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DIREITO DAS SUCESSOES


CAPITULO X A VOCAcA0 SUCESSORIA.

a aplicaçao desta figura aos legados. Trata-se assim de urna situaçao bens”, enquanto que “a substituiçao fideicomis
sucessor instituldo em primeiro lugar (o fiduciário) fica obrigado a
e ma dnjca disposicao de
nurna dupla disposiçao sucessiva, que se traduz normalmente
o objecto da sucessão para que ele reverta por sua morte em benefIcjo
conse ja consiSte 1 1
nens “279
irna aqUislcao sucessiva aos
— .

d7
segundo sucessor (o fideicornissário). Em ordem a permitir 0
Conhecjm
da situaçao por terceiros, a cláusula fideicomissária está sujeita a A ubstitUicao fideicomissária também se distingue da substituiçao pupi
termos do art. 94° b) C.R.P.
registoffl( e quase-puPilar uma vez que nesta o progenitor se substitui ao filho ou ao
A substituiçao fideicomissária ou fideicornisso277 corresponde a r acompanha na realizaçao do seu testarnento, e portanto na qualidade
urna I J.ir, enquanto que naquela é o herdeiro ou legatário que e substituldo.
tese tIpica de vocaçao sucessiva, em que se verificam duas vocacoes,
a favor do fiduciário e depois do fideicornissário, após a morte deste.
prim a além disso, 0 substituto pupilar não é herdeiro do testador, nem vem a
Ao ben quaisquer bens deste, adquirindo bens que foram do fliho ou do major
trário do que se verifica na vocação indirecta, que toma por referéncia c
ou panhado após a sua morte, e que este tenha adquirido por via do testador.
charnado cuja vocação não se concretizou, aqui verificarn-se e concret
-se duas vocaçöes, as quais resultam do mesmo negócio jurIdico
(testame 6.2. Evolucão histórica.
ou pacto sucessório) celebrado pelo de cuius, o que vai permitir a missos surgern no Direito Romano como forma de reagir contra as
ac
sucessiva dos bens por parte dos dois chamados2°. pacidades sucessórias, que nesse ordenamento tinharn gnande amplitude,
Assim, a substituiço fideicomissária distingue-se da substituiçao
dire i como para ultnapassar as formalidades testamentánjas. Assim penante a
pelo que nesta o substituldo nao chega a exercer o direito de suceder, ossibilidade de detenminada pessoa suceden ao testadon, este solicitava a
enqua
que naquela esse direito é efectivamente exercido. Enquanto que na s
seu herdeiro ou legatánio (o fiduciário), que após a sua monte tnansmitisse
tuição directa ha apenas urn chamamento eficaz, a substituiçao fideicomjs
dos esses bens ou pante deles a urn terceiro (fideicomissánio). Esta vinculaçao
na pressupöe a eficácia dos dois chamamentos, sendo o substituto chan tinha, porém, fonça junIdica, sendo apenas um dever moral, fnequentemente
depois do substituIdo. Por isso se pode dizer que “a substituiçao directa umprido pelo fiduciánio280. Apenas corn Augusto vejo a ser reconhecida fonça
Cd
siste nurna dupla disposiçao alternativa, que se resolverá necessariame [dica aos fideicomissos (Inst. 2.23.1.), ainda que, difenenternente dos legados,
o pudessern ser sujeitos a actio ex testamento, mas a uma junisdiçao especial,
(1948), I, n2s 3 e 4, pp. 105-134, GALVAO TELLES, Sucessao testamenta’rja, .fideicommissarius, que poderia reconhecê-los atnavés do pnocesso da
pp. 97 e ss., BAPTIS’
LOPES, Das doaçaes, pp. 103 e ss., OLIVEIRA ASCENSAO, Sucessães, 232 e ss., CAPELC
,nitio extra ordinem28t. 0 fideicornissário tornou-se assim credon do fiduciánio
pp.
SOUSA, SucessOes, I, pp. 220 e ss., CARVALHO FERNANDES, Sucessöes, ie era obrigado a cumpnir as disposiçoes testamentánias, tnansmitindo lhe os
pp. 240 e ss. JOR(
DUARTE PINHEIRO, Sucessães, pp.139 e ss., CARLOS OLAVO, “Substituiçao
fideicomissária”,c ens. No caso dos fideicomissos parciais, tal deconnia de stipulationes parciais
ANTNIO MENEZES CORDEIRO / LUIS MENEZES LEITAO JANUARIO
/ COSTA GOM 1melhantes ao cumpnimento do legado pelos hendeinos. No caso dos fideico
(org.), Estudos em Homenagem ao Profrssor Doutor Inocêncio Galvao Telles, I Direito
Privado e Vdris
issos univensais, o cumpnimento dos mesmos passava por vendas fictIcias da

Coimbra, Alrnedina, 2002, pp. 391-521, e MENEZES LEITAO, “A substituiçao


na ROA 80 (2020), I1I/IV, pp. 425-444. fideicornissariL rança (stipulationes emptae et vendita hereditatis; Gai Inst. 2.256 e Inst. 2.23.6).
277
Salienta CUNHA GONçALVES, Tratado, X, p. 146 ser incorrecta esta dupla designacao,ja
sa soluçao tinha, no entanto, o problema de manter o fiduciánio responsável,
constante do art. 1866 CC. 1867, urna vez que a palavra fideicomisso designa
corn mais rigor oque levou a que, no tempo de Nero, o Senatusconsultus Trebellianus decidisse
herança ou legado em relaçao a qual é feita a substituiçao. Nao vale a pena,
porém, pôr em caus
uma expressao que a lei utiliza ha mais de 150 anos. me a tnansmissão dos bens se fazia através de um ünico acto, a rest it utio, atra
278
Precisamente por esse motivo, OLIVEIRA ASCENSAO, DasRelacoes JurfdicasReais, Lisbon yes do qual o fidejcomissánio assumia a qualidade de hendeino. Como a posiçao
Livraria Morais, 1962, pp. 250-251, chegou a contestar que a substituiçao
fIdeicornissária foss
urna verdadeira substituiçao, considerando-a urn fendmeno serneihante ao
do usufruto sucessiv Cfr. CARLOS OLAVO, Estudos GalvaoTelles, I, p. 394.
“dada a irnpossibilidade de se transmitir de se transrnitir por morte urn 280
direito que corn elas Cfr. CARLOS OLAVO, Estudos Galvao Telles, I, pp. 399-40 0.
extingue”. Mas, corno refere CARLOS OLAVO, Estudos Galvão Telles, I,
p. 393, a designaçao d Cfr. THOMAS RUFNER, “Testarnentary Forrnalities in Roman Law”, em KENNETH G C REID
substituiçao é correcta, uma vez que “o fideicomissário vern ocupar o lugar do fiduciário quant
!IIARIUS J DE WAAL/ REINHARD ZIMMERMANN, Comparative Succession Law, I-Testamentary
a titular idade dos bens deixados”.
srmalities, New York, Oxford University Press, 2011, pp. 1-26 (12-13).

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DIREITO DAS SUCF.SSOES

5.6.3.2. Dupla liberalidade corn o mesmo objecto.


o primeiro elernento da substituiçao fideicornissária é a existência de
CAPITULO X A vocAcAo SUCESSORIA.

ão que estranhamente se manteve perante o Codigo


1
Civil actual294.
e que desde sernpre se admitiu que essa formulação e incorrecta,
I
dupla liberalidade, pretendendo assirn o autor da mesma benefic iar bens,
SUC Lvez que não expressa nern a situação jurIdica do fiduciário nern a dos
varnente duas pessoas, o fiduciário e fideicomissário. Essa dupla liberal que praticar qualquer acto de transrnissão para
corresponde habitualmente a urna disposiçao testamentária (arts.
id lo queo fiduciário não tern
22- leicornis10, ocorre ndo esta de forma autornática corn a rnorte daquele295.
ss.), podendo ser uma deixa a tItulo de herança ou urn legado (art.;
icargo lirnita-se assim a conservação dos bens. Já a sua transmissão por morte
Mas pode igualmente a dupla liberalidade resultar de uma doaçao embora corresponda
(art. 1700°, n°2) ou mesmo de uma doaçao em vida (art. 962°).
por m ra o fideicOmiSSá0 é urna consequéncia legal, que
m da obrigacão de conSer Vação , não corresp onde a qualquer nova obri
A dupla liberalidade tern que ter, porém, o mesmo objecto, tendo
assi o autónorna. Se o fiduciário não alienar e mantiver os bens durante a sua
fideicomissário que receber os mesmos bens deixados ao fiduciário, fideicornissária.
sern oq- a, cumpriu os termos do encargo existente na substituiçao
se estaria perante urn encargo a termo inicial e não uma substituiçao
comissária291. A substituiçao fideicomissária envolve assim
fid
necessariameni
F,.3.4. Ordern sucessiva.
urna disposicao de bens, não podendo consistir na simples constituiçao ,itltimo elernento da substituição fideicornissária consiste no facto de as
obrigaçoes e esses bens terão que pertencer ao autor da liberalidade,
sei uas disposicoes gratuitaS dos mesmos bens deverem produzir efeitos numa
O que também nao existirá substituiçao fideico
rnissária292. dem sucessiva (ordo successivus). Efectivarnente, a segunda disposicão gra
ra deve ser realizada em ordem a so ter eficácia após a extinção da eficácia
5.6.3.3. Encargo imposto ao beneficidrio da liberalidade de conservar durant
e da primeira corn a morte do fiduciário. 0 fiduciário poderá assim aproveitar
a sua vida o objecto da rnesmapara que este revertapor sua rnorte afavor beneficiar
)S bens durante toda a sua vida, passando depois os mesmos a
do segundo beneficidrio. fideicorniSSário, salvo no caso de este não sobrev iver ao fiduciá rio. Daqui
o segundo elemento da substituiçao fideicomissária é inclusão de urn encar sulta esta ordern sucessiva na propriedade dos mesmos bens, que passam a
imposto ao primeiro beneficiário da liberalidade de conservar durante
to [ser prop riedade de urna pessoa depois de terem pertencido a outrern durante
a sua vida o objecto da mesma para que este reverta por sua morte a favor :oda a vida desta dltima.
segundo beneficiário. No art. 1868° do Código Civil de 1867 falava-se A ordem sucessiva é estabelecida através da sujeicão a termo final da atri
ante
que o herdeiro ou legatário era “encarregado de conservar e transmitir ‘buiçao ao fiduciário e a urn coincidente termo inicial da atribuiçao ao fideico
por
sua morte a urn terceiro a herança ou legado”. Tal levava a que a doutrin [missário. Em consequência, os dois são chamados sucessivarnente a herança
a
falasse na altura na existência de urn encargo de “conservar e transmitir”2”
ou legado de acordo corn a ordern fixada pelo testador, a qual opera corn efi
ácia real. No entanto, a ordem sucessiva não corresponde a urna sucessão do
fideicomissário em relação ao fiduciário, sendo arnbos sucessores do testador,
291
Assim, ABRANCHES FERRAO, Das doaqoes segundo o Cddigo Civil
Portugues, I, Coimbra, a cuja sucessão são chamados296.
Imprensa da Universidade, 1911, pp. 289-290 e ANTNIO COSTA
FARO, na ROA 8 (1948), I,
n°s 3 e 4, p. 115. Na verdade, se alguern deixar a outrern determinados
bens e determinar que, no 5.6.4. Ambito de aplicação.
mornento da rnorte deste, sejam pagos € 50.000 a terceiro, a situaça
o nao e de substituiçäo fidei
cornissária, mas antes de legado a termo inicial (art. 2243, n-i). Efectiv
amente, nesta situaçionäo
A substituição fideicomissária encontra-se especialrnente prevista no ârnbito
ha qualquer obrigaçao de conservaçao dos bens, pelo que o beneficiário
pode dispor dos mesmos, da sucessão testarnentária, regulada pelos art. 2286° e ss. 0 art. 962° autoriza
sendo apenas constituida, uma dIvida que se vencerá no momento igualmente a utilizaçao de substituicoes comissárias nas doaçOes em geral,
da sua morte.
292
Assirn, e conforme salienta CARLOS OLAVO, Estudos Galvito Telles, I,
p. 433, e nota (117), se
o testador impuser ao herdeiro ou legatário instituIdo o encargo de
conservar bens do própriO Cfr. CARLOS OLAVO, Estudos Galvao Telles, 1, p. 451.
herdeiro ou legatario para os atribuir por morte deste a terceir
o, aplicar-se-á o art. 22S1, corn 299
Cfr. ANTONIO COSTA FARO, na ROA 8(1948),], n9s 3 e 4, p.114 e CARLOS OLAVO, Estudos
a especialidade de se tratar de urn legado a ternlo inicial.
293
Galvão Telles, I, p. 451.
Cfr. ANTONIO COSTA FARO, na ROA 8 (1948), I, n9s 3 e 4, 114. 296
p. Cfr. CARLOS OLAVO, Estudos Galvão Telles, I, pp. 451-452.

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DIRETTO DAS SUCESSOES CAPfTULO X A vocAcAo SIJCESSóRIA.

do fiduciário continuava a ser considerada fragfl, o Senatusconsultuspegj


s pela Europa levou a proibiçao geral das substituiçoes fideicomissá
--

permite-Ihe reter a quarta parte dos bens que a Lex Falcidia reconheci
sdive1Os palses eurOpeus288. Recenternente, no entanto, tern-se vindo
herdeiros testamentários excessivamente onerdados282. dos fideicomissos. Assim, em Franca, a reforma do
Corn o Direito Justinianeu, tanto fiduciário e fideicomissárjo r alguma reabilitacão
foram rec -o das SuceSSOe5 institulda pela Lei 2006-728, de 23 de Junho, permitiu
nhecidos corno herdeiros, podendo 0 primeiro reter a quarta parte incluindo de resIduo, corn urn novo regime das liberalidades
dos b
e ficando o segundo corn direito a receber os bens através da restitutio residuais (arts. 1048° e ss. e 1057° e ss. CCfr).
N uais e
época, permitiu-se ainda que os fideicomissos fossem sujeitos a termo,o portugal, Os fideicomissos perpétuos foram reduzidos pelo Decreto de
permitia que a restituiçao so se fizesse após determinado lapso de
teni i--il de 1832 e definitivarnente abolidos pelas Leis de 30 de Junho de 1860

No âmbito do Direito Intermédio, o objectivo de manutençao d , Maio de 1863. Os restantes continuaram, no entanto, a ser admitidos,
familia permitiu o desenvolvimento das substituiçoes fideicomissárjas
do contrOvérsia na doutrina qual 0 grau ate ao qual poderiam vigorar289.
a estipulaçao de verdadeiras condiçoes. Foi assim cornum no fideicor
estipulaçao da condiçao si sine liberis decesserit, que apenas permitia a
-
o Codigo Civil de 1867 viria a restringir ainda mais as substituiçoes fideicomis
trant -s, apenas as admitindo para o futuro em proveito dos netos ou de sobrinhos
são dos bens para o fideicomissário no caso de o fiduciário falecer sem ,.ior (art. 1867°). Já Os fideicomissos de pretérito so foram considerados
des
dentes, destinada a permitir a conservaçao dos bens na farnIlia do gray os ate ao primeiro grau (art. 1874°). A sanha contra os fideicomissos viria,
que em regra era parente do testador. A Glosa viria mesmo a considerar itanto, a ser ate nuada pelo Decreto n° 19126, de Dezembro de 1930, que alte
condiçao impilcita nos fideicomissos284. 0 fideicomisso viria por outro
la to art. 1867°, voltando a permitir todas as substituiçoes fideicomissárias em
ser associado a proibiçao de alienaçao e a ser admitido em vários graus, n+grau. Foi essa a soluçao que igualmente passou para o actual Codigo Civil.
mitindo assirn ao testador criar uma ordem de sucessores, a quem os
be
deveriam ser sucessivamente atribuldos e cuja alienaçao era proibidaa8s. .3. Elementos constitutivos da substituiçao fideicomissária.
Em Portugal, o costume levou ao desenvolvirnento de duas formas .3.1. Generalidades.
pa
ticulares de fideicornisso: as capelas e os morgadios, os quais eram per ubstituição fideicomissária possui os seguintes elernentos constitutivos:
tuos, sucessivos, inalteráveis e indivisIveis, sendo os primeiros deixados
p
cumprimento de obras pias e os segundos corn o fim de conservar o nome c a) Dupla liberalidade com o mesmo objecto;
famIlia. Os morgados vieram a ter grande aplicaçao, embora tenham b) Encargo imposto ao primeiro beneficiário da liberalidade de conservar
vini
a ser regulados apenas nas Ordenaçoes Filipinas (Livro IV, Tit.100)286. durante a sua vida o objecto da mesma para que este reverta por sua
Corn o advento do liberalismo e a absolutizaçao do direito de propriedai morte a favor do segundo beneficiário;
os fideicomissos entram em decadéncia, vindo a Revoluçao Francesa a proil c) Ordem sucessiva290.
as substituiçoes fideicomissárias através da Lei 14 de Novembro de 17
considerou nulas as disposiçoes a favor do fideicomissário. Indo ainda ma: Examinemos sucessivarnente estes elementos
longe, o Código Civil frances de 1804 considerou nulas as mesmas ta
em relaçao ao fiduciário (art. 896 CCfr287). A difusão das ideias revolucionL e’ritier institutou du le’gataire”. Hoje esta diposicao limita-se a prever: “La disposition par laquelle une
personneestchargee deconserveretde rendreà n tiers neproduit d flitque dans lecas 011 cite estautoriséeparla lot”.
Cfr. CARLOS OLAVO, Estudos GaivaoTettes, I, p. 406.
282
Cfr. CARLOS OLAVO, Estudos Gaivão Telles, I, pp. 400-401. Cfr. ANTONIO COSTA FARO, na ROA 8(1948), I, n9s 3 e 4, p. 110, eCARLOS OLAVO, Estudos
283
Cfr. CARLOS OLAVO, Estudos Galvao Telles, I, p. 401. alvaoTelies, I, p. 406.
284
Cfr. GALVAO TELLES, Direito deRepresentaçao, p. 161. Cfr. VAZ SERRA, “Sobre o problerna dos fideicornissos condicionais”, na RU 62 (1929-1930),
285
Cfr. CARLOS OLAVO, Estudos Galvao Teiles, I, p. 402.
pp. 145-147, 161-163, 177-179, 193-196, 209-212, 225-228, 241-244, 257-259, 273-276, 289-291,
Cfr. CARLOS OLAVO, Estudos Galvao Telies, I, pp. 402-403.
287
L305308, 321-324,337-340,353-356,369-372,385-388,401-404 e 63 (1930-1931), pp. 2-4 e 17-202
Code Civil, art. 896: “Les substitutions sont prohibees. Toute chsposition par laquelle le donataire, l’héritier J354, CUNHA GONçALVES, Tratado, X, pp. iSle ss., ANTONIO COSTA FARO, na ROA 8(1948),
instituéou le leataire, sera chargé de conserver et de rendre a tin tiers, sera nulls, mêrne a ügard dii donatairt, I, n8s 3 e 4, pp. 111 e ss., e CARLOS OLAVO, Estudos Galvão Teltes, I, 431.
p.

