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SENTENÇA

1. Conceito

Não há um conceito fechado de sentença no processo penal.

Em regra, sentença é concebida como o ato pelo qual se extingue o


processo, com ou sem a resolução do mérito.

Porém, o Código de Processo Penal não conceitua sentença. Há


sentenças que não encerram o processo, como a “sentença” de pronúncia (art.
413, § 1º, CPP).

Em sentido estrito ou sentido próprio, a sentença é conceituada como


a decisão definitiva que o juiz profere solucionando a causa.

2. Classificação das decisões

As decisões ou sentenças em sentido amplo são classificadas em:

a) Interlocutórias simples: são as que dirimem questões emergentes


relativas à regularidade ou marcha do processo, havendo pronunciamento
decisório sem adentrar no mérito. Ex.: recebimento de denúncia ou decretação
da prisão preventiva.
b) Interlocutórias mistas: também denominadas de decisões com
força de definitivas, são as que encerram uma etapa do procedimento ou a
própria relação processual, sem julgamento do mérito da causa. A primeira
hipótese é denominada de interlocutória mista não terminativa (ex.
pronúncia) e a segunda de interlocutória mista terminativa (ex. rejeição de
denúncia).
c) Definitivas: também denominadas de sentenças em sentido
próprio, são as que solucionam a lide, julgando o mérito da causa.

As sentenças em sentido próprio são divididas em:

a) Condenatória: quando julga procedente, total ou parcialmente, a


pretensão punitiva.
b) Absolutória: quando não acolhe o pedido de condenação.
Subdividem-se em absolutória própria, quando não acolhe a pretensão e não
impõe qualquer sanção, e absolutória imprópria, quando não acolhe a
pretensão, mas reconhece a prática da infração penal e impõe ao réu a medida
de segurança.
c) Terminativa de mérito: também chamada de definitiva em sentido
estrito, é a que julga o mérito, mas não condena nem absolve o acusado,
como a sentença de declaração da extinção da punibilidade.

Ao proferir a decisão o magistrado esgota o poder jurisdicional e não


pode praticar qualquer ato jurisdicional, a não ser a correção de erros
materiais.

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3. Requisitos formais

Os requisitos formais ou estruturais da sentença são os seguintes:

a) Relatório ou exposição: é o requisito disposto no art. 381, I e II, do


CPP. Constitui a parte da sentença na qual há o resumo do ocorrido no
processo, contendo o nome e a qualificação das partes, a exposição sucinta da
acusação e da defesa e o resumo dos atos e incidentes processuais. O
relatório é dispensado no Juizado Especial Criminal (art. 81, § 3º, da Lei nº
9.099/95).
b) Motivação ou fundamentação: nessa parte o juiz aponta os
motivos de fato e de direito em que se fundar a decisão (art. 381, III, CPP).
Relaciona-se com o princípio do livre convencimento motivado ou persuasão
racional do juiz e da garantia constitucional de que todas as decisões devem
ser fundamentadas, sob pena de nulidade (art. 93, IX, CF). O juiz deve apreciar
todas as teses levantadas pela acusação e pela defesa.
c) Conclusão ou dispositivo: parte da sentença em que o magistrado
julga o acusado, o dispositivo da decisão (art. 381, V, CPP). O magistrado
deverá indicar os artigos de lei aplicados (art. 381, IV), datando e assinando a
decisão (art. 381, VI, CPP).

A ausência dos requisitos pode culminar com a nulidade da sentença


(art. 564, IV, do CPP).

4. Embargos de declaração

O art. 382 do CPP prevê os embargos de declaração, denominados pela


doutrina de “embarguinhos”, que podem ser opostos contra a sentença de
primeiro grau de jurisdição, no prazo de 2 dias da intimação, para sanar:
a) Obscuridade: falta de clareza na redação da sentença.
b) Ambigüidade: a sentença permite mais de uma interpretação.
c) Contradição: as afirmações colidem ou se opõem (ex. entre
fundamentação e a conclusão).
d) Omissão: lacuna ou esquecimento (ex. não menciona o regime
inicial de pena).

Os erros materiais da sentença podem ser corrigidos de ofício pelo


magistrado, sem a necessidade de provocação das partes (ex.: nome do
acusado).

