas orelhas balançaram
alegremente.
— Aposto que acabaria mal bem rápido se fizéssemos Orcbolg jogá-lo… Ei,
posso te fazer uma pergunta?
— O quê?
— Qual é o sentido disso?
Garota da Guilda foi deixada pestanejando com a pergunta súbita. Alta-Elfa
Arqueira viu sua confusão e balançou as mãos freneticamente.
— Desculpe, não interprete errado. Quero dizer literalmente.
— Ah, entendi… Hmm. — Perdida em pensamentos, Garota da Guilda parecia
bastante com a mesma de sempre, apesar de estar sem uniforme. — Acho que
você pode usá-lo para determinar o seu papel e ações antes de prosseguir em uma
aventura, de certa forma.
A pausa mental fez Alta-Elfa Arqueira dar um risinho e Garota da Guilda coçar
a bochecha.
— Mas eu nunca fiz isso antes — disse a elfa.
— É preciso esforço e tempo, e é claro que precisa de jogadores suficientes.
Além disso, muita gente não consegue ler.
— Hmm…
Ela acrescentou que, embora o jogo estivesse disponível, era raramente usado.
Isso era compreensível para Alta-Elfa Arqueira. Ela colocou o paladino
cuidadosamente de volta na caixa. — Tenho certeza de que não seria o suficiente
para garantir uma aventura tranquila.
— De fato. É completamente diferente da realidade, isso é certo.
Enquanto falava, Garota da Guilda esticou a mão de novo até a caixa e pegou
uma peça. Era aparentemente um guerreiro de armadura leve, usando armadura
de couro e segurando uma adaga em prontidão. Possivelmente um batedor.
— Mas talvez… seja o suficiente. — Ela tocou seu rosto suavemente com o dedo,
sorrindo timidamente. — Você poderia dar as boas-vindas aos aventureiros que
salvaram o mundo. Não é bem uma fantasia ou um sonho… — Ela falou
discretamente, quase como se escondendo algum embaraço.
Eu entendo. A garota elfa balançou suas orelhas longas suavemente e sorriu. Ela
podia entender. Embora estivesse no lado a ser bem-vinda em vez de dar boas-
vindas.
— Ei, me ensine a jogar — disse ela, retirando o paladino da caixa.
É. Eu gosto do rosto dela.
— Apenas veja. Eu salvarei todos os mundos que você quiser!
E então Alta-Elfa Arqueira procedeu em falha. Não só ela não derrotou o mago
imortal, como ela sequer chegou ao mausoléu labiríntico. Achar a entrada repleta
de miasma do túmulo não era para heróis imaturos.
Salvar o mundo se revelou uma tarefa hercúlea, mesmo quando o mundo era um
jogo de tabuleiro.
***
— Ahh, cara! Que horrível!
A taverna a noite era barulhenta, e assim ninguém ouviu a exclamação de Alta-
Elfa Arqueira. Às vezes aventuras iam bem, às vezes não. Às vezes a melhor
coisa a se fazer era ignorar alguém.
— Eu juro que havia algo errado lá! Como pode um dragão vir batendo asas do
céu?!
— Isso era o que estava nos materiais, então é assim que as coisas aconteceram.
Quando a elfa se esticou sobre a mesa e bateu na madeira, Garota da Guilda
respondeu com um sorriso desajeitado.
Depois disso, o mundo fora extremamente destruído várias vezes. Apesar da
inclusão de Inspetora, bem como Sacerdotisa e Vaqueira que apareceram no bar,
a paz no mundo parecia um objetivo distante.
— “Assim que as coisas aconteceram”? Inaceitável. — A elfa de dois mil anos
fez beicinho como uma criança.
— Você acha?
— Sim, acho que poderíamos ter feito algo mais. Tenho certeza — queixou-se
ela, agitando seu copo cheio de vinho tinto.
— Talvez sim — disse Garota da Guilda assentindo com moderação, puxando a
comida das gotas de vinho que espirravam na mesa. — Parte do interessante nos
jogos de mesa é ver o que as pessoas inventam.
E ela tinha que admitir que o cenário fora um pouco exagerado.
Com essas palavras, Alta-Elfa Arqueira virou a cabeça na mesa para encarar
Garota da Guilda.
— …Na verdade, não acha que é meio que um desperdício?
— Desperdício?
— Ou… indulgente. Vocês mal vivem cem anos, não é?
Não obstante do necromante ocasional.
Alta-Elfa Arqueira mexeu suas orelhas, fazendo um círculo no ar com a ponta do
dedo.
— Usar esse tempo escasso se preocupando com o futuro… parece um
desperdício.
— Está dizendo que devíamos aproveitar o momento? — perguntou Garota da
Guilda, suas tranças deslizaram quando inclinou a cabeça.
— É — respondeu Alta-Elfa Arqueira com uma risada. — É o privilégio dos
mortais rir ou chorar, ficar com raiva ou fazer alvoroço sobre o que aconteceu
hoje. Se preocupar com o que acontece em cem ou duzentos anos… isso é coisa
nossa.
— Não sei.
— Um alto-elfo disse isso. Deve ser verdade!
A resposta de Alta-Elfa Arqueira foi acompanhada de uma fungada orgulhosa
enquanto estufava com confiança seu peito pequeno. Ela estava longe se ser a
imagem de um alto-elfo nobre instando um humano a ser mais ponderado. Mas
a verdade era que ela mesma sentia que precisava de tudo o que tinha para
resolver o que estava bem na sua frente dia após dia.
Garota da Guilda riu, e um sorriso veio ao seu rosto, não aquele sorriso artificial,
mas um completamente natural. Ao ver isso, Alta-Elfa Arqueira, muito satisfeita
com o que conseguira, entrecerrou os olhos como um gato e sorriu.
— Bem, já que estamos aqui… Com licença!
— Sim!
Com Garota da Guilda ainda sorrindo, ela chamou Garçonete Felpubro e pediu
outra garrafa de vinho. Ela não era hedonista, mas isso era especial. Por que não
beber algo bom?
Ela estourou a rolha, apreciando o aroma do álcool, então despejou com
generosidade no copo de Garota da Guilda e ao seu mesmo. Alta-Elfa Arqueira
pegou seu copo, com os olhos brilhando como se nunca tivesse visto um antes, e
Garota da Guilda fez o mesmo.
— …Muito bem. Aqui está pela aventura fracassada de hoje.
— Um fracasso que não vou esquecer mesmo que viva cem anos!
Saúde! Seus copos tilintaram com som musical.
Capítulo 9: Dos Três, Alguns
Meses Atrás
A palavra taverna podia significar muitas coisas. Nem todos esses lugares eram
ligados à Guilda dos Aventureiros.
