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SENTENÇA – PROF.

LUIZ FLÁVIO GOMES


REGULAR II – 2009.1

1. Despachos, Decisões e Sentenças:

Os atos jurisdicionais são: despachos, decisões e sentença.


Despachos são atos de mera movimentação do processo praticado por juiz ou servidor
da Justiça (por delegação do juiz). Em regra, não cabe recurso contra despacho. Há
exceções: despacho tumultuário (ex.: juiz inverte o procedimento). O recurso cabível é
o da correição parcial. Os despachos não são desafiados por embargos de declaração.
Quando o despacho estiver confuso e/ou obscuro a parte deve requerer o
esclarecimento do juiz.
Não confundir: despacho com ato meramente ordinatório. Ato meramente ordinatório
é um ato praticado de ofício e só pelo servidor, por exemplo: juntada de documentos.
Despacho pode ser praticado por juiz ou servidor, mas ato meramente ordinatório só
pode ser praticado pelo servidor.
Decisões interlocutórias são aquelas que não encerram o processo, são dadas dentro
do andamento do feito. São três as modalidades de interlocutórias dentro do processo
penal:
1ª) Interlocutória Simples: decisão que não encerra o processo, nem uma fase do
procedimento, nem julga nenhum pedido incidental, por exemplo: o recebimento de
uma denúncia.
2ª) Interlocutória Mista Não Terminativa: decisão interlocutória que encerra uma fase
do procedimento, mas não extingue o processo. O clássico exemplo é a decisão de
pronúncia.
3ª) Interlocutória Mista Terminativa ou Terminativa Incidental: decisão
interlocutória que julga o mérito de um pedido incidental, por exemplo: prisão
preventiva, porque o pedido principal é a condenação. Outros exemplos: restituição de
bens; livramento condicional
Sentença é o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo com ou sem decisão do
mérito.

2. Etapas da sentença que o juiz deve seguir:


1ª Verificação da necessidade concreta da pena.
2ª Escolha da pena, quando elas são alternativas.
3ª Fixação da pena de prisão, conforme o sistema trifásico.
4ª Fixação da pena de multa, conforme o sistema bifásico (fixar o número de dias
multa, valor de cada dia multa).
5ª Aplicação de eventual pena específica do art. 92 do CP.
6ª Eventual substituição da prisão.
7ª Eventual aplicação do sursis.
8ª Fixação do regime inicial de cumprimento de pena.
9ª Decretação eventual da prisão.
10ª Determinações finais.

Questão: A sentença equivocada deve ser anulada ou reformada?


Error in procedendo = anulação. Juízo rescindente. Ex: não respeito ao sistema
trifásico.
Error in judicando = reforma. Juízo rescindente e Juízo rescisório. O acórdão substitui a
sentença.

3. Espécies de sentença:

Partindo desse conceito, vamos principais espécies de sentença:


1) Sentença Terminativa: sentença que extingue o processo sem
julgamento do mérito principal. Exemplo: exceção de coisa julgada;
2) Sentença Condenatória:
Pode o MP pedir a absolvição nas alegações finais tendo em conta o princípio da
indisponibilidade da ação penal pública? Sim. Esse pedido vincula o juiz? Não. É o que
concluímos pela dicção do art. 385 do CPP:

Art. 385.  Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença


condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela
absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido
alegada.

Essa é uma visão legalista. Essa mesma questão vista por uma visão constitucionalista,
o resultado será outro: o juiz não pode condenar porque já não há mais parte
acusadora. Se o juiz condena sem acusação ele está sendo um juiz inquisidor, ferindo o
sistema penal acusatório.
A sentença condenatória está prevista no art. 387 do CPP:

Art. 387.  O juiz, ao proferir sentença condenatória:


I - mencionará as circunstâncias agravantes ou atenuantes definidas no
Código Penal, e cuja existência reconhecer;
II - mencionará as outras circunstâncias apuradas e tudo o mais que deva
ser levado em conta na aplicação da pena, de acordo com o disposto nos
arts. 59 e 60 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código
Penal;
III - aplicará as penas de acordo com essas conclusões;
IV - fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração,
considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido;
V - atenderá, quanto à aplicação provisória de interdições de direitos e
medidas de segurança, ao disposto no Título Xl deste Livro;
VI - determinará se a sentença deverá ser publicada na íntegra ou em
resumo e designará o jornal em que será feita a publicação (art. 73, § 1o, do
Código Penal).