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DIREITO DAS SUCESSO
ES
CAPITULO X A vocAcAo SUCESSORIA
o que permite igualm
ente a sua aplicaçao no
âmbito da sucessão contratual. quadro da doaçao por mo
0 art. 17OO, n22, é alias rte tar 1idir essa proibicã0 como na hipótese de alguém determiflar uma
o recurso a substituiçöes fideic expresso em pen fideicomjssanjo, subordinada a urn acontecirnen
ornissárias em relaçao aos ersâo para urn segundo to
estabelecidos na convenção pactos sucessó
antenupcial. A substituiç
ao fideicomissária no e incerto. Senia 0 caso de alguém determiflar a atnibuicão dos seus bens
naturairnente também ser
realizada no caso de do
açoes em vida. pod atófli0, corn o encargo de os transmitir por morte para BernardO, mas que,
Já no âmbito da sucessão
legitirnária, a substituiç reste ltimo falecesse sern descendentes, os seus hens passariam para Canlos.
vedada pelo art. 2163, qu ao fideicon:,
e impede o testador de
instituir encargos A maioria da doutrina considera, porérn, que o facto de o art. 2288° apenas
a legItirna contra a vonta sob referit a que a reversão para ofideicornissãrbo fique subordinada a urn aconte
de do herdeiro. Também
admissIvel a aplicaçao da su nao é conceptualmep
bstituiçao fideicomiss rnentO futuro e incerto impede a estipulacão apenas da condicãO suspensiva,
legItirna, urna vez que a ária em relaçao a
sua instituiçao por testam
ento ou pacto sucess
sucessã as j não da cojcão resolutjva, uma vez nesta verificase antes a resolu
implicaria que os herde
iros legitirnos passasse da vocacão (art. 270°, sendo assim a mesma permitida pelo art. 2229°.
rios ou contratuais. E, ali rn a sucessores testa .

as, o que sucede no caso ment te enquadrarnento seria possIvel instituir uma vocação subordinada a
em que, no caso de proibi previsto no art. 2295°,
çao ao herdeiro de dispo n°2 ndicã0 resolutiva de o herdeino instituIdo falecer sern descendefltes, caso
considerados corno fideic r dos bens da herança
ornissários os herdeiro
s legItimos do fiduciári
, são rem que os bens seriam antes atnibuldos a terceiro. Nesse caso, o falecirnento
o2°. ‘scm descen ntes resolveria a vocacão, considerando-5e esse herdeiro
5.6.5. Limites de validad inca tendo sido charnado, o que afastaria o carãcter sucessivo da substitui
e.
A lei admite a possibilida ;aofideiconssaria. A questãO de saber se uma clãusula si sine liberis decesserit
de de a substituiçao fideic
havendo assim obstácu omissária ser plural,
los a designaçao simultân nia uma condicao resolutiva em vez de uma substituicão fideicomisSaria
de vários fideicomissári ea de vários fiduciáriosnaQi
os (art. 22872). Nesse ca iepende da estipulacão do seu efeito retroactivo, sendo matéria a resolver
siçao para Os fideicorniss so, naturalmente que a
ários so se verifica corn o aqui. pela interpretacäo do testarnento299.
fiduciários. falecimento do ültimo
do Parecefl°5, no entanto, que o espirito do art. 2288° é o de evitar a utili
São, porém, nulas as subs zacão da condicäo para elidir a proibicão das substituicoes fideicorniSSárias
tituiçoes fideicornissári
como na hipótese de o fideic as em mais de urn
omissário ser por sua vez g em mais de urn grau, o que tanto se verifica na condicão suspensiva corno na
de outro fideicomissári de sig na do fid condicão resolutiva. SomoS assim de opinião que ambas são vedadas por essa
o (art. 22882). Trata-se de
uma regra que se justifi
uciáriol
pelo facto de se pretende ca disposicão.
r impedir o estabelecim
gos sobre os bens, restringind ento de excessivos enca
o a faculdade de disposiç r Em caso de instituicãO de uma substitUicão fideicomissârja em mais de
inevitavelmente resultari ao dos mesmos, como urn grau, a nulidade dessa substituicao fideicomiSsária não envolve a nulidade
a da instituiçao de duas
A lei esciarece que esta pro substituiçoes sucessivas.
ibiçao se verifica, ainda qu
para o fideicomiss
ário fique sujeita a cond e a reversão da herança
a estipulaçao de fideicom içao (art. 2288°). A lei DasdoacãeS, 1, pp. 286 e ss. Em conformidade corn esta Assento STJ 14/12/1937 (Carlos
issos condicionais, admi não proibe
tidos nos termos gerais Alves), processo 049523, publicado no D.G. I Série de 28/l2/1937 estabeleccu que “o legado de
art. 2229°, como na hipóte do
se de alguem condicion certa coisa a urna pessoa, sob a condicSo de passar a terceira se aquela falecer sem descendef
ltes
missário para o caso de o fid ar a reversão para o fideic
uciário falecer sem descend o é condicional e vâlido e nSo substituicio fldeicorniSSlria” Mas essa concepcSo foi rapidamente
liberis decesserit)298. A lei entes (condicao sisine ultrapassada tornando-se pacifica a admissibilidade dos fldeicon7iSsos condicioflais podendo a
já prolbe, no entanto, a uti ,
lização da condição para condiçio ser aposta a instituicão, a reverslo ou sirnultaneament a ambas. Cfr. GALVAO TELLES,
e
Direito de rep resentacaTh, pp. 160 e ss., VAZ SERRA, na RLJ62 (1929-1930)
297
Neste sentido, JORGE DU PP. 323 e ss. ANTONIO
298 ARTE PINHEIRO, Suc COSTA FARO, na ROA 8 (1948), I, n8s 3 e 4, p. 121, e CARLOS OLAVO, EstudoS Galvão Telles, I,
No âmbito da doutrina essôes, p. 242.
mais antiga, sustentava-se pp. 441 e ss. Na jurisprudência veja-se o Ac. STJ 7/11/2019 (MARIA ROSA TCHING), procesSO
diçOes e a substituiçao fide a inc ompatibilidade entre
icomissária. Cfr.JOSE GA a estipulacao de con 3077/16.3T8VIS.C1.S
dos negociojuridicos, I A con BRIEL PINTO COELH
clição, Coimbra, Impre O, DascldiisulasacessóriaS 299
nsa da Universidade, 191 Neste sentido, cfr. PIRES DE LIMA / ANTUNES VARELA, Código, VI, sub art. 2288, n8s S e
quem o fideicomisso con 0, 449-450, nota (para
dicional é uma “figura
jurIdica impossIvel”) e PP. 6, PP. 455-456, OLIVEIRA ASCENSO, Sucessees,
Pp. 227-228, e JORGE DUARTE PINHEIRO,
ABRANCHES FERRAO,
Sucessôes, pp. 244, e nota (456).
162

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DIREITO DAS SUCESSOES
CAPfTULO X A VOCAcAO SUGESSORIA

da instituição ou da substituico anterior, apenas se


I
considerando a seg1 entanto, oflduciário, salvo em
clãusula fideicornissária como não escrita, salvo se eza do fldeicOmisso (art. 229O, n°2). No
tamento (art. 2289). Trata-se de uma soluçao ques
o contrário resultar i istanas especiaiS não tern possibilidade de alienar ou onerar os bens
tionável, urna vez que0 r05 ao fldeicomisso, devendo considerarse nulos os negócioS jurIdicos
testador pretendeu, ao instituir urna substituiçao
fideicomissária em ir- u nesse sentido, nos termos gerais do art. 280° e 2942303. Efecti
urn grau, foi que os bens ficassem em definitivo
corn o flitimo fideicomis flduciário
enquanto que a soluçao legal atribui definitiva ste, a obrigacào de coflSercão dos bens que recai sobre o
mente esses bens a urn deter iorac ou desv aloriZa
comissário intermédio. De lure condendo, talve t ca flao apenas a obrigacão de evitar a sua ão
z fizesse por isso mais tambélTl a proibicão da sua disposicão ou oneracão.
considerar antes nulos os graus intermédio se
s na substituiçao fideicomiss porém, que, em caso de evidente necessidade ou utilidade
A jei admite,
substituicao, o tribunal possa autorizar a sua alienacão ou
5.6.6. Situaçao jurIdica do fiduciário. ara os bens da
oneracão
Urn vez que estamos perante urna situaçao racào, corn as devidas cautelas (art. 2291°, nOl). A alienacão ou
de vocacão sucessiva, a VOC mesm cond icOe em caso de evid ente neces
do fiduciário concretiza-se logo no mornento e ainda ser autorizada, nas as s,
da abertura da sucessão, at.. inter esses do fide ico
que este tenha o encargo de conservar os bens lade OU utilidade para o flduciário, contantO que os
vocaçao do fideicornissário, após a sua mo
em ordem a permitir a fut 1isário nào sejar n afect ados (art. 2291 °, n°2) 304. E de salie ntar que a alien acão
corn a abertura da sucessão o estatuto de her
rte. 0 fiduciário assume ass opode ser requerida pelo flduciário corno pelo fldeicomiSSário (art. 10136,
deiro ou legatário do deci CPC), ainda que pareca que neste iMtimo caso apenas pode estar em causa
consoante sucede na totalidade ou numa quot
a da herança ou em bens det )ótese do art. 2291°, n°1. EfectiVamente, a alienacão ou oneracão não pode
minados (art. 2030, n2). Apesar da extensão
ao usufrutuário do regime rpedida no interesSe do fldeicomissárjo, e nâo se compreenderia que fosse
usufruto (art. 2290, n2), o mesmo nao é cons
iderado necessariarnente cort .e a avaliar da necessidade ou utilidade da mesrna para o flduciário305.
legatário (cfr. art. 2O30, nQ4), podendo ser herd
eiro, conforrne refere expres Sea autorizacào for concedida, deve a sentenca flxar as cautelaS que devem
mente o art. 2286g. Como herdeiro, o fiduciário
pode exigir a partilha da heranç .L:rvadas (art. 10130, n°S, CPC). A Iei nào explica, porém, em que consis
(art. 210P), a sua instituiçao não pode ser
aposto termo inicia (art. 2243 m essas cautelas, parecendo que, no caso de a necessidade ou utilidade ser
n2) e goza do direito de acrescer cart. 23016)300.
Já enquanto legatario, na ferida aos bens, as cautelaS se satisfarão corn a sub-rogacão real dos bens,
beneficia das duas prirneiras situaçoes, tend
o apenas direito de acrescer, cas ssegurando-5e que os bens substituIdos nao se percam ou dirninuam no
seja nomeado conjuntarnente em relaçao ao
mesmo objecto (art. 23022). turo. Já se a necessidade ou utilidade corresponder ao interesse do fiduciârio,
A vocaçao do flduciário é, porém, urna voca
çao impura, urna vez que é a questàO é mais controVersa. OLIVEIRA ASCENSAO e MARIA RAQUEL
estabelecida a tItulo provisório, caducando
corn a sua morte a menos que EI sustentarn que o intereSse do fideicomissário será assegurado através da
o fideicomissário não Ihe sobreviva, e se enco
ntra onerada corn urn encarr noponibilidade a este da alienacão ou oneração, fazendo corn que a morte do
de conservaçao dos hens atribuIdos301. Apes
ar de a lei se referir ainda a urn duciário os bens revertam para o mesmo, já que o encargo de conservaSão
encargo de transmitir os bens a outrem
, essa formulaçao não é correcta, [dos hens teria natureza propter rem, transmitindo-se assim para o adquirente
urna vez que a substituiçao fideicornissária
nao e urna relaçao fiduciária,
processando-se a devoluçao de bens para o fldei
cornissário de forma automá
tica, sern necessidade da prática de qualquer
acto por parte do fiduciário302.
0 flduciário tern o gozo e administraçao dos 303
Neste sentido CARLO S OLAVO, Estudos Galvão Telles, 1, pp. 473 e ss.
bens (art. 2290, n21)), nos
rnesrnos termos do que o usufrutário, salvo j 304A lei ja nao prevé, porém, que a alienaçSo ou oneração possa ser autorizada em caso de evidente
rio que for incompatIvel corn
necessidade on utilidade da mesma para o fideicomissârio. Por esse motivo, no Ac. RL 10/5/2007
(GRANJA DA FONSECA), processo 3403/20076, indeferiuse o pedido de alienacSo dos bens
300
Neste sentido, CARLOS OLAVO, Estudo deduzido pela fiduciária corn o fim de obter recursos financeiraS para custear a aquisicãO de uma
s GalvCo Telles, I. pp. 441 e ss., e 468
°‘
Neste sentido, JORGE DUARTE PINH e ss. moradia para a fideicomisséria, sua filha.
EIRO, Sucessães, p. 245.
302
Cfr. CARLOS OLAVO, Estudos GalvaoTelles,
‘°
Neste sentido, MARIA RAQUEL REI, ROA 54 (1994), p. 162, e CARLOS OLAVO, Estudos
I, p. 451.
Galvao Telles, I, p. 481.
164
165
DIREITO DA
S SUCESSOE
S

CAPITULO X A VOCAcAO SUCESS


dos bens306. Já AN 0
TUNES VARELA
tar a alienaçao ou defende que a m
oneraçao dos bens eihor form
morte do fiduciário fideicornitidos a a ao fiduciário, näo faria qualqUer sentido que dc pudesse
”307. condiça0
Caso o fiduciário que ainda não Ihe foram devolVidos e que näo se sabe se o
seja herdeiro, resp
termos do art. 2O onde pelos enca set.
68. No entanto, rgos da
bens para o fide em consequênc
ia da futura eni6cada a devolUcao, se o fideicOmhs o nào puder on nao
icornissário, os
direito de execut
ar os bens sujeit
credores pessoa
is do fiduciár r a heranca ou o legado, fica scm efeito a substituicâo, conside
os seus frutos (a os ao fideicornisso jo heredjtat1OS adquiridos definitivamete pelo fiduciânio coffi
rt. 2292). , apenas po
Corn a morte do dendo (art. 2293°, n°2)310. Saliefltase, no entanto, que esta dis
fiduciário, ocor do
legado ao fide

icornissário (art
re a devoluçao
da herança tern racter 1fljUflt1VO pelo que se admite que o testadot dispo
ca
quiser aceitá-la, . 2293, n91) mas contt0, desde que tal näO corresponda a urna substituicão
fica sem efeito a , se este não pude -__‘

considera-se defi substituiçao e a io proibi pelO art. 22889311.


nitivamente ad herança ou
testador (art. 22 quirida pelo fidu o 1e I on não querendo o fiduciario aceitar a heranca on olegado,0
93°, n°2). Neste ciário desde
taçao a favor do
fideicomissário,
caso, não funcio
na o direito
a n’ n°3, prevê a conversào da substituicao fideicomis na em directa,
2041°, n°2, b))308 ai nd a que este tenh de rep dos bens a favor do ftdeicomjs51o corn efeitos desde
. a descenden
A aquisiçao defini t4 do testador. Este regifl é no entanto, igualmente supletiV0 pelo
tiva da herança pe impede que o testador nomeid urn substltut0 directo ao fiduci
sário não poder ou lo fiduciário em
não querer aceita caso de o fidei
aquisição por pa r a herança nao o caso de este nãO poder ou nãO querer aceitat a heranca, cofflO
rte daquele, send corresponde a
dade da situaçao o apenas urna co
nsequência da
uma e de desigflar que, em caso de não sobrevivência do fiduciánio,
jurIdica de que extens
é titular309. hamados os seus herddiros, corn o encargo de conservar a heranca
5.6.7. Situação ju fideicOmi° Admitese, mesmo a hipótese de essa substituicao
ridica do fideicom
Nos termos do issdrio. cta ser tâcita312.
art. 2294° não ha
ou legado por pa
rte do fideicomis
lu ga r a aceitaçao ou
repüdio da he I aqui resulta que durante a vida do duciânio, o fideicOmissâtl0 flão e
este praticar ness sário em vida do rai 1rde qualqU direito sobre osbens da heranca ou do legado, mas apenas
e perlodo quaisq fiduciário, nem
bens, mesmo que uer actos de di
sposiçao dos re po derna expectat junIdica de Ihe suceder3’3, que pot isso se pode qualificat
a tItulo oneroso. E sp ec
heranca ou do le fe ct ivamente, a acei t
gado apenas pode taçao ou repüdi
do fiduciário (art ocorrer após a su o d:
. 2293°, n°1). Um a devoluçao corn
a vez que se igno a mon A expliCacto para esta solucSo é dada por VAZ SERRA, na RU 62 (19294930) P. 211 n05
ra se o fideicom
306
issári jntes termos: “See caracterj5ti da substituicao fideicomis aria a ordo succesSivu3, que, portafltO
Cfr. OLIVEIRA leicomi55i0 sea proprietânio senão depois da morte do flducilrio, ofldeicornisso deveria
ASCENSAO, “O
Coisas. B) Direito bservaçOes ao
das SucessOes. Projecto do Có inguir.se corn o predecesso do fldeicomiS5bo em relacao ao flduciárbo”
e MARIA RAQ C) Das Coisas”, digo Civil A) Direito d
UEL REI, ROA na RDES 13(196 —

Cfr. PIRES DV LIMA / ANTUNES VARELA, Codigo, VI, sub art. 2293, n2S, pp 462-463.
54 (1 99 4), p. 163. 6) , n0s 3-4, pp. 217-258 .
Cfr. PIRES DE (242.24: Na urisprudêd1a cfr. Ac. STJ 29/9/1992 (CESAR MARQU) process° 081544, e Ac. STj
LIMA / ANTUN
Soluçao inversa ES VARELA, Có
constava da versS a’i go, VI, sub art. 2291 014 (ALVES VELHO), processo lO2/I2.0T2AND
nha: “0 fideicorn o original do ar 18 , n94, 460.
issário adquire t. 680 do Codi p. 2
Cfr. GALVAO TELLES, Direito de represefltacao pp. 169 e ss., e 194 e ss., e CARLOS OLAV0,
que nao sobrev di reito a sucessão go Civil de 1867
ia ao fiduciário , desde o momen ,0 qual dispm ‘sstudos GalvãO Telles, I, P.46
pacIfica na doutrin . Este direito pa to da morte do 6.
ss a ao s seus herdeiro te stador, ainda
a, como se pode s”. Mas a soluça Neste sentido, cfr. OLIVEIRA ASCENSAO Dos relaçoeS Jo icas reGis, pp.251 e sS., StICeSSOeS,
viria a ser, por ver em JOSÉ TA o nunca foi ,
isso, alterada pe VA RE S, Sucessoes, I, pp e MARIA RAQUEL REI, “Da expectativa urIdic’, na ROA 54 (1994 PP 149-180 (154)
“Se o fideicorniss lo Decreto 1912 . 466 e ss. Esta disposic .
ário nao aceitar 6, de 16 de Dezem ão Esta 6ltirna autora explica que “0 fldeicornissIfb e titular de uma expeCtati uridica porque o
a herança ou lega bro de 1930, pa
a substituiçao, flc do, ou se falece ssando a dispor:
ando o fiduciário r antes do fiduc que no fideicomisso estã em jogo e a vontade do disponente e essa determifla que o direito do
Cfr. CARLOS OL corn a proprieda iário, caducará
AVO, Estudos Ga de definitiva do fiduciãrio se exerca de tal forma que nSO preudiqUe o futuro titular do direito o fldeicofl1iS
lvão Telles, I, s hens’. —
510
p. 51 6. 0 flduciâtio é titular pot morte do disponente e a vontade deste Implica a limitacSo do seu direito
166
em atençlo ao fldeicomiss’°

167
DIREITO DAS SUCESSOES CAPITULO X A vocAçAo SUCESSORIA.

como expectativa sucessória314. E em funçao da tutela dessa expectativa


I fideicOmjS rio é a tItulo particular, urna vez que incide sobre valores cer
jj
dica que a lei limita a prática de actos de disposiçao dos bens por parte
d •oS e deterrni1ados que a primeira sucessão perrnitiu concretizar317.
fiduciário (art. 2291°) e impede que possarn ser opostas ao fideicomissár
decisOes judiciais em que ele nao tenha intervindo relativas aos bens sujejt
6.8. Os fideicomissos irregulares.
ao fideicornisso (art. 2290°, n°3). Em consequência, dessa expectativa
dev os termos do art. 2295°, serão tambérn admissIveis os denorninados fidei
reconhecer-se ao fideicomissário legitimidade para requerer o registo da )missos irregulares, os quais incluem: a) as disposiçoes pelas quais o tes
c1á
sula fideicornissárja315.
dor proIba o herdeiro de dispor dos bens hereditários, seja por acto entre
Questiona-se, porém, se a expectativa jurIdica de que beneficia o fid testador
rivos, seja por acto de ültirna vontade; b) as disposiçoes pelas quais o
comissário pode ser alienada durante a vida do fiduciário. A resposta iame alguém ao que restar da herança por morte do herdeiro; c) as dispo
pared
dever ser negativa316. Efectivamente, embora a isso no se opusesse o art. ôes pelas quais o testador chame alguem aos bens deixados a uma pessoa
2028
uma vez que ja se verificou a morte do testador, a verdade é que essa xlectiva, para o caso de esta se extinguir.
aliena
çao frustaria a vontade do testador, que era a de que fosse o fideicomissárj Os fideicomissos irregulares caracterizarn-se por não corresponderern
a adquirir os bens por morte do fiduciário. Para além disso, a obrigaçao ralrnente a situação descrita no art. 2286°, em que o autor da sucessão
fiduciário de conservar esses bens é estabelecjda tornando em considera iatribui ao fiduciário o encargo de conservar a herança ou legado ate a sua
a pessoa do fideicomissário, pelo que não se poderia estender a terceiro, Lorte e ao fideicomissário o benefIcio da reversão da herança ou do legado
at
porque os bens reverterão definitivamente para o fiduciário se ocorrer após a morte daquele. Nos fideicornissos irregulares, o autor da sucessão,
pre
viamente a morte do fideicomissárjo. não estabelece o encargo de conservar o objecto da sucessão, ou nao
A vocaçao em benefIcio do fideicomissário encontra-se assim suspens letermina a atribuiçao a urn fideicornissário do benefIcio da sua reversão318.
durante a vida do fiduciário, pelo que a devoluçao dos bens ao fideicomi o podemos, por isso, falar em verdadeiras substituiçOes fideicomissárias,
apenas se verifica no momento da morte do fiduciário (art. 2293°, n°1). U.... o que alias resulta do próprio texto do art. 2295° que, ao referir que “são havi
vez verificada a devoluçao dos hens, o fideicornissário torna-se proprietarioi las como fideicomissárias”, expressa apenas uma ficçao legal319.
pleno e definitivo dos mesmos, não estando sujeito a qualquer encargo rela A primeira hipótese de fideicornisso irregular é aquela em que se pro
tivo a sua conservação, pelo que pode livremente dispor deles. Ibe o sucessor de dispor dos seus bens por acto entre vivos ou por morte
Ao contrário do que sucede corn o fiduciário, que pode suceder a tItu1o (art. 2295°, n°1, a)). Esta cláusula é válida, urna vez que o art. 2232° apenas
de herança ou legado, o fideicomissário é sempre qualificado como legatario prolbe a condiçao de nao transmitir os bens a determinada pessoa, sendo,
se vier a suceder ao fiduciário. Na verdade, se o fideicornisso respeita a bensl porém, admitida como fideicomisso irregular a proibição de o herdeiro ou
certos e determinados, constitui urn legado em relaçao ao fiduciário e naw legatário instituIdo dispor dos seus hens, caso em que serão havidos como
ralmente também em relaçao ao fideicomissário. Mas se consistir na tota fideicomissários os seus herdeiros legItimos (art. 2295°, n°2). Neste caso,
lidade ou numa quota da herança, ernbora a primeira devoluçao a favor do O de cuius estabeleceu a obrigaçao de conservar os hens, mas ja nao atribuiu o
fiduciário seja urna sucessão a tItulo universal, ja a segunda devoluçao a favor benefIcio da reversão dos bens por morte a urn substituto por si designado.
A lei resolve assim a questao, considerando como fideicomissários os herdei
314
Assirn, OLIVEIRA ASCENSAO, na RDES 13 (1966), n5s 3-4, p. 245. No entanto, este ros legItimos do fiduciário.
autor em
DasRelac6esfuridicasReajs pp.252-253, falava antes de urna expectativa real, que institui relaçOes
juridicas reais corn a propriedade do fiducilrio. De expectativa sucessória, fala ainda CARLOS
OLAVO, Estudos Galvao Telles, 1, pp. 503-504, o qual explica esta qualificaçao porqte
a protecçãO Cfr. BRAGA DA CRUZ, Obras Esparsas, III, pp. 148-149, nota (1) e 152.
visa apenas a eficácia prática do fenómeno sucessório a favor do segundo charnado,
sern que ihe Cfr. JORGE DUARTE PINHEIRO, SucessOes, pp. 242.
sejarn atribuIdos quaisquer poderes sobre os bens objecto de tal fenómeno’. 319
°
Isso mesmo ja referia ANTONIO COSTA FARO, na ROA 8 (1948), I, n6s 3 e 4, p. 106, perante
OLIVEIRA ASCENSAO, Sucessoes, p. 230, e CARLOS OLAVO, Estudos Galvão Telles, I, 502. o art. 1871 do Codigo de Seabra, afirmando que ‘se são havidas corno fideicomissárias, não são
316
p.
Neste sentido, no ãrnbito do Codigo de Seabra, VAZ SERRA, na RU 62 (1929-1930), 258.
p. fideicornissos, rnas antes instituiçOes corn a mesma regularnentaçao jurIdica dos fideicornissos”.

