Apelação é o recurso cabível contra sentença (art. 1.009, CPC),
definida como “o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução” (art. 203, § 1º, CPC). Sua finalidade, como os recursos de maneira geral, é provocar o reexame da decisão judicial pelo órgão judiciário de segundo grau, com escopo de sua reforma ou modificação, total ou parcial (art. 1.002, CPC). Para sua admissibilidade, não importa se a sentença foi de mérito (art. 487, CPC) ou sem julgamento do mérito (art. 485, CPC), bem como a natureza do procedimento onde foi prolatada, ou se o processo é de jurisdição voluntária ou contenciosa. Entretanto, há que se ressaltar que, se o processo for entre, de um lado, Estado estrangeiro ou organismo internacional e, de outro, Município ou pessoa residente ou domiciliada no país, será cabível o recurso ordinário para o STJ, que, neste caso, se equipara ao de apelação (art. 1.027, II, b, CPC). Cabe, igualmente, recurso de apelação contra sentença em mandado de segurança, negando ou concedendo o remédio heroico, decidida por juiz singular (art. 14, Lei no 12.016/09, LMS). De outro lado, não cabe apelação contra a sentença que julga parcialmente o mérito (decisão interlocutória de mérito). Com efeito, o juiz, segundo o art. 356 do CPC, pode julgar parcialmente o mérito quando um ou mais pedidos formulados ou parcela deles: (I) mostrar-se incontroverso; (II) estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 355. Nestes casos, o recurso cabível é o do agravo de instrumento. Embora apelação seja, como se disse, recurso a ser interposto contra sentença, o recorrente pode impugnar, em preliminar (razões ou contrarrazões), decisões interlocutórias proferidas durante o processo e que não eram passiveis de impugnação por meio de agravo de instrumento (art. 1.009, § 1º, CPC), visto que nestes casos ficou afastado, quanto a estas decisões, o efeito da preclusão. O objetivo do legislador foi diminuir as hipóteses de incidência do recurso de agravo de instrumento (art. 1.015, CPC), com a consequente diminuição de recursos em segundo grau; a fim de evitar prejuízos aos interessados, criou-se então a possibilidade de a parte questionar a decisão interlocutória em preliminar na apelação, visto que nesta oportunidade ela teria mais condições de avaliar a lesividade da decisão que lhe foi desfavorável.
INTERPOSIÇÃO
O art. 1.010 do CPC informa que a apelação deve ser interposta
por petição dirigida ao juízo de primeiro grau, sendo seus requisitos formais: I – os nomes e a qualificação das partes; II – a exposição do fato e do direito; III – as razões do pedido de reforma ou de decretação de nulidade; e IV – o pedido de nova decisão. Não obstante o declarado no texto legal, estando o recorrente e o recorrido já qualificados nos autos, desnecessário contenha a petição de interposição nova qualificação; o terceiro, no entanto, deve indicar sua qualificação completa. Por outro lado, imprescindível apresente o apelante as razões do seu inconformismo, demonstrando os vícios e erros da sentença, impugnando os argumentos que lhe dão arrimo e, finalmente, fazendo pedido expresso ao órgão ad quem de nova decisão, que reforme total ou parcialmente aquela expedida pelo juiz de primeiro grau (este pedido delimita o âmbito de devolutividade do recurso). No ato de interposição do recurso, o apelante deverá comprovar, quando exigido pela legislação pertinente (estadual ou federal), o recolhimento do respectivo preparo, que envolve custas e despesas, inclusive porte de remessa e de retorno, sob pena de ter seu recurso declarado deserto, consoante o art. 1.007 do CPC. A formalização da interposição do recurso de apelação só ocorre com o efetivo protocolo da petição de interposição, acompanhada das razões, no protocolo da Comarca. Não basta, a fim de caracterizar sua tempestividade, o mero despacho com o juiz competente, sendo necessária a entrega no respectivo cartório. Para aferição da tempestividade do recurso remetido pelo correio, será considerada como data de interposição a data de postagem (art. 1.003, § 4º, CPC).