Vague pela cidade e encontrará várias, com quadros de avisos e luzes brilhantes.
Elas normalmente tinham estalagens anexadas, e por vezes os aventureiros só
desejavam uma mudança de ares. Esses eram lugares onde aventureiros podiam
facilmente aparecer, comer e beber tanto quanto quisessem, e depois sair para
cidade.
Em uma dessas tavernas, um menestrel dedilhou seu instrumento e começou a
cantar:
Quantas vezes nos encontramos e separamos?
O que importa, proclamou você, é o que está no coração
Sem ninguém para gostar, elas vêm e vão
Até que viste aquela coisa fofa um dia; oh-ho!
Seja você um senhor ou um espião,
Você não sabe o nome dela, mas você aprecia os olhos dela
Você exerce sua conversa mole, mas passa pela porta da taverna
Você percebe tarde demais: ela já se foi
Quantas vezes nos encontramos e separamos?
Uma reunião, uma despedida, um coração partido…
— Muito bem então. Acho que temos um grupo, ei, Escamoso?
— Ha-ha-ha. Ainda que eu desejasse um guerreiro e um batedor.
Sentados bem adentro da taverna aconchegante, dois aventureiros conversavam
afavelmente e riam.
Um era um anão, que acariciava sua barba branca, batia em sua barriga redonda
e se servia de vinho e comida. E do outro lado dele estava um homem-lagarto,
comendo com as próprias mãos, com seu corpo grande e escamoso sentado em
um barril de vinho. Eles bebiam o vinho que lhes foi trazido como água, de uma
forma que ultrapassava o saudável e já era quase festivo.
— Um bloqueador, um patrulheiro, um sacerdote-guerreiro e um mago. Eu diria
que temos uma boa combinação.
— De fato.
Lagarto Sacerdote deu uma dentada na perna de javali que segurava com as duas
mãos, enquanto Anão Xamã lambia um pouco de vinho que derramara na ponta
de sua barba. Ele despejou vinho da garrafa em seu copo com um glub, glub,
depois sorveu o que transbordava. Ele bebeu o vinho em um só gole e soltou um
arroto.
— Não é o suficiente na linha de frente, não é o bastante na retaguarda, conexões
insuficientes para obter equipamentos e itens… Reclame de tudo e depois não
terá mais nada para reclamar.
— Acontece, acontece — disse Lagarto Sacerdote, batendo a cauda no chão. —
Um grupo com três usuários de magia é certamente abençoado.
— Tenho que admitir, é um bocado surpreendente.
— Você quer dizer…?
— Você. — O anão com o rosto vermelho empurrou seu copo vazio em direção
ao Lagarto Sacerdote. — A princípio… achei que não ia se interessar em fazer
grupo com outro clérigo.
— Ha-ha-ha-ha-ha-ha! Oh, mestre conjurador. Nunca sei o que vai dizer a seguir.
— Lagarto Sacerdote riu deliberadamente. Terminado com a carne, ele roeu o
osso da perna, dando uma demonstração feroz de seus dentes. — Todos os nossos
semelhantes vieram do pó do mar, então não há por que para mim ficar chateado
por um descendente dos ratos nos conduzir. — Talvez o álcool estivesse
acabando, pois Anão Xamã parecia enfadado enquanto Lagarto Sacerdote
revirava os olhos triunfantemente. — Brincadeira, brincadeira.
— Receio não conseguir achar engraçado — disse Anão Xamã, mandando
embora a indiferença do lagarto.
— Bem, cada um tem sua própria crença. Se alguém optasse por discutir sempre
que houvesse uma diferença, não haveria fim.
— Mas hereges e seguidores do Caos são diferentes, não…?
— Isso não é argumento. Eles devem ser mortos até que não restem nenhum.
A cabeça de Lagarto Sacerdote balançou com a maior severidade; era difícil dizer
quão sério ele estava sendo.
Anão Xamã empurrou seu prato vazio, agarrando uma atendente para pedir um
pouco de carne, e repousou o queixo nas mãos.
— Só por curiosidade, ouvi rumores sobre os homens-lagarto. Eles são todos
canhotos, ou que seus corações estão na direita. Algo disso é verdade?
— Hmm. Não posso falar quanto a localização do meu coração, mas quanto as
minhas mãos, diria que sou ambidestro. — A ideia de que todos os homens-
lagarto eram canhotos porque a mão esquerda de um deus os criara era,
aparentemente, um absurdo.
Lagarto Sacerdote abriu significativamente ambas as mãos garradas. Então
sacudiu a língua como se tivesse acabado de pensar em algo.
— Ouvi dizer que anões podem flutuar, de vez em quando.
— Se tivermos vinho, não há nada que não possamos fazer. Vinho e boa comida!
Anão Xamã disse a mesma coisa de vários meses antes e sorriu.
— Se tiver vinho, não há nada que não possa fazer. Vinho e boa comida!
Tal como muitos grupos de aventureiros, eles foram criados na taverna. No
começo, contudo, era apenas três pessoas, e antes disso, apenas uma.
O vento soprava ao longo do canal, tornando o ar refrescante enquanto entrava
pela porta. Era o anoitecer, e a taverna da cidade da água estava viva com os sons
de vozes fazendo brindes.
— Mas, meu honorável tio! Não acha que é demais para pedir, mesmo ao seu
sobrinho?
Anão Xamã soou muito descontente. Ele cruzou os braços com firmeza e virou
as costas.
Em frente a ele estava um anão com mais músculos, mais barba e mais rugas do
que ele, bebendo cerveja com uma expressão fixa. No seu banco havia um
martelo de guerra bem-usado, juntamente com um gancho. Ele era um quebra-
escudos. O rosto sombrio do anão veterano, com o aroma da cerveja flutuando
na frente dele, mostrava com eloquência a seriedade da situação.
— Mesmo assim, escute. Nesse momento, você é o único quem posso chamar.
— Mas até mesmo para você, querido tio; simplesmente não há nada a se fazer
sobre isso. — Anão Xamã bebeu sua cerveja e fixou seu tio com os olhos meio
fechados.
O rosto do anão tinha ainda mais rugas do que antes, e estava começando a ficar
careca. Ele estava realmente envelhecendo. Era compreensível: um dos jovens
de sua tribo partira em busca de magia e agora estava agindo como um rufião.
Mesmo assim… isso!
— Ir em uma aventura com um elfo? — disse Anão Xamã. — Um escolhido
provavelmente pelo seu líder, rei, ou seja lá quem?
— Provavelmente.
— Alto, características chamativas, nobre demais; quase que uma beleza
reluzente, e, oh, tão frágil.
— Muito provavelmente.
— Ainda um orador elegante, um poeta excelente, e os deuses lhe deram o dom
de arquearia?
