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Prólogo

Uma estrela brilhante: a promessa de cem sóis nos céus.


Um fio colorido: uma costura em uma roupa acabada.
Uma gota de chuva: uma partícula de um mar agitado.
A cicatriz de um aventureiro: uma história na lenda do herói.
Mil milhares; dezena de milhares de dez milhares: juntos se erguem mais alto
que as montanhas.
Assim é o mundo, quer como os dados caem ou não.
Capítulo 1: De Guerreiro
Novato e Sacerdotisa
Aprendiz

A lâmina medíocre cortou o miasma com um vuum, e um rato gigante gordo e


roliço veio voando para cima deles.
— Uoepa!
Seus dentes frontais largos e sujos eram afiados, e seu hálito fedorento invocava
imagens da morte prematura dos aventureiros.
Pressionado, o rapaz cambaleou para trás, batendo na criatura com seu escudo
redondo bem usado.
— GYURI?!
O rato caiu no chão dando um grito, mas se levantou rapidamente de novo. Sem
danos.
Guerreiro Novato sacudiu o braço esquerdo que ficou dormente com o impacto,
apesar do escudo, e tentou recuperar o equilíbrio.
— Qual é? Por que não revida?
— Meu braço todo está doendo!
Atrás dele, Sacerdotisa Aprendiz o admoestou com sua voz nasalada e estridente.
Ela segurava uma combinação de espada-e-balança em uma das mãos e um
lampião na outra, enquanto fechava a cara.
O esgoto tinha a um fedor asqueroso que chegava a dar ânsia. Mesmo manter o
nariz tampado não ajudava.
O chão escorregadio. A água residual correndo nas proximidades. Os ratos
gigantes que com uma mordida causava muito mais do que uma simples dor. Os
vermes que se contorciam por toda parte.
Tudo isso não era diferente do normal. Mas ainda assim deixava Guerreiro
Novato à beira das lágrimas.
Um dia aqui embaixo, uma peça de ouro no bolso, dizem eles.
Assim era se atingisse sua cota. E era uma importante fonte de receita para
sustento.
Todavia, os aventureiros não deviam lidar pelo menos com goblins ou algo
assim…?
— Cuidado, tonto, aí vem ele!
— …?!
O grito de sua amiga trouxe sua atenção de volta, e ele deu um bom impulso com
a espada sem sequer olhar para o alvo.
— GYAARU?!?!
Ele perfurou pelo, carne e coração. A sensação foi desagradável.
Seguiu-se um jato de líquido quente que respingou em todo o rosto do rapaz.
Ele se apoiou no pedaço moribundo de carne e gritou:
— H-hrgg…?!
Quando ele o empurrou de sua espada, o rato caiu no chão ainda se contorcendo.
A poça negra de sangue aos seus pés escorreu por todo o chão, ensopando suas
botas.
— Ei, você está bem? Ele te mordeu?
— N-não, estou bem.
— …………Está bem.
Sacerdotisa Aprendiz deu o seu melhor para mostrar indiferença, ainda assim,
ela correu até Guerreiro Novato. Sem se importar com seu manto branco, ela
limpou o sangue em sua bochecha e alguns espalhado em seus dedos.
— Não entrou em seus olhos, entrou? E na boca?
— Ugh. Um pouco.
— O que estava fazendo? Caramba.
Com um resmungo exasperado, ela pegou um antídoto da bolsa de itens que
carregava.
Guerreiro Novato estava cuspindo sangue e lavando a boca com o cantil. Ele
bebeu gratamente o antídoto amargo.
Ambos ainda eram ranques Porcelana. Para eles, o milagre Cura para curar
veneno não passava de um sonho como uma armadura de placas completa ou um
conjunto de malha.
Mesmo assim, eles não podiam ser subestimados, como atesta o antigo monstro,
agora uma massa inerte no chão.
O rato estava ocupado com algo: um cadáver de trapos. As cavidades oculares
vazias e as maçãs do rosto arruinadas da figura sugeriam um mendigo, mas em
volta da garganta roída estava uma insígnia.
Sacerdotisa Aprendiz pegou a insígnia de cor porcelana, enrolou cuidadosamente
em um lenço e colocou em sua bolsa.
A pobre garota — eles souberam que era uma garota pela identificação da
insígnia — não usou nenhuma armadura. Ela havia adentrado os esgotos com
nada além de suas roupas e um bastão, e os ratos, muito provavelmente, a
comeram.
— …Ugh — disse Guerreiro Novato. — Eles voltaram.
— Não fique tão triste. Esse é o nosso trabalho, não é?
Talvez tenha sido a morte de seus parentes que o atraiu, ou simplesmente o cheiro
de sangue, mas outro rato apareceu das profundezas do esgoto.
A criatura era maior que um bebê e sua sombra tremulava na luz do lampião.
— Precisamos da orelha para provar que o matamos — disse Sacerdotisa
Aprendiz. — Depressa, corte antes que seja devorado!
— A orelha? Eu?
— Só faça!
— Você poderia agir um pouco mais preocupada comigo, sabe…
Mesmo enquanto murmurava, o garoto pegou o cabo de sua espada, ainda presa
na carcaça do rato, e lhe deu um puxão.
— …Hã?
Não saía.
Por mais que ele puxasse a espada alojada firmemente na carne, ela se recusava
a ceder.
Ele se apoiou para se esforçar contra o corpo — agora estranhamente macio após
sua morte violenta — mas sem sucesso.
E enquanto ele ficava lá se esforçando, um dos ratos vivos, com os olhos
brilhando intensamente, estava se aproximando cada vez mais.
— N-não…! — sussurrou ele. — E-espere um pouco…!
— Lá vem ele! Faça alguma coisa, imbecil, está se aproximando!
— U-uoepa!
Foi coisa de um instante.
Guerreiro Novato tombou para trás para evitar as mandíbulas do rato, caindo em
uma poça de resíduos. A comida estragada ou seja lá o que fosse o cobriu, mas
era melhor do que ser mordido e arriscar uma infecção. Um acerto crítico
daqueles dentes e sua garganta poderia ser arrancada.
— GURUUURRRU…!
O rato gigante rosnou, balançando a cauda de um lado para o outro, ameaçando
Guerreiro Novato. Provavelmente via o garoto desarmado e a garotinha
mantendo distância cuidadosamente atrás dele como simples comida. Ele olhou
para eles enquanto um pouco de saliva escorria de sua boca, a imagem viva da
fome. Obviamente não tinha a intenção de deixá-los escapar.
É claro, se corressem, os aventureiros tampouco conseguiriam comer, ainda que
por razões mais indiretas.
— Ahhh, merda! — Sacerdotisa Aprendiz deu um estalo descortês com a língua.
Ratos gigantes… Ratos gigantes espalham doenças, são sujos e um está nos
atacando agora, e eles são inimigos da Ordem… inimigos da Ordem!
Ela parecia tentar se lembrar de tudo isso enquanto erguia alto a espada-e-balança
e a luz começou a se formar em sua volta. Ela se tornou uma espada de raio.
— Senhor do julgamento, príncipe da espada, portador da balança, exiba aqui o
seu poder!
E então Punição Sagrada, qual ela convocou dos deuses, perfurou o rato com sua
lâmina.
Emitindo um fio de fumaça e cheiro de carne queimada, o rato gigante voou antes
de quicar e rolar, morto.
O garoto franziu os lábios fazendo um som de desgosto enquanto a garota soltava
um suspiro de alívio.
— Que sorte a tua. Os deuses tornam tudo agradável e fácil, não é?
— Ora, me poupe. Você sabe que só posso exortá-los uma vez por dia. —
Sacerdotisa Aprendiz olhou feio para Guerreiro Novato com sua demonstração
de desrespeito. — De qualquer forma, se apresse e pegue sua espada. Quero
recolher essas orelhas e ir para casa tomar um longo banho.
— Sim, claro.
Guerreiro Novato se aproximou hesitantemente do corpo do primeiro rato, e
dessa vez ele usou toda a sua força para extrair sua espada.
Então…
Chleeep.
—…
—…
Era um som que eles não gostavam. Os dois aventureiros se entreolharam com o
barulho inesperado, tensos de medo.
Chl…
Chlep.
Chleeep.…
Chlep.
O som vinha do fundo da escuridão.
Tremendo, Sacerdotisa Aprendiz levantou o lampião.
Algo preto e luzente transformado na forma de um inseto enorme brilhava como
se estivesse coberto de óleo. Um deles, dois… então muitos, muitos mais.
Mesmo com uma contagem rápida era claro de serem superiores a dez.
Enquanto procuravam com suas longas antenas finas, as criaturas se
aproximavam lentamente.
Elas vinham diretamente para os aventureiros, com as mandíbulas abertas.
— Ah…
A voz de Sacerdotisa Aprendiz se prendeu em sua garganta, antes de…
— Nãããããããão!
— Idiota! Não grite, corra!
Os dois agarraram o que puderam e correram apavorados para fora do esgoto.
Um som terrível de raspagem lhes dizia que os insetos negros ainda estavam bem
em seus calcanhares.
Quão longe era a saída mesmo?
Guerreiro Novato refletiu: ele não pediu por dragão. Talvez goblins, ao menos,
embora pudessem prolongar seus últimos momentos e fazê-lo terrível. Mas de
todas as coisas, a última forma como ele queria morrer era ser comido por baratas
gigantes.
A manhã da primavera era quente, como se estivesse anunciando a vinda do
verão.
— Ugh… ggrrh…
Guerreiro Novato acordou com uma luz matinal que penetrava seus olhos, então
se espreguiçou sobre o feno para aliviar a rigidez de seu corpo.
Ele respirou fundo e exalou, o ar tinha uma mistura desagradável de álcool e odor
de animal.
Saudar um novo dia nos estábulos ainda era melhor do que estar no esgoto.
A Guilda dos Aventureiros tinha uma pousada, é claro, mas não era de graça.
Verdade, todos eles eram quartos “econômicos”, embora as camas fossem apenas
cobertores sobre tábuas de madeira.
Estavam longe de serem suítes, mas…
— Simplesmente não tenho dinheiro.
Ele suspirou lentamente. A aventura do dia anterior ficou exposta na coluna
“prejuízo” de suas finanças.
Um antídoto, uma espada, e — por não terem cumprido a cota solicitada —
nenhuma recompensa.
Ele poderia sobreviver hoje porque ele ao menos tinha um pouco de dinheiro que
economizou e guardou. Mas a esse ritmo, não demoraria muito para que ele
tivesse que carregar seus poucos pertences de volta para casa, ou — se fosse
especialmente azarado — talvez até se tornasse um servo ou um prostituto.
Só havia passado poucos meses desde que Guerreiro Novato saiu de sua pequena
aldeia agrícola para se tornar um aventureiro. A razão foi que Sacerdotisa
Aprendiz, uma velha amiga dele, havia saído para treinar e parecia morrer
facilmente se deixada por conta própria.
A perspectiva dela, por outro lado, era que ela acompanhava ele em “algum tipo
de treinamento de guerreiro ou algo assim” para que ele não fosse deixado para
morrer em um arbusto aleatório.
Ele sentia que teria de ser clara com ela nesse ponto em algum momento.
Bem, tinha sentido.
Nos meses que se seguiram quando chegaram na cidade fronteiriça, eles não
tinham feito nada além de matar ratos. E às vezes baratas.
Isso realmente é trabalho de aventureiro…?
Foi o suficiente para fazer seus sonhos definharem na raiz, quebrando sua certeza
e resolução.
— Pare, pare. Já basta desses tipos de pensamentos.
Ele se sacudiu e tirou um pedaço de feno perdido de suas roupas.
Nas proximidades, um homem de meia-idade, aparentemente um aventureiro
também, cochilava em sono profundo de bêbado, roncando alto.
À frente deles, os cavalos olhavam com desgosto para os humanos que
presumivelmente compartilhavam seus espaços de dormir.
Ele não viu Sacerdotisa em lugar algum.
Por mais desapontado que estivesse, Guerreiro Novato ainda tinha orgulho
suficiente para permitir que ela dormisse em uma dessas camas simples.
— Muito bem! Hoje é um novo dia!
Fingir estar de bom humor é quase estar realmente de bom humor, certo? Ele deu
um berro, pegou suas coisas e correu para fora do estábulo.
Indo direto ao poço, ele puxou um balde e jogou água por todo o rosto. Usando
o pano em sua cintura, ele começou a esfregar energicamente. Ainda não havia
quaisquer sinais de qualquer barba nova crescendo.
— Começarei a parecer mais como um herói em breve… espero.
Ou talvez os pelos faciais só dariam a Sacerdotisa Aprendiz um motivo para
apontar e rir dele. Guerreiro Novato grunhiu.
Em todo o caso, havia muito a se fazer.
Com a pequena tarefa de se fazer apresentável já terminada, o garoto foi direto
para os estábulos. Ele pegou uma pá pequena da prateleira de ferramentas
agrícolas e foi para parte de trás.
— Hummm. Então, onde eu coloquei…?
O estado exaustado que ele estivera ao retornar na noite anterior o deixou com
apenas uma pequena lembrança de onde estava.
Ele verificou o chão por alguns minutos, procurando por alguma coisa, então,
com um “Ah, aí está”, ele encontrou o vestígio de terra mexida mais recente.
Ele enfiou a pá na terra, forçou o pé sobre ela e cavou por um tempo.
Depois de um pouco de trabalho, ele retirou seus equipamentos do chão; sua
armadura e escudo.
Ele tinha os conseguidos logo depois de chegar na cidade, usando seus fundos
escassos. Eles eram medíocres, mas sem igual. Esses eram equipamentos que
sabia que poderia contar.
Tinha, é claro, uma razão dele ter enterrado eles.
— …Tsc. Estão fedendo… hrrm. Bem, continua sendo o melhor, eu acho.
Ele aproximou seu rosto deles e cheirou.
Cair na poça de esgoto não o incomodou enquanto eles estiveram correndo para
fugir. O problema foi quando eles voltaram à superfície e ele percebeu o quanto
estava fedendo. Não só as pessoas na rua, mas até os seus colegas aventureiros
fizeram careta e franziram a testa para ele.
No fim, quando voltaram para a Guilda para fazer seus relatórios, a recepcionista
tinha dito sorrindo: — Por favor, vá se limpar e depois volte.
Durante todo esse tempo, Sacerdotisa Aprendiz ficou lá parada, vermelha e
tremendo, encarando o chão…
Fizemos asneira…, pensou lentamente ele.
Por fim, embora ele não estivesse muito acostumado, ele lavou as roupas, as
secou e se lavou antes de se trocar.
Depois de considerar um pouco sobre o que fazer com sua armadura de couro e
escudo, ele decidiu que a única coisa certa era os enterrar no chão e esperar que
isso acabaria com parte do fedor.
O cheiro havia melhorado um pouco, pelo menos é o que esperava, então ele
limpou a terra com um pano e se equipou.
Ele não teria a coragem de deixar seus equipamentos preciosos simplesmente
jogados por aí, mesmo se ele estivesse em um quarto alugado, quanto mais
“hospedado” no estábulo como estava.
— Hm…
Seu estômago começou a roncar, acompanhado de uma sensação dolorosa.
Guerreiro Novato pôs a mão instintivamente sobre o abdômen e olhou em volta
com um pouco de pânico. Não havia ninguém por perto. Ninguém para ouvir.
Agora que ele pensou nisso, só havia bebido um pouco de água no dia anterior.
O céu estava azul, o sol da manhã brilhava intensamente.
Guerreiro Novato deu um suspiro.
— …Acho que é melhor comer alguma coisa.
— …Você está atrasado.
Sacerdotisa Aprendiz já estava na taverna.
Ela estava em um canto, e o lugar estava vivo com aventureiros, mesmo nessa
hora da manhã.
Ela estava com o queixo descansando nas mãos e parecia irritada; Guerreiro
Novato se sentou à mesa com uma desculpa breve.
— Ah — adicionou ele — e bom dia. Desjejum?
— Eu já comi — disse bruscamente Sacerdotisa Aprendiz, mas então ela
murmurou sua resposta ao cumprimento. — Bom dia. Seja como for. Apenas se
apresse e coma. Gostaria de descer novamente essa tarde se conseguirmos.
Havia um prato de pão vazio na frente dela. No seu havia feijões, sopa de bacon
e pão.
Guerreiro Novato abriu a boca, confuso, a fechou, depois abriu de novo.
— Sinto muito.
— Pelo quê?
— Ahh…
Parecia que se dissesse mais alguma coisa, ele só a deixaria nervosa de novo.
E não é preciso lutar logo pela manhã.
Ele pegou a colher e levou um pouco de sopa até a boca. Sacerdotisa Aprendiz
deu um hmph.
— E suas roupas. Elas ainda estão penduradas atrás do estábulo?
— Ah, hum, sim. — Guerreiro Novato assentiu. Ele deu uma mordida no pão
duro e engoliu. — Elas não estavam secas.
— Tudo bem, dê elas a mim mais tarde. Esse cheiro horrível nunca sairá do jeito
que você lava. Vou fazer isso para você.
— Ah, hum… desculpe.
— Não quero acabar fedorenta só porque saio com você. — E então ela se virou
para longe dele.
O fracasso de sua última excursão fora totalmente culpa dele. — Sinto muito —
murmurou ele, focado em sua comida.
Ele arrancou um pedaço de pão e mergulhou na sopa. Quando ficou bem
encharcado, ele pegou um pouco de bacon com sua colher e comeu tudo junto.
A sopa estava rala e principalmente salgada. Ele comeu sem dizer nada,
obedientemente.
Se o cara que deveria ser o escudo estivesse com tanta fome que não pudesse se
mover, o que seu pequeno grupo faria então? Essa era outra parte do seu trabalho.
Tudo deleitado, ele jogou sua colher em cima do prato vazio e assentiu.
— Muito bem. Armas.
— É um desperdício simplesmente deixar aquela espada lá embaixo.
— Sim, mas escute — disse ele de volta, colocando um pouco de água da jarra
na mesa em sua caneca. — Eu preciso de uma arma se quisermos voltar lá e
encontrá-la.
— E você tem o dinheiro?
— Quanto a isso…
Ele bebeu a água. Sacerdotisa Aprendiz alcançou o jarro ao mesmo tempo que
ele, então ele encheu o copo dela.
— Obrigada — disse ela, colocando ambas as mãos ao redor da caneca e a
levando aos lábios. — Você não tem nenhum, não é? Dinheiro, quero dizer.
— Talvez eu pudesse pegar emprestado.
— Pare com isso. Não inicie nenhuma dívida.
— Nem. Me refiro a empréstimo de equipamento ou algo assim.
Pedir emprestado uma arma. Ele pensou em alguns de seus conhecidos, se
perguntando se algum deles estaria disposto a emprestar algo.
Seria fácil pôr as mãos em uma adaga, mas isso não inspirava muita confiança.
Ainda assim, pegar emprestado algo como uma espada longa — como aquela
que ele perdeu com um simples brandir — contaria contra ele.
Confiança não era algo tão fácil de se obter.
Ele estava dando justamente um suspiro involuntário e profundo, quando…
— Hum? O que houve, garoto? Ainda é bem cedo para uma cara emburrada.
O comentário alegre soou acima dele.
Sua cabeça se levantou. Ele viu um aventureiro carregando uma lança que
cintilava na luz.
A insígnia ao redor de seu pescoço era Prata, o terceiro ranque.
— Ah, hum, bem…
— Eu tenho um encontro, significando uma aventura, então não tenho muito
tempo. Mas vou ouvir enquanto posso.
Guerreiro Novato ficou sem palavras de repente. Lanceiro, conhecido como “o
mais forte da fronteira”, deu um sorriso amigável para ele.
O jovem guerreiro engoliu em seco. Ao lado dele, Sacerdotisa Aprendiz o
cutucou com o cotovelo. Ele assentiu com determinação.
— Hum, na verdade, eu… eu perdi minha arma na nossa aventura de ontem.
— Ah, é? — Lanceiro fez uma careta por instinto. — Isso é ruim — disse ele,
sua voz aparentemente transmitia sinceridade.
— Eu quero ir buscá-la, mas não tenho uma arma, então… Pensei que talvez
houvesse uma chance de alguém me emprestar uma…
— Emprestar uma reserva, hum? …Eu tenho algumas a mais, então poderia te
deixar usar uma, mas… — Lanceiro olhou Guerreiro Novato da cabeça aos pés,
então concluiu: — Não sei se você tem força para ela.
— Hm…
Um som mínimo de constrangimento escapou dele.
Guerreiro Novato era magro e flexível, mas em termos de músculos, ele não era
comparável com Lanceiro.
Eles tinham tipos diferentes de corpos. Naturalmente eles usavam armas com
pesos diferentes.
— E se você perdesse essa também, aposto que não poderá me pagar.
— É, não é? — Nem ele consegue tentar extorquir dinheiro de um aventureiro
júnior.
Uma linda mulher apareceu no lado de Lanceiro, silenciosa como uma sombra,
exceto pelas suas palavras murmuradas.
Ela era uma bruxa que vestia roupas que acentuavam sua figura voluptuosa e
plena. Sacerdotisa Aprendiz percebeu que estava ficando vermelha e evitou o
olhar dela.
— E uma arma mágica, certamente não, combinaria bem com você, não é?
Uma arma mágica emprestada?!
Os olhos de Guerreiro Novato se arregalaram quando Bruxa sussurrou e riu.
Para um principiante como ele, armadura metálica era coisa de sonho. Uma arma
mágica poderia muito bem ser coisa de lenda longínqua.
Ouvi dizer que pode encontrar elas em ruínas e labirintos se tiver muita sorte, e
as vejo à venda de vez em quando.
Mas elas eram vários dígitos mais caro para que ele pudesse alguma vez pensar
em possuir uma.
— Então, em vez disso, me deixe, te dar algo, bom.
Bruxa retirou alguma coisa do seu decote com um movimento elegante, uma
simples vela.
Não parecia ser da branca usual, mas azulada, que era, olhando mais atentamente,
por causa das letras coloridas a cobrindo.
A abundância de caracteres que foi gravado na vela com letras fluidas era
indecifrável por Guerreiro Novato.
— Isso é… — Sacerdotisa Aprendiz piscou várias vezes. — …uma vela?
— Sim.
Bruxa piscou e abaixou a voz como se ela fosse revelar um grande e obscuro
segredo.
— Isso, veja, é uma vela de busca… Quando, você está perto, do objeto que
procura, ela fica, mais quente. Entende?
Um item mágico. Guerreiro Novato engoliu em seco.
Não havia necessidade de eles usarem para si mesmos. Se eles vendessem, ela
renderia mais do que o suficiente para uma boa espada…
— Sinta-se à vontade, para, vendê-la… transformá-la, em dinheiro.
O sorriso dela parecia ver bem dentro dele, e Guerreiro Novato acabou por olhar
para o chão. Sacerdotisa Aprendiz lhe deu outra cutucada com o cotovelo.
— Ah, hum… Eu, hum… Ob-obrigado. Muito obrigado.
— Sem, problema. Uma, coisinha para ajudar.
Guerreiro Novato recebeu o item hesitantemente enquanto Bruxa tinha uma
expressão divertida e sorria.
— Está, bem. Temos o nosso… encontro.
— Aham. Não morram, crianças.
Lanceiro bagunçou o cabelo de Guerreiro Novato e partiu com um ritmo vistoso.
Bruxa seguiu bem atrás dele passando pelas portas da Guilda.
Guerreiro Novato colocou a mão direita na cabeça, onde ele ainda podia sentir
aquela palma poderosa.
— …Eles são tão legais.
— É. — Sacerdotisa Aprendiz se permitiu sussurrar. — Talvez…
— Hã-hã, não, nem pensar! — No campo gramado atrás da Guilda, Garoto
Batedor estava sentado e balançando as mãos freneticamente. — Eu perdi minha
própria adaga recentemente. A que eu tenho agora é emprestada. Se eu
emprestasse, Capitão me mataria!
— Você a perdeu? O que aconteceu?
— Foi absorvida por uma lesma gigante.
— O que está fazendo? — perguntou a rhea Druidesa, franzindo as sobrancelhas.
— Uma lesma gigante, hein? Sorte sua…
Guerreiro Novato contraiu os lábios, recebendo uma cotovelada de lado de
Sacerdotisa Aprendiz. — Somos ranque Porcelana, enquanto eles estão em um
grupo de Prata. Não se compara.
— Vocês estavam matando ratos gigantes, não é? — perguntou Garoto Batedor.
Guerreiro Novato franziu a testa e assentiu.
— E perdi a minha espada nisso.
— Você tem sorte de não ter sido um item único.
Garoto Batedor deu uma olhada para onde estava Guerreiro de Armadura Pesada
brandindo sua lâmina enorme de duas mãos.
Houve um vuum quando ela cortou o ar, e então um tum quando Cavaleira
entrou em ação.
A espada de duas mãos o impedia de carregar um escudo, mas a facilidade com
que ele a empunhava era uma prova do poder mágico que ele havia recebido.
Ataca, bloqueia, acerta, apara, bate, brande alto, deflete, corta, repele.
Sua arma foi primorosamente elaborada tal como sua armadura. O brilho da arma
cuidadosamente trabalhada era inconfundível até na luz do sol.
— …Quem me dera ter uma dessas.
— Uma dessas o quê?
— Aquela espada larga — disse Guerreiro Novato, descansando seu queixo nas
mãos. — Uma lâmina de duas mãos.
— Esqueça — disse Sacerdotisa Aprendiz, com os olhos arregalados. — Mesmo
se tivesse uma, imagine o que aconteceria.
— É, que seja.
— Ela quis dizer que ele só cortaria o ar?
— Ela quis dizer que ele nunca acertaria nada.
A conversa de Garoto Batedor e Druidesa fez com que Guerreiro Novato se
virasse aborrecido.
— No entanto, se eu acertasse em algo, seria incrível.
— Essas armas são tão pesadas que você iria se cansar em pouco tempo.
— Mas eu iria parecer bem legal.
— E elas também não são baratas. — Sacerdotisa Aprendiz balançou o dedo de
modo repreensivo para Guerreiro Novato, e não havia nada que ele pudesse fazer
além de ficar calado.
— Parece que ela lançou Silêncio em você! — Garoto Batedor gargalhou. —
Garoto, ela tem você nas mãos!
— Oh — disse Druidesa com uma fungada discreta e uma expressão calma,
balançando suas orelhas em forma de folha. — Como se você não desperdiçaria
todo o nosso dinheiro se eu não apertasse os cordões da bolsa.
Garoto Batedor trouxe a repreensão para si mesmo. Ele deu um estalo com a
língua e Druidesa assentiu satisfeita. Então ela perguntou: — Ei, e se vocês
pedissem um conselho à Guilda?
— Você está falando de pegar emprestado uma arma?
— Não, de como matar ratos gigantes. Talvez eles tenham alguma dica.
— Hummm. — Sacerdotisa Aprendiz fez um som baixo. — Me pergunto se
pudesse ser assim tão fácil.
— Temo que não seja tão fácil.
Claro que não.
Garota da Guilda balançou a cabeça para Sacerdotisa Aprendiz, que colocou a
mão na bochecha e parecia perturbada.
— Eu pensei que não…
— Basicamente, solicitamos aos aventureiros para fazer porque não é fácil.
— Se qualquer um pudesse fazer, não haveria nenhum trabalho, né… — disse
Guerreiro Novato. — Ah, um antídoto, por favor.
— É claro, aqui está.
Sacerdotisa Aprendiz pegou o frasco oferecido e guardou com cuidado na sua
bolsa de itens. Ao menos a memória amarga de quando ela havia corrido e
tropeçado, quebrando um dentro da sua mochila, serviu um propósito.
— Diga, que tal uma poção de cura? — acrescentou Garota da Guilda.
— Eu adoraria uma, mas… sabe, o dinheiro… Você teria algumas ataduras, ervas
ou pomadas?
— Realmente não é tão fácil, não é? Mesmo assim… — Garota da Guilda limpou
a garganta com um ar importante. — Talvez haja algo que possa te ensinar…
— Sério?! — Guerreiro Novato balançou sua cadeira quando se curvou sobre o
balcão.
O meio-dia já tinha passado, e havia poucos aventureiros a ser vistos na Guilda
dos Aventureiros.
A maior parte deles já havia escolhido suas missões e partido entusiasticamente
para a aventura.
Guerreiro Novato e Sacerdotisa Aprendiz esperara até esse momento para pedir
ajuda, e eles odiariam voltar para casa sem uma única dica.
— Alguma coisa! Qualquer coisa!
— Bem, é realmente uma ideia muito óbvia… — Garota da Guilda ergueu o
dedo indicador, que enfatizava a unha cuidadosamente feita. — Fortaleça sua
defesa. Tenha ao menos uma cota de malha ou algo similar, assim os ratos e
baratas gigantes não conseguirão te morder.
— Mas não temos dinheiro…! — Todo o entusiasmo de Guerreiro Novato se
dissipou e a cadeira se agitou de novo quando ele voltou para posição normal,
com sua voz totalmente desanimada.
Garota da Guilda inclinou a cabeça para o lado, fazendo com que seu cabelo
trançado se pendurasse.
— Vocês podem conseguir um pequeno desconto se comprar equipamento
usado.
— Eles não pegam de pessoas mortas? — Sacerdotisa Aprendiz perguntou um
pouco fria, e Garota da Guilda fez um som que rude de desagrado.
— Alguns vem de aventureiros aposentados ou pessoas que trocaram para uma
melhor. Nós não levamos nada amaldiçoado.
— Mas vocês têm itens de gente mortas, não é?
— Bem, nós… Mas nunca dos que se tornaram mortos-vivos… — Garota da
Guilda pareceu hesitante por um momento. Mas logo ela colocou um sorriso de
novo. — De qualquer forma, equipamento é equipamento, certo?
Guerreiro Novato deu um suspiro.
E estar duro é estar duro.
— Mais alguma ideia…?
— Vejamos… Ah, estão usando um lampião?
— Sim, o do Conjunto de Ferramentas de Aventureiro — disse Sacerdotisa
Aprendiz um pouco farta. O Conjunto de Ferramentas de Aventureiro continha
corda, um lampião, giz e vários pedaços de corrente, tudo em um só lugar. Até o
momento, apenas o lampião tinha sido de utilidade para eles, e ela meio que se
arrependia de ter comprado.
— Tem pessoas que usam uma tocha em vez de um lampião, uma vez que
funciona como uma arma.
Garota da Guilda mencionou com um sorriso que ratos e insetos desprezavam o
fogo.
— Que tipo de aventureiro faria uma coisa dessas?
— Bem, para um…
Garota da Guilda parou subitamente, e foi como se uma flor tivesse desabrochado
em seu rosto.
Guerreiro Novato seguiu seu olhar, vendo a entrada da Guilda.
As portas do estilo vai-e-vem se abriram, e o odor forte de ferro veio flutuando.
Era difícil culpar Guerreiro Novato pelo “Argh” que lhe escapou.
Um aventureiro muito curioso apareceu na entrada.
Ele usava um capacete de aço de aparência medíocre e uma armadura de couro
suja, um pequeno escudo redondo estava atado ao braço e uma clava primitiva
estava pendurada na sua cintura.
Ele era o aventureiro chamado Matador de Goblins.
— M-Matador de Goblins, senhor, eu te disse, é muito cedo…
— É?
Uma sacerdotisa de vestimentas brancas sujas com um vermelho-escuro terrível,
veio correndo atrás dele.
A resposta de Matador de Goblins foi breve. Ele reconheceu os dois no balcão
da recepção, então começou a andar com seu passo ousado. Ele se sentou forte
no banco na área de espera. Sacerdotisa desabou ao lado dele.
Garota da Guilda, balançando os dedos para o lado dela em uma espécie de sinal,
semicerrou os olhos como se dissesse: Não tem jeito.
— Você tem que limpar. Sempre digo a você. As pessoas irão entender errado
— resmungou ela. Então ela notou as expressões nos rostos de Guerreiro Novato
e Sacerdotisa Aprendiz. — Vocês estão bem?
— Ah, nós, hum…
— Hum… — Sacerdotisa Aprendiz coçou a bochecha desajeitadamente. — Nós
dissemos algo um pouco… grosseiro antes.
Ela estava falando sobre algo de vários meses atrás, mas o acontecimento ainda
estava fresco nas memórias deles.
Eles pensavam que ele poderia estar tentando usar a sua companheira novata
como isca.
Hoje parecia uma coisa terrivelmente inapropriada a se pensar, mas na época eles
ficaram convencidos de que tinham de resgatar Sacerdotisa.
— Ah! — disse Garota da Guilda com uma risada, entendendo. — Tenho certeza
de que está tudo bem. Ele não deixa esse tipo de coisa o aborrecer.
— É, mas isso nos incomoda… — disse Guerreiro Novato, e depois piscou. Ele
esfregou os olhos com sua manga. Alguma coisa estava errada.
O recém-chegado usava um capacete de aço de aparência medíocre e uma
armadura de couro suja, um pequeno escudo redondo estava atado ao braço e
uma clava primitiva estava pendurada na sua cintura.
Uma clava?
— …Ele não usa uma espada?
— Agora que falou nisso… — Sacerdotisa Aprendiz também olhou na direção
de Matador de Goblins. — …Acho que sim. Uma com uma aparência bem
medíocre, no entanto.
— É, tem razão.
— E aquela garota está coberta de manchas de sangue…
O que raios aconteceu? A dupla de jovens parecia muito preocupada, mas Garota
da Guilda só deu uma risada e um sorriso.
— Querem saber sobre eles? — perguntou ela, batendo sugestivamente com
alguns papéis na mesa para endireitá-los. — A melhor maneira de aprender sobre
aventuras é perguntar a um aventureiro.
— C-claro…
Mas aquela pessoa era Matador de Goblins.
Por outro lado, ele também era um aventureiro do terceiro ranque, Prata.
Mas… ele também era Matador de Goblins…
— …Está bem então!
Foi Sacerdotisa Aprendiz que ficou de pé com todo o entusiasmo que pôde juntar.
— E-ei, o que…?
— Vou perguntar — disse ela, olhando fixamente para frente — não custa nada!
Então ela se livrou do temeroso Guerreiro Novato e começou a avançar com um
ar de determinação.
Guerreiro Novato olhou para Garota da Guilda. Ela ainda estava sorrindo.
— Ahh, cara…!
Agora Guerreiro Novato se recompôs e se levantou.
A expressão de Garota da Guilda, é claro, não mudou.
— Humm… — chamou Sacerdotisa Aprendiz, provocando apenas um “Hum?”
cansado de Sacerdotisa.
Estava claro que ela tinha acabado uma aventura com Matador de Goblins.
Sacerdotisa Aprendiz franziu a testa, só percebendo agora que deveria ter
escolhido uma hora melhor.
— O que foi?
— Hã…
Além disso, houve aquela voz grave, desapaixonada e quase mecânica.
O capacete de aço se mexeu lentamente, com um olhar penetrante além do visor.
A armadura do homem estava coberta de manchas escuras de sangue.
Ele realmente se parece com uma armadura viva ou algo desse tipo…
Com esse pensamento bem desagradável na cabeça, Sacerdotisa Aprendiz
engoliu em seco.
— Hu… Hum! — Guerreiro Novato interrompeu como se estivesse a cobrindo.
Ele ignorou a queixa dela de Espere um pouco! e continuou com um tom íntimo:
— Tem uma coisa que gostaríamos de te perguntar… se não se importar.
— O que é?
A resposta de Matador de Goblins foi breve, e foi dita com a mesma voz grave.
Ao lado dele, a cabeça de Sacerdotisa balançava de um lado ao outro.
— Fale baixo, por favor.
— Oh… hrg… D-desculpe… — respondeu Guerreiro Novato com uma voz
tensa. Suas mãos estavam rígidas e tremiam um pouco de nervosismo.
Sacerdotisa Aprendiz pegou a mão dele suavemente. Era áspera e coberta de
cicatrizes.
— …Foi muito ruim, esse trabalho?
— Precisávamos de dinheiro. — Mas não. Matador de Goblins balançou o
capacete de um lado para outro. — Fui obrigado a aceitar.
Guerreiro Novato engoliu em seco e apertou de volta a mão de Sacerdotisa
Aprendiz.
— …Nós, nós… Nós queríamos te perguntar uma coisa. — Ele tomou um
fôlego. Suas mãos relaxaram. — Por que está usando uma clava?
A resposta veio de uma vez só: — Eu roubei de um goblin.
— R-roubou?
— Você lança uma lâmina ou apunhala com ela. Ela quebra ou lasca. Um uso
prudente pode ajudar, mas uma única espada não é boa por mais de 5 deles.
Isso pareceu mais ou menos uma resposta… E então, mais ou menos não.
Espera… Talvez seja.
— Hrrm — grunhiu Guerreiro Novato. Então ele parou por um longo momento.
— E quanto a ratos e baratas?
Agora foi a vez de Matador de Goblins grunhir. — Ratos ou baratas?
— …É.
— Não sei lhe dizer. — Mas… Ele tocou a clava no cinto. — …Se usar e bater
com ela, você vai machucá-los. Pelo menos você não precisa se preocupar da
lâmina lascar.
Matador de Goblins se levantou do banco, extremamente devagar. Sacerdotisa,
que estivera apoiada nele, estremeceu.
— É fácil.
— Fácil…
— Estou indo — disse ele brevemente para Guerreiro Novato, que permaneceu
pensando. Então o capacete se virou para onde Sacerdotisa estava esfregando os
olhos. — Descansar?
— Ah, n-não, estou indo!
— Entendi.
Sacerdotisa também se pôs de pé, se apressando para acompanhar o passo ousado
que o afastava rapidamente.
Mas prestes a partir, ela se virou para os outros dois aventureiros e fez uma
pequena reverência.
— Ah, hum… ei! — disse Sacerdotisa Aprendiz.
— Sim?
Era agora ou nunca.
Sacerdotisa Aprendiz tinha chamado quase sem pensar, mas agora Sacerdotisa
inclinou a cabeça. — Como posso ajudar?
— Bem, hum, nós só… Por que está manchada de sangue?
— Ah… — murmurou Sacerdotisa com uma expressão ligeira de confusão. Ela
corou bem pouquinho. — Eu… não acho que seja uma boa ideia… você
perguntar.
— Oh… sério?
— Ah, m-mas não estou ferida ou algo assim, então não se preocupe. — Ela deu
a Sacerdotisa Aprendiz um sorriso cansado, mas galante. Ela estava coberta de
suor e sujeira, mas não havia nenhum sinal de mentira em sua expressão.
A insígnia pendurada em seu pescoço não era Porcelana, mas Obsidiana.
Sacerdotisa Aprendiz soltou um suspiro.
— Ei…
— Sim?
— Desculpe por antes.
—?
— Acho que nós entendemos bem mal o que estava acontecendo.
Os olhos de Sacerdotisa se arregalaram e ela piscou várias vezes. — …Não se
preocupe com isso! — E então subitamente, a calma e séria garota agarrou seu
cajado com as duas mãos. — Está tudo bem. Eu sei como ele se parece, mas ele
é uma boa pessoa…
— Não vem? — chamou uma voz rouca ao longe.
— Devíamos conversar quando tivermos uma chance — disse Sacerdotisa, então
ela se curvou para os dois. Pondo a mão em sua cabeça para segurar sua mitra,
ela correu para onde Matador de Goblins estava.
— Algo errado? — perguntou ele.
Mas ela respondeu: — Não, nada.
— Você está exausta?
— Ah, não… Hum… Bem, talvez um pouco cansada.
— Descanse um pouco.
Mesmo à distância, os dois podiam ver Sacerdotisa sorrir um pouco quando
respondeu: — Sim, senhor.
Sacerdotisa Aprendiz suspirou e aliviou os ombros.
— Eu acho…
— Hum?
— Que teremos de tentar o nosso melhor também.
— An-ham!
Com isso, Guerreiro Novato e Sacerdotisa Aprendiz tocaram suavemente seus
punhos.
— Muuuuito bem! Aqui vamos nós!
— Certo, vamos rever a lista!
Nos arredores da cidade, logo após o amanhecer — com a neblina violeta azulada
da manhã ainda suspensa no ar — as vozes de um garoto e uma garota podiam
ser ouvidas perto da vala de esgoto.
— Antídoto!
— Confere!
— Suprimentos de primeiros socorros!
— Pomadas e ervas, confere!
— Luz!
— Um lampião do Conjunto de Ferramentas de Aventureiro, um pouco de óleo
e uma tocha! E você?
— A Vela de Busca… Humm, mapa!
— Confere! Com isso quero dizer que peguei emprestado quando aceitamos
nossa missão.
— Tudo bem. Agora, armadura!
— Minha armadura de couro ainda meio que fede… meu escudo também. Agora,
me deixe te ver.
— Eu? Não tenho intenção de ser atacada usando essas vestimentas.
— Não me interessa, apenas me mostre. Senão, que adianta a lista de verificação?
— É, tudo bem… Última, armas!
— Confere!
E com isso, Guerreiro Novato pegou sua clava rudimentar — mas novinha em
folha — com a mão direita.
Era tão intocada que ainda parecia ter uma etiqueta presa. O comprador comum
teria considerado um item barato, mas o jovem dificilmente pensaria isso.
— Bom — disse Sacerdotisa Aprendiz, acenando para a clava. Ela abriu os
braços e girou uma vez. As mangas de seu vestido branco inflaram. Havia
costuras e rasgos em alguns lugares, mesmo assim estava limpo e atrativo.
— Estou bem?
— Você devia remendar alguns lugares mais tarde.
— Se depender de eu remendar ela… — Sacerdotisa Aprendiz pôs as mãos na
cintura, e com uma expressão séria ela deu um grito. — Não cumpriremos a
nossa meta de hoje, isso sim! Estaremos arruinados!
— Não acho que as coisas estejam tão ruins assim…
— Mas é com essa atitude que você tem que ir!
Guerreiro Novato parecia estar relaxado; Sacerdotisa Aprendiz lhe deu um bom
golpe com sua espada-e-balança. — Nós nem temos dinheiro para voltar para
casa. Você acabaria como um servo, e eu como… você sabe…
— Uma prostituta? Pfft, quem te contrataria?
— Como ousa falar assim, idiota! — Seu rosto ficou vermelho-vivo e ela deu
uma cotovelada no flanco do garoto, bem onde sua armadura estava atada.
Ela olhou para ele tremendo e se contorcendo, e então bufou.
— Enfim, você entendeu?
— S-sim, entendi, mas… Bem, sim. — Guerreiro Novato se recompôs, ajustou
seus itens na mão e assentiu energicamente. — Daremos um jeito nisso de
alguma forma!
Essa era uma cidade fronteiriça, um dos lugares que as pessoas trabalharam para
reivindicar, e havia um esgoto aqui porque, obviamente, alguém tinha
construído.
Uma coisa era quando uma cidade era construída sobre algumas ruínas antigas,
como a cidade da água, outra era ter serviços públicos em um campo desocupado.
Anões artesãos e magos, construtores talentosos de todos os tipos, foram
chamados para construir o esgoto de pedra do zero.
O esgoto fora construído porque a cidade estava prosperando, ou a cidade
prosperou porque o esgoto foi construído? Guerreiro Novato não sabia o que
aconteceu primeiro.
Raio, nem sei como isso funciona.
Para além das portas de metais enferrujadas e escadas que desciam, estava uma
masmorra sombria e úmida.
Uma passarela se estendia ao longo do canal que corriam as águas residuais, e
um fedor asqueroso flutuava por todo o lugar.
Sem hesitar, Guerreiro Novato cobriu a boca com um pano; Sacerdotisa
Aprendiz franziu o rosto e pôs um tapa-nariz.
O esgoto era novo, mas ratos e baratas gigantes eram atraídos pela sujeira.
Por alguma razão, Personagens Que-Não-Rezam — os NPC — pareciam
aparecer naturalmente nesses lugares. Mais um motivo para se livrar deles antes
que alguma ameaça ainda maior surgisse…
— Então, para que lado vamos?
— Ah, hum, espere!
Enquanto Guerreiro Novato parou com o quê, para ele, era visto como vigilância
constante, Sacerdotisa Aprendiz pegou alguma coisa apressadamente.
Ela pegou uma pederneira e acendeu o lampião, depois pendurou em sua cintura.
Ela o abriu e tocou a vela na chama.
A Vela de Busca queimava com uma chama azul e branca estranha; Sacerdotisa
Aprendiz podia sentir ela ficando progressivamente mais quente em sua mão.
— …Como está?
— Está quente, mas ainda meio que…
— Se certifique de manter a minha espada nitidamente em sua mente.
Eles estavam lá para encontrar uma espada, verdade, mas também para matar
ratos. Eles tinham uma cota para cumprir.
Guerreiro Novato, decidido que iriam conseguir tudo o que vieram fazer, partiu,
ignorando vários túneis de esgoto até que finalmente alcançaram as profundezas.
Era o ninho dos ratos gigantes que eles tinham finalmente localizado depois de
se aprofundarem na busca.
— …Ohh, aqui estão eles.
Talvez tenha sido a corrente que trouxera boa parte dos resíduos de comida da
cidade para aqui.
Era isso que os ratos desproporcionais procuravam. Um deles, dois…
Guerreiro Novato cuspiu na mão e esfregou no cabo da sua arma, depois avançou
nas criaturas.
— Iaaaaaahh!
— GYUUI?!
Um deles fugiu do garoto, mas ele acertou aquele que estava concentrado na
refeição.
Houve um som seco de impacto que era totalmente diferente de atacar com uma
espada. Ele sentiu a arma se conectar com o pedaço de carne.
O rato gigante gritou e caiu longe, mas ainda estava vivo.
— Você… morre… agora!
Ele há muito tempo havia descartado qualquer senso de simpatia pelos monstros.
Era matar ou ser morto. Se eles enfiassem seus dentes em sua traqueia, era ele
que morreria.
— Uoo! Iaa!
O rato gigante se levantou e saltou nele com as presas à mostra.
Guerreiro Novato o recebeu com seu escudo, jogando seu peso para trás em um
golpe de corpo. Seu braço esquerdo, aquele que usava o escudo, formigou com
o impacto do pedaço de carne pesando quase dez quilos.
— Ora… seu…!
Mas Guerreiro Novato tinha a vantagem se tratando de peso corporal.
Ele se apoiou contra a passarela suja para evitar cair, então moveu sua clava de
cima para baixo na cabeça do rato.
Não havia nenhuma técnica, nenhum segredo. Uma briga de beco tinha mais
sofisticação.
— GYU?!
Houve um crack como o quebrar de um galho molhado quando a coluna do rato
quebrou. Outro golpe. O rato gigante se contorceu.
Ele verificou que os olhos do rato estavam em branco, e só então Guerreiro
Novato finalmente limpou o suor de sua testa.
— O-o que houve com o o-outro…?!
— Ele já correu.
Guerreiro Novato sondou a área, enquanto a garota segurando nervosamente a
espada-e-balança suspirou.
Ela andou rapidamente até ele e com um olhar atento checou o garoto em busca
de ferimentos.
Guerreiro Novato fechou sua mão para confirmar se ainda estava respondendo,
depois a abriu; então ele moveu seus braços e pernas também.
Ele estava sem ferimentos. Ele não fora mordido. O rato estava espumando
sangue, mas nada dela era sangue dele.
— Estou… bem.
— …Parece que sim.
Bom. Sacerdotisa Aprendiz assentiu. Eles não precisariam usar seu antídoto ou
qualquer um dos seus itens de cura.
— Então, como serviu a clava?
— Ainda não tenho certeza… — Guerreiro Novato fez um movimento
descuidado com a arma. Ela não era afiada como uma espada, mas era mais
pesada que uma, e isso trazia uma curiosa confiança. — Mas sei que se eu acertar
alguma coisa com ela, vai morrer.
Ele não pôde evitar de suspirar, pensando em quão distante estava da atitude
descontraída de Lanceiro ou a firmeza de Guerreiro de Armadura Pesada.
Foi só um rato.
Mas era um bom começo.
— O que a vela diz?
— Hum… seria esse caminho um pouco mais quente?
Cada vez que eles chegavam a uma bifurcação no caminho, Sacerdotisa Aprendiz
ergueria a vela para encontrar a direção correta e então eles prosseguiriam.
Infelizmente — senão previsivelmente — a espada não estava onde eles haviam
deixado depois do combate do dia anterior. Talvez os ratos gigantes tivessem a
levado embora ou as baratas gigantes a empurraram para o lado…
— Eles não são goblins… Eles não ficam acumulando saques.
— Ei, não diga isso, até assusta. — Sacerdotisa Aprendiz fez cara feia para
Guerreiro Novato e lhe deu uma cotovelada. — Se eles fossem realmente goblins
vivendo debaixo dessa cidade, não seria engraçado.
— Com certeza.
Então eles teriam que pedir a Matador de Goblins mais do que apenas conselhos.
Eles continuaram sua busca diligentemente, se queixando do fedor.
Ao longo do caminho, eles encontraram — e despacharam — um total de três
ratos gigantes. E uma barata gigante.
A clava logo estava coberta por uma gosma espessa, já contando da história de
suas batalhas.
— Acho que não pensei em como isso traria sangue e… isso são miolos?
…espatifados?
— Bem, você viu quão sujo esse rapaz goblin… — se interrompeu Sacerdotisa
Aprendiz. — Quão sujo Matador de Goblins ficou.
A nova arma também era pesada, e ter que brandi-la sem parar em batalha o
cansava muito mais depressa que uma espada.
— Mas eu gosto de como posso movê-la sem ter que mirar.
— Só não tente perdê-la nem nada.
— É…
Guerreiro Novato grunhiu concordando com essa opinião enquanto espreitava
por uma esquina.
Parecia haver apenas ratos de tamanho normal lá no momento, então não havia
problemas.
Acenando para Sacerdotisa Aprendiz atrás dele, ele foi em frente com um passo
de cada vez.
Sacerdotisa Aprendiz deu um pequeno ganido com as longas caudas dos ratos
enquanto eles pisavam ao redor dos roedores.
— Ah, sim…
— O que foi? Tem outro comentário estúpido a fazer?
— Não. — Guerreiro Novato balançou a cabeça apressadamente, verificou à
esquerda e à direita para garantir que estavam seguros, então se sentou no
caminho. — Temos algum barbante?
— Corda serve?
— Grossa demais.
— Tenho alguns barbantes para segurar meu cabelo…
— Obrigado.
Ela vasculhou a bolsa, então entregou o laço de cabelo para ele, dizendo “Não se
esqueça de me devolver”. Depois ela se agachou perto de Guerreiro Novato e
observou atentamente enquanto ele fazia alguma coisa.
— Quando arranjarmos dinheiro, eu te compro outro.
— Vai sair da sua parte, está bem?
— Sim, claro.
O serviço estava bom, mas muito simples. Ele enrolou o barbante firmemente ao
redor do cabo da clava até formar um laço de um tamanho específico.
Quando ele pôs a mão por ele para segurar a clava…
— Viu? Agora não vou deixar cair.
— Humm… — Sacerdotisa Aprendiz inspecionou atentamente a precinta
improvisada, então deu um bufo. — Esse é um bom serviço, vindo de você.
— Ai, isso dói.
— Quando voltarmos, vou colocar um melhor para você.
Sacerdotisa Aprendiz se levantou com uma gargalhada, mas quando ela ergueu
a vela para verificar…
— Uoo, caramba!
…ela quase deixou cair, ajustando desesperadamente sua mão para segurá-la.
— Ei, qual o problema? — Guerreiro Novato também se levantou, segurando a
clava no caso de haver problemas.
Ele era inexperiente, mesmo assim olhou ao redor cuidadosamente, com o
escudo erguido. A garota balançou a cabeça.
— N-não foi nada. É só que… a vela está ficando cada vez mais quente.
— Está ficando mais quente? Então isso quer dizer…
Ele podia ver que a chama branca azulada da Vela de Busca se tornara
visivelmente maior.
Guerreiro Novato e Sacerdotisa Aprendiz olharam um para o outro.
— Devemos estar chegando perto.
Foi a boa sorte com crítico que lhe permitiu pressentir que algo estava vindo
neles de cima.
Guerreiro Novato se moveu de imediato para cobrir Sacerdotisa Aprendiz, lhe
dando um empurrão enquanto ambos saiam do caminho.
— Agh! O-o que está…!
— Idiota, olhe!
Era como uma enorme massa preta.
Devia ter dois metros de comprimento, quase o dobro do tamanho normal. Tinha
uma carapaça lustrosa e seis pernas espinhadas, enquanto agitava as antenas que
pareciam pedaços finos de fio de aço e rangia as mandíbulas com dentes afiados.
— O que a vela diz…?!
— Está realmente quente!
— Não me diga que está dentro dessa coisa!
O inseto — era para lá de gigante, uma barata imensa — avançou na direção
deles. Os dois gritaram e começaram a correr.
— O-o que fazemos?!
— Gostaria de saber…!
O enorme inseto negro que rastejava indiscriminadamente pelo teto, chão e
paredes era mais do que um pouco assustador.
A perseguição em si não era a única coisa assustadora. Era a ideia de ser comida
por aquela criatura.
Eles não haviam se tornado aventureiros só para se tornar um banquete para ratos
ou baratas…!
— Vai nos apanhar nesse ritmo…!
Eles ainda só estavam seguros enquanto corriam desesperadamente pelos esgotos
graças a velocidade da sua reação e a distância que tinham no início.
Uma barata gigante estava longe de ser tão ágil quanto um humano, pelo menos
não um aventureiro ranque Porcelana.
Mas era óbvio que eles não tinham muito tempo antes de serem apanhados e
devorados.
Temos que chegar à superfície antes… Não, nunca vamos conseguir…!
Eles teriam que subir uma escada para chegar ao solo. Se fossem atacados nesse
momento, estaria acabado. Baratas normais poderiam voar. As gigantes
provavelmente poderiam também.
— E se nós pulássemos na água?!
— Muita coisa boa nos faria se pegássemos a peste!
— Tudo bem então… Um túnel estreito! Talvez não seja capaz de nos seguir!
— Não vai dar certo! Baratas são extremamente flexíveis.
Uma passagem estreita poderia dar a eles um momento de trégua, mas depois o
inseto se espremeria com eles. Só de pensar era o suficiente para dar a ele um
calafrio. Nada de túneis então.
— Temos que lutar!
— Mas como?!
O rastejar o tornava visceralmente enjoado, e estava ficando mais perto.
Guerreiro Novato olhou para a clava em sua mão.
Se ele atingisse a barata várias vezes, ela morreria. Ele estava certo disso. Mas
como fazer isso?
Se eu só brandir até ela, nunca acertarei.
Ela era muito rápida. Se ele não pudesse impedi-la de se mover, a batalha seria
impossível. Ele simplesmente não tinha a habilidade.
— E-ei! Acha que poderia acertá-la com Punição Sagrada?!
— Não sei…! São os deuses que apontam a magia, não eu!
— E se ela estivesse vindo direto para você?!
— Nesse caso, talvez…!
— Certo!
Agora ele teria que pensar rápido. Se ele ia fazer isso, ele não poderia hesitar.
Guerreiro Novato pegou o lampião da cintura de Sacerdotisa Aprendiz.
— Quê! E-ei, o que está…?!
— Você pode me xingar se sobrevivermos!
Gritando ainda mais alto que Sacerdotisa Aprendiz, Guerreiro Novato olhou para
trás.
O inseto gigantesco estava bem ali, com gosma escorrendo de suas mandíbulas
rangendo.
Guerreiro Novato respirou fundo.
— Experimente isso!
E então ele jogou o lampião bem na frente do inseto.
O impacto com o chão despedaçou o anteparo medíocre do lampião, e o fogo se
alastrou da chama de dentro.
A barata enorme deu um berro, abrindo as asas e levantando voo. A visão em si
era o suficiente para eles perderem a vontade de lutar.
Guerreiro Novato sentiu algo quente e molhado nas calças. Ele forçou seu
maxilar para parar seus dentes de rangerem.
— Agora… faça!
— Ee… ehh… ahhh…!
Em resposta ao grito de Guerreiro Novato, Sacerdotisa Aprendiz, que estava
tremendo e muda, ergueu sua espada-e-balança.
— Senhor do julgamento, príncipe da espada, portador da balança, mostre aqui
o seu poder!
Um raio crepitante avançou direto no inseto imundo.
Houve um estalo de trovão e uma luz azulada e brilhante baniu a escuridão difusa
do esgoto. O milagre durou apenas um só instante.
A fumaça que fedia a ozônio e quitina queimada eclodiu do monstro, revirando
seus estômagos.
A barata imensa caiu no chão com seu abdômen horrivelmente exposto, se
esforçando para se erguer de novo com seus seis membros.
— I-iii… iaaaaaahhh!
Guerreiro Novato ergueu sua clava e pulou nela. Ele foi até o abdômen negro,
ignorando as pernas espinhosas o arranhando, e enfiou seu escudo contra as
mandíbulas dela. Pinças negras tentaram perfurar o couro oleado, mas nada mais
do que isso. Com um grito animal, ele ergueu a clava e golpeou e golpeou,
atacando, quebrando, de novo e de novo.
Ele não prestou atenção na gosma que voava das mandíbulas da barata, nem do
sangue vazando de seus arranhões. Se prestasse, ele seria morto.
O cabo suado escorregou de sua mão. O barbante que amarrara ao redor dele lhe
permitiu recuperar o controle. E ele atacou de novo.
Ataca e ataca e ataca e ataca e ataca e ataca. Aconteça o que acontecer, apenas
ataque. Tantos golpes quanto possíveis. Bata nela até morrer.
— Huu… ahh… huff… ahh…
Por fim, ele chegou ao limite. Ele já não tinha mais fôlego suficiente.
Ele tentou clarear as ideias, com a visão avermelhada pelo calor do corpo, mas o
esforço lhe desenvolveu tontura. Então Sacerdotisa Aprendiz apareceu, o
apoiando assim quando pensou que ele iria cair.
— Você… você está bem…?!
— Acho… acho que sim.
O garoto percebeu que estava coberto da cabeça aos pés de fluidos de barata. Sua
mão direita, que segurava a clava, estava particularmente mal.
Onde a cabeça do inseto deveria estar, só havia uma poça dispersa de fluidos.
As seis pernas, se contorcendo com os últimos vestígios de vida, ainda eram de
recear.
— Ainda… está viva…? — perguntou Sacerdotisa Aprendiz.
— F-fique longe. É… perigoso.
Guerreiro Novato engoliu em seco, então retirou sua adaga do cinto. Ele a usou
para cortar cada perna na menor articulação até que finalmente rompesse. Ele
tinha que fazer isso, ou não estariam seguros. Ele fez isso seis vezes, até que seus
dedos ficaram rígidos e terrivelmente doloridos. Mas ainda não estava acabado.
— Hum… o abdômen, certo?
Ele segurou a adaga inversamente com as duas mãos, a levantou e então desceu.
Houve um fsssh e um jato de fluido do corpo.
A lâmina acertou alguma coisa dura, e então Guerreiro Novato se preparou e
alcançou o estômago da barata. Ele puxou algo para fora.
— Encontrei…
Ele não tinha ideia do que a criatura estava pensando quando comeu isso. Mas a
espada que ele pegou era inequivocamente a que ele havia comprada tão
ansiosamente, sua primeira espada.
— …A partir de hoje, talvez chamarei essa espada de Estoura-Peito e essa clava
de Matadora de Baratas. O que você acha?
— Eu acho que deveria parar de falar estupidez e beber esse antídoto, e depois
devíamos ir para casa.
O menino estava uma figura patética, cada centímetro dele coberto de gosma.
Algumas dessas coisas havia caído na cintura da garota, que fora despida quando
o lampião foi arrancado, e estava fumegando ali.
Os dois fingiram não notar nenhuma dessas coisas enquanto trocavam um sorriso
irônico com sua grande vitória.
— Ai-ai…
O sol estava se pondo na cidade fronteiriça.
Os dois tinham se lavado dos pés à cabeça no rio — evitando cuidadosamente
qualquer relance uns dos outros com apenas suas roupas íntimas — e depois
foram à Guilda fazer seu relatório.
Eles verificaram seus equipamentos, reabasteceram os suprimentos que usaram,
cuidaram de seus arranhões e finalmente pagaram por um lugar simples para
dormir.
No fim, tudo o que restou eram várias peças de prata que Guerreiro Novato
segurava atualmente nas mãos.
Essa seria suas economias. Mas… quanto é que conseguimos salvar?
Agachado na porta da Guilda dos Aventureiros, Guerreiro Novato também sentiu
vontade de suspirar.
— Ei, por que está olhando para o nada afinal?
— Hmm…
Sacerdotisa Aprendiz, pressionando uma toalha em seus cabelos molhados,
estava bem ao lado dele.
Guerreiro Novato não respondeu, com seu foco nas pessoas indo e vindo pela
porta.
Aventureiros de todas as espécies estavam saindo até a cidade com seus itens
especiais ou vindo à Guilda. Cada um estava cheio de equipamentos, com fadiga
misturada com um sentimento de realização em seus rostos.
O garoto e a garota ainda não tinham experiência suficiente para perceber que
isso significava que nenhum aventureiro morrera naquele dia.
— Só estava… pensando que temos um longo caminho a percorrer.
— Bem, obviamente — disse Sacerdotisa Aprendiz bufando e se sentando ao seu
lado. — Um pequeno progresso a cada dia! O problema começa quando quer
mais do que isso.
— B-bem, claro, mas…
— Dê o seu melhor, se sacrifique, ganhe dinheiro e viva a sua vida. Não pode
reclamar disso, pode?
— B-bem, claro, mas… — As peças de prata em sua mão tremeluziam na luz de
fim do dia. Os lampejos brilhantes do metal machucavam seus olhos. —
…Temos um longo caminho a percorrer.
— …É verdade.
Mas eu… até eu… fui capaz de lidar com alguns ratos e baratas gigantes hoje.
Não seria uma grande lenda, mas não havia como negar que ele tinha colocado
sua vida em risco.
— Muito bem! Vamos comer uma refeição decente! — disse ele, e jogou as
moedas para Sacerdotisa Aprendiz.
— …Sim. Acho que podemos desfrutar um pouco hoje.
Algum dia… algum dia… algum dia.
Eles queriam ser bravos. Eles queriam ser heróis.
Eles queriam ser aventureiros que pudessem derrotar um dragão.
As moedas chacoalharam na palma da garota enquanto ela se levantava.
Capítulo 2: De um Certo
Menino

