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14/03/2024, 10:48 · Processo Judicial Eletrônico - TRF3 - 1º Grau

MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Nº 5009151-53.2022.4.03.6000 / 2ª Vara Federal de Campo


Grande
IMPETRANTE: WELLINGTON RUFFO DE SOUZA
Advogado do(a) IMPETRANTE: LUCIANO DE ALMEIDA CAVALCANTI - MS21741
IMPETRADO: CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA, ARQUITETURA E AGRONOMIA DE MATO GROSSO
DO SUL, DIRETOR-PRESIDENTE DO CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA DE MATO
GROSSO DO SUL
Advogado do(a) IMPETRADO: ANA CRISTINA DUARTE BRAGA - MS8149

SENTENÇA

Trata-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado


por Wellington Ruffo de Souza contra ato coator imputado à Presidente do Conselho
Regional de Engenharia e Agronomia de Mato Grosso do Sul, objetivando o
afastamento de restrição existente em seu registro profissional junto ao CREA-MS.

Relata o impetrante, em síntese, que concluiu o curso de Engenharia


Elétrica na Universidade Anhanguera-Uniderp.

Continua narrando que está regularmente inscrito no Conselho Regional de


Engenharia e Agronomia de Mato Grosso do Sul (CREA-MS), com o título de
"Engenheiro Eletricista".

Discorre que, embora atenda a todas as exigências para a expedição de


seu registro profissional na plenitude da Engenharia Elétrica, o CREA-MS impôs
limitação ao seu exercício profissional (restrições de geração, transmissão e distribuição
de energia em alta tensão - art. 8º da Resolução n. 218/73, do CONFEA).

Pontua que, irresignado com a ressalva contida no registro junto ao CREA-


MS, por entender que sua formação profissional é suficiente para possibilitar também o
desempenho das atividades relacionadas no art. 8º da Resolução n. 218/73, do
CONFEA, solicitou, na via administrativa, o cancelamento da restrição imposta, mas o
seu pleito foi indeferido.

Por fim, entende que a interpretação restritiva imposta pelo CREA-MS, a


partir tão somente do que dispõe a resolução do Conselho Federal, ofende o princípio da
legalidade e o seu direito líquido e certo ao exercício pleno da sua profissão.

Requereu os benefícios da justiça gratuita.

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Entre outras providências, este Juízo deferiu os benefícios da justiça


gratuita e concedeu a medida liminar, determinando a suspensão da restrição lançada no
registro profissional da impetrante quanto às atividades relacionadas no art. 8º da
Resolução n. 218/73, do CONFEA (ID 274541983).

A autoridade impetrada apresentou informações (ID 276562786),


defendendo a legitimidade do ato impugnado. Sustenta, em suma, que é a formação
acadêmica - grade curricular e perfil formativo - que define as atribuições do profissional
e que, no caso, a Câmara Especializada de Engenharia Elétrica e Mecânica do CREA-
MS - órgão competente para o julgamento de pedidos de registro (art. 46, “d”, da Lei
n. 5.194/66) -, após análise da grade curricular e da carga horária do curso frequentado
pelo impetrante, verificou que este possui habilitação em eletrônica, não tendo formação
específica suficiente para atuação em atividades próprias voltadas
à eletrotécnica, previstas no art. 8º da Resolução n. 218/73, do CONFEA.

O impetrante refutou os fundamentos das informações prestadas pela


autoridade coatora e reiterou os argumentos deduzidos na petição inicial (ID 284567722).

Instado a se manifestar, na condição de custos legis, o Ministério Público


Federal opinou pela concessão da segurança (ID 285777143).

É o relatório.

Decido.

Não há questões preliminares pendentes de apreciação.

Assim sendo, presentes os pressupostos processuais de existência e de


validade do processo, bem como as condições da ação, passo ao exame do mérito,
seara em que, adianto-me, verifico que a pretensão mandamental merece prosperar.