168
169
CAPiTULO X A VOCAçAO SUCESSORIA.
DIREITO DAS SUGESSOES

propriedade, corn a obrigaçao de transmitir os bens a


As outrasduas hipóteses de fideicornissos irregulares correspo Lao fiduciária da
do fideicornissário não é
disposiçoes em que se determine a atribuiçao a urn segundo sucessc iro. No direito moderno, no entanto, a posição
sua proprie
que deles restar por rnorte do primeiro sucessor (art. 2295°, n°1, b)), situa ero credor do fiduciário, não dependendo a aquisicão da
transmissão por este praticado, ocorrendo autorna
denominada na doutrina de fideicomisso de resIduo (de eo quod supereri’ e de qualquer acto de
sua qualificacao como
e as disposiçoes a favor de pessoa colectiva em que se determina corn qi amente corn a sua morte. Por isso, não é possivel a
ficarão os bens, no caso de esta se extinguir (art 2295°, n°1, c)). Nestes dc prieda fiduciária.
do usufruto e da propriedade de raiz foi defendida
casos o de cuius já nao estabelece o encargo de conservaçao dos bens, mas a ic A teoria da deixa separada
entre nóS igualmente ao
mantém esse encargo, ainda que Ihe estabeleça uma atenuação. 0 fiduc Itália por BUTER1323, parecendo corresponder
tese, ao esta
pode dispor dos hens por acto entre vivos, scm necessidade de autoriza nsarne1to de CUNHA GONçALVES324. De acordo corn esta
ao fiduciário, rece
judicial, mas para tanto tern que obter o consentimento do fideicomiss’ lecer o fideicomjsso, 0 testador atribuiria urn usufruto
passaria a propriedade
(art. 22950, n°3). Apenas no caso de o fideicomissário recusar esse consejj ndo o fideicornissárjo a propriedade de raiz, que
extinção do usufruto.
mento é que a autorizaçao judicial passa a ser necessária. na corn a morte do fiduciário, que desencadearia a
tern algum apoio no art. 2290°, n°2, que manda estender ao fiduciário,
5.6.9. Natureza da substituiçao fideicomissária. não for incompatIvel corn a natureza do fideicornisso, disposiçoes
as
Em relaçao a natureza da substituição fideicomissária tern surgido as segu] ;ivas ao usufruto. Apesar disso, no entanto, as duas figuras não se podern
tes teorias: entificar, já que Os poderes do fiduciário extravasarn dos que possui o usu
os
tário, na medida em que em certas condiçoes pode alienar ou onerar
a) Teoria da propriedade fiduciária: ens sujeitos a fideicomisso (art.
2291°). Para além disso, considera-se que o
b) Teoria da deixa separada de usufruto e da propriedade de raiz; luciário adquiriu definitivamente os bens se o fideicomissário não puder
corn
c) Teoria da deixa de outro direito real de gozo menor; ott não quiser aceitar a sucessão (art. 2293°, n°2), o que é incompatIvel
d) Teoria da dupla disposiçao sujeita a condiçao suspensiva e resolutiv destatuto do usufruto325.
e) Teoria da dupla disposiçao a termo inicial e final321. A teoria da deixa de outro direito real degozo menor foi sustentada na Itália por
URICCHI0326. Este autor considera o direito do fiduciário corno urn direito
A teoria da propriedadefiducidria corresponde a explicaçào clássica d peal atIpico. Embora o princIpio da tipicidade (art. 1306°) não se oponha
substituiçao fideicomissária, nos termos da sua origem rornanIstica, s
e Ia
no entanto, defendida modernamente por COSATTINI322. Efectivamente, ‘ Cfr. ANTONIO BUTERA, “La clausola <Si heres cum liberis vel sine liberis decesserit”
fedecomissaria vietata”, no Foro Italiano, volume 54 (1929), Parte I, p. 129-145 (138),
conforme acima se referiu, neste ordenamento o fideicomisso era visto coir stituzione
funçoes do usufruto, sendo
:que considers que a substituiçao fldeicornissária preenche as mesmas
urn mero encargo de transmitir os bens a outrern, que implicava urna trans técnica jurIdica.
este permitido e aquela proibida por uma pura questao de
324
Cfr. CUNHA GONçALVES, Tratado, X, p. 157.
320
Cfr. LUIZ DA CUNHA GONçALVES, “Fideicomisso de resfduo”, na ROA 6 (1946), n2s 1 e 2, 326
Conforme refere RAQUEL REI, na ROA 54 (1994), p. 161, “se o flduciário fosse apenas urn usu
pp.576-180, e CASTRO MEN DES, “Sobre a disponibilidade dos bens em fideicomisso de resIduo’ utIrio, não poderia o preceito dizer ‘adquirida definitivamente”: teria que prescrecer a aquisicao
em ODireito 95(1963), pp.274-290, e CARVALHO FERNANDES, Sucessees, pp.252-253. Najur ura e simples pois que nao existia qualquer aquisição anterior que agora pudesse considerar-se
prudéncia cfr. Ac. STJ 4/10/2018 (MARIA DA GRAA TRIGO), processo 2630/14.4T8V15.C1.S] fimplesmente definitiva. Se o flduciário fosse urn usufrutuário, morrendo o fldeicomissário,
321
Seguimos CARLOS OLAVO, Estudos GalvaoTelles, I, pp. 412 e ss. (nua-)propriedade dos bens reverteria para os sucessores do fldeicomissário e nao para o fldu
322
Efectivamente, LUIGI COSATTINI, “Sostituzione Fedecomissaria”, no Nuovo Digesto Italiaw :iário (art. 2293.0/2)”.
vol. XII, pp.637-649 (641), sustenta que a esséncia da substituiçao fideicomissária reside numa 326
Cfr. ALBERTO AURICCHIO, “Sul Fondarnento e sui Limiti del Divieto della Sostituzione
meira obrigacao de conservar e posteriormente restituir os bens, que se concretiza numa obrigacSo Fedecommissaria”, no Foro Italiano 79 (1954, Parte I, pp. 1542-1546 (1544). Para este autor,
defacere (e também de nonfacere) em relaçao a administraçao dos bens e nao alienaçao dos bens e o direito do flduciário não pode ser de propriedade porque a obrigaçao de conservar e restituir
nurna segunda obrigacao defacere, que se concretiza em fazer corn que o objecto da substituicSo 1retira a esse direito urn dos elernentos essenciais da propriedade, o poder de disposicao. Haveria,
seja adquirido pelo fideicornissário. F porisso, urn direito real atIpico.
171
170

I

DIREITO DAS SUCESSOES


CAPITULO X A v0CAçA0 SUCESSORIA.

I
a esta tese, uma vez que se estaria apenas a qualificar
como direito real nlais amplos do que os do usufrutuário, urna vez que incluem poderes
norno urn direito consagrado na lei, a verdade é que au
dificilmente a situ alienacao dos bens (art. 2291°), corno também a aquisicao dos bens pelo
do flduciário pode ser considerada corno urn direito e

priedade, sendo antes uma real distinto da


verdadeira propriedade que, ainda que p eicomissátio opera através de uma devoluçao sucessória (art. 2293°, n°1)
em virtude da elasticidade do seu direito de propriedade. Já a teoria
atribulda a tItulo provisório, pode vir a tornar-se definitiva.
A teoria da dupla disposiçao sujeita a condiçao suspensiva e
seja
a propriedade sob condiçao
ignora o facto de que a sobrevivéncia em
rela
enquanto
resolutiva foj def ao fiduciário não constitui uma condiçao em sentido técnico,
dida na Itália por NATOLI32. Este autor sustenta que a
substituiçao fidej lementO acidental do negóciO jurIdico, mas antes de urn conditio iuris,
rnissária implica urna atribuiçao sujeita a uma dupla condiçao
suspensiva e resolutiva, o que seria demonstrado pelo facto
não retroact u seja uma facto que a lei considera pressuposto da produçao de determi
considerar que o fiduciário apenas adquire definitivamente
de a lei apen ados efeitos jurIdicos329. Por outro lado, parece claramente incompatIvel
o fldeicomissário quando o fiduciário não
Os bens quan rn o objectivo da substituiçao fldeicornissária, que não é a de fazer depen
puder quiser aceitar a heran
(cfr. art. 2293, n2). Assim, o fideicomissário adquiriria era transrnissäo da propriedade de urn facto futuro e incerto, mas antes de
os bens corn a su ctivamente assegurar a aquisiçao da mesma pelo fldeicomissário após a
ção a condiçao suspensiva de vir a sobreviver ao
fiduciário, enquanto quer norte do flduciário, o que corresponde precisamente a propriedade a termo
aquisiçao deste seria sujeita a urna condiçao resolutiva
em caso de não sol ITt. 1307°, n°2).
vivência ao fideicomissárjo. Diferenternente do que
sucede normalmente fli Contra esta qualificaçao tern vindo a objectar-se que a lei nao admite a
regime da condiçao, o autor sustenta que a mesma seria
irretroactiva, por C ujeicão a termo da instituiçao de herdeiro e sO admite o termo inicial na
siderar que a retroactividade da condiçao seria
incompatIvel corn o re’ aomeacão de legatário cart. 2243°), mas este argumento näo seria decisivo,
legal, ja que implicaria que o fiduciário nunca tivesse
sido prOprietario, rn ama vez que se trata de qualificar uma situaçao legalmente prevista. Mais
entende que a retroactividade não é urna caracterIstica
essencial da cond ertinente é a crItica de que a extinçao da situaçao jurfdica do flduciário e a
cao, urna vez que pode ser afastada pela vontade
das partes ou pela nature Ievoluçao a favor do fideicomissário nao são certas, dependendo de o fldei
do acto (cfr. art. 276).
A teoria da dupla disposiçam a termo inicial efinalconsidera romissario sobreviver ao flduciário, o que seria incompatIvel corn o conceito
que o testador efec. terrno cart. 278°).
tua duas atribuiçoes da propriedade a termo corn
atribuiçao da propriedade ao fiduciário efectuada a
o mesmo objecto, sendo a Ide Não nos parece, porérn, que esse argumento seja decisivo para rejeitar
termo resolutivo e atri-J a qualificacao da substituiçao fideicomissária como propriedade a termo,
buiçao ao fideicomissárjo a termo suspensivo. E essa a
posiçao dorninante na ido apenas que acrescentar que a veriflcaçao do termo fica sujeita a uma
doutrina portuguesa, a qua! qualifica a situaçào do
prietário a termo resolutivo, considerando este urn
fiduciário como urn
dos casos de proprieda
pro-I conditio iuris de que a propriedade possa ser adquirida pelo fideicomissário,
o assim uma condiçao legal inserida na disposiçao a termo, que por
ternporária admitidos por lei (art. 13O7, n2)328.
isso nao e retroactiva330. Tal corresponderá assim a natureza da substituicao
Parece claro que o objectivo da substituiçao fideicornissárja,
ao determin :omissária, permitindo explicar a devoluçao para o fldeicomissário no
a transmissao dos bens para o fideicomissário, em
caso de morte do flduciá momento da morte do flduciário cart. 22930, n°1), que apenas nao se verifica
rio, e instituir uma propriedade a termo. Na
verdade, a situaçao nao corres
ponde a qualquer negócio flduciário, urna vez
obrigaçao para o flduciário de transmitir os bens a
que não se verifica
nenhurna
se ele não quiser aceitar a sucessão cart. 2293°, n°2).

urn terceiro. Tambérn a


situaçao extravasa do usufruto, urna vez que nao so
os poderes do fiduciário I
327
Cfr. UGO NATOLI, L’amm in istrazjone dei beni
ereditari, II L’arnmjnjstrazjone nelperiodo successivo

all’accetazjone Milano, Giuffrb, 1949, 26 e ss. e 32 e ss.


32s
pp.
Neste sentido, PAMPLONA CORTE-REAL Sucessöes,
p. 262, JORGE DUARTE PINHEIRO, ‘
Cfr. OLIVEIRA ASCENSAO, Das relaçoesjuridicas reais, p. 252.
SucessOes, pp. 246, e CARLOS OLAVO, Estudos Galvao
Telles, 1, pp. 418 e ss. e 429 e ss. °
Neste sentido, CARLOS OLAVO, Estudos GalvCo Telles, I, p. 430.
172
173
DIREITO DAS SUCESSOES

5.7. 0 concurso de vocaçOes anómalas.

As vocacOes anómalas podem-se aplicar sirnultaneamente, como no caso


d

I
autor da sucessão fazer testamento atribuindo a sua herança a dois herdeir
simultaneamente e designando urn substituto (directo ou fideicomisSárj(d
urn deles que, no entanto, deixou descendentes. Nesse caso, verifica-se
u
situaçao de concurso de vocaçoes anórnalas, que tern que ser resolvido atrav
da determinaçao de urna vocação anómala prevalecente, seja esta a subs{,
tuiçao (directa ou fideicomissária), o direito de representaçao ou o direito
de
acrescer. Para esse efeito, a lei estabelece urna hierarquia especIfica entre
as
vocaçöes anórnala, aplicando-se ern prirneiro lugar a substituiçao directa
ou
a substituiçao fideicomissária (quando estas possam ter lugar), em seguid
o direito de representacao e so por fim o direito de acrescer331. PARTE III
Na sucessão testarnentária, a prevaléncia da substituiçao directa sobre
direito de representaçao resulta do art. 2O41, n2, a) que deterrnina a in
o
AS SUCESSOES EM ESPECIAL
cacao deste instituto sempre que tenha sido designado substituto ao herdeir
ou legatário. A mesma prevaléncia sobre o direito de representaçao verifica.s
em relaçao a substituiçao fideicomissária, quer em benefIcio dos herdeiro
do fiduciário (art. 2O41, n2 a) e 2293, n3), quer em benefIcio dos here
ros do fideicornissário (art. 204P, n2, b)). Em relaçao a sucessão contratua,
a estipulaçao de urna substituiçao fideicomissária, nos termos do art. 17OO,
n22, exlui iguamente o ünico caso nela previsto de direito de representacao
i
(art. 17O3, n2).
A substituiçao directa e a substituiçao fideicomissária prevalecem ig’’1
mente sobre o acrescer, nos termos do art. 23O4, uma vez que constituem
disposiçao do testador em sentido contrário ao mesmo.
Já a prevaléncia do direito de representaçao sobre o acrescer encontra-se
estabelecida no art. 23O4, in fine. 0 mesmo regime deve ser aplicável por
analogia em relaçao a sucessão contratual. Já em relaçao a sucessão legI
tima e legitimária, urna vez que entendemos nao haver lugar nesses casos

31
a substtuiçao directa332, a regra é apenas a da prevaléncia do direito de repre
sentaçao sobre o direito de acrescer, conforme resulta dos arts. 2138 e 21572.

Seguimos JORGE DUARTE PINHEIRO, Sucessaes, pp. 238-239.


Cfr. infra.

174
CAPITULD X
A SUCESSAO LEGITIMA.

l.Generalidades.
o nao tiver disposto, válida e eficaz
os termos do art. 2131 “Se o falecid
da morte, são charnados a
‘ente, dos bens de que podia dispor para depois
os”. A sucessão legItirna ocorre
icessão desses bens os seus herdeiros legItirn
nao houver uma disposiçao dos
sim a tItulo supletivo, so tendo lugar se
ão. Deve dizer-se, no entanto,
ens da herança por parte do autor da sucess
muitas pessoas repugna fazer
ie tal ocorre corn frequencia, urna vez que a
seja por terern a
estamento, seja por não quererern pensar na própria morte,
seja por acei
upersticão de que a realizaçao do testamento acelere a morte,
a333.
arern a soluçao legal relativa as regras da sucessão legItim
Tradicionalmente considerava-se que a sucess ão legItirn a correspondia a
Iveis hierarquizadas
vontade presurnida do tie cuius, sendo as classes de sucess
explicaria a preva
de acordo corn a ordern natural dos seus afectos334. Tal
maxima latina
ncia dos descendentes sobre os ascendentes, nos termos da
de grau, devido
amorprius descenditpostea ascendit, bern corno a preferéncia
s mais próxim os. Hoje em
ao maior afecto do falecido para corn os parente

“ Cfr. GALVAO TELLES, Sucessdo legItirna, p. 16.


Tal era já expresso por HUGO GROTIUS, Dc iure beth acpaci
s, Amsterdam, lohannis Blaev, 1646,
io, rernota omni lege exconjectura
Lib III, cap. VII, III, p.176: “Successio ab intestato quae dicitur,posito dorniu
1) chega ao ponto de a qualificar
voluntatis naturalern hahet originern” Mais a frente (X, pp. 180-18
autor da sucessSo: “Successio autern
corno urn testamento tácito feito por conjectura da vontade do
enturn cx volunt atis con/ectura’. No mesmo
ab intestato, de qua agimus, nihil aliud est quarn tacitur n testarn
iure naturae etgenti urn, Frankf urt a. M., Fridericus Knochi,
sentido SAMUEL PUFENDORF Dc ,
probabilissirnepraesmntarn
1684, Lib. II, cap. X, n41, p. 619: “Igitur sequendarn heic defuncti voluntatern
em CUNHA GONç ALVES,
ratio naturalis dictitabat”. Modernamente essa posicao ainda é expressa
a se baseia ‘na presun cao derivada das relaçoes
Tratado, IX, p.464, que refere que a sucessão legItim
de famIlia e da afeiçao natural que, no seio desta, une os seus memb ros”.

177
DIREITO DAS SUCESSOES

dia essa concepção está, porém, ultrapassada, não sendo a sucessão ie


encarada como uma sucessão testamentária presurnida, mas antes como u
opçao legislativa, resultante da valoraçao feita pelo legislador em relaçao a
sucessIveis que devem ser chamados em caso de auséncia de disposiçao test
rnentária, a qua! pode ou não coincidir com a vontade do autor da sucessão31
Para poder afastar a sucessão legItima, a disposiçao de bens terá que se
válida e eficaz. A sucessão legItima terá assim ainda lugar se a disT
tamentária for considerada inválida @rts. 2308° e ss.), for revogada (arts. 23
e ss.) ou caducar cart. 23172). —

Finalmente, mesmo em caso de disposiçao de bens válida e eficaz, a suce


.
f
d) OutrOS colaterais ate ao quarto grau:
e) Estado.
CAPITULO XI A SUCESSAO LEGITIMA.

cônjuge sobrevivo integra a primeira classe de sucessIveis, salvo se o


utor da suces.0 falecer sem descendentes e deixar ascendentes, caso em
ue integra a segunda classe (2133°, n°2).