— Vamos, até que horas você vai dormi? Acorda!


O garoto ouviu a voz familiar de sua irmã mais velha no ar da manhã.
Ele se moveu preguiçosamente com muitos oof, aaah e outros sons inarticulados,
até que uma luz forte penetrou seus olhos.
O amanhecer… era a manhã.
— Já é de manhã?!
O garoto se apressou para fora da cama de palha e deu uma bela esticada.
Ele expirou um pouco de ar que estava frio e confortável. Um aroma cheiroso de
algum tipo flutuava até ele.
Pão!
Era o café da manhã.
— Se você não se apressar e se levantar, não vai sobrar nenhum café da manhã!
— Eu sei! — gritou ele de volta à sua irmã, depois mudou rapidamente suas
roupas.
Se já estava de manhã, então ele não poderia perder nem mais um minuto, nem
mais um segundo. Além disso, ele estava com fome.
Quando fecho os olhos, a manhã chega de imediato… então por que fico com
tanta fome?
Talvez sua irmã saberia. Ele queria perguntar, mas nesse momento o café da
manhã era mais importante.
— Dia, Mana!
— Acho que você quer dizer bom-dia — disse ela quando ele veio voando para
a cozinha (e a sala e a sala de jantar, era uma casa pequena). — Céus. É por isso
que temos de ter ela cuidando de você.
— Tsc… Ela não tem nada a ver com isso. — Quando a irmã se referiu a sua
amiga de longa data que vivia na casa ao lado, o garoto pôs a mesma expressão
aborrecida dela.
A vizinha era mais nova que ele, mas ela podia fazer quase tudo, então todo
mundo o tratava como mais jovem e a fizeram responsável por ele. Ele ia se
queixar com sua irmã sobre isso, mas ela só iria sorrir. Era de esperar que uma
irmã mais velha poderia levar os sentimentos de seu irmão mais novo um pouco
mais em consideração.
— Esqueça isso, apenas coma.
— …Sim, Mana.
Sua objeção foi impiedosamente rejeitada e ela gesticulou com uma colher
grande para ele se sentar à mesa.
Os pratos na mesa incluíam pão — ainda fumegando — e uma sopa feita de leite.
Havia ovos fritos nos dias em que as galinhas botavam, mas não acontecia com
frequência. Sua comida favorita era guisado, que eles só poderiam fazer quando
matavam uma das galinhas.
O estômago dele doía só com o cheiro delicioso.
Ele pegou a colher, determinado a não deixar nada esfriar.
— Ei, faça suas orações! — disse sua irmã, que parecia ter olhos nas costas,
enquanto checava a sopa.
O garoto colocou com pesar a colher de volta na mesa e juntou as mãos.
— Ó, Aquele que é maior que os rios e mais vasto que os mares, obrigado por
nos conceder a sabedoria para obter esse alimento.
— Bem, está bom!
Era típico nessas aldeias pioneiras acreditar na Mãe Terra, e o garoto se
orgulhava do fato que sua família era diferente. Sua irmã aprendera a ler, escrever
e fazer contas no templo do Deus do Conhecimento e ainda começou a ensinar
ali pessoalmente. Era o que permitia sobreviverem mesmo após a morte de seus
pais, e por isso, tinham que dar graças à divindade.
Mas…, pensou o garoto. Ele bebeu um pouco de sopa, depois arrancou um
pedaço do pão e molhou antes de comer. Eu, eu quero ser um aventureiro.
Certamente não era algo que ele poderia dizer a sua irmã.
— Só não se esqueça de não ir para a Floresta Oriental!
— Eu sei!
— Volte ao meio-dia para ir ao templo!
— Eu sei, eu sei!
Com a sua irmã o avisando por detrás, o garoto partiu por um caminho que ele
conhecia desde o nascimento.
Bem, talvez não exatamente desde o nascimento…
Nas suas costas balançava a espada de madeira que sua irmã lhe dera
recentemente de aniversário. Uma de suas brincadeiras favoritas nesses dias era
brandir ela por aí fingindo que era um aventureiro. Claro, em sua cabeça, não era
fingir.
Meu grupo hoje é pequeno.
A garota vizinha estava indo para a cidade nesse dia. Injusto. Muito injusto.
— Nem eu nunca fui à cidade ainda. — Ele sacou a espada e deu alguns golpes
descuidados nos arbustos.
— Tu aí, garoto! Não fique balançando essa coisa onde tem pessoas, é perigoso!
É claro, um fazendeiro de meia-idade de pé ali por perto o avistou e gritou. Ele
devia estar regando seus campos. Houve um som quando ele esticou seus quadris
inclinados.
— …Sim, senhor. — O garoto entendia que o que fazia refletia em sua irmã,
então ele embainhou obedientemente a espada. — Desculpe.
— Tenha cuidado. — Batendo gentilmente na sua região inferior das costas, o
fazendeiro começou a se afastar do campo, sorrindo por estar em uma pequena
pausa. Ele veio até o garoto e soltou um longo suspiro, pegando uma toalha de
mão da cintura e limpando o rosto. Ele estava coberto de terra, poeira, barro e
suor, e o pano ficou rapidamente manchado de marrom.
— Onde está aquela garota que está sempre com você?
— Ela? Ela está na cidade hoje — disse o garoto com um toque de
aborrecimento, mas o fazendeiro apenas assentiu.
— É mesmo? Entendi… Ela é muito doce. Talvez ela tenha ido buscar algumas
roupas bonitas na cidade. Aproveite a expectativa, garoto.
— Não acho que ela fique bem em coisas chiques. — Ele estufou as bochechas.
O fazendeiro lhe deu uns tapinhas com uma mão calejada e suja. Com a visão do
garoto assim, o fazendeiro começou a rir de novo.
— Bem, espere até ver ela. Guarde isso para si mesmo por enquanto.
— Hmm…
— Diga, garoto. Você vai no templo ao meio-dia, não é?
— An-ham. Mana diz que tenho que estudar.
— Ela tem razão o suficiente quanto a isso. — O fazendeiro assentiu, então
franziu a testa e bateu suavemente na parte inferior das costas com o punho. —
Por acaso, meus quadris estão me incomodando de novo. Diga aos monges que
preciso de um pouco de medicamento.
— Claro. Medicamento para seus quadris, entendi.
O garoto assentiu e o rosto cansado do fazendeiro desabrochou em um sorriso.
— Bom garoto — disse ele. — Ah, e garoto. Você já foi avisado para ficar longe
da Floresta Oriental, não foi?
— Sim, fui — disse o garoto, inclinando a cabeça. Agora que ele pensou nisso…
— Mas por que é que não posso ir lá?
— O quê, sua irmã não te contou?
— Não. Nunca perguntei.
— Nessa Floresta Oriental… — O fazendeiro cruzou os braços seriamente,
dando um suspiro profundo. — …Há goblins lá.
— Um aventureiro, hum? Será que eles nos ajudarão?
Seguindo o caminho rudimentar para fora da vila pioneira havia uma floresta
densa e escura.
Na entrada tremia um dos jovens da aldeia, embora eles tivessem mais de trinta
anos.
Aquele que falou segurava uma velha lança enferrujada, mas ele parecia inquieto
e não muito seguro. Havia, afinal, mais de dez anos desde que fora à guerra
carregando essa arma. E mesmo assim, a batalha terminara enquanto ele ainda
estava na retaguarda, e a coisa todo não deu em nada.
Agora, qualquer um na aldeia que tivesse o mínimo de experiência em batalha
fora chamado para enfrentar os goblins, mas eles não estavam muito bem
preparados.
— A Guilda pode dar sua promessa, mas tenho certeza de que não quero esbarrar
com nenhum bandido…
— E eu, eu tenho medo de magia negra…
As vozes sussurrantes pertenciam aos dois homens na casa dos vinte anos que
pareciam ansiosos.
Eles seguravam machados feitos para cortar lenha, e os ajustavam e reajustavam
impacientemente nas mãos.
— Ouvi dizer que não se pode baixar a guarda para as moças também, ou elas
sugarão a alma de você!
— É, também ouvi dizer isso — disse um antigo soldado mais baixo que pôde.
— Tinha uma jovem na aldeia dos fabricantes de seda através da cordilheira?
— Ah, sim, tinha.
— Bem, ela disse que não queria uma vida longa comendo pão duro. Ela iria
viver uma vida boa e curta como uma aventureira.
— Deixou a casa, né?
— Certamente. Mas sabe do que mais, foi realmente porque ela estava A-P-A-I-
X-O-N-A-D-A por uma elfa, uma feiticeira que viera à aldeia.
— Ah, caramba…
— É claro, às vezes é ao contrário. Garotas são pegas e estupradas o tempo todo
por aventureiros que vêm para sua aldeia, não é?
— Acho que você já disse besteiras o suficiente. Meu avô não disse? — O líder
do grupo, um homem de vinte e poucos anos que parecia ser provavelmente o
próximo chefe da aldeia, falou com uma expressão séria. — As únicas aldeias
que sobreviveram a um ataque goblin foram as que contrataram aventureiros.
— É, mas…
— Ou deveríamos enviar aos diabinhos a sua filha como uma oferenda?
— Olha…
— Você deve ter ao menos ouvido a história do mercador viajante cuja filha foi
levada.
O antigo soldado concordou enquanto o homem tímido choramingava que isso
não foi bom, que nem sequer suportava pensar.
— O que sei é que meu avô não está errado. Ele sabe muito mais sobre combate
do que eu.
— É, mas… mas eles são goblins. Não temos que contratar nenhum aventureiro,
certo? Se apenas o deixarmos em paz, não vai…?
— Quando um ou dois aparecem, você pode os afugentar. Goblins não são nada
demais. — Seu líder balançou a cabeça, ainda parecendo sério. — Mas vovô
disse que quando eles começam a montar um ninho… eles virão atrás de nossas
esposas e filhas.
— É…
— Mas, olhe. Não é muito esperar que possamos matar todos os goblins nós
mesmos, hum? — Quando o antigo soldado falou, o homem tímido deu um
gritinho como se estivesse enfrentando a morte naquele momento.
— Co-co-co-co-com certeza, não podemos — disse ele. — Talvez eu pudesse
enxotar um goblin que viesse à aldeia, mas…
— Bem, é isso aí — disse o antigo soldado. — É dessa forma que os aventureiros
colocam comida na mesa… deixe-os lidarem com isso.
— Tsc — murmurou o líder — mas que chorão, covarde…
— Vamos, você tem que pensar nos sentimentos dele — disse normalmente o
antigo soldado, protegendo o homem tímido da chacota. — Sabemos que é noivo
da filha do chefe, e você está pronto para o futuro, mas nem todos têm isso a
favor.
Face a esse argumento, todo mundo se calou, incluindo o líder.
Os jovens da aldeia eram todos fascinados por aventureiros. Eles queriam amar
as mulheres, comer comida deliciosa, viver uma vida boa. Eles não queriam
passar a vida arando a terra do país. Eles achavam melhor lutar com um dragão.
A prontidão para enfrentar a morte vinha facilmente aos seus lábios, quando não
no coração.
E as jovens eram muito parecidas. Tudo o que podiam aguardar ansiosas era se
tornar uma das cabeça-ocas que não tinham nada além da casa e trabalho na
fazenda para fazer, ou servir o deus no templo para rezar até o momento da sua
morte. Se tivessem azar, poderiam ser atacadas e estupradas por bandidos ou algo
assim, ou ficarem tão pobres que se vender se tornaria a única saída…
Então por que não deveriam preferir passar a noite sonhando com um
aventureiro, ou abraçar a fantasia de viajar com um? A mais forte entre elas
poderia até querer reivindicar seus direitos como aventureira, como os homens.
— Bem, qualquer um se preocuparia com a própria filha, irmã, filho ou irmão.
A vida pioneira na fronteira era cruel.
Monstros estavam sempre aparecendo, e você não poderia contar com o exército
vir e te proteger. Sua Majestade o rei, cujo rosto nunca sequer foi visto, estava
certamente ocupado lidando com dragões, deuses das trevas e coisa assim.
Um templo onde eles rezavam aos deuses em seu nome poderia ser construído
como medida de apoio, e talvez isso fosse reconfortante, de certa forma.
E havia impostos. A chuva caia, o vento soprava, o sol brilhava. Alguns dias
eram nublados. E havia goblins.
Se o dinheiro esgotasse, havia sempre a prostituição ou uma viajem para algum
lugar para encontrar trabalho… e para os jovens, era normal sonhar em se tornar
aventureiro.
Se fosse o que queriam, eles poderiam tentar se tornar empregados na Guilda dos
Aventureiros na Capital…
Mas sem educação ou dinheiro, isso, também, era apenas um sonho dentro de
outro sonho.
— Espero que um aventureiro bom e forte venha até nós…
— Espera? É por isso que o rei gasta os nossos impostos construindo Guildas.
Não precisa se preocupar.
— …É.
Mas premente do que seus sonhos ou dinheiro, eram os goblins que estavam bem
próximos.
Os três jovens olharam um para o outro, depois suspiraram profundamente.
Provavelmente foi por isso que nenhum deles notou o garoto se esgueirando
silenciosamente na floresta, completamente só.
Goblins.
O que era exatamente essas criaturas que os adultos tinham tanto medo?
O garoto nunca vira um, então agora ele queria dar uma olhada.
Assim eu vou ter algo para me gabar!
Era a simples lógica de uma criança.
Ele ouvira dizer que os goblins eram os monstros mais fracos. Ele sabia, também,
que quando um ou dois apareciam na aldeia, os adultos o expulsavam.
Se isso fosse verdade, talvez ele pudesse lidar com eles.
E se pudesse…
Eu poderia me gabar ainda mais!
O garoto andava descuidadamente por uma trilha familiar, agitando sua espada
de madeira.
Os humanos não faziam uso dessa floresta, e estava escuro mesmo ao meio-dia.
As árvores eram densas; os odores de musgo e animais se misturavam no ar.
Ele fora avisado frequentemente que era perigoso, mas hoje estava especialmente
perturbador. Mas o perigo e a estranheza eram porque ele vinha muitas vezes
aqui para brincar.
— … Hum?
O garoto parou quando viu uma série de pegadas desconhecidas no lugar que
sempre brincava. Elas eram maiores que as de sua amiga e do mesmo tamanho
que as suas. Elas não eram de lobo, de raposa ou de veado.
— …Um goblin?
No momento em que ele disse, o vento soprou pela grama e folhas.
Ele engoliu em seco. Ele descobriu de repente que sua boca estava seca e sua
garganta doía.
As palmas do garoto começaram a suar e ele reajustou rapidamente sua mão na
espada.
— S-se estiver aí, então v-venha me pegar…!
Atuando como corajoso — embora ele não considerasse estar atuando — o
garoto fez o que pôde para parecer preparado.
O vento soprou de novo, levando um cheiro úmido e fétido com isso.
Onde está ele?
O garoto inspirou fundo e soltou. Eventualmente, ele começou a se mover de
novo.
Ele balançou sua espada sem nenhuma razão, limpando os arbusto e galhos, e
acertando as raízes.
Nada aconteceu. Havia apenas o silêncio de uma floresta silenciosa.
Nenhum aqui?
— Pff, eu o espantei…
O garoto limpou a testa com um movimento exagerado e secou as mãos na
camisa. Ao tocar ela, ele percebeu que o tecido estava ensopado de suor e seu
coração batia forte.
Ele engoliu em seco de novo e balançou a cabeça. Ele levantou a voz como se
quisesse se tranquilizar.
— T-tudo bem, vamos voltar. Não quero preocupar Mana!
Ele se virou… e viu um goblin agitando uma clava.
— Ah… ahh…
— GORRB?!
O goblin parecia quase tão surpreso quanto ele. Ele congelou com a clava no ar.
A criatura era da altura dele, com a boca e olhos sujos. Pele verde-clara. E hálito
de carne podre.
— Um g-g-goblin?!
— GB?!
Sua espada de madeira, que ele brandiu reflexivamente no pavor, bateu na cabeça
da criatura com um tac seco.
O pensamento que atravessou a cabeça dele foi: Eu consegui! E o sentimento que
percorria seu instinto era: Ah, não… Mas isso era tarde demais.
— GGGGG…
O goblin se levantou instavelmente, segurando a cabeça. Ele expeliu um pouco
de sangue. O garoto se engasgou.
— GOORBOGOOROROB!!
O goblin deu um uivo com os olhos com raiva, e no mesmo instante o garoto
fugiu como um coelho assustado.
Corre, corre, corre, corre. Tropeçar, quase cair, na verdade cair, se apressar em
se pôr de pé e correr. Ele nem sequer sabia se estava saindo da floresta ou se
aprofundando nela. Depois que ele estava fora da trilha, não havia como dizer
em que direção estava indo nessa floresta.
— Ooof… ahhh…!
Ele estava sem fôlego. Ele estava com falta de ar. Sua garganta fisgava. Seu
corpo inteiro doía. Seus pés estavam pesados. Mas ele correu.
Não havia tempo para olhar para trás. Ele não ouvia a voz do goblin, mas poderia
ser por causa do zumbido nos ouvidos.
— Ah! Q-que…?!
O garoto chegara a um lugar onde nunca tinha visto.
Uma clareira, bem no meio da floresta. Sempre esteve ali?
E não só isso, e pensar que havia uma caverna!
Engolindo ar desesperadamente com a cabeça girando, o garoto rastejou para o
arbusto. Não era com intenção de se esconder. Ele simplesmente não conseguia
dar outro passo.
Sua respiração era vagamente audível enquanto se esforçava para se controlar.
Então…
— ……?
Ele ouviu passos ousados e despreocupados.
Ele espiou na direção do som, então bateu com as mãos na boca para abafar o
“Oh!” que lhe escapou.
Goblins.
Dois deles, e nenhum deles havia uma ferida na cabeça. Isso tornava três então?
— GORBBRB…
— GROB! GBRROB!
Eles tagarelavam um ao outro, agitando as clavas em suas mãos, depois deram
uma risada suja.
O garoto não podia entender a língua deles, mas podia supor o que diziam.
Porque ele mesmo dissera coisas parecidas, se esquentando para quando
houvesse a luta por vir.
Estão indo para a vila!
Ele tinha que avisar a todos.
Seus pés se moveram sem que se desse conta. E quando se moveram, o arbusto
farfalhou.
— GBRO…?
Tarde demais.
Os olhos amarelos hediondo dos goblins se viraram para o mato onde o garoto
estava congelado.
Um dedo atarracado apontou e o outro goblin deu uma gargalhada maligna e
aguda.
Um passo, outro. Os dois goblins se aproximavam.
Os dentes do garoto rangiam. De alguma forma, ele conseguira agarrar sua
espada de madeira. Ele tinha que correr. Ele tinha que…
Mas como?
— GBOROBR?!
No instante seguinte, uma espada emergiu da garganta do goblin mais distante.
— GORB?!
O outro goblin se virou para o grito do companheiro.
Bem atrás da criatura que tentava agarrar o ar, esguichando sangue enquanto
caia, o garoto o viu.
Ele era — tinha que ser — um aventureiro.
Um capacete de aço que parecia medíocre. Uma armadura de couro suja. Um
escudo pequeno e redondo estava fixado no braço esquerdo, e ele segurava uma
espada de tamanho estranho.
Ele não era nada parecido com os gloriosos aventureiros de fantasia ou os
cafajestes que visitavam sua aldeia às vezes.
E ainda assim ele era, sem dúvida, um aventureiro.
— Esse é um.
A voz era baixa e fria, quase mecânica. O garoto não sabia como chegara aos
seus ouvidos.
O outro goblin ficou desnorteado. O monstro olhou primeiro para a clava na mão,
depois para o aventureiro, então para a entrada da caverna.
E ele começou a correr para a entrada.
Vingança, raiva e medo o levaram a fazer isso pelos seus companheiros.
Nesse tempo, o aventureiro puxou a espada do cadáver do goblin morto.
— Dois.
Ele a ergueu e lançou.
— GOROB?!
O goblin foi arremessado para a frente, se contorcendo, com a lâmina perfurando
sua coluna vertebral, embora o garoto sequer soubesse o que uma coluna
vertebral era.
Por fim, a criatura no chão se contorceu de novo, então ficou imóvel.
— Hmm.
O aventureiro deu um grunhido baixo e caminhou até os dois corpos com passos
ousados e despreocupados.
Ele arrancou a espada, retirando filamentos de matéria cinzenta com isso, então
estalou a língua e a jogou longe.
Em vez disso, o garoto o observou pegar algo como uma adaga do cinto de um
dos goblins.
— Oh…!
Não… Você não pode… Há mais… As palavras foram saindo dele de uma vez
só.
— Ainda há outro goblin por aí!
A reação do aventureiro foi rápida demais para se ver. Ele girou, ergueu a adaga
e apontou, tudo em um único movimento. Houve um assobio de vento, um grito
ainda em formação e uma pancada seca de alguma coisa pesada caindo no chão.
— GBOROB?!
O goblin de mais cedo estava atrás dele, não muito longe, engasgando e se
asfixiando no sangue saindo da garganta.
— Oh…!
Só então o garoto percebeu quão perto estivera de se matar.
A espada de madeira escorregou de suas mãos trêmulas, caindo no chão a seus
pés.
— Esse é três então.
Esmagando a grama e empurrando para o lado os arbustos, o aventureiro se
aproximou. Sua luva de couro surrada pegou a arma de madeira do chão, depois
a estendeu para o garoto.
— Hã? Ahh…?
— Desculpe. — Quando o garoto pegou vagamente a espada, o aventureiro
continuou, calmamente e friamente, mas inequivocamente. — Obrigado pela
ajuda.
Ele foi para a caverna sem olhar para trás, e o garoto observava-o ir.
— Por quê, você…! E depois de te dizer todas aquelas vezes para não ir à
floresta!
— Eu sinto muito, Mana!
Ele correra para o templo e tentou se encobrir, mas sua irmã logo descobriu tudo.
Afinal de contas, não havia outro lugar que ele poderia brincar que o deixava
coberto de arranhões.
Ela o arrastou pela orelha até a casa onde ele suportou uma chuva de sermões,
um pouco de curativos e depois o jantar.
A pomada que ela usou ardia terrivelmente. Ela o envolveu com ataduras e
finalmente lhe deu uma boa palmada que o deixou pulando sobre um pé no ar.
Honestamente, ele gostaria que ela fosse só um pouco mais gentil com ele, mas
não conseguia dizer a ela.
— Céus e tudo mais. Você sempre diz “eu sei, eu sei”, mas não sabe de nada.
Essas pequenas declarações aconteciam o tempo todo enquanto comiam, até que
sua irmã finalmente deu um longo suspiro.
— De todo modo… pelo menos você não ficou muito machucado.
Então ela sorriu de alívio.
Eu realmente a preocupei.
O garoto sentiu uma pequena pontado no peito com o pensamento.
— Hum… e quanto aos goblins?
— Não se preocupe com eles. Aquele aventureiro se livrou de todos eles.
Sua irmã sorriu tão intensamente quanto o sol, então fez uma careta e apontou
para o quarto dele.
— Isso quer dizer que não há mais razão para se manter acordado à noite… então
vá dormir! Sua amiga estará de volta amanhã, não é?
— Ah, sim!
O garoto pulou de sua cadeira, mas com a mão na porta do quarto, ele se virou.
— Boa noite, Mana. E… me desculpe.
— Boa noite você também… Só não faça mais nada perigoso, está bem?
— …Sim.
Ele abriu a porta, entrou no quarto e a fechou. Ele suspirou.
Tinha sido realmente um dia intenso. Ele fora perseguido por goblins, atacado
por eles e repreendido por sua irmã.
Mas…
Aninhado na cama, o garoto se virou até que estivesse olhando para a espada de
madeira na parede.
Ele acertara um goblin com essa espada. Um aventureiro a pegou para ele.
O nervosismo e entusiasmo persistente daquele momento ainda fazia seu coração
acelerar.
— Eu me pergunto… como o rosto dele se parece.
Encontrei um aventureiro real!
Não, isso não foi tudo.
Eu ajudei um aventureiro de verdade a derrotar alguns goblins!
Isso sim era algo que pudesse se gabar.
Era muito mais legal do que comprar roupas chiques na cidade.
Satisfeito com o resultado da sua aventura, o garoto fechou os olhos, ansioso
pelo dia por vir.
Capítulo 3: Da Garçonete da
Taverna

