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15.

HABEAS CORPUS

15.1 Conceito e natureza jurídica

Etimologicamente, o termo habeas corpus significa “toma o corpo”, ou


seja, a apresentação de alguém preso ao juiz para que a ordem de prisão seja
mantida ou revogada, analisando-se a sua legalidade.

Apesar de estar disciplinada no Código de Processo Penal no Título II,


que trata dos recursos em geral, o habeas corpus tem natureza jurídica de uma
ação constitucional, destinada à coibir qualquer ilegalidade ou abuso de poder
contra a liberdade de locomoção.

Dispõe o art. 5º, LXVIII, da Constituição Federal que “conceder-se-á


‘habeas-corpus’ sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer
violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso
de poder”.

O habeas corpus é gratuito (art. 5º, LXXVII, CF: “são gratuitas as ações
de habeas corpus e habeas data e, na forma da lei, os atos necessários ao
exercício da cidadania”.

Apesar das divergências sobre sua origem, a maioria da doutrina


identifica que o habeas corpus surgiu na Constituição da Inglaterra de 1215,
conhecida como Magna Charla Libertatum, outorgada pelo Rei João Sem
Terra.

No Brasil, o habeas corpus foi introduzido no Código de Processo


Criminal do Império, de 1832 (art. 340), e na Constituição de 1891 (art. 72, §
22).

15.2 Classificação

O habeas corpus é classificado em duas espécies:

Habeas corpus repressivo ou liberatório: cabível quando estiver


ocorrendo a coação contra a liberdade de locomoção. Concedida a ordem será
expedido o alvará de soltura (art. 660, § 1º, do CPP).

Habeas corpus preventivo: cabível quando houver ameaça à pessoa


de vir a sofrer a coação contra sua liberdade de locomoção. Concedida a
ordem, será expedido o salvo-conduto (art. 660, § 4º, do CPP).

15.3 Cabimento

O habeas corpus será cabível quando ocorrer coação ilegal e o art. 648
do CPP dispõe que o constrangimento é ilegal:

I - quando não houver justa causa: não houve justificativa para a


coação, ou seja, não prevista em lei ou se não observados os requisitos

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autorizadores do constrangimento. Ex.: prisão para averiguação (não previsto
em lei).

II - quando alguém estiver preso por mais tempo do que determina


a lei: quando excedido o prazo de prisão previsto na lei, ou, quando não existir
prazo determinado, tenha excedido a somatória dos prazos legais.

Súmula 64 do STJ: “não constitui constrangimento ilegal o excesso de


prazo na instrução, provocado pela defesa”.

Súmula 21 do STJ: “pronunciado o réu, fica superada a alegação do


constrangimento ilegal da prisão por excesso de prazo na instrução”.

Súmula 52 do STJ: “encerrada a instrução criminal, fica superada a


alegação de constrangimento por excesso de prazo”.

III - quando quem ordenar a coação não tiver competência para


fazê-lo: constrangimento ilegal determinado por autoridade incompetente. Ex.:
juiz de primeiro grau não pode determinar a prisão de Prefeito por crime. A
competência é originária do Tribunal.

IV - quando houver cessado o motivo que autorizou a coação:


desapareceram os motivos que autorizavam a prisão. Ex.: prisão preventiva
decretada para garantir a instrução criminal e a colheita de provas se findou.

V - quando não for alguém admitido a prestar fiança, nos casos em


que a lei a autoriza: terá por finalidade somente o arbitramento da fiança (art.
660, § 3º, do CPP).

VI - quando o processo for manifestamente nulo: impetrado com a


finalidade direta de reconhecimento de nulidade e, indiretamente, para a
obtenção da liberdade da pessoa presa. Quando se tratar de nulidade absoluta
pode ser impetrado em qualquer tempo, mesmo depois de transitada em
julgado a decisão.

VII - quando extinta a punibilidade: para o reconhecimento da extinção


da punibilidade, pela prescrição ou qualquer outra causa, o que, indiretamente,
ocasionará a liberdade da pessoa presa. Cabível mesmo depois de transitada
em julgada a decisão condenatória.

