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G - Recursos

82. Princípios gerais

No art. 399º CPP estabelece-se o princípio geral da admissibilidade de recurso das


sentenças e dos despachos judiciais, sempre que a irrecorribilidade não esteja
prevista na lei.

A Constituição garante a todos o acesso aos Tribunais para defesa dos seus direitos
(art. 20º/1 CRP) e prevê a existência de Tribunais de recurso (art. 32º/1 CRP),
decorre que o legislador, dispondo embora de uma larga margem de liberdade no
tocante à definição das decisões susceptíveis de ser impugnadas por via de recurso,
e bem assim no que concerne à identificação das pessoas legitimadas a recorrer, não
pode eliminar pura e simplesmente a faculdade de recorrer em todo e qualquer caso,
nem inviabilizar na prática essa faculdade.

No tocante a processo penal, o princípio constitucional das garantias de defesa


impõe ao legislador que consagre a faculdade de os arguidos recorrerem de quaisquer
actos judiciais que, no decurso do processo, tenham como efeito a privação ou a
restrição da liberdade ou de quaisquer outros dos seus direitos fundamentais.

Traduzindo a faculdade de recorrer em processo penal uma expressão do direito de


defesa, a Constituição impõe porém, que o legislador consagre nesse campo a
faculdade de recorrer de todo e qualquer acto do juiz, devendo admitir-se que tal
faculdade seja restringida ou limitada em certas fases do processo e que,
relativamente a certos actos do juiz, possa mesmo não existir, desde que dessa
forma se não atinja o núcleo essencial do direito de defesa.

83. Legitimidade e interesse para agir

O art. 401º/2 CPP, significa que, para poder recorrer, além dos requisitos da
legitimidade, deva ainda o requerente ter necessidade de, no caso concreto, para
realizar o seu direito usar do meio processual que é o recurso.

Dada a extensão dos deveres do Ministério Público, este requisito do interesse em


agir dificilmente lhe não será aplicável. Porém, quanto aos outros interessados no
recurso poderá assim não suceder, e ficará para a jurisprudência a função de
avaliar da existência ou da inexistência do interesse em agir, tal-qualmente tem
sucedido em processo civil. Enquanto a legitimidade é subjectiva e valorada a
priori, o interesse em agir é objectivo e terá que se se verificar em concreto.

Assim, ressalvado o Ministério Público, só terá interesse em agir para efeito de


interposição de recurso, quem tiver necessidade de usar do recurso para sustentar o
seu direito.

Em face das disposições combinadas dos arts. 48º a 52º e 401º/1-a CPP, e atentas à
origem, natureza e estrutura, bem como o enquadramento constitucional e legal do
Ministério Público tem este, legitimidade e interesse para recorrer de quaisquer
decisões mesmo que lhe sejam favoráveis e assim concordantes com a sua posição
anteriormente assumida no processo.

O assistente não tem legitimidade para recorrer, desacompanhado do Ministério


Público relativamente à espécie e medida da pena aplicada, salvo quando demonstrar
um concreto e próprio interesse em agir.

As limitações ao âmbito do recurso mencionadas nos artigos anteriores e decorrentes


do art. 402º e 403º CPP, acrescem ainda as limitações decorrentes da proibição
reformatio in pejus (art. 409º CPP).

84. Limitações do recurso

No art. 403º/1 CPP, formula-se a possibilidade de limitação do recurso, a uma parte


da decisão sempre que seja possível apreciar autonomamente a parte de que se
recorreu. Isto significa que a parte de que foi interposto recurso, se houver
alteração, não pode ficar em contradição insanável com a parte de que se não
interpôs recurso; se houver essa possibilidade, o recurso será extensivo a toda a
decisão na medida em que esta puder ser afectada. Mas ainda aqui haverá que atentar
na disposição do art. 403º/3 CPP, que amplia a possibilidade de limitação do âmbito
do recurso.

No art. 403º/2 CPP especifica-se o caso em que a lei considera haver autonomia
entre as partes da decisão recorrida, para efeito de interposição de recurso;
trata-se de enumeração que não é taxativa.

Qualquer das alíneas do art. 403º/2 CPP, terá sempre que ser criteriosamente
equacionada com o comando do art. 403º/1 CPP.

O art. 403º/3 CPP, significa que deve começar-se pela apreciação do recurso, e
seguidamente retirar-se da decisão do mesmo todas as consequências quanto à decisão
do Tribunal inferior, alterando-a na medida estritamente necessária para que não
haja contradição com a decisão do Tribunal superior, respeitando porém sempre as
limitações decorrentes da reformatio in pejus.