— Bem, ainda não os conheci…
— Baaah! — Absolutamente impossível, sem chance! Anão Xamã balançou as
mãos calejadas enfaticamente. Ele não estava brincando. — Não conseguiria
respirar junto de alguém assim. Eu morreria de asfixia!
— Ouça, seu egoísta…
— Disse que o mundo está em perigo? Estou mais do que disposta a ajudar…
mas não com um elfo!
Então aconteceu. Uma xícara veio girando pelo ar, jorrando vinho, e acertou a
parte de trás da cabeça do tio de Anão Xamã.
— Ei! Diga isso de novo!
De trás de seu tio, que agora estava de bruços na mesa e esfregando a cabeça,
veio uma voz clara e tonificada. Anão Xamã olhou para cima e viu uma elfa de
olhos afiados, com as mãos na cintura em uma postura imponente. Ela era de fato
delicada, esbelta e de aparência modesta; e ela usava um traje justo de caçador,
com as orelhas balançando energicamente. Alguém não teria adivinhado isso
pelo seu tom de voz, mas suas orelhas, mais longas do que as de outros elfos,
eram a prova de que ela era descendente dos antigos alto-elfos.
Esperando um combate, Anão Xamã agarrou seu machado, mais do que feliz em
participar, mas um felpubro com rosto de cachorro disse: — Eu vou dizer quantas
vezes você quiser!
A pelugem do felpubro era difícil de se dizer, mas a julgar pelo peito extenso,
provavelmente era uma mulher. E sua voz rouca, mas aguda, a fazia parecer que
fosse, em termos humanos, só uma adolescente. Provavelmente não uma
aventureira. Ela estava em boa forma física, seus movimentos eram precisos;
sinal de treinamento adequado. Uma soldada, muito provavelmente. Ela limpou
o vinho que escorria de sua cabeça e bufou.
— Elfos só ficam escondido em suas florestas, ignorando tudo e a todos… e
ainda por cima são avarentos!
— Vou te mostrar a verdade sobre os elfos!
Alta-Elfa Arqueira ronronou como um gato e se lançou contra a soldada com
cara de cachorro. A mesa caiu com o impacto, copos de vinho voaram e pratos
viraram. Os bêbados que se reuniam na taverna abriram caminho para a cena
familiar e começaram a fazer apostas.
— Meu dinheiro vai para a elfa. — Não, na felpubro. — Mas elfos são muito
frágeis. — É, mas felpubros são bastante estúpidos…
— …Que problemático. — Oof, essa doeu. Anão Xamã deu de ombros para seu
tio, que esfregava a cabeça e gemia.
— Bastante incomum, para um elfo.
— …Se importaria se teu companheiro fosse alguém como ela?
— Hmm, bom. Não creio que os alto-arrogantes do reino élfico escolheria
alguém tão imprudente…
Enquanto murmurava, Anão Xamã esticou a mão em um prato. Ele pegou uma
mão cheia de feijões secos, não obstante do vinho espirrado sobre eles, os
colocou na boca e mastigou ruidosamente.
Ao lado dele, seu tio deu um suspiro. — Eles já fizeram a sua escolha — disse
ele. — E escolheram ela.
— O que disse?
— Olhe para a descrição pessoal.
Seu tio pegou um pedaço de papel amassado de sua bolsa e entregou. Anão Xamã
o abriu com os dedos grossos e ágeis, depois segurou no alto e olhou para a luta.
— Ahh… essa tábua…?
Se os elfos altivos a escolheram, não havia razões para duvidar de suas
habilidades.
Os elfos eram ressentidos com os anões, mas ao mesmo tempo, eles odiavam
mais do que qualquer coisa que os anões se ressentiam com eles.
Mas essa é só uma garotinha, ou eu sou um barril.
Ela estava gritando insultos para a soldada com focinho de cachorro, as duas
puxavam o cabelo — e pelo — uma da outra. Os elfos não consideravam
exatamente a idade insignificante, mas ele se perguntava se ela tinha pelo menos
cem anos de idade.
— Ainda assim… — Com mais ou menos dez anos (ou cem), essa era a elfa que
iria ser sua companheira de viagem. — …Acho que quebraríamos alguma coisa
tentando tirá-la dessa luta.
Enquanto afagava a barba e considerava o que fazer, os olhos de Anão Xamã
foram atraídos para a porta da taverna.
Uma sombra enorme se aproximava.
Era enorme. Grande como uma rocha. Seus movimentos amplos eram tão
grandes quanto suas mandíbulas.
Mas então, de onde eram essas roupas? Ah, sim. Do sul nemoroso.
O homem-lagarto deu uma olhada no bafafá e revirou os olhos. Ele entrou na
taverna com um andar arrastado e foi para o balcão, alheio ao olhar dos que o
rodeavam. Ele não tentou se sentar na cadeira, talvez devido ao seu tamanho
enorme ou por causa da cauda que arrastava.
— Mil desculpas, mas gostaria de esperar por alguém. Como não sei quando
chegarão, talvez fique esperando por um tempo.
Sua voz era rígida como uma pedra. Era impressionante como a língua longa
dentro de suas mandíbulas exercia a língua comum tão facilmente.
— Uh, claro — disse o dono da taverna com um aceno desajeitado.
O lagarto respondeu “esplêndido”, também assentindo. — Aguardo um anão e
um elfo. Se algum de seus aventureiros se encaixar nessa descrição, talvez possa
me avisar.
Ouvindo isso, Anão Xamã olhou para seu tio, que disse calmamente: — Ouvi
que um homem-lagarto nos emprestaria sua força. — Parecia que ele mesmo não
conseguia acreditar nisso.
— Como agora, querido tio? Não conhece seu rosto?
— Mesmo que eles me dessem uma descrição, não conseguiria distinguir um
homem-lagarto de outro.
— Imagino que não.
Os homens-lagarto, que se proclamavam descendentes dos temíveis nagas que
saíram do mar, eram os guerreiros mais poderosos encontrados no mundo.
Eles eram oponentes que faziam o sangue gelar. Eles matavam seus inimigos,
massacravam, comiam seus corações. Alguns os desprezavam como bárbaros, e
havia de fato — então era dito — que alguns se aliavam com as forças do Caos.
Apesar disso, esse estava presumivelmente do lado da Ordem.
Mesmo assim…
— Ahh, e uma refeição, se puder fazer a gentileza. — O lagarto sacerdote
levantou o dedo escamoso. Ele continuou de pé no balcão; provavelmente a sua
cauda atrapalhou quando tentou se sentar. Quando seus olhos giraram e suas
mandíbulas abriram, sua observação pareceu alegre. — Lamentavelmente, eu
não trago dinheiro, por isso gostaria de retribuir com trabalho; lavando pratos ou
cortando lenha. Não se importa?
