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PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Amapá
1ª Vara Federal Cível da SJAP

SENTENÇA TIPO "A"


PROCESSO: 1008829-62.2021.4.01.3100
CLASSE: AÇÃO CIVIL PÚBLICA (65)
POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria)
POLO PASSIVO:FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAPÁ

SENTENÇA INTEGRATIVA

Cuida a espécie de embargos de declaração opostos


pela Fundação Universidade Federal do Amapá - Unifap contra
a Sentença de Id nº 1306933287 (tel:1306933287), sob a alegação
da ocorrência de omissão e obscuridade.

Aduz a embargante, em resumo, que (Id nº 1607737854


(tel:1607737854)):

a) a “decisão foi omissa quanto à existência de direitos de


terceiros para determinar a republicação do resultado e a retificação do
anexo I. Trata-se, portanto, da consolidação do resultado do PS
2021, que foi apontada em contestação e deixou de ser analisado pelo
Juízo, especialmente considerando o tempo transcorrido desde o
ajuizamento da ação. O pedido para cancelar/alterar o resultado do PS
2021, além de violar a garantia constitucional da autonomia
universitária e o princípio da vinculação ao edital, ofende o princípio
da segurança jurídica, gerando graves danos à Universidade e, em
especial, aos candidatos que já estão cursando a graduação há
três ou quatro semestres”;
:
b) “requer-se seja reconhecida a ocorrência de omissão e
que o pedido para cancelamento/alteração do resultado do PS 2021,
Edital nº 01/2021, em relação ao Curso de Bacharelado em Medicina,
seja extinto sem julgamento do mérito, nos termos do art. 485, VI, do
CPC, uma vez que se trata de situação consolidada”; e

c) há obscuridade, já que “na hipótese de não ser extinto o


feito por se tratar de situação consolidada, requer-se sejam esclarecidas
pelo Juízo as dúvidas sobre o cumprimento da decisão, mormente quanto
ao cancelamento da matrícula dos candidatos que não mais seriam
chamados e quanto à anulação dos atos subsequentes à publicação do
Edital”.

Instado a se manifestar, o embargado apresentou


contrarrazões aduzindo, em síntese, que (Id. nº 1659234989
(tel:1659234989)):

a) “no que se refere aos alunos que já estão cursando


Bacharelado em Medicina por ato ilegal da UNIFAP, há a incidência da
normativa protetiva aos terceiros de boa-fé. Como bem ensina a
doutrina, a anulação de ato administrativo ilegal gera efeitos ex tunc, ou
seja, retroage à data da prática do ato invalidado. Nada obstante,
preservam-se os efeitos já produzidos em relação aos terceiros de boa-
fé”;

b) “não há que se falar em direito adquirido, pois isso


implicaria admitir que o ato ilegal prosseguisse produzindo efeitos para
o futuro, mas sim de nulidade do ato com preservação daqueles que de
boa-fé foram por ele alcançados. Em outras palavras, a questão é
resolvida a partir do resguardo ao terceiro de boa-fé, como decorrência
do princípio constitucional da moralidade e da probidade
administrativa”;

c) "verifica-se que os acadêmicos que obtiveram aprovação


em razão de ato ilegal da UNIFAP, consubstanciado em aplicação de
critério de seleção implícito no PS 2021 de Medicina, em nada confluíram
em sua formação, estando apenas sujeitos aos efeitos de tal ato, de forma
que a eles se aplica a manutenção das matrículas como decorrência da
boa-fé";

d) "a alegada ofensa da sentença aos princípios da


segurança jurídica, da autonomia universitária e da vinculação ao edital
não existe. Como amplamente destacado na instrução processual, a
autonomia universitária não importa em independência e/ou
possibilidade de atuação contra legem da UNIFAP";
:
e) "justamente pelo princípio da vinculação ao edital é que o
MPF deduziu seus pedidos, uma vez que inexistiu menção no edital do PS
2021 de Medicina que a seleção de candidatos seria, além da nota do
Enem, pela escolha de semestre no momento da inscrição, embora isso
tenha ocorrido na prática";