85. Reclamação contra despacho que não admitir ou retiver recurso, art. 405º CPP

Apesar de a reclamação ser apresentada na secretaria do Tribunal recorrido, não


deve a mesma ser autuada por apenso, como sucede no processo civil, mas em
separado, nem a sua apresentação tem qualquer efeito sobre o andamento do processo.

Efectuada a apresentação na secretaria do Tribunal recorrido, o juiz, no prazo


geral, informa-a respondendo, se assim o entender, às razões aduzidas pelo
reclamante e envia-a ao presidente do Tribunal superior. Como a autuação não é por
apenso, convirá que o juiz reclamado não só lavre informações, mas também junte
todos os elementos necessários para que o presidente do Tribunal superior decida
sem necessidade de pedir novos elementos.

A decisão do presidente do Tribunal superior terá que ser notificada ao reclamante.


Se a reclamação for deferida, o recurso considera-se interposto a partir da
notificação, começando a partir desta a correr o prazo para a motivação, se esta
não tiver sido apresentada com a interposição.

Crê-se que a notificação deve ser ordenada pelo Tribunal onde a reclamação foi
apresentada, após comunicação ao mesmo Tribunal da decisão do presidente do
Tribunal superior.

86. Recursos com efeito suspensivo


No art. 408º/1 CPP, enumeram-se os recursos que têm efeito suspensivo do processo,
e portanto também, evidentemente, da decisão recorrida. O processo fica suspenso e
dependente de recurso, com as ressalvas feitas na parte final das alíneas a) e b).

O art. 408º/1-b CPP tem que ser equacionado com o art. 310º CPP. Como se deduz
desse art. 310º CPP, e de outras disposições, a decisão que pronunciar o arguido de
harmonia com a acusação do Ministério Público é irrecorrível. Porém, pode haver
pronúncia por factos diferentes apontados pelo Ministério Público, mais
precisamente por factos objecto de requerimento do assistente para a abertura da
instrução. Em tal caso, o recurso é admissível, e se for interposto tem efeito
suspensivo no processo.

No art. 408º/2 CPP só a própria decisão recorrida fica suspensa; o recurso


interposto não tem efeito suspensivo sobre todo o mais do processo, que continua a
sua tramitação. Por isso estes recursos sobem imediatamente e normalmente em
separado.

87. Proibição da reformatio in pejus

O sentido da proibição da reformatio in pejus é o de obstar a que o arguido veja


alterada a sentença penal, em seu prejuízo quando só a defesa recorreu, ou mesmo
quando também o Ministério Público recorreu, mas no exclusivo interesse do arguido.

A proibição, com a ressalva do art. 409º/2 CPP, aplica-se a todas as sanções, sejam
penas ou medidas de segurança, constantes da decisão recorrida.

A proibição reformatio in pejus não é absoluta, tendo uma limitação, que diz
respeito à agravação da pena de multa, que é sempre possível no recurso, desde que
a situação económica e financeira do arguido tenha entretanto melhorado de forma
sensível.

O Tribunal superior pode em recurso, alterar oficiosamente a qualificação jurídico-


penal efectuada pelo Tribunal recorrido, mesmo que para crime mais grave, sem
prejuízo, porém da proibição da reformatio in pejus.

88. Fundamento do recurso

O disposto no art. 410º CPP, é de principal importância porque enquanto nos


recursos as Relações conhecem em regra de facto e de direito (art. 428º CPP), o
recursos interpostos para o Supremo Tribunal de Justiça visam em regra
exclusivamente o reexame da matéria de direito (art. 434º CPP).

É de salientar porém que os vícios apontados no art. 410º/2 CPP, com fundamento do
recurso, têm que resultar do próprio texto da decisão recorrida[40], por si ou
conjugada com as regras da experiência comum.

Salvo o caso de decisões proferidas em primeira instância por Tribunais superiores,


os recursos ordinários, são interpostos do Tribunal singular para o Tribunal da
Relação e do Tribunal colectivo e do Tribunal de júri para o Supremo Tribunal de
Justiça.

A regra é a de um único grau de recurso, cuja a tramitação contende, com os


próprios poderes de cognição do Tribunal superior.
A superior garantia que representam os Tribunais colectivos resulta manifestamente
da sua estrutura colegial e da imediação com os factos. É que há cada vez mais
razões para olhar com cepticismo os segundos julgamentos, necessariamente montados
sobre cenários já montados e com prévio ensaio geral.