Por ocasião da apreciação da liminar, oportunidade em que este Juízo


analisou perfunctoriamente a controvérsia instaurada pelas partes, o tema foi enfrentado
nos seguintes termos:

A liminar, em sede de mandado de segurança, somente será concedida se,


de início, forem verificados de modo plausível tanto os indícios de existência
do direito pleiteado por meio de fundamento relevante (fumus boni iuris)
quanto a imprescindibilidade de concessão da antecipação da tutela, sob
pena de perecimento do bem da vida pleiteado ou ineficácia da medida caso
concedida somente ao final da demanda (periculum in mora).

No juízo superficial que se faz no momento, é possível verificar a presença


dos requisitos legais para a concessão da liminar pretendida.

Em princípio, a edição de uma Resolução de Conselho Federal de Classe


não pode, em princípio, andar na contramão de dispositivos
infraconstitucionais e constitucionais.

No caso dos autos, é fato que a parte impetrante se graduou Engenheiro


Eletricista, conforme documento de Id. 267629858, estando sujeito às
regras contidas no art. 33, do Decreto 23.569/33:

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Art. 33. São da competência do engenheiro eletricista :

...

g) a direção, fiscalização e construção de obras concernentes às


uzinas elétricas e às rêdes de distribuição de eletricidade;

h) a direção, fiscalização e construção das instalações que utilizem


energia elétrica;

i) assuntos de engenharia legal, relacionados com a sua


especialidade;

j) vistorias e arbitramentos concernentes à matéria das alíneas


anteriores.

Tal Decreto, regulamenta toda a atividade do profissional da Engenharia


Elétrica, dentre outras áreas da Engenharia, de onde se constata a aparente
violação ao princípio constitucional da legalidade, especialmente no que
tange a eventuais restrições realizadas por meio de Resolução do Conselho
Federal Profissional.

Nesse passo, a Constituição Federal é taxativa ao afirmar que “é livre o


exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as
qualificações profissionais que a lei estabelecer” – art. 5º, XIII. Tal
dispositivo constitucional não admite outra interpretação, senão a de que
somente Lei em sentido estrito poderia restringir a atuação profissional do
impetrante, o que aparentemente não ocorre no caso dos autos, haja vista
que a limitação questionada na inicial está fundamentada em mera
Resolução do Conselho Profissional.

Nesse sentido, os artigos 8º e 9º da Resolução em questão – 218/73 –


estabelecem:

“Art. 8º - Compete ao ENGENHEIRO ELETRICISTA ou ao


ENGENHEIRO ELETRICISTA, MODALIDADE ELETROTéCNICA:
I - o desempenho das atividades 01 a 18 do artigo 1º desta Resolução,
referentes à geração, transmissão, distribuição e utilização da energia
elétrica; equipamentos, materiais e máquinas elétricas; sistemas de
medição e controle elétricos; seus serviços afins e correlatos.
Art. 9º - Compete ao ENGENHEIRO ELETRôNICO ou ao
ENGENHEIRO ELETRICISTA, MODALIDADE ELETRôNICA ou ao
ENGENHEIRO DE COMUNICAçãO:
I - o desempenho das atividades 01 a 18 do artigo 1º desta Resolução,
referentes a materiais elétricos e eletrônicos; equipamentos eletrônicos
em geral; sistemas de comunicação e telecomunicações; sistemas de
medição e controle elétrico e eletrônico; seus serviços afins e
correlatos.”

Assim, haja vista que o impetrante é graduado em Engenharia Elétrica e


que tanto o art. 8º, como o art. 9º, da Resolução em questão permitem o
exercício das atividades ali descritas, de forma genérica, ao profissional
Engenheiro Eletricista, é forçoso concluir, em juízo perfunctório, que o
impetrante detém o direito de exercer tais atribuições.

Da mesma forma, está presente o perigo da demora na concessão da


liminar, uma vez que as restrições impostas pelo Conselho requerido estão
a impedir o impetrante de exercer integralmente sua profissão, o que

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certamente lhe causa prejuízos profissionais e pessoais.