— Olá, bem-vindo!
— Opa. Traga-nos três ales e duas águas com limão para começar!
— Certamente!
— E, hum… é, bolinhos de chuva será suficiente. Para cinco!
— Com certeza! — respondeu intensamente a garçonete, olhando de relance para
o aventureiro com a espada de duas mãos em suas costas e anotando o número
que ele estava fazendo com os dedos.
Qualquer taverna estaria animada no começo da noite, mas na taverna da Guilda
dos Aventureiros, isso era diferente. Havia pessoas relaxando após uma aventura
onde lutaram por suas vidas. Outros poderiam ficar, finalmente, mais à vontade
quando amigos regressavam de muito longe.
Alguns clientes eram aventureiros de longe, começando com uma refeição agora
que chegaram nessa cidade.
A felpubro ou garota-fera garçonete corria de um lugar para outro, ela adorava
essa atmosfera. A sensação de que estava ajudando pessoas a motivava mais do
que seu salário.
Enquanto seu cabelo longo cuidadosamente amarrado balançava como uma
cauda (sua verdadeira cauda estava debaixo da saia), ela gritava para a cozinha:
— Três ales, duas águas com limão e cinco pratos de bolinhos de chuva!
— Pode deixar. Bom, grande pedido… torna tudo mais fácil para mim!
Um rhea rechonchudo de meia-idade se movia constantemente para lá e para cá
pela cozinha pequenina.
Panelas e frigideiras, facas e espetos, conchas e rolos de massa. Ele trabalhava
com o fogo e os utensílios de cozinha como mágica, e a comida estava pronta
sem nenhuma demora.
Um molho levemente doce cobria o frango e peixe dourados em óleo. Eles eram
crocantes e quente por fora, e quando você os mordia, o suco fluía na boca. As
felpubros não eram as únicas cheirando o ar com aroma fragrante.
— Aqui está. Entregue-o!
— Sim, senhor!
Quando se tratava de cozinhar, não havia raça tão talentosa quanto os rheas.
Claro, eu adicionei meu pequeno toque!
Seus pequenos toques além da enorme habilidade do cozinheiro faziam deles,
essencialmente, heróis da comida incomparáveis.
Ela tirou um pouco de ale de um barril, espremeu um limão sobre um pouco da
água e o pedido estava pronto.
Ela sapateava com a refeição em uma bandeja para onde o grupo já estava
sentado à mesa esperando ansiosamente.
Talvez eles não quisessem esperar para ir para casa tirar suas armaduras, pois
cada membro do grupo tinha retirado algum do seu equipamento. Os membros
da linha de frente, todavia mantinham suas espadas onde poderiam pegá-las a
qualquer momento, o que demonstrava sua longa experiência.
— Obrigado por esperarem! Três ales, duas águas com limão e bolinhos de chuva
para cinco!
O guerreiro de armadura leve meio-elfo que era responsável pelas finanças do
grupo deu a ela algumas peças de prata.
— Obrigado. Ah, e vinho tinto para mim.
— Claro, eu sei!
A garçonete pegou as moedas com as mãos carnudas e as colocou no bolso do
avental. Eles deram um pouco mais do que a quantidade da conta, talvez
estivessem incluindo atenciosamente uma gorjeta. Embora era também possível
que ele fosse só um mulherengo.
— Veja, quando se vai a uma taverna, você deveria começar com ale, não é? —
disse uma cavaleira como se não pudesse acreditar no que ouviu. Ela repousou o
queixo nas mãos.
— Lá vai a nossa Senhora Cavaleira dizendo tudo o que quiser de
novo… sempre boa e fiel à Ordem!
— Bem, obviamente. Está até escrito nas Escrituras do Deus Supremo — disse
Cavaleira como se não pudesse acreditar, estufando o peito.
Guerreiro de Armadura Leve pressionou a mão na fonte como se estivesse
evitando uma dor de cabeça e suspirou profundamente.
— Crianças, não cresçam para ser como ela, tudo bem?
— Simssenhor!
— Mas ela parece tão legal quando está toda arrumada, no entanto…
Garoto Batedor ergueu a mão como confirmação, enquanto Druidesa deu um
suspiro perturbado.
Cavaleira estufou as bochechas irritada.
— Do que está falando? Eu sempre pareço legal.
— Gah! Ainda nem tomou um gole e já parece bêbada. — Guerreiro de
Armadura Pesada fez um gesto de “silêncio” como se estivesse repreendendo um
bebê, depois levantou a caneca de ale. — Agora temos que brindar! Voltamos de
uma aventura. Comam e bebam quanto quiser, crianças!
— Uooh! Carne! Carne!
Garoto Batedor e Cavaleira deram um grito de alegria e se jogaram na comida e
bebida. Seus companheiros os observaram com uma pequena irritação, mas se
prepararam para sua própria refeição também.
— Casa finalmente…
— Estamos. Bom, trabalho, hoje?
— Pode apostar! Bom trabalho.
Com um tilintar do sino em cima da porta, os próximos a entrar era um homem
forte e robusto com uma lança, e uma mulher bela e voluptuosa.
Lanceiro e Bruxa se sentaram em seus lugares, com os rostos ruborizados com a
satisfação de um trabalho feito.
— Ei, senhorita! Gostaríamos de fazer um pedido!
— Sim, senhor! Bem-vindos de volta! — Garçonete Felpubro se apressou para
a mesa enquanto Lanceiro levantava a mão languidamente no ar. — O que vão
querer?
— Para mim… Deixe-me, ver. Vinho tinto e, pato, salteado. Pode conseguir,
esses?
— Para mim… Coxa de boi, com osso e bem grelhada. E licor de maçã.
— Ah, maçãs… — murmurou Bruxa, entrecerrando os olhos. Seus lábios se
abriram ligeiramente com o pequeno desejo, mas se fecharam imediatamente
outra vez.
Lanceiro deu de ombros indiferentemente. — Quer um pouco?
— Não, prec…
— Coloque um par de maçãs assadas então. Quero uma também.
— …Hrrrm.
— Pode deixar, já está anotado.
Apesar das aparências, elas podem realmente ser bem bonitas. Essa foi a
impressão que Garçonete Felpubro recebeu de Bruxa, que estava sentada
contraindo os lábios como uma menina.
Ou é porque ele está aqui?
— Diga, senhorita? — disse Lanceiro.
— Sim?
— Garota da Guilda ainda está aqui?
Lá se foi a impressão delas.
Garçonete Felpubro viu sua força a deixando, mas se manteve firme perante
Lanceiro, que estava com uma expressão séria.
Ela empurrou sua franga para o lado e deu um suspiro. Ela tinha certeza de que
Garota da Guilda ainda estava trabalhando. A garçonete sabia muito bem até que
horas ela ficava às vezes.
— …Sim, parece que ela ainda está aqui.
— Simmm!
Bruxa e Garçonete Felpubro observaram sem entusiasmo Lanceiro quando ele
fez um punho e comemorou.
Céus, e quando ele tem uma mulher linda bem ao lado… era um comentário para
se manter consigo mesma.
Era assunto de todos por quem eles se apaixonavam.
E ainda assim, pensar que esse aventureiro “mais forte da fronteira”, alguém cuja
habilidade com a lança poderia deixar os Cavaleiros da Capital envergonhados,
seria assim…
Ele pareceria mais legal se ficasse de boca fechada.
Ela se sentiu um pouco desconfortável ao considerar que, porventura, se
descobrisse a verdadeira razão de todos se tornarem aventureiros, seria uma
desilusão tão grande quanto essa.
Bem, acho que ele é fácil de se fazer amizade, ao menos.
Isso era indubitavelmente melhor do que ser distante, não é? Com esse
pensamento, Garçonete Felpubro correu em direção a cozinha.
— Vinho tinto, pato salteado, coxa de boi com osso bem passada, licor de maçã.
E duas maçãs grelhadas!
— Pode deixar! Leve as bebidas primeiro!
— Simssenhor!
Chef Rhea gritou com uma voz que desmentia seu tamanho diminuto. Garçonete
Felpubro respondeu com um grito para igualar.
Quando ela trouxe as duas bebidas, eles deram um sorriso, um “obrigado” e
entregaram a ela o dinheiro.
— Muito bem, aqui está o nosso “encontro”.
— Sim. Um, brinde.
Como que em harmonia com o elegante tilintar dos copos de Lanceiro e Bruxa,
o sino badalou novamente.
— T-tão cansado…
— Vamos, ande direito! Céus!
Os dois aventureiros novatos entraram, a imagem própria da fadiga e exaustão.
Sacerdotisa Aprendiz praticamente empurrou Guerreiro Novato para o assento,
depois limpou o suor da testa.
— De alguma forma não estou com vontade de comer…
— Bem, que pena! Precisa comer!
Repentinamente, a garota olhou para cima para repreender o garoto, que parecia
pronto para adormecer a qualquer momento.
Seus olhos encontraram os de Garçonete Felpubro, e a garota aventureira corou.
— Ah, d-desculpe. Humm… Uma tigela de mingau de aveia, por favor, e pão
para dois…
— Sim, senhorita!
— Ah, e água!
— Deixa comigo!
Ela foi até a cozinha e retransmitiu o pedido. Chef Rhea ergueu a sobrancelha.
— Muito bem! Leve as coisas com carne grelhada. Hmm, então, onde foi parar
aquele vinagre?
— Eu sei, eu sei. Ah, o vinagre está na prateleira atrás de você.
Quando o chef sorriu e se virou, Garçonete Felpubro apontou para uma das
prateleiras. O chef pegou um pouco de queijo e colocou no prato com o pão,
então balançou a cabeça, satisfeito.
— Está bem, vou levar esses aqui então!
— Faça isso!
Ela deixou o crocante e oleoso prato com Lanceiro e Bruxa, e lhes ofereceu uma
palavra de agradecimento. Então ela caminhou até onde o garoto e a garota
estavam, mas Sacerdotisa Aprendiz pestanejou para ela.
— Hã? Desculpe, nós não pedimos isso…
— Está tudo bem, apenas comam. — Garçonete Felpubro balançou a mão,
apontando para o queijo com o dedo peludo. — De qualquer forma, virá alguém
em breve que não consegue se fartar dessa coisa, e teremos que fazer um novo
pedido. Precisamos esvaziar nosso estoque!
— Obr-obrigada.
— Nem. Obrigada por nos ajudar com isso!
Tendo assim feito uma ronda bem-sucedida em suas mesas, ela foi até a parede
e suspirou.
O barulho animado dos aventureiros na taverna ameaçava se transformar em um
zumbido em seus ouvidos.
Eles estavam se divertindo rindo, gritando e cantando, e após comerem e
beberem, eles retomavam seus divertimentos.
— Hm. — Garçonete Felpubro achava satisfatório apenas ficar ali com os braços
cruzados, os observando.
Então…
— Ahhhh cara, estou cansada! Quero um pouco de comida e quero ir para cama!
— Havia um montão de goblins, não havia?
O sino tocou outra vez, e mais cinco pessoas entraram. Na frente do grupo,
abrindo a porta com um estrondo, estava uma alta-elfa patrulheira. Uma
sacerdotisa da Mãe Terra a seguia.
— Bem, um banquete é habitual depois de uma batalha. Beber, comer, se alegrar
e depois dormir… à sua maneira, essa é uma recordação de nossos inimigos.
— Verdade, mas Corta-barba vai ir caçar mais goblins amanhã, não é? Que
viciado em trabalho…
Depois veio um homem-lagarto com um passo pesado e sólido e um anão
conjurador bem constituído.
E então veio o último deles.
— Sim. — disse francamente o aventureiro quando entrou pela porta. Todo
mundo na taverna olhou para ele.
Amadura de couro suja, um capacete de aparência medíocre, um pequeno escudo
redondo preso no braço, e na sua cintura havia uma espada de tamanho estranho.
— Precisamos de dinheiro — disse Matador de Goblins tranquilamente.
— Sinto muito. Se eu tivesse só um pouco mais de vitalidade…
Assim, Alta-Elfa Arqueira interrompeu como se estivesse cobrindo a
aparentemente decepcionada Sacerdotisa.
— Ei, não se preocupe com isso. Apenas deixe outros aventureiros lidarem com
isso.
— Se não houver goblins, vamos considerar isso.
— Céus, é sempre desse jeito com você. — Alta-Elfa Arqueira olhou para o teto
irritada, balançando as orelhas.
— Olá, bem-vindos!
Garçonete Felpubro seguiu até a entrada, cumprimentando os aventureiros com
um sorriso brilhante.
Havia muitos aventureiros selvagens e rebeldes, mas essas pessoas tinha uma
gentileza nascida da experiência, um deles era ranque Prata.
Então era natural que quisesse servi-los com um sorriso.
— Oh-ho — disse o intermediário deles, Lagarto Sacerdote, revirando os olhos.
— Como vai minha senhora garçonete? Bem, eu anseio solicitar um pouco de
queijo…
Garçonete Felpubro soltou uma risada com seu tom sombrio. Era do
conhecimento geral que esse homem-lagarto se tornara bastante encantado com
queijo em todas as formas.
— E o resto de vocês?
— Humm, vou querer… como era?… aquela coisa fina. Macarrão? Vou querer
isso — disse Alta-Elfa Arqueira.
— Ah, hum, alguma coisa um pouco leve para mim… — murmurou Sacerdotisa.
— Então isso é tudo? — disse Anão Xamã. — Sou o único com um apetite
adequado? Carne, eu disse, carne! E um bom e forte vinho.
— Alguma coisa com carne, sim, senhor! — adentrou Lagarto Sacerdote.
A bainha da saia da garçonete se levantou quando ela se virou para olhar para o
último aventureiro.
— Senhor, nosso especial do dia é lúcio! Pego na cidade da água e grelhado
fresco!
Apenas os ingredientes certos, perfeitamente preparados, e é claro, os talentos do
chef estavam fora de questão. Ela informou tudo isso como um desafio,
estufando seu peito de tamanho médio como se quisesse provocar uma resposta.
— Então, o que vai querer?
Era uma maneira um pouco impertinente de se falar com um cliente, mas ela não
considerava esse homem como um cliente nesse momento.
Ela encarou ele, se recusando a deixá-lo escapar, e ela pensava que podia ver um
olho vermelho dentro do capacete.
— Nada. — disse Matador de Goblins. — Estou bem por hoje.
— O que há com ele? Ele é louco?!
— Bem, não tenho certeza disso…
Garçonete Felpubro interrompeu a resposta do aprendiz da oficina batendo o
punho no balcão.
— Digo, aventureiro deveriam matar dragões, beber vinho e rir como Fua-ha-ha-
ha! Esse é seu trabalho, não é?
— Não posso negar que há alguns assim. — O aprendiz aceitou o argumento da
garota com um sorriso irônico, então enfiou um garfo em alguns peixes em um
prato. O lúcio bem passado começara a esfriar um pouco, mas ainda continuava
gorduroso e delicioso. Havia limão ou algum outro condimento nele, lhe dando
um leve cheiro de cítricos que dava água na boca.
— De qualquer forma, obrigado pelo lanche. Hm, isso é bom. Faz algum tempo
desde que comi peixe.
— Eu só não queria desperdiçar as coisas que esfriaram. Não interprete errado!
— Gosto de como nem sequer está dizendo isso para cobrir seu embaraço ou
algo do gênero.
Quando se tornou parte da rotina diária de Garçonete Felpubro levar um pouco
de comida — na verdade sobras — assim?
Fora tarde da noite, todos os aventureiros tinham ido para suas estalagens, e ela
estava sem seu uniforme limpando a taverna.
Quando se aprontou para ir para casa, ela espiou a oficina, onde o garoto aprendiz
estava sozinho cuidando do fogo.
“O que está fazendo” perguntara ela, e ele respondera: “Não podemos deixar o
fogo abaixar”.
Claro, isso era só uma desculpa; com seus olhos aguçados, ela viu que ele estava
fazendo uma adaga.
Fazia sentido. Ele trabalhou durante o dia, então ele tinha que arranjar tempo
para praticar.
Para Garçonete Felpubro, era uma excelente oportunidade; dar a ele as sobras de
comida parecia a coisa mais lógica a fazer.
— As pessoas que podem comer, deveriam comer.
— Acho que é uma contradição de termos…
— É por isso que me deixa louca quando as pessoas ignoram a minha comida!
— disse Garçonete Felpubro, mostrando sua raiva quando sacudia a cauda
vigorosamente. Não estava claro até que ponto o aprendiz compreendia o gesto
único da felpubro.
— Você entende que isso tem a ver com a minha honra como garçonete? Ou
não? Gostaria de saber se você segue o meu raciocínio!
— Bem… — O aprendiz coçou o rosto com a ponta do dedo de constrangimento.
— …Acho que não gostaria que as armas que faço fossem jogadas em qualquer
lugar por aí.
— Imaginei que não.
— Aquele cara joga as espadas de todas as formas — resmungou o aprendiz. E
as lâminas infelizes nem sequer eram obra do aprendiz (ele ainda não tinha
permissão para expor seu trabalho na loja) mas do seu chefe.
— O chefe diz: “Você é o único que pode ficar verdadeiramente satisfeito com
seu próprio trabalho”.
— Bem, eu quero que aquele esquisito experimente a comida de nossa taverna.
— Não é como se ele não comesse, é?
— É por isso mesmo! — Garçonete Felpubro se inclinou sobre o balcão da
oficina, que foi lustrado. O balcão pressionava os peitos dela, tal como estava, e
o garoto aprendiz desviou os olhos o mais casualmente possível. — Depois de
suas aventuras, ele normalmente não come.
— Eu… eu acho que já ouvi sobre pessoas que não comem antes de irem…
— Ahhh, caramba. Talvez ele não goste de nosso cardápio…
— Isso está realmente te incomodando de repente. — Os olhos do aprendiz
desceram lentamente, e ele os ergueu apressadamente de novo. Suas bochechas
coraram. — Qual é o problema?
— Quero dizer, ele nunca costumava vir à taverna, não é? — disse ela,
aparentemente inconsciente do olhar do garoto. — Há quanto tempo ele está aqui
mesmo?
— Cerca de cinco anos, não é?
— Não sei…
Para Garçonete Felpubro, a questão de saber quando o aventureiro apareceu era
trivial. Se alguém prestasse atenção a essas coisas, ela teria igualmente se
lembrado de quando eles sumiram. Assim que começa se preocupar sobre onde
fulano tinha ido depois de um tempo, você se perde. Era preferível pôr toda sua
energia em acolher as pessoas que estavam aqui agora. Ela aprendeu isso no seu
primeiro ano.
Agora que penso nisso, a recepcionista não começou a se animar cinco anos
atrás?
Garçonete Felpubro estava ali estendida com o peito no balcão, murmurando
“Hmm…”.
O garoto aprendiz tentou evitar olhar para ela, mas de alguma forma continuou
olhando na sua direção. Seus olhos se moviam para direita, depois para esquerda,
de novo e de novo, até que em pouco tempo eles se focaram em um único ponto.
— Oh!
— O quê? — Garçonete Felpubro se ergueu, com as orelhas balançando.
— Não sei se é verdade ou não — disse o garoto aprendiz, balançando a cabeça,
— mas ouvi dizer uma vez que ele gosta de guisado. Carne.
— Guisado de carne, é?
— Correto!
Parada na frente de uma panela grande e borbulhante, Garçonete Felpubro
estufou o peito. Ao lado dela, o chef estava em uma escadinha para olhar a
panela, com os braços cruzados e murmurando “Hmm”.
— Desculpe, velhote. Você está tendo que me ensinar e tudo mais.
— Bem, se você aprender a cozinhar, posso dormir um pouco mais sossegado.
— Ah, pare de denunciar sua idade, velhote.
— Acho que talvez é minha idade falando. Sou como uma manteiga espalhada
demais.
— Quer dizer o seu espírito?
— É como se eu estivesse esticado e puxado. — Com um “com licença”, o chef
pegou uma colherada do guisado e provou. — Hmm, nada mal. Deixe cozinhar
um pouco mais.
— Está beeem!
Essa seria sua chave para a vitória.
O chef olhou para Garçonete Felpubro enquanto ela soltava um “Oba!” a plenos
pulmões e murmurou:
— Mas gostaria de saber o que um aventureiro iria achar disso…
— Hum? — Ela congelou instantaneamente. — Não estava bom?
— Ehh, eu não diria isso. — Ainda que se ele dissesse alguma coisa, nunca
poderia parar. Chef Rhea coçou seu nariz arredondado. — Bem, pense por si
mesma.
— …Céus. Você vai arrepender do dia em que me deu tempo para pensar!
— Har har! Continue.
Garçonete Felpubro olhou para seu chefe com os olhos entreabertos enquanto ele
acenava com a mão, depois ela voltou sua atenção ao caldeirão.
Olhar atentamente para ele não era a forma de descobrir algo, contudo…
— Minha nossa, bem me parecia que cheirava algo bom aqui…
Ela ouviu uma voz familiar e dois tipos de passos. O sino da porta não tinha
tocado. Os recém-chegados vieram de outra parte do edifício.
Garçonete Felpubro colocou a cabeça para fora da cozinha e levantou a mão
alegremente para suas duas colegas.
— Olá! Estou fazendo a comida. O prato do dia… guisado de carne!
— Oh, guisado, isso é ótimo.
— Oooh, guisado de carne!
Elas eram suas colegas, embora estritamente falando, elas eram funcionárias e
ela apenas uma assistente, apesar das três trabalharem na Guilda.
Mas Garçonete Felpubro não dava atenção a essas distinções, nem estava nervosa
com Garota da Guilda e Inspetora.
— Obrigada. Hã? Vocês vieram almoçar? — Ela podia ver quando espiou pela
janela que o sol ultrapassara seu auge e começava a descer. Não era exatamente
o crepúsculo. — Já é bem tarde para isso.
— Nós meio que perdemos…
— Isso não é bom, como esperam manter seu corpo dessa forma?
Ou elas o “perderam” porque…?
Certamente não havia nada errado em deixar seus olhos aguçados se virarem por
um instante para um lugar particular.
— Você está certa. Estou faminta… — disse Garota da Guilda, com a mão na
barriga. Garçonete Felpubro odiava aquele estômago.
Temos que engordá-la.
— Entendi, então, experimentaria um pouco disso? Serviremos isso aos
aventureiros essa noite.
— Claro, se não se importa — disse Garota da Guilda com um sorriso e um
aceno. Depois ela acrescentou: — Ah, mas…
— Hum? — Garçonete Felpubro inclinou a cabeça.
Garota da Guilda disse desajeitadamente: — …Me pergunto o que os
aventureiros vão pensar disso.
— É… Parece meio sangrento.
— Oh…
Agora que elas haviam mencionado isso, ela também pôde entender o que
queriam dizer. O estoque, que incluía tomate, era preto avermelhado; pedaços de
carne borbulhavam para superfície.
Enquanto Garçonete Felpubro ficava ali murmurando consigo mesma, ela sentiu
uma mão minúscula bater nela por trás.
— Quêê!
— Desculpe, senhoritas, por favor, não interfiram em meus ensinamentos.
Era, desnecessário dizer, o chef. O homem de meia-idade que apareceu ao lado
delas bateu com raiva em sua barriga rotunda, e colocou uma expressão severa
no rosto. — Eu esperava ver se essa garota notaria por si mesma.
— Ah, céus, nos perdoe.
Garota da Guilda deixou escapar um pequeno riso e, indicando o guisado, disse:
— Vamos almoçar aqui então. Para se desculpar.
— Então vocês devem… comer bastante! Só o guisado é suficiente?
— Ah, está bem. Vejamos então. Pão e… Pode me trazer um chá preto?
— E muita geleia para acompanhar!
— Com prazer!
Garota da Guilda e Inspetora fizeram seus pedidos; Chef Rhea lhes deu uma
resposta animada e apertou o avental.
— Bem, não fique aí parada… ao trabalho, ao trabalho!
— Ergggg… simsenhor!
Agora não havia nada a se fazer. A comida estava pronta e quem quisesse comer
comeria.
Garçonete Felpubro se apressou com suas tarefas, e no devido tempo, a noite
caiu.
Quando o sol se pôs completamente, aventureiros surgiram na taverna como
sempre.
Previsivelmente, o guisado de carne parecia inesperado, e os compradores
poucos.
Será que eles não queriam isso logo após uma aventura? E mesmo assim servir
guisado de carne logo de manhã parecia…
— …Na verdade, talvez iria funcionar pôr no cardápio do café da manhã.
Ela se ocupou com esses pensamentos otimistas até que finalmente um
aventureiro veio andando com um passo audaz.
Por um segundo, cada olhar na taverna se virou para ele e a conversa parou, mas
rapidamente foi reanimada.
A armadura de couro suja, o capacete de aço medíocre, o pequeno escudo
redondo no braço e a espada de tamanho estranho no quadril.
Ele atravessava o edifício da Guilda, indo para fora. Ele nem sequer olhou na
direção da taverna.
Como se eu fosse deixar você ir embora!
Garçonete Felpubro correu até ficar na frente dele e o fixou com o dedo.
— Senhor, o prato do dia é guisado de carne!
— É?
— O que gostaria de pedir?!
— Nada. — disse Matador de Goblins. — Estou bem por hoje.
— Pensei que disse que ele gostava de guisado de carne!
— Eu disse que foi algo que ouvi dizer.
Era meia-noite.
Em meio à luz fraca do lampião, Garoto Aprendiz parecia bastante satisfeito com
a terrina com guisado de carne que ela trouxera para ele.
Isso não ofendeu exatamente Garçonete Felpubro, mas ela franziu os lábios e
olhou feio para ele mesmo assim.
— Ooh, pedaços de batata. Perfeito.
— …Tem certeza de que não disse isso só porque queria um pouco de guisado
de carne?
— De jeito nenhum. Bem, talvez só um pouquinho. — Garoto Aprendiz deu um
grande sorriso para ela.
A carne bem cozida era tão macia que poderia ser cortada com uma colher. Mas
não estava molenga; ainda parecia o ideal para morder. E os sucos jorravam cada
vez que era mastigado, o óleo e a base da sopa estavam deliciosos, mesmo que
estivessem um pouco frios.
Quanto aos vegetais, ele gostava de massudo e espesso.
— Então, o que anda fazendo?
— Estou recolhendo limalha de quando fizemos a afiação.
Garçonete Felpubro observou ele com interesse genuíno, e ele respondeu
enquanto devolvia a terrina à ela.
Ele varreu um canto da loja de ferraria com uma vassoura, o tempo todo
pensando que isso não era para ele.
— Vocês fizeram bastante, até para facas. — Ele não salientou que algumas
pessoas consideravam espadas nada mais que facas gigantes.
A afiação foi realizada desbastando o metal contra uma pedra de amolar na forma
de uma roda de carroça, então o processo produziu bastante cavaco. Certificar-
se de que foram devidamente limpos era um dos vários trabalhos importantes do
aprendiz.
Além disso, havia também o fato de que misturá-los com certos metais fazia seu
material durar mais. Às vezes, também se utilizava limalhas quando um trabalho
urgente exigia mais suprimentos do que tinham.
O que realmente quero é se apressar e fazer algum artigo de ferraria, no entanto…
Como um aprendiz, ele ainda estava aprendendo. Obviamente, ninguém iria
confiar nele a importantíssima produção de armas e armaduras.
Assim, ele acreditava que simplesmente teria de se dedicar o máximo possível
ao que lhe foi dado para fazer.
Não é como se não entendesse, esse sentimento de ver seus esforços
completamente ignorados.
E se ele exibisse as armas que tivesse feito — no futuro, é claro — e elas fossem
sumariamente ignoradas?
— Quer saber ao menos o porquê, não é? — perguntou ele.
— É, exatamente! Não consigo aceitar dessa forma… aceitação é muito
importante!
— Hummm — murmurou o aprendiz, cruzando os braços. Então ele
repentinamente descruzou e bateu as mãos, exclamando: — Ei, é isso!
— O que foi? Teve uma ideia, Ó futuro mestre ferreiro? Conte-me!
Quando Garçonete Felpubro se inclinou na direção dele, uma fragrância de
algum tipo flutuou do cabelo dela. Era o odor da cozinha, o cheiro herbáceo único
para os Felpubros, sabão, e outra coisa, algo doce. Garoto Aprendiz engoliu em
seco e acenou com as mãos.
— B-basta perguntar! Pergunte a alguém que saiba mais.
— O quê, quer dizer como o velhote na cozinha?
— Não — disse ele. — Quero dizer a garota da fazenda.
— O que é isso? Guisado?
— An-ham!
Era o término da manhã, na porta de serviço atrás da Guilda.
Vaqueira descarregara a mercadoria com um “Hhup!” e agora pestanejava para
Garçonete Felpubro.
Seus seios generosos saltaram quando ela deu um suspiro e limpou o suor da
testa.
Garçonete Felpubro estava bem ciente de que ela mesma estava na média, na
verdade, talvez um pouco mais do que a média; seguramente não menos. Mesmo
assim…
Talvez estejam cheios de leite?
Ela não conseguiu impedir que o pensamento sórdido atravessasse sua cabeça.
De acordo com a fofoca do escritório, Garota da Guilda trabalhava sem parar
para manter sua figura, nesse aspecto, Garçonete Felpubro ainda estava muito
bem.
— Tenho certeza de que você é uma melhor cozinheira do que eu. — Vaqueira
corou e juntou as mãos na frente do peito desajeitadamente. — Só sei fazer coisas
que que se faz em casa…
— Não tem a ver com se é ou não boa em cozinhar. — Garçonete Felpubro se
sentou em um barril com a leveza de uma felina. Ela passou a pena pelo recibo
preso a prancheta que segurava. Os assuntos financeiros era o trabalho dos
funcionários da recepção, mas checar o pedido era trabalho dela.
— Eu sei que pergunto isso sempre, mas tem certeza de que não quer olhar
dentro?
— Meu nariz sabe. Está tudo bem.
Garçonete Felpubro deu uma pequena gargalhada orgulhosa e esticou o peito que
pressionava seu avental. Sabendo, é claro, que nunca poderia
ganhar essa disputa, ela rapidamente balançou a mão para mudar de assunto.
— Como eu disse. Não se trata de se você sabe cozinhar. Há um cara que não
come, e eu tenho andado matutando sobre isso.
— Tem um aventureiro que não come?
— Alguma coisa errada?
— Não… — Vaqueira deu um sorriso conturbado e coçou a bochecha. — …Ele
não tem má intenção.
— Essa é a questão!
— Humm… — Vaqueira parecia um pouco perdida com a insistência de
Garçonete Felpubro. Ela limpou o suor com o braço, depois se sentou em uma
caixa próxima.
Ela começou a balançar as pernas, despreocupadamente, então fixou Garçonete
Felpubro com um olhar.
— É só isso?
Para um humano ou semelhante, o tom dela não teria soado diferente do normal.
Mas nem tanto para Garçonete Felpubro. Suas orelhas aguçadas detectaram o
mínimo estremecimento na voz de Vaqueira.
— É só isso o quê? — Ela inclinou a cabeça, fingindo não notar nada.
— Bem, hum, sabe. — Vaqueira não conseguia dizer bem as palavras, e seus
olhos se moviam de um lado para o outro. Ela respirou fundo. — …Você quer
dar a alguém que goste ou algo assim?
— Ahhh, não, nada disso.
Garçonete Felpubro deu uma risada calorosa e balançou a mão como se tivesse
acabado de ouvir uma piada.
— Não tenho ninguém para cozinhar além dos clientes…
Sua mão parou de se mexer.
Bem, talvez uma pessoa.
Antes que percebesse, sua expressão mudou e ela a cobriu com a mão peluda.
Havia uma pessoa para quem ela sempre dava a comida que fazia.
— …Acho que poderia dar um pouco para aquele cara da oficina.
—…
Vaqueira olhou intensamente para o rosto de Garçonete Felpubro. Seus francos
olhos vermelho-claros pareciam prender a felpubro no lugar.
— O-o que foi…? — perguntou Garçonete Felpubro, mas por um momento,
Vaqueira não disse nada.
— …Bem, certo, então — disse ela indiferentemente depois de um tempo, e
Garçonete Felpubro se viu soltando um suspiro. — Vou te dizer. Você tem algo
para escrever?
— Bem aqui — disse Garçonete Felpubro, virando toda a papelada. Ela segurou
a pena e disse: — Continue. — Vaqueira deu um sorriso impotente.
— Humm, está bem. A forma como se faz é…
E então ela explicou a receita em detalhes.
Guisado, na verdade, era um prato de carne cozida, não uma sopa. Mas a comida
que ela descreveu usava muito leite. Em suma, a impressão que isso fez foi…
— Surpreendentemente… normal?
— Exato — assentiu Vaqueira com um sorriso. — É totalmente normal.
— Digo, é apenas um guisado simples, não é?
— Isso mesmo — disse ela, não deixando o sorriso sumir — Apenas um guisado
normal.
Foi inesperado, para dizer o mínimo.
A garçonete tinha certeza de que havia algo mais… único na receita. Ela esfregou
a têmpora com a parte de trás da pena.
— É algum tipo de receita especial, passada pela sua família por gerações?
— Ha-ha-ha. Acho que sim. — Vaqueira sorriu ligeiramente e pulou da caixa.
Ela bateu as mãos para tirar a poeira, então se alongou, arqueando seus peitos
generosos. — Não foi como se tivesse aprendido de minha mãe… Embora
gostaria de ter.
Garçonete Felpubro inclinou a cabeça com o murmúrio.
— Seus parentes, então?
— Um vizinho. — Vaqueira olhou para o céu azul e semicerrou os olhos. O vento
passou pelo seu cabelo vermelho. — A garota mais velha que vivia ao lado.
— Olá, bem-vindos!
— Opa. Nos traga três ales e duas águas com limão… para começar!
— Certamente!
— E, hum… é, a travessa de batata ao vapor será o suficiente. Para cinco!
— É para já!
A taverna no pôr-do-sol. Garçonete Felpubro abria caminho pelas conversas
diversificadas dos aventureiros.
Era a mesma vivacidade de sempre. Os mesmos rostos. Era maravilhoso.
Mais um dia em que eles poderiam voltar para casa e comer alimentos e bebidas
deliciosos. Apenas isso era o suficiente para motivar todo mundo.
— Pedidos chegando, velhote!
— Pode deixar. Tente não os deixar esfriar… ou cair!
Essa era a resposta favorita de Chef Rhea.
Ela espiou a cozinha, onde uma sopa fervia ruidosamente, uma frigideira
escaldava e uma faca passava velozmente pelos ingredientes.
E claro, o chef estava no meio disso tudo, com seus braços curtos se movendo
incessantemente.
Ele faz bastante coisa com esse corpo pequeno.
Ela nunca se cansava de observá-lo, mesmo que o visse todos os dias.
Quando os pratos saíam, Garçonete Felpubro os empilhava nos braços, olhando
para a panela mais no fundo da cozinha.
— Está certo? Ainda não ferveu?
— Quê? Está me dizendo como cozinhar? Isso é culinária equivalente a uma
criança de cinco anos!
— Está bem, está bem. Era só para confirmar.
Sentindo um sermão chegando, ela ajeitou sua cauda e a saia, e se afastou.
Esse sempre foi o momento favorito de Garçonete Felpubro na taverna.
Ela poderia das as boas-vindas aos aventureiros enquanto chegavam em casa,
vendo seu alívio em voltar.
Também havia aqueles aventureiros que não puderam voltar para casa. Ela tinha
fé de que estava viajando para algum lugar.
O que houve com o aventureiro, e onde, era algo que só o mais valente poderia
dizer…
— …Humm?
As orelhas de Garçonete Felpubro se contraíram subitamente. Elas haviam
captado passos indiferentes, ousados e quase violentos se aproximando.
A armadura de couro suja, o capacete de aço medíocre, o pequeno escudo
redondo no braço e a espada de tamanho estranho no quadril.
E com a aparição de Matador de Goblins, é claro, a taverna ficou em silêncio por
alguns instantes.
— Senhor?!
— …A recepção me disse para não se esquecer de passar na taverna. — O
capacete de aço se inclinou um pouco com o som de surpresa que escapou dela.
— O que foi? Há goblins aparecendo aqui?
— Ah, não! Senhor, por favor, espere aí um momento.
— Está bem.
Deixando o estranho — mas assentindo — homem onde estava, Garçonete
Felpubro correu para a cozinha.
—Oh… Oh-ho! O que foi agora?
— Dê-me um prato, velhote! Só um pequeno!
— Diga isso para a pessoa que os lavou!
— Fui eu!
Ela pegou um prato da prateleira de louças enquanto gritavam um com o outro.
Ela colocou um pouco de guisado nele, depois correu de volta para a taverna para
que pudesse servir ele enquanto ainda estava quente.
— Prove!
— … — Matador de Goblins olhou duvidosamente para o prato que Garçonete
Felpubro colocou na frente dele. — Guisado?
— Isso mesmo!
— Para que eu prove?
— Isso mesmo!
— …Entendi.
Ele pegou o prato relutantemente, mas depois engoliu habilmente através da sua
viseira.
Lá se foi a expectativa de Garçonete Felpubro que ele pudesse tirar o capacete
enquanto comia. Mas…
Matador de Goblins deu um ligeiro “Hmm” surpreso.
As orelhas da garçonete não eram tão boas quanto de um elfo, mas elas não
perderam isso.
Ela tinha conseguido. Um sorriso gracioso surgiu em seu rosto enquanto
perguntava triunfantemente: — O que achou? Muito bom, não é?
— Sim — assentiu Matador de Goblins. — Nada mal.
— Iiiissso!
Ela acabou por erguer o punho para o alto e deu um viva de vitória. Ela nem
sequer se preocupou com os aventureiros que olharam, tentando entender o que
estava acontecendo.
— Sim! Demais! Consegui! — Ela girou, com a bainha de sua saia flutuando,
depois disse alegremente: — Então você vai comer essa noite, não é, senhor?
Qual o seu pedido? Guisado?
— Nada. — disse Matador de Goblins. — Estou bem por hoje.
— O quê?! Por quê?!
Garçonete Felpubro ficou tão surpresa que quase deixou o prato cair, se
esforçando para não o deixar cair. Matador de Goblins disse: — Alguém está
esperando por mim.
Sua voz foi breve, desapaixonada e fria, quase mecânica.
Mas Garçonete Felpubro pestanejou com as palavras. Ela olhou atentamente para
o capacete.
Em sua mente, o olho vermelho olhando de dentro se sobrepôs com outro olho
vermelho mais claro.
Ah…
Então era isso.
— O que foi? — Matador de Goblins inclinou a cabeça questionadoramente para
Garçonete Felpubro, que tinham sorrido de repente.
Ela podia ver agora. Olhando assim, era inconfundível.
— Nada. Só estava pensando, senhor, você não tem má intenção.
— É mesmo? — Matador de Goblins assentiu firmemente e depois disse: — Já
acabou?
— Acho que sim — disse Garçonete Felpubro, ao qual ele previsivelmente
respondeu “Entendi” e se virou. — Nesse caso, eu irei.
— Claro, foi um prazer tê-lo aqui.
— Não sei ao que se refere.
Matador de Goblins balançou a cabeça e andou pela taverna com um passo firme,
mas rápido.
— Ei, Matador de Goblins! Vai matar mais goblins?
— Que tal você lutar com outra coisa uma vez? Tem que caçar algo grande como
eu!
— Ahh, sozinho hoje? Nenhuma sacerdotisa bonitinha ou elfa sexy?
Respondendo “Sim”, “É mesmo?” e coisas assim para as vozes provocadoras ao
seu redor, Matador de Goblins abriu a porta.
E então, deixando apenas o tilintar do sino atrás dele, ele saiu para a cidade, pela
noite afora.
Bem, isso não era bem correto.
Sua aventura acabou, ele estava voltando. Para sua casa.
— Céus. Se era isso que ele estava fazendo, ele poderia ter dito alguma coisa!
Garçonete Felpubro riu, percebendo quão unilateral a competição fora.
Então ela soltou um “Muito bem!” e deu um tapinha na bochecha com as mãos.
A alegria a revigorou, e ela reforçou o laço do avental nas costas, pronta para
trabalhar.
— O prato do dia é guisado que dei meu coração e minha alma! Alguém vai
querer?
Mãos se ergueram. Pessoas gritaram. À medida que cada pedido vinha,
Garçonete Felpubro sorria e os anotava, dizendo “Pode deixar!”.
Mas ela tinha optado por uma panela muito grande para fazer o guisado. Não
havia “talvez” sobre isso: havia certeza de sobra.
E nesse caso…
— Eu só posso fazê-lo comer!
Se ela pudesse fazer a comida que gostava, como gostava e dar a uma pessoa que
ela gostava, seria o bastante.
Garçonete Felpubro se apressou no furor da taverna.
Capítulo 4: De um Ninho de
Goblin Perfeitamente
Comum

Para esse goblin, tudo era apenas o pior, o pior, o pior.


