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05/02/2020 Dizer o Direito: Lei de Abuso de Autoridade - parte 2

Lei de Abuso de Autoridade - parte 2


terça-feira, 19 de novembro de 2019

DECRETAÇÃO DE MEDIDA PRIVATIVA DE LIBERDADE EM


DESCONFORMIDADE COM A LEI

Art. 9º Decretar medida de privação da liberdade em manifesta


desconformidade com as hipóteses legais:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena a autoridade judiciária que,
dentro de prazo razoável, deixar de:
I - relaxar a prisão manifestamente ilegal;
II - substituir a prisão preventiva por medida cautelar diversa ou de
conceder liberdade provisória, quando manifestamente cabível;
III - deferir liminar ou ordem de habeas corpus, quando
manifestamente cabível.

CRIME DO CAPUT

Em que consiste o delito:


A autoridade judicial decreta medida privativa de liberdade em desacordo com
as hipóteses autorizadas pela lei.

Medidas de privação de liberdade


Medidas de privação de liberdade previstas no ordenamento jurídico e que
podem ser objeto deste crime:
• Prisão cautelar (prisão temporária, prisão preventiva);
• Prisão para cumprimento da execução provisória da pena;
• Prisão para cumprimento da execução definitiva da pena;
• Medida de segurança detentiva (internação) (art. 96, I, do CP);

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• Semiliberdade (art. 120 do ECA);


• Internação (art. 121 do ECA);
• Internação psiquiátrica (art. 6º da Lei nº 10.216/2001).

Sujeito ativo
A autoridade judicial (Juiz, Desembargador, Ministro).

Sujeito passivo
É o Estado e também a pessoa que teve privada a sua liberdade.

Elemento subjetivo
Dolo acrescido do elemento subjetivo especial (finalidade específica de
prejudicar outrem ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, por mero
capricho ou satisfação pessoal).
Não se pune a conduta culposa.

Consumação
O crime se consuma com a decretação, ou seja, com a prolação da decisão
determinando a medida de privação da liberdade, ainda que ela não se
consuma.
Trata-se, portanto, de crime formal, que não depende da produção de
resultado naturalístico.
Desse modo, imagine que o juiz decreta a prisão mesmo sendo
manifestamente descabida. Antes que a providência seja cumprida, o indivíduo
consegue do Tribunal uma ordem em habeas corpus cassando a decisão de 1ª
instância. Em tese, o crime estará consumado mesmo não tendo havido a
efetiva condução coercitiva.

Suspensão condicional do processo


Como a pena mínima é igual a 1 ano, cabe suspensão condicional do processo
(art. 89 da Lei nº 9.099/95).

CRIME DO PARÁGRAFO ÚNICO

Providências que o juiz deverá adotar diante de uma prisão em


flagrante
Segundo o art. 310 do CPP, o juiz, ao receber o auto de prisão em flagrante,
deverá, fundamentadamente:
I - relaxar a prisão ilegal; ou
II - converter a prisão em flagrante em prisão preventiva, quando:
• estiverem presentes os requisitos do art. 312 do CPP e
• se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da
prisão; ou
III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.
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Os incisos I e II do parágrafo único do art. 9º têm por objetivo principal punir


o magistrado que, dentro de prazo razoável, deixa de dar cumprimento
adequado ao art. 310 do CPP.

Inciso I
A prisão ilegal deve ser relaxada pela autoridade judiciária competente.
É o caso, por exemplo, em que o juiz recebe o auto de prisão em flagrante e
constata que o indivíduo foi preso por conta de um fato atípico ou percebe que
não havia situação de flagrância. Nestas hipóteses, exemplificativas, cabe ao
juiz relaxar a prisão do indivíduo, colocando-o em liberdade, salvo se houver
algum outro motivo para o cárcere.