2.1) Efeitos de uma sentença condenatória:


1º efeito: prisão do réu se presente os requisitos da preventiva (art. 393, I do CPP).

Art. 393.  São efeitos da sentença condenatória recorrível:


I - ser o réu preso ou conservado na prisão, assim nas infrações
inafiançáveis, como nas afiançáveis enquanto não prestar fiança;

A leitura isolada do art. 393, I leva a conclusão que a prisão seria uma decorrência
automática da sentença condenatória, a prisão seria ex vi legi. Mas, esse dispositivo
tem que ser interpretado juntamente com o parágrafo único do art. 387:

Parágrafo único do art. 387.  O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a


manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra
medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser
interposta.

Assim, não existe mais prisão automática no processo penal. Na sentença


condenatória, a fundamentação do juiz quanto a decretação da prisão deverá
abranger: fundamentação fática; fundamentação jurídica; necessidade (pois estamos
diante de uma prisão cautelar e não definitiva).
A reforma processual penal de 2008 também trouxe outro importante avanço, qual
seja: a desvinculação do recurso de apelação, ou seja, a prisão não condiciona a
apelação, são coisas independentes. Não há pedágio (prisão) para poder apelar.
O motivo dessa mudança legislativa se deu em homenagem ao princípio do duplo grau
de jurisdição, previsto na Convenção Americana sobre Direitos Humanos – art. 8º, 2,
“h”, que goza, hoje, de status supra legal.

2º efeito: lançamento do nome do réu no rol dos culpados (art. 393, II):

Art. 393.  São efeitos da sentença condenatória recorrível:


II - ser o nome do réu lançado no rol dos culpados.
3º efeito: pressuposto da reincidência:

4º efeito: fixa a indenização civil:


O juiz fixa o valor mínimo de reparação dos danos.
Se a vítima não concorda, pode ir ao civil busca a diferença.

3) Sentença Absolutória:

Art. 386.  O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva,


desde que reconheça:
I - estar provada a inexistência do fato;
II - não haver prova da existência do fato;
III - não constituir o fato infração penal;
IV –  estar provado que o réu não concorreu para a infração penal; 
V – não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal;
VI – existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena
(arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 1 o do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo
se houver fundada dúvida sobre sua existência; 
VII – não existir prova suficiente para a condenação. 
Parágrafo único.  Na sentença absolutória, o juiz:
I - mandará, se for o caso, pôr o réu em liberdade;
II – ordenará a cessação das medidas cautelares e provisoriamente
aplicadas;
III - aplicará medida de segurança, se cabível.

De todos os fundamentos de uma absolvição, há uma novidade: havendo dúvida sobre


alguma causa excludente de antijuridicidade (legítima defesa, estado de necessidade)
resolve-se em favor do réu. Antigamente o MP só tinha a preocupação de provar o fato
e a autoria.
Espécies de sentença absolutória:
3.1) Sentença absolutória própria: o juiz absolve e nenhuma conseqüência resulta
para o réu;
3.2) Sentença absolutória imprópria: o juiz absolve e aplica medida de segurança ao
inimputável.

Efeitos da sentença absolutória:


1º efeito: Liberação do réu se estiver preso, ainda que no Júri, não importando o
número de votos;
Se se tratar de doente mental inimputável, aplica-se medida de segurança.
Restituição da fiança.
As medidas assecuratórias são levantadas, etc.
Regra: a sentença absolutória não impede a ação civil. Independência das instâncias.
Exceção: sentença que absolve por inexistência do fato ou negativa de autoria.
Reconhecimento de causa justificante faz coisa julgada no cível, isto é, não pode ser
rediscutida em processo civil (ex: estado de necessidade agressivo; legítima defesa real
com aberratio ictus).