Eles estavam no fundo de um pequeno buraco que causaria claustrofobia e que
não poderia ser chamado de confortável por qualquer que seja o ponto de vista.
E ele fora colocado na frente de uma porta que cheirava a fedor bisonho.
— Não! N-não, pare com isso… Pa-paaaugh!
Ele espiou através da fenda deixada pela porta de madeira mal ajustada para
encontrar seu companheiro no meio de seus negócios. Ela não tinha desejo de
ver o pequeno traseiro sujo de outro goblin, mas o traseiro da fêmea — que estava
nesse momento agarrada, chutando o ar — que ele queria ver.
— …? GROB! GBROOB!
Mas o outro goblin o notou observando e gritou com ele, no qual ele se virou
rapidamente.
Isso era como sempre era. Você é o sentinela, então fique de guarda, diziam eles,
e ele ficaria esperando pela sua vez. Eles poderiam pelo menos deixá-lo assistir.
Esses eram os pensamentos que passavam pela cabeça dele enquanto analisava a
lança que segurava. Ela tinha uma ponta de metal e um cabo de madeira de
carvalho, mas a haste tinha sido quebrada violentamente ao meio.
Foi o goblin que quebrara. Ele achou que era muito longa e pesada para usar, e
se ele quebrasse, então teria duas lanças.
A arma estava praticamente reluzente quando a conseguiu, mas agora a ponta e
o cabo estavam cobertos por uma sujeira carmesim.
Ele tinha ficado feliz quando recebeu o trabalho de sentinela juntamente com a
lança que tiraram da mulher, mas…
— GBBORB…
Ele não tinha a menor ideia de como conseguiria retirar a mancha. Agora que
pensava nisso, talvez o cinto bonito e arrumado que o outro goblin ficou teria
sido melhor. Aquele goblin tinha um cinto tão bom e ainda teve a audácia de
roubar olhares nessa lança.
Ele não conseguia aguentar. O cinto lhe convinha mais do que aquele goblin. É.
Nenhum cinto serviria naquele tolo.
Ele é parte da minha família, então se ele morresse, eu poderia tê-la.
Em uma horda, quase todos eram parentes de sangue, mas isso não passava pela
sua cabeça. Seu pequeno cérebro tacanho começou a fumegar ao pensar com algo
que ele não poderia ter.
— E-eeeeiaaaaaghh!
Como a fêmea.
Cada vez que ele via os outros se divertindo, fazendo o que queriam com ela,
inveja ardia em seu coração.
Ele fora deixado no ninho sobre a justificativa de que era o sentinela, e ele nunca
tinha chegado a ter uma das capturas para si. Ele havia feito parte de um grupo
em várias ocasiões, mas nunca experimentado o prazer singular de ficar sozinho.
A mulher naquele lugar era típica: se esforçando, lutando e se recusando a
desistir, não importava quanto tempo levasse. É claro, os goblins estavam
fazendo o que normalmente fariam perante tal demonstração de desprezo;
machucá-la, domá-la.
Havia uma que parecia ter desistido, abaixado como uma bola e esperando a
tempestade passar. Mas depois ela morreu enquanto eles se divertiam tentando
descobrir o que seria necessário para fazê-la gritar.
Havia outras que se desculpavam profundamente com os goblins, se curvando
de joelhos, raspando a cabeça contra o chão e empinando o traseiro.
E uma vez, porque os goblins fariam qualquer coisa, eles cortaram um a um os
braços e pernas de uma delas, cozinharam e comeram.
Então, isso foi saboroso.
Ele não conseguia se lembrar de quando ou onde tinha sido, mas ele lambeu os
beiços.
Essa era, em última análise, a relação entre goblins e as outras raças. Se esses
últimos fossem fortes, os primeiros não teriam escolha senão encolher e
obedecer. Mas se uma criatura estivesse morrendo diante deles — seja um ogro
ou um demônio — eles iriam em massa sobre ele e devorariam. Era assim que
os goblins eram.
— GOBRBOB…
— GBORB?!
Seu companheiro, tendo terminado seu negócio, abriu a porta e saiu. Talvez
tivesse lhe dado muita coragem, porque no caminho ele deu uma risada
zombadora dissimulada.
Esse companheiro pensava que “guarda” significava apenas andar pelo ninho, e
aqui estava ele rindo do sentinela. Isso deixou o sentinela com tanta raiva que ele
deu ao outro goblin um golpe no traseiro com o cabo da lança.
— GOBORB?!
O sentinela gargalhou quando o outro goblin deu um salto no ar. Sua vítima veio
até ele com os punhos erguidos, assim ele virou a lança e ofereceu a ponta.
— GROB! GBOOROBO!!
Em outras palavras, esse era o seu posto, então se o outro goblin não tivesse mais
negócios ali, ele deveria seguir seu rumo.
O outro goblin não retrucou a autoridade de um trabalho atribuído. Quando ele
se afastou resmungando, o sentinela cuspiu Bem feito e sorriu.
Agora vem a parte divertida.
O sentinela olhou para a esquerda e a direita, se certificando de que ninguém
poderia vê-lo, então entrou pela porta que estava apodrecendo.
— GBOB…?
A fêmea olhou para cima, dando apenas um “ahh” e “agh” mesmo quando a
chutou. Mal poderia se dizer que ela estava viva ou não. O goblin deu a ela um
golpe suave com a lança, e ela imediatamente gritou “Gaaah!”. Ele continuou
algumas vezes mais, e ela produziu alguns tipos “iaaargh” interessantes de sons.
Bah. Sem vantagens como essa, seria impossível suportar o trabalho difícil de
sentinela. Era irritante, no entanto, que eles o avisassem para não a deixar morrer.
Eles iriam ficar bravos com ele se ela morresse quando ainda queriam mais
diversão com ela. Mas, um pouco de raiva em troca de alguém assim? Valeria a
pena o problema.
— Devol… Devolva…!
— GRRORB!
O goblin inclinou a cabeça para a mulher, que finalmente começara a fungar e
soluçar.
Humm, essa lança pertence a essa fêmea, não é?
A lança, como a mulher, não duraria muito tempo. Ele achou o pensamento
estranhamente engraçado e deu uma risadinha.
Ele teve o seu divertimento com a mulher até que ela não pudesse mais fazer
nenhum som, e então vagou pelo ninho.
Ele se certificou de que ela ainda estivesse viva — ainda se contorcendo, pelo
menos — e até mesmo cuidou do banheiro.
E logo seria a “manhã”. Os aventureiros só vinham à “noite”.
Ninguém pode pegar no meu pé por nada.
Goblins sempre levavam as coisas da forma que lhes pareciam melhor.
— GOROB! GOOBORROB!!
— GBBROBOG!!
Ele esteve andando pelo ninho por um tempo quando ouviu gargalhadas
espirituosas.
Eram os batedores.
Dois ou três estavam sentados juntos, bebendo vinho de uma tigela quebrada.
Eram eles que procuravam as estradas ou aldeias aos arredores por presas
desprevenidas, se aventurando em uns ou dois. Então era normal que muitos
deles tivessem benefícios adicionais.
Não era incomum para eles voltarem cedo para um lugar que os goblins
acreditavam ser seguro, para se divertirem. Eles sempre estavam embolsando
alegremente os itens que roubavam de quem quer que encontravam. Mas o
trabalho deles era fácil, se agrupar para atacar sua presa. O sentinela trabalhava
tão duro o tempo todo, e esses caras…!
E quanto ao trabalho de guarda?!, pensou ele, indignado por ser ignorado. Ele
tentou lhes mostrar a extremidade da lança, mas eles apenas olharam feio para
ele.
— GOBOR…?
— GOROBOR!
Eles não tinham feito nada para ele, e todo esse balançar de lança não mudaria
isso. Ele se esquivou do batedor que lhe deu um golpe com a tigela, e se afastou.
Pfft! Eles eram criaturas repugnantemente violentas. Eles apenas deveriam ir em
frente e morrer.
Ainda mal com a amargura, ele chegou ao caminho lateral que se estendia perto
da entrada. Era uma rota de emboscada que os goblins cavaram, sendo familiares
como eram com a terra e o solo. Aventureiros, ou seja lá como se chamavam,
nunca pareciam achar que poderiam ser atacados por trás.
Havia, é claro, rochas nas proximidades para se esconder por trás, e era uma delas
que o sentinela se aproximava agora.
Tudo isso, todo mundo.
Ele odiava, odiava, odiava tudo.
Ele odiava a função de sentinela.
Ele odiava ter nada além de uma lança.
Ele odiava os batedores por intimidá-lo.
Ele até odiava o chefe retardado, que não tinha nada além do tamanho para falar.
Ele mesmo daria um chefe melhor que aquele idiota!
Ele poderia ter todas as aventureiras e aldeãs que quisesse, só para si.
Ele poderia fazer os guardas e batedores fazer todas as coisas desagradáveis e
irritantes. Ele apenas berraria ordens do fundo do buraco e se empanturraria de
comida e fêmeas.
Hmm. Chefe parecia ser um bom trabalho.
Ele ficou completamente absorvido no que para ele parecia uma possibilidade
realista, quando objetivamente era pura fantasia.
Como é que ele assassinaria o chefe que unira a horda? Como é que o humilde
triunfa sobre o forte?
Ele concebeu um plano que não tinha dúvida que teria sucesso. Então ele se
levantou lentamente da sombra da rocha.
Mas…
— GORB…?
De repente, seus ouvidos nada aguçados captaram o som de passos ousados.
Eles estavam se aproximando rapidamente. Ele se escondeu apressadamente
atrás da rocha, depois espiou cuidadosamente, só com os olhos aparecendo.
Um aventureiro!
Não havia erro. Apenas um aventureiro andaria pelo seu ninho com uma tocha
na mão.
E sozinho, ainda por cima. O cheiro era difícil de descobrir. Ele esperava que
fosse uma mulher. Mas mesmo que fosse um macho, eles ainda poderiam comer.
O goblin lambeu os beiços, babando horrivelmente, sem se incomodar em
esconder a cobiça surgindo.
Ele iria atacar, acabar com o aventureiro, dilacerar, se divertir. Maldito
aventureiro. Maldito aventureiro!
Mas enquanto se escondia, pronto para saltar com a lança na mão, um pouco de
bom senso permaneceu com ele.
Sua presa estava sozinha. Mesmo assim, goblins eram fracos. Aventureiros eram
estúpidos, mas eram fortes. Mesmo que o goblin emboscasse o aventureiro aqui
e agora, não significaria nada se ele mesmo morresse.
Ele poderia gritar para convocar seus companheiros, mas ele ainda seria o
primeiro a morrer.
Ele poderia se infiltrar em silêncio para lhes dizer, mas havia batedores no
caminho. Eles receberiam todo o crédito.
O que devo fazer?
O goblin ficou ali, com a lança na mão, pensando o máximo que podia.
Ele não queria morrer. Ele queria tirar algum proveito disso. O que fazer, o que
fazer?
Talvez eu devesse correr.
Ele balançou rapidamente a cabeça. Não, isso não funcionaria. Se o aventureiro
descobrisse que ele tinha corrido, bateria nele até não restar nada. E se seus
companheiros salvassem o dia, aquele que correu não ganharia nada. Sem
acasalar, sem comida. Ele só iria ser capaz de assistir enquanto todos os outros
se divertiam na frente dele.
Ele não podia suportar. Então ele decidiu esperar pelo momento.
Ele prendeu a respiração, cauteloso para não fazer nenhum barulho, enquanto
seguia o aventureiro lentamente, ah, bem devagar.
Por fim, seu momento chegou.
— GOROBOR!!
— GROB! GROBORB!!
O aventureiro chegou onde os batedores estavam tomando seu vinho.
No momento em que chegou, ele jogou a tocha de sua mão esquerda bem no
meio do grupo.
— GORB?!
— GRBBBROG?! GROBOOBR!
O vinho e o fogo se espalharam. Alimentando-se do álcool, a chama da tocha se
intensificou.
Goblins eram sem dúvida capazes de ver no escuro, mas sua visão ainda ficou
prejudicada pela fumaça.
Um gritou, outro entrou em pânico e o último simplesmente não sabia o que
estava acontecendo. Cada um dos três batedores teve uma reação diferente, mas
todos eles ainda estavam tentando entender a situação enquanto o aventureiro
agia.
— GROB?!
Um corpo surgiu batendo com um escudo pequeno.
O alvo, que teve a infelicidade de estar de costas, tropeçou de cara no fogo.
— Quarto. — murmurou o aventureiro, pisando em cheio em cima do goblin que
se contorcia de agonia das queimaduras.
— GRBBBR…
— GROBROB!!
Os dois restantes prenderam a respiração. Mesmo assim, eles pegaram as armas
para atacar o invasor enlouquecido.
Mas já era tarde demais.
A mão direita do aventureiro se moveu rapidamente quando ele arremessou sua
espada; ela esmagou os dentes de um dos batedores quando o perfurou pela boca.
— GOOBR?!
— Cinco.
O aventureiro nem sequer olhou para o goblin ajoelhado e se contorcendo com o
cérebro saindo por trás da cabeça.
Em vez disso, o aventureiro transferiu seu peso para o goblin debaixo de seu pé,
quebrando sua coluna e se lançando para frente enquanto seu braço esquerdo se
aproximava do último batedor.
— GBBOORB?!
A borda afiada do escudo cortou o rosto do goblin. Um jato de sangue pintou a
parede.
O goblin jogou a arma de lado para pressionar as mãos em seu nariz e cavidade
ocular rompidas, mas…
— São seis.
O aventureiro pegou a lança do batedor, que caiu aos seus pés, e perfurou o
coração da criatura com ela.
O último batedor logo deixou de fazer nada além de se contorcer e não passava
mais do que um saco de sangue cuspindo entranhas.
O aventureiro largou a lança de lado como se fosse uma porcaria e suspirou.
Então ele se aproximou indiferentemente do corpo, pisou nele e agarrou a espada
sobressaindo de sua garganta.
Eles eram estúpidos.
Se esse goblin não estivesse esperando atrás, observando sua chance, ele nunca
teria sabido.
Três contra um. Verdade, os batedores estavam bêbados. Mas ele poderia ver o
que aconteceu.
Por isso sua forma era a melhor.
O batedor expeliu sangue, dando o último suspiro. Em seu coração, o sentinela
ficou radiante com a visão.
Isso vai lhes mostrar, seus bárbaros idiotas.
Não havia nenhum sinal de compaixão dele para com os batedores que se
transformaram em tais avatares do sofrimento.
Mas seja como for, ele estava zangado com aquele que viera em seu ninho e
assassinara goblins.
Por isso esse era o momento, quando o aventureiro — cansado da batalha —
tinha virado as costas.
Agora!
Seus companheiros em breve chegariam, atraídos pela agitação. Quando eles o
vissem agarrando o aventureiro depois de atacar por trás, eles iriam louvá-lo. Ele
poderia até mesmo ser capaz de se gabar por ter se levantado e lutado enquanto
seus companheiros morreram.
Com seu coração cheio de egoísmo e ganância, ele deu um salto gigantesco. Ele
moveu sua lança em um arco de cima para baixo, a segurando inversamente.
A barriga ou o peito serviria, se fosse o melhor que conseguisse, mas o braço ou
a perna era o ideal. Se fosse revelado ser um homem, tudo que poderiam fazer
era comer.
— …?!
Foi quando aconteceu.
Ele não sabia o que ocorreu. Tudo o que ele sabia era que seu ataque deveria ter
sido uma emboscada por trás, mas o aventureiro segurava sua lança com as duas
mãos.
O aventureiro armadurado se moveu rápido demais para se ver.
E no instante em que o goblin tentava decidir se largaria a lança ou faria outra
coisa, ele se viu prensado, com lança e tudo, no chão.
— GROB?!
Ele não tinha considerado essa possibilidade.
Sua mente deu um branco; ele ficou completamente perdido.
— GBBOROBO?!
Ele não pôde dar uma resposta adequada em meio sua desordem.
Ele sentiu uma dor fantástica com a pancada nas costas, sua carne e ossos
lamentaram, e acima de tudo, ele tinha dificuldade em respirar.
Ele abria e fechava a boca, com a lança caindo de sua mão.
Não restava mais nada para ele. O aventureiro desembainhou uma espada.
O goblin se pôs de pé cambaleando e começou a correr para a entrada da caverna
tão rápido quanto podia…
— Esse vai dar sete.
Juntamente com o pronunciamento implacável veio um choque que percorreu de
suas costas ao peito, e sua consciência desvaneceu.
Ela nunca mais voltou.
— Hmm.
Depois de acabar com sete goblins, Matador de Goblins finalmente teve que dar
um suspiro.
Você pode notar algo atrás quando um par extra de passos vem tamborilando
atrás de você.
Ele extraiu a lâmina e limpou o sangue nos trapos do goblin, depois verificou o
fio e devolveu a espada à bainha. Ainda poderia ser usada.
Ele passou o dedo na ponta da lança que tirou do goblin e examinou o cabo
quebrado.
Matador de Goblins estalou a língua, então a adicionou ao cinto.
Depois ele chutou as mãos dos batedores, quebrando seus dedos e soltando as
espadas que seus corpos ainda agarravam.
Acaso havia três delas. Ele pegou a que estava em melhores condições e
acrescentou ao cinto. Isso serviria.
Ele vasculhou sua bolsa de itens, pegou o cantil e puxou a tampa, então bebeu o
conteúdo.
O cantil foi feito com o estômago de uma ovelha, virado do avesso e secado, e
ele agora continha uma mistura de água e vinho tinto.
O líquido frio deslizou pelo visor do capacete de Matador de Goblins, depois
entre seus lábios, fluindo na garganta e indo para o estômago.
Não seria bom se embriagar com vinho, mas um pouco aquecia o corpo e ajudava
no estado de alerta.
— …Não vejo quaisquer totens — murmurou Matador de Goblins consigo
mesmo enquanto colocava a tampa e devolvia o cantil à bolsa de itens.
Ele balançou a cabeça suavemente quando percebeu que ninguém respondeu.
Sacerdotisa e seus outros companheiros — ele balançou a cabeça outra vez ao
perceber que pensava neles dessa forma — não estavam ali.
Eles tinham os seus próprios planos. Eles tinham a saúde para se preocuparem.
Eles nem sempre estariam todos juntos.
Matador de Goblins virou suas costas para a parede e empurrou o visor para
baixo. Ele aquietou sua respiração. Ele não ouvia nada como passos.
Em vez disso, ele ouviu o som de uma refeição sendo devorada. Ele podia sentir
pequenas ondas de choques nas costas. Era claro o que estava acontecendo.
Sua fonte de luz — a tocha — ainda brilhava entre os restos do grupo dos
batedores. Bom.
Matador de Goblins retirou rapidamente um frasco da sua bolsa de itens e o jogou
praticamente no lugar certo.
O recipiente de barro e a parede explodiram aproximadamente na mesma hora.
— GBRROBORRBBBG!!
Goblins.
Uma horda deles, uma maré agitada.
Mas os primeiros que saltaram em frente impacientemente tombaram
inesperadamente.
Eles devem ter tropeçado na gordura por todo o chão. As piruetas foram apenas
um pouco da humilhação adicional.
— GOROB?!
— GOB?! GBOROOBOGOBG?!
Eles gritaram, se vendo chutados e pisados pelos seus compatriotas, que vieram
um após o outro por trás deles.
Pior, eles tinham caído na tocha acesa e foram envoltos em chamas ardentes.
— GOROOOBOGOROOBO?!?!
— Oito, nove… dez.
As criaturas queimando contabilizaram duas delas. A outra foi aquela que fora
pisoteada até cair imóvel.
— Restam sete. Uma lança, uma espada, um machado, quatro clavas. Ótimo.
Sem se importar com a imolação dos seus outros companheiros, os outros goblins
surgiram, raiva e ganância cintilavam em seus olhos.
Tendo feito um balanço dos inimigos, Matador de Goblins preparou sua espada
e os enfrentou de frente.
— GBBRBGGB!!
O primeiro a vir até ele foi o goblin segurando uma lança, o ponta de lança literal
da operação.
— Onze.
Matador de Goblins arremessou indiferentemente a espada na criatura. Ela
sibilou através do ar estagnado da caverna e se enfiou na testa do goblin com
um thac, perfurando seu cérebro.
— GGBGGO?!
Quando o goblin cambaleou e caiu sob o impacto, Matador de Goblins roubou a
arma de sua mão.
Uma arma longa não era ruim. Você não seria cercado. A primeira coisa era
retirar quem tivesse o maior poder de fogo.
Se tivesse um dos grandes presentes, a prioridade teria sido reduzir seus números,
mas no momento ele queria evitar ser imobilizado por causa de um só golpe.
Isso significava que o próximo passo era claro.
Matador de Goblins, ainda segurando a lança, correu para as profundezas da
caverna.
— GOROOB! GOROOBORG!!
— GROOB!!
Os goblins, seis deles, o seguiram com passos patéticos. Matador de Goblins
olhou para trás para corrigir a mira, depois ergueu sua lança.
— Esse é doze.
A lança voou, fazendo um arco.
Ela passou sobre o goblin que fora empurrado para frente e acertou o que
segurava um machado.
— GOOROBOG?!
Talvez tivesse perfurado o estômago; um grito inarticulado ecoou pela caverna.
Cinco sobravam. Matador de Goblins arremessou a espada do batedor, de seu
cinto. Ele estava ficando sem tempo, e era arriscado ir mais fundo. Era hora de
enfrentar o inimigo.
— GOROBB!!
— GBOR!
O goblin com a espada distribuiu ordens presunçosamente aos quatro com clavas.
Claro, isso não era demonstração de coragem, nem era um desejo ardente de
vingança.
Eles estavam descontentes por ter visto seus companheiros morrerem e queriam
espancar esse adversário de forma triunfal. Sobretudo, os goblins gostavam de
surrar aventureiros e roubar seus equipamentos mais do que tudo.
— Hmph.
Matador de Goblins deu um passo para trás, depois prendeu a primeira clava que
veio até ele.
— GBOROB?!
Enquanto o monstro tentava soltar sua arma, Matador de Goblins impulsionou
sua espada naquele que saltava até ele pela direita.
A lâmina deslizou através do maxilar da criatura, perfurando a cabeça na
diagonal. Mas não pôde aguentar o peso do goblin e quebrou.
— GOOROBOOBO?!
— Mais quatro.
Enquanto ele ajustava a mão no cabo da espada, ele enfrentou o golpe de clava
de um monstro na frente com seu escudo. Seu braço esquerdo formigou. No
mesmo movimento, ele moveu horizontalmente o escudo e bateu o oponente no
goblin à esquerda.
— GBOR?!
— GOROBO?!
— Próximo.
Enquanto os dois goblins ainda estavam se contorcendo pelo impacto, ele
brandiu o cabo da espada na criatura da frente dele. O goblin apavorado largou
sua clava e tentou correr, mas era tarde demais.
— GOBOOROGOBOGOB?!
Um golpe. A empunhadura e a guarda da espada afundaram na parte de trás da
cabeça do goblin, afundando em seu crânio, e o monstro gritou.
Não foi um ferimento grave, mas isso não importava. Ele poderia simplesmente
retirar a vida do goblin.
Matador de Goblins bateu na criatura com a guarda de sua espada como se fosse
um martelo.
— GOROB?! GOROOG?! GOOROBOG?!
Pancadas secas soaram até que finalmente sangue e miolos jorraram do crânio
quebrado.
Matador de Goblins deu um estalo com a língua e largou a espada, depois moveu
os pés para pegar a clava que ele estava em cima.
— Isso torna quatorze. Três restando…!
Os outros dois goblins tinham se posto de pé e estavam vindo juntos até ele.
Matador de Goblins lidou com um deles usando seu escudo redondo, quebrando
a cabeça do monstro e ficando fora do alcance do outro com a clava.
— Dois sobrando.
A diferença no tamanho do corpo significava uma certa diferença no alcance. E
em um combate frente a frente não havia como ele perder para um goblin.
Instantes depois, o som da morte da próxima criatura ecoou na caverna.
— GOROOBOROB?!
— GOROBOGR!!
O último goblin, aquele com a espada, não perdeu tempo em dar um berro e fugir.
Felizmente para o goblin, seu inimigo estava indo mais a fundo na caverna. Se
fugisse para o lado de fora, ele provavelmente não o seguiria. A luminosidade
odiosa de fora parecia para ele como a salvação.
O goblin não sentia qualquer culpa em abandonar seus companheiros. Era culpa
deles ele estar em perigo, para começo de conversa.
Ele pisava sobre os restos ainda em chamas das outras criaturas, correndo,
correndo, correndo…
— Hrmph.
Matador de Goblins soltou a clava ensopada de cérebro indiferentemente, se
aproximando do corpo que estava empalado com a lança.
O machado ainda estava em sua mão. Ele o pegou habilmente e jogou.
O goblin fugindo morreu acreditando até no último instante que só ele sairia a
salvo.
O machado devastou seu crânio por trás, dizimando seu cérebro. Ele se inclinou
para frente e caiu.
— Dezessete.
Matador de Goblins pegou uma nova tocha de sua bolsa, a acendendo com as
brasas daquelas que havia entre os restos do grupo.
Então se virou por um momento, ainda mais audaz do que antes, e revistou o
cadáver do goblin que matou com o machado.
Ele procurava pela espada. Quando a encontrou, ele a colocou em sua bainha.
— Três no reconhecimento, um por acaso, três batedores e dez por emboscada.
Dezessete no total. Há prisioneiras. Sem totens. Sem veneno — murmurou
consigo mesmo.
Como interpretar isso? Claro, ele não ouviu nenhuma resposta. Matador de
Goblins começou a pensar.
O ninho era de pequena escala. Provavelmente não deveria ter muitos mais
goblins. E ele ainda não tinha pegado seu líder.
— Talvez um hob seja o líder deles.
E ainda assim, ele não sentia que um hobgoblin estava vindo.
Matador de Goblins logo determinou o que isso significaria.
— É o tipo de coisa que um goblin iria pensar.
Ele analisou rapidamente todos os seus equipamentos. Capacete, armadura,
escudo, arma, todos bem.
Ele segurou a tocha com a mão esquerda e avançou pela caverna com seu passo
audaz e indiferente.
O ninho era grande o suficiente para abrigar umas dez criaturas. Tinha algumas
ramificações, mas havia um limite para elas.
Mas acima de tudo, era o odor desagradável cocegando seu nariz que dizia a
Matador de Goblins para onde ir.
Ele deu várias voltas no caminho sinuoso e logo chegou a uma porta
apodrecendo.
— Ah… ouch! Isso… Isso dói…?!
— GGGOROOOBB!!
O que surgiu foi um goblin enorme puxando uma mulher pelo cabelo.
A mulher deu um grito de dor, mas a julgar pelo estado de seu corpo, ela não
estava mais em condições de resistir.
Vários fios de cabelo se soltaram, levando junto pedaços de seu couro cabeludo,
mas tudo o que ela podia fazer era gritar.
Enquanto isso a ridicularizava, o hobgoblin percebeu que havia alguém
bloqueando seu caminho. Ele olhou para cima.
— GOROBB……
O hobgoblin resmungou algo, ergueu a mulher e a segurou na sua frente.
Um fedor horrível flutuava de cada parte dela; sangue e resíduos se misturavam
e escorriam pelo seu corpo.
O hob a colocou na frente de si como se para chamar a atenção de Matador de
Goblins com seus olhos vidrados, presumivelmente ele a via como um escudo de
carne.
— Tolo — cuspiu Matador de Goblins. — Isso não mudará nada.
O pensamento do hob era claro. Na verdade, qualquer goblin teria provavelmente
pensado o mesmo nessa situação.
Contanto que ele sobrevivesse, isso era tudo o que importava.
A criatura pretendia sacrificar seus companheiros e escapar com a fêmea.
Era apenas o tipo de coisa que um goblin iria pensar.
— GROBO! GOBOOROGB!!
—…
O hob achava que dizia para ele largar a arma, deixar para lá, ou algo assim.
O hobgoblin sorriu horrorosamente para ele, enquanto brandia a machadinha
com a mão direita.
Matador de Goblins olhou para a mulher que a criatura estava usando como um
escudo. Ele olhou nos olhos dela. E então deu só um pequeno aceno.
— Está bem.
Ele sacou a espada do quadril e a largou. Os olhos do hob seguiram o movimento.
Matador de Goblins avançou de imediato, chutando impiedosamente a criatura
na virilha.
— GGROOOOROOBOROOB?!?!
O monstro deu um grito insuportável face ao dano entre as pernas. Matador de
Goblins, de fato, sentira algo estourar sob os dedos do pé.
Goblins sempre eram tão convencidos. Mesmo ele nunca tendo a menor intenção
de se deixar morrer calmamente.
— Erg… ahh!
— GBBRGO?! GOROOBOGOROGOB?!?!
O hobgoblin jogou a mulher de lado em meio suas convulsões. O capacete de
aço olhou para ele indiferentemente.
Assim Matador de Goblins pegou sua espada — segurando inversamente — se
apoiando no ombro do goblin e impulsionou a lâmina com força.
— GOOBOR?!
Só houve um berro incoerente. A espada ficou verticalmente na parte de trás do
crânio da criatura. Matador de Goblins lhe deu um belo giro.
A espada cortou a coluna com um crac, assim o hob deu uma tremenda sacudida
e depois parou de se mover.
— Dezoito… Você está viva?
A mulher descartada tremia. Levemente, com os lábios tremendo, ela murmurou
um “si” e “in”.
— Entendi.
Matador de Goblins vasculhou sua bolsa de itens, retirando um sobretudo
embrulhado. Ele o envolveu sobre a mulher, e assim que cobriu seu corpo
encharcado de imundice, ele a ergueu como uma mercadoria.
A mulher murmurou debilmente alguma coisa, à qual Matador de Goblins disse
“entendi” e assentiu.
— Eu peguei a lança — disse ele. — O cabo está quebrado, mas a ponta não.
Matador de Goblins andou silenciosamente para fora da caverna.
Um pranto fraco e desesperado pesou sobre suas costas.
Capítulo 5: De um Dia em
que Ele não Estava Lá

— Mrm… ooh… hha…


Logo após o amanhecer, o ar fresco eriçou sua pele; ela se revirou com os
cobertores com pequenos ruídos.
Normalmente ela teria esperado ouvi-los nesse momento, mas hoje não houve
qualquer sinal de passos se aproximando.
— …Oooh…?
Ela não era do tipo de ter problemas em sair da cama, mas sem os sons que estava
acostumada, achava difícil abrir os olhos.
Quando finalmente se arrastou para fora da cama de palha, ela esfregou suas
pálpebras pesadas e sonolentas e deu um grande bocejo.
O meio-dia ainda era quente, mas a noite e a manhã assumiam um frio.
Com muita tremedeira e sacolejos, ela colocou as roupas íntimas em seu corpo
saudavelmente carnudo, como sempre.
— M-mm… talvez só um pouco… apertado demais?
Ela ganhara algum peso? Ou apenas cresceu um pouco? Seja como for, ela não
via com bons olhos. Era injusto seu tio ficar sempre comprando roupas novas e
roupas íntimas.
Mas, também não é bom usar coisas que não cabem.
Se calhar, ela faria modificações na roupa.
Com esses pensamentos em mente, ela abriu a janela e a brisa fresca da manhã
soprou no quarto.
Sorrindo de prazer, ela se debruçou, repousando seu peito volumoso no parapeito
da janela.
Era uma cena que ela conhecia e gostava.
Os campos da fazenda balançando. O mugido de vacas ao longe. O cacarejo de
galinhas. A fumaça se erguendo da cidade longínqua. O mundo.
— …Ah, é mesmo — murmurou Vaqueira distraidamente, enquanto se deleitava
na luz dourada do sol. — Ele não está aqui hoje.
— Que tal você ir à cidade?
— O que disse?
Vaqueira virou só a cabeça para olhar para seu tio. O café da manhã terminara, e
ela estava empilhando os pratos na pia.
Não havia muito o que lavar quando ele não estava. Isso facilitava as coisas, e
isso era bom, de certa forma.
— Eu disse: Que tal você ir à cidade?
Ela olhou para ele outra vez. Sua expressão era simples e franca, e ele olhava
soturnamente para ela.
— Hum? — disse ela questionadoramente, olhando de volta para ele enquanto
pegava os pratos e os secava. — Para mim tanto faz. Mas eu não teria muito o
que fazer lá.
— Bom, isso não pode ser verdade. — Seu tio estava sempre tão sério. Ele
continuou sem pausar: — Seus amigos estão lá, não estão?
— Amigos, certo…
Vaqueira sorriu vagamente. Ela pegou um pouco de areia de um balde ao lado
dela e esfregou na superfície de um dos pratos, xric-xroc.
— Acho que podemos chamar aquela pessoa de amiga, se quisesse. Mas acho
que talvez ela esteja bem mais para uma companheira que compartilha os
mesmos valores.
— Devia sair para se divertir às vezes.
— Hmm…
Vaqueira fez um som que não foi nem aceitação quanto negação.
Vendo que a areia limpou todas as manchas do prato, ela lavou outra vez com
água.
Finalmente ela limpou o prato suavemente para secá-lo e devolver para a
prateleira de louças.
— Mas há os animais para cuidar, a colheita, o muro de pedra e a cerca para
verificar, entregas para fazer e depois temos que se preparar para amanhã…
Ela contou as tarefas com os dedos; havia mesmo muito trabalho. Muitas coisas
para serem feitas. Coisas que tinham de ser feitas hoje. Coisas que deveriam ser
feitas hoje. Todos os tipos de coisas que poderiam ser resolvidas em vez de
adiadas.
Exato, assentiu Vaqueira, fazendo seu peito balançar. — Não tenho tempo para
brincadeiras. Ainda bem que temos trabalho a fazer!
— Estou dizendo para você ir se divertir. — Sua voz não tolerava qualquer
argumento.
Ela olhou para ele, surpreendida com seu tom brusco.
Seu tio estava imóvel. Quando ele ficava assim, sua opinião era menos propensa
a mudar do que uma montanha. Ele passara dez anos a criando, e ela
compreendeu isso sem ele dizer nada.
— Hã? Mas… Hum…
— Você ainda é muito nova. Quantos anos você tem? Quero que você me diga.
— Hum, eu tenho… dezoito… — Ela assentiu assiduamente. — Quase
dezenove.
— Então não é o seu dever trabalhar de manhã até a noite todos os dias.
Vaqueira quebrou a cabeça por uma resposta.
…Hum? Por que estou tão contraria em sair?
O pensamento passou por toda sua mente e desapareceu. Esse não era o
momento.
— M-mas, e o dinheiro…
— Felizmente, não somos servos. Nossas vidas não são ditadas pela falta de
recursos.
— Bem, verdade, mas…
Não adiantava. Com sua frágil resistência sumariamente subjugada, Vaqueira
ficou sem palavras.
Bem, e agora? Os pratos estavam limpos e ela não tinha outras cartas na manga.
Ela revirou afazeres na cozinha por um tempo antes de finalmente se sentar em
frente ao seu tio.
— Não precisa se preocupar comigo. — Ele era gentil como sempre, como se
estivesse falando com uma criança.
Vaqueira contraiu os lábios — ele não tinha que falar com ela dessa forma —
mas ela não disse nada. Talvez isso mesmo fosse infantil. Nesse caso…
— Vá e se divirta. — Enquanto a observava, seu rosto escabroso se suavizou de
repente e relaxou. — Uma jovem que trabalha o tempo todo na fazenda?
Certamente há alguma coisa ou outra feminina que quer fazer.
— Fico pensando…
Vaqueira não sabia.
Coisas femininas?
O que seria isso? Arrumar-se? Comer doces? Todas as suas ideias pareciam
distantes e vagas.
Comparado com isso, o clima de amanhã parecia concreto…
— …Está bem — disse ela depois de um tempo, ainda não sabendo ao certo se
entendeu ou não algo. — Vou sair um pouco então.
— Sim, faça isso.
— …Tá.
Vendo o alívio de seu tio, tudo o que pôde fazer era acenar com a cabeça.
Ela não tinha a carroça e ele não estava ali, era apenas ela.
Ela viu seu ritmo instável mesmo que só estivesse indo à cidade por uma estrada
que conhecia bem.
Como ela normalmente caminhava nessa estrada? Ela acabou se sentindo muito
intrigada.
E assim, passando por entre aventureiros e mercadores enquanto iam e vinham,
ela atravessou o grande portão da cidade.
Vaqueira sorriu jocosamente quando seus pés começaram a levá-la em direção à
Guilda dos Aventureiros, geralmente o primeiro lugar que ia. Dominando
conscientemente seu subconsciente, em vez disso ela foi reto para a cidade, em
direção a praça.
Havia conversas no ar, vozes de comerciantes, crianças brincando, mães
chamando, aventureiros conversando entre si. Mergulhando-se nos sons,
Vaqueira se sentou vagamente em um meio-fio aleatório. Ela observou um
menino e uma menina, talvez com uns dez anos, passar. Ela os seguiu com os
olhos e suspirou.
Agora que penso nisso… — Eu tenho amigos…?
Não havia mais ninguém que conhecesse desde pequena. Ela se mudara dez anos
atrás, e por cinco desses anos ela se absorveu só no que estava em sua frente.
É um pouco tarde para ir ao passado agora.
Da forma como ela estava naquela época, teve sorte de ele ter a chamado
enquanto vagava.
Ainda havia chifres em seu capacete de aço, e o cabelo dela era
consideravelmente mais longo.
Pelos cinco anos depois disso, sua cabeça estava cheia dele. Ela estivera
completamente incapaz de se divertir.
— Ah, mas…
Ela balançou a cabeça, pensando na recepcionista e a empregada que via quase
todos os dias. Elas podiam contar como amigas, mas só havia duas. Bem, duas
amigas podem ser o suficiente.
Muitas pessoas não conseguiam fazer amigos.
— …Estou muito bem.
Esse pensamento a fez muito bem. Ela sorriu debilmente e continuou olhando
para as pessoas que iam e vinham pela praça.
Elas carregavam uma variedade infinita de expressões. Algumas pareciam estar
se divertindo, outras pareciam tristes. Algumas pareciam solitárias, outras
felizes. Mas todas elas andavam sem hesitação, com algum tipo de objetivo em
mente. Trabalho, ou uma refeição, ou um lugar para onde voltar, ou um lugar
para se divertir, ou, ou…
Nada como ela.
Vaqueira sentada no meio-fio, trouxe os joelhos para perto do peito.
Esse é um problema grave.
No fim, não tenho uma única relação com nada, exceto a fazenda…
— …? Algo de errado?
Ela pensou ter reconhecido a voz acima dela.
Ela olhou para cima e viu uma garota de cabelos dourados olhando para ela com
uma pitada de confusão. Ela tinha um corpo elegante e esbelto, e vestia roupas
modestas de cânhamo, simples e despretensiosas.
Vaqueira piscou, tentando se lembrar de quem era, e então bateu as mãos.
— E-ei, você é aquela sacerdotisa…
— Ah, sim. E você é da fazenda, certo?
— É, isso mesmo. — Vaqueira assentiu e ficou de pé, abanando a sujeira do
traseiro. — O que houve com suas roupas?
Em vez de suas vestimentas habituais, Sacerdotisa estava vestida com roupas
normais; de fato, seu traje a fazia parecer uma garota de uma aldeia agrícola.
— Eu fiquei para trás dessa vez, então pensei… eu poderia muito bem sair. —
Ela coçou o rosto com o dedo magro em um gesto de embaraço. — Mas não
tenho ideia do que fazer.
— É, eu também. Sei exatamente o que quer dizer. Normalmente só preciso fazer
o que se precisa em uma fazenda.
Hum. Elas eram iguais.
Ela sabia que seu senso de solidariedade poderia ser um pouco unilateral, mas
Vaqueira ainda assim suspirou e relaxou um pouco. Ela sempre fora extrovertida,
afinal; ela não ficava nervosa. E de qualquer forma, essa era um dos seus
membros de grupo.
Seria errado dizer que não havia uma sombra de dúvida em sua cabeça, mas
Vaqueira decidiu manter uma atitude descontraída.
— Você disse que ficou para trás dessa vez? Por quê?
— Ah, humm, é… — Subitamente, Sacerdotisa não conseguiu terminar bem sua
frase; seus olhos se moveram de um lado para o outro. Suas bochechas coraram
— sua temperatura subira um pouco? — e seus olhos se voltaram ao chão com
um olhar abatido.
Hum?, pensou Vaqueira suspeitosamente, mas uma explicação veio a seguir.
— Hoje é… um dia bocado difícil para isso…
— Claro. — Vaqueira deu um sorriso tenso e assentiu. Era uma coisa que toda
mulher tinha que lidar.
Deve ter sido difícil para uma garota envergonhada dizer a informação dessa
forma.
— O que costuma fazer, sabe, quando não está em uma aventura?
— Eu oro.
Vaqueira sabia que era uma tentativa desajeitada para mudar de assunto, mas a
resposta da garota foi breve e sincera. Ela se encaixava mais ou menos na
imagem que Vaqueira criara depois de vê-la de longe algumas vezes.
— Sério? — disse Vaqueira com admiração, e Sacerdotisa pôs o esbelto dedo
branco nos lábios e pensou por alguns instantes.
— Também leio as escrituras, o Livro dos Monstros e treino…
— Nossa, você é mesma uma garota séria, hein?
— Eu só não aprendi o suficiente ainda.
Talvez Sacerdotisa não estivesse acostumada a ser elogiada, pois a expressão
surpresa de Vaqueira a fez com que corasse de vergonha.
Hmm…
Ela decidiu não dizer que planejava elogiar Sacerdotisa para ele mais tarde.
A despeito de como se parecia, ele se importava com as pessoas, do seu jeito,
então talvez seria um bocado exagerado, mas…
— …Ei.
— Sim?
— Que tal darmos uma volta? — Vaqueira sorriu. — Já que nos esbarramos e
tudo mais.
— …Tem razão. — Sacerdotisa sorriu de novo, como uma flor desabrochando.
— Sim, vamos andar um pouco.
— Se pensarmos bem, ainda está longe, mas quando o verão acabar, será o tempo
do festival da colheita, não é?
— Ah, sim. O Templo vai começar em breve os preparativos para a dança de
oferenda.
— Pergunto-me quem será a dançarina. Já pensou em se tornar uma candidata?
— Não, de certo. Isso carrega muita responsabilidade. Ainda não estou
preparada.
— Acha? Talvez a nossa fazenda devesse montar uma barraca… Poderíamos
fazer outra coisa além de comida.
— Já está ficando bastante quente, mas o outono chegará antes que perceba, não
acha?
Enquanto as duas caminhavam lado a lado, sem qualquer destino específico, elas
conversavam à toa.
A cidade fronteiriça era um dos assentamentos pioneiros mais distantes.
Naturalmente havia muitos visitantes, e bastante gente andando ao redor. Mas
não, é claro, tanto quanto a cidade da água ou a Capital, de modo que enquanto
caminhavam, elas viam rostos que conheciam por aí.
— Oh, que bom ver você!
— Olá!
Vaqueira se curvou e Sacerdotisa deu um aceno respeitoso com a cabeça quando
passaram por uma aventureira que reconheceram. Seus círculos de conhecidos
certamente cresceram desde o ataque do senhor goblin à cidade.
É um sentimento estranho.
Vaqueira riu involuntariamente, induzindo uma olhada intrigada de Sacerdotisa.
— Nada, nada — disse Vaqueira, balançando a mão e com o sorriso ainda no
rosto.
O que quer que ele pudesse dizer, ele estava ligado claramente a um grande
número de pessoas.
Nada como eu, hum?
— …Ei. Como ele é? Quero dizer, geralmente.
— Como ele é? Como assim?
— Só queria saber se ele, sabe, é um pé no saco ou algo assim…
Vaqueira juntou as mãos atrás de si e virou, mas Sacerdotisa balançou as mãos e
disse: — Ah, nem um pouco! Ele sempre está me ajudando e tudo mais. Temo
que seja eu quem cause todos os problemas…
Não parecia haver qualquer falsidade nas palavras ou expressão de Sacerdotisa.
Vaqueira colocou a mão de alívio em seu peito farto. Alívio de que ele não estava
causando problemas? Ou que ele não era desagradável? Ela não sabia qual.
— Mas… — Sacerdotisa baixou a voz e piscou provocantemente. — …Talvez
ele seja apenas um pouco chato.
— Ah, é?
As duas se entreolharam e riram.
Era questionável, de certa forma, se ele era o assunto que compartilhavam, mas
ao mesmo tempo, ele era fácil de se falar. Como ele poderia ser estranho, sério,
obtuso e não se podia deixá-lo fazer o que tivesse vontade. Isso lhes dava bastante
material para conversar.
— Mas é verdade que devo muito a ele.
Sacerdotisa descreveu um lado dele que Vaqueira nunca tinha visto.
Como quando o vira pela primeira vez, ela pensou que ele era algum tipo de
monstro. De quando ele estava, aparentemente, tentando agir como um
aventureiro ranque Prata. Do quão rápido ele ficou embriagado quando o grupo
se reuniu para beber. De como ele sempre estava disposto a assumir a guarda
dado ao grande número de conjuradores no grupo.
Isso se parece bem com ele, pensou Vaqueira. Mas ela também pensou: Ele foi
beber com todo mundo?
— E ele me ensinou muito sobre aventura.
— Tipo o quê?
— Tipo… — Sacerdotisa tocou os lábios com o dedo. — Cota de malha, por
exemplo.
— Cota de malha…?
No fundo de sua mente, Vaqueira tentou imaginar todos os itens que ele mantinha
em seu galpão. Cota de malha era um de seus equipamentos favoritos. Ela se
lembrava dele a polindo cuidadosamente com óleo. Ele até mesmo lhe mostrou
como fazer reparos de emergência em partes danificadas usando fio.
— Mas… — Ela se lembrou repentinamente de uma pergunta que tivera há muito
tempo. — Ela não é pesada?
— Se você atar um cinto em volta do quadril ou no abdômen, o peso se espalhará
pelo seu corpo inteiro, então não é tão ruim. — Depois ela acrescentou: — Mas
seus ombros ficam rígidos.
Vaqueira assentiu. Fazia sentido. — É difícil ser um aventureiro, hein…
— Eu uso cota de malha, mas entendo que muitos usuários de magia não gostam
nada de usá-la. — O anão, por exemplo, parecia ignorá-la.
Vaqueira assentiu evasiva às palavras de Sacerdotisa. Havia uma antiga tradição
de que metal interferia com a magia, mas ela não sabia o quão verdadeiro era.
Ela estava meio convencida de que deveria ser superstição, mas de vez em
quando havia pessoas que queriam ferraduras para afastar a magia.
Magia, bruxaria e milagres divinos eram coisas que Vaqueira não sabia nada.
O que ela estava mais interessada era…
— Cota de malha, hum?
— Perdão?
— …Ei, a Guilda lida com cota de malha, armadura, capacetes e coisas assim,
não é?
— O quê? Ah, sim — disse Sacerdotisa, assentindo apressadamente. — Eu
comprei a minha lá.
— Nesse caso… — Vaqueira sorriu como uma criança escapando dos pais para
brincar. — Que tal olhar um pouco a loja?
— C-caramba…
E lá, na frente dos olhos de Vaqueira, estava uma roupa íntima.
Ou, mais precisamente uma armadura que era praticamente uma roupa íntima.
Era um conjunto que incluía apenas uma cobertura para o peito e uma coisinha
para a parte inferior do corpo. Categoricamente falando, poderia ser chamado de
armadura leve.
Em termos de mobilidade, superava facilmente um conjunto completo de
armadura de metal.
A armadura em si era lindamente curvada, elaborada e sólida. Desse ponto de
vista, era impecável.
O problema era, que não cobria área suficiente.
Era só uma armadura de torso — na verdade, armadura de mama — e calcinha.
Havia ombreiras, verdade, mas isso não era bem a questão.
— Hã? V-você usa algo como isso?
— Não, essa é a questão. — O garoto aprendiz trabalhando em uma espada com
a pedra de amolar atrás do balcão lhes lançou um olhar. De fato, ele já estava
olhando há algum tempo, talvez preocupado com as garotas segurando a
mercadoria.
— Tem… Tem alguém que realmente compra isso? — perguntou incrédula
Sacerdotisa. Não estava claro se ela notou o rubor em suas bochechas.
— Bem, é fácil de vestir. E fornece um pouquinho de proteção… Pelo menos
esse é o argumento de venda. — Então o rapaz murmurou algo que parecia um
“desculpe…” — Não tenho certeza de que devia dizer isso, mas — …e
acrescentou: — Algumas pessoas, você sabe. Querem, hum, atrair caras…
— Atrair? É, você provavelmente chamaria atenção nisso. — Vaqueira pegou a
amadura biquíni, corando e murmurando “caramba”.
Ela a examinou na frente, a virou e observou por trás, passou o dedo pelos
ângulos acentuados dos quadris, a estendeu e examinou outra vez.
— Não é meio revelador demais?
— …Temos pedidos o suficiente para fazer com que valha a pena ter aqui —
murmurou o garoto aprendiz, evitando discretamente seus olhos.
— Humm — suspirou Vaqueira. — Acho que teria de ter coragem para usar algo
tão perigoso. É basicamente um maiô.
— Isso é verdade… — assentiu Sacerdotisa com uma expressão imperceptível.
Ela continuou analisando com grande curiosidade os itens das prateleiras. Como
uma pessoa que ficava na fileira de trás, talvez ela não tivesse muito exposta à
armas e armaduras. Vaqueira era tão curiosa quanto Sacerdotisa.
— Ah, esse… — Subitamente, Sacerdotisa parou na frente da exibição de uma
armadura. Ela pegou algo com um sorriso. Era um capacete.
— Ei, eu reconheço esse.
Era a resposta natural para Vaqueira, que também estava sorrindo. Sacerdotisa
pegara um capacete de aço reluzente, mas de aparência medíocre. Exceto pelos
chifres saindo dos dois lados e o fato de ser novinho em folha, era exatamente
como o dele.
Vaqueira espiou dentro do capacete pelo visor vazio, então bateu as mãos.
— Ei, se colocássemos ele?
— Hã? Podemos fazer isso? — Sacerdotisa inclinou a cabeça, confusa com a
ideia inesperada.
— A placa diz que pode experimentar as coisas.
— Humm, tudo bem então, vejamos no que dá…
Segurando o capacete com um pouco de relutância, Sacerdotisa primeiro pegou
uma balaclava de algodão com “Para Prova” escrito. Ela o preparou, prestando
bastante atenção em seu cabelo comprido, depois colocou o capacete na cabeça.
— C-caramba…
Seu corpo delicado entortou para o lado; o capacete deveria ser tão pesado quanto
aparentava. Vaqueira estendeu a mão freneticamente para apoiá-la. A forma
esbelta da garota era surpreendentemente leve.
— Opa, você está bem?
— Ah, estou bem. Só um pouco desequilibrada…
Os olhos de Sacerdotisa podiam ser vistos dentro da viseira, ainda parecendo
inocentes a despeito do equipamento. Pelo ligeiro rubor em suas bochechas, ela
parecia estranhamente envergonhada.
— Heh-heh… Acho… acho que é bem pesado… E torna difícil de respirar…
— Isso porque ele é um capacete completo. É mais do que natural, o visor é bem
justo.
Com a observação do garoto aprendiz, Sacerdotisa lutou para afrouxar os
parafusos, e então o visor se levantou.
— Ufa!
Vaqueira riu do aparente suspiro involuntário de alívio, e o rosto de Sacerdotisa
ficou ainda mais vermelho.
— Is-isso não é motivo para rir…!
— Ahh-ha-ha-ha-ha! Desculpe, desculpe. Bem, sou a próxima.
Sacerdotisa retirou o capacete e depois a balaclava. Quando Vaqueira os pegou
e estava próxima de colocá-los, ela sentiu um aroma doce e fraco de suor.
Hum?
Era — não perfume — mas como ela naturalmente cheirava? Que inveja! Com
esse pensamento, ela colocou o capacete.
— N-nossa… Bem apertado aqui.
— É, não é?
Pelas grades finas do visor, o mundo era escuro, estreito e sinistro. Ela respirou
fundo e soltou, sua visão se instabilizou quando o fez.
Esse é o mundo que ele vê?
O que ela, Sacerdotisa e seus outros companheiros pareciam para ele? Como seus
rostos pareciam?
— Consigo mais ou menos imaginar, mas…
— O quê?
— Hm. Não é meio injusto ele poder ver nossos rostos, mas não podemos ver o
seu?
— Ahh — disse Sacerdotisa concordando e rindo. — É verdade.
— Não que eu ache que ele tente esconder intencionalmente… Hup!
Ela assentiu quando o garoto aprendiz disse: “O coloque de volta onde achou,
está bem?”. Ela devolveu o capacete e a balaclava para a estante.
Ela suspirou, e seu peito balançou enquanto alongava o pescoço de um lado ao
outro. Ela não se achava que estava em má forma, mesmo assim, a armadura
deixou definitivamente seus ombros duros.
Hummm… — Diga…
— Sim?
— Já que estamos aqui… — Vaqueira sorria como uma criança com uma
brincadeira em mente. — Por que não provamos aquela armadura?
Sacerdotisa olhou para onde ela estava apontando e rapidamente baixou a cabeça,
corando.
— Ahh, cara! Meu país já era!
— Que pena… Bem, isso não é muito engraçado.
— Aquele dragão é muito forte! Não tenho o equipamento nem habilidades para
lidar com ele.
— Mas você vai encontrar um jeito. Não é isso o que faz você um ranque Prata?
Depois de olhar atentamente os produtos na oficina, as duas se voltaram para a
taverna e viram uma coisa estranha.
Já se passara do meio-dia, mas ainda não era o fim da tarde, e não havia muitos
clientes na taverna da Guilda. Aliás, eles pareciam estar se preparando. As
cadeiras estavam colocadas nas mesas e as empregadas varriam um canto do
chão.
Inspetora, Garota da Guilda e Alta-Elfa Arqueira estavam sentadas em uma mesa
com cartas espalhadas sobre. Elas faziam uma companhia estranha, mas não
deixava de ser uma.
— O que estão fazendo…? — perguntou Sacerdotisa hesitantemente,
pestanejando enquanto olhava para a mesa.
Ela ainda parecia um pouco nervosa e não fora capaz de se acalmar; ela ajeitou
sua roupa levemente desarrumada.
— Ah, isso é um jogo de mesa — respondeu Garota da Guilda, olhando sobre os
ombros para Sacerdotisa. Ela também não estava usando seu uniforme, mas sim
roupas pessoais. Ela emitia uma imagem arrumada e elegante.
Pensando consigo mesma: Ela está bonita, Vaqueira voltou seus olhos para a
mesa. Havia, de fato, um tabuleiro de jogo com várias peças, cartas e dados.
— Eu o encontrei ontem enquanto organizava alguns papeis velhos, então
pensamos em testar…
— Mas que dragão! É tão forte! — choramingou Alta-Elfa Arqueira, com seu
peito pressionado na mesa.
— Se não fosse forte, não seria um dragão. Eu entendo o que quer dizer, mas
tenha calma — disse Inspetora (também usando roupas pessoais) com um
sorriso. Presumivelmente, a peça vermelha de dragão localizada no meio da mesa
era a serpe em questão. E as peças caídas ao lado dela eram todos aventureiros
que morreram a desafiando.
— Então, como se sente? — perguntou Alta-Elfa Arqueira, girando a cabeça para
Sacerdotisa.
— Ah, tudo bem — assentiu Sacerdotisa envergonhada. — Está quase acabando
agora.
— Legal — disse Alta-Elfa Arqueira, acenando para ela. — Nesse caso, me ajude
aqui. Não tenho mais aventureiro o suficiente.
— Existem… aventureiros… nesse jogo de mesa? — Vaqueira inclinou a cabeça
de perplexidade. Quase fazia sentido, mas ela não conseguia juntar bem as peças.
— Para simplificar — disse Garota da Guilda — você finge ser um aventureiro.
Embora existam muitas regras e tal.
— Finge ser um aventureiro? — murmurou Vaqueira, ruminando a ideia. —
Então você, tipo, mata goblins e coisas assim?
— Claro. Alguns um pouco mais básico existem, onde você é como um
aventureiro de verdade vasculhando uma caverna. — Garota da Guilda tocou
uma das peças de metal, talvez um guerreiro de armadura leve maltrapilho ou
um ladrão, e sorriu. Até onde Vaqueira podia ver, a peça não usava capacete. Ela
ficou ligeiramente desapontada.
— Esse é de uma perspectiva de um nível mais elevado, onde a questão é como
proteger o mundo do perigo.
— Você tem que pegar armas e armaduras lendárias, e garantir que suas
habilidades são boas antes do dragão acordar — resmungou Alta-Elfa Arqueira,
erguendo bruscamente a cabeça e abaixando as orelhas. — Mas não temos mãos
o bastante ou tempo suficiente.
— Você também pode pegar missões da aldeia, coletar equipamentos e combater
o dragão… — Inspetora contou as funções nos dedos, assentindo consigo
mesma. Ela parecia cheia de confiança apesar de ter perdido a batalha, o que a
fez parecer tonta ao invés de segura. — Pode lhe dar o gostinho de gerenciar uma
Guilda dos Aventureiros, onde você tem que fazer tudo.
— Não sabia que havia jogos assim — disse Vaqueira, enquanto estendia a mão
com grande interesse e pegava uma peça que parecia um cavaleiro de armadura
e capacete.
Ele parecia um pouco mais esfarrapado, ou pelo menos, seu equipamento parecia
mais barato, mas que belo cavaleiro. Nada mal.
— Isso é completamente novo para mim…
Em sua mente, “jogos” eram principalmente limitados aos que você marcava
pontos com combinações de cartas. Entretenimentos similares podiam incluir
escutar canções, jogar dados e talvez competir se houvesse um festival.
Garota da Guilda riu, observando-a olhar para as peças e o tabuleiro.
— Quer tentar?
— Hã? Posso?
— Claro — disse Garota da Guilda, assentindo e quase fechando os olhos com a
forma que o rosto de Vaqueira se iluminou. — Não é fácil apenas esperar lá sem
fazer nada, é?
— Hmm. — Vaqueira deu um murmúrio. Não havia como superar essa
garota. Acho que é o que chamam de mulher adulta.
Independentemente de estar ciente dos pensamentos de Vaqueira, Garota da
Guilda continuou sorrindo.
— Vamos, adoraríamos ter mais aventureiros. Não seja tímida!
— Hum, certo, então com licença… Que tal vir comigo? Já que está aqui…
— Ah, tudo bem!
Vaqueira deu um puxão na manga de Sacerdotisa, praticamente a puxando para
um banco. Agora havia cinco mulheres formando um círculo completo ao redor
da mesa redonda. Sem dúvida, muitos aventureiros, se soubessem disso, teriam
se queixado que queriam ir à taverna.
— Então comecem escolhendo sua peça, por favor — disse Garota da Guilda,
sua voz e sorriso estavam mais suaves que geralmente na recepção.
— Humm… — Vaqueira juntou as mãos na frente do peito, olhando atentamente
para os vários aventureiros alinhados no tabuleiro.
Bem… Acho que é esse que quero.
Apesar de estar insegura, ela escolheu o cavaleiro que pegara mais cedo. O
capacete de aço tornava impossível ver seu rosto, mas ele tinha um escudo e
espada erguidos enquanto olhava para frente.
— Vou querer… Acho que esse.
— Ah, hum, vou pegar… — Sacerdotisa pôs o dedo pálido nos lábios e pensou,
meio perdida enquanto olhava para os peões. Então, com um “ah!”, ela olhou e
escolheu uma peça particular.
— Es-esse, por favor!
O personagem que ela escolhera era um elfo conjurador, com o corpo volumoso
envolto de um manto.
— Ótima escolha — disse Alta-Elfa Arqueira com uma risada conhecedora, e
Sacerdotisa se contorceu um pouco.
— Está bem, para mim… — Alta-Elfa Arqueira balançou as orelhas com a
expressão de um caçador perseguindo sua presa. — Certo! Vou pegar esse dessa
vez! Um anão guerreiro!
— Puxa, tem certeza? — perguntou Garota da Guilda, mas Alta-Elfa Arqueira
respondeu “é claro!” e estufou seu pequeno peito.
— Vou mostrar àquele anão que sou melhor em… anãozisse… do que ele já foi!
— Então vou continuar como a batedora.
— Heh-heh-heh! Isso significa que vocês não têm um monge. Bem, eu cuido
disso.
Garota da Guilda colocou sorrindo um guerreiro de armadura leve com
equipamento surrado no tabuleiro, enquanto Inspetora pegou um velho com um
selo sagrado.
E assim, seus aventureiros se reuniram. Um cavaleiro de armadura e elmo, um
elfo feiticeiro, um anão guerreiro, um batedor leve e um monge veterano. Esse
foi o grupo que partiu para enfrentar um monstruoso dragão e salvar o mundo.
Garota da Guilda explicou brevemente as regras para Vaqueira, que então pegou
os dados firmemente na mão.
Lá vai.
— Meu aventureiro é o herói que vai proteger a aldeia, resgatar a princesa e
derrotar o dragão!
Com essa proclamação resoluta, Vaqueira deixou o primeiro rolar de dados cair
sobre o tabuleiro.
— Ahh, nós perdemos.
A cidade e o céu estavam tingidos com o azul-ultramarino da penumbra.
Vaqueira falou indiferentemente, olhando para as estrelas que brilhavam ao
longe. Enquanto ela caminhava, com as mãos entrelaçadas nas costas,
Sacerdotisa se movia ao lado como um pequeno pássaro.
— Não fomos capazes de pegar a Espada do Matador de Dragões, não é?
— Não conseguíamos ultrapassar suas escamas.
No fim, elas estiveram ocupadas com extermínio de goblins. O dragão acabou
com as garotas, e elas não foram capazes de salvar o mundo, mas…
— Mas certamente foi divertido, né? — disse Sacerdotisa.
— Foi mesmo — concordou Vaqueira.
O outono ainda parecia levar algum tempo, mas a brisa que soprava cada vez
mais fria sugeria isso.
O mundo que ele via.
O mundo que ele vivia…
Ela apanhara o pequeno vislumbre disso.
— Ei… — Vaqueira ria enquanto uma brisa acariciava sua pele, vermelha do
jogo. — Olhar os produtos na loja de armas, jogar na taverna… Não é muito
feminino, é?
— Ah-ha-ha-ha…
Sacerdotisa deu uma risada seca e evitou a pergunta. Ela era três ou quatro anos
mais nova que Vaqueira, e ela parecia como uma irmã mais nova.
Me pergunto o que ele pensa dela.
— Hum. — Sacerdotisa pode ter ou não notado o pequeno suspiro que Vaqueira
deu. Mas ela olhou para Vaqueira com um sorriso sincero.
— Eu gostaria de jogar de novo algum dia.
— …É. Eu também.
— Nesse caso… — Sacerdotisa deu vários passos em frente, tap-tap-tap, e se
virou para encarar Vaqueira. Seu cabelo dourado esvoaçava atrás da cabeça,
cintilando, apanhando a última luz do sol se pondo. — …Vamos fazer isso!
Hum. Vaqueira expirou sem perceber. Acho que tenho algumas relações aqui.
Ela pensava que só tinha ele e a fazenda. Mas por ele ser ligado a essa garota,
agora ela também estava.
— …Claro. — Vaqueira abanou as costas dela e sorriu. — Vamos fazer isso
mais vezes.
Capítulo 6: Da Destruição do
Templo Demoníaco da
Perdição