Sobre o tema, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região já decidiu:

E M E N T A AGRAVO DE INSTRUMENTO EM MANDADO DE


SEGURANÇA.PROFISSIONAL ENGENHEIRO ELETRICISTA.
AMPLITUDE DA GRADE CURRICULAR. HABILITAÇÃO PARA
EXERCER AS ATIVIDADES DE GERAÇÃO, TRANSMISSÃO E
DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA, ELENCADAS NOS ARTIGO 8º E 9º
DA RESOLUÇÃO CONFEA Nº 218/1973. MANUTENÇÃO DA
DECISÃO AGRAVADA. 1. Os autos foram instruídos com Diploma
outorgado ao agravado em 06/06/2019, documento hábil a comprovar
que ele possui formação profissional em Engenharia Elétrica -
Bacharelado pelo Centro Universitário do Norte Paulista (Unorp), curso
cujo reconhecimento pelo Ministério da Educação foi renovado pela
Portaria nº 1.091, de 24/12/2015. 2. O título de Engenheiro Eletricista
do agravado foi reconhecido pelo CREA-SP na Certidão CI nº
2106713/2019, porém apenas para as atribuições do artigo 9º da
Resolução CONFEA nº 218/1973. 3. As atribuições do artigo 9º são
afetas aos engenheiros eletrônicos, assim também aos engenheiros
eletricistas (modalidade eletrônica) e aos engenheiros de
comunicação. Em contrapartida, as atividades elencadas no artigo 8º
também são de competência dos engenheiros eletricistas, porém com
ênfase na modalidade eletrotécnica, especialidade que, ao contrário da
eletrônica, possibilita ao profissional o exercício de trabalhos com alta
tensão. 4. De acordo com a grade curricular apresentada, foram
ministradas ao agravado, durante o 5º ano do Bacharelado, disciplinas
que se relacionam com a área de eletrotécnica, tais como "Análise de
Sistemas Elétricos de Potência" (carga horária de 80 horas) e
"Geração, Transmissão, Distribuição da Energia Elétrica e Fontes
Alternativas e Renováveis" (carga horária de 160 horas). 5. A aferição
da pertinência das aulas ministradas com as respectivas atribuições
profissionais dá-se em consonância com o quanto estabelecido na
própria Resolução CONFEA nº 218/1973, que menciona dentre as
atividades do artigo 8º aquelas relacionadas "à geração, transmissão,
distribuição e utilização da energia elétrica". 6. Os elementos
colacionados no mandado de segurança originário são hábeis a indicar
que o impetrante/agravado possui aptidão para exercer não apenas as
atividades relacionadas no artigo 9º da Resolução Confea nº 218/1973,
mas também aquelas elencadas no artigo 8º dessa resolução. 7.
Demonstrada a probabilidade do direito, bem como o perigo na
demora, consubstanciado no iminente prejuízo oriundo da indevida
restrição ao pleno exercício profissional. 8. Agravo de instrumento a
que se nega provimento.

(AI 5021755-09.2019.4.03.0000, Desembargador Federal CECILIA


MARIA PIEDRA MARCONDES, TRF3 - 3ª Turma, Intimação via
sistema DATA: 06/12/2019.)

Ante ao exposto, presentes os requisitos legais, defiro o pedido de liminar,


para determinar que a autoridade impetrada retire a restrição existente no
registro profissional do impetrante junto ao CREA/MS, relacionadas ao art.
8º e 9º, da Resolução 218/73, do CONFEA, no prazo de 05 (cinco) dias.