J-Iierarquizacao dos sucessIveis legItimos.


I
são legItima continua a aplicar-se relativamente a todos os bens da herai 131 GeneralidadeS.
que não tenham sido abrangidos por essa disposição336.
n face da vastidão do nümero de sucessIveis legItimos é normal que nem
odos sejam chamados a suceder. E preciso por isso fazer a hierarquizaçao dos
2. Categorias de herdeiros legItimos. ucessIveis, em ordem a determinar quais são os sucessIveis legItimos priori
ãrios, Os ünicos a que é atribuIdo o direito de suceder. Essa hierarquizacão
Nos termos do art. 2132° “sao herdeiros legItirnos 0 cônjuge, Os parentes e 0 bedece a trés regras gerais:
Estado, pela ordem e segundo as regras constantes do presente capItulo”. Em
consequência da equiparação da adopçao a fihiaçao, nos termos do art. 158E a) Preferéncia de classes;
e 1973° e ss. são também considerados herdeiros legItirnos o adoptado e o b) Preferéncia de graus de parentesco;
adoptante. Já o membro sobrevivo da união de facto não é considerado her-i c) Divisão por cabeça.
deiro legitimo, tendo apenas, nos termos do art. 2020°, o direito de exigi
alimentos da heranca do falecido. Examinernos sucessivamente essas trés regras da sucessão legItirna.
Nos termos do art. 2133°, n°1, a sucessão legItima defere-se pela segui
ordem: J.2. Preferência de classes.

a) Conjuge e descendentes, incluindo adoptados; A regra da preferéncia de classes implica que os sucessIveis de uma classe
b) Conjuge e ascendentes, incluindo adoptantes; èrern aos sucessIveis das classes subsequentes, pelo que apenas aqueles
c) Irmãos e seus descendentes; são chamados a sucessão.
r Esta regra encontra-se consagrada no art. 2133°, que nos indica quais são
as classes de sucessIveis, acrescentando o art. 2134°, que “os herdeiros de cada
Cfr. GALVAO TELLES, Sucessães, pp. 142-143, e FERNANDO NOGUEIRA, ROA 40 (198O),
ma das classes de sucessIveis preferem aos das classes imediatas”. Da mesma
pp. 665 e ss.
Esta soluçao afasta-se do princIpio rornanista nemo pro parte testatusproparte intestatusdecedere orma, o art. 2137° prevé que os sucessIveis de uma classe so são chamados a
potest, que considerava incompatIvel a sucessão testarnentária corn a sucessão legitirna, obrigando iceder se nenhum dos sucessIveis da classe anterior quiser ou puder aceitar
o testador a dispor de todo o seu patrimonio por forrna a que nao coexistissem herdeiros testa a herança.
rnentários e herdeiros legItirnos. Ern consequéncia, se o testador fizesse urna disposicao parcial,l • Nestes termos, imaginernos que o autor da sucessão deixa dois flihos
entendia-se que a rnesma abrangia toda a herança. Tendo sido seguida no ins commune esta regra
e dois pais. Corno os flihos integram a primeira classe de sucessiveis e os
veio a ser abolida ern Portugal a partir do sec. XVII. Cfr. GALVAO TELLES, Direito de rep resentacdO,
pp. 245 e ss., e SucessCo legItima, pp. 16-17. is a segunda, apenas os fllhos serão chamados a sucessão. Se urn dos fllhos

178 179

I
DIREITO DAS SUCESSOES CAPfTULO XI A STJCESSAO LEGITIMA.

repudiar a herança, e não tiver descendentes, a sua parte acrescerá a do OUtTI .4.2. ExcepçOeS.
fliho (art. 2137, n2). 0 charnamento dos pais apenas se verificará em caso1’ divisão por cabeca é, no entanto, objecto de algurnas excepçOes:
A regra da
ambos os flihos repudiarern a herança (art. 2137, n1).
a) sucessão do cônjuge corn mais de trés descendentes (art. 2139, n21,
3.3. Preferéncia de graus de parentesco. segunda parte);
b) sucsão do cônjuge corn ascendentes (art. 2142, n1);
A regra da preferéncia de graus de parentesco determina que, dentro de ca c) sucessão dos irmãos gerrnanos e unilaterais (art. 2146);
classe, os parentes de grau mais próximo preferern aos de grau mais afastad d) direito de representacao (21382).
(art. 21352). Assirn, se ao autor da sucessão sobreviverern dois flihos e urn neto
fliho de urn deles, os flihos são sucessIveis prioritários, preferindo aos netos A primeira excepção respeita a sucessão do cônjuge corn mais de três descenden
Consequentemente o neto nao será chamado a sucessão do de cuius, se ‘“cEfectivamente, embora o art. 2139, n1, estabeleça que “a partilha entre o
a herança repartida entre os dois flihos. njuge e os flihos faz-se por cabeça, dividindo-se a herança em tantas par
No entanto, a regra da preferência por classes de sucessIveis pode ser posta s quantos forern os herdeiros” determina na sua parte final que “a quota do
em causa pelo instituto do direito de representaçao (art. 21382). Assim, s conjuge, porérn, não pode ser inferior a uma quarta parte da herança”. Assirn
ao autor da sucessão sobreviverern dois filhos e urn neto, fliho de urn ou - sendo, sempre que o cônjuge concorra corn mais de trés descendentes, a regra
fliho, falecido antes do autOr da sucessão, o neto tern direito a concorrer a da divisão por cabeça deixa de se aplicar, passando o cônjuge a receber sem
herança juntamente corn os outros dois flihos, na posiçao que competia ao pre urn quarto da herança, enquanto que os descendentes dividirão entre si
anterior filho. Os restanteS trés quartos.
A segunda excepçao respeita a sucessdo do cônjuge corn os ascendentes, caso
3.4. Divisão por cabeça. em que o art. 2142, n21, estabelece que “ao conjuge pertencerao duas terças
partes e aos ascendentes uma terça parte da herança”. A sucessão do con
3.4.1. Regime geral. juge corn os ascendentes é assim totalmente exciulda da regra da divisão por
A regra da divisão por cabeça significa que os sucessIveis legItimos priori-. cabeça, uma vez que neste caso ao cônjuge são sempre atribuldos dois terços,
tários sucedem em partes iguais e aplica-se normalmente entre parentes de cabendo aos ascendentes dividir entre S 0 terço restante.
cada classe (art. 21362), e na situaçao do concurso do cônjuge corn ate três A terceira excepção respeira a sucessão dos irrntosgermanos e unilaterais. Corn
descendentes (art. 2139, n21, prirneira parte). efeito, deterrnina o art. 2l46 que “concorrendo a sucessão irmãos gerrnanos e
Assim, se ao autor da sucessão sobreviverem dois flihos, a cada urn deles irmãos consanguIneos ou uterinos, o quinhao de cada urn dos irmãos germanos,
caberá metade da herança. Se ihe sobreviverem dois flihos e o seu cônjuge, ou dos descendentes que os representern, é igual ao dobro do quinhao de cada urn
a cada urn destes sucessIveis será atribuldo urn terço. Assirn, os diversos her dos outros”. Esta excepçao justifica-se pelo facto de existir habitualmente major
deiros sucedem de forma igualitaria. proxirnidade do autor da sucessão em relaçao aos seus irmãos germanos (flihos
A regra da divisão por cabeça é aplicável, mesmo no caso de existirem cola dos mesrnos pais) do que em relaçao aos seus irrnãos consangulneos ou uterinos
terais que sejam duplamente parentes do falecido (art. 2148). E o que ocor filhos apenas do mesmo pai ou da mesrna mãe o que justifica que estes herdern
rerá, por exernplo, em relaçao a primos, flihos de urn casamento do irmão do apenas metade do que compete aqueles. Esta excepçao apenas se aplica a suces
pai corn a irma da mae. Apesar do duplo parentesco existente, a sua posição são dos irmãos e seus descendentes que os representem, pois se estiver em causa
sucessória nao e diferente da dos outros primos que sejarn apenas flihos de a sucessão de colaterais, o art. 2148 volta a rnandar aplicar a regra da divisão por
irmãos do pai ou de irrnãos da mae, aplicando-se a todos eles a regra da divisäo cabeça, rnesrno que algurn dos colaterais seja duplamente parente do falecido.
por cabeça. A ültirna excepçao refere-se a situaçao do direito de rep resentacao, urna vez
que, nos termos do art. 2l38, a divisão por cabeça não prejudica o direito

180 181
DIREITO DAS SUCESSOES CAPITLJLO XI A SUCESSAQ LEGITIMA.

de representaçao, nos casos em que este tiver lugar (cfr. arts. 2039° e ss.). i Tambe nao terá direito de suceder o cônjuge que celebre novo casa
tivamente, e conforme acirna se salientou, nos terrnos deste direjto a djvj flto após a declaraçao de morte presumida (art. 116Q), perdendo este direito
diversa, posterior
faz-se por estirpe (cfr. art. 2044°), pelo que a parte que competia ao sucess’ 4ucessã0 caso se comprove que 0 óbito ocorreu em data
que não pôde ou nao quis aceitar a herança é atribuIda ao conjunto dos desc (art. ll8).
aSse casarneflto
dentes desse mesmo sucessIvel. Em consequéncia, havendo mais do que : Em contrapartida, 0 cônjuge mantém o seu direito de suceder
em caso de
sucessIvel do herdeiro pré-falecido, a regra da divisão por cabeça deixa de
tej.1 paracão de facto ou de simples separaçao judicial de bens.
aplicaçao, determinando antes o art. 2042° que “na sucessão legal, a represent j já em relação aos descendentes, naturalmente que a sucessão depende de
rem urn vinculo de fihiaçao estabelecido. Relativamente a mae,
çäo tern sempre lugar, na linha recta, em benefIcio dos descendentes de fjIh0 o vInculo da
autor da sucessão e, na linha colateral, em benefIcio dos descendentes de irmi jação resulta do facto do nascimento (art. 1796, n1), o qual é estabelecido
do falecido, qualquer que seja, num caso ou noutro, o grau de parentesco”. Nes través da declaraçao de maternidade (arts. 18O3 e ss.), averiguaçao oficiosa
nto judicial (arts. 1814° e ss.). Relativamente
caso, “cabe a cada estirpe aquilo que em que sucederia o ascendente respect
ivo1 tarts. 1808° e ss.) ou reconhecime
1826° e
(2044°, n°1), 0 que implica que o direito de representaçao prejudique a aplic. o pai, o mesmo pode resultar da presunçao de paternidade (arts.
çao da regra da divisão por cabeça, quer em relaçao a sucessão dos descendentj oficiosa (arts. 1864° e ss.)
ss.), de perfilhacao (arts. 1849 e ss.), averiguaçao
ou reconhecimento judicial (arts. 1869° e ss.). E legalmente equiparada
(2140°’), quer em relaçao a sucessão dos irmãos e seus descendentes (art. 21452) a urn
to constitutivo da fihiaçao a sentença de adopcao (art. 1986°, n°1).
No caso da adopçao, o vInculo de adopçao tern que se encontrar consti
4. A sucessão do cônjuge e dos descendentes. aldo por sentença já proferida a data da morte do adoptante (art. 1973°, n°1337.
já no caso da fihiacao o seu estabelecirnento tern eficácia retroactiva (art. 1797°,
A primeira classe de sucessIveis prevista no art. 2133°, n°1, integra o con n°2), pelo que o reconhecimento judicial em data posterior a morte do decuius
juge e os descendentes. 0 cônjuge sobrevivo, no entanto, deixa de integrar permite a aquisiçao dos direitos sucessórios. A nosso ver, são inconstitucio
a prirneira classe se o autor da sucessão não deixar descendentes e deixarl nais os prazos constantes dos arts. 1817° e 1873°, uma vez que viola claramente
ascendentes, passando nesse caso a integrar a segunda classe. o princIpio da proporcionalidade exigir que o direito ao estabelecirnento da
Para poder suceder, o cônjuge tern, no entanto, que ter em vigor o seu fihiacao so possa ser exercido por urna pessoa na fase inicial da sua vida ou
casamento. Assim, dispöe o art. 2133°, n°3, que “o cônjuge nao é chamado a no prazo de trés anos após o conhecimento de factos supervenientes rela
herança se a data da morte do autor da sucessão se encontrar divorciado ou tivos a fihiaçao338. Também nao nos parece sustentável a posiçao defendida
separado judicialmente pessoas e bens, por sentença que já tenha transitado
ou venha a transitar em julgado, ou ainda se a sentença de divórcio ou sepa Ao contrário do que refere JORGE DUARTE PINHEIRO, Sucessães, pp. 69-70, nao julgamos
ração vier a ser proferida posteriormente àquela data, nos termos do n° 3 do necessário que essa sentença tenha transitado em julgado a data da abertura da sucesslo.
338 Neste sentido, JOAQUIM SOUSA RIBEIRO, “A inconstitucionalidade da limitaçao temporal
art. 1785°”. Actualmente, o divórcio ou a separação judicial de pessoas e bens ao exercIcio do direito a investigacao da paternidade”, na RU 147, n° 4009, Março-Abril 2018, pp.
por mütuo consentimento podem ser igualmente decretados pelo conserva 214-238. Em sentido contrlrio, vejam-se Os Acs. TC 401/2011 (JOAO CURA MARIANO, vencidos
dor do registo civil, nos termos dos arts. 1776°, n°3, e 1794°, pelo que, caso tal JOAQUIM SOUSA RIBEIRO, CUNHA BARBOSA, CATARINA SARMENTO E CASTRO, JOSE
tenha ocorrido o cônjuge nao será igualmente chamado a sucessao. BORGES SOEIRO, VITOR GOMES, GIL GALVAO), de 22/9/2011, e 247/2012 (PAMPLONA DE
OLIVEIRA, vencido GIL GALVAO). 0 Tribunal Constitucional viria posteriormente a tomar posi
0 cônjuge também nao será chamado a sucessão em caso de inexistén
çao no sentido que defendemos, o que fez no Ac. TC 488/2018 (MARIA CLARA SOTTOMAYOR,
cia (arts. 1628° e 1630°), nulidade (art. 1625°) ou anulabilidade do casamento vencidos PEDRO MACHETE e FERNANDO VAZ VENTURA), de 4/10/2018, mas esse Acórdao
(art. 1631°). Nos dois dltirnos casos, haverá, porém, que salvaguardar o regime veio lamentavelmente a ser revogado pelo Ac. TC 394/2019 (JOAO CAUPERS, vencidos CLAUDIO
do casamento putativo, pelo que se o cônjuge estiver de boa fé terá direito MONTEIRO, JOANA FERNANDES COSTA, CLARA SOTTOMAYOR, MANUEL DA COSTA
de suceder, caso a morte do outro cônjuge ocorrer antes do trânsito em jul ANDRADE, CATARINA SARMENTO E CASTRO). de 3/7/2019, demonstrando a dificuldade
da nossa jurisprudéncia constitucional em pôr em causa as opcoes do poder legislativo, mesmo
gado da sentença de anulaçao (arts. 1647° e 1648°). perante situaçoes de evidente lesao dos direitos fundamentais.

182 183
DIREITO DAS SUCESSOES CAP1TULO XI A SUCESSAO LEG 1T [MA.

porJORGE DUARTE PINHEIRO33° e por algurna jurisprudência do Supre ascendentes,


iNo caso de ocorrer a sucessão conjunta do cônjuge e dos
Tribunal deJustica340, que admite a possibilidade de abuso de direito no ônjuge pertencerãO duas terças partes e aos ascendentes uma terça parte
cIcio das acçoes destinadas ao reconhecirnento da fihiaçao, excluindo ao abr
dahenca (art. 2142°, n°1), nào se aplicando assim a regra da sucessão por
do art. 334° o fliho dos direitos sucessórios que a lei ihe reconhece em yin
dessa qualidade. Efectivamente, a vocaçao sucessória é urn efeito legal res Faltaflcl cOnjuge, os ascendentes são chamados a totalidade da herança.
tante da filiaçao estabelecida, que so pode ser afastada através dos iflstjtU sses casos, aplicam-se totalmente as regras da preferéncia por graus de
da indignidade e da deserdaçao, näo do abuso de direito, constituindo rentesco e da sucessão por cabeça (art. 2142°, n°3)342.
as
aplicaçao neste caso urna verdadeira discriminaçao dos flihos nascidos
f
do casamento, que a Constituiçao expressamente proIbe341.
6. A suCesSao exciusiva do cônjuge.
5. A sucessão do cônjuge e dos ascendentes. j 0 art. 2144° estabelece que, na falta de descendentes e ascendentes, o cônjuge
e chamado a totalidade da herança. Esta disposiçao tern, no entanto, gerado
A segunda classe de sucessIveis surge no caso de nao existirem descende ma contrOVérSia sobre o que se entende por falta de ascendentes. PIKES de
tes (art. 2142°, nol), abrangendo o cônjuge e os ascendentes, ou qualquer ur JMA e ANTUNES VARELA, CARVALHO FERNANDES, CAPELO DE
destes. JOUSA e JORGE DUARTE PINHEIRO entendem que a sucessão exciusiva
Da mesma forma que verificámos na classe anterior, o vInculo de casa do cônjuge apenas ocorre se não houver urn ünico ascendente que nao possa
mento tern que se manter vigente na data da abertura da sucessão para qu ou não queira aceitar a herança, independentemente do grau do ascendente,
o cônjuge possa suceder. E os ascendentes sO sucedem se o vInculo de filia i vez que o art. 2143° estabelece urn acrescer entre ascendentes343. Pelo
cao se encontrar estabelecido, ainda que o seu estabelecimento em data contrário, OLIVEIRA ASCENSAO entende que, nos termos do art. 2143°,
posterior tenha eficácia retroactiva, nos termos do art. 1797°, n°2. No entanto acrescer apenas se verifica em relaçao aos ascendentes que concorrarn a suces
o art. 1856° estabelece que a perfilhaçao de filho falecido so tern efeitos a favor
dos seus descendentes, o que impede os ascendentes de serem chamados a f
sao, pelo que em caso de repüdio dos ascendentes em urn grau,
O acrescer para o cônjuge e não para os ascendentes de grau anterior°44.
essa sucessão ou a sucessão dos seus descendentes. Já a inibiçao das reponsa Parece-se, no entanto, que o objectivo do art. 2143° é estabelecer que o
bilidades parentais não exclui os pais inibidos de serern chamados a sucessão acrescer para o cônjuge apenas ocorre se nao existir qualquer ascendente,
dos seus flihos. seja qual for o seu grau. Na verdade, já sendo a quota do cônjuge tao elevada
quando concorre corn ascendentes, não se justifica que a mesma seja reforçada
Cfr. JORGE DUARTE PINHEIRO, “Inconstitucionalidade do Artigo 1817°, n.° 4 do Codigo corn o acrescer, em lugar de este beneficiar os ascendentes de grau anterior.
Civil — Anotaçao Ac. do TRC de 19.10.2004, Proc. 718/04’ em CDP n° 13 (Janeiro/Março, 2006), • Assim, esse acrescer apenas se verificará em caso de inexistência de qualquer
pp. 65-71 e “Inconstitucionalidade do Artigo 1817°, n.° 1 do Codigo Civil
— Anotaçao Ac. do TC ascendente, independenternente do seu grau.
23/2006 de 10.01.2006, Proc. 885/05” em GDP n° 15, Julho/Setembro 2006,
PP. 46-52. Esta posi
çao foi mantida pelo autor em 0 Dire ito da FamIlia Contempordneo, 6° ed., Lisboa, AAFDL, 2019,
pp. 125 e ss., maxirne 129 e ss.

f
342
Diferente era a soluçao consignada no Anteprojecto, em que o art. 132°, 2° previa que
340
Cfr. Ac. STJ 9/4/2013 (FONSECA RAMOS, vencido SALAZAR CASANOVA), processo “achando-se porém os ascendentes no mesmo grau, caberá metade dos bens disponIveis a uma
187/09.7TBPFR.P1.S1, publicado na ROA 73 (2013), I, pp. 361-395 e em CDP no 45 (Janeiro/Marco linha e a outra nietade a outra linha”. Cfr. INOCENCIO GALVAO TELLES (org.), Direito das
2014), pp. 32-49. Sucessães, Tra bathos Preparatórios, p. 63.
Cfr. MENEZES LEITAO, “Anotação ao Acórddo do S.T.J. de 9/4/2013”, na ROA 73 (2013), I, Neste sentido, cfr. FIRES DE LIMA / ANTUNES VARELA, Código, VI, sub art. 2143, n°3,
pp.396-399. Em sentido contrário cfr. CRISTINA DIAS, “Investigaçao da paternidade e abuso de
p. 239, CARVALHO FERNANDES, Sucessães, pp. 379-380, CAPELO DE SOUSA, Sucessães, I,
direito. Das consequências jurIdicas do reconhecimento da paternidade Anotaçao ao AcórdSo

p. 250 e nota (628) e JORGE DUARTE PINHEIRO, Sucessães, pp. 72 e nota (117).
do S.T.J. de 9.4.2013, Processo 187/09”, em CDP n” 45 (Janeiro/Marco 2014), pp. 49-59 (56 e ss.). Cfr. OLIVEIRA ASCENSAO, Sucessães, pp. 209-210.