Anão Xamã riu de repente. Tomou um gole de vinho, bateu em sua barriga e deu
uma boa e bela risada. Ele riu até que o lagarto sacerdote virou seu longo pescoço
para olhar de uma forma estranha, e então o anão deu outro gole no vinho.
— Ei, Escamoso! — chamou ele o homem-lagarto. Ele tossiu, depois limpou o
vinho de sua barba com a mão. — Vê aquela garota orelhuda lutando ali? Pegue
ela pela nuca e traga até aqui, pode ser?
Anão Xamã riu tranquilamente, apontando para a elfa, que estava se balançando
em cima da felpubro, alheia aos acontecimentos ao seu redor. No momento, a
felpubro a pegou pelos cabelos e rolava com ela para uma nova posição. Mãos,
pés e unhas se moviam por todo o lugar. Sua dignidade élfica desaparecera. Ela
agora era apenas uma criança brigando.
— Faça isso e eu te recompensarei com todo o vinho e carne que quiser.
— Oh-ho! — A cauda de Lagarto Sacerdote acertou o chão com uma poderosa
bofetada. O dono da taverna franziu a testa; tal como o tio de Anão Xamã. —
Muito bem, então irei. Me considere agradecido. Ah, virtude gera virtude.
Imediatamente Lagarto Sacerdote, cauda e tudo mais, saltou para a luta com uma
velocidade que desmentia seu tamanho. Ao lado de Anão Xamã, sorrindo para a
anarquia na taverna, seu tio gemeu. Ele parecia ter uma dor de estômago. Nem
mesmo um bocado de vinho não parecia lhe fazer bem.
Por fim, o homem que fora um quebra-escudos no exército anão por mais de dez
anos, disse: — …Se me dá licença, voltarei para minha unidade. — Ele deixou
um punhado de peças de ouro na mesa e pulou instavelmente da cadeira
construída para a altura de um humano.
Ele não conseguia decidir se era sensato deixar o destino de sua raça nas mãos
desse grupo; incluindo seu sobrinho.
Oh, às ordens dos deuses…
Enquanto ele se afastava da taverna, a cabeço do velho quebra-escudos foi
preenchida com o som de dados rolando.
— …Quecêquer?
Seu cabelo estava bagunçado, suas roupas sujas, suas bochechas um pouco
inchadas, e ela estava de costas para ele com uma expressão de desgosto. Anão
Xamã acabou por dar um sorriso alegre com o primeiro som da boca da alta-elfa.
— Quem, eu? Pensei que podíamos falar de trabalho. — Ele sorriu e esfregou as
mãos grossas, fsh-fsh-fsh.
Se ela pudesse se sentar de frente para mim como uma adulta, eu poderia achar
que ela estivesse me ouvindo.
As brigas nessa taverna deveriam ser tão comuns quanto pão e manteiga, porque
o ambiente já havia relaxado de novo, e as conversas e brincadeiras voltaram à
vida.
A felpubro bastante machucada estava sentada em um canto, parecia infeliz e
estava rasgando um pedaço de carne. Com a luta sendo extinguida, os antigos
apostadores logo se acomodaram de volta.
— Hum. Nesse caso, tem algo de extrema importância que devo perguntar
primeiro.
A ordem restaurada na taverna foi em parte graças à rápida intervenção do
homem-lagarto, que agora usava um barril de vinho no lugar de uma cadeira.
Fora uma bela visão vê-lo pegar a elfa e a felpubro pela nuca e separá-las, mas
também foi um resultado que ninguém apostara. Assim, só o agente de apostas
teve lucro, e o rhea deu voltas pelo bar balançando alegremente seu vinho.
— E o que é, Escamoso?
Lagarto Sacerdote deu um “hmm” e acenou com a cabeça seriamente. —
Poderíamos talvez considerar nossas despesas com comida serem separadas da
recompensa nessa missão?
— Mas é claro — disse Anão Xamã dando um puxão em sua barba e sorrindo.
— Vamos mandar a conta para meu honorável tio.
— Agradeço imensamente — disse Lagarto Sacerdote, depois abriu amplamente
as mandíbulas e as enfiou em um pedaço de carne com osso que estava na mesa.
Alta-Elfa Arqueira observou eles, ainda estufando um pouco as bochechas. —
Então — murmurou ela — qual é o trabalho? Não que ainda não tenha ouvido o
básico.
— Ah, sim, sobre isso. — Anão Xamã assentiu, pegou um copo e bebeu. Então
usou o recipiente vazio para empurrar de lado alguns pratos e abrir espaço para
si. — Você sabe sobre a batalha que está acontecendo na Capital com o Senhor
Demônio ou seja lá o quê?
Foi uma pergunta retórica. Ele pegou um pergaminho de sua bolsa e abriu na
mesa. Fora desenhado com pigmentos de casca. A imagem abstrata, porém
precisa, o assinalava como um mapa élfico. Ele representava uma construção
antiga, bem no meio de uma terra devastada.
— Um conselho de guerra estava prestes a ser convocado, mas então descobriram
que havia um grupo de goblins vivendo bem atrás dela.
— Um ninho de goblin, não é assim que se chama?
— Sim, e um bastante grande também.
Aqui. Alta-Elfa Arqueira olhou para onde Anão Xamã estava apontando e
pestanejou. Ela olhou para o símbolo no antigo edifício no meio da terra
devastada, depois para a floresta enorme não muito longe dela.
— Ei… essa é a minha casa!
— Hm. Isso explicaria por que você está aqui…
Lagarto Sacerdote mordiscou mais carne do osso, mastigou várias vezes e
engoliu antes de falar.
— …É isso que chamam de política?
— Sim. — Anão Xamã assentiu com firmeza. Bem, isso era uma bela confusão.
Um dos seus membros estava aqui para satisfazer a honra de alguém. Ele sentia
problemas à frente. — Meu tio pode pensar que é insensato, mas não podemos
deixar os humanos sentados enquanto nossos exércitos são os únicos que se
mobilizam.
— E nem rheas e felpubros?
As orelhas de Alta-Elfa Arqueira se contraíram com a menção do povo fera. A
soldada com rosto de cachorro que ela estivera brigando fora subjugada por um
oficial superior que veio correndo. Enquanto o oficial puxava o rosto grande da
soldada, a elfa se perguntava se tal tratamento era uma ocorrência diária, ou se o
povo cachorro simplesmente, pela sua natureza, achava difícil ir contra seus
superiores.
Em todo o caso, a cidade da água era uma cidade linda, mas eles não se sentiam
ameaçados.
— Acho que não podemos esperar mais do que alguns voluntários deles.
