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Professora Ana Paula Correia de Souza

Direito Processual Penal I

TEORIA GERAL DOS RECURSOS


Segundo Nucci, recurso é uma garantia individual do duplo grau de jurisdição,
prevista implicitamente na CF. Pode ser entendido como o direito que a parte possui de,
na mesma relação jurídica processual, atacar decisão judicial que lhe contrarie,
pleiteando sua revisão total ou parcial.

RECURSOS AÇÕES AUTÔNOMAS

São ajuizados antes do trânsito em Natureza de ação.


julgado da decisão impugnada.

Utilizados na mesma relação jurídica Dá origem a uma nova relação


processual. jurídica.

- NATUREZA JURÍDICA:
Existem 3 correntes:
1ª) Desdobramento do direito de ação (desenvolvimento de uma nova
etapa da mesma relação processual). MAJORITÁRIA
2ª) Nova ação dentro do mesmo processo.
3ª) Meio destinado a obter a reforma da decisão.

- FINALIDADE:
Reexame de uma decisão por órgão jurisdicional, em regra, de instância superior.

- O PRINCÍPIO AO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO:


Apesar de não estar assegurado expressamente na Constituição Federal, parte da
doutrina entende que o duplo grau de jurisdição está implicitamente inserido no direito
ao devido processo legal, previsto no artigo 5º, inciso LIV, e no direito à ampla defesa,
previsto no artigo 5º, inciso LV.
O duplo grau de jurisdição consiste na garantia do reexame integral da matéria
de fato e de direito da decisão do juízo a quo por um outro órgão jurisdicional.
A doutrina aponta dois fundamentos para o princípio em comento: a falibilidade
humana e o inconformismo das partes.
Esse princípio também traduz a possibilidade de o processo ser examinado
inicialmente no primeiro grau de jurisdição e reexaminado em sede recursal pelo
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Tribunal, com exceção das hipóteses de competência originária destes. Logo o princípio
em comento também impede a supressão do primeiro grau de jurisdição. Inclusive, vale
ressaltar que este é o fundamento para a vedação de muttatio libelli na segunda
instância.
Trata-se de um princípio absoluto? Não, pois além de existirem decisões que
são irrecorríveis, deve-se considerar que nem todo recurso permite o exame da matéria
de fato e de direito como é o caso dos Recursos Extraordinário e Especial, pois se
prestam à tutela da Constituição Federal e da Legislação Federal infraconstitucional,
respectivamente.

- CLASSIFICAÇÃO DOS RECURSOS:


Constitucionais: Previstos no próprio texto constitucional.
Exemplo: Recurso Extraordinário; Especial; Ordinário.
Legais: São os que emanam do próprio CPP ou de leis especiais.

- Apelação; Em sentido estrito; Apelação; Embargos de


Declaração; Embargos infringentes ou de nulidade; Carta testemunhável; Agravo em
Execução.

- CARACTERÍSTICAS:
a) Voluntariedade (art. 574, primeira parte/CPP): O recurso traduz a
manifestação de vontade da parte em recorrer da decisão proferida.
- Exceções:

- Reexame Necessário (Duplo grau de jurisdição obrigatório/


Recurso de ofício/ Recurso Anômalo): Trata-se de condição de eficácia
da sentença.
Súmula 423/STF: Não transita em julgado a sentença por
haver omitido o recurso ex officio, que se considera
interposto ex lege.
Exemplos de recurso de ofício:
a) Indeferimento liminar da revisão criminal,
por falta (ou incompleto) de instrumento (art. 625,
§3º/CPP);
b) Indeferimento liminar de HC pelo
Presidente do Tribunal (art. 663/CPP);
c) Concessão de reabilitação criminal (art.
746/CPP)
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- Extensão subjetiva do efeito devolutivo do recurso/ efeito


extensivo do recurso: Art. 580/CPP.
b) Tempestividade: O recurso deve ser interposto antes de formada a preclusão
ou a coisa julgada, respeitando o prazo previsto em lei, ou seja, a parte não pode exercer
o seu inconformismo por período indeterminado.
Vale ressaltar que a tempestividade é também um pressuposto de
admissibilidade recursal.
c) Taxatividade: O recurso deve estar previsto de forma prévia e expressa
(numerus clausus). Logo, se a lei não prevê recurso contra determinada decisão,
conclui-se que essa decisão é irrecorrível, mas nada impede que a parte questione a
matéria em preliminar de futura e eventual apelação ou ainda por meio de ações
autônomas de impugnação como o habeas corpus ou mandado de segurança em matéria
criminal.
A taxatividade não impede a aplicação da analogia ou da interpretação
extensiva. (Ex.: RESE contra decisão de indeferimento do aditamento da inicial
acusatória).
d) Unirrecorribilidade (unicidade ou singularidade) das decisões: Como
regra, a lei prevê apenas um recurso para a impugnação de uma decisão.
Exemplo: artigo 593, §4º/CPP.

- Exceções: Recurso Especial e Recurso Extraordinário.