5. Princípio da correlação

Deve existir a correlação entre a sentença e o fato descrito na denúncia


ou queixa. O acusado se defende dos fatos narrados na inicial e não da
capitulação dada ao crime na denúncia ou queixa.

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6. Emendatio libelli

A emendatio libelli está prevista no art. 383 do CPP, prevendo que o juiz,
sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá
atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em conseqüência, tenha de
aplicar pena mais grave.

Nessa hipótese, a denúncia ou a queixa descrevem o fato criminoso,


contudo, há equívoco na capitulação do tipo penal, de maneira que o juiz
poderá proceder à correção, sentenciando o feito sem a necessidade da oitiva
prévia das partes, ainda que tenha de aplicar pena mais grave.

Não há prejuízo para o acusado, que se defende dos fatos descritos na


inicial acusatória e não da classificação jurídica indicada na denúncia ou
queixa.

A correção deve ocorrer no momento da sentença, não podendo o


magistrado fazê-la quando do recebimento da exordial acusatória.

A emendatio libelli também pode ser aplicada na fase recursal (Tribunal),


salvo quando houver recurso exclusivo da defesa, pois, nesse caso, a
aplicação de pena mais grave afronta o princípio da vedação da reformatio in
pejus.

Com a emendatio libelli poderão advir as seguintes conseqüências:

a) se da definição jurídica diversa, houver possibilidade de proposta de


suspensão condicional do processo, o juiz procederá de acordo com o
disposto na lei, ou seja, dará vista ao Ministério Público para formular a
proposta e, caso haja negativa, aplicará o disposto no art. 28 do CPP e
remeterá os autos ao Procurador-Geral de Justiça (art. 383, § 1º, CPP). Dispõe
a Súmula 337 do STF: “É cabível a suspensão condicional do processo na
desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva);
b) tratando-se de infração da competência de outro juízo, a este serão
encaminhados os autos (art. 383, § 2º, CPP).

7. Mutatio libelli

A mutatio libelli vem prevista no art. 384 do CPP, prescrevendo que


encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do
fato, em conseqüência de prova existente nos autos de elemento ou
circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público
deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude
desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-
se a termo o aditamento, quando feito oralmente.

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Na hipótese da mutatio libelli há o surgimento de elementar ou
circunstância durante a instrução que não está narrada na denúncia ou na
queixa (subsidiária da pública).

O procedimento descrito no art. 384 do CPP será adotado independente


da pena cominada ao crime decorrente da nova definição.

A mutatio libelli somente é cabível na ação pública ou na ação penal


privada subsidiária da pública e não poderá ser aplicada na fase recursal,
sob pena de ocorrer a supressão de instância. Não se aplica à ação penal
privada exclusiva ou personalíssima em razão do princípio da oportunidade,
pois o aditamento deveria ocorrer somente até o decurso do prazo decadencial.

Portanto, verificando que é o caso de mutatio libelli, o Ministério Público


deverá promover o aditamento da denúncia ou queixa. Assim não procedendo,
o juiz deverá aplicar o disposto no art. 28 do CPP, remetendo os autos ao
Procurador-Geral de Justiça (art. 384, § 1º, CPP).

Procedido ao aditamento, ouvido o defensor do acusado no prazo de 5


(cinco) dias e admitido o aditamento, o juiz, a requerimento de qualquer das
partes, designará dia e hora para continuação da audiência, com inquirição de
testemunhas, novo interrogatório do acusado, realização de debates e
julgamento (art. 384, § 1º, CPP).

Aplicam-se no caso de mutatio libelli as mesmas conseqüências que


podem advir da emendatio libelli (art. 384, § 2º, CPP), assim:

a) se da definição jurídica diversa, houver possibilidade de proposta de


suspensão condicional do processo, o juiz procederá de acordo com o disposto
na lei, ou seja, dará vista ao Ministério Público para formular a proposta e, caso
haja negativa, aplicará o disposto no art. 28 do CPP e remeterá os autos ao
Procurador-Geral de Justiça (art. 383, § 1º, CPP);
b) tratando-se de infração da competência de outro juízo, a este serão
encaminhados os autos (art. 383, § 2º, CPP)

Na nova instrução decorrente do aditamento, cada parte poderá arrolar


até 3 (três) testemunhas, no prazo de 5 (cinco) dias, ficando o juiz, na
sentença, adstrito aos termos do aditamento (art. 384, § 4º, CPP). Não
recebido o aditamento, o processo prosseguirá (art. 384, § 5º, do CPP).