184
185
DIREITO DAS SUCESSOES CAPITULO XI A SUCESSAO LEGITIMA

7. Sucessão dos irmãos e seus descendentes


do Estado.
Faltando o cônjuge e os parentes na linha recta, são podem ficar scm sucessor, determina o art. 21520 que,
chamados a suc aveZ que osbens não
legItirna os irmãos e representativamente os flihos deste chamado a heranca
2145°). Se a sucessão concorrerem vários irmãos a
s (art. 2133, - de conjuge e de todos Os parenteS sucesSIVeis, é
divisao faz-se em pri Apesar de a lei referir que o Esta do tern, relat ivam ente a heranca,
pio por cabeça (art. 2136°), a men
os que se verifique o concurso entre direitos e obrigacöes de qualquer outro herdeiro (art. 2153°),
germanos e irmãos unilaterais (consanguIrieos e irm
exactalnente igual a dos res
os representem, caso em que o quinhao destes ültim
uterinos), ou os flihos [tuacão do Estado enquantO herdeiro nao é
os é igual a metade tes herdeiros.
prirneiros (art. 2146°).
ectivamente, a aquisicãO da herança pelo Estado, como sucessor leg1-
Faltando os irrnãos do falecido, são chamados necessidade de aceitacãO, não podendo o
a sucessão represent o, opera-se de direito, scm
mente os respectivos descendentes, ou seja, os sobr inpossibilidade de repüdio pelo Estado
inhos, os sobrinhos-net( tado repudiã4a (art. 2155°). A
sobrinhos-bisnetos e os sobrinhos-trinetos. Ha luga
r naturalmente a aplicaç mpree5e pelo interesSe püblico em evitar que Os bens da herança fiquem
da regra da preferéncia de grau (art. 2135°), scm preju
sentaçao, sempre que a ele haja lugar (art. 2138°). Uma
Izo do direito de rep abafldn caso em que poderiam ser facilmente perdidos e subtraIdos por
necessidade de
art. 15820 o parentesco na linha colateral so releva
vez que nos ‘rceiro, em prejuiZO dos credores da herança. Não havendo
ate ao sexto grau, a possL itacão, também nao posSlVel ao Estado a aceitacàO a benefIcio de inven
dade de sucessão dos descendentes de irmãos term ma naturalmente
nos sobrinhos-trinetos°4 rio, ainda que os bens que cornpoem a herança venham a ser
urados no prOcessO de liquidacao de heranca vaga, pelo que o Estado tam
8. Sucessão dos outros colaterais ate ao quarto gra ém nunca terá que pagar dIvidas para além das forças da herança.
u. Em consequeflcia, em relaçao ao Estado não ha lugar a aplicacão do regime
declaracão
Determina o art. 2147° que, na falta de herdeiros I dos arts. 2050° e ss. e 2062° e ss., os quais são substituldos pela
das classes anteriores, saol judicial de heranca vaga em benefIcio do Estado (art. 21550), considerandose
chamados a sucessão os restantes colaterais ate
sempre os mais próxirnOs. Estão assirn neste caso
ao quarto grau, preferindo
l a heranca jacente ate a ocorrêflcia dessa declaracão judicial (art. 2046°).
em causa apenas os tios, os A declaracão judicial da herança vaga em benefIcio do Estado é efectuada
tios-avós e Os primos direitos, não adquirindo quai
squer direitos sucessórios nos termos do processo especial da liquidacão da herança vaga em benefIcio
Os restantes colaterais a partir do quinto grau. Em virtu
réncia de grau, os tios preferirão aos
de da regra de prefe do Estado (arts. 938° e ss. CPC), o qual possui duas fases: uma fase declarativa,
tios-avós e aos prirnos direitos. Já
se sobre que se destina a declarar a heranca vaga para o Estado e uma fase executiva,
viverem ao autor da sucessão tios-avós
e primos direitos, parece que amb
os subsequente a esta, em que se procede a liquidacão da referida heranca.
concorrerão a sucessão, urna vez que nao ha prefe
rência de grau entre des. No âmbito dafase declarativa, este processo prevé que, no caso de heranca
0 art. 21480 considera neste caso irrelevante o dupl
minando que a partilha faz-se por cabeça, inde
chamados a sucessão ser duplamente parente
o parentesco, deter
pendentemente de algum dos
do falecido. Efectivarnente,
I jacente, por não serem conhecidos os sucessores, por o Ministério Püblico pre
tender contestar a legitimidade dos que se apresentarem ou por os sucessores
conhecidos haverem repudiado a herança, são tomadas as providências neces
e conforme acima se referiu, se o autor da suce
ssão deixar primos do lado sárias para assegurar a conservacãO dos hens e em seguida são citados, por
paterno e do lado rnaterno, mas urn dos seus prirn
os o for de ambos os lados, éditos, quaisquer interessados incertos para deduzir a sua habilitacão como
porque urn irrnão do seu pai casou corn uma irma
da sua mae, este seu primo sucessores dentro de 30 dias depois de findar o prazo dos éditos (art. 938°,
herdará por cabeça, exactamente nos mesmos term
os que os restantes primos. n°1, CPC). No caso de algum interessado se habilitar a heranca, a mesma pode
ser objecto de contestacãO pelo MinistérlO Pñblico ou por qualquer outro
Em sentido contrário, invocando o art. 2O42 infine
sustenta DANIEL MORAlS, Direito Sucessd interessado (art. 9382, n°2, CPC), seguindo-se nesse caso o processo comum
rio, p.6O, não haver qualquer limite de parentesco
em relaçao a sucessão de descendentes de irmãoS. declarativo cart. 9382, n°2, CPC).
186
187
DIREITO DAS SUCESSOES

No caso de ninguém aparecer a habilitar-se


os que se apresentem corno sucessores, a her
a herança ou decaire CAPITU-U Xfl
ança e dedarada
o Estado (art. 9392, n21, CPC). A SUCESSAO TESTPLMENTARIA
No âmbito da fase executiva, este proces
so estabelece que, urna
declaração do direito do Estado, procede-se Vez
a liquidaçao da herança,
as dIvidas ativas, vendendo-se judicia cobr ar
lmente os bens, satisfaz
passivo e adjudicando-se ao Estado o efld(
remanescente (art. 9392,
Compete ao Ministério Püblico instaur n22, c
ar as acçoes relativas a cob
dIvidas activas da heranca (art. 9392, ra,
n23 CPC), sendo os credores
citados para reclamar os seus créditos da her
, por apenso ao processo de
(art. 94O CPC). Nos termos do art. 322 liquic’
a prescrição dos direitos da ra1idades.
ou contra ela nao se completa antes de her
decorridos seis meses depois
pessoa por quern ou contra quem os dire de h
itos possam ser invocados346.
cessà0 testamefltáa consiste naquela espécie de sucessão em que a desig
osucessónia resulta de urn testamento. Trata-se assirn de uma modalidade
ucesSão voluntaria, resultante da autoflomia privada do autor da sucessào.

2. ConCeito de testameflto.

;tarnentO surgeflos definido no art. 2l79, n°l, corno “o acto unilateral e revo
vel pelo quai urna pessoa dispöe, para depois da morte de todos os seus bens
u de parte deles”. A definicâo legal não parece, porérn, integralmente correcta.
Em prirneirO lugar, o testarnentO não é urn simples acto mas urn verda
iro negócio jurIdic0 na medida em que, tirando as lirnitacoeS resultantes
da sucessão iegitimária o testador tern plena liberdade de estipulacão dos
eltos juridicos da sua sucessao.
Em segundo lugar, o testamento não é apenas urn acto de disposicão de
‘ens, admitindo o art. 2179, n22 a ossibi1idade de o testarnentO inserir dis
posicoes de carácter nao patrimonial. EfectivaiTlente, a lei admite que o tes
tamento possa conter a declaracãO de maternidade cart. 114, n2l, CRC), a
perfilhacäo (art. l8S3, b)) ou a designacão de tutor (art. 1928, n23).
Preferirnos por isso uti1izaco a definicão de OLIVEIRA ASCENSAO,
igualmente seguida pot JORGE DUARTE PINHEIR0, que qualifica o tes
tamento como urn “negócio urIdico unilateral pelo qual alguérn procede
a disposicOes de ültirna vontade”347.
346
Ta! não implica, no entanro, o reinicio
do prazo de prescricao, relativamente
critos em vida do falecido. Neste sentido, a créditos já pres
cfr. Ac. STJ 22/9/2016 IANTON
processo 125/06.9TBMMV-C.CI.S1. IOJOAQUIM PIçARRA, Cfr. OLIVEIRA ASCENSAO, Sucessöes, pp.43 e 293 e JORGE DUARTE PIN HEIRO, SucessOeS,
p.83.
188
18’)
DIREITO DAS SLCESSOES CAPTULO XII A SUCESSAO TESTAMENTARIA.

3. CaracterIstjcas do testamento. sucessão (verernos que pode ser


ssIvel do testamento corno instrurnento de
sua fundamental negociabilidade”350.
ado para outros fins). 0 que acentua a
3.1. Generalidades. verdade, embora o testador esteja de alguma forma constrangido na
I Naliberdade de estipulaçao em virtude da protecçao conferida aos her
ja
o testamento possui enquanto negócio jurIdico as seguintes caracteristic, ros legitirnários, rnantém nos limites da sua quota disponIvel
uma liber
E urn negócio jurIdico unilateral, não receptIcio, inortis causa, gratuito, form de de estipulacão plena, o que justifica a afirrnaçao do carácter negocial
individual, pessoal e livremente revogável. otestameflto.
Exarninemos sucessivamente estas caracterIstjcas. E pacIfico que o testamento é urn negócio juridico unilateral porque so
u urna parte, que 0 prOprio testador. Efectivarnente encontram-se hoje
3.2. 0 testamento como negócio jurIdico unilateral. :rapassadas posiçoes corno a de CIIVIBALI, que sustentou que o testamento
ria urn contrato, urna vez que, como acto de disposiçao de bens, teria sem
o testarnento constitui antes de tudo urn acto de autonornia privada do aut re que ser aceite pelo herdeiro OU Iegatario para que des pudessem adquirir
da sucessão, ern que coexistern as liberdades de celebraçao e de estipulaça bens que o testador lhes atribuiu. Seria assim necessário o consentirnento
sendo consequentemente urn negócio jurIdico. Não parecem de facto just e duas parteS para que o negócio produzisse efeitos, como é tIpico dos con
ficar-se posiçOes como a de LIPARI que nega que o testamento seja urn ac ratos. Para este autor, o facto de o consenso nao ser actual não constituiria
de autonomia privada por considerar que o mesmo nao determina a voca stáculo ao carácter contratual do testarnento, urna vez que tal ocorre sern
sendo apenas urn elemento da suafacti species corn a mesma funçao da rela re noS contratos entre ausentes, so se considerando no testarnento o contrato
çao familiar na sucessão legItirna. A seu ver, por esse rnotivo, o testan )ncluldo no mornento em que, após a morte do testador, o sucessor aceita a
tambdm nao poderia ser urn negócio jurIdico, iima vez que dele não result .isposicão. A revogabilidade do testamento tambérn não seria obstáculo ao
nenhuma relaçao jurIdica entre o testador e os herdeiros ou legatários de ;eu carácter contratual, uma vez que, sendo a proposta apenas aceite corn
nados, sendo irnpossIvel por isso encontrar qualquer efeito especIfico directc a morte do testador, natural seria que ele conservasse a possibilidade de revo
resultante da declaraçao testamentária348. 0 facto de o testamento poder n ar o testamento durante a sua vida351.
conter qualquer disposiçao patrimonial (cfr. art. 58711 CCit, correspondente Esta construçao não pode, porém, proceder. Na verdade, o facto de o suces
ao nosso art. 2179, n2) tambérn demonstraria a ausência do seu carácter sIvel designado poder aceitar ou repudiar a disposiçao testamentária não o
negocial349. converte em contraparte no testarnento, uma vez que, por forca do mesmo,
0 erro desta tese foi, no entanto, demonstrado entre nós por NAZARETH após a abertura da sucessão e antes da aceitaçao o sucessIvel adquire logo o
LOBATO GUIMARAES, que afirma que “em funçao do que nos parecern ser direito de suceder, cujo contefldo nao pode modificar (art. 2054°, n°1 e 2064°,
as necessidades da sucessão, admitirIarnos, sem ddvidas, que o testarnento tern n°1). Não e por isso necessária qualquer aceitaçao para produzir os efeitos do
funçoes negociais: destina-se a regular uma situação de acordo, em princIpio I testarnento, ja que a designacao e a vocaçao sucessória se verificam indepen
corn a vontade do autor do acto, a regular urna situaçao pela normativa posta dentemente de aceitaçao. Uma vez que o testamento produz os seus efeitos
pelo autor do acto. Visto o que na sucessão é não inevftavelrnente legal, vista apenas em virtude da declaraçao do testador, podendo ser também revogado
a margem que se pretende deixar aos particulares, nao ha diivida que estes unilateralmente por este, a qualificaçao que ihe compete é a de negócio uni
podern intervir na sucessào. E visto que no ha na sucessão aquela lineari lateral e não a de contrato.
dade que se dizia caracterIstica, e hoje muito mais diversificado o conteddo

350
Cfr. MARIA DE NAZARETH LOBATO GUIMARAES, “Testamento e autonomia (algumas
348
Cfr. NICOLO LIPARI, Autoriomia privata e testamento, Milano, Giuffrè, 1970, pp. 48 e 162-163. de um livro de LIPARI’, na RDES 18 (1971), n0s 1-2-3-4, pp. 1-109 (6),
flotas criticas a proposito
Cfr. LIPARI, Autonomia, p. 68. “
Cfr. ENRICO CIMBALI, “II testamento è contratto?”, emIl Filangieri 9 (1884), I, pp. 265-274.

190 191
DIREITO DAS SUCESSOES
CAPITULO XII A SUCESSAO TESTAMENTARIA.

3.3. 0 testamento como negócio jur


Idico nao rec eptIcio.
;l, OS terflTos do art. 134° e 135° do Codigo Penal cart. 6° b) da Lei
O testamento é ainda urn negócio não é ma nifesto que este negóciO produz efeitos em vida do seu autor,
receptIcio, urna vez que ondendo por isso a urn verdadeiro testamento.
de chegar ao conhecimento de out não ne
rem para produzir efeitos,
estes logo que a vontade do tes verjfic I
tador é manifestada pela -

(art. 224, n1, infine). forma 0 teSt0 comb negócio gratuito.

Em consequéncia, o testarnento
considera-se válido e eficaz
momento em que é celebrado por a tamento e urn negócio gratuito, uma vez que contém disposicoes patri
alguma das formas previstas parid0
sar de a concretizaçao das dispos
içoes testarnentárias estar
na lei. Ape.
I s em beneficjo de oUtrenT sern qualquer contrapartida por parte do
morte do autor da sucessão e da depend-’—’ fjciáriO. A disposicäo testamefltá’ja pode estar sujeita a encargos, nos
aceitaçao dos charnados, tal
testamento comece a produzir im
ediatarnente os seus efeitos.
não altera c os do art. 2244°, mas esteS representam apenas uma restricãO a libera
o testamento e a aceitaçao da suc
essão são dois actos unilatera
Efectiva de e nãO uma contrapartida por parte do beneficiário.
autónomos, resultando imediata is distji
rnente do testamento a design
e apenas sendo possIvel a aceitaç aça o suces 3.6.0 testamento como negócio formal.
ao apds a verificaçao da vocaçã
em virtude da abertura da sucessã o sucess
o corn a morte do seu autor352.
dos devem aceitar ou repudiar a
sucessão, rnas tal não constitui
Os cha: Otestamento e urn negócio formal, urna vez que a lei prevê formas especiais
perfeiçao, nem sequer de eficácia
do testarnento, a qual se res
requisit( Lra 0 testamento, so sendo o mesmo válido se obedecer a uma das formas
naçao sucessdria, que permite pro ume a des ..mente previstaS (cfrs. arts. 2204° e ss.).
duzir, corn a morte do autor
a vocaçao sucessória353. da suces
3.7.0 testamento como negóciO individual.
3.4. 0 testamento como neg
ócio jurIdico mortis causa.
7.1.0 carácter individual do testamellto.
O testamento é urn negócio jurIdi testamento é urn negócio individual, uma vez que a lei apenas admite que
co mortis causa porque os seus
nas se produzem por morte do efeitos ap bnha urna pessoa como seu autor, sendo proibida por lei a realizacão de urn
testador. Não constitui por isso
deiro testarnento o denominado urn verd1 stamento em que haja rnais do que urn testador. Efectivamente, no art. 2181°
testamento vital, previsto no art
25/2012, de 16 de Juiho, alte . 2 da Lc eda-se odenominado testarnento de mao comum, ao se proibir que no mesmo
rada pela Lei 49/2018, de 14 de
constitui urn documento uni Agosto, o qua LctO testem duas ou mais pessoas, quer em proveito próprio quer em favor
lateral e livrernente revogável
uma pessoa estabelecer direct que permite a .e terceiro. Desta norma resulta que o testameflto, em ordem a ser garan
ivas antecipadas de vontade, no
aos cuidados de saüde que des que concern ido o pleno exercIcio da liberdade de testar, apenas pode ter urn ünico autor,
eja receber, ou não deseja recebe
por qualquer razão, se encontrar r, no c......., sendo nub o testamefltO em que apareca outrem igualmente a participar na
incapaz de expressar a sua von
e autonomarnente. Esse docum tade pessoal feitura do acto354.
ento e sujeito a forma escrita e
especiais (art. 3Q da Lei 25/201 a form alidades Segundo explica CUNHA GONcALVES, a proibicao dos testarnentOs
2), tendo urn prazo de eficácia
conta da sua assinatura (art. 7 de cinco anos a de mao cornurn e justificada pelas seguintes razöes: “a) quando o testarneflto
da Lei 25/2012). Uma vez que essa
respeitam aos tratarnentos me s directivasi sse cerrado, a morte de urn dos co-testadores obrigaria a abertura daquele e
dicos a receber pelo doente (cfr
da Lei 25/2012) e não podem des . art. 2, n92, a consequente revelacão davontade do outro; b) o testamentO de mao comum,
tinar-se a provocar a sua morte
não natural
Cfr. CAPELO DE SOUSA, Suce 3S4
ExceptuamSe naturalmeflte as intervencoeS exigidas por razOes de ordern formal como a do
353
ssães, I, p. 168.
Cfr. GUILHERME DE OLIV notário ou das testemunhas e, no caso de o testamento cerrado, a possibilidade de o mesmo ser
EIRA, 0 Testainento, p. 9.
escrito por outra pessoa a rogo do testador (art. 22OS, nI).
192