Havia rheas individuais de grande coragem, mas isso não se estendia aos seus
clãs ou seus administradores. No fundo, eles adoravam a paz e a tranquilidade, e
não tinham qualquer interesse em nada que não dissesse respeito a sua terra natal
diretamente.
Os felpubros eram felpubros; eles eram tão diversificados que era difícil unir
todos eles rapidamente atrás de qualquer causa. Quando se juntavam,
dependendo de qual tribo assumia a liderança, as coisas podiam dar muito bem
ou muito mal. Isso era verdade mesmo quanto ao despertar do Senhor Demônio
e a guerra posterior contra todos os que possuíam palavras do continente. Claro,
se o perigo aumentasse demais, eles iriam se unir e se insurgiriam por si
mesmos…
— Nosso outro problema é: precisamos que um humano se junte a nós.
— Ah! Conheço um muito bom. — Alta-Elfa Arqueira tirou os olhos do mapa.
Ela esticou seu dedo indicador longo e fino, fazendo um círculo no ar. — Ele se
chama Orcbolg. Um guerreiro que mata goblins na fronteira.
— O que, você quer dizer Corta-barba?
— Correto. Vocês anões podem não saber, mas nesse momento, há uma canção
muito popular sobre ele se espalhando.
Ela na verdade não sabia se a canção era popular ou não, mas ela precisava de
uma chance para parecer inteligente.
O Rei Goblin perdeu a cabeça para um Golpe Crítico dos mais terríveis!
Um azul escaldante, o aço de Matador de Goblins cintila no fogo.
Assim, o plano repugnante do Rei chegava ao seu fim apropriado, e a adorável
princesa alcançou seu salvador, seu amigo.
Mas ele é Matador de Goblins! Em nenhum lugar ele permanece, mas jurou
vagar, não deve ter outro ao seu lado.
Fora apenas o ar ao seu alcance que a grata donzela encontrou… o herói tinha
partido, sim, sem olhar para trás.
Quando terminou de cantarolar a melodia, ela fez um barulho orgulhosa e estufou
o pequeno peito.
— Você não sabe porque estava vivendo literalmente em uma caverna. Isso é
anões para você.
— Uma coisa boa para dizer vindo de alguém que fica escondido em sua floresta.
Anão Xamã lhe deu um olhar austero enquanto ela balançava as orelhas de
autossatisfação.
Suponho que apenas metade dessa canção é verdade. Esse sempre era o melhor
parecer a se ter sobre as melodias de um bardo.
— Mas, ahh, ahem.
Essa elfa de orelhas longas deveria ser uma patrulheira ou uma batedora. O
homem-lagarto era um sacerdote… uma espécie de monge-guerreiro, muito
provavelmente. Ele mesmo sabia magia, é claro, e ele também entendia de como
manejar uma arma. Mas eles não tinham combatentes o suficiente.
Ele não podia ter certeza até que visse o homem, mas esse era alguém que tinha
uma música escrita sobre ele. Era razoável presumir que ele tivesse uma boa
quantidade de habilidade.
— …Está bom o bastante.
— A recompensa será dividida igualmente, então. Também estamos acordados
em assumir que meu senhor Matador de Goblins se juntará a nós?
Lagarto Sacerdote olhou revirando os olhos para o grupo. Tanto Anão Xamã
quanto Alta-Elfa Arqueira concordaram.
Com isso, o homem-lagarto disse “então vamos planejar” e tocou a ponta do
nariz com a língua.
— Primeiro essa cidade — disse Anão Xamã, lançando os olhos no mapa. — Em
que cidade disse que ele estava?
— Bem, hum, eu perguntei ao bardo, e… — O dedo pálido de Alta-Elfa Arqueira
passou pelo mapa élfico. Por fim, ela encontrou a cidade fronteiriça, e bateu no
local com a unha bem-cuidada. — Talvez por aqui?
— Isso não está muito longe. Porém… mesmo assim. — Lagarto Sacerdote
parecia extremamente sério enquanto olhava o mapa. — Estamos à procura de
frustrar os planos de nosso inimigo. Creio que possamos assumir que isso
provocará uma retaliação.
— Hum? Podemos ser atacados no meio de uma aventurar, você quer dizer?
— Vamos resolver isso agora para evitar essa possibilidade. Antes que eles
tenham a chance de consolidar suas forças.
— Deixe tudo conosco! — Bop. Alta-Elfa Arqueira formou um punho e bateu
com fervor em seu pequeno peito. — O destino do mundo está por um fio? É aí
que os aventureiros fazem o seu melhor!
— Ei, então — disse Anão Xamã, arregalando os olhos. — Sabe que isso não é
uma brincadeira, não é?
— Claro que sim. Eu não sei quanto aos anões, mas os elfos sempre usaram seus
arcos para manter o mundo seguro.
— Oh-ho. Não me diga. — Os olhos do conjurador se alargaram só um pouco;
ele deu um puxão na abarba e suspirou. — Então esse seu peito de tábua não
interfere em nada quando atira de arco?
— Tábua?
— É rígido… e liso.
— Ora, seu…!
A vergonha e a raiva enviaram sangue para as bochechas da arqueira. Houve um
barulho quando ela se levantou da cadeira e colocou as mãos na mesa enquanto
se inclinava.
— Mas que coragem! Isso quando vocês anões… uhh, hum… — Ela ficou ali,
com sua boca abrindo e fechando. Suas orelhas balançavam para cima e para
baixo, e a ponta de seu dedo traçou um caminho sem objetivo no ar. — C-certo!
Essas barrigas! Seus estômagos fariam um tambor parecer pequeno!
— Quero que saiba que dizemos que é ser solidamente constituído! Um anão
prefere esse tipo de corpo… — Anão Xamã se cortou sugestivamente, depois
olhou de soslaio para a elfa. — …Independentemente do que vocês elfos devam
gostar.
Alta-Elfa Arqueira não poderia deixar de notar o olhar em seu peito. Ela cruzou
os braços bufando deliberadamente, deixando seu desgosto evidente.
— Sempre soube que anões tinham um sendo de beleza distorcido!
— Quem é que vem comprar os nossos trabalhos em metal? Ah, certo. Elfos.
— E daí?!
E eles começaram a discutir. As outras pessoas na taverna observaram essa
rivalidade antiga entre as raças desenrolar diante de seus olhos. Mas, a atmosfera
logo mudou. Brigas e discussões vendiam às dúzias.
— Cinco pratas no anão!
— Uma peça de ouro na elfa!
— Vamos, garota!
— Espanque bem ela, velhote!
Lagarto Sacerdote balançou a cabeça e suspirou. Depois deu um grande sibilo.
Com o sentimento avassalador de um réptil na caça, os dois aventureiros calaram
a boca. Lagarto Sacerdote assentiu.
— Hm.
Ótimo.