É fundamental não esconder a realidade das coisas. Não são considerações de


dogmática ou um certo construtivismo judiciário que abonam a vantagem ou a
fatalidade do recurso directo interposto dos Tribunais colegiais. As razões
encontram-se noutros planos. Assegurada a efectiva colegialidade, garantido o
contraditório e obtida um tanto quanto possível imediação, o recurso do Tribunal
colectivo tem características particularmente nítidas de remédio jurídico. A
previsão de um mecanismo de reapreciação dos factos não pode – não deve – ser senão
uma válvula de segurança. É esta a economia do recurso para o Supremo Tribunal de
Justiça a que se poderia chamar, de revista alargada.

No que respeita às Relações. Trata-se, neste caso de recurso interposto de Tribunal


singular. Esta circunstância justifica a conveniência de que o recurso seja
apreciado, segundo as normas clássicas da apelação, por um Tribunal colegial.

Se não tiver havido renúncia ao recurso, as Relações conhecem de facto e de direito


se a tiver havido, o recurso é de direito mas na modalidade de revista alargada

89. Desistência

Confrontando o texto do art. 415º CPP, com o do art. 401º CPP, sobre a legitimidade
para recorrer, nota-se que no art. 415º CPP, quanto à possibilidade de desistência
do recurso, se omitiram as pessoas indicadas no art. 401º-d CPP.

Crê-se, que se trata de lapso do legislador, e que portanto o art. 415º CPP, deve
sofrer interpretação extensiva. O art. 415º CPP, consagra uma regra geral, e foi
formulado mais com o propósito de deixar bem explicita a possibilidade de
desistência por parte do Ministério Público, do arguido e do assistente e indicar
até que momento se pode efectivar a desistência do que com o propósito de aflorar
uma regra geral.

90. Vista ao Ministério Público

Os recursos em processo penal são obrigatoriamente motivados no Tribunal a quo pelo


Ministério Público, quando este for recorrente. Quando não for recorrente, também
normalmente o Ministério Público responderá à motivação do recorrente, porque se
trata de um sujeito processual afectado (art. 413º CPP).

No entanto, cumprirá ao Ministério Público no Tribunal superior apor o seu visto ou


emitir o seu parecer, no qual não está vinculado pela motivação ou pela resposta do
Ministério Público no Tribunal inferior.

No visto a que se refere o art. 416º CPP, o Ministério Público emite o seu parecer,
podendo suscitar quaisquer questões que se lhe oferecem como cabidas para a decisão
e devendo, logicamente, seguir a ordenação estabelecida nas alíneas do art. 417º/2
CPP; em casos que se afigurem de extrema simplicidade aporá o visto no processo.

Se o recurso não for rejeitado ou julgado em conferência e houver de prosseguir, o


Ministério Público normalmente já não terá novo visto, sendo só convocado para a
audiência
91. Rejeição do recurso

A rejeição do recurso (art. 420º CPP) é deliberada em conferência, e pode


fundamentar-se na sua manifesta improcedência ou em causa que devia ter determinado
a sua não admissão (art. 414º/2 CPP). A manifesta improcedência do recurso pode
suscitar dificuldades, pela indefinição do que se deve entender por manifesta
improcedência. Um bom critério de orientação poderá ser dado, com as devidas
adaptações, pela manifesta inviabilidade das acções em processo civil. Recursos em
que, perante o Supremo Tribunal de Justiça, se discuta só matéria de facto, ou em
que seja visível um propósito ínvio, como o de aguardar previsíveis medidas de
clemência ou o de retardar o pagamento de indemnizações não terão cabimento e serão
penalizadas pela disposição do art. 420º/4 CPP.

92. Audiência

Conforme se preceitua no art. 423º/3 CPP, a palavra para as alegações é dada ao


Ministério Público, aos representantes dos recorrentes e dos recorridos, pela ordem
enunciada. Aqui podem suscitar-se dúvidas quando o Ministério Público não é
recorrente. O contraditório e a “igualdade de armas”, pedras fundamentais do
código, impõem que cada uma das partes possa produzir alegações o mesmo número de
vezes que a outra parte, só sendo possível um ligeiro desvio, nos termos do art.
423º/4 CPP, para que o defensor fale antes do encerramento da audiência, se não
tiver sido o último a intervir isso manifestamente com o propósito de não cortar o
arguido de qualquer via de defesa.