193
DIREITO DAS SUCESSOES CAPITULO XII A SUCESSAO TESTAMENTARIA

mormente quando as disposiçoes fossem recIprocas, facilitava


as capta estâ-Se perante urna aplicacao particular da regra do art. 293°,
pois era usado, sobretudo, pelos cônjuges, urn dos quais se impun ste caSo, negócio de tipo e conteüdo
ha ao o itindose a conversão do negócio nub nurn
c) convertia-se o testamento recIproco nurna espécie de contrato demonstrar que a vontade hipotética das
sucess rente, scm que seja necessârio
mas, o co-testador sobrevivo, depois de aproveitar os benefIcios d Efectivamente, as razOes da proibicao da doaçao
do f tes iria nesse sentido359. irregovável, pelo
cido, podia revogar as suas disposiçoes, faltando aos compromissos radicam no seu carácter contratual e, em princIpio,
toma r morte
d) ficava prejudicada a espontaneidade e liberdade do testador”355. revogável (art. 2179°, n°i)
e, sendo 0 testamto urn negócio unilateral e
Salienta-se, no entanto, que esta proibiçao apenas inviabiliza morte possa ser objecto dessa conversão.
que Os tes h obstácUlo a que a doação por
mentos sejam realizados num ünico acto, tendo assim que ocorrer
£xigese, no entanto, que tenham sido
observadas as formalidadeS dos
em a
distintos. Tal não impede, por isso, que existam testamentos recIpro que formalidades são essas.
cos, sefl amentos, o que levanta a düvida de saber
ate frequente a sua realizaçao entre Os cônjuges, que habitualmente DE LIMA e ANTU NES VARELA e para
cOflC ra GALVAO TELLE5, PIRES
tarn entre si as suas disposiçoes testarnentárias para evitar que se irnplica que a doação seja
contra pT1STA LOPES, a exigencia destas formalidades
garn356. No entanto, ao se exigir a sua realizaçao nela intervenham duas testernunhas, por força
em dois actos consegue. ita por escritura püblica e que
evitar a influência que urn dos testadores poderia exercer sobre o Codigo do Notariado360. Mas a exigência das testemu
outro, be p art. 67°, n°1 a) e n°3 do
como manter em segredo as disposiçoes testarnentárias de cada ASCENSAO, que sustentOu que a regra do
urn deJ 1as foi contraditada por OLIVEIRA
que alias podem continuar a ser unilaterairnente revogadas, assirn se literalmente, uma vez que seria impossIvel
evitanc rt. 9460, n°2, não pode ser entendida
a correspectividade entre os testamentos. testarnentoS, dado que so urn tes
Lma doacãO revestir todas as formalidades dos
doação tenha sido feita por escri
amento opodetia fazer, bastando por isso que a
3.7.2. ExcepçOes ao carácter individual do testamento. sua posicão foi posteriormente
ura pdblica ou forma notarial equivalente°°’. A
3.Z2.1. Generalidades. FERNANDES°63.
uida por PAMPLONA CORTE-REAL°°2 e CARVALHO
0 carácter individual do testarnento adrnite, porém, várias excepçOes exigir neste
que PensarnoS ser esta ültirna a meihor soluçao. Efectivamente,
correspondem as seguintes: equivaleria a tornar partica mente
caso todas as formalidades dos testamentos
n°2. Por outro
impossIvel qualquer hipOtese de conversão ao abrigo do art. 946°,
a) a conversäo da doaçao por morte em testamento; nao se apresenta como
lado, a verdade é que a interveflcão das testemunhas
b) a autorizaçao do cônjuge para a disposiçao de coisa certa ou determ admite a sua dis
L sencial, dado que o art. 67°, n°2 do Codigo do Notariado
nada do patrimonio conjugal; as conseguir.
pensa pelo notário, no caso de haver urgéncia e dificuldade em
c) a inclusao de disposiçoes testamentárias na convençao antenupcial3S7 Parece, por isso, suficiente que a doaçao revista a forma de escritu ra püblica.
9460,
Daqui resulta consequentemente que a conversão ao abrigo do art.
Examinemos sucessivamente estas excepçOes. testarnento, na medida
n°2, constitui uma excepcäo ao carácter individual do
outorgantes possa
em que possibilita que urn negOcio em que participam dois
3.7.2.2. A conversão da doaçaopor morte em testamento. valer como testamento.
A primeira excepçào ao carácter individual do testarnento é a conversão da
doaçao por morte em testamento. Efectivamente, a lei determina que, apesar
FERNANDES, A conversãO
de nula, a doaçao por morte pode ser havida como disposiçao testamentária Cfr. OLIVEIRA ASCENSAO, Sucessães, pp. 94-95 e CARVALHO
, dosnegociosjurIdiCOSCiW5 Lisboa, Quid ions, 1993, p.591.
se tiverern sido observadas as formalidades dos testamentos (art. ANTUNES VARELA,
946, n2)358. 060
Cfr. GALVAO TELLES, SoocessSes. Porte geral, p.2O PIRES DE LIMA /
Código, 11 sub art. 946, n03, p. 249 e BAPTISTA LOPES, Das doaçães, p. 37.
Cfr. CUNHA GONçALVES, Tratado, IX, p. 518. 361
Cfr OLIVEIRA ASCENSAO, SucessOes, p. 95.
Cfr. GALVAO TELLES, Sucessão testamentdria, p. 18. autor sustenta tratar-se
362
Cfr. CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL, .Sucessöes, pp. 79-80. Este
Cfr, JORGE DUARTE PINHEIRO, Sucessoes, pp. 85-86. u’igamos correct o.
358
de entendimento pacifIco, o que roao
Esta soluçao ja resultava do art. 1457 do CC. 1867. 363
Cfr. CARVALHO FERNANDES, Conversão, pp. 596 e ss.

194 195
DIREITO DAS SUCESSOES 11 CAPITULO XII A SUCESSAO TESTAMENTARIA.

3.Z2.3. A autorizaçao do conjugepara a disposicao de coisa certa e deternhinada 3.8.0 testamentO como negócio pessoal.
incluIda no patrimonio conjugal.
A existência de casamento nao afecta a liberdade de testar dos cônjuges, refe. 3.8.1. 0 carácter pessoal do testamento.
rindo expressamente o art. 1685, n1, que cada urn dos cônjuges conserva a o testarnento é urn negócio pessoal, uma vez que a lei proibe que
o
faculdade de dispor, para depois da morte, dos hens próprios e da sua mea.. seja efectuado por representante ou possa estar dependente do arbitrio de
çao nos hens comuns, sem prejuIzo das restriçoes impostas por lei em favo1 oUtren, quer pelo que toca a instituiçao de herdeiro ou norneação de legatario,
dos herdeiros legitimários. quer pelo que respeita ao objecto da herança ou do legado, quer pelo que per
No entanto, relativamente aos bens comuns, o cônjuge, uma vez que ape.. tenCe ao cumprimento ou nãO cumprirnento das suas disposiçoes (art. 2l82).
nas é titular da sua rneação, não pode dispor de coisas certas e determinadas1
Em consequência, o art. l68S, n2, estabelece que a disposiçao que tenha por 3.8.2. Excepçöes ao carácter pessoal do testamento.
objecto coisa certa e determinada do património comum apenas dá ao con.I 3.8.2.1. Generalidades.
templado o direito de exigir o respectivo valor em dinheiro. Daqui resulta que Existern, porém, algumas excepcoes ao carácter pessoal do testamento. São
a disposiçao de coisas certas e determinadas do patrimonio cornum, emboral estas a atribuiçao a terceiro da repartiçao da herança ou legado quando seja
seja válida quanto ao valor, é nula quanta a substância, não atribuindo ao institulda ou norneada urna generalidade de pessoas (art. 2l82, n2, a)),
beneficiário o direito de reclamar essa coisa. a atribuicao a terceiro da nomeaçao do legatário entre pessoas determinadas
0 art. 1685, n3 b) reconhece, porém, ao beneficiário o direito de recla I (art. 2l82, n 2 b)), a escolha do legado pelo onerado, pelo legatário ou porter
mar a coisa em espécie se a disposiçao tiver sido autorizada pelo outro ceiro (art. 2183) e as substituiçoes pupilar ou quase-pupilar (arts. 2297 e ss.).
cônjuge por forma auténtica ou no próprio testamento. Neste ültimo caso, Examinernos sucessivamente estas situaçOes.
a lei admite assim a intervenção do outro cônjuge no testarnento em ordem
a conferir validade ao direito do beneficiário em relaçao a coisa em espé 3.8.2.2. A atribuiçao a terceiro da reparticao da herança ou legado quando seja
cie, o que constitui igualmente urna excepçao ao carácter individual do
testamento.
I institulda ou noineada uniageneralidade depessoas.
A primeira excepção ao carácter pessoal do testamento é a possibilidade de
o testador cometer a terceiro a repartiçao da herança ou do legado, quando
3.Z2.4. A inclusao de disposiçoes testamentdrias na convençao antenupcial. institua ou nomeie uma generalidade de pessoas (art. 2l82, n22, a)). Trata-se
A ültima excepçao ao carácter individual do testamento é a inclusão de neste caso de urna situação em que o testador institui uma generalidade
disposiçoes testamentárias na convençao antenupcial. Efectivamente,. de pessoas como herdeiros ou legatários, atribuindo por exemplo urn sexto
o art. 17O4 possibilita aos esposados que instituarn urn terceiro como da sua herança aos membros de um determinado clube, OU os livros da sua
herdeiro ou o nomeiem legatário na convenção antenupcial, atribuindo biblioteca jurIdica aos advogados de determinada comarca. Nesse caso,
-Se, no entanto, cariz meramente testamentário a essas disposiçoes se nao a disposiçao testarnentária nao se encontra completa, faltando a repartiçao da
se tratar de pessoa certa ou determinada ou se esta nao intervier no acto herança ou do legado entre os beneficiários, sendo por esse motivo permitido
como aceitante. Essa soluçao constitui assim mais uma excepção a regra ao testador atribuir a terceiro a faculdade de fazer essa repartiçao. Essa situa
que proIbe os testamentos de mao cornum, ao permitir que os esposados cão constitui uma excepçao ao carácter pessoal do testamento na medida em
façarn testarnento em benefIcio de terceiros no mesmo acto (a convenção que se admite que urn terceiro possa especificar mais precisamente o conteüdo
antenupcial). A lei adrnite inclusivarnente que nesse caso fique consig da disposiçao testarnentária.
nada na convençao antenupcial a correspectividade dessas disposiçOes, Nesse caso, pode qualquer interessado requerer ao tribunal a fixaçao de
caso em que a invalidade ou ineficácia de uma das disposiçoes produz urn prazo para a repartiçao da herança ou legado sob a cominaçao de a repar
a ineficácia da outra (art. 17O6Q). tiçao pertencer a pessoa designada para o efeito pelo tribunal (art. 2182, n3).

196 197
DIREITO DAS SUCESSOES CAPTULO XII A SUCESSAO TESTAMENTARIA

3.8.2.3. A nomeaçao do legatdrio de entrepessoas determinadaspelo


A segunda excepção ao carácter individual do testamento é a
de o testador determinar a terceiro a escoiha do legatário
I
testador
possjbjlj(’
tes de perfazer os
dezoito anos de idade. Na segunda situação essa facul
Lde é igualmente exercida
pelo progenitor, sern distinção de idade, no caso
incapaz de testa r em conSeqUencia de uma sentenca de acorn
por aquele determinadas (art. 2182, n22, b)). Esta soluçao
entre pessc Le o flihO ser
legal do Cod- nhament0. Em ambos os casos se verifica assim uma excepção ao carácter
Civil Je 1966 revogou o Assento do STJ de 21 de Julho de 1944 que compete ao
o art. 174O, ünico do Codigo Civil de 1867 estabelece
que, perar ssoal do testameflto, urna vez que a faculdade de testar,
“o testador nao pode encarregar outrern de escoiher herd
u a soluçao de e exercida pelo seu progenitor.
eiro ou legata .. Exarninemos corn mais detaihe as substituicöes pupilar e quase-pupilar
ainda que indique as pessoas de entre as quais a esco incapacidades testamentárias.
lha deve ser feita” a proPOSt0 das
Actualmente a Iei continua a vedar ao testador a possibilid
ade de encarr
gar outrem de escoiher herdeiro, mas já lhe permite a nom revogáVel.
desde que indique as pessoas de entre as quais a escoiha
eaçao de legataj •9. 0 testameflto como negóCiO
deve ser efectuada I
Neste caso, pode igualmente qualquer interessado requ
erer ao tribun: o testamento é urn negóciO revOgável, uma vez que otestador pode revogá-lo
a fixação de urn prazo para a nomeação do legatário sob 2179Q, facu
nel), seja no todo ou em parte, a que,
ldade
a corninaçao de a ‘
nquafl0 for vivo (art.
distribuiçao do legado ser feita por igual de entre as pess 2311, n1)365
tenha determinado (art. 2182, n3).
oas que o testadoj’ 1ali5, 0 meSmo não pode renunciar (art. .
I Esta carac teris tica do testa men to e, poré m, cont estada por JORGE
DUARTE PINHEIRO, atenta a consagracãO da irrevogabilidade da perfi
3.8.2.4. A escoiha dolegadopelo onerado,pelolegatdrio ouporterc
eiro. lhacão nos termos do art. 1858g. Não nos parece, porém, que tenha razão.
A terceira excepçao ao carácter individual do testamen
de o testador determinar a escolha do legado pelo oner
to é a possibilidade o testamento é eminentemente revogável, face a sua natureza de disposicão
ado corn o encargo, de ültirna vontade, proibindo mesmo a lei a estipulacao da irrevogabilidade
pelo legatario ou por terceiro, desde que indique o fim do legad
o e o género ou a renñncia a facukiade de revogacãO (art. 2311). Mesmo o testamento de
ou espécie em que ele se contém (art. 2183). Será, por exemp
lo, o caso de a onde conste uma perfilhacao e revogável, como alias expressamente refere o
testadora determinar o legado de uma das suas jOias a uma
sua amiga, deter- art. l858, ocorrendo apenas que nesse caso a revogacãO do testamento não
minando, porém, que competirá ao herdeiro onerado, a sua
própria amiga ou prejudica a perfilhacão.
a urn terceiro, a escolha da jOia a receber.
A lei determina a aplicaçao neste caso do disposto no art.
2182, n3, corn
as necessárias adaptaçoes (art. 2183, n°2). Parece assirn
que qualquer inte 4. Forma do testamento.
ressado poderá requerer ao tribunal igualmente a fixaçao
de urn prazo para
a escolha do legado por parte da pessoa a quem competir
essa escoiha, sob 4.1. Generalidades.
a cominacao de a mesma ser efectuada pelo tribunal.
Conforme acirna se referiu, o testarnento constitui urn negOcio formal,
3.8.2.5. As substituicoespupilar e quase-pupilar.
devendo por isso respeitar a forma prescrita na lei, a quai inclul a necessi
As outras excepcOes ao carácter pessoal do testamento são
as que resultarn dade de realização do testamento por escrito, a intervencão de oficial püblico
das substituiçoes pupilar (art. 2297) ott quase-pupilar
(art. 2298E). Na pri na elaboracao ou na aprovacão do testarnento e a presenca de testemunhas. Já
meira situaçao o progenitor que não estiver inibido
total ou parcialmente se salientou que estas exigênciaS desempenham uma tripla fun cao:prevefltiva,
do poder paternal tern a faculdade de substituir aos
flihos os herdeiros on probatória e executiva. AfuncaopreVefltiva destina-se a assegurar o carácter livre
legatários que bern ihe aprouver, para o caso de os mesm
os filhos falecerem e consciente da declaracão do testador, garantindo que a mesma não é viciada

364
Cfr. Assento STJ 21/7/1944 (LUTZ OSORIO), proces
so 052176. 366
Cfr. CAPELO DE SOUSA, Sucessöes, I, p. 171.
198
199
DIREITO DAS SUCESSOES CAPITULO XII A SUCESSAO TESTAMENTARIA.

por captaçao, fraude ou violéncia. Afunçaoprobatciria destina-se


a demo formaS comuns de testamento
trar externarnente no testarnento qual a ültima vontade do testado 42 As
r. Afun
executiva corresponde ao facto de apenas o testarnento legalmente
fornecer aos interessados urn tItulo eficaz perante os poderes
celebra 2.1. Ge11eta1id
püblicos pa 1forrne acima se salientou, são trés as formas comuns de testamento: o tes
o reconhecirnento e defesa dos direitos dos seus sucessores e para testamento internacional.
a sua re inentO 6b1ico, o testamento cerrado e o
lizaçao prática366.
ExamiflelTbos sucessivamente estas formas comuns de testamentos.
0 art. 22O4 refere que ha duas formas de testamento: o testamento I
püblj
e o testamento cerrado. Ha que referir, no entanto, que em 1975 foi
pelo Decreto n 252/75, de 26 de Maio a convenção relativa a Lei
aprova .2.2. 0 testainentO publico.
testamento püblico, que o art.
Uniform priffl’ forma comum do testameflto é a do
sobre a Forma de urn Testamento Internacional, pelo presenternent notário no seu livro de notas.
e as for.. O5 define como o testarnentO escrito pelo
mas comuns do testamento são trés: o testamento pñblico, o testarn 72, n21, a) do Codigo do Notariado entre
ento cer fectivamente, nos termos do art.
rado e o testarnento internacional. Para além disso, a lei prevé nos notariais encontra-Se urn especIfico,
e ss. uma séric de formas especiais do testarnento.
arts. 2 s livros de notas destinados aos actos
testa
estinado aos testarnentos püblicos e as escrituras de revogacão de
Se for elaborado urn testarnento que não respeite a forma legal, o esses actos
mesm ento. Os mesmos são al inseridos bern corno os averbamentoS a
será considerado nub (art. 22O). regista dos num livro especI fico cart. 72, n2 1,
(art. 11, CN), Os quais são ainda
Uma vez que os testarnentos exigem sempre a forma escrita, nao respeitam (art. 15 CN). 0 testa
válido em Portugal o testamento nuncupativo, realizado por via oral
e 1- d) CN), onde se anotam os actos que a eles
pdblica
perantc mento püblico constitul urn documento auténtico corno a escritura
urn certo ndmero de testernunhas, que atestavam a vontade do testa muito diferen te desta, uma vez
(dr. arts. 3692 e ss. CC) mas tern urn regime
o qual era admitido no Direito Romano e nas OrdenaçOes. interve nção de
que é registado em livro autónomO, e exige, em princIpio, a
Em consequéncia da exigéncia da intervençao notarial para o testam testernunhas instrumentárias (art. 67, n21, a) e n2 3 CN), a qual so pode
ento,
tambérn não é válido em Portugal o testarnento ológrafo, que corresp em as
onde ser dispensath pebo notário, no caso de haver urgéncia e dificuldade
ao testamento escrito e assinado pelo testador pebo seu prdprio punho,
sem conseguir, devendo fazer-se menção expressa desta circunstância no texto
intervenção notarial (art. 22O6, n2s 4 e 5).
(art. 67, n92, CN).
Também nao é considerado válido o codicilo, disposiçao de ültima
von 0 testarflefltO publico não é de acesso püblico, urna vez que tern natureza
tade sem instituição de herdeiro, normalmente utilizado para realizar
legados confidencial ate a morte do testador (art. 32, n°2, CN). Por esse motivo, ao
de pequeno valor e que, por isso, podia ser feito, não apenas pela forma
dos contrário do que acontece corn a generalidade dos documentos arquivados
testamentos, mas também através de documento escrito datado
e assinado nos cartórios notariais, as certidöes rebativas ao conteüdo dos testarnentos
pelo testador. 0 codicilo tern tradiçoes no Direito Portugués, tendo sido
ainda püblicos so podem ser requeridas em vida do testador pebo próprio ou por
previsto nas Ordenaçoes Filipinas (IV.86), mas viria a ser abolido pelo Codigo l64, n2l, a) CN), podendo
procurador corn poderes especiais para o acto (art.
Civil de 1867 que apenas admitiu a celebração de testamentos, indepe
nden ainda as mesmas ser requeridas pebo tribunal, em caso de justificacao da ausén
temente de preverern ou não a instituiçao de herdeiro. 0 codicilo perma 1012).
cia para instauracão da curadoria definitiva dos hens do ausente (art.
nece, porém, admitido pelo Direito Brasileiro (arts. 188U a 1885° do Código ser de acesso
A expressão testarnento pdblico não resulta assim de o mesmo
Civil Brasileiro).
pdblico, rnas antes do facto de ser elaborado por uma entidade dotada de fé
Iremos referir em seguida as várias formas do testamento, começando
pdblica367, sendo por isso considerado urn documento auténtico (arts 363,
pelas formas comuns e depois pelas formas especiais.
&2, in principio, e 369 e ss.).

366
Cfr. JOSÉ TAVARES, Sucessöes, I,
pp. 111-112. Cfr. CRISTINA ARAÜJO DIAS, SucessOes, p.247 e DANIEL MORAlS, Direito SucessOrio, p.
80.

200 201
DIREITO DAS SUCESSOES CAPITULO XII A SUCESSAO TESTAMENTARIA.