15.4 Sujeitos dos habeas corpus

Paciente: quem sofre ou está ameaçado de sofrer a violência ou


constrangimento à sua liberdade de locomoção. Somente pessoas físicas.

Coator: quem exercer ou determinar o constrangimento ilegal. Prevalece


o entendimento que o coator pode ser tanto a autoridade quanto o particular.

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Exemplo de constrangimento por particular: hospital de não dá alta
enquanto a pessoa não pagar a conta dos serviços, há o constrangimento
ilegal (art. 148 do CP).

Impetrante: é a pessoa que impetra o habeas corpus em favor de


outrem, podendo ser qualquer do povo, incluindo o próprio paciente (art. 654
CPP). Não há a necessidade de representação por advogado (art. 10, § 1º, da
Lei 8.906/94).

O Ministério Público pode ser impetrante em favor do réu, ainda que ele
seja parte no processo (art. 654, caput, do CPP).

O juiz no exercício de suas funções não pode impetrar em favor do réu.


Nesse caso, poderá conceder o habeas corpus de ofício (art. 654, § 2º, do
CPP).

15.5 Habeas corpus e prisão administrativa

Dispõe o art. 650, § 2º, do CPP que não cabe o habeas corpus contra a
prisão administrativa, atual ou iminente, dos responsáveis por dinheiro ou
valor pertencente à Fazenda Pública, alcançados ou omissos em fazer o seu
recolhimento nos prazos legais, salvo se o pedido for acompanhado de prova
de quitação ou de depósito do alcance verificado, ou se a prisão exceder o
prazo legal.

Essa espécie de prisão não foi recepcionada pela Constituição Federal,


pois, a prisão somente poderá no caso de flagrante delito ou por ordem escrita
da autoridade judiciária competente.

Caso seja determinada a prisão administrativa, por ausência de previsão


legal, deve ser impetrado o habeas corpus por ausência de justa causa para a
coação (art. 648, I, do CPP).

15.6 Habeas corpus e punição disciplinar militar

Dispõe o art. 142, § 2º, da CF que “não caberá habeas corpus em


relação a punições disciplinares militares”.

É predominante o entendimento que a proibição da impetração do


habeas corpus se refere ao mérito da punição disciplinar militar, assim, pode
ser impetrado quando houver vício formal que torne a medida ilegal.

15.7 Liminar em habeas corpus

Embora não exista previsão legal, poderá ser concedida a liminar em


habeas corpus, desde que presentes o periculum in mora e o fumus boni iuris.
No julgamento do mérito a liminar poderá ser mantida ou revogada.

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15.8 Competência

A competência para o julgamento do habeas corpus será do juiz com


autoridade judiciária superior ao coator. Nos termos do art. 650, § 1º, do CPP,
“a competência do juiz cessará sempre que a violência ou coação provier de
autoridade judiciária de igual ou superior jurisdição”.

Sendo coator o delegado de polícia, o juiz de primeiro grau é o


competente para o julgamento do habeas corpus. Sendo coator juiz de primeiro
grau, somente o segundo grau de jurisdição terá competência para o
julgamento do writ (ex.: TJ ou TRF). Sendo coator o promotor de justiça,
prevalece o entendimento de que deve ser impetrado o habeas corpus perante
o Tribunal (TJ e TRF).

Competência para julgamento do habeas corpus regrada pela


Constituição Federal.

Supremo Tribunal Federal (art. 102, I, “d” e “i”, da CF):

 Sendo pacientes o Presidente da República, o Vice-Presidente,


os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros (STF), o
Procurador-Geral da República, os Ministros de Estado e os Comandantes da
Marinha, do Exército e da Aeronáutica, os membros dos Tribunais Superiores,
os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de
caráter permanente.
 Quando o coator for Tribunal Superior (STJ, TSE, TST).
 Quando o coator ou o paciente for autoridade ou funcionário
cujos atos estejam sujeitos diretamente à jurisdição do Supremo Tribunal
Federal.
 Quando se tratar de crime sujeito à jurisdição do STF em única
instância.

Superior Tribunal de Justiça (art. 105, I, “c”, da CF):

 Sendo coator ou paciente os Governadores dos Estados e do


Distrito Federal, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e
do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do
Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais
Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas
dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante
tribunais.
 Quando o coator for tribunal sujeito à sua jurisdição, Ministro de
Estado ou Comandante da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica, ressalvada
a competência da Justiça Eleitoral;

Tribunal Regional Federal (art. 108, I, “d”, da CF):

 Quando a autoridade coatora for juiz federal.

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Juízes Federais (art. 109, VII, da CF):

 Quando o constrangimento provier de autoridade cujos atos não


estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição.

Juizado Especial Criminal: predomina o entendimento de que o


habeas corpus contra ato do juiz do juizado especial criminal deve ser julgado
pela Turma Recursal.

Turmas Recursais: o habeas corpus contra decisão das Turmas


Recursais deve ser julgado pelo Tribunal de Justiça do Estado (O STF decidiu
que não mais prevalece a Súmula 690).

15.9 Habeas corpus em substituição aos recursos ordinários

O impetrante pode optar por impetrar outro habeas corpus contra a


decisão que denegou o writ anteriormente impetrado.

Ex.: HC contra delegado impetrado a um juiz de primeiro grau que


denega o writ. O impetrante pode recorrer em sentido estrito contra a
denegação da ordem (art. 581, X, do CPP) ou impetrar outro habeas corpus ao
TJ ou TRF contra essa decisão do juiz de primeiro grau.

15.10 Habeas corpus contra indeferimento de liminar em outro


habeas corpus

Em regra, não é possível, pois importa em supressão de instância.


Súmula 691 do STF: “não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de
habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus,
requerido a Tribunal Superior, indefere a liminar”.

Porém, em alguns casos concretos, quando há manifesto


constrangimento ilegal, o STF tem admitido e afastado a incidência da Súmula
691.

16. REVISÃO CRIMINAL

16.1 Conceito e natureza jurídica

A revisão criminal é o meio processual para a desconstituição da


sentença penal condenatória transitada em julgado.

Não possui natureza recursal, apesar de prevista no CPP no Capítulo


destinado aos recursos. A revisão tem natureza de ação penal de
conhecimento de caráter desconstitutivo. O art. 626 do CPP refere-se à
procedência da revisão, o que é típico das ações, e não provimento, que é
atinente ao julgamento de recursos.

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É de uso exclusivo da defesa. Não poderá ser requerida em favor da
sociedade, mesmo que surgirem novas provas para a condenação.

16.2 Pressupostos

São dois os pressupostos da revisão criminal:

a) decisão judicial condenatória: não é admitida a revisão criminal


para a desconstituição da sentença penal absolutória, salvo a absolutória
imprópria (medida de segurança).

b) decisão transitada em julgado: a decisão condenatória deve ser


irrecorrível (art. 625, § 1º, do CPP, determina que o requerimento será instruído
com a certidão de haver passado em julgado a sentença condenatória).

16.3 Cabimento

Nos termos do art. 621 do CPP, a revisão criminal será admitida:

I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso


da lei penal ou à evidência dos autos

A decisão será contrária ao texto expresso da lei penal quando contrariar


a lei no sentido amplo, não só o direito penal, mas também o direito processual
penal. Ex.: reconhecer agravante não expressa na Lei Penal.

Também pode ser utilizada a revisão criminal quando a decisão é


contrária à evidência dos autos, ou seja, às provas. A decisão deve ter sido
proferida alheia a toda a prova dos autos, pois, se houver um mínimo de provas
que sustentem a sentença condenatória, não terá cabimento a revisão.

II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos,


exames ou documentos comprovadamente falsos: não basta a existência
de depoimento, exame ou documento falso nos autos, há a necessidade de
que a sentença tenha se “fundado” em qualquer um deles para que a revisão
criminal possa ser manejada. A prova da falsidade deverá acompanhar a
petição de revisão, sob pena de indeferimento liminar (art. 625, § 1º, do CPP).

III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de


inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize
diminuição especial da pena: prova nova é a que surgiu depois do trânsito
em julgado da decisão ou a preexistente, que, contudo, não foi apreciada no
processo que condenou o acusado.

16.4 Prazo

Não há prazo para o ingresso da revisão criminal, que poderá ser


requerida em qualquer tempo, antes ou depois de extinção da pena, inclusive
após a morte do réu (art. 622 do CPP). Não será admissível a reiteração do
pedido, salvo se fundado em novas provas (art. 622, parágrafo único, do CPP).

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16.5 Procedimento

Não há fase de instrução na revisão criminal e nem contraditório.

Nos termos do art. 625, § 1º, do CPP, o requerimento será instruído com
a certidão de haver passado em julgado a sentença condenatória e com as
peças necessárias à comprovação dos fatos arguidos. Portanto, os fatos
alegados devem vir acompanhados de prova pré-constituída.

Havendo a necessidade de instruir com depoimento de novas


testemunhas, o requerente, inicialmente, deverá realizar a oitiva da testemunha
em procedimento de justificação criminal, que é uma espécie de ação cautelar
de natureza preparatória, ajuizada perante o juízo da condenação de primeiro
grau de jurisdição, no qual será obedecido o contraditório, com a participação
do Ministério Público.

A revisão criminal, quando requerida, será distribuída a um Relator


(conforme normas de organização judiciária), a quem cabe examinar a
presença dos pressupostos dessa ação e a presença dos elementos
necessários para o julgamento.

Entendendo o Relator que o pedido está regular, determinará a abertura


de vista ao Ministério Público para manifestação e, em seguida, determinará a
inclusão na pauta para julgamento. O Relator poderá determinar o
apensamento dos autos originais, caso isso não dificultar a execução normal
da sentença (art. 625, § 2º, do CPP).

Contudo, se o Relator julgar insuficientemente instruído o pedido, poderá


adotar duas posições:

a) Indeferir liminarmente a revisão criminal (art. 625, § 3º, do CPP):


contra essa decisão será facultado recurso se previsto no regimento interno,
como, por exemplo, o agravo regimental.

b) O Relator poderá determinar o apensamento dos autos originais se


isso não se mostrar inconveniente ao interesse da justiça (art. 625, § 3º, do
CPP).

16.6 Legitimidade

Dispõe o art. 623 do CPP que a revisão poderá ser pedida pelo próprio
réu ou por procurador legalmente habilitado ou, no caso de morte do réu, pelo
cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.

Há divergência se o réu pode requer diretamente a revisão, sem que


esteja assistido por advogado, diante do que dispõe o art. 133 da Constituição
Federal. STF entendeu que não precisa de advogado (decisão de 2001). Para

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outros autores, se o réu ingressar com a revisão, deve ser nomeado defensor
dativo ou defensor público para ratificar seus termos.

Quando o requerente, cuja revisão tiver de ser revista, falecer no curso


da revisão, o presidente do tribunal nomeará curador para a defesa (art. 631 do
CPP).

16.7 Competência para julgamento

A revisão criminal tem sistema próximo de reexame, até porque não se


trata de recurso, mas de ação de conhecimento desconstitutiva.

O Supremo Tribunal Federal tem competência para julgar a revisão


criminal de seus julgados (art. 102, I, “j”, da CF).

O Superior Tribunal de Justiça tem competência para julgar a revisão


criminal de seus julgados (art. 105, I, “e”, da CF).

Os Tribunais de Justiça e os Tribunais Regionais Federais têm


competência mais ampla, pois, além de julgarem as revisões criminais de seus
julgados, proferidos em única (competência originária) ou última instância
(recursos ordinários), também julgam as revisões dos julgados dos juízes de
primeiro grau de jurisdição (quando transitou em julgado em primeiro grau de
jurisdição).

16.8 Revisão criminal para reconhecimento de nulidade

Não há previsão expressa no art. 621 do CPP do cabimento da revisão


criminal para o reconhecimento de nulidade e, por se tratar de rol taxativo, há
entendimento de que deve ser impetrado o habeas corpus para o
reconhecimento de nulidade da decisão transitada em julgado.

No entanto, alguns autores entendem ser possível, pois o art. 626 do


CPP dispõe que uma das consequências da procedência da revisão criminal é
a anulação do processo.

16.9 Consequências da procedência da revisão criminal

As consequências para a procedência da revisão estão dispostas no art.


626 do CPP, estabelecendo que julgando procedente a revisão, o tribunal
poderá alterar a classificação da infração, absolver o réu, modificar a pena ou
anular o processo.

A decisão não poderá ser desfavorável ao réu, vedando-se a reformatio


in pejus. Assim, não poderá ser agravada a pena imposta pela decisão revista
(art. 626, parágrafo único, do CPP).

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16.10 Revisão criminal e soberania dos veredictos do Tribunal do Júri

Há dois entendimentos sobre a consequência da procedência da revisão


criminal contra decisão proferida pelo Tribunal do Júri.

O primeiro sustenta que o órgão revisor poderá absolver o réu, pois não
há previsão para determinar a sua submissão a novo julgamento. O órgão
revisor pode absolver o réu, pois a soberania do júri é garantia constitucional
em favor do jus libertatis, assim como a revisão criminal. Essa é a posição
prevalente na doutrina e jurisprudência.

O segundo sustenta que para harmonizar a revisão criminal e a


soberania das decisões do júri, a solução é que o órgão revisor deve anular o
processo e remeter o réu a novo julgamento pelo Tribunal do Júri.

16.11 Direito à indenização

O Tribunal que julgar a revisão, se o interessado o requerer, poderá


reconhecer o direito a uma justa indenização pelos prejuízos sofridos (art. 630
do CPP). A indenização será liquidada no juízo cível, e responderá a União, se
a condenação tiver sido proferida pela justiça do Distrito Federal ou de
Território, ou o Estado, se o tiver sido pela respectiva justiça (§ 1º).

Essa previsão está em consonância com o art. 5º, LXXV, da CF: “o


Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar
preso além do tempo fixado na sentença”.

No entanto, o art. 630, § 2º, do CPP, obsta a indenização nas seguintes


hipóteses:

a) se o erro ou a injustiça da condenação proceder de ato ou falta


imputável ao próprio impetrante, como a confissão ou a ocultação de prova em
seu poder. Ex.: réu que confessa o crime para proteger outrem.

b) se a acusação houver sido meramente privada: há divergência sobre


a constitucionalidade desse dispositivo. O art. 5º, LXXV, da CF, não restringe a
indenização por erro judiciário às ações públicas. Ademais, a ação de natureza
privada é julgada pelo Poder Judiciário, que expressa a vontade do Estado.

16.12 Revisão criminal no Juizado Especial Criminal

Não há impedimento para o ingresso da revisão criminal contra as


decisões proferida pelo Juizado Especial Criminal. O art. 59 da Lei 9.099/95
somente vedou a ação rescisória das decisões proferida pelo Juizado Especial
Cível, quedando-se silente quanto à revisão criminal.

Há divergência somente quanto ao órgão que julgará a revisão.

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Para a primeira posição a competência de julgamento será do Tribunal
de Justiça (Juizado Especial Criminal Estadual) ou do Tribunal Regional
Federal (Juizado Especial Criminal Federal). Essa posição é minoritária.

Para a segunda posição a competência para julgamento da revisão será


da Turma Recursal, que é órgão de segunda instância dos Juizados Especiais.
Essa é a posição prevalente e também a adotada pelo Superior Tribunal de
Justiça.

17. MANDADO DE SEGURANÇA

17.1 Conceito e natureza jurídica

O mandado de segunda é a ação de natureza constitucional destinado a


proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas
data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física
ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de
autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do
Poder Público (art. 5º, LXIX, da CF e art. 1º da Lei 12.016/09).

Além da previsão constitucional, o mandamus é disciplinado pela Lei


12.016/09 (que revogou a Lei 1.533/51).

17.2 Pressupostos

Inicialmente, o mandado de segurança tem o escopo de proteger direito


líquido e certo.

Direito líquido e certo é aquele sob o qual não há qualquer dúvida da


existência ou quanto sua extensão e que pode ser exercido e comprovado de
plano, até porque, é inadmissível a dilação probatória no mandado de
segurança.

Não é todo direito líquido e certo que pode ser amparado pelo mandado
de segurança, mas somente aquele que não caiba o habeas corpus (direito de
locomoção) e o habeas data (direito à informação).

Deve o direito líquido e certo estar sofrendo ou estar sob o justo receito
de que venha a sofrer ilegalidade ou abuso de poder por parte de autoridade.

Ilegalidade é a desconformidade do ato praticado pela autoridade com o


que determina a lei. Abuso de poder ocorre quando a autoridade, com
competência para o ato, o pratica com finalidade diversa, desviando o poder
conferido, ou extrapola os limites definidos pela própria lei.

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17.3 Legitimidade ativa

O impetrante pode ser a pessoa física ou jurídica que sofrer violação ou


houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade (art. 1º da Lei
12.016/09).

O impetrante deverá ser o titular do direito líquido e certo. Quando o


direito ameaçado ou violado couber a várias pessoas, qualquer uma delas
poderá impetrar o mandado de segurança (art. 1º, § 3º, Lei 12.016/09).

O mandado de segurança, sob o enfoque criminal, poderá ser impetrado


pelo:
a) Ministério Público (art. 32, I, da Lei 8.625/93). Ex.: concessão de
efeito suspensivo a recurso que não o tenha por força de lei.
b) Acusado. Ex.: liberação de veículo apreendido e que não interesse ao
processo.
c) Ofendido. Ex.: contra o indeferimento do pedido de habilitação como
assistente de acusação.
d) Querelante.
e) Advogado. Ex.: direito de acesso ao inquérito policial.
f) Terceiros interessado. Ex: liberação de bem apreendido.

Ao contrário do habeas corpus, a petição do mandado de segurança


deve ser subscrita por quem tem capacidade postulatória, pois a petição inicial
pode ser rejeitada nas hipóteses previstas no art. 485, I, do CPC (art. 6º, § 5º,
da Lei 12.016/09).

17.4 Não cabimento do mandado de segurança

Dispõe o art. 5º, da Lei 12.016/09, que não se concederá mandado de


segurança quando se tratar: I - de ato do qual caiba recurso administrativo com
efeito suspensivo, independentemente de caução; II - de decisão judicial da
qual caiba recurso com efeito suspensivo; III - de decisão judicial transitada em
julgado.

Súmula 266 do STF: “não cabe mandado de segurança contra lei em


tese”.

Súmula 267 do STF: “não cabe mandado de segurança contra ato


judicial passível de recurso ou correição”.

Súmula 268 do STF: “não cabe mandado de segurança contra decisão


judicial com trânsito em julgado”.

17.5 Legitimidade passiva

O coator somente poderá ser autoridade pública ou agente de pessoa


jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. Portanto, o coator deverá
ser pessoa física, nunca a pessoa jurídica, seja de direito público ou privado.

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Ao contrário do habeas corpus, não pode ser impetrado contra ato de
particular.

A autoridade coatora será aquela que pratica o ato ilegal ou abusivo ou a


que ordena a sua execução. Estabelece o art. 6º, § 3º, da LMS, que “considera-
se autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual
emane a ordem para a sua prática”. Não cabe o mandado de segurança contra
o mero executor da ordem, mas contra quem ela emanou e tem o poder de
desfazer o ato impugnado.

17.6 Competência para julgamento

Em regra, a competência para o julgamento do mandado de segurança


será definida de acordo com a hierarquia da autoridade coatora e sua sede
funcional, independente da matéria relativa ao ato impugnado.

Destarte, o juiz de primeiro grau de jurisdição julgará o mandado de


segurança contra o ato ilegal ou abusivo praticado por autoridade sob sua
jurisdição, como, por exemplo, o delegado de polícia. Quando o ato impugnado
tiver sido praticado pelo juiz criminal, julgará o mandado de segurança o
Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal, caso seja na esfera estadual
ou federal.

A Constituição Federal também disciplina a competência para o


julgamento do mandado de segurança.

O Supremo Tribunal Federal tem competência para julgar o mandado


de segurança contra atos do Presidente da República, das Mesas da Câmara
dos Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União, do
Procurador-Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal (art.
102, I, “d”, da CF). Súmula 624 do STF: “não compete ao Supremo Tribunal
Federal conhecer originariamente de mandado de segurança contra atos de
outros tribunais”.

O Superior Tribunal de Justiça tem competência para julgar os


mandados de segurança contra ato de Ministro de Estado, dos Comandantes
da Marinha, do Exército e da Aeronáutica ou do próprio Tribunal (art. 105, I, “b”,
da CF).

Os Tribunais Regionais Federais têm competência para julgar os


mandados de segurança contra ato do próprio Tribunal ou de juiz federal (art.
108, I, “c”, da CF).

Os juízes federais têm competência para julgar os mandados de


segurança contra ato de autoridade federal, excetuados os casos de
competência dos tribunais federais (art. 109, VIII, da CF).

Sendo o ato impugnado praticado por juiz do Juizado Especial Criminal,


o mandado de segurança será julgado pelas Turmas Recursais. Súmula 376 do

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STJ: “Compete a turma recursal processar e julgar o mandado de segurança
contra ato do juizado especial”.

Há divergência quanto ao cabimento de mandado de segurança contra


ato das Turmas Recursais.

Primeira posição: é cabível o mandado de segurança contra ato da


Turma Recursal, que por ela própria deve ser julgada. É a posição dominante.

Segunda posição: não cabe mandado de segurança contra Turma


Recursal, pois não há previsão legal para que ela julgue o mandamus contra
seus próprios atos. Também não cabe aos Tribunais de Justiça e aos Tribunais
Regionais Federais julgar questões relativas aos Juizados Especiais Criminais.

17.7 Prazo

O mandado de segurança deve ser impetrado no prazo de 120 (cento e


vinte) dias, contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado (art. 23 da
Lei 12.016/09). Trata-se de prazo decadencial (Súmula 632 do STF) e,
superado o prazo, ocorre a decadência do direito de impetrar o mandamus.

17.8 Processamento

A impetração do mandamus será realizada por petição, que deverá


preencher os requisitos estabelecidos na lei processual civil, sob pena de
indeferimento nos termos do art. 267 do CPC (art. 6º, § 5º).

A petição inicial será apresentada em 2 (duas) vias, acompanhada dos


documentos que comprovem o direito líquido e certo e o ato ilegal ou abusivo
praticado ou na iminência de ser praticado (art. 6º, caput).

Será indeferida desde logo a inicial, por decisão motivada, quando não
for o caso de mandado de segurança ou lhe faltar algum dos requisitos legais
ou quando decorrido o prazo legal para a impetração.

Ao despachar a inicial, o juiz ordenará:

I - que se notifique o coator do conteúdo da petição inicial, enviando-lhe


a segunda via apresentada com as cópias dos documentos, a fim de que, no
prazo de 10 (dez) dias, preste as informações.

II - que se dê ciência do feito ao órgão de representação judicial da


pessoa jurídica interessada, enviando-lhe cópia da inicial sem documentos,
para que, querendo, ingresse no feito.

III - que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver
fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da
medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante
caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à
pessoa jurídica (quando presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora).