Ressalte-se, por fim que, nos crimes de ação pública, o juiz poderá
proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado
pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha
sido alegada (art. 385, CPP). Dessa forma, não há a necessidade de aditar a
denúncia para o reconhecimento de agravantes.

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8. Sentença absolutória

A sentença absolutória é a que julga improcedente o pedido de


condenação e rejeita a pretensão punitiva estatal.

O motivo da absolvição deverá ser indicado na sentença em razão dos


efeitos que podem produzir na esfera cível (ação de reparação de dano) e na
esfera administrativa (procedimento disciplinar).

Dispõe o art. 386 do CPP que o juiz absolverá o réu, mencionando a


causa na parte dispositiva, desde que reconheça: I - estar provada a
inexistência do fato; II - não haver prova da existência do fato; III - não
constituir o fato infração penal; IV – estar provado que o réu não concorreu
para a infração penal; V – não existir prova de ter o réu concorrido para a
infração penal; VI – existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o
réu de pena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 1 o do art. 28, todos do Código Penal),
ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência; VII – não existir
prova suficiente para a condenação.

8.1 Efeitos da sentença absolutória

Nos termos do art. 386, parágrafo único, do CPP, na sentença


absolutória, o juiz: I - mandará, se for o caso, por o réu em liberdade; II –
ordenará a cessação das medidas cautelares e provisoriamente aplicadas; III -
aplicará medida de segurança, se cabível.

9. Sentença condenatória

Sentença condenatória é aquela que acolhe, no todo ou em parte, o


pedido da ação penal e reconhece a pretensão punitiva estatal.

Conforme dispõe o art. 387 do CPP, além de fundamentar o


convencimento sobre os fatos alegados e as provas produzidas em favor da
acusação ou da defesa, o juiz, ao proferir sentença condenatória: a)
mencionará as circunstâncias agravantes ou atenuantes definidas no Código
Penal, e cuja existência reconhecer (I); b) mencionará as outras circunstâncias
apuradas e tudo o mais que deva ser levado em conta na aplicação da pena,
de acordo com o disposto nos arts. 59 e 60 do Decreto-Lei n o 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 - Código Penal (II); c) aplicará as penas de acordo com
essas conclusões (III); d) fixará valor mínimo para reparação dos danos
causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido (IV);
e) decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso,
imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do
conhecimento da apelação que vier a ser interposta (parágrafo único).

Os incisos V (atenderá, quanto à aplicação provisória de interdições de


direitos e medidas de segurança, ao disposto no Título Xl deste Livro) e VI
(determinará se a sentença deverá ser publicada na íntegra ou em resumo e

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designará o jornal em que será feita a publicação (art. 73, § 1o, do Código
Penal) estão tacitamente revogados.

Decidindo pela procedência da ação penal, com o reconhecimento do


crime narrado na denúncia ou queixa, o juiz deverá concretizar a garantia da
individualização da pena, declarando o acusado como incurso nas penas
determinadas pelo tipo penal.

Na fixação da pena o juiz deve atender ao sistema trifásico disposto no


art. 68 do CP (“a pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59
deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e
agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento”), da seguinte
maneira:

a) Primeira fase: o magistrado deverá fixar a pena-base pelos critérios


do art. 59 do CP (“o juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à
conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e
conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima,
estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e
prevenção do crime”).
b) Segunda fase: o juiz deverá considerar as circunstâncias agravantes
e atenuantes, devendo, por imposição constitucional (art. 93, IX), motivar sua
decisão.
c) Terceira fase: por fim, o julgador deve considerar as causas de
aumento e diminuição de pena.

O juiz deverá, ainda, estabelecer o regime inicial de cumprimento da


pena privativa de liberdade (art. 59, III, CP) e avaliar a possibilidade de
substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos (art. 44, e
art. 59, IV, CP).

9.1 Efeitos da sentença condenatória

São efeitos da sentença condenatória recorrível: I - ser o réu preso ou


conservado na prisão, assim nas infrações inafiançáveis, como nas afiançáveis
enquanto não prestar fiança; II - ser o nome do réu lançado no rol dos culpados
(art. 393, CPP).

Esse dispositivo deve ser interpretado em conformidade com o princípio


da presunção de inocência.

