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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

Faculdade Mineira de Direito

DIREITO CONSTITUCIONAL: ESTUDO DE CASO

Belo Horizonte, Setembro de 2022


Contexto:
A Lei Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994 instituiu a defensoria pública do
Estado de MG, bem como estabeleceu a forma de provimento dos cargos de defensor. Essa
lei estabeleceu que esse provimento seria feito por remoção de outros servidores estáveis,
pertencentes a outra carreira diversa da carreira de defensor.
O procurador-geral da República manejou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade
contra dispositivos dessa lei, porém, essa ação somente foi julgada pelo STF, no mérito, 03
anos depois e foram considerados inconstitucionais esses dispositivos, em razão da violação à
regra de investidura via concurso público, disposta no inciso II do artigo 37.
II - a investidura em cargo ou emprego público
depende de aprovação prévia em concurso público de provas
ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a
complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei,
ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado
em lei de livre nomeação e exoneração(BRASIL, 1988).

No entanto, o STF se utilizou da modulação temporal dos efeitos da decisão (art.27,


lei 9868/99) para determinar que a decisão somente tivesse efeito a partir de 01 ano, assim,
após esse período, os servidores retornaram ao seus cargos de origem e passaram a receber
seus vencimentos correspondentes.
Inconformados com essa situação, os servidores procuraram advogado com o fim de
ver reconhecido o princípio da irredutibilidade dos seus vencimentos, sendo que essa questão
da irredutibilidade não havia sido discutida perante o STF. Os servidores, então, impetraram
Mandados de Segurança para garantir esse direito à irredutibilidade, sendo que esses
Mandados foram julgados pelo TJMG.
Cabe a impetração deste Mandado de segurança, ou seja, a decisão do STF impede
que matérias correlatas aquelas decididas na Ação direta de Inconstitucionalidade sejam
discutidas perante outros juízos?

Debate:

O Brasil adota um controle de constitucionalidade híbrido (controle concreto e


abstrato), ou seja, controle concreto e abstrato. No presente caso é possível observar o
conflito entre esses dois tipos de controles de Constitucionalidade, em que o primeiro
(concreto), possui como principais características, em regra, ter efeitos inter partes, e o
segundo (abstrato) ser um processo objetivo (sem partes), com efeitos, em regra, ergas
omnes, no qual se faz a análise da lei em tese1.
O sistemas de controle de constitucionalidade pátrio, adota uma miríade de formas de
controle, contemplando o controle em concreto em sede incidental ou principal – jurisdição
constitucional das liberdades –, em abstrato – ações diretas estaduais e federais –, por órgãos
de diversos graus de jurisdição – como Tribunais de Justiça ou o Supremo Tribunal Federal
(STF) –, com eficácia restrita ao caso ou ampla, e com mecanismos de ampliação – resolução
suspensiva – ou jurisprudência dotada de eficácia vinculante, embora distinta da geral –
súmulas vinculantes –, entre outras 2.
A declaração de inconstitucionalidade proferida pelo STF no controle abstrato ostenta
efeitos erga omnes, ao passo que a declaração de inconstitucionalidade proferida pelo STF
em sede de controle concreto ostenta efeitos restritos ou inter partes, salvo se, comunicado ao
Senado Federal, este editar resolução através da qual suspenda a eficácia do ato legislativo
fulminado.
A Constituição Federal de 1988 prevê expressamente o efeito erga omnes e vinculante
das decisões definitivas de mérito proferidas pelo STF em ações declaratórias de
constitucionalidade a partir da Emenda Constitucional nº. 3/93, que introduziu o parágrafo §
ao artigo 102.
Art 102 - § 2º As decisões definitivas de mérito, proferidas
pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de
inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de
constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito
vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à
administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual
e municipal (BRASIL, 1988).

Apesar da decisão do supremo com efeitos erga omnes e vinculante trazer segurança
jurídica, há de se falar na apreciação concreta em razão da proteção de bens fundamentais
individuais, ainda que com risco de corrosão da ordem jurídica e discricionariedade. É
necessário então que os profissionais atuantes busquem esse equilíbrio constantemente.