Inciso II
O estudo do inciso II deve ser dividido em duas partes:
1) deixar de “substituir a prisão preventiva por medida cautelar diversa”.
Prisão preventiva é uma espécie de prisão de natureza cautelar, decretada na
fase das investigações ou durante a ação penal, desde que presentes os
pressupostos e requisitos previstos nos arts. 312 e 313 do CPP.
Ocorre que a prisão preventiva é uma medida extrema e somente deve ser
decretada (ou mantida) se não couber nenhuma outra medida cautelar. A
prisão é a última das medidas cautelares que deverá ser adotada. Assim,
somente será determinada a prisão quando não for cabível a sua substituição
por outra medida cautelar (art. 282, § 6º do CPP).
O art. 319 do CPP prevê a lista de medidas cautelares diversas da prisão:
Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão:
I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas
pelo juiz, para informar e justificar atividades;
II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por
circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer
distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;
III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por
circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela
permanecer distante;
IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja
conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;
V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o
investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;
VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza
econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a
prática de infrações penais;
VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados
com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser

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inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de


reiteração;
VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o
comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento
ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;
IX - monitoração eletrônica.

2) deixar “de conceder liberdade provisória, quando manifestamente cabível”


Liberdade provisória é uma medida de contracautela concedida pela autoridade
judicial que, ao receber o auto de prisão em flagrante, constata que a prisão
efetuada foi legal, mas que não há motivos para se decretar a prisão
preventiva, razão pela qual o flagranteado deverá ser solto, com ou sem a
imposição de medidas cautelares diversas.
A liberdade provisória é relacionada, portanto, com a prisão em flagrante, não
sendo a medida adequada para o caso de já ter sido decretada a prisão
preventiva. Vamos comparar e entender os institutos:

Revogação da prisão
Relaxamento da prisão Liberdade provisória
preventiva
É a decisão do magistrado É a decisão do magistrado É a decisão do magistrado
reconhecendo que a prisão é reconhecendo que não há reconhecendo que a prisão em
ilegal, ou seja, que não atende motivos para a prisão flagrante foi legal, mas que não
os requisitos formais. preventiva, devendo, portanto, há motivos para convertê-la em
esta medida ser revogada. prisão preventiva, motivo pelo
qual o flagranteado deve ser
solto, com ou sem a imposição
de medidas cautelares.

Inciso III
Deixar de “deferir liminar ou ordem de habeas corpus, quando
manifestamente cabível”.
Este inciso III é extremamente amplo. Isso porque ele não se limita aos casos
de prisão em flagrante. Na verdade, não se restringe nem mesmo aos casos
de prisão.
Explico. No Brasil, o habeas corpus apresenta uma feição bem ampla, sendo
cabível mesmo quando o paciente não está preso e mesmo quando ato
impugnado não implicar risco imediato de prisão.
Nesse sentido, o STF recentemente decidiu que:
Cabe habeas corpus mesmo nas hipóteses que não envolvem risco imediato
de prisão, como na análise da licitude de determinada prova ou no pedido
para que a defesa apresente por último as alegações finais, se houver a
possibilidade de condenação do paciente. Isso porque neste caso a discussão
envolve liberdade de ir e vir.
STF. 2ª Turma. HC 157627 AgR/PR, rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o
ac. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 27/8/2019 (Info 949).

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Assim, o inciso III do parágrafo único do art. 9º pune, em suma, a demora no


julgamento do habeas corpus.

Liminar em habeas corpus: é a decisão concedendo o pedido formulado pelo


impetrante antes que o processo de habeas corpus chegue ao fim.
Ordem de habeas corpus: é a decisão concedendo o pedido formulado pelo
impetrante, mas já ao final do processo de habeas corpus.
Vale relembrar que, apesar de ser mais comum a impetração de habeas corpus
nos Tribunais, existe também a possibilidade de o juízo de 1ª instância julgar
habeas corpus. É o caso, por exemplo, em que o impetrante questiona um ato
do Delegado de Polícia.

Dentro de prazo razoável


A grande dúvida e polêmica envolvendo este tipo penal diz respeito ao
conceito de “prazo razoável”. Trata-se de conceito aberto que deverá ser
analisado com base nas peculiaridades do caso concreto.

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