2º efeito: Devolução da fiança;

Réu absolvido no crime tem que pagar indenização civil? Em regra sim, salvo nas
seguintes exceções:
a) Estar provado que o fato não ocorreu;
Se o fato ocorreu:
b) Estar provado que o réu não participou dos fatos;
c) Estar provada um causa excludente da antijuridicidade.
Essa terceira exceção, por seu turno, sofre exceções (volta a caber indenização civil):
 Estado de necessidade agressivo (porque atinge um inocente); vaqueiro
atirou num boi descontrolado e acertou um inocente que estava numa árvore.
 Legítima defesa real com aberratio ictus (erro na execução); “A” agrediu
injustamente “B”, “B”reagiu em legítima defesa só que o tiro pegou em “C”.
 Legítima defesa real quando se usa um inocente como escudo; A pessoa
vai se defender e pega outra como escudo e ela sofre as lesões em seu lugar.
 Legítima defesa putativa;

4) Sentença Declaratória Extintiva da Punibilidade:


Exemplo: sentença concessiva do perdão judicial:
Súmula 18 do STJ: A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória
da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório.

5) Sentença que julga o mérito de uma ação autônoma, por exemplo: HC,
MS etc

6) Sentença Constitutiva: constitui uma nova relação jurídica, exemplo:


sentença que concede a reabilitação criminal.

4. Classificação das sentenças:


Examinada essas seis espécies de sentença, vamos a classificação das sentenças:

4.1. Sentença autofágica ou de efeito autofágico (MP/MG):


É a sentença em que o juiz reconhece o crime e a culpabilidade do agente e em
seguida julga extinta a punibilidade. É o caso do perdão judicial. O exemplo mais
comum na jurisprudência de perdão judicial é o caso do pai que mata o filho em
acidente de trânsito.
E na prescrição retroativa, a decisão é autofágica? Não, porque primeiro o juiz só
condena, ou seja, a sentença é condenatória. Se o MP recorre o Tribunal ainda pode
majorar a pena. Se o MP não recorre, transita em julgado para a acusação, a pena
torna-se definitiva para a acusação. Só nesse momento é que o juiz vai fazer o cálculo
da prescrição e, em havendo a prescrição, ele dará nova sentença de extinção da
punibilidade pela prescrição. Veja, são duas sentenças distintas.
É pacífico que o juiz de 1º grau possa reconhecer a prescrição retroativa, ele só não
pode é reconhecê-la na sentença condenatória, uma vez que ele deve aguardar o
transito em julgado para o MP.

4.2. Sentença branca:


É a sentença que remete para o próximo grau de jurisdição o julgamento de uma
questão que depende de uma interpretação de Tratados Internacionais. Isto está
proibido no Brasil. O juiz, mesmo que se trate de uma questão internacional, tem que
julgar. Pelo princípio da indeclinabilidade da jurisdição o juiz tem que decidir tudo, não
tem que passar para o TJ.

4.3. Sentença vazia:


Sentença sem nenhuma fundamentação.

4.4. Sentença suicida:


O dispositivo/conclusão não tem congruência com a fundamentação.

4.5. Sentença Simples:


É proferida por juiz monocrático.

4.6. Sentença subjetivamente plúrima:


Emanada por um órgão colegiado.

4.7. Sentença subjetivamente complexa:


Emanada de vários órgãos. Ex: júri.

4.8. Sentença Material:


Julga o mérito do pedido principal.

4.9. Sentença Formal:


Extingue o processo, por razões processuais. Ex: reconhecimento de coisa julgada /
litispendência.

5. Requisitos de uma sentença:

1º - Relatório:
É a “pequena história do processo” (Pontes de Miranda).
É obrigatório. Sua ausência gera nulidade. A nulidade é relativa, deve verificar se houve
prejuízo para a parte. Única exceção: juizados especiais.

2º - Fundamentação/motivação:
São as justificativas / valorações do juiz sobre as provas, sobre os fatos, sobre o direito.
Sentença sem fundamentação (sentença vazia) gera nulidade absoluta.
Não se confunde com fundamentação insuficiente, que é causa de nulidade relativa.
Fundamentação per relationem: o juiz admite na sua decisão fundamentação alheia,
encampa fundamentação alheia. Ex: “acolho as razões do MP ou da Defesa”. Em
algumas situações é possível. Ex: decretação da prisão preventiva. Não é cabível nas
sentenças finais.
Nulidade no ponto. Ex: Pena acima do mínimo sem fundamentação. Sentença nula no
ponto. A sentença pode ser válida, mas contém uma omissão. O Tribunal confirma a
condenação, mas baixa o processo a fim de que o juiz supra a omissão.
Pena no mínimo sem fundamentação. A jurisprudência tolera.

Na fundamentação o juiz não pode invocar conhecimentos particulares (preconceitos


raciais, sexuais) sobre os fatos. O juiz deve invocar o que está nos autos. Não pode
invocar dados psicografados. Não pode fundamentar de forma escatológica.
A fundamentação da pena deve ocorre na fundamentação, mas tolera-se a
fundamentação dentro do dispositivo.

3º - Dispositivo/Conclusão:

4º - Parte autenticativa:
Assinatura do Juiz. Sentença sem assinatura pode ser anulada. Quando foi inequívoca
a autoria da sentença, o ato pode ser sanado / regularizado. Se não se descobre a
autoria da sentença, tem-se um ato inexistente.

6. Publicação da sentença:
A publicação, em regra, se dá por ato do escrivão.
A sentença proferida em audiência já é pública automaticamente.
A sentença do júri se torna pública no encerramento do júri.
A partir da publicação, a sentença se torna imodificada. Princípio da imodificabilidade
da sentença. Exceções: erros materiais; erros de cálculo; embargos de declaração;
surgimento de lei penal nova mais favorável1; efeito regressivo do RESE.
É possível a publicação da sentença em jornais?
Pelo CP não pode (reforma de 84). Mas há exceção prevista no art. 78, II CDC:

Art. 78. Além das penas privativas de liberdade e de multa, podem ser
impostas, cumulativa ou alternadamente, observado o disposto nos artigos
44 a 47, do Código Penal:
II – a publicação em órgãos de comunicação de grande circulação ou
audiência, às expensas do condenado, de notícia sobre os fatos e a
condenação;

Questiona-se a constitucionalidade desse dispositivo, violaria o princípio da dignidade


da pessoa humana?

7. Intimação da Sentença:
Ato pelo qual se dá conhecimento às partes da sentença.
A partir da intimação que se conta prazos para recursos.

Obs: Intimação por precatória. Súmula 710 do STF. Conta-se os prazos da data da
intimação, e não da juntada da precatória.
Formas de Intimação:
Intimação Pessoal: MP, Defensor Público e Defensor Dativo.
Intimação pela Imprensa: Defensor Constituído.
Intimação do Réu:
Sentença Absolutória = Pessoalmente ou na pessoa de seu advogado. Sentença
Condenatória = Dupla intimação necessária. Réu + Advogado.
Réu preso deve ser intimado pessoalmente. Réu solto intimação pessoal, mas se não
for achado, intimação por edital.
Conta-se o prazo para recurso da última intimação.

Intimação de Acórdão se faz pela imprensa, salvo MP e Defensor Público.


Jurisprudência inclui também o Defensor Dativo.

8. Natureza jurídica da sentença:


O juiz declara o Direito ou o juiz cria o Direito?
Pela corrente conservadora o juiz só declara o Direito. Por sua vez a doutrina moderna
(séc. XXI) entende que o Direito vai do constituinte ao juiz, todos criam o Direito. A lei
faz parte do Direito, mas não é o Direito. Logo, o juiz cria o direito, por exemplo: para
haver a continuidade delitiva o prazo máximo entre os crimes não podem superar 30
dias. É o ativismo judicial: juiz exercendo atividade legislativa, exs.: fidelidade
partidária, uso da algemas, utilização da lei de greve do serviço privado para regular a
greve dos servidores públicos etc.
1
Questão: Quem aplica a lei nova mais favorável?
Se o processo está em primeira instância o juiz de primeira instância é quem aplica a lei nova mais
favorável. Se estiver no tribunal, é o tribunal quem aplica a lei nova. Se estiver no juiz da execução, é o
juiz da execução.
9. Imodificabilidade da sentença:
Publicada a sentença ela se torna definitiva, salvo:
a) Inexatidões materiais;
b) Meros erros de cálculo;
c) Embargos de declaração – art. 382, CPP;
d) Lei penal nova mais favorável (Novatio legis in mellius);

A velha doutrina afirmava que o juiz, com a sentença, esgotava a jurisdição. Isso é
válido em termos, pois o juiz esgota a jurisdição no sentido de que não pode mais
reavaliar o caso, mas em todas as hipóteses acima o juiz readquire a jurisdição.

10. Princípio da Correlação entre a Acusação e a Sentença.


O fato narrado tem de ser o fato julgado.

A sentença não pode ser ultra (além) petita. Sentença absolutamente nula.
Ex: narra-se uma lesão leve e o juiz condena por lesão grave.

A sentença não pode ser extra (fora) petita. Sentença absolutamente nula.
Ex: narra-se um furto e o juiz condena por apropriação indébita.

A sentença não pode ser citra (aquém) petita.


Ex: denunciam-se dois crimes, roubo e estupro, o juiz apenas julga o roubo,
esquecendo-se do estupro.
Pode ser corrigida por meio de embargos de declaração. Ainda que não sejam opostos
os embargos, a sentença não é nula quanto ao crime julgado, mas há uma nulidade de
omissão. O tribunal reconhece a omissão e baixa os autos para que o juiz de primeiro
grau supra a omissão.

11. Coisa Julgada


Garantia da imutabilidade do mandamento proveniente da sentença. Opera-se a coisa
julgada quando a sentença se torna irrecorrível. O fundamento da coisa julgada é a
segurança jurídica.
Não confundir coisa julgada com efeitos naturais de uma sentença. A coisa julgada se
dá entre as parte. Já os efeitos naturais são erga omnes.

11.1. Espécies de coisa julgada:


a) Coisa julgada formal: ocorre quando preclusa as vias impugnativas da sentença. Seus
efeitos se projetam para dentro do processo, ou seja, o juiz não pode modificar o que
já decidiu, ressalvadas as exceções já vistas.
b) Coisa julgada material: projeta seus efeitos para fora do processo, ou seja, nenhum
outro juiz ou Tribunal pode modificar o que ficou decidido.

11.2. Função negativa da coisa julgada:


É a garantia de que outro processo não haverá em relação ao mesmo fato. Ninguém
pode ser processado duas vezes pelo mesmo fato, salvo quando o fato ocorrer no
estrangeiro – extraterritorialidade da lei penal. Nessa exceção pode haver, inclusive,
dupla condenação. Nesse caso a penas serão comutadas (art. 8º do CP).

11.3. Coisa Julgada e Revisão Criminal


A revisão criminal desfaz a coisa julgada, porque é uma garantia maior, por isso só
existe revisão criminal pro reo no Brasil.
A revisão criminal não ofende a coisa julgada, a questão é de hierarquia.
É por isso que, no Direito Penal, toda sentença condenatória é sempre relativa. Por
outro lado, sentença absolutória ou extintiva da punibilidade gera coisa julgada
absoluta (não cabe revisão criminal pro societate).

11.4. Coisa Julgada e Recurso “ex officio”:

Súmula 423 do STF: Não transita em julgado a sentença por haver omitido
o recurso de ofício, que se considera interposto “ex lege”. Não importa o
tempo, não fará coisa julgada.

Exemplos: concessão de HC, absolvição sumária no Júri, concessão de reabilitação etc.


Enquanto o recurso não subir não há falar em coisa julgada.
Apesar das críticas o STF disse que continua valendo esses recursos de ofício.

11.5. Coisa julgada e juízo das execuções:


Na fase de execução é possível mudar alguns aspectos da condenação, por exemplo:
progressão de regime.
Cuidado! O juiz da execução não poderá, entretanto, alterar o sentido da decisão.
Por quê? Isso porque a sentença condenatória (coisa julgada) contém cláusula “rebus
sic stantibus”.

11.6. Limites da coisa julgada

a) Limites objetivos da coisa julgada:


Qual parte da sentença transita em julgado? Relatório, fundamentação, conclusão
(dispositivo) ou parte autenticativa?
Transita em julgado a parte decisória da sentença, presente no Dispositivo (conclusão).
Não importa o tipo de sentença, será sempre a parte dispositiva.
Esse trânsito em julgado está vinculado a um fato. O objeto da coisa julgada é o fato
principal. Em última análise, é a realidade histórica narrada no processo.
Os limites objetivos da coisa julgada dizem respeito ao fato natural narrado e julgado
na sentença, pouco importando a sua qualificação jurídica (art. 110, CPP)
Art. 110.  Nas exceções de litispendência, ilegitimidade de parte e coisa julgada,
será observado, no que Ihes for aplicável, o disposto sobre a exceção de
incompetência do juízo.
§ 1o  Se a parte houver de opor mais de uma dessas exceções, deverá fazê-lo
numa só petição ou articulado.
§ 2o  A exceção de coisa julgada somente poderá ser oposta em relação ao fato
principal, que tiver sido objeto da sentença.
Narrou-se um furto, a condenação foi por furto, mas na verdade era roubo. Cabe novo
processo por roubo? Não, pois o fato já foi julgado, ou seja, circunstâncias do fato que
aparecem não permitem novo processo.
E se for instaurado um segundo processo? O caminho é propor EXCEÇÃO DE COISA
JULGADA para impedir o andamento do novo processo. Haverá extinção do processo
novo.
Situação diferente é quando vários crimes forem cometidos e um só deles foi objeto
do processo, nesse caso permite-se novo processo em relação aos outros crimes.
Situações peculiares:
I - Concurso formal x limites objetivos da coisa julgada:
Sujeito atropelou e matou 7 pessoas, só que a denúncia e a condenação só foi para 6.
A sétima vítima apareceu. Cabe novo processo? Sim, porque esse é novo crime, novo
fato. PODE ABRIR PROCESSO NOVO EM RELAÇÃO AO OUTRO CRIME, QUE NÃO FOI
JULGADO.

II - Concurso material x limites objetivos da coisa julgada:


Conteúdo: roubo + estupro. Houve processo somente quanto ao roubo. Depois da
coisa julgada a vítima afirma que também foi estuprada, poderá abrir novo processo
contra o estupro? PODE SIM ABRIR PROCESSO PELO ESTUPRO. É outro crime, outro
processo. Expede-se carta de guia para a Execução, a fim de somar as penas.

III – Crime permanente x limites objetivos da coisa julgada:


Crime permanente é aquele em que a consumação se prolonga no tempo, exemplo
clássico: seqüestro.
Conteúdo: iniciou um seqüestro. Houve processo, com coisa julgada. É possível novo
processo, envolvendo as mesmas partes, para um outro seqüestro?
É SIM POSSÍVEL ABRIR PROCESSO NOVO, DESDE QUE HAJA CONTEXTO FÁTICO
DISTINTO.

Conteúdo: prática do crime de quadrilha ou bando (artigo 288). Exige permanência.
Condenado pelo artigo 288, ocorre que depois da coisa julgada descobre-se que
aquela associação continua atuando.
O FATO É EXATAMENTE O MESMO. APENAS NÃO PAROU. EM RAZÃO DE O FATO
CONTINUAR, NÃO PODERÁ HAVER PROCESSO NOVO.

IV – Crime habitual x limites objetivos da coisa julgada:


Crime habitual é aquele que exige reiteração. Exemplo: exercício ilegal de medicina.
Réu condenado pelo artigo 282, pode ser processado novamente porque continua
exercendo a atividade ilícita. Pode ser processado de novo?
DEPENDE. SE APENAS ESTIVER PROSSEGUINDO NO FATO ANTERIOR, NÃO CABE NOVO
PROCESSO. DE OUTRO LADO, SE ELE ESTIVER PRATICANDO NOVOS FATOS, É POSSÍVEL
NOVO PROCESSO. Exemplo: foi condenado pelo artigo 282 na comarca de Ribeirão
Preto. Agora, está exercendo ilegalmente a profissão em Porto Alegre. No caso, caberá
novo processo.

V – Crime de conteúdo múltiplo ou variado x limites objetivos da coisa julgada:


Crime de conteúdo múltiplo ou variado é o crime que contém vários verbos. Exemplo:
artigo 33 da Lei 11.343/06 (Lei de Drogas).
Conteúdo: réu condenado por um fato. Pode abrir processo pelo mesmo fato. TUDO
QUE OCORRE NO MESMO CONTEXTO FÁTICO SÓ PODE SER OBJETO DE UM PROCESSO
(princípio da ALTERNATIVIDADE – vários verbos, no mesmo contexto fático, não
permite novos processos).

VI - Crime continuado x limites objetivos da coisa julgada:


Crime continuado são vários crimes vinculados pelo elo de continuidade. É o artigo 71
do CP.

Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica


dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar,
maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser
havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos
crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer
caso, de um sexto a dois terços. Parágrafo único - Nos crimes dolosos,
contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à
pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a
conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as
circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a
mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo
único do art. 70 e do art. 75 deste Código.

O sujeito cometeu três roubos, em comarcas próximas, em datas seqüenciais. Só foi


denunciado e condenado por dois. Descoberto crime novo, cabe novo processo? SIM,
PODE HAVER VÁRIOS PROCESSOS, CADA QUAL JULGANDO UM ROUBO.
Competência é do juiz das Execuções que irá reconhecer a continuidade delitiva. Tal se
denomina de INCIDENTE DE UNIFICAÇÃO DE PENAS.
Essa modificação do juiz da execução não fere a coisa julgada!