f) "quanto à ofensa ao princípio da segurança jurídica, a


realidade é que reconhecer a suposta consolidação do resultado do PS
2021 de Medicina é que importará em mácula dessa máxima. Como
cediço, dos atos ilegais da Administração não se originam direitos, e a
segurança jurídica dá-se quando há direito adquirido, ato jurídico
perfeito e coisa julgada";

g) "ao contrário do que alega a UNIFAP, a consolidação


pretendida é que importará em ofensa à segurança jurídica, uma vez que
é evidente a lesão a toda a coletividade e de maneira especial aos
candidatos que obtiveram nota para aprovação no Bacharelado em
Medicina do PS 2021 mas foram alijados de seu direito à vaga pela má
sorte quando da escolha do semestre"; e

h) "em que pese a pertinência dos esclarecimentos solicitados


pela PROGRAD, tais questionamentos não são aptos a fundamentar a
oposição de embargos de declaração, pois prestam-se a trâmites
administrativos que serão discutidos na fase de liquidação da sentença.
Por se tratar de sentença coletiva, não há necessidade de entrar nas
minúcias relacionadas aos direitos de cada indivíduo, pois tal será
tratado na execução do título".

Decido.

De fato, em que pese não tenha sido objeto do pedido, a


sentença foi omissa acerca do tratamento do direito de terceiros, sendo
imprescindível a tutela devida, mormente porque não contribuíram para
a situação enfrentada nos autos.

Nessa senda, vê-se que o embargante centra seus pedidos de


revisão do julgado nos seguintes fundamentos: i) omissão com relação
à existência de direitos de terceiros para determinar a republicação do
resultado e a retificação do anexo I, que, em razão da consolidação do
resultado, impõe que o feito seja extinto sem julgamento do
mérito; e ii) obscuridade ante a necessidade de que "sejam esclarecidas
pelo Juízo as dúvidas sobre o cumprimento da decisão, mormente quanto
ao cancelamento da matrícula dos candidatos que não mais seriam
chamados e quanto à anulação dos atos subsequentes à publicação do
Edital".
:
Em resposta, o embargado afirma que "em que pese a
pertinência dos esclarecimentos solicitados pela PROGRAD, tais
questionamentos não são aptos a fundamentar a oposição de embargos
de declaração, pois prestam-se a trâmites administrativos que serão
discutidos na fase de liquidação da sentença. Por se tratar de sentença
coletiva, não há necessidade de entrar nas minúcias relacionadas aos
direitos de cada indivíduo, pois tal será tratado na execução do título"
(Id. nº 1659234989 (tel:1659234989)).

Observa-se que o próprio embargado pontuou a pertinência


dos questionamentos da embargante, porém, ao contrário do que concluiu,
tal situação autoriza o manejo do presente recurso, até para que não
sobrevenham novas demandas com o intuito de regulamentar o decidido
nos presentes autos.

Da leitura das contrarrazões apresentadas pelo embargado, da


lavra da Procuradora da República Sarah Teresa Cavalcanti de
Britto, verifica-se coerente solução para o direcionamento da situação
de terceiros aqui apresentada, sendo oportuno colacionar o seguinte
trecho que passa a integrar o fundamento da presente sentença
integrativa, in verbis:

(...) No que se refere aos alunos que já estão cursando Bacharelado


em Medicina por ato ilegal da UNIFAP, há a incidência da
normativa protetiva aos terceiros de boa-fé. Como bem ensina a
doutrina, a anulação de ato administrativo ilegal gera efeitos ex
tunc, ou seja, retroage à data da prática do ato invalidado. Nada
obstante, preservam-se os efeitos já produzidos em relação aos
terceiros de boa-fé.

Assim, não há que se falar em direito adquirido, pois isso


implicaria admitir que o ato ilegal prosseguisse produzindo efeitos
para o futuro, mas sim de nulidade do ato com preservação
daqueles que de boa-fé foram por ele alcançados. Em outras
palavras, a questão é resolvida a partir do resguardo ao terceiro
de boa-fé, como decorrência do princípio constitucional da
moralidade e da probidade administrativa.