1
MONTEIRO, Daniel Azevedo. Poder Judiciário no Brasil. Jan. 2014. Disponível em:
<https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/8339/Consideracoes-acerca-do-controle-de-constitucionalidade-re
alizado-pelo-Poder-Judiciario-no-Brasil> Acesso em: 30 ago, 2022.
2
ZAVASCKI, Teori Albino. Eficácia das sentenças na jurisdição constitucional. 2001. Disponível em:
<https://www.scielo.br/j/seq/a/fXxVmQJzkKPRSNmnQNb7cmC/abstract/?lang=pt> Acesso em 30 ago, 2022.
Sustenta o Ministro Gilmar Mendes, apoiado pelo então Ministro Eros Grau, que a
jurisdição do Supremo Tribunal Federal passará por um processo de “objetivação” ou
“abstrativização”, não fazendo mais sentido, em seu juízo, a distinção baseada naquele que
considera um instituto vetusto e ultrapassado, qual seja, a resolução suspensiva do Senado
Federal3.
É sustentada uma revisão e atualização da jurisprudência da corte na matéria,
postulando o reconhecimento de uma eficácia ampla das decisões do STF mesmo que fossem
estas proferidas em controle abstrato, em controle concreto ou incidental4.
Ainda, o Supremo Tribunal Federal (STF) entende ser possível a utilização do
mandado de segurança, por parlamentar, para a realização de controle de constitucionalidade
preventivo.
O mandado de segurança impetrado neste caso é válido, pois a ADI produz efeitos no
plano normativo abstrato, e não no plano concreto individual, não tendo condão de modificar
situações concretas de forma automática. Além disso, tendo em vista que o devido processo
administrativo não foi estabelecido para a dispensa dos funcionários concursados, impedindo
o exercício de ampla defesa e que a irredutibilidade não foi discutida na ADI, havia espaço
para a matéria em outra jurisdição, permitindo assim a discussão pela via do controle
concreto. Além do mais, o controle concreto é possível de forma independente do controle
abstrato, via de regra, salvo se a situação concreta já tiver sido alcançada por formas de
preclusão, em respeito ao princípio da segurança jurídica, logo, o controle concreto é
acessível ao caso narrado.
Vale destacar, que o controle abstrato objetiva a verificação da constitucionalidade do
texto legal em si, logo, a análise independe de aplicação a um caso concreto. Outrossim, o
controle de constitucionalidade concreto possui como principais características o fato de ser
um controle ex tunc e inter partes, sendo assim, seus efeitos são retroativos unicamente para
as partes que compõem o processo e permite que o magistrado ou órgão colegiado possa
analisar dentro do caso concreto se a ação possui compatibilidade perante a Constituição.
Portanto, a irredutibilidade de vencimento tratada no mandado de segurança no TJMG
deve ser respeitada, pois não há do que se falar em ofensa a direito líquido e certo no qual os
servidores públicos retratados no caso já possuíam, e sendo que a irredutibilidade dos
vencimentos não foram pauta na ADI julgada pelo STF, essa discussão é válida e devida

3
ZAVASCKI, Teori Albino. Eficácia das sentenças na jurisdição constitucional. 2001. Disponível em:
<https://www.scielo.br/j/seq/a/fXxVmQJzkKPRSNmnQNb7cmC/abstract/?lang=pt> Acesso em 30 ago, 2022.
4
MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2013.
dentro do caso concreto narrado, havendo espaço para discussão da matéria em outras
jurisdições.
REFERÊNCIAS:

BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acesso em 13 set,
2022.

MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. 3. ed. rev., atual. e ampl. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.

MONTEIRO, Daniel Azevedo. Poder Judiciário no Brasil. Jan. 2014. Disponível em:
<https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/8339/Consideracoes-acerca-do-controle-de-con
stitucionalidade-realizado-pelo-Poder-Judiciario-no-Brasil> Acesso em: 30 ago, 2022.

ZAVASCKI, Teori Albino. Eficácia das sentenças na jurisdição constitucional. 2001.


Disponível em:
<https://www.scielo.br/j/seq/a/fXxVmQJzkKPRSNmnQNb7cmC/abstract/?lang=pt> Acesso
em 30 ago, 2022.

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