A prisão do acusado não é automática, devendo estar presentes os


requisitos da prisão preventiva (art. 312, CPP). Ao proferir a sentença o juiz
decidirá, motivadamente, sobre a manutenção ou imposição da prisão
preventiva (art. 387, parágrafo único, CPP).

Por sua vez, a inclusão do nome do réu no rol dos culpados pressupõe
que a sentença transite em julgado (art. 5º, LVII, CF: “ninguém será

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considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal
condenatória”).

O Código Penal também estabelece os efeitos da sentença penal


condenatória, que podem ser genéricos (art. 91, CP) ou específicos (art. 92,
CP). Os efeitos genéricos independem de declaração expressa do juiz na
sentença, enquanto os efeitos específicos não são automáticos e devem ser
motivadamente declarados na sentença.

10. Publicação

Para que possa produzir seus efeitos a sentença deve ser publicada.

É considerada publicada a sentença quanto entregue em mão do


escrivão, que lavrará nos autos o respectivo termo, registrando-a em livro
especialmente destinado a esse fim (art. 389, CPP).

Se proferida em audiência considera-se publicada a sentença quando


lida pelo juiz.

Depois de publicada a sentença não pode ser modificada pelo juiz, salvo
no caso dos embargos de declaração ou para correção de erro material.

11. Intimação

O Código de Processo Penal estabelece regras peculiares para a


intimação da sentença.

Nos termos do art. 391 do CPP, o querelante ou o assistente será


intimado da sentença, pessoalmente ou na pessoa de seu advogado. Se
nenhum deles for encontrado no lugar da sede do juízo, a intimação será feita
mediante edital com o prazo de 10 dias (prazo de dilação), afixado no lugar de
costume.

O Ministério Público e Defensoria Pública são intimados


pessoalmente mediante a entrega dos autos, isto é, carga dos autos (REsp
1349935/SE, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, TERCEIRA SEÇÃO,
julgado em 23/08/2017, DJe 14/09/2017 – Recurso Repetitivo - Tema
Repetitivo 959). Defensoria Pública e o advogado dativo também são
intimados pessoalmente, por mandado (sem carga dos autos).

No que tange ao acusado e seu advogado o art. 392 do CPP


estabelece que: I - ao réu, pessoalmente, se estiver preso; II - ao réu,
pessoalmente, ou ao defensor por ele constituído, quando se livrar solto, ou,
sendo afiançável a infração, tiver prestado fiança; III - ao defensor constituído
pelo réu, se este, afiançável, ou não, a infração, expedido o mandado de
prisão, não tiver sido encontrado, e assim o certificar o oficial de justiça; IV -
mediante edital, nos casos do n o II, se o réu e o defensor que houver
constituído não forem encontrados, e assim o certificar o oficial de justiça; V -

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mediante edital, nos casos do no III, se o defensor que o réu houver constituído
também não for encontrado, e assim o certificar o oficial de justiça; VI -
mediante edital, se o réu, não tendo constituído defensor, não for encontrado, e
assim o certificar o oficial de justiça.

O prazo de dilação do edital será de 90 dias, se tiver sido imposta pena


privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, e de 60 dias, nos
outros casos (art. 392, § 1º, CPP).

A intimação é considerada efetivada no dia útil subsequente ao término


do prazo de dilação do edital. Dessa forma, o prazo para apelação correrá após
o término do fixado no edital, salvo se, no curso deste, for feita a intimação por
qualquer das outras formas estabelecidas neste artigo (art. 392, § 2º, CPP).

Entende-se que o edital pode se sucinto, com a indicação do réu e da


parte dispositiva da sentença, não havendo necessidade de conter o inteiro
teor da sentença.

12. Coisa julgada

A coisa julgada ocorre nas situações em que há sentença propriamente


dita, com julgamento da pretensão punitiva em seu mérito.

Com a coisa julgada, a sentença se torna imutável com o decurso do


prazo recursal sem a interposição de recurso ou após todos eles terem sido
julgados.

Em matéria penal a coisa julgada pode recair sobre a sentença


condenatória ou absolutória.

A sentença condenatória, porém, está sujeita à revisão criminal em favor


do réu, mitigando a qualidade de coisa julgada de sentença penal condenatória
(art. 622, CPP). Não há revisão criminal da sentença absolutória ou
condenatória pro societate.

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