PRAZO
O prazo para interpor o recurso de apelação, bem como para
contra-arrazoá-la, é de 15 (quinze) dias, contados “da data em que os advogados, a sociedade de advogados, a Advocacia Pública, a Defensoria Pública ou o Ministério Público são intimados da decisão” (art. 1.003, CPC). Quando a sentença for proferida em audiência, as partes considerar-se-ão intimadas no ato. O Ministério Público, a Advocacia Pública e a Defensoria Pública têm a prerrogativa de serem intimados pessoalmente, assim como dispõem do prazo em dobro para recorrer (arts. 180, 183, 186, CPC), bem como as partes com diferentes procuradores (art. 229, CPC). A contagem dos prazos para interposição de recurso pelo réu contra decisão proferida anteriormente à citação deve observar as regras dos incisos I a VI do art. 231 do CPC, quais sejam: (I) a data de juntada aos autos do aviso de recebimento, quando a citação ou a intimação for pelo correio; (II) a data de juntada aos autos do mandado cumprido, quando a citação ou a intimação for por oficial de justiça; (III) a data de ocorrência da citação ou da intimação, quando ela se der por ato do escrivão ou do chefe de secretaria; (IV) o dia útil seguinte ao fim da dilação assinada pelo juiz, quando a citação ou a intimação for por edital; (V) o dia útil seguinte à consulta ao teor da citação ou da intimação ou ao término do prazo para que a consulta se dê, quando a citação ou a intimação for eletrônica; e (VI) a data de juntada do comunicado de que trata o art. 232 ou, não havendo esse, a data de juntada da carta aos autos de origem devidamente cumprida, quando a citação ou a intimação se realizar em cumprimento de carta. O terceiro prejudicado dispõe do mesmo prazo que as partes para recorrer. Suspende-se o prazo para interposição do recurso, segundo o art. 1.004 do CPC, “se, durante o prazo para a interposição do recurso, sobrevier o falecimento da parte ou de seu advogado ou ocorrer motivo de força maior que suspenda o curso do processo, será tal prazo restituído em proveito da parte, do herdeiro ou do sucessor, contra quem começará a correr novamente depois da intimação”. O impedimento do advogado, como, por exemplo, uma doença ou um acidente, deve ser tal que o impossibilite não só da prática do ato, mas também de outorgar, por exemplo, um substabelecimento a outro colega. Há, ademais, que se considerar que a interposição de embargos de declaração tem o efeito de interromper o prazo para a interposição de outros recursos (art. 1.026, CPC). Neste caso, o prazo integral só voltará a correr depois da intimação da decisão sobre os embargos (art. 1.003, CPC).
EFEITOS
Além de obstar o trânsito em julgado da sentença, a apelação, de
regra, tem duplo efeito: o devolutivo e o suspensivo. O efeito devolutivo consiste na transferência para o órgão ad quem do conhecimento de toda a matéria efetivamente impugnada pelo recorrente e, obviamente, no limite da impugnação (tantum devolutum quantum apellatum). Neste sentido, a norma do art. 1.013 declara: “A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada. § 1º Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado. § 2º Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais. § 3º Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando: I – reformar sentença fundada no art. 485; II – decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir; III – constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que poderá julgá-lo; IV – decretar a nulidade de sentença por falta de fundamentação.” Havendo reforma da sentença que tenha conhecido a ocorrência da decadência ou prescrição, o tribunal, se possível, deve julgar o mérito, examinando as demais questões. O interessado pode, ainda, impugnar o capítulo da sentença que confirma, concede ou revoga a tutela provisória. O efeito devolutivo, como se vê, possibilita conhecer o tribunal de todas as questões suscitadas e discutidas no processo, mesmo que a sentença não as tenha apreciado por inteiro. A apelação alcança tantos os errores in iudicando (erros de interpretação), quanto os errores in procedendo (erros de forma). Pode, inclusive, acolher fundamento alternativo da defesa, previamente rejeitado pelo juiz de primeiro grau, ou até julgar o feito, no caso de o juiz de primeiro grau ter extinguido o processo sem julgamento de mérito, se a questão de fundo for unicamente de direito. Estabelecido o alcance do efeito devolutivo, fica fácil concluir que o apelante pode recorrer parcialmente quanto à questão de mérito (princípio dispositivo), sendo que a matéria não impugnada transitará em julgado, formando a coisa julgada e possibilitando a execução definitiva. Exemplo desta situação é o caso do réu que é condenado a pagar indenização por danos materiais e morais e apela apenas quanto aos danos morais. Nesta hipótese, a sentença, quanto aos danos materiais, transitará em julgado, possibilitando ao autor o ajuizamento da execução definitiva. Outra conclusão que advém do efeito devolutivo é a proibição da reformatio in pejus. Com efeito, se a parte contrária se conformou com os limites da sentença, não pode o recorrente que, no exercício de um direito, busca a revisão da decisão judicial, ter sua situação alterada para pior. O efeito suspensivo, por sua vez, impede a eficácia da decisão judicial, mantendo a situação decidida, nos limites