- EFEITOS DOS RECURSOS:


a) Devolutivo: É o efeito comum de todos os recursos, variando apenas em sua
extensão e profundidade. É a possibilidade de reanálise da questão decidida pelo juízo a
quo que tenha gerado inconformismo por outro órgão jurisdicional.
Ressalta-se que por ser o recurso um ato voluntário e condicionado ao
inconformismo da parte sucumbente, cabe a este delimitar a matéria a ser apreciada em
sede recursal – regra do tantum devolutum quantum appellatum, a qual limita o efeito
devolutivo do recurso, em fiel observância ao princípio da inércia da jurisdição.
A extensão do efeito devolutivo pode ser total ou parcial. Naquela hipótese, o
juízo ad quem analisará todas as questões da lide. Em sendo parcial, o juízo ad
quem ficará restrito a matéria impugnada pelo recorrente.

b) Suspensivo: Consiste na impossibilidade de a decisão recorrida produzir seus


efeitos (aplicabilidade) enquanto o recurso não seja julgado, ou seja, embora tenha
havido uma decisão, esta não produzirá efeitos em razão da interposição do recurso. É
um efeito excepcional, uma vez que exige a previsão legal de tal efeito.
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Renato Brasileiro explica que não é a interposição do recurso que suspende os


efeitos da decisão, mas sim a mera previsão legal de impugnação dotada de efeito
suspensivo, ou seja, “havendo previsão legal de recurso dotado de efeito suspensivo, a
decisão sujeita a tal recurso já surge ineficaz no mundo jurídico”. A decisão só surtirá
efeitos depois de transcorrido o prazo de interposição de recurso.

- Exemplo de decisão com eficácia imediata: sentença de absolvição (art.


596/CPP);

- Exemplo de decisões com eficácia contida: sentença condenatória que impõe


pena privativa de liberdade (≠ da prisão cautelar); sentença de pronúncia.

c) Regressivo/iterativo/diferido: é a possibilidade de reexame da matéria pelo


mesmo órgão prolator da decisão impugnada, podendo este se retratar antes de submeter
a matéria à análise de Instância superior (juízo de retratação/confirmação).
- Embargos de declaração; RESE; Agravo em Execução; Carta
testemunhável.
Da presença ou ausência do efeito iterativo decorrem outras 2 classificações dos
recursos:
- Recurso reiterativo: é aquele em que o reexame da decisão será feito
pelo órgão ad quem (ex. apelação)
- Recurso misto: é aquele em que o reexame poderá ser feito tanto pelo
juízo a quo quanto eventualmente pelo juízo ad quem. (ex. RESE).
Tal classificação não se confunde com a classificação feita pela doutrina
levando-se em conta os limites fixados pelo âmbito de impugnação do recurso para o
órgão jurisdicional superior. Aqui temos:
- Recurso de instância iterada: existe quando se devolve ao tribunal
apenas o conhecimento de decisão de cunho processual.
- Recurso de instância reiterada: ocorre quando a matéria devolvida ao
tribunal é reexaminada por inteiro.

d) Extensivo: Decorre do princípio da isonomia e consiste na possibilidade do


resultado favorável de um recurso interposto por um dos acusados se estender aos
outros que não tenham recorrido, desde que o recurso não seja baseado em motivos de
caráter exclusivamente pessoal – artigo 580/CPP.

- REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE OU PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS:


- Quem analisa? Juízo ad quo (dar seguimento ou negar seguimento) e Juízo ad
quem (conhecer ou admitir o recurso);
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- Juízo de PRELIBAÇÃO: é a verificação da presença dos pressupostos de


admissibilidade recursal.
- Análise do direito ao recurso.

- Efeito declaratório (efeito positivo ou negativo)

- ≠ do JUÍZO DE DELIBAÇÃO ou JUÍZO DE MÉRITO, que é a


análise das questões fáticas e jurídicas.
É bom saber: Também é chamado de Juízo de delibação o juízo feito
superficialmente sobre a legalidade de um ato, sem, contudo, adentrar
no exame de mérito. Exemplo: homologação de sentença estrangeira
pelo STF, exame de legalidade dos atos administrativos feito pelo
Poder Judiciário.

- Requisitos:

• Cabimento: Existência de previsão legal.


• Adequação/regularidade formal: Respeito ao recurso indicado na lei para cada
tipo de decisão. Não cabe à parte eleger o recurso cabível.
• Art. 579, caput, do CPP.
• Princípio da fungibilidade recursal: Consiste na possibilidade de
admissão de um recurso interposto por outro, que seria o cabível, na
hipótese de existir dúvida objetiva sobre a modalidade de recurso
adequada (divergência doutrinária ou jurisprudencial) – ausência de
má-fé ou erro grosseiro.
• Exemplo: Denegação de seguimento à apelação: Carta
testemunhável (art. 632/CPP) ou RESE?
• A doutrina minoritária entende que a adequação seria decorrência lógica
do pressuposto recursal referente ao cabimento.
• Tempestividade: Respeito do prazo estabelecido em lei, sob pena de preclusão
temporal.
• Cancelamento da súmula 418/STJ - não se fala mais na intempestividade
do recurso prematuro.
* Prazos processuais: Contínuos e peremptórios.

🡪 Artigo 798, §5º/CPP.