A carruagem deixou o portão, envolto pela noite. A essa hora, ninguém além de
aventureiros teriam achado mais seguro viajar em uma caravana ou algo
parecido. Mas os três não tinham tempo, e eles foram forçados de mais de uma
forma.
O veículo que estavam não era um muito bom, era apenas um de carga
ligeiramente modificado. E o cavalo era apenas mediano… bem, talvez um
pouco abaixo da média. Anão Xamã e Lagarto Sacerdote tinham as rédeas. Alta-
Elfa Arqueira estava observando o céu, com seu arco preparado.
Viajar de carruagem significava ir mais rápido do que uma pessoa podia andar,
mas mais lento do que um cavalo podia correr. Anão Xamã não estava satisfeito
com essa situação. Ele queria ter obtido a melhor carona e o melhor cavalo
possível, para não falar do condutor. Mas os fundos que recebera de seu tio eram
limitados, assim como o tempo. Ele foi obrigado a ceder.
— E ainda por cima temos que ir devagar. Que desgraça.
— Tenha em mente que não temos o luxo de mudar de cavalo em um dos postos
intermediários. — Sentado ao lado dele no assento do condutor, Lagarto
Sacerdote respondeu o comentário cauteloso de Anão Xamã. — E se considerar
o problema que teríamos se corrêssemos e assim atraíssemos atenção indesejada,
dessa forma é de fato mais rápida.
— Atenção indesejada? — Alta-Elfa Arqueira inclinou a cabeça, agitando a
ponta de suas orelhas em direção ao assento do cocheiro.
— Bandidos ou salteadores, suponho.
— Certo…
Seu rosto franziu com a resposta, como se achasse isso muito desagradável. Anão
Xamã captou a demonstração clara de emoção com sua visão periférica e fez um
som de aborrecimento.
— Estivemos bem de alguma forma na cidade, pelos auspícios daquela adorável
senhora, mas agora estamos em campos aberto.
— Assim que nos afastarmos do santuário do Deus Supremo, pode ser só uma
questão de tempo até que algum espírito mau decida atacar — disse Lagarto
Sacerdote.
— Está falando daquilo que chamam de benção de deus? Nosso deus da ferraria
e do aço só é bom para encorajar em batalha… — Não obstante, Anão Xamã
murmurou uma oração ao grande deus Krome. Ele soltou os ombros e balançou
a cabeça, dizendo sem malícia: — Preciso ao menos rezar para que a nossa elfa
não perca a coragem quando for preciso.
— Hum…! — As orelhas da elfa dificilmente poderia deixar passar esse
comentário desagradável. — Apenas veja! Você vai se curvar para me agradecer
quando isso acabar!
— Ahh, claro. Não posso dizer que estou muito esperançoso. — Ele agitou sua
mão aberta. Alta-Elfa Arqueira bufou furiosa e rolou de costas. Anão Xamã
apanhou a dica dela, olhando para o céu. Estava cheio de estrelas e com as duas
luas. As estrelas brilhavam como se alguém tivesse espalhado joias preciosas
sobre o veludo preto. As luas brilhavam como um par de olhos, verdes e frios.
Talvez fosse o verão que se aproximava que dava ao ar sua lentura incomum e
fazia difícil respirar.
— Eu poderia fazer com facilidade… — murmurou Alta-Elfa Arqueira. Anão
Xamã sentia o mesmo, embora não tenha dito nada.
Seu grupo chegou a um pedaço abandonado de terra que parecia alguma vez ter
sido uma aldeia. A estrutura sombria das casas sob a luz da lua lançava sombras
repulsivas nas ruas. Esse cadáver em forma de aldeia se tornara ermo, deixado à
proliferação; teria parecido desolada mesmo à luz do dia. Mas agora, à noite, não
seria surpreendente encontrar fantasmas ou carniçais ali…
— Hr-ah?
Alta-Elfa Arqueira fez um som estranho. Ela olhou sobre os ombros, com seu
nariz cocegando.
— O que foi agora? Parou para cheirar as flores ou algo assim? Hã?
— Ah, pare. Há um cheiro estranho… — Ela balançou a mão na frente do nariz,
lançando uma olhadela ao redor da área com uma expressão de profunda
suspeita. — É… meio forte e meio irritadiço… E posso sentir embora não haja
vento algum.
— …Enxofre, muito provavelmente.
— Isso é enxofre?
— Algum tipo de vapor misturado com enxofre, para ser mais preciso.
O que isso significava não passou por eles. Eles se calaram e engoliram em seco
coletivamente. A elfa olhou para cima, com uma expressão preocupada no rosto.
— Em cima de nós!
Parecia mais como uma máquina do que um ser vivo, com carne na forma de um
inseto artificial. Seu corpo era vermelho, e a cabeça pontuda como se estivesse
usando um chapéu. Algo vermelho.
Ele batia asas que lembravam as de morcegos, e garras curvas e cruéis eram
visíveis em suas mãos.
Um demônio inferior. E havia dois deles. Isso foi um encontro aleatório.
— Eles estão vindo?! — gritou Anão Xamã, chicoteando com as rédeas e
instando o cavalo a seguir. O animal relinchou, tendo sentido coisas que não
eram desse mundo. As rodas da carruagem começaram a girar a sério quando o
cavalo partiu com toda força.
— Faça ele ir mais rápido…! Não, me dê as rédeas. Você prepara suas magias!
— Todas sua!
Praticamente jogando as rédeas em Lagarto Sacerdote, Anão Xamã se virou no
seu assento. Ele foi cuidadoso, é claro, para segurar firme a alça de sua bolsa de
catalisadores em seu ombro para que não voasse.
— Não podemos fugir? — disse Alta-Elfa Arqueira, lambendo os lábios
enquanto seu arco lançava flecha atrás de outra.
— Não sei quanto a isso, mas… — disse Anão Xamã.
— Não podemos arriscar da informação escapar — disse Lagarto Sacerdote
acenando com a cabeça tão calmamente quanto se estivesse preparando jantar.
— Temos que matá-los.
Os demônios pareciam ter a mesma ideia. Com uma rajada de ar, um deles
mergulhou na carruagem. Enquanto alguém gritava que a iniciativa fora tomada,
houve uma colisão, e lascas de madeira voaram.
O demônio atingira a carruagem por trás, com suas garras tão mortais quanto
qualquer arma.
— Ergh! Pfah! — Anão Xamã retirou pedaços da carruagem de sua barba e
berrou: — Se você destruir essa coisa, nós seremos aqueles que arcaram com a
culpa!
— Vou cuidar da segurança do cavalo, então, se fizer a gentileza… — respondeu
Lagarto Sacerdote.
O próximo ataque veio do céu enquanto conversavam.
Um mergulho veloz, com as asas dobradas. Alta-Elfa Arqueira franziu a testa; a
criatura estava com uma lua nas costas. Suas orelhas tremeram, e ela puxou a
corda.
— Seu estúpido, fedorento…!
— AAARREMMEERRRR?!?!
Um grito de outro mundo se seguiu. Alta-Elfa Arqueira não perderia a chance
para disparar. O demônio, agora com sua mão pregada no transporte pela flecha,
se contorceu, destruindo a madeira com as garras.
— Isso vai te mostrar!
A última coisa que o demônio viu foi uma elfa puxando o arco bem na sua frente,
com a flecha com a ponta de broto.
A corda fez um som que seria apropriado a um instrumento musical de alta
qualidade; ela lançou a flecha no globo ocular do demônio e através de seu
cérebro. O pescoço da criatura quebrou para trás com a força do golpe. O cadáver
pendeu flacidamente, raspando pelo chão. Alta-Elfa Arqueira deu um sorriso de
apreço pelo trabalho feito. — Esse já era!
— Bom trabalho! Mas como ele é uma espécie de fardo, talvez você pudesse
soltá-lo de nossa carruagem?
— Sim, claro… guh, o quê?
No espaço de alguns instantes, vários fios de cabelo de Alta-Elfa Arqueira foram
apanhados por uma garra e lançados dançando pelo ar. O monstro que viera
correndo desferiu uma pancada em sua nuca. Alta-Elfa Arqueira parou,
tremendo, ainda segurando a haste da flecha que puxara. Ao mesmo tempo, o
demônio morto deslizou no chão, quicando com um baque.
— Teve um pequeno susto aí?
— Não estou com medo, estou com raiva!
Ela se enfureceu com a provocação de Anão Xamã, que estava com a mão
preparada na bolsa de catalisadores o tempo todo, depois olhou para o céu. Com
um corpo de demônio a menos a bordo, a velocidade estava aumentando de novo;
mas não seria páreo para uma criatura com asas.
— Ei, anão! — gritou Alta-Elfa Arqueira sem tirar os olhos do céu. — Você não
pode usar uma magia para derrubá-lo ou algo assim?
— Acho que poderia, de certa forma… — Ele fechou um dos olhos e olhou para
cima, avaliando a velocidade e a distância entre ele e o inimigo. A cortina da
noite era impotente face a luz das luas e das estrelas, e, de qualquer forma, anões
podiam ver com facilidade pela escuridão. — É só que se eu o derrubar com uma
magia, ele simplesmente se ergueria de novo.
— O quê?! Mas que conjurador! Estúpido, anão estúpido!
— Ah, para de chorar — disse friamente Anão Xamã, franzindo a testa. — Eles
não se movem com as mesmas leis que nós. Aço e ferro são as formas de lidar
com eles.
— Fisicamente, você quer dizer. Muito bem dito! — Segurando as rédeas,
Lagarto Sacerdote curvou suas imensas mandíbulas em um sorriso que lembrava
tanto quanto o de um tubarão. Ele pareceu fazer alguns cálculos rápidos, depois
assentiu com satisfação. — Mestre conjurador, você disse que pode derrubá-lo?
— Acho que sim — assentiu Anão Xamã. — Embora não por muito tempo.
— Então mestra patrulheira, finja gentilmente que vai dar um belo disparo…
— Consigo fazer!
Sem esperar ouvir o resto do plano, Alta-Elfa Arqueira lançou uma flecha na
noite. Era potente como magia, uma flecha que só um elfo podia disparar, mas o
demônio ziguezagueou agilmente do caminho.
— Ah, droga! — Alta-Elfa Arqueira estalou a língua e ajeitou uma nova flecha
no arco, puxando a corda.
— Bem, então — disse Lagarto Sacerdote, puxando as rédeas para retardar o
cavalo. — Talvez possa fazer a gentileza de perfurá-lo com uma flecha com uma
corda amarrada?
— Uma flecha com uma corda amarrada…?! — Alta-Elfa Arqueira pegou a
corda que fora jogada na plataforma de carga, com o rosto inexpressivo enquanto
olhava para o inimigo. O monstro de pele vermelha continuou batendo as asas,
procurando a sua oportunidade para ir até eles. — Beleza, vou fazer!
Tão logo falou e já começou a amarar a corda na flecha. Os dedos da elfa não
tiveram problemas, mesmo em cima de uma carruagem agitada. Ela manteve
seus olhos e ouvidos no oponente, com suas mãos se movendo como se houvesse
outra pessoa as controlando. Sua expressão relaxou. — Você parece um general
ou algo parecido — disse ela.
— Você é muito gentil. — Lagarto Sacerdote balançou bem sua cabeça. — Se
quiser me comparar com alguma coisa, sou como a pena de uma flecha. Só defino
a direção, eu não… — Antes de continuar, sua língua saiu e tocou a ponta do
nariz. — Hm — disse ele por um tempo. — Para ter uma unidade funcional, é
preciso juntar uma ponta de flecha, uma haste, uma pena, um arco e um arqueiro.
Ahh. Alta-Elfa Arqueira sorriu ligeiramente. Essa era uma metáfora que ela
podia entender. — Me pergunto se isso me faria a ponta… Vamos, anão, tenha
certeza de que a magia acerte o alvo!
— Hmph! Já estou farto de te ouvir!
Quando Anão Xamã retorquiu para Alta-Elfa Arqueira e colocou o inimigo no
campo de visão, ele viu algo: uma única luz vermelha no céu. Estava ardendo na
boca grande e aberta do demônio…
— Seta de Fogo vindo!
— Ahh, agora! — disse Lagarto Sacerdote com alegria sincera, dando uma
sacudida forte nas rédeas. O cavalo deu um relincho horrível de confusão e medo,
e a carruagem guinou em uma nova direção, rangendo o tempo todo.
Segundos depois, um feixe de fogo atingiu o lugar onde a carruagem estaria, com
brasa voando pelo céu. A luz brilhante iluminou o semblante terrível de Lagarto
Sacerdote.
— Ha-ha-ha-ha-ha-ha-haaaa! Agora as coisas ficaram interessantes!
— Acho que você confundiu nossa carruagem com uma biga, Escamoso!
— De fato — respondeu o lagarto, provocando um “maluco…” de Anão Xamã
enquanto olhava para o céu.
O demônio vermelho parecia se preparar para outro mergulho, agora que eles
evadiram sua seta de fogo, marca registrada.
Acha que vai ser assim tão fácil, é?
Anão Xamã berrou para a sombra que ficava cada vez maior:
— Pixies, pixies, rápido e depressa! Sem doces para vocês, travessuras é o que
preciso!
Palavras cheias de verdadeiro poder para dobrar a realidade jorraram, e o círculo
mágico apanhou em cheio o demônio.