0 notário tern, no entanto, o dever de participar a Conservatória dos Regis. 0 art. 106°, n°1, CN exige que o documento seja manuscrito pelo próprio
tos Centrais a informaçao corn a identificaçao dos testamentos püblicos e as testador ou por outrem a seu rogo. Admite-se, no testarnento cerrado, a res
escrituras da sua revogacão (art. 187, n21, a) CN), em ordem a permitir que salva de emendas, rasuras, traços, entrelinhas, borroes ou notas marginais,
Os interessados possam, após a morte do testador, tomar conhecimento da desde que seja feita exciusivarnente por quem o tiver escrito ou pelo próprio
sua realizaçao. testador (art. 1060, n°2, CN). A ressalva faz-se antes da assinatura ou em adi
Não sendo acessIvel ao püblico, no deixa de haver no testamento pübl icoI tamento seguido e novamente assinado (art. 106°, n°3, CN).
conforme reconhece GALVAO TELLES, urna certa “publicidade defacto E exigida a assinatura do testador no testamento cerrado. 0 art. 2206°,
resultante de o instrumento ser lavrado e lido perante pessoas cuja presenca n2, apenas permite a falta de assinatura do testador quando ele não souber
e juridicamente indispensável mas que poderao, indiscretamente, dar a conhej ou não puder faze-b, ficando consignada no testamento a razão porque não
cer o seu conteñdo a pessoas interessadas nesse conhecirnento e levá-las, 0 assina70. Em qualquer caso, a pessoa que assinar o testamento cerrado

inclusive, a exercer pressao sobre o testador, no sentido de revogar ou alterarj deve rubricar as foihas que não contenham a sua assinatura (art. 2206°, n°3).
O testamento feito”368. RelativaTnente a aprovaçaopüblica do testamento cerrado, dispoe o art. 2206°,
na4, que o testamento cerrado tern que ser aprovado por notário, nos termos
da lei do notariado (art. 2206°, n°4). Aplica-se assim o art. 108° CN, o qual
4.2.3. 0 testamento cerrado.
A segunda forma prevista para o testamento é o testarnento cerrado, que I determina que a aprovaçao do notário é feita através de instrumento lavrado
e elaborado e assinado pelo testador ou por outrem em virtude de instru
çao sua, tendo em qualquer caso que ser aprovado por notário. Conforme
refere CUNHA G0NALVES “o testamento cerrado tern duas partes: umal
I após a asssiflatura, contendo as seguintes declaraçoes do testador: a) que o
escrito apresentado contém as suas disposiçoes de ültima vontade; b) que
está escrito e assinado por ele, ou escrito por outrern a seu rogo, ou somente
de elaboraçao puramente privada, o testamento propriarnente dito; outra,

assinado por si, OU que está escrito e assinado por outrem, a seu rogo, visto
de elaboraçao püblica, o auto de aprovaçao notarial. E esta segunda que ihe

ele não poder ou não saber assinar; c) que o testamento não contém pala
dá força jurIdica; sern ela, a primeira parte, embora escrita e assinada pelo vras emendadas, truncadas, escritas sobre rasuras ou entrelinhas, borroes
testador não teria valor algum, seria simples projecto, visto a nossa lei nao ou notas marginais ou, no caso de as ter, que estao devidamente ressalvadas;
admitir o testarnento olografo”369. d) que tödas as foihas, a excepção da assinada, estão rubricadas por quem
Relativamente a elaboraçaoprivada do testamento cerrado, o art. 22O6, n1, assinou o testamento. Caso o testarnento não tenha sido feito pelo testador,
admite trés possibilidades: a) o testarnento ser escrito e assinado pelo testa deverá ainda conter a mençäo de que foi por este lido. 0 notário faz constar
dor; b) o testamento ser escrito e assinado por outra pessoa a rogo do testador; [do instrumento o nümero de páginas completas e linhas de alguma página
c) o testamento ser escrito por outra pessoa a rogo do testador e assinado incompleta. A lei obriga a que as foihas do testarnento sejam rubricadas pelo
pelo testador. notário, sendo que, se o testador o solicitar, o testamento, corn o respectivo
No entanto, mesmo quando escrito a rogo por outrem, exige-se que instrumento de aprovação, é ainda cosido e lacrado pelo notário, que apoe
o testamento cerrrado possa ser lido pelo testador, já que nos termos do art. I sobre o lacre o seu sinete. Em qualquer caso, na foiha que servir de invólucro,
22O8, os que nao sabem ou não podem ler são inábeis para dispor em testa é lançada uma nota corn a indicaçao da pessoa a quem o testamento pertence.
mento cerrado. Trata-se de urna soluçao que se justifica pelo facto de que as No entanto, a aprovaçao pelo notário d meramente formal, urna vez que
pessoas nessas condiçoes poderem ser facilmente iludidas sobre o conteüdo é feita sem leitura, dado que o art. 107° CN determina que so a pedido do
do testamento que celebrassem por essa forma.
OLIVEIRA ASCENSAO, SucessOes, pp. 63-64, GUILHERME DE OLIVEIRA, 0 testarnento,
p. 44, e JORGE DUARTE PINHEIRO, SucessOes, p. 105, propOem uma interpretaçSo abrogante
do art. 2206, n82, dizendo que n5o é concebIvel que a1guen saiba ler mas nSo saiba assinar. Mas,
como demonstra CAPELO DE SOUSA, SucessOes, I,
368
Cfr. GALVAO TELLES, SucessaTh testamentdria, p. 45. pp. 189-190, nota (425), essa situaçao pode
369
Cfr. CUNHA GONçALVES, Tratado, x, 293. OCorrer em muitos casos.
.

202 203
TESTAMENTARIA.
CAPITULO XII A SUCESSAO
DIREITO DAS SUCESSOES

que pode requisitar a conservatória do registo


testador o testamento cerrado pode ser lido pelo notário que lavrar o test obtenha a certidao de óbito,
CN).
mento, podendo a leitura ser feita em voz alta, na presença de algum dos fltei civil (art. 115 os seguintes actos:
Nos termos do art. ll3, n21, CN, a abertura compreende
venientes, se o tesatdor o autorizar. Uma vez aprovado, o testamento deve se materi al do testamento, se estiver cosido, lacrado ou
encerrado
a) a abertur a
registado no livro de registo próprio para testamentos e actos a ele re1atjv0 invólucro; b) a verificação do estado em
que o testamento se
Não sendo elaborado por notário, o testamento cerrado é considerado ur em qualquer existéncia de alguma viciação, ernenda, rasura,
documento particular (art. 363, n2, &zfine, e e ss.), podendo por isso set ncontra, nomeadamente da testamento
marginal não ressalvada; c) a leitura do
escrito em qualquer lIngua, ainda que o instrumento de aprovaçao tenha qu entrelia, borrao OU nota ntante ou inte
e na presenca simultânea do aprese
ser escrito em português cart. 420, n1, CN), devendo por isso o testament, elO notário, em voZ alta em
44Q, n23, CN). rio e das testemunhas.
Após a abertura, o testarnento e rubricado
ser acompanhado de traduçao idónea para portugués (art. apresentante ou interessado, pelas testemunhas
e pelo
0 testamento cerrado considera-se datado do momento da sua aprovaç
.

todas as folhas pelo lavrado instru


seguida (art. 1132, n22, CN) e é
notário, sendo arquivado em
(art. 22O7Q), sendo que o testador pode conservá-lo em seu poder, cometê..1 m o cumprimento das suas formalidades
ea
l mento de abertura, onde consta
a guarda de terceiro ou depositá-lo em qualquer repartiçao notaria (art. 22O9 da decisão judicial que determinaou a
abertura
n1). Se for entregue para depósito em cartóri o notaria l, deve o notário lavra data do óbito do testador ou deve igual
de abertura do testamento cerrado
instrumento de deposito (art 109°, n°1, CN), sendo nesse caso o testa ñ (art. ll4 CN). 0 instrumento is
notário a Conservatória dos Registos Centra
mente ser comunicado pelo
cerrado cosido e lacrado, caso ainda não o esteja (art. 109, n2, CN).
(art. 187, n2l, a) CN).
Quer os instrumentos de aprovaçào dos testamentos cerrados, quer c
do seu depósito tém que ser comunicados pelo notário a Conservatória dosi
Registos Centrais (art. 187, n1, a) CN), o que permite que, após a morte d 14.2.4. 0 testamento é o testamento internacional.
Nos
testador, possa ser conhecida pelos interessados a aprovaçao do testamento A terceira forma cornum do
me sobre a Forma de urn Testamento
termos do art. 1 da LUFTI, a Lei Unifor
cerrado e o cartório notarial em que se encontra depositado, se for o caso. D.L. 252/75, de 23 de Maio, o tes
Internacioflal, aprovada para adesão pelo
Caso o testamento cerrado tenha sido entregue a terceiro, o mesmo e obrt
gado a apresentá-Io ao notário em cuja area o docurnento se encontre, den
tro de três dias contados desde o conhecimento do falecimento do testador,
r
tamento internacional é válido, no que
o local onde é realizado e a situação
concerne a forma, qualquer que seja
dos hens, a nacionalidade, o dornicllio
sob a forma de urn testarnento inter-
ou a residéncia do testador, se for feito
sendo que, se não o fizer, incorre em responsabilidade pelos danos a que der observar a forrna de testamento
nacional. Em qualquer caso, o facto de não
causa, podendo ainda incorrer em indignidade, nos termos do art. 2034 d);
(art. 2209, n2).
Após o falecirnento do testador, o testamento cerrado deve ser aberto,1
Ij internacional não prejudica a sua validade
a forma da lei interna.
como testamento se obedecer

por escrito, ainda que não neces


0 testamento internacional deve ser feito
podendo se-b em qualquer cartório notarial (art. 11U, n1, CN), salvo se o tes ser escrito a mao ou por outro
sariamente pelo próprio testador, podendo
tamento se encontrar depositado, em que a sua abertura é feita no carl’ que ser certificado por entidade
processo cart. 32 LUFTI). Tern, no entanto, 49
notarial onde ocorreu o depósito (art. ilU, n2, CN). 0 testamento cerrado e 102 da LUFTI, nos termos
r para ‘competente para o efeito nos terrnos do art.
e igualmente aberto em caso de justificaçao da auséncia do testado entidades competenteS são
do art. 1 do D.L. 177/79, de 7 de Junho essas
efeitos de estabebecirnento da curadoria definitiva dos seus hens (art. 1O1). território português ou os
da os notários quando o testarnento seja celebrado em
A abertura do testamento cerrado depende, no entanto, da exibiçao teve lugar no estrangeiro.
o da deci agentes consulares portugueses se essa celebraçao
certidão de óbito, no caso de falecimento do testador, ou da certidã da declaraçao do testador,
0 testarnento intern acional e certificado através
são judicial que tenha ordenado a abertura, no caso de esta ser consequéncia testarnento e conhece o seu
er junto da pessoa habilitada de que aquele é o seu
de justiflcaçao de ausência (art. ll2 CN). 0 notário pode, porérn, proced desse conteüdo nem
ento do conteüdo, não tendo, no entanto, que dar conhecimento
a abertura oficiosa do testarnento, se tiver conhecimento do falecim 42 Na presenca dessas pessoas,
er a solicita r a sua abertur a, logo que as testemuinhas nem a pessoa habilitada (art.
testador e nenhurn interessado a aparec
205

204
DIREITO DAS SUCESSOES
CAPITULO XII A SUCESSAO TESTAMENTARIA

o testador assina o testamento ou, se já o tiver


feito previamente, r:;.. Fsim, em primeiro lugar, o art. 22212, n°1, estabelece que não pode ser
confirma a sua assinatura (art. 52, n2l). Se esti
ver imnpossibilitado abonador ou intérprete em qualquer dos testamentoS regulados
deve ser efectuada essa mençao no testame de ass
nto (art. 32, n°2). seccão quem está impedido de o ser nos documefltos autênti
0 testamento internacional pode, a semelha
nça do testamento
ser entregue para depdsito em cartório not cerr, extrofi5 sendo igualmente aplicável a disposicãO do art. 2197°, que
arial, devendo o notário
trumento de depdsito (art. 109°, n°1, C. lavrar I belece uma indisponibi1ida1e relativa em relaçao aos intervenientes no
Not.), e coser e lacrar o
internacional, caso o mesmo ainda nao testamel imento (art. 2221°, nQ2).
esteja nessas condiçoes (art. 1092
C. Not.). n22 DeP0i5 o art. 2222° estabelece urn prazo de eficácia rnuito curto relati
A abertura do testamento internacion ente as formas especiais de testarneflto, deterininando que o testamento
al processa-se nos mesmos terflt
da do testamento cerrado, sendo igu iebrado por algurna das referidas formas especiais fica sem efeito decor
almente aplicáveis as diposic
arts. 1112 e ss. C. Not. oes os dois meses sobre a cessacãO da causa que impedia o testador de tes
n2l). No entanto se, no decurso
r segundo as formas cornuns (art. 2222°,
4.3. As formas especiais de testamento ste prazo o testador for colocado de novo em circunstâflcias impeditivas,
.
prazo e interrompido, devendo corneçar a contar-se por inteiro a partir
4.3.1. Generalidades. Ia cessacão das novas circunStâflcias (art. 2222°, n22). A entidade perante
Cabe agora examinar as diversas formas uem for feito o testamento deve esciarecer o testador acerca deste prazo
especiais de testamento. Salienta-s
em primeiro lugar, que nao correspondia t ..e eficácia, fazendo menção do rnesrno no próprio testamento. No entanto,
a urna forma especial de testame
a disposiçao do art. 2223°, que se limitav nt a falta de cumprimento deste dever flão determifla a nulidade do testa
a a fazer a derrogaçao permitida
art. 652, n°2, a regra do n°1 desta disposiç pel n1en° (art. 2222°, ri°3), sem prejuizo de este naturalmente caducar corn
ao. 0 art. 22232 vinha assim exig
quanto a testamentos de portugueses ir o decurSo do referido prazo.
no estrangeiro, a exigéncia de
forma solene, ainda que a lei do lugar da urna l
celebraçao a dispensasse. Tratava-se 4.3.2. 0 testamefkto militar.
de uma norma de aplicacao imediata, que j
restringia a soluçao resultante da
lei estrangeira. Esta disposiçäo deve, por A primeira forma especial de testamento é o testarnento militar, ao qual
ém, considerar-se hoje revogada podem recorrer os militares e as pessoas a estes equiparadas ou seja civis ao
virtude do Regulamento (UE) 650/2012 em
, do Parlamento Europeu e do Con servico das forças armadas. Estas pessoas podern recorrer a esta forma espe
iho, de 4 de Juiho de 2012, relativo a com se
peténcia, a lei aplicável, ao reconhe cial de testarneflto sernpre que se encontrern em carnpanha ou aquartelados
cimento e execuçao das decisoes, e a ace
itaçao e execuçao dos atos autênticos fora do Pals, ou ainda dentro do Pals mas em lugares corn os quais estejarn
em matéria de sucessöes e a criação de
urn Certificado Sucessório Europeu interrornpidas as cornunicacöes e onde não exista notário, e tambérn quando
que revogou igualmente o art. 65°, um
a vez que esse diploma não admite se encontrem prisioneiroS do inimigo (art. 2210°).
possibilidade de os Estados-Membros a
estabelecerem normas de aplicaçao A lei admite duas formas de testarnento militar: o testamento rnilitar
imediata nesta matéria37.
Restarn assim as seguintes quatro form püblico tart. 2211° e o testamento militar cerrado (art. 2212°).
as especiais de testarnento: o testa No caso de testarnento militar pnblico, deterrninaSe que o militar, ou o
mento de militares, o testamento marItim
o, o testamento a bordo de aeronave, civil a ele equiparado, declarará a sua vontade na presenca do comandante
e o testamento feito em caso de calarnid
ade pdblica. Estas formas especiais da respectiva unidade independente ou força isolada e de duas testernunhas
de testamento estão, porérn, sempre suje
itas a regras comuns, constantes dos (art. 2211°, n°1), sendo assirn atribulda ao comandante a competeflcia para
arts. 2221° e 2222°.
lavrar o testamentO. Se o próprio comandante quiser fazer testarnento, tornará
o sen lugar quem deva substitul-lo (art. 2211°, n°2). Nesse caso, o testarneflto,
depois de escrito, datado e lido em voz alta pelo cornandante, será assinado
Cfr. DANIEL MORAlS, Dire ito Sucess
ório, p. 83. pelo testador, pelas testemunhas, e pelo mesrno comandante. Se o testador
206
207
DIREITO DAS SUCESSOES
CAP iTULO XII A SUCESSAO TESTAMENTARIA.

ou as testemunhas nào puderem assinar, declarar-se-á


fazem (art. 2211, nQ3).
o motivo porqueo1,0 F ‘c ambos, se
nenhurn foi depositado nos termos do ndmero anterior, alérn de
Já o testamento militar cerrado corresponde àquele a do registo. (art. 2217, n2). Em qualquer caso, o comandante cobrará
que é feito pelo jj ;o da entrega e averbá-lo-á no diário de navegacão, a margem do registo
ou pelo civil a ele equiparado, pelo seu próprio punh
o, sendo admjtjda testament0 (art. 2217, n3).
forma de testamento sempre que aquele souber e
e puder escrever (art. ecejd o testarnento, a autoridade consular ou militar lavrará termo
n91). Neste caso, o testanlento é escrito e assinado 2
pelo testador, sendo depe ntrega’ e fá-1o depositar na reparticão ou em alguma das repartiçOes
apresentado por este ao comandante, na presença J
de duas testemunhas, de 1otariais do lug do dorniclijo ou da ñltima residéncia do testador (art. 2218q,
rando que exprime a sua ültima vontade. 0 corn
andante, sem o ler, escrev
no testamento a declaraçao datada de que ele 1). Logo que falecido o testador, será a sua morte anunciada no jornal ofi
ihe foi apresentado, sendo
declaraçao assinada tanto pelas testemunhas es, ia’, corn desigcão da reparticão notarial onde o testamento se encontra
como pelo comandante (art. Dositado (art. 2218, n2, e 2213, n2).
n2). Se o testador o solicitar, o comandante, --

ainda na presença das testen


nhas, coserá e lacrará o testarnento, exarando
na face exterior da foiha 0 testameflto a bordo de aeronave.
servir de invólucro urna nota corn a designaça qul
o da pessoa a quem perten 2219 estabelece que o disposto nos artigos 2214Q a 22l8 é aplicável, corn
o testarnento au contido (art. 2112, n3).
Também neste caso, se o próp
-
‘bart.
comandante quiser fazer testamento, a apro r. necessárias adaptacoes, ao testamento feito em viagem a bordo de aeronave.
vaçao do mesmo e efectuada
aquele que deva substitul-lo (art. 21l2, n24 po no entanto, difIcil conceber essa aplicaçào, urna vez que o tempo curtIssimo
e 2111, n2). as viagens de avião, aliada a dificuldade de elaborar disposicöes testamentâ
Ambas as espécies de testamento militar estão
sujeitas a formalidades corn ñas no caso de emergêflcia a bordo torna extremamente difIcil a aplicação do
plernentares, a que se refere o art. 2ll3. E assim
obrigatorio que o testamen regime do testamento marItimo ao testamento a bordo de aeronave.
seja depositado pelas autoridades militares
na repartiçao ou em alguma das
repartiçOes notariais do lugar do domicIlio
ou da ditima residéncia do testa 4.3.5. 0 testamento feito em caso de calamidade püblica.
dor Se o testador falecer antes de findar a caus
a que o impedia de testar nas A ültima forma especial de testarnento é o testamento feito em caso de
formas comuns, será a sua morte anunciada
no jornal oficial, corn designa calamidade püblica. Relativamente a este, dispöe o art. 2220, n81, que se qual
da repartiçao notarial onde o testarnento se
encontra depositado. quer pessoa estiver inibida de socorrer-se das formas cornuns de testamento,
4.3.3. 0 testamento maritimo. por se encontrar em lugar onde grasse epidemia ou por outro motivo de cala
o testamento marItimo é aquele que é realizado a bord
ou de navio da marinha mercante, em viag
o de navio de guerra,
ern pelo mar (art. 22l4Q). A seme-
lhança do que se prevé para o testamento milit a
I midade püblica, pode testar perante algurn notário, juIz ou sacerdote, corn
observância das formalidades prescritas nos artigos 22ll ou 2212g. Adrnite-se
assim tambérn nestes casos a celebração de testamento püblico ou testarnento
ar, o mesmo pode ser feito por cerrado. Em qualquer dos casos, o testamento será depositado, logo que seja
forma pdblica ou cerrada, competindo ao
comandante do navio as funçoes possIvel, na reparticão notarial ou em alguma das repartiçöes notariais do
que no testamento militar competem ao da
unidade independente ou força lugar onde foi feito (art. 2220, n2).
isolada (art. 2215).
0 testamento marItimo e feito em duplicado
, registado no diário de nave 4.4. Ambito da forma legal.
gacao e guardado entre os docurnentos de bord
o (art. 2216). Logo que o navio
entrar em algum porto estrangeiro onde exist
a autoridade consular portu Uma importante caracterIstica do testamento corno negócio formal e o facto
guesa, o comandante deve entregar a essa
autoridade urn dos exemplares do de nao admitir a relevância de outras estipulacoes do testador que no cons-
testamento e cópia do registo feito no diári
o de navegaçao (art. 2217P, nl). tern do docurnento, ao contrário do que o art. 22U prevé genericamente para
Quando o navio aportar a território por
tugués, entregará o comandante a a forma legal. Assim, o art. 2l84 determina a proibicao do testamento per
autoridade marItirna do lugar o outro exem
plar do testamento, ou fará entrega relationein, ao estabelecer que “e nula a disposicão que dependa de instruçOes
208
209
DIREITO DAS SUCESSOF.S CAPfTULO XII A SUCESSAO TESTAMENTARIA.

ou recornendaçoes feitas a outrem secretamente, ou se reporte a document Requisitos do testamento e das disposiçUes testamentárias.
não auténticos, ou não escritos e assinados pelo testador corn data anteriot
a data do testamento ou contemporanea desta”. Assim, por exem1 I GeneralidadeS.
se o testador disser no testamento que remete para instruçOes que deu ao seu
advogado ou que as suas disposiçoes constam de urn papel guardado num para alérn da necessidade de adopçäo da forma especial, o testamento e as dis
certo lugar, a disposicao testamentária nao será considerada válida. poSicOes testamefltáriaS que nele se integram obedecem a requisitos especiais
A doutrina tern discutido se a referência legal aos “docurnentos n ra poderem ser válidas. Poderernos indicar a este propósito a possibilidade
escritos e assinados pelo testador corn data anterior a data do testamento ou isica e legal, a determinabilidade e a licitude do objecto e do fim negocial,
contemporâna desta” permite considerar válido o testarnento que remetat a capacidade para testar e a inexisténcia de indisponibilidades relativas.
esse tipo de documentos, como na hipdtese de o testador determinar qu& ExaminemoS sucessivamente estes requisitos.
deixa a determinada pessoa os imóveis que adquiriu por escritura püblica ei I
certo dia, ou os rnóveis que constam de urna relaçao datada e assinada. Algum 15.2. Possibilidade fisica e legal e licitude do objecto e do fim
doutrina, onde se incluem os nomes de ANTUNES VARELA e DAI. do testameflto.
MORAlS respondem afirmativamente, entendendo que e válida uma disi
posiçao testarnentária essencial que conste de docurnento anterior ou corn o testarnento está em princIpio sujeito as regras relativas ao objecto e ao fim
a mesrna data escrito e assinado pelo testador372. negocial constantes do art. 280°. Será assirn nub urn testamento que tenha
Aposiçao maioritária, onde se incluem OLIVEIRAASCENSAO, PAMPLONA urn objecto fisicarnente impossIvel, como a deixa de urn bern inexistente,
CORTE-REAL, CAPELO DE SOUSA e CARVALHO FERNANDES vai, ou legalmente impossIvel, como a deixa de bens do domInio püblico. Será
porém, em sentido diferente, considerando que essa regra so se pode aplicar igualmente nub urn testarnento de conteüdo indeterminável. Finalmente
as disposiçoes testarnentárias nao essenciais, pois em relaçao a estas ültimas também será nub urn testamento de conteüdo ilIcito, como a deixa de urn
a rernissão sO se pode fazer para documento que revista a forma legal de tes- , depósito de drogas.
tarnento ou de escritura püblica, sob pena de se pôr em causa a exigéncia de E também nula a disposiçào testamentdria quando da interpretaçao do
forma no testamento373. testamento resulte que foi essencialmente determinada por um firn contra-
Por nossa parte, aderimos também a esta ültima posiçao, considerando rio a lei ou a ordem püblica, ou ofensivo dos bons costumes (art. 2186°). Será,
que o art. 2184° não admite que disposiçoes testamentárias essenciais cons- por exemplo, o caso da deixa de valores para que o beneficiário possa corneter
tern de documento que não revista a forma de testamento ou, pelo menos, de crimes, ou a deixa de urn local para o exercIcio da prostituiçao.
escritura püblica. Serd assirn válida a disposiçao testamentária em que o tes Existe urn regime especial para as condiçoes e encargos ilIcitos, constante
tador deixe a alguem os imóveis que adquiriu por escritura püblica de uma dos arts. 2230° e 2245°. Referiremos detalhadamente esse regime quando nos
determinada data, mas jd nao aquela em que deixe os irnóveis referidos em ocuparmos do conteüdo do testamento.
certa pãgina do seu caderno de apontarnentos.
5.3. A capacidade testamentdria.