Nesse sentido, Hely Lopes Meirelles assevera:

"Reconhecida e declarada a nulidade do ato, pela Administração


ou pelo Judiciário, o pronunciamento de invalidade opera ex tunc,
desfazendo todos os vínculos entre as partes e obrigando-as à
reposição das coisas ao status quo ante, como conseqüência
natural e lógica da decisão anulatória. Essa regra, porém, é de ser
atenuada e excepcionada para com os terceiros de boa-fé
alcançados pelos efeitos incidentes do ato anulado, uma vez que
estão amparados pela presunção de legitimidade que acompanha
toda atividade da Administração Pública. Mas, ainda aqui é
:
necessário que se tomem os conceitos de parte e de terceiro no
sentido próprio e específico do Direito Administrativo, isto é, de
beneficiário direto ou partícipe do ato (parte) e de estranho ao seu
objeto e à sua formação, mas sujeito aos seus efeitos reflexos
(terceiro). Assim, por exemplo, quando anulada uma nomeação de
funcionário, deverá ele repor os vencimentos percebidos
ilegalmente, mas permanecem válidos os atos por ele praticados
no desempenho de suas atribuições funcionais, porque os
destinatários de tais atos são terceiros em relação ao ato nulo".
(Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, 7ª ed.,
São Paulo, Revista dos Tribunais, 1979, p. 182/183)

Diante disso, verifica-se que os acadêmicos que obtiveram


aprovação em razão de ato ilegal da UNIFAP, consubstanciado em
aplicação de critério de seleção implícito no PS 2021 de Medicina,
em nada confluíram em sua formação, estando apenas sujeitos aos
efeitos de tal ato, de forma que a eles se aplica a manutenção das
matrículas como decorrência da boa-fé. (...)

Quanto aos demais questionamentos que não são reflexos


do encaminhamento do direito de terceiros aqui disposto, deve a
administração observar os efeitos próprios que regem a anulação dos atos
administrativos no sistema jurídico vigente.

Ante o exposto, corrigindo a omissão, integro a sentença de Id


nº 1306933287 (tel:1306933287) para a inserção do seguinte trecho em
sua fundamentação:

Por fim, "no que se refere aos alunos que já estão cursando
Bacharelado em Medicina por ato ilegal da UNIFAP, há a
incidência da normativa protetiva aos terceiros de boa-fé. Como
bem ensina a doutrina, a anulação de ato administrativo ilegal
gera efeitos ex tunc, ou seja, retroage à data da prática do ato
invalidado. Nada obstante, preservam-se os efeitos já produzidos
em relação aos terceiros de boa-fé.

Assim, não há que se falar em direito adquirido, pois isso


implicaria admitir que o ato ilegal prosseguisse produzindo efeitos
para o futuro, mas sim de nulidade do ato com preservação
daqueles que de boa-fé foram por ele alcançados. Em outras
palavras, a questão é resolvida a partir do resguardo ao terceiro
de boa-fé, como decorrência do princípio constitucional da
moralidade e da probidade administrativa.

Nesse sentido, Hely Lopes Meirelles assevera:

"Reconhecida e declarada a nulidade do ato, pela Administração


ou pelo Judiciário, o pronunciamento de invalidade opera ex tunc,
desfazendo todos os vínculos entre as partes e obrigando-as à
reposição das coisas ao status quo ante, como conseqüência
natural e lógica da decisão anulatória. Essa regra, porém, é de ser
:
atenuada e excepcionada para com os terceiros de boa-fé
alcançados pelos efeitos incidentes do ato anulado, uma vez que
estão amparados pela presunção de legitimidade que acompanha
toda atividade da Administração Pública. Mas, ainda aqui é
necessário que se tomem os conceitos de parte e de terceiro no
sentido próprio e específico do Direito Administrativo, isto é, de
beneficiário direto ou partícipe do ato (parte) e de estranho ao seu
objeto e à sua formação, mas sujeito aos seus efeitos reflexos
(terceiro). Assim, por exemplo, quando anulada uma nomeação de
funcionário, deverá ele repor os vencimentos percebidos
ilegalmente, mas permanecem válidos os atos por ele praticados
no desempenho de suas atribuições funcionais, porque os
destinatários de tais atos são terceiros em relação ao ato nulo".
(Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, 7ª ed.,
São Paulo, Revista dos Tribunais, 1979, p. 182/183)