Normalmente, a criatura nunca deveria ser capaz de escapar dos grilhões da
gravidade, não importando quanto batesse suas asas. Demônios inferiores ainda
eram demônios; esses monstros viviam para distorcer a ordem natural.
— ARREMERRRERRRR!!
O demônio, que caiu na terra, uivou e bateu as asas vigorosamente, quebrando
os vínculos mágicos que o segurava. Ele teria a sua vingança contra aquele anão,
aquele homem-lagarto e aquela elfa. Só de pensar no sangue de um antigo alto-
elfo, o cheiro de seu fígado, era o suficiente para atiçar a ganância básica da
criatura.
— Tome isso!
Foi uma flecha daquela mesma elfa que pôs um fim agonizante nessa ganância.
Ela se inclinara, se apoiando na beirada da carruagem, e disparou uma única
flecha ponta-broto implacável no monstro.
— AREEERM?!
Se debatendo de tormento, o demônio foi um pouco lento em notar a corda
amarrada à flecha. E esse foi o tempo necessário que a carruagem precisou para
ganhar velocidade e puxar a corda tensa.
Um rugido horrível de desespero, o suficiente para fazer o sangue gelar, ecoou
pela planície.
O demônio estava longe de imaginar que seria arrastado pelo chão atrás da
carruagem. Havia uma certa pena dele enquanto quicava, contida pelo grupo
enquanto ele se bagunçava na terra e tentava voar desesperadamente.
Demônios inferiores ainda eram fortes. Se o trio não conseguisse controlar a
posição dele, ele poderia rapidamente fincar as garras na terra, e se ele se
levantasse, seria apenas questão de pouco tempo para estar no ar. E uma vez no
ar, seria perigoso.
— E agora?! — gritou Alta-Elfa Arqueira, pegando outra flecha de sua aljava.
Lagarto Sacerdote se levantou com facilidade. — Daremos o golpe final, é claro.
— Ele segurou um dos seus catalisadores, uma presa, entre as palmas. — Ó asas
falciformes de velociraptor, rasgue e dilacere, voe e cace! — Uma grande
Garraespada surgiu e então se modelou em suas mãos.
— E o cavalo?! — Mas quando Alta-Elfa Arqueira olhou para trás, ela viu um
Guerreiro Dragãodente agarrando firmemente as rédeas.
— Espera um pouco, Escamoso — disse Anão Xamã, com os olhos se
arregalando. — Que história é essa de golpe final? V-você não vai…
— Pular? Não seja tolo. — Lagarto Sacerdote balançou a cabeça com um
movimento considerável. — Isso seria ridículo.
Nos próximos instantes, a carruagem chiou quando Lagarto Sacerdote saltou no
demônio inferior.
— Ó temíveis nagas! Observem minhas ações, meus antepassados!
— AREEERMEER?!?!
Garra, garra, presa, cauda. Ele golpeou, cortou e rasgou o demônio enquanto ele
se esforçava para resistir. A criatura abriu suas mandíbulas para liberar uma seta
de fogo, mas Lagarto Sacerdote uivou… — Grrrryaaahhh! — …e visou um chute
direto em sua garganta, esmagando sua traqueia. E então sua Garraespada
alcançou a cabeça do demônio, a cortando sem esforço.
A cabeça rolou pelo chão e desapareceu na grama. O resto do corpo, ainda preso
à carruagem, traçava um jato de sangue roxo-azulado. Lagarto Sacerdote, em
cima do cadáver, estava bastante calmo apesar da quantidade crescente de sangue
o cobrindo; ele ergueu a cabeça alegremente.
— Ahh, eu fiz por merecer o mérito desse dia.
O sol começara a espreitar atrás do horizonte, e seus raios cobriram Lagarto
Sacerdote com uma atmosfera indescritível.
— Olhe para isso. Não tínhamos concordado secretamente que não íamos contra
ele?
— Ah, mas de vez em quando meu sangue ferve. — Depois da resposta simples
de Lagarto Sacerdote, ele ergueu alegremente um naco de queijo com as duas
mãos. Ele abriu a boca e a rasgou, com cada mordida acompanhada por um brado
de “doce néctar!” e um bofetada com a cauda no chão. — Porque sou uma
criatura de sangue quente, sabe.
— Suas piadas nunca fazem qualquer sentido para mim — resmungou Anão
Xamã. Ele ergueu as mãos em resignação, mas também para sinalizar a garçonete
que ele queria mais cerveja. Quando bebendo com amigos, Anão Xamã achava
que estava sendo apenas educado ao encher seu barril tanto quanto podia.
— Então estamos todos juntos?
— Não entendi o que quer dizer.
— Sua flecha. Flecha e arco.
— Ahh. — Lagarto Sacerdote engoliu o pedaço de queijo bem-mastigado com
um glub e lambeu os restos em seus lábios. — A ponta da flecha é a nossa
patrulheira, a haste que nos mantém unidos é você, mestre conjurador, e eu sou
a pena…
— …O arco é aquela garota, e Corta-barba seria o arqueiro… estou certo?
— Isso mesmo.
Anão Xamã pegou a cerveja que a garçonete lhe trouxe, observando de soslaio
Lagarto Sacerdote assentir. Ele levou o copo transbordando até a boca e tomou
um golinho, depois bebeu tudo em um único gole.
— Por mais renomado que seja um arqueiro, se ele dispara apenas para o céu,
ele se machucará um dia.
— Então, de novo, se nós não caçarmos nada além de goblins, isso é bom ou
ruim? — Anão Xamã, com o rosto vermelho, soltou um arroto e passou a mão
em sua barba para limpar alguns pingos.
— Qualquer que seja o caso… — começou Lagarto Sacerdote.
— De fato, em todo o caso — subscreveu Anão Xamã.
— É um bom grupo.
— Sem queixas.
Lagarto Sacerdote sorriu com suas mandíbulas grandes, e Anão Xamã deu uma
gargalhada estrondosa. Os dois pegaram os copos frescos que foram trazidos a
eles, e os tocaram.
— Aos bons amigos.
— Aos bons companheiros de batalha.
— Às boas aventuras!
Ouça, ouça! No momento em que os copos foram erguidos três vezes, eles
estavam vazios.
Quantas vezes nos encontramos, e separamos?
Alguns desaparecem, em cinzas, como devemos
Com a esperança de reencontro, cada jornada começa
Como virar uma página que está se transformando em pó
Lembra da lenda que treinou durante anos?
Qual era seu nome? Agora não me lembro
Você percebe tarde demais, agora ele já se foi
E apesar de nossas despedidas e encontros, todavia
Cada um desses encontros é único, e isso é tudo.
Assim a noite sucedeu para os aventureiros.
Capítulo 10: De Ir Lá e de
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