- Súmula 710/STF.
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- Não se computa o dia do começo (dies a quo), incluindo-se o do


vencimento (dies ad quem) - Súmula 310/ STF.

- Dúvida em relação à tempestividade = processamento do recurso.

- Prazo do Assistente de acusação: súmula 448/STF.

- Desvio da administração pública no processamento do recurso (art.


575/CPP).
* Termo de Interposição X Petição/Razões recursais.
No processo penal, há recursos em que a parte pode interpor o
recurso e, posteriormente, apresentar suas razões recursais, os quais são: a) recurso em
sentido estrito; b) apelação, salvo nos casos de Juizados Especiais Criminais; c) agravo
em execução; d) carta testemunhável.
Atenção! Alguns autores incluem um 4º pressuposto de admissibilidade
recursal objetivo, outros dizem que são causas extintivas anormais dos recursos –
Inexistência de fatos impeditivos ou extintivos.
- Fatos impeditivos:

a) Renúncia ao direito de recorrer → trânsito em julgado → formação da


coisa julgada.
* Réu renúncia X advogado entende pelo recurso:
Majoritariamente, prevalece a vontade do advogado, em razão da sua capacidade
técnica – Súmula 705/STF.
* MP pode renunciar? Majoritariamente, sim. Minoritariamente,
deve-se aguardar o decurso do tempo.
* Manifestação de interesse de recorrer do réu X advogado:
prevalece o interesse de quem quer recorrer.
b) Preclusão:
b.1 Temporal (intempestividade);
b.2 Lógica: Trata-se da incompatibilidade da prática de um ato
processual com outro praticado anteriormente, ou seja, com relação aos recursos, é a
impossibilidade da parte de interpor o recurso em virtude de sua RENÚNCIA ao direito
de recurso. Tem íntima relação com o princípio da boa-fé processual.
b.3 Consumativa: É a perda de uma faculdade processual em
virtude de prévio exercício.
Assim, uma vez apresentadas as razões recursais, no ato da
interposição ou posteriormente, o recorrente não poderá completar seu recurso com
novas razões – vedação ao princípio da complementaridade.
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Em decorrência também da preclusão consumativa, não é possível


que a parte substitua um recurso já interposto por outro, ainda que dentro do prazo
recursal - vedação ao princípio da variabilidade.

- Fato extintivos:
a) Desistência: ocorre depois de já interposto o recurso.
* Princípio da indisponibilidade da ação penal pública.
b) Deserção:
- OCORRIA quando o réu, que deveria ser recolhido à prisão
para recorrer, fugisse (art. 595/CPP) ou;
- Quando deixa de pagar custas (art. 806, §2º, parte final/CPP);
- Deixa de promover o traslado/apógrafo dos autos (art. 601,
§1º/CPP)

• Interesse da Parte: art. 577, parágrafo único/CPP


- Como regra, não se reconhece interesse para a parte que deseje, apenas,
alterar os fundamentos tomados pelo julgador para proferir determinada decisão, salvo
se a fundamentação produzir efeitos consequenciais concretos no direito da parte.
- MP: garantido como parte acusatória ou na situação de custos legis.

* Ação Penal Privada: absolvição - não cabe recurso do MP se o


querelante não o fizer, em razão do princípio da disponibilidade da ação penal privada.
• Legitimidade: Art. 577, caput, do CPP – Legitimados gerais.
- O recurso deve ser oferecido por quem é parte no processo.
- Hipótese especial: Art. 598/CPP;

- REFORMATIO IN PEJUS
- Art. 617/CPP;
- Impera o tantum devolutum quantum appellatum.
Nesse sentido, segue julgado do STJ:
No âmbito de recurso exclusivo da defesa, o Tribunal não pode
agravar a reprimenda imposta ao condenado, ainda que reconheça
equívoco aritmético ocorrido no somatório das penas aplicadas.
Configura inegável reformatio in pejus a correção de erro material no
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julgamento da apelação — ainda que para sanar evidente equívoco


ocorrido na sentença condenatória — que importa em aumento das
penas, sem que tenha havido recurso do Ministério Público nesse
sentido. Assim, se o juiz cometeu um erro na sentença ao somar as
penas, mas o Ministério Público não recorreu contra isso, não é
possível que o Tribunal corrija de ofício em prejuízo do réu. STJ. 6ª
Turma. HC 250.455-RJ, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em
17/12/2015 (Info 576).

- Reformatio in pejus indireta:


Se o recurso for exclusivo da defesa, no caso de provimento do recurso,
tendo sido determinada, pela instância superior, a anulação do primeiro julgamento, no
caso de nova condenação, a pena não poderá ser fixada em quantidade superior à
decisão anulada.

- Reformatio in mellius:
Mesmo tendo sido o recurso interposto somente pela acusação, é
possível que a situação do réu melhore, ainda que o MP tenha pedido sua condenação.
Nucci, no entanto, faz alguma ressalva quanto a esse princípio.
Para ele, para haver a reformatio in mellius, deve existir, no mínimo, uma manifestação
defesa; assim, em havendo total conformismo desta, não haveria razão para aplicar tal
instituto.

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