Riiing. Ela semicerrou os olhos contente quando tocou seu cajado de monge. O
primeiro vento a sinalizar o fim do verão roçou suas bochechas. A carruagem
sacudia também. Que agradável seria andar ao lado dela na estrada.
Ela voltou a si. Ela quase se esqueceu de que estava no meio de uma missão de
escolta. Como membro do clero, ela achava às vezes que conseguia sentir a
presença dos deuses em momentos como esse.
Apenas algumas nuvens preenchiam o céu. Ao longe, uma sombra negra voava.
Um gavião? Uma águia? Um falcão?
— Aquele pássaro está bem alto, não?
— De fato…
Aquele que falou com ela estava sentado no teto da carruagem.
O patrulheiro com a besta não estava, é claro, lá em cima por diversão. Alguém
precisava manter vigilância. Patrulheiro se mostrara confiável em ficar de olho
no ambiente e não mostrou sinais de deixar sua atenção se perder.
Então a suspeita na voz de Patrulheiro fez com que ela apertasse de imediato as
mãos no seu cajado de monge. Cada um dos outros preparou seus equipamento
também, se preparando contra algo que não podiam ver. O único que não parecia
notar algo era o dono da carruagem, um mercador. Eles o ignoraram quando
perguntou: “Então, o que está acontecendo?”.
Patrulheiro disse em voz baixa: — Não acham que esse pássaro é grande demais?
— Agora que falou nisso…
Aconteceu quando ela tentou ver mais de perto.
Ele estava encurtando a distância até enquanto observava: pele e garras, bico e
asas da cor de cinzas escuras…
— Demônio!
Eles reagiram com a voz do seu companheiro, Patrulheiro, mas estavam
atrasados demais para tomar a iniciativa. No caso dela, criticamente tarde
demais, e o monstro — o demônio de pedra — foi terrivelmente rápido. Não foi
destino ou acaso, mas uma diferença clara nas capacidades que foi sua ruína.
Quando ela pensou Hum?!, seus pés já estavam voando sobre o chão. Ela sacudiu
as pernas, mas não significava nada; ela foi puxada bem para o alto no ar. O chão,
a carruagem, seus amigos, todos ficaram mais distante.
— Ergh… ahh… ou… aahã?!
Ela bateu no monstro com o cajado de monge no seu esforço desesperado para
resistir, ao que ele apertou as garras nos seus ombros e a sacudiu.
Ela olhou para baixo e deu um grito com isso. Ela sentiu a parte inferior do seu
corpo ficar úmida.
— Hrrgh… Eeegh!
Os problemas não pararam por aí. Sua coxa ardia como se fora atingida por uma
pinça quente. Patrulheiro devia ter disparado uma flecha na tentativa de fazer
algo, e o demônio deveria a ter usado como escudo.
Ela olhou para baixo, com a visão turva pelas lágrimas, para ver seu conjurador
entoando alguma coisa.
Pare, pare, pare, pare! Ela agitou desesperadamente seu cajado de monge,
balançando a cabeça em Não, não!
Estivemos enganados! Isso não é um demônio! Isso não é um…!
— Aaaaahhh!
A criatura se esquivava da avalanche de raios, a sacudindo como um chicote. A
flecha em sua coxa se enfiou mais fundo na carne. Ela gritou e tremeu.
Ela não devia ter feito isso.
As garras em seus ombros escorregaram, rasgando a pele, a carne e tirando
sangue.
— Ugh!
Um som escapou dela. A sensação de flutuar. Vento. Vento. Vento. Vento.
Ahh, estou com medo, me ajude, Deus do Conhecimento, ó Deus, oh Deus…
Infelizmente, tudo isso talvez tenha sido um desejo fervoroso de sua parte, mas
não era uma oração.
Dessa forma, não alcançou os deuses. Sua única noticia positiva era que não
sentiu dor. Ela teve azar até no momento em que atingiu o chão, sem perder a
consciência.
Embora por ela agora ser um pedaço trêmulo de carne arruinada, isso não fazia
diferença.
— Então, qual é o plano?
Uma voz ríspida e masculina soou pela terra devastada fustigada pelo vento. A
lança que ele carregava nas costas e a armadura que usava, o fazia parecer bonito
e corajoso.
Em frente aos olhos de Lanceiro se erguia uma torre branca, brilhando na luz do
meio-dia. As paredes eram feitas de uma pedra branca cintilante; da forma como
alcançava aos céus sem uma única sutura, devia ser marfim. Mas a ideia de que
não havia nenhum elefante assim tão grande deixava poucas dúvidas se esse era
o produto de magia.
— Eu diria que essa coisa tem pelo menos sessenta andares.
— Entrar pela porta da frente pode ser complicado.
A resposta veio de alguém com aparência não menos heroica do que Lanceiro.
Seu corpo musculoso estava armadurado, e em suas costas levava uma espada
larga quase tão grande quanto ele. Guerreiro de Armadura Pesada, famoso na
cidade fronteiriça, estendeu a palma da mão e olhou para cima, semicerrando os
olhos para o topo da torre.
— Oitenta e nove por cento de chance dessa torre ter sido construída por algum
tipo de idiota que a preencheria com monstros e armadilhas.
Aos seus pés havia um cadáver brutalmente deformado; parecia ter caído de uma
grande altura. Eles já haviam pegado a insígnia que estava em seu pescoço,
indicando seu nome, gênero, ranque e classe. Aparentemente, o corpo pertencera
a uma garota, mas se ela havia morrido antes da queda ou por causa dela, eles
não sabiam.
Eles viam outros pontos carmesins ao redor da torre, presumivelmente mais
restos.
— Suponho que algum mágico estranho construiu ela como um esconderijo. Eu
diria que ele se saiu mal.
Guerreiro de Armadura Pesada cutucou levemente o cadáver com a bota. O dono
da torre era um Que-Não-Reza, ele se esquecera como. Essa aventura significava
que seria basicamente um corta-e-massacra, cheio de oponentes monstros.
— Duvido que haja necessidade de termos que enfrentá-lo de frente.
A última pessoa falou com a voz calma e baixa. Era um homem com armadura
de couro suja e um capacete de aço medíocre, com um pequeno escudo redondo
no braço e uma espada de tamanho estranho no quadril. Ele enfiou a mão na
bolsa de itens em sua cintura e começou a procurar pelos equipamentos.
— Podemos escalar a parede.
— Ei, está dizendo com uma corda ou algo assim? Se o gancho soltar no meio
de caminho, nós vamos cair direto!
— Segure um pitão em cada mão e puxe.
Lanceiro deu de ombros, olhando para o pitão que Matador de Goblins pegara.
— Você tem alguma experiência em escalada?
— Um pouco, em montanhas. Penhascos também.
Guerreiro de Armadura Pesada cruzou os braços e grunhiu. Ele estendeu o dedo,
medindo a altura da torre, e estalou a língua.
— A questão é como lutar contra algo que pula em você no caminho. Não precisa
ser um demônio. Uma gárgula seria problema de sobra.
— Gárgula?
— Estátuas de pedra — disse Guerreiro de Armadura Pesada, indicando seu
tamanho aproximado com as mãos. — Asas. Elas voam ao redor do céu.
— Hmm. — Matador de Goblins soltou um grunhido. — Então existem inimigos
como esse também…
— É. Pessoalmente, sou focado em armamento de curta distância, mas… um
usuário de magia certamente facilitaria as coisas aqui agora.
— Não fique todo animado aqui, tá? — Lanceiro olhou para Guerreiro de
Armadura Pesada, que começara a formular uma estratégia com a maior
seriedade, como se não pudesse acreditar no que via.
— E então? Quer abrir caminho até lá, detectar e desarmar armadilhas, procurar
por aí? De certo que não. — Guerreiro de Armadura Pesada suspirou, deslizando
a espada enorme nas costas para repousar entre as omoplatas. — Porque não
temos conjurador, monge e nem ladrão.
Nisso, Lanceiro só pôde ficar em silêncio.
Havia uma gama interminável de lugares para se aventurar no mundo. Ruínas
das batalhas da Era dos Deuses eram numerosas, e ainda mais na fronteira.
Independente se eles seguissem a Ordem ou o Caos, nações floresciam e depois
declinavam, e o ciclo continuava com outra nação surgindo. Em consequência,
encontrar uma ou duas ruínas novas não era nada especial. Mas quando ruínas
apareciam um dia depois de quando não estavam antes, era outra história.
Foi supostamente uma caravana mercante que descobrira a torre de marfim se
erguendo de resíduos. A floresta que estava lá em sua viagem de ida
desaparecera, substituída pela torre branca que os contemplava de cima.
Naturalmente, sua surpresa foi tremenda, mas não tiveram tempo para ficar
olhando, eles foram atacados por criaturas com formas humanas e asas de
morcegos.
Demônios! Aqueles agentes horríveis do Caos! Aqueles Personagens Que-Não-
Rezam!
Os comerciantes fugiram, e por meio da Guilda dos Aventureiros, seus relatórios
foram enviados ao próprio rei. O rei poderia ter enviado o exército para
exterminar a ameaça e o assunto teria sido resolvido. Se as coisas fossem simples
assim.
Mandar o exército exigia homens e dinheiro. Nesse caso, os homens eram
cidadãos normais e o dinheiro eram impostos. Os impostos poderiam subir no
ano seguinte. E parentes, membros da família, amigos e vizinhos poderiam
morrer cumprindo seu dever como soldados. Os cidadãos achavam isso
intolerável e criariam apenas ressentimento.
E também havia o dragão para vigiar que vivia no vulcão e outros problemas
como partidários do Senhor Demônio que ainda ameaçava a área. Enviar o
exército significaria haver menos pessoas para participar nessas outras questões.
E se a torre fosse uma isca, uma distração, e então? Verdade, demônios estavam
se reunindo lá, mesmo assim, era só uma torre no meio de um terreno baldio.
Talvez algum mago doentio tivesse construído. Não podia ser dito ainda se era
uma ameaça para o país ou ao mundo. Não havia razão para os militares se
envolverem.
Poder-se-ia perguntar, então, para que serviam os militares. Estarem prontos
contra uma invasão das forças do Caos, é claro. Na recente batalha culminante
entre o novo herói ranque Platina e o Senhor Demônio, eles estiveram nas linhas
de batalha. As baixas foram elevadas. Muitos morreram, muitos ficaram feridos.
Eles não estavam em condições de ir imediatamente para a próxima escaramuça
ou grande batalha.
Mais do que tudo, uma estratégia simples dizia que tentar enfiar um exército em
uma ruína ou uma caverna era uma boa forma de destruí-lo. Unidades militares
eram feitas para lutar em planície aberta contra unidades inimigas, não para
entrar em espaços fechados que nem mesmo cavalos podiam entrar.
Ruínas e cavernas tinham monstros que ameaçavam as aldeias pioneiras. Como
o exército poderia ser despachado para todos eles de uma só vez? Era
precisamente devido ao rei e os nobres serem um bom rei e bons nobres que não
podiam utilizar suas forças tão levianamente.
— Mas essa questão também não será ignorada.
O jovem rei, visitando sua amiga pela primeira vez em muito tempo, suspirou
profundamente.
O lugar era mesclado de raios solares suaves, cheio de tranquilidade e silêncio
verdadeiro.
A vida vegetal era cuidadosamente tratada, as flores perfumadas. Os pilares
brancos no bosque pareciam ser árvores enormes. O correr de um riacho, que
parecia vir de nenhum lugar em especial, era relaxante aos seus nervos
desgastados.
— O que acha que devo fazer?
— Meu Deus.
Eles estavam em um jardim na parte mais profunda do Templo. Sua sacerdotisa
deu um sorriso elegante e inclinou a cabeça. Seus lindos cabelos dourados
fluíram como mel, caindo sobre seu peito vasto.
— Uma interessante mudança de ideia para alguém que deu as costas quando
estávamos lidando com os goblins.
— Você tem de entender, embora possa ter sido uma tragédia pessoal, em uma
visão geral, era trivial.
O rei falou sucintamente, depois sacudiu a mão como se para afastar as palavras.
A maneira como se acomodou no banco que fora preparado para ele era ao
mesmo tempo rude e ainda assim gracioso. Era isso o que chamavam de realeza?
Ou orientação aristocrática? O que quer que fosse, ele se movia como alguém
que entendia desde o nascimento.
— E alguns goblins podem ser lidados facilmente por um grupo de aventureiros.
— …Sim. Tem razão.
Isso era um simples fato.
Goblins eram perigosos, e se eles o derrotassem, “tragédia” era a palavra exata
para o que se esperava.
Mas goblins continuavam sendo os monstros mais fracos, e eles não eram os
únicos contra os quais a perda significava um destino cruel. Você poderia ser
comido por um dragão, dissolvido por um limo ou feito em pedaços por um
golem…
O que em última análise o aguardava era a mesma coisa que encontraria quando
os goblins tivessem acabado de brincar com você: a morte. Quer fosse devido à
falta de força física, habilidade ou simplesmente azar, não havia futuro para
aqueles que não pudessem derrotar goblins.
— Como Vossa Majestade é muito gentil…
Uma música cômica veio dos lábios entreabertos da mulher:
Uma vez um rei tão gentil e justo
Para tomar da população seus impostos
Água ele deu a um rio furioso
E aos conselhos municipais sempre ajudou
Enfiou os conselheiros na cama
E cada esfomeado alimentou
Ele fez seus soldados mostrarem coragem
E heróis enviou para buracos de goblins:
A Capital logo era uma festa para trolls.
O rei franziu a testa ao ouvir uma música que zombava da nobreza, e ela riu como
uma garota.
— Não é esse o momento de recorrer aos aventureiros, Vossa Majestade?
— Realmente, pode ser…
O rei colocou a mão na testa, a esfregando como que para aliviar um músculo
tenso, e assentiu. Ele pensava que terminaria assim.
O exército não era adequado para caçar monstros. Assim eles dariam status a
esses malandros, dariam recompensas, eles iriam enviar os aventureiros. Era isso
que mantinha o mundo girando. Eles fariam isso de novo agora. Os aventureiros
não eram especialistas em caçar monstros, afinal?
— Os mercadores disseram que foram atacados por demônios, mas não sabemos
ao certo o que foi responsável.
O rei balançou a cabeça como se para frisar que não existiam provas, depois se
acomodou brutamente na sua cadeira.
Mal poderia um rei se sentar em um trono dessa forma. Ele fechou os olhos,
respirando o ar refrescante do jardim à vontade do seu coração.
— Duvido muito que comerciantes possam diferenciar um demônio de uma
gárgula.
— É uma torre de conjurador maligno, não é? — A mulher que era a mestre
desse templo deu uma risada e murmurou “Nossa, que assustador”, como se não
fosse problema dela.
O rei ergueu a cabeça apenas o suficiente para olhar para seus olhos tampados,
mas não deu nenhuma resposta. Era assim que ela iria alfinetá-lo por ignorar o
incidente com goblins. A capacidade para aceitar cordialmente os ressentimentos
de suas políticas era, supunha ele, a marca de um rei. Deixe-os o chamar de
incompetente, se quisessem.
— Isso é certamente mais perigoso que goblins. Mas não é nada comparado aos
Deuses Demônios.
— Verdade, de fato.
— Parece que algum necromante ao sul encontrou uma tumba antiga. — O rei
se recostou bem na cadeira, quase como se estivesse dizendo que o assunto o
entediava. A cadeira fez um rangido. — Um exército dos mortos! Isso não me
dá o luxo para lidar com goblins ou uma torre solitária.
— Heh-heh. Quão cansado você deve estar. — Ao falar, a mulher deixou suas
coxas aparecerem pela bainha do vestido, como se as exibindo.
— Status é uma coisa difícil — murmurou o rei. — Sequer posso encontrar meus
amigos sem um pretexto.
— Tal é a posição — sussurrou a mulher. — Tudo muda, o que você poder ver
e o que não pode.
— Perdi a capacidade de dizer que eu e meus amigos deveriam simplesmente
lidar com isso com nossas espadas, como fazíamos antigamente. — O rei
suspirou, parecendo ponderar sobre uma memória dos tempos passados. — Não
consigo deixar de pensar que as coisas eram mais fáceis quando eu era um único
senhor desafiando labirintos por conta própria.
— Ah, sim, você ficava muito bem, fugindo depois de ser surrado por aquele
atacamato.
— Eu me lembro de um grupo que sofreu um destino terrível quando atacado por
limos.
O tom gracejador deu lugar a um mais contundente. Donzela da Espada soltou
um suspiro silencioso. — Há momentos em que eu também gostaria de deixar a
minha posição e voltar a ser apenas uma garota.
— Até a arcebispa do Deus Supremo se sente assim?
— Sim. — As bochechas da clériga cega tingiu-se de rosa claro, e seus lábios
formaram um sorriso generoso. Ela pôs a mão em seus seios grandes para
impedir de tremer, e com uma voz tão ardente quanto se estivesse confessando
seu amor, ela disse: — Muito mesmo, ultimamente.
— As coisas não saíram da forma que qualquer um de nós esperava. Mas é isso
que faz a vida ser interessante. — Com esse sussurro, o rei fez um espetáculo ao
se erguer da cadeira. — Já é hora de me despedir. Afinal, só vim para pegar
emprestado algumas sacerdotisas da guerra.
— Sim, Vossa Majestade. Estou feliz de termos a oportunidade de conversar.
— Imagino. — O rei deu um leve sorriso que abrangia tanto o amargo quanto o
familiar. — Você parecia ter outra pessoa em mente além de mim.
— Lamento, não posso fazer isso.
Guerreiro de Armadura Pesada olhou para o formulário da missão e balançou a
cabeça com firmeza, embora fosse assinado pelo próprio rei.
— É muito difícil?
— Nem, mas o meu grupo está indisposto no momento. Caso contrário teríamos
pegado.
— Bem, essa é uma situação difícil — murmurou de novo Garota da Guilda,
franzindo a testa para o aparente sombrio Guerreiro de Armadura Pesada.
Em sua mão ela segurava um pedido para investigar as ruínas chamadas
provisoriamente de “Torre do Demônio”.
Recentemente se tornara cada vez mais comum ruínas e labirintos surgirem de
repente. Desde a derrota do Senhor Demônio, seus partidários restantes andavam
fazendo trabalho sombrio por todo o lado. Enquanto os militares se recuperavam,
os conjuradores malignos e semelhantes ficaram menos relutante em ser vistos
pelas pessoas.
Como parte da Guilda, seria mentira dizer que Garota da Guilda não queria
designar todas as missões disponíveis. Mas mesmo com uma recompensa de
dezenas de peças de ouro por pedido, havia cem ou duzentas para serem
resolvidas. Ela percebeu que o tesouro nacional era basicamente ilimitado e não
conseguia pensar em nada mais indulgente do que isso.
— Estaríamos contra demônios, certo?
Podendo ouvir ou não o suspiro de seu peito bem formado, Guerreiro de
Armadura Pesada deu mais uma boa olhada na folha de missão. Com o dedo
envolto de uma luva simples, ele traçou lentamente as letras dançando na página,
então formou um punho.
— Sem ao menos um conjurador e um batedor… ranques Prata, ainda por cima…
— Um grupo de três?
— Esse seria o mínimo. Se possível, eu gostaria especificamente tanto de um
mago quanto um clérigo comigo e dois outros na linha de frente, e esse batedor.
Seis no total.
Hum, hum, hum. Garota da Guilda pensou nisso com uma expressão séria no
rosto, com os papéis em sua mão farfalhando enquanto os virava
descuidadamente.
Fichas de Aventura.
Elas gravavam como cada capacidade do aventureiro crescera com cada aventura
que passavam. Não seria exagero dizer que, de certo modo, esse maço de papel
eram as próprias vidas dos aventureiros. A pilha continha um monte de novatos,
magos e clérigos, batedores e guerreiros. Mas quando chegava naqueles que
formavam os ranques superiores, o número caia drasticamente. Um dos seus
problemas era que havia bem poucos veteranos de ranque médio.
Não temos ninguém que se encaixe perfeitamente nessa descrição.
Garota da Guilda olhou para os aventureiros que faziam do edifício tão vivo.
Claro que eles deviam ser capazes, mas também tinha de ser pessoas decentes.
Afinal de contas, o recrutador de missão dessa vez era o próprio rei. A Guilda
não precisava de alguém que só saia para provar alguma coisa. Eles poderiam ser
um pouco egoístas ou ambiciosos, mas tinha que entender o que realmente estava
em jogo…
— Se apenas houvesse alguém que tivesse todas essas qualidades e pudesse
equilibrar o uso de magia com batalha…
— Pode deixar! Estou bem aqui!
Foi como um sonho. Quando seu desejo havia acabado de se perder, alguém
respondeu entusiasticamente.
Ele veio correndo alegremente até o balcão, carregando sua lança, como se
tivesse esperado por esse momento a vida toda. Assim que Garota da Guilda
percebeu quem era, ela disse “Ah!” e trouxe um sorriso ao rosto. — Agora que
penso nisso, me lembro de você ter aprendido um pouco de magia.
— Um aventureiro tem que estar pronto para todas as situações possíveis! —
Lanceiro assentia ansiosamente e confiante, e não pareceu notar Guerreiro de
Armadura Pesada exclamando “Aggh” e batendo na própria testa, um gesto fácil
de se entender.
Independentemente disso, Garota da Guilda sabia muito bem que Lanceiro
trabalhava com Bruxa.
— Ham-ham, o seu… grupo está de acordo com isso?
— Ah, claro. Acabamos de voltar de um de nossos “encontros”. Acho que vou
deixá-la descansar.
…Ele tem certeza disso?
Garota da Guilda olhou sobre os ombros de Lanceiro e viu Bruxa atrás dele,
descansando no banco. Bruxa lhe ofereceu um sorriso elusivo.
Essa é a atitude mais problemática de todas.
Mexendo com as tranças com uma das mãos, Garota da Guilda soltou um leve
suspiro perturbado. Da perspectiva de Bruxa, Garota da Guilda era uma rival
amorosa. Mas isso era negócios… certo?
Hmm. Não posso deixar minha vida pessoal se envolver com meu trabalho.
— Está bem, de momento, vocês dois… tudo bem?
— Claro, não me importo. Eu posso confiar… bem, tenho confiança nesse cara.
— Apesar de ele parecer se atrapalhar um pouco com as palavras, Guerreiro de
Armadura Pesada assentiu. — Mas ainda não é o bastante.
Lanceiro surrupiou o papel da missão de Guerreiro de Armadura Pesada com um
“Me deixe ver isso” e inclinou a cabeça. — Como não somos o suficiente? —
disse ele.
— Quero um batedor, pelo menos.
— Não há muitos batedores talentosos por aí. E quanto aquele garoto do seu
grupo?
— Não quero envolvê-lo em uma luta com demônios — disse seriamente
Guerreiro de Armadura Pesada. — Eu não poderia carregar essa
responsabilidade. — Ele encarou Lanceiro. — Não preciso necessariamente de
alguém com alinhamento bom, mas quero pelo menos um neutro.
Em alinhamento, “bom” e “mau” não tem exatamente o seu significado literal,
mas sobretudo descrevia se alguém era alocêntrico ou um egocêntrico, se
preferiam lutar ou não. Batedores e ladrões estavam por si mesmos e eram
dispostos a agir. Era algo que valia pensar se você não quisesse ter de se
preocupar com seu compatriota agindo contra o personagem quando o momento
crucial viesse.
— Então o que você precisa é…
Alguém que era um batedor e poderia ficar na linha de frente. Capaz, bem como
respeitável. Alguém que pudesse manter seus negócios e vida pessoal separados.
Cujo alinhamento era, se não bom, ao menos neutro. E alguém que estaria
susceptível a tomar essa missão.
— Sim! Consigo pensar em um!
Quando Garota da Guilda bateu as mãos e saltou do seu lugar, Lanceiro lhe deu
um olhar duvidoso. O breve momento que esse olhar sondou seu peito não passou
despercebido, mas no momento Garota da Guilda não se importava.
— Hã? Existe realmente alguém assim?
— Posso garantir que ele é habilidoso, de qualquer forma. — Ela chegou mesmo
a lhe dar um sorriso e uma piscadela, depois marchou muito bem-disposta. Ela
parecia impressionante, seus sapatos faziam barulho enquanto andava com o
papel apertado no peito. Ela ia para o banco em um canto da área de espera da
Guilda. O lugar onde ele sempre se sentava. Ela achou ficar um pouco
emocionada só de ver o capacete de aço se virar em direção a ela quando reparou
que vinha.
E então ele perguntou, com uma voz baixa e desapaixonada:
— …Goblins?
— Tenho que admitir, não pensei que fosse aceitar.
— Porque não havia missões de goblincídio.
Assim, os três aventureiros se encontravam na frente da torre. Lanceiro e
Matador de Goblins, com Guerreiro de Armadura Pesada como líder.
Um grupo composto de um guerreiro humano, um segundo guerreiro humano e
um terceiro guerreiro humano. Isso traria um sorriso irônico a qualquer rosto.
Embora esses tipos de grupos não fossem incomuns, por pura necessidade.
— E precisava de dinheiro.
— Principalmente por extermínio de goblins, presumo? — riu Lanceiro.
Mas Matador de Goblins respondeu “não” e balançou a cabeça. — Não por isso.
Mas é urgente.
— Dependendo de quanto precisa, posso te emprestar um pouco — disse
Guerreiro de Armadura Pesada, sem tirar os olhos da torre na frente deles. —
Acho que você não morreria.
— Agradeço, mas não, obrigado.
— Você que sabe. — Guerreiro de Armadura Pesada respondeu com um aceno
e Matador de Goblins começou a vasculhar sua bolsa de itens. A primeira coisa
que sua procura resultou foi um monte de pitões e um martelo pequeno.
— E eu já tenho uma dívida para pagar.
— Dívida? Que seja! — Lanceiro franziu a testa e estalou a língua irritado. —
Somos aventureiros! Terminaremos essa missão, considere essa dívida paga.
— Entendi.
— De qualquer modo, você literalmente só tratou comigo uma única bebida
depois daquilo. Você ainda me deve!
— Isso é o oposto do que acabou de dizer — disse Guerreiro de Armadura Pesada
exasperado, mal ouvindo os dois.
Matador de Goblins retirou um rolo de corda e pôs no ombro.
— Eu prometi te recompensar com uma bebida. E eu fiz.
— Hrrrgh! — Lanceiro não teve qualquer resposta para a réplica de Matador de
Goblins. Guerreiro de Armadura Pesada teve de se esforçar para segurar um
sorriso.
Resmungando furiosamente “hrmph, hrmph” e estalando a língua, Lanceiro deu
a parede algumas batidas experimentais. — …E-enfim, essa parede parece
terrivelmente sólida. Tem certeza de que conseguirá fixar seu equipamento de
escalada nela?
Havia algum truque para funcionar, mas os outros dois também não se sentiriam
atraídos com isso. A torre fora criada em uma ou duas noites. Obviamente não
era feita de materiais normais.
— Aqui, me dê eles.
— Claro. — Matador de Goblins passou os pitões e o martelo para a mão
estendida.
Guerreiro de Armadura Pesada os pegou, dando a um dos ganchos um bom golpe
com o martelo, depois ele grunhiu:
— É. É bastante duro.
A parede da torre reluzente nem sequer arranhou.
De repente, Guerreiro de Armadura Pesada começou a remover suas luvas e
braceletes. Ele enfiou o equipamento em sua mochila e trocou por uma garrafa
cheia de um líquido vermelho. Ele sacou a rolha e tomou. Provavelmente uma
poção de força. Ele guardou o frasco vazio, depois pegou uma espada de uma
mão e um anel com um rubi brilhante.
— Hum! Um anel com um encantamento de impulso físico? — disse Lanceiro
com interesse.
Não era surpresa que Guerreiro de Armadura Pesada tinha uma espada mágica.
Armas mágicas eram raras, mas poderia se esperar de um ranque Prata ter pelo
menos uma delas.
— Normalmente uso minhas Braçadeiras do Mestre de Armas Excepcional e
minhas luvas mágicas, então não preciso disso com frequência. — Guerreiro de
Armadura Pesada pôs a espada em sua cintura e segurou o pitão com a mão que
estava o anel. Dessa vez ele grunhiu “hmph!” e o levou contra a parede.
— Dê uma olhada, Matador de Goblins. Isso é equipamento de primeira classe
para você.
Por que está se gabando? Guerreiro de Armadura Pesada parecia querer
perguntar.
Lanceiro o ignorou. — Por que você não mantem uma ou duas espadas
encantadas consigo? Não quer parecer legal?
— Não tenho interesse em espadas mágicas, mas tenho um anel.
— Ah, é?
— Ele permite respirar debaixo d’água — disse Matador de Goblins brevemente.
— Mesmo que os goblins roubassem, não faria mal.
— Para que eles iriam querer isso? Espera um pouco… você supõe que será
roubado?
Lanceiro estava pressionando suas têmporas, mas o capacete de aço assentiu e
disse: — É claro. Mas não iria caber no dedo de um goblin.
— Você devia aprender que não importa o que diga a essa cara, é tudo inútil. —
Guerreiro de Armadura Pesada estava mostrando um sorriso enquanto agarrava
o pitão e se erguia. — Ei, vocês dois vão me pagar pela poção, não é? Nós
dividimos a recompensa em três partes, menos o custo.
E então, se segurando no lugar com apenas um dos braços, ele pegou outro pitão
e continuou escalando. Ele não estava exatamente velocíssimo, mas parecia
muito bem. Ele estava, afinal, de armadura completa e carregando uma espada
larga nas costas. Isso não exigia pouca força física.
— Sem problema.
— Sim, claro.
Matador de Goblins respondeu com espontaneidade, e Lanceiro não manifestou
qualquer objeção particular. A maioria dos aventureiros sabia manter qualquer
disputa sobre a recompensa na taverna. Não importava quão valioso fosse um
item, se você guardasse ao custo de sua vida.
Matador de Goblins agarrou os pitões e começou a subir após Guerreiro de
Armadura Pesada, enquanto atrás dele Lanceiro deu um estalo com a língua. —
Então eu sou o traseiro, hum?
Matador de Goblins parou no meio da escalada, olhando para trás com uma das
mãos ainda no pitão.
— Prefere passar na minha frente?
— Tanque primeiro, batedor depois. Mas tudo bem, então vamos continuar
subindo.
— Entendi.
Ele agarrou, subiu, agarrou o pitão seguinte, colocou o pé sobre o anterior e assim
ele ficou outro nível acima. O que restava era simplesmente repetir o processo.
Sem olhar para cima, sem olhar para baixo. Observando cautelosamente apenas
à esquerda e à direita.
Todos eram aventureiros relativamente experientes, e tinham pontos de apoio
para as mãos e pés. Se eles estivessem muito preocupados com o vento, que
ficava mais forte quanto mais subiam, não poderiam ter contemplado a escalada
da parede externa.
O problema era que o vento não era a única coisa que poderia machucá-los.
Matador de Goblins, verificando a esquerda e a direita como seu batedor, gritou:
— Ei. — Ele continuou: — A oeste. Três deles. Alados. Não goblins.
— Então nos encontraram… Que cor são?
— Cinza.
— Sabia — disse Guerreiro de Armadura Pesada, assentindo com a resposta. —
Eles são gárgulas, sem dúvida.
— Gárgulas… Humm — suspirou Matador de Goblins. — Então é assim que
são.
— Há uma chance de eles serem demônios de pedra. Perto de oitenta e noventa
por cento, é.
Elas eram demônios alados tão escuros quanto as cinzas no canto de uma lareira.
Ou assim poderia se pensar à primeira vista. Tais eram os monstros de pedra,
gárgulas. Uma vez destinadas a vigiar lugares sagrados, gárgulas, também eram
agora Que-Não-Rezam. Possivelmente era os seus corpos terríveis e distorcidos
que tinham, ao longo dos anos, conduzido elas ao Caos.
Uma pessoa não pensaria que um pouco de bater de asas poderia manter uma
estátua no ar, mas essas criaturas podiam voar. Ainda assim eram feitas de pedra,
as tornando inimigos temíveis.
— Nunca viu mesmo uma? Elas aparecem em ruínas às vezes.
— Algumas vezes. — Matador de Goblins virou lentamente a cabeça de um lado
ao outro. — Mas não sabia que eram gárgulas.
— Seja como for, elas descem rápido. — O sorriso de Lanceiro foi tão feroz
quanto o de um tubarão. Os monstros voavam agora — literalmente — em seu
campo de visão.
Elas estavam rodopiando preguiçosamente ao redor do topo da torre,
provavelmente a vigiando. Agora elas estavam descendo em pânico,
provavelmente elas não esperavam que alguém tentasse escalar a parede. Elas
não estavam longe, mas os aventureiros não pareciam muito assustados ou
mostravam qualquer sinal de estar ficando.
— Não é verdade o que dizem, que gárgulas não suportam a luz do sol. —
Lanceiro olhou para elas, ajeitando seus pés para encontrar o equilíbrio nos
pitões. — Se elas te apanharem, você terá problemas.
Segurando-se firmemente com o braço esquerdo com escudo, Matador de
Goblins sacou sua espada segurando inversamente. — Se conseguir manter
debaixo de você, você não vai morrer mesmo que caia no chão. Apesar de que
você ficaria longe da batalha nesse ponto.
— Talvez, se pudesse lançar Controle sobre todas elas. E isso se elas não cairem
em um golpe, certo? — Guerreiro de Armadura Pesada pegou sua espada de uma
mão, que emitia um ligeiro brilho branco, a aura da magia. Ele segurou com a
boca a corda decorativa que pendia da empunhadura, então apertou firmemente
ao redor do pulso. — Não sei quanto a vocês, mas estou tranquilo só com uma
mão.
— Dizem que o choque de magias vem antes do choque das armas. Arrgh. Esses
marombas. — Lanceiro entrecerrou os olhos e tocou seu brinco — um catalisador
mágico — com uma das mãos. Matador de Goblins olhou para o que Lanceiro
estava fazendo, então balançou a cabeça.
— Estou pensando em algo.
— Eu também — disse Guerreiro de Armadura Pesada.
— Calem a boca, já entendi! Não consigo me concentrar aqui embaixo!
— GARGLEGARGLEGARGLE!!
Com um berro indistinto não muito diferente de gargarejar, os monstros
demoníacos voaram até eles. Mas Lanceiro, sem pressa ou alarido, disse algumas
palavras de verdadeiro poder com a capacidade de remodelar as leis da realidade.
— Hora… semel… silento! Fique em silêncio, tempo!
Naquele instante, o vento parou.
O fluxo da atmosfera cessou; o som de longe pausou, estagnou, parou. As
palavras de Lanceiro preencheram o mundo, dobrando suas leis, e tudo empacou.
Essa era a magia Retardar.
— GARGLEGARG?! GARGLEGARG!!
— GARGLEGARGLEGAR!!
As gárgulas batiam e batiam as asas, mas não podiam gerar qualquer poder, assim
elas não puderam ficar no ar. A gravidade tomou conta das três criaturas, e em
questão de segundos elas caíram várias dezenas de andares, virando pó ao
atingirem o chão. E nenhuma estátua de pedra, uma vez destruída, poderia voltar
a vida.
— Quê, já foram? Elas não eram tão difíceis.
— Suponho que cair dessa altura geralmente levará à morte.
Guerreiro de Armadura Pesada contraiu os lábios, desapontado, e Matador de
Goblins deslizou sua espada de volta para a bainha. Os dois retomaram
rapidamente a escalada, mas Lanceiro lhes lançou um olhar inequivocamente
descontente.
— Puxa, uma magia como essa, e nem sequer juntaram uma palavra de elogio?
— Foi uma boa estratégia — retornou a resposta casual de Matador de Goblins.
— Vou usá-la qualquer dia.
— O quê, em goblins?
— Que mais?
Essa conversa fez Lanceiro balançar a cabeça com um abatimento profundo.
Levar os goblins para algum lugar bem alto e então jogá-los? Não parecia ser
algo que aventureiros mais sérios contemplariam. E pensar que ele estava sendo
creditado pela ideia… Dá um tempo!
— Mais importante: quantas magias ainda tem? — As palavras de Guerreiro de
Armadura Pesada trouxeram Lanceiro de volta a si.
Ele agarrou um pitão para se firmar, quase tarde demais e falou “mais uma”.
Doía nele admitir, mas um fato era um fato. — Essa não é a minha classe
principal, lembrem-se.
— Está bem, se formos atacados de novo na subida, voltaremos para baixo e
descansaremos por uma noite. Então mudaremos para um ataque de frente.
A decisão de Guerreiro de Armadura Pesada foi rápida e clara. Atacar a base
inimiga com suas magias esgotadas ou depois de restauradas? Não importava de
como você visse, essa última oferecia uma oportunidade melhor de
sobrevivência.
Lanceiro compreendia isso, e ele sorriu. — Mesmo que estivéssemos prestes a
tocar o céu?
— Se estivermos lá, então é diferente — respondeu Guerreiro de Armadura
Pesada, mostrando os dentes enquanto ria da pergunta despreocupada de
Lanceiro.
— Você é o líder. — Matador de Goblins concordou discretamente. — Seguirei
suas ordens.
— Ótimo. Nesse caso, vamos indo. — Guerreiro de Armadura Pesada estendeu
a mão para mais pitões; Matador de Goblins procurou na bolsa e pegou outro
monte. Ele mantinha bastante com ele porque eram uma ferramenta muito útil, e
graças a isso parecia que provavelmente estava fora de questão eles ficarem sem
para alcançar o cume.
— Seja como for, acho que eles sabem que estamos aqui. Vamos garantir que
eles nos deem uma boas-vindas.
— Certo.
Matador de Goblins deu a sua resposta curta e olhou para o homem na sua frente.
A espada larga enorme nas costas de Guerreiro de Armadura Pesada tremia como
um chocalho. Com um tom imensamente severo e sério, Matador de Goblins
disse: — Não deixe isso cair em mim.
— Ah, fica quieto.
Lanceiro gargalhou sem qualquer malícia e Guerreiro de Armadura Pesada
continuou taciturno a exercitar seus músculos.
O objetivo deles, o topo da torre, não estava longe.
O cume da torre apresentava uma cena quase que indescritível.
Era um espaço aberto com uma depressão como uma tigela redonda, com o
exterior rodeado de pilares. O telhado era uma cúpula curvada, como se um globo
enorme estivesse descendo no espaço. No teto estava um mapa estelar, mas os
seus riscos selvagens não refletiam quaisquer constelações que os aventureiros
conheciam.
O chão e os pilares eram brancos puro, com o céu azul espreitando entre as
colunas. E ainda assim, havia uma opressão esmagadora. Quando Guerreiro de
Armadura Pesada se ergueu pela borda, ele olhou para as constelações e fez um
chiado descontente.
— Isso é com certeza trabalho do Caos. Vamos, e não podemos deixar que nada
nos cause problemas mais tarde.
Ele estendeu a mão enquanto falava, segurando uma luva de couro. Ele ajudou
Matador de Goblins subir, e esse deu uma olhada no ambiente.
— A escalada foi mais fácil do que eu esperava.
— Provavelmente porque somos três caras. — Guerreiro de Armadura Pesada
retirou o anel do dedo e pôs de volta na bolsa de itens. Ele rapidamente o
substituiu por luvas e braçadeiras, e agarrou a espada em suas costas. — Não
gostaria de ter algumas crianças fazendo essa escalada.
— Cara, isso é verdade. — A resposta veio de Lanceiro, que hesitou, franzindo
a testa para a luva de couro que pairava a sua frente. A luva simples e pouco
sofisticada pegou a mão de Lanceiro, puxando o último membro do grupo para
o telhado. — Não gostaria de deixá-la fazer isso. Raios, ela provavelmente não
conseguiria. Sabe, grandes demais.
O comentário grosseiro soou estranhamente inofensivo vindo de Lanceiro,
embora talvez fosse graças a sua personalidade. Guerreiro de Armadura Pesada
lhe lançou um olhar duvidoso enquanto ele fazia um gesto vulgar com as duas
mãos na frente do peito.
— Entendo o que está dizendo — disse Matador de Goblins, com outro aceno
reservado. — Não iria querer cansar a sua retaguarda. E a minha é sensível.
— É isso o que te preocupa? — Lanceiro suspirou profundamente. — Você não
tem outro disco? Os corpos das mulheres devem ser louvados! Bustos! Quadris!
Bundas!
— Qual é o sentido em elogiá-los?
— Amarão você por isso, e ficará popular entre as mulheres!
— Entendi.
Matador de Goblins falhou em levar a conversa mais longe, em vez disso sacou
a espada. Ele verificou a alça do seu escudo, depois girou o pulso direito,
juntamente com a arma na mão. Guerreiro de Armadura Pesada olhou para ele.
— Não usou força demais?
— Estou bem.
— Ótimo. — Guerreiro de Armadura Pesada bateu suavemente no ombro de
Matador de Goblins. — E você?
— Não sou tão frágil quanto isso — sorriu Lanceiro, pegando a lança com as
duas mãos e aplicando uma estocada lúdica.
Para o líder, mostrar que entendia como cada membro estava era uma forma
importante de aliviar qualquer ansiedade por parte do grupo.
E mais ainda antes de uma batalha culminante. Guerreiro de Armadura Pesada
manteve a ponta de sua espada larga em um único ponto do terraço. Ele passou
a língua nos lábios para umedecê-los.
— Vamos começar.
E então, o inimigo estava lá.
Uma sombra agitada no meio do telhado, no fundo da depressão em forma de
tigela. Escuridão se juntou à sombra agitada e crescente. Finalmente, ela formou
um sobretudo antigo, a figura tremulava como uma miragem.
— Mortais tolos…!
A voz rangeu como um galho seco, um som que um humano muito
provavelmente não poderia fazer.
A figura estava torta e distorcida e parecia como se estivesse em um pântano.
Em seus dedos salientes, segurava um cajado que parecia tão velho quanto suas
mãos. Abaixo do casaco, uma chama espiritual queimava. O homem, a imagem
indiscutível de um mago do mal, cuspiu aos aventureiros detestáveis:
— Como detesto quem interfere com meus pla…!
Mas ele foi cortado antes de poder terminar.
Uma espada.
Uma espada tosca e de produção em massa com um tamanho estranho atravessou
o ar e perfurou o peito do mago. Ele gorgolejou, depois caiu no chão agarrando
a garganta.
— Ei, ei, você poderia pelo menos deixá-lo terminar. Não?
— Não há necessidade de termos que confrontá-lo de frente.
Foi Matador de Goblins. De pé ao lado de Lanceiro sorridente, o homem que
lançara a espada pelo ar balançou o capacete de aço de um lado para outro. — E
parecia que ele não era um adversário sério.
De fato.
O mago colapsou com um baque. Enquanto observavam, a espada em seu peito
definhou. Ela se transformou em ferrugem antes que pudessem piscar. Uma mão
esquelética a alcançou, agarrou e a despedaçou.
— O ritual… já está… completo! — berrou ele enquanto arrancava a lâmina
dizimada. Estava bem claro que essa pessoa era um Personagem Que-Não-Reza.
Guerreiro de Armadura Pesada estava com sua espada larga em prontidão e deu
uma olhadela para Matador de Goblins.
— Talvez o apunhalar no peito não foi o melhor plano?
— É mais ou menos a altura da cabeça de um goblin.
Matador de Goblins sacara uma adaga e tomou uma postura baixa.
O fogo espiritual tremeluzia nos olhos do mago enquanto ele avançava.
— Não posso ser morto por aqueles que possuem palavras!
— Vocês o ouviram — disse Lanceiro, quase como se estivesse abafando um
bocejo. — O que vamos fazer?
— Ele disse que não pode ser morto, mas não disse que não pode morrer.
Guerreiro de Armadura Pesada sorriu tanto quanto tinha sorrido quando derrotou
sua primeira barata gigante. Ele assentiu da mesmo forma que Matador de
Goblins fazia quando confrontado por um goblin.
— Então, só há uma coisa a fazer.
Sem qualquer sinal para com o outro, o grupo entrou em formação e se preparou
para a batalha.
O mago começou a gritar verdadeiras palavras sem qualquer hesitação, dobrando
o espaço. Com duas ou três palavras ele invocou uma magia, e o que apareceu
— talvez de se esperar — foram demônios cinzas de pedra. Eles aguardavam
fielmente atrás do seu mestre, e então, com um movimento do seu cajado, eles
se lançaram nos aventureiros.
— Bárbaros malcriados! Cedam perante minha enorme inteligência!
Mas os homens que estavam contra ele eram todos guerreiros e tinham alcançado
o ranque Prata. O trabalho pesado e a perseverança que conduzira a habilidade
de Guerreiro de Armadura Pesada com a espada não era de se desprezar.
— Você esqueceu de “geniais”!
Guerreiro de Armadura Pesada rangeu enquanto avançava para encontrar os
monstros e pará-los da esquerda, direita e meio.
— GARGLEGARGLEGA!!
— GARGLE!! GARGLEGA!!
Quando uma estátua descuidada entrou no seu alcance, ele aproveitou a
oportunidade e a destruiu.
Ele fez uma pose intimidadora. Esse era um homem que não precisava mais do
que uma espada e seu próprio corpo. Seria preciso mais do que números para
intimidá-lo. Com cada brandir de sua espada, poeira tracejava pelo ar como um
estandarte.
— Então morra como bárbaros que são! — gritou o mago, ainda empunhando
seu cajado em segurança atrás das gárgulas.
— Tonitrus… oriens…! Ascenda, trovão!
Invocado pelas palavras de verdadeiro poder, magia começou a jorrar no local.
Não havia vento, contudo, os aventureiros foram atingidos por uma força
avassaladora como uma tempestade iminente.
— “Raio”?! — gritou Lanceiro. Ele viu o que estava acontecendo e ficou atento
pela sua chance. — Eu poderia usar Contramagia… Não, nunca funcionaria!
Sinto muito, rapazes, não consigo fazer isso!
Mas isso vinha, em parte, do reconhecimento de que seu oponente era um usuário
de magia muito mais talentoso do que ele.
— Está bem — assentiu Guerreiro de Armadura Pesada, distribuindo ordens a
um ritmo alucinante enquanto abatia mais uma gárgula. — Tampem a boca!
— Tampem a boca — repetiu Matador de Goblins. Sua adaga já não estava na
mão; ele já estava revirando sua bolsa de itens.
Ele pegou o ovo e lançou em um único movimento. Guerreiro de Armadura
Pesada levantou a gola do casaco.
O ovo fez uma bela parábola no ar, mas o mago o golpeou como uma mosca e
pisou em cima.
— Muito esperto, seu……?!
Instantaneamente, uma névoa vermelha flutuou do seu pé… pó mineral e
pedaços de casca. Uma dor paralisante afligiu sua boca, nariz e olhos. Ele não
conseguia respirar nem falar. Ou, é claro, entoar magia. O mago pressionou as
mãos no rosto e caiu para trás com um grito mudo.
O pó era um gás lacrimogêneo, incluindo cápsico e outros ingredientes. Por mais
avançado que alguém poderia ser em magia, desde que tivesse olhos, nariz e
boca, era difícil de evitar.
— Agora… você… é meu!
Lanceiro não perdeu tempo; ele avançou rapidamente pelo local como uma
flecha de um arco. As gárgulas, encurraladas pelo Guerreiro de Armadura
Pesada, não eram nada para ele. Ele foi direto para o mago, tocando a mão em
seu brinco.
— Aranea… facio… ligator! Aranha, venha e prenda!
— ?!
A “teia de aranha” pegou facilmente o mago agoniado. A chama espiritual do
mago estremeceu, e no momento que aconteceu, a ponta de uma lança perfurou
seu coração.
O sangue que jorrou era preto-azulado. Lanceiro rapidamente deu um chute no
corpo envolto de seda para soltar sua arma e pulou para trás.
Nem era preciso dizer que, como ele havia declarado antes, o mago não mostrou
nenhum sinal de perder a vida com isso. Com sangue negro-azulado escorrendo
de sua boca, ele tentou abrir bem os lábios o suficiente para dizer outra magia.
— Ah, cala a boca.
Lanceiro enrolou o final da teia de aranha na ponta de sua lança e a usou como
uma mordaça. Ele deu de ombros para o mago, que parecia indisposto a desistir,
com sua chama espiritual cintilando com intenção assassina.
— Parece que você não estava brincando quando disse que não podia ser morto.
— Não tem que se preocupar com um mago que não consegue falar — disse
Guerreiro de Armadura Pesada. — Mas é um pouco chato — murmurou ele
enquanto esmagava a última das gárgulas com sua espada larga.
Tudo o que restava era encontrar a fonte de poder do mago, que tinha de estar
em algum lugar da torre, e destruí-la.
Mas, enquanto o mago estivesse vivo, era provável que as armadilhas e os
monstros não parariam de aparecer.
— Humm — grunhiu Guerreiro de Armadura Pesada. Ao lado dele, Matador de
Goblins mantinha sua adaga orientada ao seu cativo, sempre vigilante. Então seu
capacete inclinou um pouco, como se tivesse acabado de pensar em algo.
— Por que não o jogamos?
—…
—…
Guerreiro de Armadura Pesada e Lanceiro trocaram um olhar. Eles assentiram e
depois riram como crianças desobedientes.
— É isso.
— Vamos fazer isso.
O mago, tentando falar com a mordaça na boca, foi arrastado até a beira da torre
e então chutado firmemente pelas costas. A gravidade não teve palavras, mesmo
assim o arrastou para baixo, e logo ele conhecera o mesmo destino dos
aventureiros anteriores.
Em outras palavras, ele morreu facilmente.
— Queria saber por que ele construiu essa torre, no entanto — comentou em voz
alta Lanceiro, espiando de lado para a mancha escura-azulada se propagando no
chão abaixo. Seu tipo geralmente se estabelecia quer na ponta de uma torre ou
nos locais mais profundos de um labirinto subterrâneo. — Poderia ter sido mais
problemático matá-lo se ele estivesse no subsolo.
— Talvez ele tivesse uma ajuda dos deuses ou algo assim — disse Guerreiro de
Armadura Pesada francamente, devolvendo sua espada às costas. Ele ainda
estava observando seu ambiente com cuidado, talvez porque o perigo de
armadilhas e inimigos remanescentes não tivesse diminuído. — Vamos lá, vamos
encontrar o saque. O chefe está morto. Se não nos apressarmos, essa torre pode
desaparecer.
— Ah, sim, é verdade! Uma aventura tem que ter um tesouro!
Lanceiro partiu correndo, com sua alegria lhe dando coragem. Guerreiro de
Armadura Pesada nem sequer considerou detê-lo. Atitude e ações estavam
separadas. Tal como manter a guarda e não ficar nervoso eram coisas diferentes.
— Ele é muito bom nisso.
— Sim. — Matador de Goblins assentiu, pegando a espada arruinada de
ferrugem e estalou a língua enquanto a jogava fora. — Há muitas coisas que eu
poderia aprender dele.
— Não sei dizer se está brincando ou não.
Enquanto Guerreiro de Armadura Pesada considerava se ria, ele e Matador de
Goblins partiram na busca. Eles estavam procurando por saque, baús, efeitos;
qualquer coisa desse tipo. Para um aventureiro, não havia alegria maior.
Em pouco tempo, eles descobriram um baú de estoque de carvalho vermelho em
um canto do terraço.
— Essa não é a minha classe principal. Não esperem muito — avisou a eles
Matador de Goblins, depois se ajoelhou diante do baú. Ele olhou em sua bolsa
de itens e pegou várias ferramentas especializadas. Primeiro, ele pegou uma lima
parecida com uma lâmina fina e a moveu sob a tampa do baú, procurando algo.
Ele confirmou que não havia armadilhas, então segurou um espelho perto do
buraco da fechadura e olhou para dentro.
Agora era a hora do arame. Matador de Goblins se preparou para abrir a
fechadura.
— Ei, Matador de Goblins. Pense sobre isso: você não apanhou um único vilão
hoje. — Lanceiro sorriu enquanto observava o fazer de Matador de Goblins sobre
seus ombros. — Significando…
— O quê?
— Que eu venci!
— Sim — Matador de Goblins não fez qualquer esforço para refutar, apenas
concordou. — De verdade.
Lanceiro levou seu punho ao alto com um “Simmm!” comemorativo. Guerreiro
de Armadura Pesada olhou para o céu.
— Porque não eram goblins.
Na sua euforia, Lanceiro pareceu não escutar o murmúrio, mas Guerreiro de
Armadura Pesada certamente o ouviu.
Por fim, a fechadura abriu com um clique, e Matador de Goblins expirou:
— É um pouco tarde para mencionar isso, mas provavelmente vai haver alvoroço
quando voltarmos.
— Hã? …Ah, sua garota elfa? — Guerreiro de Armadura Pesada pensou na
estourada e masculina elfa do grupo de Matador de Goblins.
Acho que meio que deixamos ela de fora.
— Acho que vou ter mais problemas ainda — disse Lanceiro. — Mas não se
preocupe. É tradição ter pouca emoção enquanto se divide o saque e bebe um
pouco de vinho.
— …Se bem me lembro, dissemos que haveria três partes, menos para as
despesas.
— Sim — disse Matador de Goblins — creio que sim. — Depois ele acrescentou
com uma voz desapaixonada: — Tesouro, hein? Nada mal.
Guerreiro de Armadura Pesada colocou uma mão amiga em seu ombro. Matador
de Goblins aceitou em silêncio. A tampa do baú rangeu quando ele a levantou.
Capítulo 7: Da Segunda Vez Que
os Planos do Necromante Foram
Frustrados

