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Impugnação ao cumprimento de sentença e

embargos à execução no CPC


 Thomaz Carneiro Drumond

13 de outubro de 2023, 15h23

O rito executório é informado pelo princípio do desfecho único e comporta uma


dualidade básica de posições. De um lado, o credor busca obter materialmente o
bem da vida garantido pelo titulo executivo judicial ou extrajudicial. Do outro, o
devedor executado, cuja pretensão se limita a defender ou impedir o êxito do
exequente.

O executado possui a priori duas formas de defesa


a depender da natureza da execução. Contra o título executivo judicial em cumprimento de
sentença cabe a impugnação do artigo 525 do CPC (artigo 535, no caso da Fazenda Pública), ao
passo que cabem embargos à execução para resistir ao rito executório de um título executivo
extrajudicial conforme o artigo 914 do CPC (artigo 910 do CPC no caso da Fazenda Pública).

Impugnação
A impugnação é apresentada nos mesmos autos, por simples petição. Não se cria
novo processo incidental, tampouco se formam novos autos. Seu julgamento se dá
por decisão interlocutória caso mantenha a execução ainda que parcialmente, e por
sentença, em caso de extinção da execução (artigo 203, §1º, parte final, e
artigo 924, do CPC).
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Tem lugar na defesa do cumprimento de sentença de título executivo judicial para
pagamento de quantia certa. Todavia, será cabível, no que couber, com relação à
obrigação de fazer ou de dar coisa (artigo 536, §4º, e artigo 538, §3º, do CPC).

Com base no caput dos artigo 523 e 525 do CPC, o executado será intimado e terá
o prazo de 30 dias úteis (artigo 219, do CPC) para apresentar a sua impugnação. É
que os primeiros 15 dias serão para realizar o pagamento voluntário (artigo 523) e,
não o fazendo, posteriormente terá início automático, sem nova intimação, de um
novo prazo de 15 dias para impugnar. Esses prazos contam-se independentemente
de penhora ou garanta (artigo 525) e em dias úteis.

Para se compreender o alcance da impugnação, deve-se partir da ideia de que na


fase cognitiva o contraditório foi amplo, culminando-se em sentença prolatada
pelo judiciário contra a qual foram cabíveis diversos recursos. O que se deve ter
em mente é que o título judicial posteriormente executado formou-se em cognição
exauriente após debates na fase de conhecimento. Então, a impugnação possui um
campo limitado de discussões, já que o "núcleo duro" dos questionamentos no
judiciário já ocorreram na fase anterior à execução. Vejamos os temas alegáveis na
impugnação conforme se extrai do artigo 525, §1º, do CPC:

"§1º Na impugnação, o executado poderá alegar:


I – falta ou nulidade da citação se, na fase de conhecimento, o processo correu à
revelia;
II – ilegitimidade de parte;
III – inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação;
IV – penhora incorreta ou avaliação errônea;
V – excesso de execução ou cumulação indevida de execuções;
VI – incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução;
VII – qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento,
novação, compensação, transação ou prescrição, desde que supervenientes à
sentença."

O inciso I, que trata da nulidade de citação quando o processo na fase de


conhecimento correto a revelia, constitui exceção à regra de que, ainda que no
módulo de conhecimento tenha havido nulidades absolutas, não poderiam ser
arguidas em via de impugnação, porque sobre as mesmas já pesa a autoridade da
coisa julgada, só sendo possível a utilização da ação rescisória para cassar a parte
dispositiva da sentença definitiva que tem sobre si a imutabilidade e autoridade da
coisa julgada [1].

Com exceção do primeiro inciso, todas as demais alegações dizem respeito a


situações ocorridas após o trânsito em julgado, ou seja, falhas pontuais que
surgiram ou são apreciáveis apenas no próprio modo de conduta do Credor no rito
executório. Na impugnação, não há uma nova oportunidade para debater a
obrigação constituída na sentença, e tampouco seria possível questionar
novamente o conteúdo do título judicial.

É por isso que se afirma que a impugnação ao cumprimento de sentença não pode
combater o mérito da condenação, limitando-se ao âmbito das preliminares,
pressupostos processuais e condições do rito executivo. Tudo que envolve o
mérito da condenação só pode ser relacionado a eventos posteriores que possam
afetar a sentença e a dívida reconhecida, como pagamento, compensação ou
prescrição da execução, enfatizando-se que tais eventos devem ocorrer de forma
superveniente. Essa restrição em seu alcance é justificada pelos motivos
mencionados.

Embargos à execução
Os embargos à execução têm natureza de ação judicial e devem ser distribuídos
em apenso, por dependência, conforme o artigo 914 e §1º do CPC, devendo ser
apresentados no prazo de 15 dias úteis a partir da citação. Em geral, esses
embargos não possuem efeito suspensivo e não exigem garantia do juízo
(conforme o artigo 919). No entanto, de acordo com o §1º, o juiz poderá conceder
efeito suspensivo se a parte garantir o juízo e demonstrar que os requisitos da
tutela provisória estão presentes. Em outras palavras, o efeito suspensivo é
concedido pelo próprio julgador (ope judicis).