5.3.1. Generalidades.
Outro requisito do testarnento é a capacidade testarnentária activa, dado que,
372
Cfr. PIRES DE LIMA / ANTUNES VARELA, Codigo, VI, sub art. 2184, n4, p. 298, nos termos do art. 2190°, o testamento feito por incapaz é nub. No termos do
GUILHERME DE OLIVEIRA, 0 testamento, pp. 50 e ss., e DANIEL MORAlS, Dire ito Sucessório,
art. 2188°, podem testar todos os indivIduos que a lel não declare incapazes
pp. 84-85.
Cfr. OLIVEIRAASCENSAO, Sucsssöes, p. 66, PAMPLONA CORTE-REAL, Sucessães, pp. 90-91,
para o fazer, sendo manifesto que apenas as pessoas singulares podem testar,
CAPELO DE SOUSA, Sucessöes, p. 195, e CARVALHO FERNANDES, SzicessOes, p. 484.. não possuindo as pessoas colectivas capacidade testamentária. Em relaçao as

210 211
DIREITO DAS SUCESSOES CAP1TULO XII A SUCESSAO TESTAMENTARIA.

pessoas singulares, resulta do art. 2189° que são incapazes de testar os mern testador, embora a tItulo de legItima, nao abrangendo assim bens que o
res não ernancipados, e os maiores acompanhados sempre que a sentei Ibstituldo haja adquirido de terceiros.
de acompanhamento assirn o determine. A razão das substituiçoes pupilar e quase-pupilar é a intençao de o proge
itor, no caso em que o menor ou o acompanhado não tenha descendentes ou
5.3.2. Casos de incapacidade testamentária. cende1tes, evitar que qualquer dos outros herdeiros legItimos possa rece
A primeira situaçao de incapacidade testamentária é a dos menores er a heranca por morte deste, em virtude da sua incapacidade para testar375.
n
emancipados, sendo que o menor obtém, de pleno direito, a ernancipaçao ‘or esse motivo, estas substituiçoes ficam sem efeito logo que o substi
e
consequência do casamento cart. 132°). Uma vez que a lei nao distingue,
pared luido adquire capacidade para testar, ou se falecer deixando descendentes
que o casamento do menor, mesmo sern a autorizaçao dos pais ou do tuy,
ou ascendefltes.
legalmente exigida (art. 1604° a)), nao o impede de fazer testamento
(art
133° e 2189° a), mesmo em relacao aos bens excluIdos da sua administraç; A substituiçaopupilar.
nos termos dos art. 1649°. Efectivamente, a exclusão desses bens da
adminil A substituicao pupilar encontra-se prevista no art. 2297°, permitindo ao pro
tração do menor ate atingir a maioridade nao implica que o mesmo não nitor que não estiver inibido total ou parcialmente do exercIcio das suas
capacidade testarnentária em relaçao a todos os bens de que seja titular’ ompetências parentais substituir aos fllhos Os herdeiros ou Iegatarios que
Já relativamente ao major acompanhado, hoje a lei limita a sua inca hes aprouver para o caso de estes falecerem antes de perfazerem os dezoito
dade ao estritarnente necessário (art. 145°, n° 1), pelo que em princIpio é livr anos de idade376.
O exercIcio pelo mesmo dos seus direitos pessoais, onde se inclui expressa Uma vez que a substituiçao pupilar se destina a suprir a incapacidade
mente o de testar (art. 147°, n°2), salvo existindo deterrninaçao em contrárjo de testar, a mesma fica sem efeito logo que o menor perfaça os dezoito anos de
na sentença judicial (art. 147°, n°1).
Face ao carácter pessoal do testamento, nao é possIvel a representaçao ou
j jdade (art. 2298°, n°2), devendo considerar-se que a mesma fica também sern
efeito se o menor for antes dos 18 anos emancipado pelo casarnento (art. 132°),
assistência nesse acto, admitindo a lei, no entanto, as figuras da substituiçao uma vez que nessa situacao o menor adquire plena capacidade de exercicio
pupilar e quase-pupilar (arts. 2297° e ss.), das quais falaremos em seguida. de direitos (art. 133°), passando consequentemente a poder testar (art. 2189°
a)). Da mesma forma, a substituição pupilar fica sem efeito se o substituldo
5.3.3. As substituiçoes pupilar e quase-pupilar. deixar descendentes ou ascendentes (art. 2297°, n°2).
5.3.3.1. Generalidades.
As substituiçao pupilar e quase-pupilar constituern urna forma de represen. 5.3.3.3. A substituiçao quase-pupilar.
taçao legal do testador, permitindo, nos casos em que este é incapaz de testar Já a substituiçao quase-pupilar encontra-se prevista no art. 22980, permi
que o seu progenitor o substitua nesse acto, realizando urn testamento em
por conta dele. 0 art. 2300° esciarece que as substituiçOes pupilar ou quase
L tindo ao progenitor exercer igualmente essa faculdade sem dependéncia da
idade do fliho, no caso de este ser incapaz de testar em consequência de uma
-pupilar 56 podem abranger Os hens que o substituldo haja adquirido por via sentença de acompanhamento.
termos do art. 2299°, a substituiçao pupilar converte-se em quase
-pupilar, se o menor for declarado interdito por anomalia psIquica, disposiçao
Sustentam, porérn, GUILHERME DE OLIVEIRA, 0 testamento, pp. 20-21, e JORGE DUARTE Nos
PINHEIRO, SucessOes, p. 89, que, se o menor casar sern autorizaçao dos pais, e nula a disposiclo Tern sido tradicional a explicaçao de que a consagracao destas substituiçoes resultaria ate do
testamentária por ele realizada, em reaçao a bens de que o menor nSo tenha a administração, receio de que, em virtude da sua ambiçSo, os herdeiros legItimos pudessern atentar Contra a vida
uma vez que a incapacidade de testar subsiste quanto aqueles bens, por força do art. 1649g. Nao do menor ou do incapaz, em ordem a herdar os seus bens. Cfr. CAPELO DE SOUSA, SucessOes, I,
nos parece, porérn, que tenham razão. A Onica sançao que é atribulda ao menor é a exclusão da
p. 225. Nao acompanhamos, porérn, esta posiçao, que nos parece exagerada.
adrninistraçao desses bens, podendo fazer testamento, pelo que nao faria sentido que o testamentO Sobre as origens da substituiçao pupilar no Direito Rornano, cfr. GALVAO TELLES, Dirnto
que fizesse nao abrangesse todo o seu patrimonio. de representação, pp. 145 e ss.

212
213
TESTAMENTARIA
SUCESSAO
CAPITULO xii A

DIREITO DAS SUCESSOES ou na


dos outros intervenientes no testamento
ou pessoas
a favor do
notário a favor destas
que hoje se deve considerar aplicável ao facto de o menor vir a ser c. 2197°); as disposicoes efectuadas efectuadas em
(art.
e ainda as disposicoes
-

sentença de acompanharnento que o irnpeça de testar. pessOa (art. 2198°)


n°2).
A substituição quase-pupilar fica sern efeito logo que cesse a lir rosta matrim0mas (art. 1650°, pelo que
o de
impedimento s
dades relativas não são recIprocas
referida, ou se o substituldo falecer deixando descendentes ou ascen indiSPofib do major acorn
(art. 2298, n22). A lei nao contempla, porém, a situacão de, tendo o notar que as o acompa ante de testar a favor
exemplo,
acompanhado casado antes de ser decretada uma medida de acompah impede poT favor do menor.
tutor de testar a estas disposics.
que o impeca de testar, vier a falecer no estado de casado, deixando ado ott o suce5Sjvamete todas as
camtfldmnOs
quentemente cônjuge. PAMPLONA CORTE-REAL, CAPELO DE S acompante
a favor do
e CRISTINA ARAUJO DIAS sustentavam, face ao regime anterior, que do major acornpanh0
Mdisposicoes
caso a substituiçao quase-pupilar deveria igualmente ficar sem efej 2. de bens. fazerem
1ministrad legal proibicão de OS maloreS acompanhados
Já OLIVEIRA ASCENSAO opunha-se a essa soluçao, considerand 2i92 estab a legal de bens,
ou admjnistrador
a sobrevivência do cônjuge em relaçao ao substituIdo não deveria ii., 1rt•
do seu acomphante nulas estas mesmaS
osicoes a favor contas, considera0
caducidade da substituiçao378. Esta ñltima soluçao veio a ser defendida.a as respeCtiV (pressu
da que estefam
aprOVda5
porérn vâlidas essaS disposicoes
ao actual regime, por DANIEL MORAlS379. Por nossa parte, aderimos t n°l). SerãO, trate de des
)osicoes (art. 2192°, capacidade testamentánia) quando se
bern a esta ültima tese, por considerarmos estar em causa essencialme a do testador
ado-se naturalfiente colaterais ate ao terceiro grau ou conjuge
futura transmissão dos hens deixados pelos pais ao fliho, que não se ye assifi, salvo
1dentes, ascendentes, de facto (art. 2192°, n22). Ha,
que deva caducar pelo facto de ele ter casado. este viva em UfliãO
referidos no art. 2192°,
:upessoa que corn favor dos farniliares
tratar de doacOes a acompanhados efectuarem
testa
5.4. As indisponibilidades relativas testamentdrias. no caso de se generiCa de os rnaioreS sendo
legal de bens,
2, uma proibicão acompan ntc ou administrOr
seu
ento a favor do
5.4.1. Generalidades. considerad nulas.
A indisponibilidade relativa consiste na proibiçao de testar a favor de dete ssas disp05ic
administrador legal
minadas pessoas em virtude da relaçao entre estas e o testador. Neste caso do menor a favor do tutor,
trata-se de situaçoes em que o testador possui capacidade para fazer testal
.4.3. As dispoSic
“receber do pupilO
mento, mas em que a lei ihe veda a sua realizaçao a favor de pessoas deter- de bens ou protUt0 aos menores, a proibicão de o tutor
relacão por acto entre
i tambérn, em quaisquer liberalidades,
-

minadas por virtude da capacidade de influéncia que estas tenharn sobre interposta pessoa
designacao e antes da
apro
-

directamente ou por depois da sua


o testador. Estão nesta situaçao as disposiçoes do maior acompanhado a morte, se tiverenT
sido feitas no n°3
vIVOS ou por as deixas testament1a5curador
favor do acompanhante ou administrador legal de hens (art. 2192); as dis- I ação das respectivas
contas, scm prejuIZO para
Esta proibicão é
extensiva ao
posicOes do menor a favor do tutor, administrador legal de bens ou protutor 1 do art. 2192°” cart. 1937° d)).
do art. 1971°, n°l e
(art. 1937 b)); as disposiçoes de alguem a favor do medico ou enfermeiro que
ho3e administror de bens, por força substitua
ao sempre que este
por força do art. 156°, ao protutot
o tratar numa doença ou do sacerdote que ihe prestar assistência espiritual, se-b em relacão

J também parece dever do testamento,


este acto serâ a nulidade
se o testamento for feito durante a doenca e o testador vier a falecer da mesma A sancão para
o tutor (art. 1956° b)).
(arts. 2l94 e 2l95); as disposiçoes efectuadas pelo cônjuge a favor da pes 294°. legal de bens for
efec
nos termoS do art. adminiStraca o
soa corn quern corneteu adultério (art. 2196); as disposiçOes efectuadas pelo Ir se a tutela ou a for realizada

1
Daqui resulta que, testamento não e proibido se
menor, o as respectivas

Cfr. PAMPLONA CORTE-REAL, SucessOes. p. 98, CAPELO DE SOUSA, Sucessoes, p. 226, nota tuada em relacão a urn maioridade e já estiverem aprovadas
depois de omenor
atingir a que a disposiSão
(543), e CRISTINA ARAUJO DIAS, Sucessães, pp. 138-139, nota (213). aprovadas as contas, parece
não estejarn
Cfr. OLIVEIRA ASCENSAO, Sucessães, p. 50. contas. Mesmo que 215
Cfr. DANIEL MORAlS, Direito Sucessdrio, pp. 94-95.

214
DIREITO DAS SUCESSOES
CAPITULO XII A SUCESSAO TESTAMENTARIA

testamentária tambérn não será proibida se for efectuada a favor


res referidos no n°2 do art. 2192°.
dos fani] ,or considerar lesivo dos interesses do outro cônjuge permitir a realizaçào
Le testamento
pelo seu consorte ao cdrnplice no adultério.
no entanto, de referir que esta disposiçao tern duas importantes excep
5.4.4. Testamento a favor de medicos, enfermeiros ou
sacerdotes r es, medida em que nao se aplicará Se, a data da aceitacao, o casamento ja
na
0 art. 2194° considera nula a disposiçao testamentária a favor
do medico ou stava dissolvido OU os cônjuges separados judicialmente de pessoas e bens
enfermeiro que tratar do testador ou do enfermeiro que Ihe
téncia espiritual, se o testamento for feito durante a doença
prestar assjiF on separados de facto ha mais de seis anos, nem se o testamento se lirnitar a
e o testador vj ssegurar alimentos ao beneficiário (art. 2196, n2). Em relaçao a separacao
a falecer de1a380. Tal explica-se ern virtude da influéncia
que estas pesso facto, entendem, no entanto, JORGE DUARTE PINHEIRO e DANIEL
poderiam ter no testador, levando-o a fazer testamento a favor
delas, apen MORAlS que, dado o facto de a Lei 61/2008, de 31 de Outubro, ter vindo
em virtude da debilidade psicologica que a sua doença mortal
acarrel -- :stabelece1 ser possIvel o divórcio ao fim de urn ano de separacao de facto
Assim, se o testador nao faleceu da doença de que foi tratado382,
teria entr (nova redacçao do art. 1781a) do Codigo Civil) deverá igualmente fixar-se
tanto podido revogar o testarnento e, se o nao fez, foi porque
decidiu mantei sse prazo em urn ano384. Näo nos parece, porérn, que essa interpretaço tenha
a liberalidade. Caso o testarnento seja realizado após a cura
do testador este [cabimento na letra da lei.
já será considerada válido.
Mesmo tendo sido realizado durante a doença e o testador
vier a falece 5.4.6. Testamento a favor do notário, redactor do testamento,
dela, ha, porém, excepçöes a invalidade destas disposiçoes.
Assim, não sa intérprete ou testemunhas que tenham intervençao no acto.
exciuldos os legados remuneratórios recebidos pelo doente,
nem as disposi., Face ao art. 2197, é tambérn nula a disposiçao a favor do notário ou entidade
çoes a favor dos familiares referidos no n°3 do art. 2192°.
corn funçoes notariais que lavrou o testamento pdblico ou aprovou o testa
mento cerrado, ou a favor da pessoa que escreveu este, ou das testemunhas,
5.4.5. Testamento a favor do cümplice do testador adültero.
abonadores ou intérpretes que intervieram no testarnento ou na sua aprovação.
Urna outra situaçao de indisponibilidade relativa respeita
é o testamento a Salienta CUNHA GONALVES que esta regra “é uma precauçao da lei para
favor do cürnplice do doador addltero, referida no art. 2196°,
n°1. A lei insti-] evitar que o notário escreva algum legado a seu favor, sem que o testador dê fé
tuiu esta proibiçao por motivos de tutela da instituiçao familiar383
e tambérn disso, visto que é o próprio notário quem 1€ o testamento; e hem assim que, em
380
No Ac. STJ 13/9/2011 (SALAZAR CASANOVA), em cJ-ASTJ
siderada esta disposiçao aplicável aos funcionários de urn
19 (2011), 3, pp. 34-40, foi con
I conluio corn o notário, iguais benefIcios dolosamente obtenharn, quer o mdi
vIduo que escreveu o testarnento cerrado, por nao poder ou saber escrevê-lo o
lar de terceira idade, que, nao sendo testador, quer as testemunhas de tais actos”385. Esta soluçao justifica-se ainda
enfermeiros, praticavam actos proprios de enfermagern.
381
Conforme escreve CUNHA GONçALVES, Tratado, IX, por Os intervenientes no acto notarial poderiam influenciar ilegitimamente o
pp. 668: “0 enfermo, que se encontra
in art iculo mortis ou prostrado corn doença mortal, tendo
o corpo e o espiriro deprimidos, desape testador na elaboraçao do testamento, que assim deixaria de ser urn acto livre
gado dos bens terrenos e aterrado corn a perspectiva da vida seu. Ha, alias, impedimentos expressos a estas entidades para a prática de actos
futura, facilmente pode servItimada
captaçao da sua herança, quer pelo facultativo que prornete
salvá-lo apesar de sabé-lo incurável, notariais a seu favor, referidos nos arts. 58, 68 e 68 do Codigo do Notariado.
quer pelo confessor que the promete a absolviçao dos seus
302
pecados e Ihe garante a entrada no Céu”.
No sentido de que o art. 21940 so é aplicável se o doente vier
a falecer da doença de que foi tratado e
nSo doutra, do mesmo tipo ou de tipo diverso, ainda que crOnica,
veja-se GALVAO TELLES, Sucessio testa
5.4.7. Disposição através de interpostas pessoas.
rnentarza,p. 33. Em sentido diferente, no lrnbito do Código anterior, 0 art. 2198 considera também nulas todas das disposiçoes referidas anterior

I
cfr., porém, CUNHA GOXçALVES,
Thtado,IX, p. 671. Na jurisprudência,cfr. oAc.25/10/2001 (TERESA
PATS), na CJ26 (2001), 4,pp. 125-128 mente quando realizadas por interposta pessoa, considerando como inter
que considerou inapticvel o art. 21940 ao caso de urn doente
que morre de ataque cardlaco e sofria do postas todas as referidas no art. 5798, n82. Tal abrange assim tanto o cônjuge
coraçao, tendo efectuado determinada disposiçao a favor de urn
383
dos medicos que regularrnente o tratava.
No Ac. STJ 24/1/2002 (SILVA PAIXAO), em CJ-ASTJ1O (2002),
1, pp.51-54, considerou-se nb ser
inconstitucionalo art. 2196 por o valor de tutela da familia prevalecer
sobre o da tutela da propriedade Cfr. JORGE DUARTE PINHEIRO, Sucessdes, p.94 e DANIEL MORAlS, Direito Sucessório, p.97.
e que nao envolve abuso de direito ser o próprio doador a solicitar
a declaraçao de nulidade da doaçIo. CUNHA GONçALVES, Tratado, IX, p. 677.
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