Diante disso, verifica-se que os acadêmicos que obtiveram


aprovação em razão de ato ilegal da UNIFAP, consubstanciado em
aplicação de critério de seleção implícito no PS 2021 de Medicina,
em nada confluíram em sua formação, estando apenas sujeitos aos
efeitos de tal ato, de forma que a eles se aplica a manutenção das
matrículas como decorrência da boa-fé."

Por força da complementação da fundamentação acima


descrita, necessária também a alteração do dispositivo da sentença, com a
inserção de item específico preservando situação de fato consolidada, cuja
redação passa ser a seguinte:

Ante o exposto, homologo o reconhecimento do pedido quanto à


retirada do item 12.8 do edital nº 01/2021 e o impedimento de
sua reprodução nos editais posteriores, julgando parcialmente
procedentes os demais pedidos para:

a) confirmando a tutela provisória de urgência, tornar sem efeito


a publicação do resultado do PS2021, Edital nº 01/2021, em
relação ao Curso de Bacharelado em Medicina;

b) determinar que a Unifap retifique o Anexo I do Edital nº


01/2021 – PS2021, promovendo oferta unificada das 60 vagas do
Curso de Bacharelado em Medicina, com a preservação das
subdivisões dos sistemas de cotas e ampla concorrência, na
proporção estabelecida no item 3 e seguintes do Edital, devendo
classificar todos os inscritos do Curso de Medicina de acordo com o
item 8 do instrumento editalício, distribuindo posteriormente as
vagas por semestre de acordo com a nota desses candidatos, em
ordem decrescente, de forma que a lista geral seja dividida em 2
grupos: os 30 melhores colocados iniciais (considerando-se as
listas da ampla concorrência e das cotas) ingressem no primeiro
semestre do Curso e os 30 restantes ingressem no segundo
semestre do ano letivo;
:
c) determinar que a Unifap promova nos processos seletivos
posteriores, a partir do Ps2021, a oferta unificada das 60 vagas do
Curso de Bacharelado em Medicina, com a preservação das
subdivisões dos sistemas de cotas e ampla concorrência, devendo
distribuir as vagas por semestre de acordo com a nota desses
candidatos, em ordem decrescente, de forma que a lista geral seja
dividida em 2 grupos: os 30 melhores colocados iniciais
(considerando-se as listas da ampla concorrência e das cotas)
ingressem no primeiro semestre do Curso e os 30 restantes
ingressem no segundo semestre do ano letivo;

d) determinar que a Unifap, a despeito das anulações e


retificações determinadas, mantenha a matrícula dos acadêmicos
que obtiveram aprovação em razão do ato ilegal, mesmo aqueles
que não tenham ficado dentro do número de vagas oportunizadas
no edital, ante o reconhecimento de boa-fé e de situação de fato
consolidada.

Sem custas e sem honorários em razão da regra do art. 18 da Lei


nº 7.347/1985.

Sentença sujeita ao reexame necessário.

Comunique-se a prolação desta sentença ao relator do Agravo de


Instrumento nº 1022908-34.2021.4.01.0000.

P. R. I.

No mais, permanece a sentença tal como lançada.

Comunique-se a prolação desta sentença integrativa ao relator


do Agravo de Instrumento nº 1022908-34.2021.4.01.0000.

P. R. I.

Macapá/AP, na data da assinatura eletrônica.

Anselmo Gonçalves da Silva

Juiz Federal

Assinado eletronicamente por: ANSELMO GONCALVES DA SILVA


19/10/2023 17:53:59
https://pje1g.trf1.jus.br:443/consultapublica/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam
ID do documento: 1870590683 (tel:1870590683)
:
23072903135304500001
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