— Fwaaaah!
Quando a heroína acordou com o sol da manhã, em uma cama na pousada, ela
esticou os braços vigorosamente. O céu do lado de fora estava azul, e ela se sentia
enérgica, forte e pronta para sair.
— Certo! Hoje é mais um dia para dar tudo de mim!
Ela se energizou com um tapa rápido em cada bochecha, então usou essa energia
para se levantar da cama.
Isso era importante, porque a luz calorosa do sol estava tão confortável que a
fazia querer voltar para debaixo das cobertas. Mas seria bastante indulgente
desperdiçar um dia tão bonito por dormir demais.
Ela se vestiu rapidamente. Seu corpo ainda era jovem, mas tinha as curvas de
uma mulher amadurecendo. Pensando em que estava por vir mais tarde naquele
dia, ela se assegurou de usar sua armadura. Por último, ela pegou a espada
encantada, sua fiel companheira, e ela estava pronta. Era preciso se equipar tanto
com armas quanto armaduras, ou não havia sentido.
— Bom diiiia, pessoal!
Ela abriu a porta e correu pelo corredor, indo agilmente do átrio até o primeiro
andar.
Por sorte, em razão de estar cedo, não havia muitas pessoas ainda na taverna. A
única pessoa ao vê-la quando ela chegou silenciosamente foi uma garçonete de
olhos grandes no turno da manhã.
Mestre da Espada — seu companheiro, que já havia levantado e comido mais
cedo o café da manhã — deu um suspiro pouco surpreso. — …Olhe para você,
toda animada e disposta depois de uma noite de sono. O que você é, uma criança?
— Hã? Isso não é normal? — Heroína se sentou de frente para Mestre da Espada
com sua cabeça inclinada, balançando as pernas. Ela logo pegou um pouco de
pão do cesto no meio da mesa, passando um pouco de manteiga e enfiando na
boca.
Hmm, delicioso!
— Oh, vou pedir… Vejamos. Eu quero salsicha e ovo frito!
— S-sim, madame. Agora mesmo!
— Ah, e pão! Com bastante manteiga!
A garçonete observou em transe esse comportamento audacioso, depois correu
para a cozinha.
— Hum? O nosso terceiro ainda está dormindo?
— As coisas duraram até tarde da noite passada.
Mestre da Espada bateu na mão de Heroína, que estava estendendo a mão para
outro pedaço de pão, e olhou para os quartos no segundo andar. Ele parecia
preocupado com Sábia, que não havia acordado ainda.
— Bem, havia um monte deles!
— E o nosso grupo não tem a capacidade de usar Dissipar.
Isso significava que não podiam retornar fantasmas e mortos-vivos à terra. Em
consequência, eles tiveram que cortar a cabeça do exército de Necromante,
literalmente. Se o rei não tivesse pegado o grosso das forças inimigas, teria sido
muito difícil.
— Seria tão bom se eu pudesse simplesmente limpar o caminho todo até o
horizonte com um golpe!
— Pare com isso. Se pudesse fazer isso, seria terrivelmente perigoso.
— Acha?
Enquanto ela murmurava “Sério…?” e balançava as pernas, Heroína passava
sinceramente a impressão de uma garotinha. Mestre da Espada achou difícil de
acreditar que ela era a heroína, no melhor sentido. Tudo o que ele fazia era
manejar uma espada, mas ele queria ajudá-la se pudesse.
— Ah, ei, eu tive um sonho estranho.
— Um sonho?
— É. Os deuses, sabe? Eles estavam como: Vá para aquela cidade.
Mestre da Espada parou por um momento quando ela disse isso. Ele não tinha
conhecimento de tais magias ou segredos divinos. Sua compreensão se estendia
à “mate isso, apunhale aquilo”.
— …Isso é um Oráculo, uma ajuda.
A voz suave veio de cima.
Uma garota com um sobretudo segurando um cajado desceu pelas escadas,
esfregando os olhos. Sábia, uma das maiores conjuradoras desse mundo.
— Bom dia! — Heroína acenou para ela, e Sábia respondeu com um aceno de
cabeça. Ela puxou uma cadeira e se sentou. Heroína entrecerrou os olhos de
felicidade com a visão familiar dos três ao redor da mesa.
— …Que tipo de cidade?
— Hmm. Será que eles estavam tendo um festival? Havia essa… espécie de luz
esquisita.
— Isso é tudo?
— E havia essa grande tempestade, tipo bruah! Talvez tivesse sido um gigante?
— …Eu tenho um palpite.
Sábia murmurou uma ou duas palavras para criar uma magia e retirou um velino
arredondado do nada. Mestre da Espada não tinha ideia do que estava
acontecendo, mas ela ocasionalmente fazia coisas assim. Esticado na mesa,
acabou por ser um mapa da fronteira. Sábia apontou para um certo lugar com a
ponta do seu cajado.
— …Aqui.
— Muuuuito bem!
Heroína formou um punho justo quando a garçonete chegou com sua comida,
dizendo “desculpe pela demora”.
— Quer alguma coisa? — perguntou Mestre da Espada, e Sábia respondeu
sucintamente:
— Um omelete.
Heroína riu enquanto ela colocava molho de tomate generosamente em seu ovo
frito.
— Acho que já sabemos onde a nossa próxima aventura será!
Era certo: aventuras ocorriam por todo o lado nesse mundo.
Capítulo 8: Do Dia Sossegado
de Uma Elfa

— Hrrm…?
O sol estava bem alto no céu quando seus raios entraram pela janela e atingiram
os olhos de Alta-Elfa Arqueira. Ela estava nua, enrolada na cama sob um único
cobertor, e assim ela enfiou o rosto no travesseiro em uma breve demonstração
de resistência. Mas a luz do sol era terrivelmente brilhante, não podendo ser
derrotada simplesmente por cobrir o rosto.
Rapidamente cedendo, a elfa bocejou com um gato — fwaah — e fez um bom
alongamento em seu corpo magro.
— Faah… oooh… já é de manhã?
O sol estava alto demais para a manhã. Era quase meio-dia.
Alta-Elfa Arqueira, esfregando os olhos e olhando pela janela, se sentou de
pernas cruzadas na cama.
— Ooo…
Ela esfregava o cabelo desgrenhado enquanto murmurava palavras sem sentido.
Como se recordava, ela tinha o dia de folga. Ao menos, se ninguém veio acordá-
la, isso significava que não havia aventura.
Aquele Orcbolg… ele fora sozinho, todo goblins, goblins como sempre.
Ela não tinha realmente certeza sobre o incidente recente. Ela não conseguia
acreditar em uma batalha com um mago maligno no topo de uma torre.
Seja como for, isso de certo é diferente da floresta.
No mínimo, o fato de que podia dormir até ao meio-dia a fazia feliz por ter
deixado a floresta.
Ela bocejou outra vez, então começou a coçar sua barriga e umbigo
saudavelmente firmes. O comportamento dos alto-elfos era conhecido pelo seu
requinte, mas havia limites.
Alta-Elfa Arqueira esticou as pernas em direção ao chão, que estava tão
bagunçado de itens e pertences que quase não havia nenhum lugar para colocar
os pés. As pontas de seus pés encontraram seu amado arco grande. Ela reatou a
corda frouxa, depois a puxou com delicadeza para checar. Ela deveria mudá-la
mais cedo ou mais tarde.
— Hmm, tinha certeza de que estava por aqui… Ah, aí está você.
Ela se estendeu pela cama e esticou os braços para o chão.
Ela pegou uma pequena aranha do tamanho da ponta de um dedo. Ela estivera
perambulando em cima de suas perneiras no chão.
Alta-Elfa Arqueira tocou seu dedo esbelto na traseira da aranha e deu um puxão,
e um fio prateado atravessou o ar. Ela estava literalmente tecendo seda. E não
seda de aranha grudenta, mas de simples aranhas amáveis usadas por elas para
se caminhar. Ela fez isso duas ou três vezes, até que tivesse o comprimento de
fio que queria, ao que suas orelhas balançaram.
— Isso basta, eu acho. Obrigada!
Ela soltou a aranha e começou a torcer o fio. A seda de aranha era leve, mas mais
forte que fio de aço de mesma espessura. O material perfeito para uma corda de
arco. Passado um tempo, a elfa enrolou as cordas. Ela as passou para lá e para cá
pelos dedos, de uma extremidade à outra.
Convencida de que não havia problemas, ela balançou as orelhas de satisfação.
— Lá vamos nós.
Ela enrolou a corda com uma volta e saltou da cama ao chão. Sendo cuidadosa
para não pisar nos livros emprestados e brinquedos que comprou, mas não
reconhecia realmente, ela se esforçou para chegar à sala.
Ela agarrou seu traje de caçadora, o colando descuidadamente.
Hoje era seu dia de folga. Ela não precisava de seu casaco nem nada. Ainda que
uma espada curta pudesse ser conveniente…
Ela era magra e elegante; ela tinha uma pele tão branca que era quase translucida
e pouca carne extra em seus ossos. Combinado com seu peito plano, ela tinha a
beleza de uma estátua.
Em beleza, ao menos, os elfos da floresta não se contentavam com o segundo
lugar competindo com qualquer outra raça. Talvez a razão pela qual se
escondiam sob roupas eram porque viam seu próprio tom claro como
simplesmente normal.
— ~♪
Assobiando desafinada, Alta-Elfa Arqueira entrelaçou seu cabelo. Ela afastou de
lado gentilmente seus cabelos soltos de seus ombros e bochechas, e quando ela
se virou para trás, seu quarto bagunçado lhe saudou.
De certa forma, o caos era compreensível no quarto de um aventureiro. Mas era
difícil de acreditar que esse era o quarto de uma jovem mulher e ainda elfa.
Equipamentos estavam jogados ao redor, roupas descartadas caídas por toda a
parte e pratos vazios amontoados descuidadamente. Romances de aventuras e
livros de teatro estavam abertos, enquanto brinquedos comprados nos festivais
do templo estavam espalhados. Seria mais fácil acreditar que esse era um quarto
de criança.
Como é que tantas coisas cabiam em tal espaço relativamente pequeno? Era um
grande enigma que mesmo os elfos, com todos os seus conhecimentos, não
poderiam desvendar.
— Hmm — Alta-Elfa Arqueira cruzou os braços com seriedade e examinou o
quarto, então moveu suas orelhas para cima e para baixo e assentiu como se
estivesse de acordo com algo. — É melhor eu lavar algumas roupas.
***
Ela adicionou raspas de sabão juntamente com suas roupas em um balde cheio
de água do poço, depois colocou seus pés.
— Oooh… A água do subsolo é fria, não é?
Seu corpo e suas orelhas estremeceram, e ela começou a pisar em suas roupas.
Ela estava certa: ela nunca poderia imaginar isso em sua casa na floresta. Lá,
seria uma simples questão de colocar suas roupas no rio e pedir que as ondinas
ou espíritos da água lavarem para você. As tarefas domésticas eram deixadas
para os duendes. O mundo humano era terrivelmente incômodo, pensou ela.
Mas deixando isso de lado, ela gostava de pisotear, basicamente brincando na
água.
Atrás da Guilda havia um poço que também servia como um lugar para lavar
roupa.
A luz quente do sol da manhã que já se foi, se espalhava. Ao longe, ela podia
ouvir crianças correndo e donas de casa conversando. Os preparativos do almoço
deviam estar em curso, pois um aroma tentador flutuava da cozinha da taverna.
Alta-Elfa Arqueira adorava essa hora. De alguma forma tinha um cheiro
diferente das manhãs, noites e dias habituais da cidade de quando ela partia em
uma aventura. Ela não sabia exatamente que cheiro era, e ela podia estar
imaginando isso. Ela achava uma curiosidade saudável muito positiva em si e
nos outros, mas algumas coisas não deveriam ser muito minuciosamente
investigadas.
— Bwaaah…
Ela deu um bom bocejo. Não importava o quanto você dormia, em dias como
esses nunca era o bastante. Entretanto, os elfos tinham todo o tempo do mundo.
Desperdiçar um pouco disso não faria nenhum mal.
É uma pena, no entanto.
Coisas interessantes, coisas que chamavam sua atenção; se ela tirasse os olhos
delas só por um instante, de repente elas desapareceriam.
Alta-Elfa Arqueira continuou pisoteando as roupas ao lavar, dando outro grande
bocejo e saindo de cima do balde. Então ela espremeu suas roupas bem
pisoteadas e as balançou para a esquerda e para a direita com um paf.
— Muitas coisas interessantes em que pensar, de fato.
Como o cheiro delicado do sabão. A brisa que ela podia sentir através de sua
roupa molhada. A luz do sol.
Apreciando todas essas coisas, Alta-Elfa Arqueira pendurou suas roupas no varal
da área de lavar. Ela se lembrou muito bem de quando as pendurou
descuidadamente e ficaram amarrotadas, então se assegurou de colocá-las o mais
justo possível. Por alguma razão, era incomodo quando eram apanhadas pelo
vento e voavam no chão, então ela as prendeu firmemente com pregadores.
— Feito e feito!
Ela pendurou a última roupa cuidadosamente, depois balançou satisfeita suas
orelhas. Ela limpou a testa, embora não estivesse suada, pôs as mãos na cintura
e olhou para as roupas. As roupas balançavam com o vento como a bandeira de
um exército no topo de uma fortaleza conquistada.
— Lavando roupas? Se não é uma trabalhadora…
Alta-Elfa Arqueira se virou para a voz atrás de si com uma fungada orgulhosa.
Em geral, elfos sabiam quem vinha sem olhar. Mas até mesmo eles podiam ser
surpreendidos às vezes. Para toda regra há exceções.
— Oh, Garota da Guilda. Como vai?
— Estou tirando o dia de folga, então só estava andando.
A recepcionista usava roupas normais. Foi um pouco chocante, já que Alta-Elfa
Arqueira estava tão acostumada a vê-la com seu uniforme, mas claro, até Garota
da Guilda tinha outras roupas. Como qualquer um.
Ela usava um vestido de verão claro. Não tinha mangas, o que mostrava os
adoráveis traços dos seus braços desde os ombros até suas unhas feitas
cuidadosamente. Ele combinava bem nela e provavelmente permitia uma brisa
refrescante passar levemente. Seu corpo bem-formado era presumivelmente o
resultado dos seus esforços feito todos os dias. Poderia ser chamado
tranquilamente de ideal.
— Ele faz você parecer uma sílfide, de certa forma.
Garota da Guilda sorriu, agradecida com isso. — Eu comprei porque era para ser
a última moda na Capital.
Então era isso. Alta-Elfa Arqueira assentiu. Sem dúvida parecia uma boa roupa
para passear. Contudo, a moda humana mudava em um ritmo tão frenético que
ela achava difícil de acompanhar…
Me pergunto como eles aparecem com tantas coisas em um único ano.
Uma coisa era certa: o mundo humano nunca ficava chato.
— Mas o que está fazendo na Guilda?
Era seu dia de folga. Garota da Guilda evitou, de repente, os olhos da Alta-Elfa
Arqueira com a pergunta inocente. Seu olhar se moveu de um lugar para outro.
— …Só porque… Pensei em talvez me assegurar de que nossos aventureiros
tivessem voltado bem para casa.
— Hum! — Alta-Elfa Arqueira riu, sem refletir profundamente sobre essa
resposta. — Isso que é dedicação!
— Bem, sabe como é… — disse Garota da Guilda ambiguamente. — Então,
como está indo, lavando a roupa?
— Contemple o fruto do meu trabalho. — Alta-Elfa Arqueira estufou
orgulhosamente seu pequeno peito. — O que me diz?
Não era como se ela tivesse usado uma habilidade especial. Era apenas roupas
para lavar. Não era algo para se gabar, mas Garota da Guilda sorriu mesmo assim.
— Você já ficou bem acostumada em fazer isso, não é? — comentou ela.
— Acho que sim. Consigo lidar com isso muito facilmente — respondeu Alta-
Elfa Arqueira.
— Oh… Nenhuma roupa íntima?
—?
Garota da Guilda ficou com as tranças sacudindo enquanto inclinava confusa a
cabeça
Alta-Elfa Arqueira respondeu prontamente: — Não tenho nenhuma.
— Ah, está dizendo que essa já é a segunda vez que lava?
— Não — respondeu ela balançando enfaticamente a cabeça. Por que ela não
entendeu? — Eu não tenho nenhuma.
— …Pensei que todas escolhemos algumas juntas há algum tempo.
— Eu meio que as enterrei…
—…
Garota da Guilda colocou a mão na testa e olhou para o chão apenas o tempo
suficiente para Alta-Elfa Arqueira ficar ligeiramente desconfiada. E quando
Garota da Guilda olhou de novo para cima…
— Vamos comprar algumas então… Sim, vamos fazer isso.
Havia aquele sorriso estampado.
— Hã? Mas… Sinceramente, pode ser meio chato…
— Vamos.
E para o aventureiro recusar uma oferta de uma empregada da Guilda era
simplesmente impossível.
***
— Arrgh… Ei, tenho mesmo que vestir isso?
— Sim, tem!
Alta-Elfa Arqueira colocou a cabeça do lado de fora do provador só para se
deparar com o dedo de Garota da Guilda em seu rosto.
Garota da Guilda pegara a elfa pela gola e arrastou-a até a loja da cidade.
Essa poderia ser uma área subdesenvolvida na fronteira, mas mesmo aqui havia
um alfaiate.
— Apesar de que, se tratando da moda mais recente na Capital, você teria mais
sorte nessa loja.
Pode não se comparar a cidade da água, mas mais itens passavam por aqui.
Assim Garota da Guilda disse e estufou seu peito bem-formado, mas Alta-Elfa
Arqueira não entendeu. A moda mudava com uma velocidade tão ofuscante, que
talvez apenas os humanos pudessem acompanhar.
— E mais — disse Garota da Guilda balançando seu dedo — a aparência é
importante para os aventureiros.
— É?
— Se os aventureiros de níveis alto não se destacam, isso diminui a qualidade
geral de todos os nossos aventureiros.
Aventureiros eram conhecidos por uma impressão particular, como: rufiões com
armas e armaduras. O Estado pode ter estabelecido à Guilda a ajuda para
controlar os aventureiros, mas a opinião pública não era tão gentil. Não existia a
necessidade de roupas extravagantes, mas uma aparência bem-cuidada era
importante.
Não era por Alta-Elfa Arqueira não entender a lógica. Ela entendia, e ainda
assim…
— É? — disse ela com uma sacudida descontente com as orelhas. — Tente dizer
isso a ele.
— Acha que ele iria ouvir? — ripostou Garota da Guilda com um sorriso largo.
— …Não — disse Alta-Elfa Arqueira, voltando emburrada ao provador. Em suas
mãos estava uma lingerie fina e sem mangas, que ia até a barriga.
— Mas tenho altas expectativas em ti, sabe.
— Altas expectativas?
— Elfos tem naturalmente uma pele tão bonita… vocês provavelmente nem
precisam se cuidar.
— Não tenho certeza disso…
Não obstante, Alta-Elfa Arqueira fez um grunhido evasivo e se apertou na roupa
íntima. Ela não conseguia se acostumar com a sensação de que ficava presa ao
seu peito liso.
— Eu prometi ajudar a nossa amiguinha a escolher algumas roupas íntimas
também. — Só por um momento, Garota da Guilda pareceu dar uma olhadela
por trás de seu sorriso tenso. — Somos todas garotas, certo? Vocês podem ser
aventureiras, e equipamentos devem ser mais importantes que a moda, mas… —
As orelhas de Alta-Elfa Arqueira captaram as últimas palavras quando ela
murmurou: — Mas somos todas garotas, certo?
Não havia nada crítico ou repreensivo em seu tom. Talvez ela não estivesse em
posição para fazer tal coisa. Alta-Elfa Arqueira não sabia. Mas mesmo que não
entendesse, ela sabia que Garota da Guilda estava tomando conta delas do jeito
dela.
Ela é uma boa pessoa. Eu acho.
— Mesmo assim…
Seja como for. Roupa íntima ajuda a absorver suor e coisas assim, mas…
Ela agarrara uma única peça de roupa fina, um triângulo ao contrário. A cor da
parte superior e inferior, é claro, combinavam.
…Não acho que essa coisa possa servir muito.
Ela segurou a coisa em sua mão, a esticando e examinando enquanto dizia: —
Por que vestiria isso?
— Como assim, por quê?
— Digo, não é como se alguém fosse ver. Para quem você iria mostrar?
Ela podia sentir Garota da Guilda se enrijecendo do outro lado da cortina do
provador.
— Hum? — disse Alta-Elfa Arqueira, surpresa, com a cabeça
inclinada. Aparentemente ela perguntara uma coisa que não deveria.
— É-é meio que uma preparação para… para quando chegar a hora de mostrar
para alguém. Roupa íntima é o último trunfo de uma garota — disse Garota da
Guilda enquanto continuava gentil como sempre.
— É isso mesmo? — perguntou Alta-Elfa Arqueira sem pensar, ao que Garota
da Guilda disse rapidamente:
— Sim, é.
Hmm…
Era difícil para ela imaginar que tal peça de roupa fina e de aparência duvidosa
fosse tudo isso.
Talvez Garota da Guilda pudesse sentir Alta-Elfa Arqueira refletindo sobre isso,
pois ela murmurou: — Ah, bem. Não precisa se forçar a comprar isso agora ou
qualquer coisa assim, mas devia pensar nisso.
— Claro, eu irei.
Alta-Elfa Arqueira arrancou as roupas que estivera provando sem qualquer
arrependimento. Então ela pegou suas próprias roupas, que estavam espalhadas
no chão, e as vestiu o mais rápido que podia. Do outro lado da cortina, ela pôde
ouvir Garota da Guilda exclamar “Q-quê?” quando a lingerie veio voando.
— Se você colocar roupas por cima delas e depois tentar se mover, parece que
elas ficam meio que… esponjosas e barulhentas. — Alta-Elfa Arqueira saiu do
provador, de volta ao seu traje habitual, e olhou nos olhos de Garota da Guilda.
Ela estava pegando as roupas que a elfa havia arremessado no chão. Alta-Elfa
Arqueira sorriu sem malícia, como um gato. — Prefiro fazer algo divertido. Ei,
quer jogar um jogo?
***
— Um jogo de mesa?
— Correto. Eu descobri há pouco tempo.
Assim elas chegaram à taverna da Guilda algum tempo depois.
Garçonete Felpubro lhes deu uma pequena saudação, e Alta-Elfa Arqueira puxou
a cadeira de uma das mesas.
Garota da Guilda trazia uma caixa comprida e achatada, envolto em um pano cor
de cobre. Ela abriu a janela e soprou um pouco de poeira. Na tampa havia o
padrão como uma cobra sinuosa.
— Você move peões, rola dados e age como um aventureiro… Ao menos, acho
que é assim que funciona.
— Então… você finge ser um aventureiro?
— Mais ou menos.
Quando elas abriram a tampa da caixa, encontraram vários livros velhos de
velino, juntamente com um grupo de peões e dados enfiados cuidadosamente.
Alta-Elfa Arqueira pegou um dos bonecos na mão e examinou. Ele tinha uma
base circular: um cavaleiro usando armadura azul de placa. Talvez fosse feito de
metal, pois pesava. Esse boneco segurava um estandarte com um símbolo ômega,
brandia uma boa lâmina de aço e gritava pelo fim do Caos. Um paladino, sem
dúvida.
— Isso é um belo artesanato.
— Há um monte de cenários também. Desde salvar o mundo, e bem, matar
goblins.
Alta-Elfa Arqueira riu com as palavras matar goblins. Suas orelhas balançaram
alegremente.
— Aposto que acabaria mal bem rápido se fizéssemos Orcbolg jogá-lo… Ei,
posso te fazer uma pergunta?
— O quê?
— Qual é o sentido disso?
Garota da Guilda foi deixada pestanejando com a pergunta súbita. Alta-Elfa
Arqueira viu sua confusão e balançou as mãos freneticamente.
— Desculpe, não interprete errado. Quero dizer literalmente.
— Ah, entendi… Hmm. — Perdida em pensamentos, Garota da Guilda parecia
bastante com a mesma de sempre, apesar de estar sem uniforme. — Acho que
você pode usá-lo para determinar o seu papel e ações antes de prosseguir em uma
aventura, de certa forma.
A pausa mental fez Alta-Elfa Arqueira dar um risinho e Garota da Guilda coçar
a bochecha.
— Mas eu nunca fiz isso antes — disse a elfa.
— É preciso esforço e tempo, e é claro que precisa de jogadores suficientes.
Além disso, muita gente não consegue ler.
— Hmm…
Ela acrescentou que, embora o jogo estivesse disponível, era raramente usado.
Isso era compreensível para Alta-Elfa Arqueira. Ela colocou o paladino
cuidadosamente de volta na caixa. — Tenho certeza de que não seria o suficiente
para garantir uma aventura tranquila.
— De fato. É completamente diferente da realidade, isso é certo.
Enquanto falava, Garota da Guilda esticou a mão de novo até a caixa e pegou
uma peça. Era aparentemente um guerreiro de armadura leve, usando armadura
de couro e segurando uma adaga em prontidão. Possivelmente um batedor.
— Mas talvez… seja o suficiente. — Ela tocou seu rosto suavemente com o dedo,
sorrindo timidamente. — Você poderia dar as boas-vindas aos aventureiros que
salvaram o mundo. Não é bem uma fantasia ou um sonho… — Ela falou
discretamente, quase como se escondendo algum embaraço.
Eu entendo. A garota elfa balançou suas orelhas longas suavemente e sorriu. Ela
podia entender. Embora estivesse no lado a ser bem-vinda em vez de dar boas-
vindas.
— Ei, me ensine a jogar — disse ela, retirando o paladino da caixa.
É. Eu gosto do rosto dela.
— Apenas veja. Eu salvarei todos os mundos que você quiser!
E então Alta-Elfa Arqueira procedeu em falha. Não só ela não derrotou o mago
imortal, como ela sequer chegou ao mausoléu labiríntico. Achar a entrada repleta
de miasma do túmulo não era para heróis imaturos.
Salvar o mundo se revelou uma tarefa hercúlea, mesmo quando o mundo era um
jogo de tabuleiro.
***
— Ahh, cara! Que horrível!
A taverna a noite era barulhenta, e assim ninguém ouviu a exclamação de Alta-
Elfa Arqueira. Às vezes aventuras iam bem, às vezes não. Às vezes a melhor
coisa a se fazer era ignorar alguém.
— Eu juro que havia algo errado lá! Como pode um dragão vir batendo asas do
céu?!
— Isso era o que estava nos materiais, então é assim que as coisas aconteceram.
Quando a elfa se esticou sobre a mesa e bateu na madeira, Garota da Guilda
respondeu com um sorriso desajeitado.
Depois disso, o mundo fora extremamente destruído várias vezes. Apesar da
inclusão de Inspetora, bem como Sacerdotisa e Vaqueira que apareceram no bar,
a paz no mundo parecia um objetivo distante.
— “Assim que as coisas aconteceram”? Inaceitável. — A elfa de dois mil anos
fez beicinho como uma criança.
— Você acha?
— Sim, acho que poderíamos ter feito algo mais. Tenho certeza — queixou-se
ela, agitando seu copo cheio de vinho tinto.
— Talvez sim — disse Garota da Guilda assentindo com moderação, puxando a
comida das gotas de vinho que espirravam na mesa. — Parte do interessante nos
jogos de mesa é ver o que as pessoas inventam.
E ela tinha que admitir que o cenário fora um pouco exagerado.
Com essas palavras, Alta-Elfa Arqueira virou a cabeça na mesa para encarar
Garota da Guilda.
— …Na verdade, não acha que é meio que um desperdício?
— Desperdício?
— Ou… indulgente. Vocês mal vivem cem anos, não é?
Não obstante do necromante ocasional.
Alta-Elfa Arqueira mexeu suas orelhas, fazendo um círculo no ar com a ponta do
dedo.
— Usar esse tempo escasso se preocupando com o futuro… parece um
desperdício.
— Está dizendo que devíamos aproveitar o momento? — perguntou Garota da
Guilda, suas tranças deslizaram quando inclinou a cabeça.
— É — respondeu Alta-Elfa Arqueira com uma risada. — É o privilégio dos
mortais rir ou chorar, ficar com raiva ou fazer alvoroço sobre o que aconteceu
hoje. Se preocupar com o que acontece em cem ou duzentos anos… isso é coisa
nossa.
— Não sei.
— Um alto-elfo disse isso. Deve ser verdade!
A resposta de Alta-Elfa Arqueira foi acompanhada de uma fungada orgulhosa
enquanto estufava com confiança seu peito pequeno. Ela estava longe se ser a
imagem de um alto-elfo nobre instando um humano a ser mais ponderado. Mas
a verdade era que ela mesma sentia que precisava de tudo o que tinha para
resolver o que estava bem na sua frente dia após dia.
Garota da Guilda riu, e um sorriso veio ao seu rosto, não aquele sorriso artificial,
mas um completamente natural. Ao ver isso, Alta-Elfa Arqueira, muito satisfeita
com o que conseguira, entrecerrou os olhos como um gato e sorriu.
— Bem, já que estamos aqui… Com licença!
— Sim!
Com Garota da Guilda ainda sorrindo, ela chamou Garçonete Felpubro e pediu
outra garrafa de vinho. Ela não era hedonista, mas isso era especial. Por que não
beber algo bom?
Ela estourou a rolha, apreciando o aroma do álcool, então despejou com
generosidade no copo de Garota da Guilda e ao seu mesmo. Alta-Elfa Arqueira
pegou seu copo, com os olhos brilhando como se nunca tivesse visto um antes, e
Garota da Guilda fez o mesmo.
— …Muito bem. Aqui está pela aventura fracassada de hoje.
— Um fracasso que não vou esquecer mesmo que viva cem anos!
Saúde! Seus copos tilintaram com som musical.
Capítulo 9: Dos Três, Alguns
Meses Atrás

A palavra taverna podia significar muitas coisas. Nem todos esses lugares eram
ligados à Guilda dos Aventureiros.
Vague pela cidade e encontrará várias, com quadros de avisos e luzes brilhantes.
Elas normalmente tinham estalagens anexadas, e por vezes os aventureiros só
desejavam uma mudança de ares. Esses eram lugares onde aventureiros podiam
facilmente aparecer, comer e beber tanto quanto quisessem, e depois sair para
cidade.
Em uma dessas tavernas, um menestrel dedilhou seu instrumento e começou a
cantar:
Quantas vezes nos encontramos e separamos?
O que importa, proclamou você, é o que está no coração
Sem ninguém para gostar, elas vêm e vão
Até que viste aquela coisa fofa um dia; oh-ho!
Seja você um senhor ou um espião,
Você não sabe o nome dela, mas você aprecia os olhos dela
Você exerce sua conversa mole, mas passa pela porta da taverna
Você percebe tarde demais: ela já se foi
Quantas vezes nos encontramos e separamos?
Uma reunião, uma despedida, um coração partido…
— Muito bem então. Acho que temos um grupo, ei, Escamoso?
— Ha-ha-ha. Ainda que eu desejasse um guerreiro e um batedor.
Sentados bem adentro da taverna aconchegante, dois aventureiros conversavam
afavelmente e riam.
Um era um anão, que acariciava sua barba branca, batia em sua barriga redonda
e se servia de vinho e comida. E do outro lado dele estava um homem-lagarto,
comendo com as próprias mãos, com seu corpo grande e escamoso sentado em
um barril de vinho. Eles bebiam o vinho que lhes foi trazido como água, de uma
forma que ultrapassava o saudável e já era quase festivo.
— Um bloqueador, um patrulheiro, um sacerdote-guerreiro e um mago. Eu diria
que temos uma boa combinação.
— De fato.
Lagarto Sacerdote deu uma dentada na perna de javali que segurava com as duas
mãos, enquanto Anão Xamã lambia um pouco de vinho que derramara na ponta
de sua barba. Ele despejou vinho da garrafa em seu copo com um glub, glub,
depois sorveu o que transbordava. Ele bebeu o vinho em um só gole e soltou um
arroto.
— Não é o suficiente na linha de frente, não é o bastante na retaguarda, conexões
insuficientes para obter equipamentos e itens… Reclame de tudo e depois não
terá mais nada para reclamar.
— Acontece, acontece — disse Lagarto Sacerdote, batendo a cauda no chão. —
Um grupo com três usuários de magia é certamente abençoado.
— Tenho que admitir, é um bocado surpreendente.
— Você quer dizer…?
— Você. — O anão com o rosto vermelho empurrou seu copo vazio em direção
ao Lagarto Sacerdote. — A princípio… achei que não ia se interessar em fazer
grupo com outro clérigo.
— Ha-ha-ha-ha-ha-ha! Oh, mestre conjurador. Nunca sei o que vai dizer a seguir.
— Lagarto Sacerdote riu deliberadamente. Terminado com a carne, ele roeu o
osso da perna, dando uma demonstração feroz de seus dentes. — Todos os nossos
semelhantes vieram do pó do mar, então não há por que para mim ficar chateado
por um descendente dos ratos nos conduzir. — Talvez o álcool estivesse
acabando, pois Anão Xamã parecia enfadado enquanto Lagarto Sacerdote
revirava os olhos triunfantemente. — Brincadeira, brincadeira.
— Receio não conseguir achar engraçado — disse Anão Xamã, mandando
embora a indiferença do lagarto.
— Bem, cada um tem sua própria crença. Se alguém optasse por discutir sempre
que houvesse uma diferença, não haveria fim.
— Mas hereges e seguidores do Caos são diferentes, não…?
— Isso não é argumento. Eles devem ser mortos até que não restem nenhum.
A cabeça de Lagarto Sacerdote balançou com a maior severidade; era difícil dizer
quão sério ele estava sendo.
Anão Xamã empurrou seu prato vazio, agarrando uma atendente para pedir um
pouco de carne, e repousou o queixo nas mãos.
— Só por curiosidade, ouvi rumores sobre os homens-lagarto. Eles são todos
canhotos, ou que seus corações estão na direita. Algo disso é verdade?
— Hmm. Não posso falar quanto a localização do meu coração, mas quanto as
minhas mãos, diria que sou ambidestro. — A ideia de que todos os homens-
lagarto eram canhotos porque a mão esquerda de um deus os criara era,
aparentemente, um absurdo.
Lagarto Sacerdote abriu significativamente ambas as mãos garradas. Então
sacudiu a língua como se tivesse acabado de pensar em algo.
— Ouvi dizer que anões podem flutuar, de vez em quando.
— Se tivermos vinho, não há nada que não possamos fazer. Vinho e boa comida!
Anão Xamã disse a mesma coisa de vários meses antes e sorriu.
— Se tiver vinho, não há nada que não possa fazer. Vinho e boa comida!
Tal como muitos grupos de aventureiros, eles foram criados na taverna. No
começo, contudo, era apenas três pessoas, e antes disso, apenas uma.
O vento soprava ao longo do canal, tornando o ar refrescante enquanto entrava
pela porta. Era o anoitecer, e a taverna da cidade da água estava viva com os sons
de vozes fazendo brindes.
— Mas, meu honorável tio! Não acha que é demais para pedir, mesmo ao seu
sobrinho?
Anão Xamã soou muito descontente. Ele cruzou os braços com firmeza e virou
as costas.
Em frente a ele estava um anão com mais músculos, mais barba e mais rugas do
que ele, bebendo cerveja com uma expressão fixa. No seu banco havia um
martelo de guerra bem-usado, juntamente com um gancho. Ele era um quebra-
escudos. O rosto sombrio do anão veterano, com o aroma da cerveja flutuando
na frente dele, mostrava com eloquência a seriedade da situação.
— Mesmo assim, escute. Nesse momento, você é o único quem posso chamar.
— Mas até mesmo para você, querido tio; simplesmente não há nada a se fazer
sobre isso. — Anão Xamã bebeu sua cerveja e fixou seu tio com os olhos meio
fechados.
O rosto do anão tinha ainda mais rugas do que antes, e estava começando a ficar
careca. Ele estava realmente envelhecendo. Era compreensível: um dos jovens
de sua tribo partira em busca de magia e agora estava agindo como um rufião.
Mesmo assim… isso!
— Ir em uma aventura com um elfo? — disse Anão Xamã. — Um escolhido
provavelmente pelo seu líder, rei, ou seja lá quem?
— Provavelmente.
— Alto, características chamativas, nobre demais; quase que uma beleza
reluzente, e, oh, tão frágil.
— Muito provavelmente.
— Ainda um orador elegante, um poeta excelente, e os deuses lhe deram o dom
de arquearia?
— Bem, ainda não os conheci…
— Baaah! — Absolutamente impossível, sem chance! Anão Xamã balançou as
mãos calejadas enfaticamente. Ele não estava brincando. — Não conseguiria
respirar junto de alguém assim. Eu morreria de asfixia!
— Ouça, seu egoísta…
— Disse que o mundo está em perigo? Estou mais do que disposta a ajudar…
mas não com um elfo!
Então aconteceu. Uma xícara veio girando pelo ar, jorrando vinho, e acertou a
parte de trás da cabeça do tio de Anão Xamã.
— Ei! Diga isso de novo!
De trás de seu tio, que agora estava de bruços na mesa e esfregando a cabeça,
veio uma voz clara e tonificada. Anão Xamã olhou para cima e viu uma elfa de
olhos afiados, com as mãos na cintura em uma postura imponente. Ela era de fato
delicada, esbelta e de aparência modesta; e ela usava um traje justo de caçador,
com as orelhas balançando energicamente. Alguém não teria adivinhado isso
pelo seu tom de voz, mas suas orelhas, mais longas do que as de outros elfos,
eram a prova de que ela era descendente dos antigos alto-elfos.
Esperando um combate, Anão Xamã agarrou seu machado, mais do que feliz em
participar, mas um felpubro com rosto de cachorro disse: — Eu vou dizer quantas
vezes você quiser!
A pelugem do felpubro era difícil de se dizer, mas a julgar pelo peito extenso,
provavelmente era uma mulher. E sua voz rouca, mas aguda, a fazia parecer que
fosse, em termos humanos, só uma adolescente. Provavelmente não uma
aventureira. Ela estava em boa forma física, seus movimentos eram precisos;
sinal de treinamento adequado. Uma soldada, muito provavelmente. Ela limpou
o vinho que escorria de sua cabeça e bufou.
— Elfos só ficam escondido em suas florestas, ignorando tudo e a todos… e
ainda por cima são avarentos!
— Vou te mostrar a verdade sobre os elfos!
Alta-Elfa Arqueira ronronou como um gato e se lançou contra a soldada com
cara de cachorro. A mesa caiu com o impacto, copos de vinho voaram e pratos
viraram. Os bêbados que se reuniam na taverna abriram caminho para a cena
familiar e começaram a fazer apostas.
— Meu dinheiro vai para a elfa. — Não, na felpubro. — Mas elfos são muito
frágeis. — É, mas felpubros são bastante estúpidos…
— …Que problemático. — Oof, essa doeu. Anão Xamã deu de ombros para seu
tio, que esfregava a cabeça e gemia.
— Bastante incomum, para um elfo.
— …Se importaria se teu companheiro fosse alguém como ela?
— Hmm, bom. Não creio que os alto-arrogantes do reino élfico escolheria
alguém tão imprudente…
Enquanto murmurava, Anão Xamã esticou a mão em um prato. Ele pegou uma
mão cheia de feijões secos, não obstante do vinho espirrado sobre eles, os
colocou na boca e mastigou ruidosamente.
Ao lado dele, seu tio deu um suspiro. — Eles já fizeram a sua escolha — disse
ele. — E escolheram ela.
— O que disse?
— Olhe para a descrição pessoal.
Seu tio pegou um pedaço de papel amassado de sua bolsa e entregou. Anão Xamã
o abriu com os dedos grossos e ágeis, depois segurou no alto e olhou para a luta.
— Ahh… essa tábua…?
Se os elfos altivos a escolheram, não havia razões para duvidar de suas
habilidades.
Os elfos eram ressentidos com os anões, mas ao mesmo tempo, eles odiavam
mais do que qualquer coisa que os anões se ressentiam com eles.
Mas essa é só uma garotinha, ou eu sou um barril.
Ela estava gritando insultos para a soldada com focinho de cachorro, as duas
puxavam o cabelo — e pelo — uma da outra. Os elfos não consideravam
exatamente a idade insignificante, mas ele se perguntava se ela tinha pelo menos
cem anos de idade.
— Ainda assim… — Com mais ou menos dez anos (ou cem), essa era a elfa que
iria ser sua companheira de viagem. — …Acho que quebraríamos alguma coisa
tentando tirá-la dessa luta.
Enquanto afagava a barba e considerava o que fazer, os olhos de Anão Xamã
foram atraídos para a porta da taverna.
Uma sombra enorme se aproximava.
Era enorme. Grande como uma rocha. Seus movimentos amplos eram tão
grandes quanto suas mandíbulas.
Mas então, de onde eram essas roupas? Ah, sim. Do sul nemoroso.
O homem-lagarto deu uma olhada no bafafá e revirou os olhos. Ele entrou na
taverna com um andar arrastado e foi para o balcão, alheio ao olhar dos que o
rodeavam. Ele não tentou se sentar na cadeira, talvez devido ao seu tamanho
enorme ou por causa da cauda que arrastava.
— Mil desculpas, mas gostaria de esperar por alguém. Como não sei quando
chegarão, talvez fique esperando por um tempo.
Sua voz era rígida como uma pedra. Era impressionante como a língua longa
dentro de suas mandíbulas exercia a língua comum tão facilmente.
— Uh, claro — disse o dono da taverna com um aceno desajeitado.
O lagarto respondeu “esplêndido”, também assentindo. — Aguardo um anão e
um elfo. Se algum de seus aventureiros se encaixar nessa descrição, talvez possa
me avisar.
Ouvindo isso, Anão Xamã olhou para seu tio, que disse calmamente: — Ouvi
que um homem-lagarto nos emprestaria sua força. — Parecia que ele mesmo não
conseguia acreditar nisso.
— Como agora, querido tio? Não conhece seu rosto?
— Mesmo que eles me dessem uma descrição, não conseguiria distinguir um
homem-lagarto de outro.
— Imagino que não.
Os homens-lagarto, que se proclamavam descendentes dos temíveis nagas que
saíram do mar, eram os guerreiros mais poderosos encontrados no mundo.
Eles eram oponentes que faziam o sangue gelar. Eles matavam seus inimigos,
massacravam, comiam seus corações. Alguns os desprezavam como bárbaros, e
havia de fato — então era dito — que alguns se aliavam com as forças do Caos.
Apesar disso, esse estava presumivelmente do lado da Ordem.
Mesmo assim…
— Ahh, e uma refeição, se puder fazer a gentileza. — O lagarto sacerdote
levantou o dedo escamoso. Ele continuou de pé no balcão; provavelmente a sua
cauda atrapalhou quando tentou se sentar. Quando seus olhos giraram e suas
mandíbulas abriram, sua observação pareceu alegre. — Lamentavelmente, eu
não trago dinheiro, por isso gostaria de retribuir com trabalho; lavando pratos ou
cortando lenha. Não se importa?
Anão Xamã riu de repente. Tomou um gole de vinho, bateu em sua barriga e deu
uma boa e bela risada. Ele riu até que o lagarto sacerdote virou seu longo pescoço
para olhar de uma forma estranha, e então o anão deu outro gole no vinho.
— Ei, Escamoso! — chamou ele o homem-lagarto. Ele tossiu, depois limpou o
vinho de sua barba com a mão. — Vê aquela garota orelhuda lutando ali? Pegue
ela pela nuca e traga até aqui, pode ser?
Anão Xamã riu tranquilamente, apontando para a elfa, que estava se balançando
em cima da felpubro, alheia aos acontecimentos ao seu redor. No momento, a
felpubro a pegou pelos cabelos e rolava com ela para uma nova posição. Mãos,
pés e unhas se moviam por todo o lugar. Sua dignidade élfica desaparecera. Ela
agora era apenas uma criança brigando.
— Faça isso e eu te recompensarei com todo o vinho e carne que quiser.
— Oh-ho! — A cauda de Lagarto Sacerdote acertou o chão com uma poderosa
bofetada. O dono da taverna franziu a testa; tal como o tio de Anão Xamã. —
Muito bem, então irei. Me considere agradecido. Ah, virtude gera virtude.
Imediatamente Lagarto Sacerdote, cauda e tudo mais, saltou para a luta com uma
velocidade que desmentia seu tamanho. Ao lado de Anão Xamã, sorrindo para a
anarquia na taverna, seu tio gemeu. Ele parecia ter uma dor de estômago. Nem
mesmo um bocado de vinho não parecia lhe fazer bem.
Por fim, o homem que fora um quebra-escudos no exército anão por mais de dez
anos, disse: — …Se me dá licença, voltarei para minha unidade. — Ele deixou
um punhado de peças de ouro na mesa e pulou instavelmente da cadeira
construída para a altura de um humano.
Ele não conseguia decidir se era sensato deixar o destino de sua raça nas mãos
desse grupo; incluindo seu sobrinho.
Oh, às ordens dos deuses…
Enquanto ele se afastava da taverna, a cabeço do velho quebra-escudos foi
preenchida com o som de dados rolando.
— …Quecêquer?
Seu cabelo estava bagunçado, suas roupas sujas, suas bochechas um pouco
inchadas, e ela estava de costas para ele com uma expressão de desgosto. Anão
Xamã acabou por dar um sorriso alegre com o primeiro som da boca da alta-elfa.
— Quem, eu? Pensei que podíamos falar de trabalho. — Ele sorriu e esfregou as
mãos grossas, fsh-fsh-fsh.
Se ela pudesse se sentar de frente para mim como uma adulta, eu poderia achar
que ela estivesse me ouvindo.
As brigas nessa taverna deveriam ser tão comuns quanto pão e manteiga, porque
o ambiente já havia relaxado de novo, e as conversas e brincadeiras voltaram à
vida.
A felpubro bastante machucada estava sentada em um canto, parecia infeliz e
estava rasgando um pedaço de carne. Com a luta sendo extinguida, os antigos
apostadores logo se acomodaram de volta.
— Hum. Nesse caso, tem algo de extrema importância que devo perguntar
primeiro.
A ordem restaurada na taverna foi em parte graças à rápida intervenção do
homem-lagarto, que agora usava um barril de vinho no lugar de uma cadeira.
Fora uma bela visão vê-lo pegar a elfa e a felpubro pela nuca e separá-las, mas
também foi um resultado que ninguém apostara. Assim, só o agente de apostas
teve lucro, e o rhea deu voltas pelo bar balançando alegremente seu vinho.
— E o que é, Escamoso?
Lagarto Sacerdote deu um “hmm” e acenou com a cabeça seriamente. —
Poderíamos talvez considerar nossas despesas com comida serem separadas da
recompensa nessa missão?
— Mas é claro — disse Anão Xamã dando um puxão em sua barba e sorrindo.
— Vamos mandar a conta para meu honorável tio.
— Agradeço imensamente — disse Lagarto Sacerdote, depois abriu amplamente
as mandíbulas e as enfiou em um pedaço de carne com osso que estava na mesa.
Alta-Elfa Arqueira observou eles, ainda estufando um pouco as bochechas. —
Então — murmurou ela — qual é o trabalho? Não que ainda não tenha ouvido o
básico.
— Ah, sim, sobre isso. — Anão Xamã assentiu, pegou um copo e bebeu. Então
usou o recipiente vazio para empurrar de lado alguns pratos e abrir espaço para
si. — Você sabe sobre a batalha que está acontecendo na Capital com o Senhor
Demônio ou seja lá o quê?
Foi uma pergunta retórica. Ele pegou um pergaminho de sua bolsa e abriu na
mesa. Fora desenhado com pigmentos de casca. A imagem abstrata, porém
precisa, o assinalava como um mapa élfico. Ele representava uma construção
antiga, bem no meio de uma terra devastada.
— Um conselho de guerra estava prestes a ser convocado, mas então descobriram
que havia um grupo de goblins vivendo bem atrás dela.
— Um ninho de goblin, não é assim que se chama?
— Sim, e um bastante grande também.
Aqui. Alta-Elfa Arqueira olhou para onde Anão Xamã estava apontando e
pestanejou. Ela olhou para o símbolo no antigo edifício no meio da terra
devastada, depois para a floresta enorme não muito longe dela.
— Ei… essa é a minha casa!
— Hm. Isso explicaria por que você está aqui…
Lagarto Sacerdote mordiscou mais carne do osso, mastigou várias vezes e
engoliu antes de falar.
— …É isso que chamam de política?
— Sim. — Anão Xamã assentiu com firmeza. Bem, isso era uma bela confusão.
Um dos seus membros estava aqui para satisfazer a honra de alguém. Ele sentia
problemas à frente. — Meu tio pode pensar que é insensato, mas não podemos
deixar os humanos sentados enquanto nossos exércitos são os únicos que se
mobilizam.
— E nem rheas e felpubros?
As orelhas de Alta-Elfa Arqueira se contraíram com a menção do povo fera. A
soldada com rosto de cachorro que ela estivera brigando fora subjugada por um
oficial superior que veio correndo. Enquanto o oficial puxava o rosto grande da
soldada, a elfa se perguntava se tal tratamento era uma ocorrência diária, ou se o
povo cachorro simplesmente, pela sua natureza, achava difícil ir contra seus
superiores.
Em todo o caso, a cidade da água era uma cidade linda, mas eles não se sentiam
ameaçados.
— Acho que não podemos esperar mais do que alguns voluntários deles.
Havia rheas individuais de grande coragem, mas isso não se estendia aos seus
clãs ou seus administradores. No fundo, eles adoravam a paz e a tranquilidade, e
não tinham qualquer interesse em nada que não dissesse respeito a sua terra natal
diretamente.
Os felpubros eram felpubros; eles eram tão diversificados que era difícil unir
todos eles rapidamente atrás de qualquer causa. Quando se juntavam,
dependendo de qual tribo assumia a liderança, as coisas podiam dar muito bem
ou muito mal. Isso era verdade mesmo quanto ao despertar do Senhor Demônio
e a guerra posterior contra todos os que possuíam palavras do continente. Claro,
se o perigo aumentasse demais, eles iriam se unir e se insurgiriam por si
mesmos…
— Nosso outro problema é: precisamos que um humano se junte a nós.
— Ah! Conheço um muito bom. — Alta-Elfa Arqueira tirou os olhos do mapa.
Ela esticou seu dedo indicador longo e fino, fazendo um círculo no ar. — Ele se
chama Orcbolg. Um guerreiro que mata goblins na fronteira.
— O que, você quer dizer Corta-barba?
— Correto. Vocês anões podem não saber, mas nesse momento, há uma canção
muito popular sobre ele se espalhando.
Ela na verdade não sabia se a canção era popular ou não, mas ela precisava de
uma chance para parecer inteligente.
O Rei Goblin perdeu a cabeça para um Golpe Crítico dos mais terríveis!
Um azul escaldante, o aço de Matador de Goblins cintila no fogo.
Assim, o plano repugnante do Rei chegava ao seu fim apropriado, e a adorável
princesa alcançou seu salvador, seu amigo.
Mas ele é Matador de Goblins! Em nenhum lugar ele permanece, mas jurou
vagar, não deve ter outro ao seu lado.
Fora apenas o ar ao seu alcance que a grata donzela encontrou… o herói tinha
partido, sim, sem olhar para trás.
Quando terminou de cantarolar a melodia, ela fez um barulho orgulhosa e estufou
o pequeno peito.
— Você não sabe porque estava vivendo literalmente em uma caverna. Isso é
anões para você.
— Uma coisa boa para dizer vindo de alguém que fica escondido em sua floresta.
Anão Xamã lhe deu um olhar austero enquanto ela balançava as orelhas de
autossatisfação.
Suponho que apenas metade dessa canção é verdade. Esse sempre era o melhor
parecer a se ter sobre as melodias de um bardo.
— Mas, ahh, ahem.
Essa elfa de orelhas longas deveria ser uma patrulheira ou uma batedora. O
homem-lagarto era um sacerdote… uma espécie de monge-guerreiro, muito
provavelmente. Ele mesmo sabia magia, é claro, e ele também entendia de como
manejar uma arma. Mas eles não tinham combatentes o suficiente.
Ele não podia ter certeza até que visse o homem, mas esse era alguém que tinha
uma música escrita sobre ele. Era razoável presumir que ele tivesse uma boa
quantidade de habilidade.
— …Está bom o bastante.
— A recompensa será dividida igualmente, então. Também estamos acordados
em assumir que meu senhor Matador de Goblins se juntará a nós?
Lagarto Sacerdote olhou revirando os olhos para o grupo. Tanto Anão Xamã
quanto Alta-Elfa Arqueira concordaram.
Com isso, o homem-lagarto disse “então vamos planejar” e tocou a ponta do
nariz com a língua.
— Primeiro essa cidade — disse Anão Xamã, lançando os olhos no mapa. — Em
que cidade disse que ele estava?
— Bem, hum, eu perguntei ao bardo, e… — O dedo pálido de Alta-Elfa Arqueira
passou pelo mapa élfico. Por fim, ela encontrou a cidade fronteiriça, e bateu no
local com a unha bem-cuidada. — Talvez por aqui?
— Isso não está muito longe. Porém… mesmo assim. — Lagarto Sacerdote
parecia extremamente sério enquanto olhava o mapa. — Estamos à procura de
frustrar os planos de nosso inimigo. Creio que possamos assumir que isso
provocará uma retaliação.
— Hum? Podemos ser atacados no meio de uma aventurar, você quer dizer?
— Vamos resolver isso agora para evitar essa possibilidade. Antes que eles
tenham a chance de consolidar suas forças.
— Deixe tudo conosco! — Bop. Alta-Elfa Arqueira formou um punho e bateu
com fervor em seu pequeno peito. — O destino do mundo está por um fio? É aí
que os aventureiros fazem o seu melhor!
— Ei, então — disse Anão Xamã, arregalando os olhos. — Sabe que isso não é
uma brincadeira, não é?
— Claro que sim. Eu não sei quanto aos anões, mas os elfos sempre usaram seus
arcos para manter o mundo seguro.
— Oh-ho. Não me diga. — Os olhos do conjurador se alargaram só um pouco;
ele deu um puxão na abarba e suspirou. — Então esse seu peito de tábua não
interfere em nada quando atira de arco?
— Tábua?
— É rígido… e liso.
— Ora, seu…!
A vergonha e a raiva enviaram sangue para as bochechas da arqueira. Houve um
barulho quando ela se levantou da cadeira e colocou as mãos na mesa enquanto
se inclinava.
— Mas que coragem! Isso quando vocês anões… uhh, hum… — Ela ficou ali,
com sua boca abrindo e fechando. Suas orelhas balançavam para cima e para
baixo, e a ponta de seu dedo traçou um caminho sem objetivo no ar. — C-certo!
Essas barrigas! Seus estômagos fariam um tambor parecer pequeno!
— Quero que saiba que dizemos que é ser solidamente constituído! Um anão
prefere esse tipo de corpo… — Anão Xamã se cortou sugestivamente, depois
olhou de soslaio para a elfa. — …Independentemente do que vocês elfos devam
gostar.
Alta-Elfa Arqueira não poderia deixar de notar o olhar em seu peito. Ela cruzou
os braços bufando deliberadamente, deixando seu desgosto evidente.
— Sempre soube que anões tinham um sendo de beleza distorcido!
— Quem é que vem comprar os nossos trabalhos em metal? Ah, certo. Elfos.
— E daí?!
E eles começaram a discutir. As outras pessoas na taverna observaram essa
rivalidade antiga entre as raças desenrolar diante de seus olhos. Mas, a atmosfera
logo mudou. Brigas e discussões vendiam às dúzias.
— Cinco pratas no anão!
— Uma peça de ouro na elfa!
— Vamos, garota!
— Espanque bem ela, velhote!
Lagarto Sacerdote balançou a cabeça e suspirou. Depois deu um grande sibilo.
Com o sentimento avassalador de um réptil na caça, os dois aventureiros calaram
a boca. Lagarto Sacerdote assentiu.
— Hm.
Ótimo.
A carruagem deixou o portão, envolto pela noite. A essa hora, ninguém além de
aventureiros teriam achado mais seguro viajar em uma caravana ou algo
parecido. Mas os três não tinham tempo, e eles foram forçados de mais de uma
forma.
O veículo que estavam não era um muito bom, era apenas um de carga
ligeiramente modificado. E o cavalo era apenas mediano… bem, talvez um
pouco abaixo da média. Anão Xamã e Lagarto Sacerdote tinham as rédeas. Alta-
Elfa Arqueira estava observando o céu, com seu arco preparado.
Viajar de carruagem significava ir mais rápido do que uma pessoa podia andar,
mas mais lento do que um cavalo podia correr. Anão Xamã não estava satisfeito
com essa situação. Ele queria ter obtido a melhor carona e o melhor cavalo
possível, para não falar do condutor. Mas os fundos que recebera de seu tio eram
limitados, assim como o tempo. Ele foi obrigado a ceder.
— E ainda por cima temos que ir devagar. Que desgraça.
— Tenha em mente que não temos o luxo de mudar de cavalo em um dos postos
intermediários. — Sentado ao lado dele no assento do condutor, Lagarto
Sacerdote respondeu o comentário cauteloso de Anão Xamã. — E se considerar
o problema que teríamos se corrêssemos e assim atraíssemos atenção indesejada,
dessa forma é de fato mais rápida.
— Atenção indesejada? — Alta-Elfa Arqueira inclinou a cabeça, agitando a
ponta de suas orelhas em direção ao assento do cocheiro.
— Bandidos ou salteadores, suponho.
— Certo…
Seu rosto franziu com a resposta, como se achasse isso muito desagradável. Anão
Xamã captou a demonstração clara de emoção com sua visão periférica e fez um
som de aborrecimento.
— Estivemos bem de alguma forma na cidade, pelos auspícios daquela adorável
senhora, mas agora estamos em campos aberto.
— Assim que nos afastarmos do santuário do Deus Supremo, pode ser só uma
questão de tempo até que algum espírito mau decida atacar — disse Lagarto
Sacerdote.
— Está falando daquilo que chamam de benção de deus? Nosso deus da ferraria
e do aço só é bom para encorajar em batalha… — Não obstante, Anão Xamã
murmurou uma oração ao grande deus Krome. Ele soltou os ombros e balançou
a cabeça, dizendo sem malícia: — Preciso ao menos rezar para que a nossa elfa
não perca a coragem quando for preciso.
— Hum…! — As orelhas da elfa dificilmente poderia deixar passar esse
comentário desagradável. — Apenas veja! Você vai se curvar para me agradecer
quando isso acabar!
— Ahh, claro. Não posso dizer que estou muito esperançoso. — Ele agitou sua
mão aberta. Alta-Elfa Arqueira bufou furiosa e rolou de costas. Anão Xamã
apanhou a dica dela, olhando para o céu. Estava cheio de estrelas e com as duas
luas. As estrelas brilhavam como se alguém tivesse espalhado joias preciosas
sobre o veludo preto. As luas brilhavam como um par de olhos, verdes e frios.
Talvez fosse o verão que se aproximava que dava ao ar sua lentura incomum e
fazia difícil respirar.
— Eu poderia fazer com facilidade… — murmurou Alta-Elfa Arqueira. Anão
Xamã sentia o mesmo, embora não tenha dito nada.
Seu grupo chegou a um pedaço abandonado de terra que parecia alguma vez ter
sido uma aldeia. A estrutura sombria das casas sob a luz da lua lançava sombras
repulsivas nas ruas. Esse cadáver em forma de aldeia se tornara ermo, deixado à
proliferação; teria parecido desolada mesmo à luz do dia. Mas agora, à noite, não
seria surpreendente encontrar fantasmas ou carniçais ali…
— Hr-ah?
Alta-Elfa Arqueira fez um som estranho. Ela olhou sobre os ombros, com seu
nariz cocegando.
— O que foi agora? Parou para cheirar as flores ou algo assim? Hã?
— Ah, pare. Há um cheiro estranho… — Ela balançou a mão na frente do nariz,
lançando uma olhadela ao redor da área com uma expressão de profunda
suspeita. — É… meio forte e meio irritadiço… E posso sentir embora não haja
vento algum.
— …Enxofre, muito provavelmente.
— Isso é enxofre?
— Algum tipo de vapor misturado com enxofre, para ser mais preciso.
O que isso significava não passou por eles. Eles se calaram e engoliram em seco
coletivamente. A elfa olhou para cima, com uma expressão preocupada no rosto.
— Em cima de nós!
Parecia mais como uma máquina do que um ser vivo, com carne na forma de um
inseto artificial. Seu corpo era vermelho, e a cabeça pontuda como se estivesse
usando um chapéu. Algo vermelho.
Ele batia asas que lembravam as de morcegos, e garras curvas e cruéis eram
visíveis em suas mãos.
Um demônio inferior. E havia dois deles. Isso foi um encontro aleatório.
— Eles estão vindo?! — gritou Anão Xamã, chicoteando com as rédeas e
instando o cavalo a seguir. O animal relinchou, tendo sentido coisas que não
eram desse mundo. As rodas da carruagem começaram a girar a sério quando o
cavalo partiu com toda força.
— Faça ele ir mais rápido…! Não, me dê as rédeas. Você prepara suas magias!
— Todas sua!
Praticamente jogando as rédeas em Lagarto Sacerdote, Anão Xamã se virou no
seu assento. Ele foi cuidadoso, é claro, para segurar firme a alça de sua bolsa de
catalisadores em seu ombro para que não voasse.
— Não podemos fugir? — disse Alta-Elfa Arqueira, lambendo os lábios
enquanto seu arco lançava flecha atrás de outra.
— Não sei quanto a isso, mas… — disse Anão Xamã.
— Não podemos arriscar da informação escapar — disse Lagarto Sacerdote
acenando com a cabeça tão calmamente quanto se estivesse preparando jantar.
— Temos que matá-los.
Os demônios pareciam ter a mesma ideia. Com uma rajada de ar, um deles
mergulhou na carruagem. Enquanto alguém gritava que a iniciativa fora tomada,
houve uma colisão, e lascas de madeira voaram.
O demônio atingira a carruagem por trás, com suas garras tão mortais quanto
qualquer arma.
— Ergh! Pfah! — Anão Xamã retirou pedaços da carruagem de sua barba e
berrou: — Se você destruir essa coisa, nós seremos aqueles que arcaram com a
culpa!
— Vou cuidar da segurança do cavalo, então, se fizer a gentileza… — respondeu
Lagarto Sacerdote.
O próximo ataque veio do céu enquanto conversavam.
Um mergulho veloz, com as asas dobradas. Alta-Elfa Arqueira franziu a testa; a
criatura estava com uma lua nas costas. Suas orelhas tremeram, e ela puxou a
corda.
— Seu estúpido, fedorento…!
— AAARREMMEERRRR?!?!
Um grito de outro mundo se seguiu. Alta-Elfa Arqueira não perderia a chance
para disparar. O demônio, agora com sua mão pregada no transporte pela flecha,
se contorceu, destruindo a madeira com as garras.
— Isso vai te mostrar!
A última coisa que o demônio viu foi uma elfa puxando o arco bem na sua frente,
com a flecha com a ponta de broto.
A corda fez um som que seria apropriado a um instrumento musical de alta
qualidade; ela lançou a flecha no globo ocular do demônio e através de seu
cérebro. O pescoço da criatura quebrou para trás com a força do golpe. O cadáver
pendeu flacidamente, raspando pelo chão. Alta-Elfa Arqueira deu um sorriso de
apreço pelo trabalho feito. — Esse já era!
— Bom trabalho! Mas como ele é uma espécie de fardo, talvez você pudesse
soltá-lo de nossa carruagem?
— Sim, claro… guh, o quê?
No espaço de alguns instantes, vários fios de cabelo de Alta-Elfa Arqueira foram
apanhados por uma garra e lançados dançando pelo ar. O monstro que viera
correndo desferiu uma pancada em sua nuca. Alta-Elfa Arqueira parou,
tremendo, ainda segurando a haste da flecha que puxara. Ao mesmo tempo, o
demônio morto deslizou no chão, quicando com um baque.
— Teve um pequeno susto aí?
— Não estou com medo, estou com raiva!
Ela se enfureceu com a provocação de Anão Xamã, que estava com a mão
preparada na bolsa de catalisadores o tempo todo, depois olhou para o céu. Com
um corpo de demônio a menos a bordo, a velocidade estava aumentando de novo;
mas não seria páreo para uma criatura com asas.
— Ei, anão! — gritou Alta-Elfa Arqueira sem tirar os olhos do céu. — Você não
pode usar uma magia para derrubá-lo ou algo assim?
— Acho que poderia, de certa forma… — Ele fechou um dos olhos e olhou para
cima, avaliando a velocidade e a distância entre ele e o inimigo. A cortina da
noite era impotente face a luz das luas e das estrelas, e, de qualquer forma, anões
podiam ver com facilidade pela escuridão. — É só que se eu o derrubar com uma
magia, ele simplesmente se ergueria de novo.
— O quê?! Mas que conjurador! Estúpido, anão estúpido!
— Ah, para de chorar — disse friamente Anão Xamã, franzindo a testa. — Eles
não se movem com as mesmas leis que nós. Aço e ferro são as formas de lidar
com eles.
— Fisicamente, você quer dizer. Muito bem dito! — Segurando as rédeas,
Lagarto Sacerdote curvou suas imensas mandíbulas em um sorriso que lembrava
tanto quanto o de um tubarão. Ele pareceu fazer alguns cálculos rápidos, depois
assentiu com satisfação. — Mestre conjurador, você disse que pode derrubá-lo?
— Acho que sim — assentiu Anão Xamã. — Embora não por muito tempo.
— Então mestra patrulheira, finja gentilmente que vai dar um belo disparo…
— Consigo fazer!
Sem esperar ouvir o resto do plano, Alta-Elfa Arqueira lançou uma flecha na
noite. Era potente como magia, uma flecha que só um elfo podia disparar, mas o
demônio ziguezagueou agilmente do caminho.
— Ah, droga! — Alta-Elfa Arqueira estalou a língua e ajeitou uma nova flecha
no arco, puxando a corda.
— Bem, então — disse Lagarto Sacerdote, puxando as rédeas para retardar o
cavalo. — Talvez possa fazer a gentileza de perfurá-lo com uma flecha com uma
corda amarrada?
— Uma flecha com uma corda amarrada…?! — Alta-Elfa Arqueira pegou a
corda que fora jogada na plataforma de carga, com o rosto inexpressivo enquanto
olhava para o inimigo. O monstro de pele vermelha continuou batendo as asas,
procurando a sua oportunidade para ir até eles. — Beleza, vou fazer!
Tão logo falou e já começou a amarar a corda na flecha. Os dedos da elfa não
tiveram problemas, mesmo em cima de uma carruagem agitada. Ela manteve
seus olhos e ouvidos no oponente, com suas mãos se movendo como se houvesse
outra pessoa as controlando. Sua expressão relaxou. — Você parece um general
ou algo parecido — disse ela.
— Você é muito gentil. — Lagarto Sacerdote balançou bem sua cabeça. — Se
quiser me comparar com alguma coisa, sou como a pena de uma flecha. Só defino
a direção, eu não… — Antes de continuar, sua língua saiu e tocou a ponta do
nariz. — Hm — disse ele por um tempo. — Para ter uma unidade funcional, é
preciso juntar uma ponta de flecha, uma haste, uma pena, um arco e um arqueiro.
Ahh. Alta-Elfa Arqueira sorriu ligeiramente. Essa era uma metáfora que ela
podia entender. — Me pergunto se isso me faria a ponta… Vamos, anão, tenha
certeza de que a magia acerte o alvo!
— Hmph! Já estou farto de te ouvir!
Quando Anão Xamã retorquiu para Alta-Elfa Arqueira e colocou o inimigo no
campo de visão, ele viu algo: uma única luz vermelha no céu. Estava ardendo na
boca grande e aberta do demônio…
— Seta de Fogo vindo!
— Ahh, agora! — disse Lagarto Sacerdote com alegria sincera, dando uma
sacudida forte nas rédeas. O cavalo deu um relincho horrível de confusão e medo,
e a carruagem guinou em uma nova direção, rangendo o tempo todo.
Segundos depois, um feixe de fogo atingiu o lugar onde a carruagem estaria, com
brasa voando pelo céu. A luz brilhante iluminou o semblante terrível de Lagarto
Sacerdote.
— Ha-ha-ha-ha-ha-ha-haaaa! Agora as coisas ficaram interessantes!
— Acho que você confundiu nossa carruagem com uma biga, Escamoso!
— De fato — respondeu o lagarto, provocando um “maluco…” de Anão Xamã
enquanto olhava para o céu.
O demônio vermelho parecia se preparar para outro mergulho, agora que eles
evadiram sua seta de fogo, marca registrada.
Acha que vai ser assim tão fácil, é?
Anão Xamã berrou para a sombra que ficava cada vez maior:
— Pixies, pixies, rápido e depressa! Sem doces para vocês, travessuras é o que
preciso!
Palavras cheias de verdadeiro poder para dobrar a realidade jorraram, e o círculo
mágico apanhou em cheio o demônio.
Normalmente, a criatura nunca deveria ser capaz de escapar dos grilhões da
gravidade, não importando quanto batesse suas asas. Demônios inferiores ainda
eram demônios; esses monstros viviam para distorcer a ordem natural.
— ARREMERRRERRRR!!
O demônio, que caiu na terra, uivou e bateu as asas vigorosamente, quebrando
os vínculos mágicos que o segurava. Ele teria a sua vingança contra aquele anão,
aquele homem-lagarto e aquela elfa. Só de pensar no sangue de um antigo alto-
elfo, o cheiro de seu fígado, era o suficiente para atiçar a ganância básica da
criatura.
— Tome isso!
Foi uma flecha daquela mesma elfa que pôs um fim agonizante nessa ganância.
Ela se inclinara, se apoiando na beirada da carruagem, e disparou uma única
flecha ponta-broto implacável no monstro.
— AREEERM?!
Se debatendo de tormento, o demônio foi um pouco lento em notar a corda
amarrada à flecha. E esse foi o tempo necessário que a carruagem precisou para
ganhar velocidade e puxar a corda tensa.
Um rugido horrível de desespero, o suficiente para fazer o sangue gelar, ecoou
pela planície.
O demônio estava longe de imaginar que seria arrastado pelo chão atrás da
carruagem. Havia uma certa pena dele enquanto quicava, contida pelo grupo
enquanto ele se bagunçava na terra e tentava voar desesperadamente.
Demônios inferiores ainda eram fortes. Se o trio não conseguisse controlar a
posição dele, ele poderia rapidamente fincar as garras na terra, e se ele se
levantasse, seria apenas questão de pouco tempo para estar no ar. E uma vez no
ar, seria perigoso.
— E agora?! — gritou Alta-Elfa Arqueira, pegando outra flecha de sua aljava.
Lagarto Sacerdote se levantou com facilidade. — Daremos o golpe final, é claro.
— Ele segurou um dos seus catalisadores, uma presa, entre as palmas. — Ó asas
falciformes de velociraptor, rasgue e dilacere, voe e cace! — Uma grande
Garraespada surgiu e então se modelou em suas mãos.
— E o cavalo?! — Mas quando Alta-Elfa Arqueira olhou para trás, ela viu um
Guerreiro Dragãodente agarrando firmemente as rédeas.
— Espera um pouco, Escamoso — disse Anão Xamã, com os olhos se
arregalando. — Que história é essa de golpe final? V-você não vai…
— Pular? Não seja tolo. — Lagarto Sacerdote balançou a cabeça com um
movimento considerável. — Isso seria ridículo.
Nos próximos instantes, a carruagem chiou quando Lagarto Sacerdote saltou no
demônio inferior.
— Ó temíveis nagas! Observem minhas ações, meus antepassados!
— AREEERMEER?!?!
Garra, garra, presa, cauda. Ele golpeou, cortou e rasgou o demônio enquanto ele
se esforçava para resistir. A criatura abriu suas mandíbulas para liberar uma seta
de fogo, mas Lagarto Sacerdote uivou… — Grrrryaaahhh! — …e visou um chute
direto em sua garganta, esmagando sua traqueia. E então sua Garraespada
alcançou a cabeça do demônio, a cortando sem esforço.
A cabeça rolou pelo chão e desapareceu na grama. O resto do corpo, ainda preso
à carruagem, traçava um jato de sangue roxo-azulado. Lagarto Sacerdote, em
cima do cadáver, estava bastante calmo apesar da quantidade crescente de sangue
o cobrindo; ele ergueu a cabeça alegremente.
— Ahh, eu fiz por merecer o mérito desse dia.
O sol começara a espreitar atrás do horizonte, e seus raios cobriram Lagarto
Sacerdote com uma atmosfera indescritível.
— Olhe para isso. Não tínhamos concordado secretamente que não íamos contra
ele?
— Ah, mas de vez em quando meu sangue ferve. — Depois da resposta simples
de Lagarto Sacerdote, ele ergueu alegremente um naco de queijo com as duas
mãos. Ele abriu a boca e a rasgou, com cada mordida acompanhada por um brado
de “doce néctar!” e um bofetada com a cauda no chão. — Porque sou uma
criatura de sangue quente, sabe.
— Suas piadas nunca fazem qualquer sentido para mim — resmungou Anão
Xamã. Ele ergueu as mãos em resignação, mas também para sinalizar a garçonete
que ele queria mais cerveja. Quando bebendo com amigos, Anão Xamã achava
que estava sendo apenas educado ao encher seu barril tanto quanto podia.
— Então estamos todos juntos?
— Não entendi o que quer dizer.
— Sua flecha. Flecha e arco.
— Ahh. — Lagarto Sacerdote engoliu o pedaço de queijo bem-mastigado com
um glub e lambeu os restos em seus lábios. — A ponta da flecha é a nossa
patrulheira, a haste que nos mantém unidos é você, mestre conjurador, e eu sou
a pena…
— …O arco é aquela garota, e Corta-barba seria o arqueiro… estou certo?
— Isso mesmo.
Anão Xamã pegou a cerveja que a garçonete lhe trouxe, observando de soslaio
Lagarto Sacerdote assentir. Ele levou o copo transbordando até a boca e tomou
um golinho, depois bebeu tudo em um único gole.
— Por mais renomado que seja um arqueiro, se ele dispara apenas para o céu,
ele se machucará um dia.
— Então, de novo, se nós não caçarmos nada além de goblins, isso é bom ou
ruim? — Anão Xamã, com o rosto vermelho, soltou um arroto e passou a mão
em sua barba para limpar alguns pingos.
— Qualquer que seja o caso… — começou Lagarto Sacerdote.
— De fato, em todo o caso — subscreveu Anão Xamã.
— É um bom grupo.
— Sem queixas.
Lagarto Sacerdote sorriu com suas mandíbulas grandes, e Anão Xamã deu uma
gargalhada estrondosa. Os dois pegaram os copos frescos que foram trazidos a
eles, e os tocaram.
— Aos bons amigos.
— Aos bons companheiros de batalha.
— Às boas aventuras!
Ouça, ouça! No momento em que os copos foram erguidos três vezes, eles
estavam vazios.
Quantas vezes nos encontramos, e separamos?
Alguns desaparecem, em cinzas, como devemos
Com a esperança de reencontro, cada jornada começa
Como virar uma página que está se transformando em pó
Lembra da lenda que treinou durante anos?
Qual era seu nome? Agora não me lembro
Você percebe tarde demais, agora ele já se foi
E apesar de nossas despedidas e encontros, todavia
Cada um desses encontros é único, e isso é tudo.
Assim a noite sucedeu para os aventureiros.
Capítulo 10: De Ir Lá e de
Voltar Outra Vez

A noite estava chegando quando a carruagem compartilhada parou. O sol se


pondo lançava seus últimos raios vermelhos, e o mundo foi pintado de roxo junto
as marcas da escuridão. A sombra alongada do veículo se fundia com as grandes
e distorcidas silhuetas da cidade, criando figuras bizarras e caricatas.
Quando ouviu as crianças correndo para a casa ao longe, Matador de Goblins
relaxou. Ele não entendia por que seus músculos ficaram tão tensos na
carruagem, embora tudo o que fez foi cavalgar. Ele estava completamente
consciente, mas seu corpo parecia pesado, sua cabeça confusa e seus passos
incertos e leve.
Acho que esse é o momento, decidiu ele, fechando os olhos durante alguns
segundos para aliviar a dor maçante neles. Ele recordou de ouvir em algum lugar,
uma vez, que humanos só podiam lutar continuamente por no máximo vinte dias.
Sem descanso, mais do que isso iria provavelmente degradar suas capacidades
de diversas formas.
Matador de Goblins não era tão otimista de supor que ele poderia aguentar tanto
tempo.
Ele partiu com um passo audaz, rumando direto para o edifício que assomava
próximo ao portão principal: a Guilda. Ele faria seu relatório, pegaria a
recompensa, examinaria seu equipamento, descansaria um pouco, e então sairia
de novo para matar goblins.
Era exatamente a mesma rotina que sempre seguia. Nunca mudou. Não poderia.
Mas, quando ele foi abrir a porta da Guilda…
— Oh!
— Minha… nossa.
Ela abriu do outro lado, e ele quase acabou esbarrando em um homem e uma
mulher saindo. O homem recuou alguns passos quando confrontado com o
capacete de aço coberto de manchas carmesins. Sua companheira avantajada
apenas parou com seu cajado preparado e seus lábios arqueados elegantemente.
— Caramba, parceiro — disse Lanceiro com uma expressão tremendamente
cansada. — Tem que parar de andar por aí com esse capacete.
— Eu te assustei?
— Não mais que o normal!
— Sabia… que você… parece uma… armadura viva, não é?
Os risinhos de Bruxa pareceram fazer o perplexo Lanceiro ainda mais furioso.
Matador de Goblins virou seu capacete de um lado para o outro, os observando
despreocupado. Lanceiro estava equipado com sua armadura e a sua amada
lança, com uma mochila pendurada na ponta. Quanto a Bruxa, ela usava seu traje
habitual e segurava seu cajado usual. Ela também carregava um recipiente
cilíndrico com um pergaminho. Era perfeitamente óbvio onde os dois estavam
indo.
— Partindo em uma aventura?
— Sim. — Os olhos de Bruxa, agraciado por cílios longos, entrecerrou um
pouco. — Um encontro… se preferir.
— E suponho que você tem andando exterminando goblins?
— Sim — assentiu Matador de Goblins. — Acabei de terminar.
— Tsc. Claro — murmurou Lanceiro, então abriu a boca para dizer mais alguma
coisa. Mas uma expressão que era difícil de descrever passou pelo seu rosto; ele
olhou do capacete para a Guilda e voltou de novo, depois fechou a boca sem
dizer nada.
Matador de Goblins abriu a porta, dando espaço para passar uma pessoa. Depois
de um momento de reflexão, pensando que deveria dizer algo, ele disse: —
Tenham cuidado.
— Você é a última pessoa de quem quero ouvir isso.
Lanceiro bateu com o punho no ombro de Matador de Goblins enquanto passava.
Ele já estava começando a andar quando Matador de Goblins olhou para o ombro
com um pouco de perplexidade. Quando ele olhou para cima de novo, viu Bruxa
dando a ele um sorriso estranhamente significativo antes de sair, balançando os
quadris.
— …Hmm.
Matador de Goblins inclinou a cabeça ligeiramente, deixando a porta entreaberta.
Ela rangeu quando fechou, e então ele abriu de novo, por si mesmo dessa vez.
Os gritos entusiasmados no edifício o envolveram. Um grupo estava agrupado
na recepção, tentando apresentar um relatório sobre sua aventura. Um outro
olhava o quadro de avisos, à procura de uma missão que podiam começar de
imediato. Algumas pessoas estavam no bar, aproveitando um dia de folga,
enquanto outros estavam ansiosos para pegar novas aventuras. Era barulhento,
era rude e o lugar todo ressoava com o som de armas, equipamentos e vozes.
Matador de Goblins examinou rapidamente o local desde a entrada, então
caminhou até a área de espera livre. Ele podia ver que Garota da Guilda estava
ocupado no momento ajudando outros aventureiros. Sua cabeça balançou em
resposta à sua pequena saudação, e ele foi para o banco.
— Oh!
— Ah!
Isso provocou um par de exclamações incoerentes dos arredores. Ele se virou
para olhar e viu um jovem e uma jovem que pareciam completamente exaustos.
Era Guerreiro Novato e Sacerdotisa Aprendiz. Talvez tivessem tido uma luta de
água, pois o cabelo deles estavam úmidos e ensopados. Ao mesmo tempo, havia
uma pitada de entusiasmo em seus rostos, muito provavelmente o prazer de um
trabalho feito.
Uma clava estava pendurada ao lado da espada na cintura do garoto. Estava sujo
e bem usado, e havia uma alça de corda no cabo. Matador de Goblins inclinou o
capacete bem ligeiramente.
— Então você está usando.
— …Oh, hum, é. — Guerreiro Novato se moveu desconfortavelmente, então deu
um tapa na clava suavemente. — É bastante boa.
— É mesmo? — disse Matador de Goblins assentindo.
Guerreiro Novato coçou a bochecha de uma forma que sugeria indecisão, depois
disse: — Estive pensando…
—…
— Talvez dê o nome de Esmagador.
— Entendi.
— Ei — disse Sacerdotisa Aprendiz, dando ao jovem guerreiro um golpe com o
cotovelo. — Esse nome é vergonhoso.
Guerreiro Novato resmungou, mas não recuou. — É, mas…
Matador de Goblins olhou de um para o outro quando começaram discutir, então
se levantou.
O grupo na frente de Garota da Guilda fora embora.
Matador de Goblins ficou em silêncio por alguns instantes, mas antes que ele
começasse a se mover, murmurou: — Não é nada mau.
A argumentação deles parou em um instante. O garoto e a garota ficaram
boquiabertos para o capacete de aço medíocre, como se não conseguissem
acreditar no que acabaram de ouvir. O capacete inclinou um pouco para olhara
para eles.
— Não serve para arremessar, mas essa corda é engenhosa — continuou a voz
sossegada. — Talvez eu tente isso.
Os dois aventureiros jovens se viraram para olharem um para o outro enquanto
Matador de Goblins virava as costas para eles e partia.
Na recepção, Garota da Guilda, que acabou os afazeres com os outros
aventureiros, endireitava um maço de papéis. Quando viu o elmo de aço sujo, ela
deu um sorriso brilhante.
— Bem-vindo de volta, Sr. Matador de Goblins!
— Obrigado. — A cadeira rangeu sob seu peso quando ele se sentou, e então ele
observou rapidamente alguns objetos estranhos na mesa. Eram bonecos
pequenos o bastante para caberem na palma da mão; não, era um grupo de cinco
ou seis peões em forma de aventureiros.
— Oh, esses? — Garota da Guilda não conseguiu segurar um riso quando tocou
um deles com a ponta do dedo. Parecia ser um guerreiro com armadura leve. Ele
estava com um pequeno escudo e espada, e ela o colocou gentilmente na mão.
— Os encontrei outro dia… Eles só são peças de jogo, mas me senti um pouco
mal os colocando em qualquer lugar.
— É mesmo? — Ela assentiu para ele e pôs o boneco de volta no lugar. Um
batedor levemente armadurado, um cavaleiro com um capacete de aço, um elfo
feiticeiro, um guerreiro anão e um monge velho.
— Isso é… um grupo?
— Sim. Aventureiros que partiram para fechar o portão da tumba que leva ao
inferno. Não que eles já tiveram conseguido… — ela coçou a bochecha.
— Está bem balanceado — disse ele.
— Sim. É um grupo muito bom. — Ela falou sobre sua aventura como se tivesse
realmente acontecido. Como elas encontraram a entrada do túmulo, lutou com
um monstro guardião de verde e o labirinto terrível…
Matador de Goblins ouviu em silêncio, até que Garota da Guilda voltou a si
mesma com um susto.
— M-me desculpe! Eu fiquei todo esse tempo…
— Não se preocupe — disse Matador de Goblins balançando a cabeça. — É bem
interessante.
— É? — Garota da Guilda inclinou a cabeça, balançando ligeiramente as tranças.
Então ela tossiu um pouco. Ela lhe ofereceu uma xícara de chá que preparara e
se acomodou de novo no seu lugar.
— Então, hum… Como foi a sua missão?
Matador de Goblins pegou o copo e bebeu, então disse:
— Havia goblins lá.
Sim, claro. Garota da Guilda sorria como se isso a fizesse feliz, com sua pena se
movendo pela folha. Quantos eram? Como se estabeleceram? Como os matou?
Ele resgatou alguém? A missão foi bem-sucedida?
Ele lhe deu a informação serenamente. Tudo como o de costume. Outro trabalho
de extermínio de goblins por Matador de Goblins. Quando ela terminou de
escrever um relatório rápido, ela leu de novo, revisando tudo.
Estava tudo em ordem. Garota da Guilda o parabenizou outra vez pelo trabalho
bem feito, depois colocou o selo no relatório. Agora o trabalho estava realmente
terminado. Tudo o que faltava era pegar sua recompensa do cofre.
— Agora, sua recompensa… Oh, isso mesmo. — Ela bateu as mãos com suas
unhas cuidadosamente cortadas. Havia algo que ela não poderia esquecer. — Se
lembra da aldeia do outro dia?
— Que aldeia?
— Aquela que foi sozinho…
— Ah — assentiu ele. A caverna. Os aldeões. O garoto. A prisioneira. — Eu me
lembro.
— Bem, aquela aldeia — disse Garota da Guilda com um riso expressivo — lhe
enviou um pequeno presente de agradecimento.
Ela disse a ele que esperasse um instante e desapareceu como um cachorrinho
feliz. Ela pegou uma bolsa de couro do cofre e pesou em uma balança, se
certificando de que o ouro pesava o que devia. Sem problemas.
Ela pôs a bolsa em uma bandeja, depois deu um hup! e colocou um cesto
inconveniente ao lado. O resultado, na mesa da recepção, era um monte de milho
que parecia ter sido colhido recentemente.
— Eles disseram que isso é para você comer!
— Oh-ho.
Matador de Goblins pegou uma das espigas; era pesada na mão. Ele puxou a
casca para revelar lindos grãos dourados.
— Está muito maduro.
— Não é? — Ela estufou seu peito mediano prazerosamente, tão orgulhosa como
se ela mesma tivesse cuidado do milho. — E sabe que mais? A pessoa que trouxe
foi uma pessoa que você salvou recentemente.
— …Foi agora?
— An-ham! — Garota da Guilda deixou seus olhos se moverem para o milho
com uma expressão que indicava alívio. Era raro que aventureiros ou
mercenários tivessem uma segunda chance quando falhara uma vez. — É ótimo,
não é?
— É. — Matador de Goblins balançou seu capacete lentamente para cima e para
baixo. — Excelente.
E assim, com toda a papelada e procedimentos terminados, Matador de Goblins
pegou a cesta de milho e se pôs de pé. Exceto pelos registrantes muito novos,
nenhum desses reunidos na Guilda lhe prestou atenção especial. Talvez alguns
olhassem para cima e comentavam: “Ah, lá vai ele de novo”. Não foi diferente
de Garoto Aprendiz enquanto espreitava da oficina, lhe dando uma pequena
reverência.
Matador de Goblins parou. — O que foi? — O garoto limpou as mãos no avental
antes de falar.
— Ah, nada. Pensei que você poderia, hum, precisar de uma espada ou algo
assim, e queria vir fazer o seu pedido.
— Entendi — assentiu Matador de Goblins. — Nesse caso, uma, por favor.
— Pode deixar. Não quer pedir várias de uma vez?
— Não. — Matador de Goblins apalpou a bainha ao seu lado. — Só consigo
carregar uma de cada vez.
— Esse é o nosso Matador de Goblins — disse Garoto Aprendiz com um sorriso
irônico e um aceno. — Vou arranjar uma para você então, e… Uoo! Esse é um
belo milho! — Ele avistou a cesta e pestanejou. — Sorte a sua — disse ele. —
Não sabia que já estava na época.
— É.
— No interior, antes de vir para cá, nós costumávamos ferver o milho toda vez.
Sabe, no verão.
— É mesmo? — Matador de Goblins pegou da cesta, indiferentemente, duas ou
três espigas de milho. Ele as esticou na direção do aprendiz. — Quer um pouco?
Garoto Aprendiz fez um som de surpresa. — Posso? Sério?
— Devo bastante a você e a seu mestre.
— B-bem, está bom então! Muito obrigado! — Abaixando a cabeça, Garoto
Aprendiz correu com o milho nos braços. — Ei, chefe! — Sua voz ecoou na
oficina. Matador de Goblins se virou e seguiu.
O dia estava acabando e aventuras tinham acabado, então a Guilda estava cheia
de aventureiros. Ele abriu caminho por entre a multidão, dando um ligeiro aceno
com a cabeça cada vez que alguém que conhecia o cumprimentava.
— Céus. Podia ter nos avisado. Podíamos ter cozinhado elas na cozinha.
Assim que alcançou a porta, ele sentiu um puxão no cotovelo.
— O quê? — Ele olhou e viu Garçonete Felpubro, segurando seu braço e olhando
sugestivamente na direção da oficina.
— Na verdade, tenho certeza de que devia ter nos trazido um pouco disso
primeiro.
— Acha?
— É. Podíamos ter preparado e todos podiam ter dividido! Isso não foi muito
gentil de sua parte… — continuou ela, piorando a injúria.
Matador de Goblins apenas assentiu e disse: — É mesmo?
Com sua cesta de milho, o aventureiro de capacete de aço se destacava ainda
mais do que o usual.
— Aí, Matador de Goblins! — chamou uma voz eufórica da taverna.
Ele virou o capacete para olhar. Guerreiro de Armadura Pesada acenava com a
mão, seu rosto vermelho sugeria que ele já tinha tomado todas.
— Você parece um homem que precisa de uma bebida. Venha cá e vamos
brindar!
— Não me diga que você quer que ele se junte a nós? — Cavaleira, com seu
lindo rosto tingido com um pouco de carmesim, estufou as bochechas ao lado do
guerreiro.
— Ah, qual é o problema? Só de vez em quando.
— Alguns de nós gostariam que algo além de história sobre goblins
acompanhasse nossas bebidas. — Sua cadeira rangeu quando ela se levantou com
um resmungo exasperado de “ah, esqueça” e trocou de lugar. — Cheguem para
lá, crianças. A paladina vai se sentar aqui.
— Não sei, realmente acha que pode se chamar de paladina com uma boca como
essa…? — disse Garoto Batedor.
— Tome cuidado. Veja se eu não lance Punição Sagrada em você um dia desse…
— Claro. Não tem sido nada além de Trombada com Escudo ultimamente —
comentou Druidesa.
— E o quê? Por favor, me diga, é errado para um cavaleiro usar seu escudo?
Culpe os deuses por não me dar nenhum milagre!
— Ahh, já pode ficar quieto?! Homens não conseguem pensar direito porque
falam demais!
Garoto Batedor e Druidesa começaram a discutir como crianças quando
Cavaleira os deixou livre. Guerreiro de Armadura Pesada interrompeu e olhou
furiosamente para todos. Ele não tinha nenhuma atenção sobrando para Matador
de Goblins.
Assim que o último tentava descobrir o que fazer, uma sombra apareceu ao lado
dele. Era o meio-elfo do grupo de Guerreiro de Armadura Pesada. Ele fez uma
elegante reverência com a cabeça e piscou.
— Quero ter uma palavrinha com os nossos estimados líderes. Por favor, não
lhes dê atenção.
— Nem brincando! — Disse Garçonete Felpubro com uma risada. — Eles estão
para lááá de bêbados. Não há nada de interessante lá. — Ela balançou a mão
parecida com uma pata como se estivesse enxotando algo. — Muito bem, senhor,
vá em frente. Não seria bom manter alguém esperando, seria?
— … — Matador de Goblins virou seu capacete em direção aos dois, depois para
Guerreiro de Armadura Pesada no bar. Ele olhou para cima, depois para baixo.
— Obrigado.
— Sem problema! — Ela respondeu sua palavra calma de gratidão com um
sorriso, e ele não disse mais nada enquanto saía do edifício.
Empurrado pelos aventureiros em volta, ele abriu as portas vai-e-vem e saiu.
Havia uma brisa fresca da noite, e dentro do capacete, Matador de Goblins fechou
os olhos. Então ele deu um passo em frente. Ele prosseguiu pela rua com seu
passo casual e ousado habitual, indo para o portão principal. Mais uma vez, o
portão estava bem ao lado da Guilda, então não ficava muito longe. Ainda
assim…
Entre o vai-e-vem de aventureiros e viajantes passando pelo portão, uma forma
maciça se sobrepunha acima do resto. Matador de Goblins parou quando notou
a silhueta distinta, e seu dono o viu também.
— Oh-ho, meu senhor Matador de Goblins! — O rosto do homem-lagarto se
iluminou, e ele balançou bem o braço para chamar a atenção do guerreiro.
Quando Matador de Goblins chegou perto o bastante por entre a multidão, ele
pôde ver três outras pessoas ao lado do lagarto; todos os seus companheiros
habituais estavam ali.
Os quatro pareciam exaustos, com as roupas sujas, mas um sentimento de
realização estava claro em seus rostos. O nariz de Anão Xamã se contraiu com o
leve cheiro de sangue, e assim ele destampou uma garrafa de vinho para se livrar
dele.
— O que é isso? Não me diga que está saindo de novo a essa hora, Corta-barba?
— Não — disse Matador de Goblins balançando o capacete. — Estou indo para
casa. E vocês?
— Apenas acabamos uma pequena aventura.
— É bem difícil com apenas uma pessoa na linha de frente! — Alta-Elfa
Arqueira fez um som de aborrecimento e deu de ombros, balançando a cabeça.
Então estendeu a mão e agarrou Sacerdotisa, a puxando em um abraço.
— Q-quê!
— Aposto que você está bastante cansada.
— N-não, eu… — O súbito contato físico pareceu deixá-la tonta; podendo ou
não ter sido isso o motivo de ela abaixar a cabeça timidamente. — Estou bem.
Obrigada a todos por se esforçar tanto em me proteger…
— Oh, e é modesta também! — Alta-Elfa Arqueira mantinha os braços esbeltos
da garota, acariciando sua cabeça e gorjeando “que docinho”. Ela olhou para
Matador de Goblins ao mesmo tempo, com aparentemente nenhuma intenção de
deixá-lo ir. — Então — disse ela — não sou um anão, mas pensei que devíamos
ter um miminho.
— Entendi.
— Ooh, isso é milho? — Os olhos da elfa, sempre perspicazes, caíram sobre o
cesto que Matador de Goblins carregava. A menos que ela estivesse muito
enganada, estava cheia de milhos amarelos de maduro, ainda na casca. — Ooh!
Ooh! Pode me dar um pouco? Por favor! — Mal terminou de falar e ela soltou
Sacerdotisa e surrupiou uma espiga.
— Você é um elfo ou um rhea? — perguntou Anão Xamã, apanhado entre
irritação e diversão.
— Está bem — disse Matador de Goblins, fazendo com que a elfa estufasse seu
pequeno peito ainda mais orgulhosamente.
Sacerdotisa ficou ocupada estando desvairada durante toda a situação, e Lagarto
Sacerdote silvou. — Oh-ho. Isso era um alimento básico na minha terra natal.
— Hã? Quer dizer que vocês comem algo além de carne? — perguntou
Sacerdotisa, surpresa. Ela podia ver uma discussão surgindo apesar da fadiga, e
ela queria evitar isso o máximo possível.
— Costumamos fazer mingau dele e beber em uma sopa com mel ou agave.
— Uau! Mal consigo imaginar isso. — Alta-Elfa Arqueira se inclinou, com seu
interesse desviado com sucesso, e Sacerdotisa deu um pequeno suspiro de alívio.
— Nesse caso, prepararei um pouco. Ah, sim, meu senhor Matador de Goblins.
— O quê?
— Se me permite incomodá-lo, gostaria de outra rodela de…
— Queijo?
— …Hum.
A cabeça de Lagarto Sacerdote se agitou impacientemente, e ele não conseguiu
conter uma bofetada de sua cauda no chão.
— Eu o enviarei diretamente ao seu quarto.
— Ahh! Meus agradecimentos sem limites! Isso se tornou um vício para mim…
— Ele continuou nesse mesmo sentido, com gritos de “oh, doce néctar!” e coisas
assim.
— Orcbolg — disse Alta-Elfa Arqueira, observando o lagarto de soslaio — por
que simplesmente não entrega você mesmo então?
— Então não seria afazeres de fazenda.
— Hummm.
Isso contava como uma espécie de integridade? Alta-Elfa Arqueira balançou as
orelhas e riu. — Isso é perfeito, então… Estava pensando em te pedir para fazer
um trabalho.
— Goblins?
— Claro que não — disse Alta-Elfa Arqueira com um balançar de suas orelhas.
— Quero que acompanhe essa garota de volta ao templo.
— Hwah?! — Sacerdotisa não esperava se tornar o alvo da conversa. Ela acabou
por ser empurrada por trás até que estivesse na frente de Matador de Goblins. Ela
olhou freneticamente dele para Alta-Elfa Arqueira e assim por diante. — Ah!
Uh! E… estou bem… sozinha. Não é muito longe…
— A estrada é um lugar perigoso à noite. — Anão Xamã passou a mão pela
barba, com um sorriso provocador no rosto. — Goblins podem aparecer a
qualquer momento. Não é verdade, Corta-barba?
— Sim — disse Matador de Goblins com máxima seriedade. — Mas vocês não
estão hospedados na pousada da Guilda?
— É, mas parece que ela tem alguma coisa a ver com o festival do outono, hum?
Quando Alta-Elfa Arqueira olhou para ela para confirmar, Sacerdotisa pareceu
incapaz de formar uma resposta. Era verdade, aparentemente, mas admitir isso
significaria ser escoltada de volta ao templo.
Lagarto Sacerdote a encurralou ainda mais, adicionando sua voz ao coro: — Lhe
faria bem deixá-lo acompanhá-la.
— Não é hora de ficar tímida, moça.
—…
Todos pareciam muito sérios. Eles não poderiam estar errados, poderiam?
Sacerdotisa olhou de um em um, esperando encontrar alguma pista em seus
rostos, quando Matador de Goblins começou a se mover.
— Vamos. — E ele partiu com essa palavra franca.
— Ah, hum, uh, s-sim, senhor! — Sacerdotisa acabou por correr atrás dele,
ansiosa para não ficar para trás.
Ela deu uma olhada sobre os ombros para encontrar os outros três observando
eles ir, seus sorrisos sugeriam que estavam se divertindo com a cena. Ela achou
isso estranhamento embaraçoso e sentiu suas bochechas aquecerem, mas ela se
curvou para eles mesmo assim.
— Eu, hum, vejo vocês amanhã!
Matador de Goblins parou e pensou por um momento, com seu capacete
inclinando só um pouco, depois começou a andar outra vez. Sacerdotisa correu
para alcançá-lo enquanto ele ficava cada vez mais distante. Ela só o alcançou
quando ele abrandou o passo.
— V-você tem andado, é, ocupado ultimamente? — Sacerdotisa olhou para ele,
se esforçando para acalmar sua respiração. Ele usava o mesmo capacete de aço
de sempre. Se o capacete já não tivesse ocultado sua expressão, a escuridão o
teria.
— Sim — disse Matador de Goblins assentindo. — Precisava de dinheiro.
— Dinheiro…?
— Juntei o suficiente agora.
Hum. Sacerdotisa tocou o dedo pálido nos lábios, observando o chão enquanto
pensava. Ela sentiu um pouco de insatisfação e uma pitada de preocupação. Ela
não experimentava isso como ciúmes, propriamente. Era uma tristeza, quase uma
raiva, que ele não a convidara. Ele devia ter se sentido livre para lhe dizer.
Enquanto ela ficou pensando, ele continuou andando, e ela fez um esforço para
alcançá-lo. Não demorou muito tempo para chegarem ao Templo da Mãe Terra.
— Chegamos. — Quando Matador de Goblins falou, ela olhou para cima para se
ver à porta do templo. O sol roxo da penumbra atravessava pelas paredes de
porcelana; dentro, um fogo aceso pela vigília noturna tremeluzia.
— Muito obrigada — disse Sacerdotisa, subindo as escadas da entrada.
Eu estou… bem com isso?
Não. Não, não estava. Foi por isso que ela criou coragem e falou. Ela tinha
certeza de que seu rosto estava vermelho, mas talvez entre o crepúsculo e a
escuridão, ele não poderia ver.
— A-ahn! Na próxima vez que for em uma aventura, tenha… tenha a certeza de
me avisar! — disse ela tão energicamente quando pôde.
—…
Matador de Goblins não disse nada a princípio e apenas olhou para ela. Mas
depois de um momento ele disse: — Está bem — e deu um aceno inconfundível.
— Eu irei.
Isso era tudo o que Sacerdotisa precisava ouvir. Seu rosto se iluminou tão
intensamente que era notável mesmo na profunda escuridão. — Certo! —
exclamou ela. — Até amanhã então!
— Até amanhã — murmurou ele, observando enquanto ela se virava e
desaparecia no templo.
Por um tempo ele ficou parado ali na frente do edifício.
Encontrei com bastante pessoas hoje. Ele pensara isso antes.
Mas, ele refletiu, não era exatamente verdade. Essas pessoas estiveram sempre
ali. As coisas tinham, em certo sentido, mudado. Mas em outras, não. Era
simplesmente porque ele nunca reparou.
Ele tinha a sensação de que muitas coisas tinham escapado de sua atenção. Ele
respirou fundo e depois soltou lentamente.
Ele passou pela Guilda — ainda movimentada — então saiu pelo portão e seguiu
a estrada. As luas gêmeas e as estrelas entre elas conspiravam para silenciar a
sensação de escuridão. O vento agitava a vegetação rasteira, oferecendo um
frescor agradável.
Ele caminhava silenciosamente pela estrada com seu passo habitual.
E então, ao longe, ele viu um único ponto de luz. Por sua vez, no mesmo lugar
de sempre. Ele chegou onde ele conseguia ver a luz da fazenda.
Matador de Goblins acelerou o ritmo ligeiramente. Ele passou pelo muro de
pedra que ele e o dono da fazenda construíram juntos e passou pela cerca que ele
consertou, até a porta.
Após respirar fundo, Matador de Goblins parou diante de uma porta velha de
madeira, mas não a abriu imediatamente. Antes, ele vasculhou sua bolsa de itens
em sua cintura, pegando um saco estufado de peças de ouro. Tinha um bom peso
na mão. Ele soltou a corda e verificou o conteúdo. Estava tudo em ordem. Ele
guardou. Seu capacete de aço se moveu para a direita, então para a esquerda. Por
fim, ele moveu seu olhar para o céu.
— Bom — sussurrou ele baixinho, depois pôs a mão na maçaneta. Ele girou e
abriu a porta.
Juntamente com o ranger da porta veio um calor relaxante e um aroma doce.
Assim que ele percebeu que era alguma coisa cozida com leite, a garota que
estava na cozinha se virou.
— Ufa! Você ficou fora bastante tempo. — Ela piscou de surpresa, limpando as
mãos no avental e correndo pela cozinha.
Ele fechou a porta atrás de si, entrando na casa com passos calculados. Ela olhou
para ele e viu a cesta que carregava ao seu lado.
— O que há com o milho? Parece ótimo!
— Um presente — disse ele, colocando a cesta na mesa.
— Ah, é? — disse ela, mexendo a panela grande. Sem olhar para ele, depois
acrescentou: — Não em cima da mesa.
— Hrm.
— Coloque em uma cadeira.
— Onde está o seu tio?
— Ele disse que tinha uma reunião hoje. Vai chegar tarde.
— Muito bem, então. — Ele puxou uma cadeira fazendo ruído e pôs a cesta. O
monte de milho ficou lá orgulhosamente, como se fosse o convidado de honra.
Ele deu um grunhido e assentiu.
Enquanto isso, ela estava correndo por toda a cozinha. — Só um minuto, está
bem? Estará pronto em breve.
— Tudo bem — disse ele. Ele foi até a cadeira e colocou a mão atrás das costas.
— Hum? — Ela olhou sobre os ombros quando ele não mostrou sinais de se
sentar como costumava fazer. Ela o viu parado próximo da cadeira, em silêncio.
Hmm… Secando as mãos no avental, ela largou o fogo e foi ao seu
lado. Normalmente é melhor para mim ver o que há quando ele fica assim.
— O que foi? — Ela se inclinou para frente, como se estivesse tentando
vislumbrar o rosto dele.
Aquele capacete familiar. Ele escondia sua expressão, e ainda assim, ela tinha
uma boa ideia do que estava debaixo dele agora.
— Hm. — Ele ficou calado por um momento antes de finalmente dizer “nada”.
Depois de mais algum tempo ele disse: — Antes de comermos…
— Sim?
— …tem uma coisa que quero te dar.
Pouco a pouco as palavras deixaram sua boca, e então ele mexeu sua bolsa de
itens. Ele pegou o saco de peças de ouro que verificou mais cedo. O saco
balançou quando ele colocou na mesa.
Ela piscou, surpreendida. — O que é isso? Pensei que já tivesse pagado o aluguel
desse mês.
— Não é o aluguel. — Ele falou ainda mais cruamente do que o habitual. —
Feliz aniversário.
— Oh! — Ela juntou as mãos. Ele estava certo. Ela esteve tão ocupada que tinha
esquecido completamente disso.
Amanhã é meu décimo nono aniversário.
— Eu não sabia o que te dar, então achei que isso seria melhor — disse ele,
empurrando o saco em direção a ela. Poderia ter sido mais problemático do que
o normal o embrulhar, mesmo assim, era uma bolsa de couro sem decoração,
excepcionalmente simples. E ela estava cheio de dinheiro. Como um presente de
aniversário, não era muito bom.
— Sabe, você… — Várias expressões passaram pelo rosto de Vaqueira, todas
difíceis de se entender. Ela deveria estar zangada? Chateada? Aborrecida, ou
triste? Finalmente ela pôs um sorriso estupefato. — …não tem jeito.
Ela abraçou a bolsa de moedas em seu peito assim como uma criança faria com
uma boneca nova.
— Você age como se não soubesse de nada, e então quando acho que você sabe
de uma coisa ou outra… acontece que você não sabia mesmo de nada.
— Hrm…
— Se não tiver certeza do que comprar, me leve junto. Podemos escolher algo
juntos.
Isso é o que realmente quero.
Ele grunhiu suavemente com as palavras dela, depois acenou lentamente com
seu capacete para cima e para baixo. — …Eu entendi.
— Essa resposta não inspira confiança. Vou lhe agradecer… mais uma vez
quando escolhermos meu presente. — Ela riu, percebendo que estava lhe dando
sermões, e afagou suas costas. — Estou com grandes expectativas com o festival
da colheita, está bem? Ela estava sorrindo. Ela não parecia estar esperando muita
coisa.
Então ela não o levou muito a sério quando ele disse “vou pensar sobre isso”.
— Claro, claro. Enfim, sente-se. O jantar está pronto, vamos comer!
Então ela colocou as mãos no ombro dele, grande pela armadura, e o guiou para
a cadeira. Ela foi de volta à cozinha, mas se virou quando um pensamento cruzou
sua cabeça.
— Ah, é, esqueci de uma coisa importante. — Ela fez com que lhe desse o sorriso
mais brilhante que pudesse. — Bem-vindo de volta!
— Obrigado — assentiu ele, se movendo calmamente na cadeira. — Estou de
volta.
Posfácio

Olá, Kumo Kagyu aqui. Todos vocês gostaram do volume 4?


Eu projetei esse volume como uma coleção de contos, sobretudo acontecendo
entre os volumes 1 e 2 ou os volumes 2 e 3. São histórias em que uma série de
pessoas diferentes pensam e fazem inúmeras coisas diferentes, e uma variedade
de coisas diferentes acontecem. Isso significou menos goblins que o habitual,
mas ainda assim houve um pouco de extermínio de goblins no livro.
Também há uma edição limitada do volume 4 que inclui um CD drama. Ele
retrata uma aventura envolvendo Sacerdotisa e Alta-Elfa Arqueira, então não há
muitos goblins também. Mas, não se preocupem; eu trabalhei em pelo menos
uma cena de goblincídio. E estou realmente impressionado com as atrizes. Fiquei
completamente surpreso. Isso me deixou pensando se deveria ter esse ou aquele
personagem aparecendo, ou apenas ter posto mais falas ao todo… Pensamentos
como esse me fizeram manter a cabeça baixa enquanto ouvia a gravação.
Disseram-me que os outros autores ficaram da mesma forma. Não foi só comigo!
Além disso, Matador de Goblins levou o maior prêmio para uma série nova no
concurso “Essa Light Novel é Incrível!”! Não posso dizer o quão feliz estou,
mas… eles têm certeza de que querem um livro tão estranho ficando em primeiro
lugar? É apenas uma história de um aventureiro que fala sobre nada além de
goblins e mata nada além de goblins.
Em todo o caso, haverá muito mais goblins, e pode ter certeza de que o “Sr.
MataGob” os matará. O volume 5 será estabelecido logo após o volume 3 e
apresentará goblins que vivem em uma montanha nevada e devem ser mortos.
O volume 1 apresentou uma colina, o volume 2 teve lugar debaixo de uma
cidade, o volume 3 contou sobre um monstro de sete braços, o volume 4 foi
sossegado e o volume 5 será em uma fortaleza na montanha. Alguns de vocês já
podem entender onde estou indo com isso. Mas se você não, não se preocupe.
Seja como for, estou muito feliz por todos estarem apreciando as aventuras do
meu pequeno e estranho aventureiro. Por favor, fique para a jornada.
Obrigado ao Sr. Kannatuki por mais um volume com ilustrações maravilhosas.
Garçonete Felpubro realmente veio de suas imagens.
Sr. Kurose, eu aguardo ansiosamente a sua versão de mangá todos os meses, e
mal posso esperar para ver mais dela.
Obrigados a todos os atores que participaram no CD drama; suas performances
foram maravilhosas.
Obrigado como sempre aos meus companheiros de jogos e os outros criativos
em minha vida.
A todos da equipe editorial, e a todos os envolvidos na produção, promoção e
distribuição desse livro, eu lhes devo muito.
A todos os meus leitores e ao administrador do meu site, vocês são a razão de eu
ter chegado tão longe.
Continuarei dando tudo de minha nessa série, e espero que você me acompanhe!

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