Podem ser apresentados contra qualquer execução de título executivo


extrajudicial. Seu julgamento se dá por sentença e comporta juízo de procedência
ou improcedência, a fim de se desconstituir o título executivo extrajudicial
combatido.

Mas a amplitude dos embargos à execução em muito supera a da impugnação.


É que ainda que o legislador atribua presunção de certeza, liquidez e exigibilidade
ao título executivo extrajudicial, também é garantido ao executado o amplo direito
de discutir em juízo a higidez do título, observando, assim, os princípios
constitucionais do contraditório e da ampla defesa previstos no artigo 5º, LV, da
Constituição.

Esta conclusão é extraída da interpretação do disposto no artifo e 917, VI, do CPC:

"Artigo 917. Nos embargos à execução, o executado poderá alegar:


VI – qualquer matéria que lhe seria lícito deduzir como defesa em processo de
conhecimento."

Diferentemente da execução de título judicial, em que a impugnação possui


cognição limitada em razão de já ter havido prévia discussão e acertamento
judicial da lide, os embargos à execução de título extrajudicial permitem ampla
cognição por constituírem verdadeira ação de conhecimento. Afinal, é a partir dos
embargos que se inaugura o debate em juízo até então inédito, podendo assim
rediscutir a própria formação do título.

Nesse sentido é a lição da doutrina do professor Humberto Theodoro Júnior:

"Embora o título extrajudicial goze de força executiva igual à da sentença, não se


apresenta revestido da imutabilidade e indiscutibilidade próprias do título
judicial passado em julgado. Daí porque, ao regular os embargos manejáveis
contra a execução de títulos extrajudiciais, a Lei permite ao executado arguir
tanto questões ligadas aos pressupostos e condições da execução forçada como
quaisquer outras defesas que lhe seria lícito opor ao credor, caso sua pretensão
tivesse sido manifestada em processo de conhecimento." (Theodoro Júnior,
Humberto. Processo de Execução e Cumprimento da Sentença. 25ª Ed. rev. ampl.
atual. São Paulo. LIV. e ED. Universitária de Direito, 2008, pág. 426).

É o mesmo posicionamento de Luiz Guilherme Marinoni:

"Daí a razão fundamental da segunda diferença entre a execução dos títulos


judiciais e dos extrajudiciais. A defesa do executado, na execução de títulos
extrajudiciais, não se faz mediante simples impugnação, oferecida no seio do
procedimento executivo. Como já dito, aqui a defesa se realiza por meio da
propositura de novo processo, que veiculará uma ação de conhecimento
autônoma e incidente ao processo de execução, que objetiva discutir aspectos da
execução, do título e do próprio crédito demandado. O executado se tornará
autor de uma ação que tem por objetivo desconstituir o título ou o direito
demandado ou ainda inviabilizar o processo de execução. Este processo de
conhecimento incidente ao de execução é de cognição plena e exauriente. Permite
a discussão de qualquer tema (vinculado, obviamente, ao direito postulado na
execução) e sua sentença é apta a tornar-se imutável pela coisa
julgada." (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, et al. Novo Curso de
Processo Civil: Tutela dos direitos mediante procedimentos diferenciados. V.3. 3
Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, v. d., p. 34-35).

O tratamento que a resposta do devedor dá à execução do título extrajudicial


corresponde a uma verdadeira transformação da execução em ação ordinária de
cobrança, pelo menos enquanto estiverem pendentes os embargos opostos pelo
executado. O crédito passa a ser objeto de ampla indagação e de completo
acertamento, tanto positivo como negativo [2].

É por isso que se diz que o juízo cognitivo dos embargos é amplo e pode atingir
tanto os fatos anteriores à formação do título (a própria causa debendi) como os
posteriores, que possam provocar a modificação ou extinção do crédito ou o
impedimento à sua exigibilidade. Fala-se, nesse sentido, que na execução do título
extrajudicial ocorreria "execução adiantada", com "inversão da ordem das
atividades jurisdicionais" [3].

Comparando-se com a defesa na execução de título judicial, não há dentre os


temas alegáveis na impugnação ao cumprimento de sentença um inciso semelhante
ao VI, que amplia a discussão para "qualquer matéria" alegável na fase de
conhecimento. Isso se dá por um motivo: tais alegações do executado-impugnante
deveriam ter sido feitas na fase de conhecimento, não inaugurando a impugnação
nova oportunidade, o que se dá também em atenção ao artigo 508 do CPC:

"Artigo 508. Transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão


deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor
tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido."
Embora existam inúmeras outras diferenças, neste ensaio pretendeu-se apenas
destacar alguns pontos práticos e breves que merecem atenção por parte dos
advogados, especialmente no que diz respeito às formalidades do peticionamento e
à sutil diferença entre o alcance e as matérias alegáveis, e revela algumas das
razões para essas distinções.

[1] ABELHA, Marcelo. Manual da Execução. 5a. Ed. Forense: Rio de Janeiro.
2015.

[2] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Rio de


Janeiro: Forense, 2018. vol. III, item 513, p. 709.

[3] MIRANDA, Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de


Janeiro: Forense, 1974, t. IX, p. 63; ZAVASCKI, Teori Albino. Processo de
execução – parte geral. 3. ed. São Paulo: RT, 2004, p. 273.

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