Assim, quando o Ministério Público é o recorrente, deverá alegar em primeiro lugar,


alegando seguidamente a acusação particular e depois os arguidos (recorridos). Até
aqui não se suscitam quaisquer dúvidas. Mas qual deve ser a ordem de alegações nos
casos em que o Ministério Público não é recorrente, mas recorrido? Crê-se que a
ordem é a estabelecida no texto, e que mesmo neste caso o Ministério Público deve
alegar no início, como primeiro defensor da legalidade.

Contrariamente ao que sucede com a falta de motivação, a falta de alegações não


implica a rejeição do recurso, sendo por isso lícito a qualquer das partes não
alegar, sem que isso implique a rejeição ou o não conhecimento do recurso. As
alegações têm, função e finalidade diferentes das da motivação, esta destina-se a
manifestar porque é que o recorrente discorda da decisão recorrida e a apontar qual
o sentido em que em seu entendimento, deve ser proferida a decisão do Tribunal
superior, enquanto que as alegações, proferidas quando o âmbito do recurso já está
definido, se destinam a expor considerações finais, já após a audiência.

Recursos ordinários

93. Recurso para a Relação

A tramitação dos recursos perante as Relações e perante o Supremo Tribunal de


Justiça, em grande parte é unitário. Há um conjunto comum de normas de tramitação a
observar em qualquer destes Tribunais, que consta dos arts. 410º a 426º CPP. Para
além deste conjunto comum de normas que formam a tramitação unitária, há trâmites
específicos dos recursos interpostos para as Relações, constante dos arts. 427º a
431º CPP, e trâmites específicos dos recursos interpostos para o Supremo Tribunal
de Justiça que constam dos arts. 432º a 436º CPP.

No art. 427º CPP, especificam-se os casos em que há lugar a recursos para a


Relação, que são a regra geral quanto a decisões proferidas por Tribunais de
primeira instância.

Como se deduz do art. 427º CPP, o regime regra é o da interposição para as Relações
dos recursos de decisões dos Tribunais de primeira instância. Assim, os recursos
que são interpostos directamente para o Supremo Tribunal de Justiça nos casos
taxativamente enumerados na lei (art. 432º-c), d), e) CPP.

94. Poderes de cognição[41]

Há que assinalar que a declaração referida no art. 364º/1 e 2 CPP ou a falta do


requerimento previsto no art. 389º/2 CPP, ou no art. 391º-E/2 CPP, significa que as
partes renunciaram ao recurso em matéria de facto, conhecendo então as Relações
somente em direito, sem prejuízo do disposto no art. 410º CPP.

Mas há também a assinalar que, mesmo quando as Relações não conhecem da matéria de
facto, isso não prejudica a possibilidade desses Tribunais superiores usarem da
faculdade conferida pelo art. 410º/2 e 3 CPP, o que em certos aspectos de algum
modo implicaria a apreciação de matéria fáctica.

Nos casos em que as Relações detectam vícios referidos nas alíneas do art. 410º/2
CPP procedem à renovação da prova se se afigurar que a renovação perante elas
permite evitar o envio do processo para novo julgamento.

Quando a prova ficou documentada e não se verificar o condicionalismo do art.


430º/1 CPP, as Relações não procedem à renovação, valendo nesse caso o que
documentado ficou.

Daqui conclui-se que bem reduzidos são os casos em que se procede à renovação de
prova; só ela se procede verificando-se cumulativamente as condições de se
verificar algum dos vícios enumerados nas alíneas do art. 410º/2 CPP, e de haver
fundadas razões para crer que a renovação evita o reenvio do processo para novo
julgamento.

95. Recursos para o Supremo Tribunal de Justiça

O recurso para as Relações é o regime regra, só havendo portanto lugar a recurso


para o Supremo Tribunal de Justiça nos casos taxativamente previstos nas alíneas do
art. 432º CPP, ou em outras disposições da lei (art. 433º CPP).

De notar que os recursos das decisões interlocutórias do Tribunal de júri e do


tribunal colectivo só sobem ao Supremo Tribunal de Justiça se deverem subir com os
interpostos acórdãos finais; o reconhecimento daqueles recursos pertencerá à
Relação se tiverem subido imediatamente.