da matéria impugnada pelo recurso, no mesmo estado em que se encontra, até nova decisão pelo órgão ad quem. Embora, de regra, a apelação deva ser recebida no duplo efeito (devolutivo e suspensivo), há, segundo norma do art. 1.012 do CPC, algumas exceções a esta regra geral, quando a sentença recorrida: I – homologa divisão ou demarcação de terras; II – condena a pagar alimentos; III – extingue sem resolução do mérito ou julga improcedentes os embargos do executado; IV – julga procedente o pedido de instituição de arbitragem; V – confirma, concede ou revoga tutela provisória; VI – decreta a interdição. Nestes casos, o relator, a pedido da parte interessada, pode suspender o cumprimento da sentença, se o apelante demonstrar a probabilidade de provimento do recurso ou se, sendo relevante a fundamentação, houver risco de dano grave ou de difícil reparação. Ressalve-se, ademais, que a Lei nº 8.245/91, a chamada Lei do Inquilinato, declara no seu art.58, inciso V, que os recursos interpostos contra as sentenças proferidas nas ações de despejo, consignação em pagamento de aluguel e acessórios de locação, revisionais de aluguel e renovatórias de locação terão somente o efeito devolutivo. Merecem, por fim, nota especial a situação da apelação interposta contra sentença que indeferiu de pronto o pedido do autor (art. 332, CPC) e aquela que indefere a petição inicial (art. 330, CPC). Em ambos os casos, é facultado ao juiz, no prazo de 5 (cinco), contados do termo de conclusão, reformar sua decisão. Nestes casos, ocorre a mitigação do efeito devolutivo, uma vez que a interposição do recurso de apelação possibilita ao próprio juiz prolator da sentença reformar sua decisão, configurando exceção à regra prevista no art. 494 do CPC. Havendo reforma da decisão, o processo terá regular prosseguimento. De outro lado, mantida a sentença, o juiz deverá ordenar a citação do réu para responder ao recurso.
QUESTÕES NOVAS
Regra geral, não se pode inovar quando da apelação; ou seja, as
partes devem apresentar o seu caso ao juiz de primeiro grau. O recorrente pode, no entanto, suscitar na apelação questões de fato não propostas no juízo de primeiro grau, desde que prove que deixou de fazê-lo oportunamente por motivo de força maior. Com efeito, o art. 1.014 do CPC é expresso sobre o tema, declarando que “as questões de fato não propostas no juízo inferior poderão ser suscitadas na apelação, se a parte provar que deixou de fazê-lo por motivo de força maior”. Importante observar, no entanto, que o referido dispositivo não permite a modificação da causa de pedir (causa petendi). Assim, desejando o recorrente suscitar questão nova quando da apelação, de-verá tomar o cuidado de previamente alegar e provar o motivo de força maior que dá arrimo a sua pretensão, para, só então, ter a questão apreciada pelo tribunal. Aplica-se esta mesma norma para a juntada de novos documentos na apelação, ou seja, deve a parte justificar os motivos que a impediram de fazê-lo oportunamente. Dispensa prova de motivo de força maior a alegação de prescrição, que pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição (art.193, CC). A proibição de inovar alcança também a juntada de novos documentos; a exceção, a ser justificada, envolve apenas novos documentos que se refiram a fatos supervenientes.
PROCEDIMENTO
Formalizada a interposição do recurso de apelação, os autos irão
conclusos ao juiz a quo, que, sem emitir qualquer juízo, deverá determinar a intimação, ou citação (arts. 331, § 1º, 332, § 4º, CPC), da parte contrária para, se quiser, responder. Havendo recurso adesivo, o juiz deverá observar o mesmo procedimento, recebendo o recurso e declarando os seus efeitos, abrindo, em seguida, prazo para a manifestação da parte contrária. Note-se que a apresentação do recurso adesivo não dispensa a parte de contra-arrazoar o recurso principal. Diferentemente do que acontecia sob a égide do CPC de 1973, o juiz de primeiro grau não mais emite juízo de admissibilidade quanto ao recurso (art. 1.010, § 3º, CPC); o legislador do novo CPC acabou com a competência diferida do juízo de origem, buscando dar mais agilidade ao recurso de apelação. Agora cabe somente ao relator a verificação da presença, ou não, dos requisitos de admissibilidade do recurso, assim como declarar os efeitos em que é recebido. Em seguida, apresentadas, ou não, as contrarrazões, o juiz determinará a subida dos autos para o órgão ad quem, onde o relator, como se disse, declarará os efeitos em que é recebido, emitindo juízo de admissibilidade, podendo: (I) decidi-lo monocraticamente apenas nas hipóteses do art. 932, incisos III a V; (II) se não for o caso de decisão monocrática, elaborar seu voto para julgamento do recurso pelo órgão colegiado. Os incisos do citado art. 932 informam que o relator poderá: (III) não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida; (IV) negar provimento a recurso que for contrário a: (a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; (b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; (c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; (V) depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a: (a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; (b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; (c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência.