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José Diones do Nascimento Filho

Matheus Silva Olegário Barcelos


Thiago Silva Barros
Fabrício Martins de Oliveira

Remédio Constitucional Habeas Corpus

O'Que é o Habeas Corpus?

É uma medida judicial que tem como objetivo a proteção da liberdade de locomoção
do indivíduo, quando esta se encontra ameaçada ou restringida de forma direta ou
indireta. Normalmente este amparo pode ser requisitado por qualquer pessoa fisica
que sofrer (ou se achar na iminência de sofrer) violencia ou coação ilegal na sua
liberdade de ir e vir, em decorrência de ilegalidade ou abuso de poder.

Origem do Habeas Corpus no Brasil

Embora já fosse implicitamente contemplado desde a Constituição de 1824, o HC


alcançou novo patamar com a Constituição Federal de 1988, promulgada após um
período duro para a democracia no Brasil.
Por mais de duas décadas, até seu fim em 1985, a ditadura militar calou e perseguiu
brasileiros, restringindo direitos básicos do cidadão, entre eles, o de locomoção.
O habeas corpus é peça processual impetrada justamente para defesa de
mencionado interesse, “sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer
violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de
poder” (art. 5º, LXVIII da Constituição Federal).

Tipos de Habeas Corpus:

Preventivo: pode ser implementado se houver simplesmente a ameaça do direito


de ir e vir, seu deferimento da ao paciente, o salvo conduto (garantia de não ser
preso), por exemplo, pode ser usado contra a quebra de sigilo telefônico do
paciente.

Liberatório: é cabível apenas quando tal interesse foi desrespeitado, o alvará de


soltura (garantia de não permanecer preso), por exemplo, é cabível quando a
execução da pena supera o estabelecido na sentença.
Legitimidade

Qualquer cidadão, brasileiro ou estrangeiro, pessoa física ou jurídica, bem como o


Ministério Público, têm legitimidade ativa para impetrar HC em seu favor ou de
outrem (art. 654 do Código de Processo Penal).

Do Habeas Corpus e Seu Processo


(possibilidades que podem ser utilizadas ao hc previsto no CPP)
Art. 647. Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na
iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos
casos de punição disciplinar.
Art. 648. A coação considerar-se-á ilegal:

I – quando não houver justa causa;

II – quando alguém estiver preso por mais tempo do que determina a lei;

III – quando quem ordenar a coação não tiver competência para fazê-lo;

IV – quando houver cessado o motivo que autorizou a coação;

V – quando não for alguém admitido a prestar fiança, nos casos em que a lei a
autoriza;

VI – quando o processo for manifestamente nulo;

VII – quando extinta a punibilidade.

Condições da ação e julgamento

É preciso haver possibilidade jurídica do pedido e ele deve ser líquido e certo.
A primeira condição diz respeito ao cabimento do habeas corpus, inadmissível, por
exemplo, nas punições disciplinares militares (art. 142, §2º da CF/88). Já a segunda
está relacionada à necessidade de ser evidente o motivo do pleito, notório,
manifestamente compreensível pelo julgador.
Todos esses alicerces compõem a base de julgamento do magistrado, sendo
imprescindível a sua fundamentação quando proferida a decisão sobre o
salvo-conduto ou o alvará de soltura.

Competência e procedimento

Em regra, é competente para julgar a autoridade imediatamente acima da que


ameaçou ou violou a liberdade de locomoção. O HC tem prioridade de tramitação
em razão da urgência do pleito, dada a delicadeza do assunto, fazendo valer as
máximas do Estado Democrático de Direito.
O procedimento é regulamentado pelo art. 656 e seguintes do CPP, prevendo, por
exemplo, o interrogatório do paciente, prazos, quórum da sessão e demais aspectos
procedimentais relativos à conduta em corte.

Um exemplo curioso é o do caso do André do Rap, traficante preso que conseguiu


um habeas corpus através do ministro do STF já aposentado, Marco Aurélio Mello.

Uma das maiores discussões jurídicas de todo o ano de 2020 foi, sem dúvidas, a
soltura de André do Rap, um dos líderes da facção criminosa Primeiro Comando da
Capital (PCC).

O criminoso possui grande influência no meio do crime organizado, fato este


corroborado pelas autoridades que o consideravam responsável pelo envio de
grandes quantidades de drogas a outros países. Ele estava preso desde setembro
de 2019 e já era condenado em segunda instância por tráfico internacional de
drogas. As penas, se somadas, resultam em mais de 25 anos de prisão.

Evidentemente, a sociedade não viu com bons olhos a cena de André do Rap
saindo, com aparente tranquilidade, pelo portão da frente do presídio. As forças
policiais certamente também não, considerando que desempenharam, por anos, um
árduo trabalho para efetivar a sua captura. Entretanto, apesar da revolta
generalizada, alguns pontos precisam ser esclarecidos. O faccionado encontrava-se
preso preventivamente. Por conseguinte, se faz necessário, para compreensão,
uma análise desse instituto.

Preliminarmente, a prisão preventiva não se confunde com prisão para cumprimento


de pena. Enquanto esta é a efetiva responsabilização pelo cometimento de um
crime, aquela é decretada para garantir a ordem pública, a ordem econômica, por
conveniência da instrução criminal, para assegurar a aplicação da lei penal, quando
houver descumprimento das medidas cautelares ou, ainda, quando houver dúvidas
sobre a identidade civil do acusado. Todas essas hipóteses encontram-se previstas
nos artigos 312 e 313, §1º, do Código de Processo Penal.

"Artigo 312 — A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem
pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para
assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e
indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do
imputado (redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)
Artigo 313... (...)
§1º. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a
identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para
esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a
identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida
(redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)".

A diferenciação entre a prisão-pena e a preventiva é estritamente necessária, dado


que esta não se presta a punir o culpado. Denota-se, com isso, que uma decretação
de prisão preventiva não quer dizer, em nenhuma hipótese, que o detido começou a
pagar pelo crime que cometeu. Do mesmo modo, a soltura de alguém em caso igual
não significa impunidade.

Feitas essas observações, se chegará, posteriormente, à conclusão acerca da


imprescindibilidade de garantir que a decretação da prisão preventiva seja realizada
quando for, de fato, necessária. Considerando as possibilidades de decretação
previstas nos supramencionados artigos do Código de Processo Penal, não subsiste
razão em segregar alguém sem que haja o devido risco, ficando vedadas
decretações com fundamentos em fatos genéricos ou, então, antigos.

Nesse versar, não havia, anteriormente à Lei 13.964/19 (pacote "anticrime"),


nenhuma menção referente ao prazo da preventiva e não raro eram as prisões
preventivas que se estendiam por anos. Algumas superaram, inclusive, a própria
pena do crime praticado. Com o advento da citada lei, foi acrescentado um
parágrafo único ao artigo 316 do Código de Processo Penal, estabelecendo que,
decretada a prisão preventiva, o órgão emissor da decisão deverá revisar a
necessidade de sua manutenção a cada 90 dias, mediante decisão fundamentada,
de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal. In verbis:

"Artigo 316 — O juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes, revogar a prisão
preventiva se, no correr da investigação ou do processo, verificar a falta de motivo
para que ela subsista, bem como novamente decretá-la, se sobrevierem razões que
a justifiquem (redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019).
Parágrafo único. Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão
revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 dias, mediante decisão
fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal (incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)".

Infere-se que o legislador determinou, de maneira clara e patente, um prazo para a


revisão da prisão cautelar. Assim, no prazo estipulado, quer seja, 90 dias, será
necessário que a mesma seja revista. A justificativa é simples e trouxe consigo uma
importantíssima ferramenta contra as prisões preventivas demasiadamente
extensas. Note, considerando que os motivos da decretação precisam ser atuais e
devidamente fundamentados, razoável é a sua revisão a cada 90 dias, avaliando,
logo, se é o caso de renová-la ou não.

A consequência da não revisão está presente no próprio dispositivo acrescentado,


quando menciona "sob pena de tornar a prisão ilegal". Dessa forma, ultrapassados
os noventa dias sem que tenha havido a revisão, a prisão preventiva é considerada
ilegal. Novamente, interpretação clara e que não deixa margem para quaisquer
dúvidas.

Aplicando a norma ao caso do André do Rap, constata-se que a prisão do acusado


não foi revisada e, então, não podia o ministro Marco Aurélio tomar outra atitude que
não o relaxamento [2], nos termos do artigo 5º, LXV da Constituição Federal, que
preceitua que a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária:

"Artigo 5º — Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
(...) LXV. a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária".

A decisão suscitou repercussão na grande massa, que, além de leiga, jamais


entenderia a razão por trás da soltura de um notório líder de facção. No entanto, é
possível, após as manifestações populares, analisar o caso de maneira técnica e
compreender que não houve, por parte do ministro, equívoco.

Ainda, para eventuais críticas condenando a decisão e afirmando que a


periculosidade do agente deveria ser analisada, se faz indispensável a reflexão
acerca da impossibilidade de o julgador não aplicar a norma ou aplicá-la de modo
distinto. Como já dito, o dispositivo utilizado na fundamentação da soltura não deixa
espaço para interpretações.

Além disso, os riscos de possibilitar que o julgador intérprete a questão a seu sentir
são incalculáveis, tendo em vista a total ausência de segurança jurídica propiciada
por tal fato. As legislações federais são elaboradas pelo Congresso Nacional,
composto por representantes democraticamente eleitos e mediante amplo debate
com a sociedade civil. À vista disso, contrariar o disposto na norma é atentar contra
a própria democracia, que, indiretamente, a elaborou.

Isso posto, é perfeitamente possível que haja discordâncias e reivindicações quanto


à sua alteração ou extinção. Porém, o caminho correto para tais ações é através
dos mesmos representantes democraticamente eleitos, pois, caso contrário,
tornar-se-á o Congresso Nacional um local de simples encenação, onde quem
decide é, na prática, o Judiciário.

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