Concluído o trâmite mandamental, verifico que não foram deduzidos


argumentos, de fato ou de direito, aptos a infirmar os motivos que se prestaram a
justificar a conclusão exarada na referida decisão, os quais, diga-se, passam a integrar a
fundamentação desta sentença.
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Vale registrar, no ponto, que "reveste-se de plena legitimidade jurídico-


constitucional a utilização, pelo Poder Judiciário, da técnica da motivação 'per
relationem', que se mostra compatível com o que dispõe o art. 93, IX, da Constituição da
República. A remissão feita pelo magistrado - referindo-se, expressamente, aos
fundamentos (de fato e/ou de direito) que deram suporte a anterior decisão (ou, então, a
pareceres do Ministério Público ou, ainda, a informações prestadas por órgão apontado
como coator) - constitui meio apto a promover a formal incorporação, ao ato decisório, da
motivação a que o juiz se reportou como razão de decidir" (STF, 2ª Turma, AI 825.520
AgR-ED, Relator Ministro Celso de Mello, data do julgamento: 31.5.2011, data da
publicação: DJe 12.9.2011, divulgado em 9.9.2011).

Importante ressaltar que a qualificação é necessariamente atribuída pelo


curso superior realizado profissional e não pelo respectivo conselho de fiscalização
profissional.

No caso, o impetrante demonstrou que se graduou em Engenharia Elétrica


em curso devidamente autorizado e reconhecido pelo MEC (ID 267629865), tendo,
inclusive, cursado no 9º semestre da graduação a disciplina de Geração, Transmissão e
Distribuição de Energia, com carga horária de 40 horas, na qual obteve aprovação com
8,10 pontos (ID 267629396, p. 3).

Entretanto, o CREA-MS, após avaliação avaliação unilateral da insuficiência


da grade curricular do curso de graduação, expediu registro profissional ao impetrante
com a titulação de engenheiro eletricista, constando da certidão emitida pelo
Conselho restrição relativa ao art. 8º da Resolução n. 218/73, quanto à atuação no
campo de geração, transmissão e distribuição de energia em alta tensão.

Essa distinção quanto à habilitação conferida e pretendida não possui


justificativa técnica ou legal e vai de encontro ao histórico curricular e à
titulação apresentados pelo impetrante. Habilitado o impetrante como
engenheiro eletricista, a imposição de restrições adicionais ao exercício profissional, por
meio de ato infralegal, revela-se inconstitucional e lesivo a direito líquido e certo.

Resta evidente que os arts. 8º e 9º Resolução n. 218/1973, do CONFEA,


outorgam competências aos engenheiros eletricistas, de forma genérica, divergindo
somente no que tange à especialidade, seja eletrotécnica ou eletrônica. Logo, no caso
dos autos, é forçoso concluir que o impetrante, graduado em Engenharia Elétrica, estaria
habilitado para ambas.

Com tais considerações, adoto as razões de decidir explicitadas por ocasião


do deferimento da medida liminar para, agora em cognição plena e exauriente,
reconhecer que as atribuições previstas nos artigos 8º e 9º da Resolução n. 218/1973, do
CONFEA, referem-se genericamente ao profissional Engenheiro Eletricista, o que impõe
concluir que a interpretação restritiva conferida pela Câmara Especializada de
Engenharia Elétrica e Mecânica do CREA-MS, de fato, implicou flagrante violação do
direito líquido e certo da parte impetrante ao pleno exercício profissional

Diante do exposto, confirmo a liminar e concedo a segurança pleiteada,


extinguindo o feito, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de
Processo Civil, para o fim de determinar à autoridade impetrada que se abstenha de

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restringir a atividade profissional do impetrante, permitindo-lhe exercer plenamente


as atribuições previstas nos artigos 8º e 9º da Resolução n. 218/1973, do CONFEA.

Sentença sujeita ao reexame necessário.

Indevidos honorários advocatícios, nos termos do art. 25 da Lei n.


12.016/2009.

Custas processuais pela parte impetrada.

Oportunamente, arquivem-se.

P.I.

Campo Grande (MS), datada e assinada eletronicamente.

Assinado eletronicamente por: JANETE LIMA MIGUEL


23/10/2023 23:37:17
https://pje1g.trf3.jus.br:443/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam
ID do documento: 304791287

23102323371744600000294596047
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