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Dessa decisão do juiz de primeiro grau que conceder ou denegar a
liminar caberá agravo de instrumento (com as regras do CPC – art. 7º, § 1º).

Decorrido o prazo de 10 (dez) dias para que a autoridade coatora


apresente as informações, o juiz ouvirá o representante do Ministério Público,
que opinará, dentro do prazo improrrogável de 10 (dez) dias. Com ou sem o
parecer do Ministério Público, os autos serão conclusos ao juiz, para a decisão,
a qual deverá ser necessariamente proferida em 30 (trinta) dias (art. 12).

Da sentença, denegando ou concedendo o mandado, cabe o recurso


voluntário de apelação. Concedida a segurança, a sentença estará sujeita
obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição (reexame necessário).

No mandado de segurança impetrado pelo Ministério Público contra


decisão proferida no processo penal é obrigatória a citação do réu como
litisconsorte passivo (Súmula 701 do STF), sob penal de nulidade.

17.9 Algumas hipóteses de cabimento na área criminal

Decisão que indefere a habilitação de assistente de acusação.


Presentes os requisitos do art. 273 do CPP, não deve ser negada a habilitação,
sendo um direito líquido e certo.

Decisão que indefere a restituição de bens apreendidos. Em regra,


contra essa decisão cabe o recurso de apelação (art. 593, II, do CPP), porém,
é admitido o mandamus.

Concessão de efeito suspensivo a recurso em que não há previsão


legal desse efeito. Nesse caso os tribunais somente concedem o efeito
suspensivo em situações excepcionais, quando evidenciado manifesta
ilegalidade.
A questão foi sumulada pelo STJ, vendado o manejo do MS nessa
hipótese. Súmula 604 do STJ: “Mandado de segurança não se presta para
atribuir efeito suspensivo a recurso criminal interposto pelo Ministério Público”.

Direito de acesso do advogado aos autos do inquérito policial ou


para extração de cópias quando decretado sigilo pelo Delegado (art. 7º,
XIV, da Lei 8.906/96).

18 CORREIÇÃO PARCIAL

18.1 Conceito e natureza

A correição parcial é a medida judicial utilizada contra o magistrado


quando ocorrer o error in procedendo, decorrente de abuso de poder e que
cause a inversão tumultuária do processo, e não seja cabível recurso contra
esse despacho ou decisão.

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Não há consenso quanto à natureza jurídica da correição. Para alguns
autores trata-se de mera providência ou medida administrativa-disciplinar e
para outros é um autentico recurso residual.

A correição não tem previsão no Código de Processo Penal, mas nos


regimentos internos dos tribunais ou nas leis de organização judiciária,
podendo variar seu procedimento e prazos.

O âmbito federal, a Lei 5.010/66, que organiza a Justiça Federal de


primeira instância, estabelece no art. 6º, I, que o Conselho da Justiça Federal
compete conhecer de correição parcial requerida pela parte ou pela
Procuradoria da República contra ato ou despacho do Juiz de que não caiba
recurso ou que importe erro de ofício ou abuso de poder.

18.2 Prazo

O prazo para propositura da correição parcial dependerá da sua


previsão no regimento interno ou lei de organização judiciária.

No Decreto-lei 253/67, que regulamentou a Lei 5.010/66, o prazo será de


cinco dias.

No Estado de São Paulo, o Regimento Interno do Tribunal de Justiça,


estabelece que a correição parcial adotará o procedimento do agravo de
instrumento do Código de Processo Civil, cujo prazo de interposição será de 15
dias (art. 1003, §3º, do CPC). No entanto, o TJSP entende que o prazo é de 5
dias da publicação da decisão atacada.

Há, por fim, entendimento de que deve seguir o procedimento do recurso


em sentido estrito, no qual o prazo de interposição será de 5 dias.

18.3 Procedimento

O procedimento dependerá da previsão do regimento interno e da lei de


organização judiciária e, normalmente, seguirá o procedimento do agravo de
instrumento do Código de Processo Civil ou do recurso em sentido estrito.

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