VII – Produção posterior de resultado mãos grave x limites objetivos da coisa julgada:
Conteúdo: o sujeito foi condenado por tentativa de homicídio. Após o transito em
julgado a vítima morre. Cabe novo processo? NÃO, porque o fato é único, apenas
mudou a circunstância do fato.

VIII – Sentença que julga extinta a punibilidade com base de certidão de óbito falsa x
limites objetivos da coisa julgada:
Réu que junta certidão de óbito falsa, levando à decisão de extinção da punibilidade.
Essa sentença vale ou não?
Para a doutrina faz coisa julgada, processa-se depois o réu por uso de documento
falso. É um entendimento tecnicamente correto, porém absurdo.
Para o STF, NÃO HÁ COISA JULGADA, a decisão do juiz é inexistente. A decisão do juiz
tem uma base falsa. Há uma relativização da coisa julgada contra o réu (HC 84525).

IX – Dois réus: um acusado de autor (executor), outro acusado como partícipe. Os


julgamentos foram em momentos distintos. No dia do julgamento o partícipe
confessou que foi o autor e o “autor” disse que só emprestou a arma. Ambos foram
absolvidos. Cabe novo processo?
STF: SIM, APESAR DE JÁ PROCESSADO PELO FATO, PODE-SE ABRIR NOVO PROCESSO. O
FUNDAMENTO JURÍDICO É: NÃO É A MESMA CAUSA DE PEDIR.

X - Nos Juizados Especiais, havendo descumprimento de transação, é possível abrir


novo processo contra o réu?
Entendimento do STJ e STF: admitem oferecimento de denúncia. Exceção (não cabe
denúncia, mesmo o réu descumprindo a transação): réu condenado só pela pena de
multa. Não se dá nova denúncia. Tenta-se executar em bens do réu. Há muita
polêmica na doutrina. Mas o posicionamento do STF e do STJ é claro.

XI – FILME: RISCO DUPLO:


Réu condenado por um homicídio que não cometeu. Pode matar “novamente”?
NÃO, segue-se a mesma lógica da certidão falsa: o primeiro processo não vale.
No Brasil, deverá haver revisão criminal para anular o primeiro processo. Apenas cabe
indenização pelo cumprimento da pena injustamente aplicada.
Se o réu matar efetivamente abre-se novo processo. Não existe crédito de crime.
Tempo já cumprido não se debita na nova pena. Irá para cadeia novamente.

b) Limites subjetivos da coisa julgada:


A coisa julgada vale em relação a quem? Quem é atingido pela coisa julgada? A coisa
julgada vale para as partes.
Na verdade, não importa quem integrou o pólo ativo.
Se houve absolvição, não se modifica mais o caso (não importa a ilegitimidade da parte
ativa). Se houve condenação, e a parte ativa era ilegítima, cabe HC ou revisão criminal
para anular o processo.
Caso de co-autoria, só um réu foi denunciado e condenado. Descoberto o outro co-réu,
posteriormente à condenação do outro réu, cabe processo contra ele? CABE SIM,
PORQUE O OUTRO CO-RÉU NÃO FEZ PARTE DO PROCESSO. A coisa julgada só está
valendo para quem integrou o processo.
Mesmo que um réu (caso de co-autoria) seja absolvido, pode-se abrir novo processo
contra o co-réu? DEPENDE do fundamento da absolvição. SE UM RÉU FOI ABSOLVIDO
POR ATIPICIDADE OU POR EXCLUDENTE DA ILICITUDE (ex.: legítima defesa), NÃO
PODERÁ ABRIR OUTRO PROCESSO. SE UM RÉU FOI ABSOLVIDO POR FALTA DE PROVAS,
PODERÁ SER ABERTO CONTRA O OUTRO RÉU (pode não ter prova contra “A”, mas
pode ter contra “B”).
A sentença penal condenatória contra um co-réu, pode ser executada civilmente contra
terceiros? Não é possível executar terceiros, porque não participaram do processo
(não teve direito a contraditório e a ampla defesa). A vítima, com a decisão
condenatória na mão, deve ingressar com ação cível. Não poderá executar
diretamente.

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