96. Poderes de cognição[42]

Quando o Supremo Tribunal de Justiça funciona como Tribunal de recurso compete-lhe


aplicar o regime jurídico adequado perante os factos que foram apurados pelos
Tribunais de instância. Perante o Supremo Tribunal de Justiça funcionando como
Tribunal de recurso não há lugar, em caso algum, a renovação de prova; a lei
atendeu à elevada garantia de veracidade que dá a prova apurada pelos referidos
Tribunais.

Mas o Supremo Tribunal de Justiça tem agora poderes que, de algum modo, se
intrometem na apreciação de aspectos fácticos, e que são os da apreciação da
matéria referida no art. 410º/2 e 3 e no art. 434º CPP. Ainda nestes casos porém, o
Supremo Tribunal de Justiça não procede à renovação de prova, limitando-se a
apontar o vício que apurou e a determinar o reenvio do processo para novo
julgamento (arts. 426º e 434º CPP).

Cabe aqui, acentuar ser ponto assente na jurisprudência, maxime na do Tribunal


Constitucional que o duplo grau de jurisdição em matéria de facto pode garantir-se
sem que isso implique a possibilidade de produção de prova no Tribunal de recurso,
bastando que este controle a legalidade da produção e possa ordenar a reapreciação
por outro Tribunal, de categoria idêntica ou superior à do recorrido.

Recursos extraordinários

97. Fixação de jurisprudência

O acórdãos que resolvem o conflito e fixam jurisprudência só têm eficácia nos


termos do art. 445º/1 CPP, e podem vir a ser reexaminados e modificados pelo
plenário das secções criminais (art. 447º/2 CPP). Estes acórdãos, que têm sido
designados de assentos, perderam a sua força externa, que era inconstitucional[43]

O recurso interposto nos termos do art. 437º CPP, é um recurso extraordinário, a


interpor num prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da decisão de que se
recorre. A partir do decurso desse prazo de 30 dias pode ser interposto recurso no
interesse da unidade do direito, nos termos do art. 447º CPP. Este recurso do art.
447º CPP, só pode ser interposto pelo Procurador-geral da Republica, enquanto que
para a interposição do recurso nos termos do art. 437º CPP, nos 30 dias
subsequentes ao trânsito, têm legitimidade o Ministério Público, o arguido, o
assistente e as partes civis. Por isso se compreende que, além da legitimidade para
a interposição outras diferenças marcantes existam entre os dois recursos, maximé
quanto à eficácia da decisão, que no caso do art. 437º CPP, se produz no processo
em que o recurso foi interposto, não obstante o trânsito que durante 30 dias é
condicional, enquanto que no caso do art. 447º CPP, a decisão é só para efeito de a
jurisprudência ser fixada, não tendo portanto qualquer reflexo no processo em que o
recurso foi interposto.

98. Recursos de decisão proferida contra jurisprudência fixada pelo Supremo


Tribunal de Justiça

O disposto no art. 446º/1 CPP, tem como fundamento a conveniência de uniformização


da jurisprudência, fazendo intervir o Supremo Tribunal de Justiça sempre que as
decisões dos Tribunais inferiores não acatem a jurisprudência fixada por esse alto
Tribunal.

Prevê-se aqui um caso de recurso obrigatório para o Ministério Público. Tratando-se


de um recurso obrigatório para o Ministério Público, pode pôr-se a questão de saber
se, neste caso é lícito ao Ministério Público desistir do recurso que interpôs.
99. Recursos no interesse da unidade do direito

Os ns.º 1 e 2 do art. 447º CPP, têm campos de aplicação diferentes, o n.º 1 do art.
447º CPP, destina-se a permitir que o Procurador-geral da República, interponha
recurso para fixação de jurisprudência de decisão transitada em julgado há mais de
30 dais; o n.º 2 do art. 447º CPP, destina-se a permitir que a mesma entidade
interponha recurso para alteração de jurisprudência já fixada, no sentido de
alterar a decisão que foi confirmada, por se impor o seu reexame.

Em qualquer destes casos, a decisão para resolver o conflito não tem qualquer
eficácia no processo em este recurso extraordinário tiver sido interposto (art.
447º/3 CPP), assim se distinguindo do recurso extraordinário regulado nos arts.
437º a 445º CPP, o qual é interposto no prazo de 30 dias a contar do trânsito em
julgado e tem eficácia no processo em que foi interposto.

A disposição do art. 447º/2 CPP, a par de limitações à obrigatoriedade da


jurisprudência uniformizada, coloca a uniformização da jurisprudência nos moldes
agora estabelecidos ao abrigo de criticas que anteriormente foram formuladas aos
assentos do Supremo Tribunal de Justiça, assacando-os de inconstitucionais.

100. Recurso de revisão

A revisão é um recurso extraordinário, admitido no processo civil e também, por


maioria de razão em processo penal, pois que este demanda mais vincadamente a
verdade material. O princípio res judiciata pro veritate habetur, não pode impedir
um novo julgamento, quando posteriores elementos de apreciação põem seriamente em
causa a justiça do anterior. O fundamento central do caso julgado é uma concessão
prática à necessidade de garantir a certeza e a segurança do direito.

Qualquer sentença penal com trânsito em julgado ou despacho que tenha posto fim ao
processo pode ser objecto de revisão.

Parece, no entanto, que na falta de interesse e atento ao princípio da actualidade,


que informa as medidas de segurança privativas de liberdade, não há lugar há
revisão das decisões que aplicam tais medidas, enquanto estas forem modificáveis.

É sabido que as medidas de segurança têm como fundamento a perigosidade do


delinquente, sendo uma função desta. Por isso mesmo, só subsistem enquanto a
perigosidade subsistir, e devem acompanhá-la em todas as suas vicissitudes. Não
têm, por isso, a estabilidade das penas, podem a todo o tempo ser modificadas, e
devem de ofício, ser periodicamente revistas.

Estas noções decorrem da natureza utilitária (de prevenção especial) das mediadas
de segurança e correspondem a ensinamentos de toda a doutrina autorizada. Daí
decore também, que na sucessão, do tempo, de leis que prescrevem diversas medidas
de segurança, se aplicará sempre a lei mais recente, embora mais grave, já que,
aplicando-se à perigosidade actual, nunca haverá retroactividade.

Fundamentos da revisão (art. 449º/1 CPP)

a) Falsidade de meios de prova que tenham sido determinantes para a decisão

Deve entender-se ser bastante, para fundamentar o pedido de revisão que os meios de
prova considerados falsos por sentença transitada em julgado tenham influenciado a
decisão de rever, não sendo necessária a prova de que esses meios, só por si,
tenham sido determinantes dessa decisão.

b) Crime cometido por juiz ou jurado, relacionado com o exercício da sua função no
processo

Há aqui uma presunção iuris et iure de que o crime cometido pelo juiz ou jurado, e
relacionado com o exercício das suas funções no processo influenciou a decisão, e
de que portanto esta foi injusta, pelo que não há mais que indagar se esse crime
teve ou não influência no processo, admitindo-se a revisão sem mais delongas.

c) Inconciliabilidade de decisões

Só permite a revisão de sentenças condenatórias.

d) Descoberta de novos factos ou meios de prova que suscitem graves dúvidas sobre a
justiça da condenação

101. Formulação do pedido[44]

A revisão é um recurso extraordinário cujo requerimento inicial tem de ser


apresentado no Tribunal em que o arguido foi julgado e corre o processo onde se
proferiu a sentença que deve ser registada.

O recurso extraordinário de revisão comporta duas fases distintas: a fase do juízo


rescindente e a fase do juízo rescisório.

A fase do juízo rescindente abrange toda a tramitação, desde a dedução do pedido


até à decisão que concede ou denega a revisão; a fase do juízo rescisório começa no
momento em que o processo baixa e termina com o novo julgamento.

Quando a revisão é denegada, não há fase do juízo rescisório.

Na fase do juízo rescindente, é o Supremo Tribunal de Justiça que detém a


jurisdição. Trata-se de uma questão julgada em única instância, pelo que não é
admissível recurso ordinário da decisão que concede ou denega autorização para a
revisão.

A fase do juízo rescindente é processada primeiramente no Tribunal onde se proferiu


a decisão cuja revisão se pretende e posteriormente à informação e à remessa
referidas no art. 454º CPP, no Supremo Tribunal de Justiça.

[40] Não sendo assim portanto permitida a consulta de outros elementos constantes
do processo.
[41] Art. 428º CPP.
[42] Art. 434º CPP.
[43] Acórdão Tribunal Constitucional n.º 743/96, de 28 de Maio, declara a
inconstitucionalidade com força obrigatória geral, o art. 2º CC, na parte em que
atribui aos Tribunais competência para fixar doutrina com força obrigatória geral,
por violação do disposto no art. 115º/5 CRP.
[44] Art. 451º CPP.

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